Artigo Isabel Duprat e a Arte de Criar Ambientes

ISABEL DUPRAT E A ARTE DE CRIAR AMBIENTES – Projeto Paisagístico – 1º bimestre 2022/1

Diana Biazin, Bruna; Estudante; Centro Universitário Belas Artes de São Paulo; brunadbiazin@outlook.com

Resumo: Este artigo apresenta uma análise do processo criativo da paisagista Isabel Duprat, expondo os elementos principais que ela faz uso para projetar, sendo eles: a topografia, a criação de diferentes ambientes, cores, texturas e formas orgânicas. Para concluir, é feita uma relação do processo criativo aplicada em seu projeto paisagístico Praça Infantil Iguatemi.

Palavras chave: Isabel Duprat; espaços verdes; paisagismo brasileiro.

Abstract: This article presents an analysis of the creative process of the landscape designer Isabel Duprat, exposing the main elements that she uses to create her projets, namely: topography, the creation of different environments, colors, textures and organic shapes. To conclude, a relation of the creative process applied in her landscape design Praça Infantil Iguatemi is made.

Keywords: Isabel Duprat; green spaces; brazilian landscape.

Introdução Esse artigo tem como objetivo central a compreensão do processo criativo da paisagista brasileira contemporânea Isabel Duprat, considerando os elementos construídos em seus projetos, bem como a exploração da vegetação na composição dos espaços. Para tal, foram analisados o uso da topografia, das texturas, das cores, a criação de diferentes espaços e o traçado de formas orgânicas. Por fim, para compreender o processo na prática, é apresentado o projeto Praça Infantil Iguatemi, um projeto extremamente criativo e lúdico, utilizando como referência escritos da própria paisagista de suas intenções objetivas e subjetivas em cada detalhe do projeto.

1 Uma trajetória inspirada pelo campo Maria Isabel de Campos Duprat nasceu em 1954, na cidade de São Paulo, onde tem vivido até os dias de hoje. Apesar do campo sempre ter feito parte da sua vida, foram os três anos de sua infância em que viveu no interior do estado, em uma cidade chamada Araras, que foram determinantes para sua trajetória como paisagista. Devido ao desejo de seu pai de experimentar um estilo de vida bucólico, ela e seus seis irmãos viveram esse período de suas infâncias em contato direto com a natureza. Segundo Isabel, sua mãe estimulou “a intimidade e o prazer de semear, plantar e ver crescer, sobretudo árvores.” (DUPRAT, 2020).

Seu caminho em direção ao paisagismo ocorreu de forma natural. Quando criança, desejava ser botânica, e na adolescência, descoberto seu gosto pela arquitetura, não houveram crises e incertezas de qual carreira seguir. Em 1978, formou-se pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Mackenzie com dois diferenciais: seu estágio com Roberto Burle Marx, com o qual conviveu e desfrutou de seu conhecimento, e suas participações em expedições em busca de novas espécies vegetais, promovidas pela botânica Nanuza de Menezes e seu grupo de pesquisa da USP. Assim, logo que formada, Isabel Duprat ingressou no Departamento de Parques e Áreas Verdes da Cidade de São Paulo, no qual permaneceu por seis anos. Nesse período, participou da criação de um curso municipal de jardineiros para preparação de mão de obra especializada, e junto ao time de arquitetos, participou de projetos de inúmeras praças e parques para a cidade.

Em 1983, criou seu próprio escritório de projetos e execuções de jardins, juntamente com uma loja de plantas, em uma chácara localizada em um bairro central da cidade, a qual lhe fora dada por um jardineiro português chamado Fernando Silva, com quem aprendeu “sobre plantas e como, humildemente, sempre temos o que aprender com elas.” (DUPRAT, 2020). E nessa chácara permaneceu durante 25 anos, fazendo arranjos de flores e vendendo vasos de plantas.

Com o passar do tempo, segundo a própria paisagista, a loja e a chácara desapareceram com a volúpia da cidade, contribuindo com o amadurecimento de seu escritório, o qual acabou mudando de localização. O novo local, na Alameda

Ministro Rocha de Azevedo, perpendicular à Avenida Paulista, agora se encontra em uma das regiões mais movimentadas e representativas da vida urbana na grande cidade de São Paulo.

Em 2002, seu marido Manoel Dubeux Leão, músico e engenheiro agrícola, juntou-se a ela na coordenação dos trabalhos de execução dos jardins projetados.

Figura 1: Manoel Leão, à esquerda, e Isabel Duprat, à direita.

Fonte: https://www.isabelduprat2.com/

2 O processo criativo guiado pela liberdade Segundo a paisagista, o objetivo final de seus projetos é criar ambientes que promovam o bem-estar às pessoas que o desfrutam em seu cotidiano, por meio de uma relação respeitosa com a natureza. A integração do entorno do projeto de arquitetura com a paisagem natural é a função primordial do paisagista, o qual deve compreender a relação afetiva com o espaço externo.

A liberdade criativa é fundamental e se dá de forma diferente para cada projeto seu, resultado de uma percepção de que criar jardins é uma maneira de fazer arte.

Fazendo uma análise geral de suas obras, é possível definir sua maneira de desenvolvê-los, considerando os aspectos morfológicos dos elementos construídos e a exploração da vegetação na composição dos espaços.

2.1 Topografia Para além da criação de sua maneira de traçar os caminhos percorridos, Isabel Duprat utiliza do manejo da topografia para criar diferentes perspectivas ao

longo do percurso em seus projetos. É possível observar isso mais evidentemente em algumas obras, como: na Casa Formas da Terra (Figura 2) e no Jardim Casa da Vista (Figura 3).

Figura 2: Casa Formas da Terra

Figura 3: Jardim Casa da Vista

Fonte: https://www.isabelduprat2.com/

Fonte: https://www.isabelduprat2.com/

Na Casa Formas da Terra, localizada no Rio de Janeiro, a topografia foi pensada de forma a permitir o desfruto da visão do pôr do sol à frente. A variação da posição do sol, incidindo nas diferentes horas do dia nos patamares, cria diferentes recortes de luz e sombra, alterando a percepção do desenho das curvas.

Já no Jardim Casa da Vista, na Bahia, a localização no topo da falésia proporciona a percepção de um horizonte infinito com vista para o mar. Antes da intervenção, a pequena inclinação era visualmente desconfortável em direção à borda. Portanto, para estruturar o terreno, Isabel desenhou suaves curvas de nível, deixando a casa mais à vontade.

2.2 Ambientação, texturas e cores O uso ilimitado da criatividade proporciona a criação de diferentes ambientes, onde cada um se difere pela escolha das texturas, geradas por meio das variadas vegetações e paginação de piso. Um bom exemplo disso é o Jardim da Casa Asa. Aproveitando-se da grande escala do terreno e a variedade de ambiências, como por exemplo, áreas de bosque e sub-bosques, áreas de sol e sombra, abertas e fechadas, foram aplicadas diferentes texturas, e assim, criou-se variados

ambientes. Para vegetação, foram utilizadas espécies arbóreas, arbustivas, folhagens e forrações, escolhendo espécies de diferentes cores e formas (Figura 4).

Para paginação de piso, paralelepípedo, pedras, deck de madeira e espelho d’água.

Figura 4: Mapeamento da variedade de espécies na área da piscina

Fonte: https://www.isabelduprat2.com/

2.3 Formas orgânicas Provavelmente herança de um dos seus mentores, Burle Marx, muitos dos projetos de Isabel Duprat apresentam um desenho de piso orgânico. Dois exemplos são o Jardim da Casa na Areia (Figura 5) e o Bankboston SP (Figura 6).

Figura 5: Jardim da Casa na Areia.

Figura 6: Bankboston SP, croqui por Isabel.

No Jardim da Casa na Areia, localizado na Bahia, o trajeto repleto de meandros tem como função provocar a curiosidade em decifrar vagarosamente o caminho e “surpreender com o destino final em um jardim inteiramente descortinado, que se percebe por inteiro, como que um preparo para receber o mar aberto” (DUPRAT, 2020). Já no Bankboston SP, as formas sinuosas tem o “propósito de conduzir o interesse estético e o uso dos jardins, criando aberturas e fechamentos onde convivem o desejado e o imprevisto” (DUPRAT, 2020).

3 Um projeto lúdico 3.1 Ficha técnica ● Nome: Praça Infantil Iguatemi ● Localização: São Paulo - SP ● Área: 900 m² ● Ano: 2012 ● Responsáveis: Isabel Duprat e Studio MK27 3.2 Partido O projeto da Praça Infantil Iguatemi, localizada em meio a uma área residencial, deveria ser um espaço lúdico para as crianças explorarem livremente, partindo da ideia de “um grande espaço central circular aberto, em volta do qual muitas atividades aconteceriam em eixos radiais” (DUPRAT, 2015). Para tal, Isabel Duprat fez uso da vegetação de uma forma lúdica estimulando a percepção e a relação com a natureza pelas crianças.

Este jardim é uma homenagem à infância. Do resgate das boas lembranças, da turma de amigas e das brincadeiras solitárias também, das descobertas das maravilhas de Alice, dos sonhos com os vôos de Mary Poppins, das aventuras nas explorações da nossa floresta encantada e do esconderijo na casa da árvore, na busca pela pedra mais preciosa para cada um, e de toda fantasia que nos mantém com a curiosidade dos primeiros anos. (DUPRAT, 2015)

Para dar início ao projeto, a área foi dividida em quadrantes, criando quatro diferentes ambientes interligados a serem explorados (Figura 7). Cada ambiente

possui um tema definido em função da insolação no terreno, selecionando para os respectivos quadrantes os grupos de vegetação conforme maior ou menor necessidade de sol.

3.3 Quadrante 1 - “Descobrindo a Floresta” O objetivo deste quadrante é instigar a curiosidade, levando as crianças a entrarem e desfrutarem do jardim. Aproveitando as árvores existentes no terreno, a vegetação de meia sombra com diferentes desenhos e cores se espalham pela área, onde flores se parecem com bichos e aves, prevalecendo as cores laranja, vermelho e rosa. No chão deste ambiente semelhante a um bosque, pegadas seriam reveladas, estimulando a criança a ir em busca de sua origem. Tais pegadas seriam identificadas em um painel, aparecendo ao lado de fósseis de folhas tropicais.

Figura 7: Planta do quadrante 1.

Figura 8: Modelo 3D do quadrante 1.

3.4 Quadrante 2 - “Casa da árvore” Continuando o caminho, ao seguir as pegadas, a criança é levada para um ambiente novo, rodeado de capins coloridos, morangos silvestres, flores miúdas, cana de açúcar, jabuticabeira, e como principais atrações, um pequeno teatro e uma rede de escalada.

Figura 9: Planta do quadrante 2.

Figura 10: Modelo 3D do quadrante 2.

3.5 Quadrante 3 - “O labirinto” Para criar um labirinto em tamanho real, foi proposto o uso de um arbusto chamado Murta, o qual permite a criação de diferentes caminhos a se seguir. O chão é forrado de pedras brasileiras incrustadas, como ametistas, topázios e turmalinas, sugerindo que elas seriam a representação do tesouro guardado pelo labirinto, a fim de serem descobertas e conhecidas. Ao lado, um mapa do Brasil que destaca São Paulo mostra seu desenho dizendo ”Estamos aqui”. Por fim, uma horta de ervas proporciona uma experiência de sabores e cheiros.

Figura 11: Planta do quadrante 3.

Figura 12: Modelo 3D do quadrante 3.

3.6 Quadrante 4 - “Alagados” Em um espaço totalmente alagado, permite o uso de diversas espécies de plantas aquáticas, criando um lago artificial, onde o fundo é forrado de pedras

coloridas, as mesmas do tesouro do labirinto, e sua travessia é feita por um caminho de pedras.

Figura 13: Planta do quadrante 4.

Figura 14: Modelo 3D do quadrante 4.

Considerações Finais Dado a análise da vida e processo criativo da paisagista Isabel Duprat e a descrição do projeto Praça Infantil Iguatemi, é possível fazer algumas relações.

Primeiramente, é notável o uso de diferentes texturas e cores, o que é essencial para a diferenciação de cada quadrante. Ela faz uso de diferentes espécies vegetais, de pedras, água, etc, criando ambientes e percepções únicas. Quanto ao uso de traçados orgânicos, essa característica se apresenta nos caminhos criados, principalmente nos quadrantes um e dois, a fim de promover a curiosidade e promover o uso do espaço.

Também é interessante notar o quanto o contato com a natureza na sua infância se mostrou presente nesse projeto, evidenciada pela sensibilidade em proporcionar uma interação das crianças com a natureza, assim como ela teve quando criança.

Referências

PEREIRA, Matheus. Arquitetura da paisagem: conheça o trabalho de 17 paisagistas brasileiros contemporâneos, 2020. Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/900702/16-paisagistas-brasileiros-contemporaneos? ad_source=search&ad_medium=projects_tab&ad_source=search&ad_medium=sear ch_result_al. Acesso em: 26 de mar. 2022

Glamurama. Muito verde nas dicas de paisagismo de Isabel Duprat, 2015.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=nR1hJbIZx2UAcesso em: 26 de mar. 2022

DESCONHECIDO. Praça Infantil Iguatemi / StudioMK27 - Marcio Kogan + Eduardo Gurian + Marcio Tanaka. Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/624244/praca-infantil-iguatemi-studiomk27-marcio-o gan-mais-eduardo-gurian-mais-marcio-tanaka. Acesso em: 26 de mar. 2022

DESCONHECIDO. Paisagista Isabel Duprat leva vida para casa de Carolina Ferraz, 2011. Disponível em: https://gnt.globo.com/programas/casa-brasileira/noticia/paisagista-isabel-duprat-leva -vida-para-casa-de-carolina-ferraz.ghtml. Acesso em: 26 de mar. 2022

ISABEL DUPRAT. Disponível em: https://www.isabelduprat2.com/. Acesso em: 26 de mar. 2022