"História de uma instituição centenária e de sua primeira década de transformação em universidade"

Page 17

Apesar delas, o contexto histórico, em seus diversos aspectos (econômico, social, político e mental), favoreceu a criação de instituições de ensino superior, inclusive as de iniciativa privada, no país a partir do início da Era Republicana (1889). Faltava, para que tal criação fosse empreendida, indivíduos sintonizados com as inovações de seu tempo, atentos às oportunidades criadas pela conjuntura histórica, compromissados com ideais progressistas e motivados para superar desafios que empreendimentos complexos exigem. Eis a importância da ação do indivíduo na história, a qual não se move sozinha. São os indivíduos que, em sua vida diária, consciente ou inconscientemente, movimentam-na. Suas estruturas, por mais rígidas que sejam, apresentam brechas, momentos raros, mas bastante oportunos para que ocorram reorientações e novos rumos sejam tomados.7 João Leão de Faria foi um desses indivíduos perspicazes, atentos aos movimentos da história e às oportunidades que eles oferecem. Ele era um indivíduo devotado à educação. Em 1913, havia fundado o Colégio São José em Alfenas (o qual dirigiu por três anos) um ano antes de criar a EFOA. 8 Para criá-la, conquistou e articulou uma rede de apoiadores que foi decisiva para a concretização de novo projeto educacional. Os membros dessa rede foram atraídos da parcela esclarecida das elites locais. Sabe-se que as classes dominantes nunca são homogêneas e que, no meio urbano, a sua composição é mais variada. Por essa razão, mesmo que os seus setores mais retrógados fossem contrários à expansão da educação, havia entre seus quadros mentes progressistas e capazes de apoiar iniciativas positivas para expandi-la. Por falta de documentação mais específica, dificilmente será possível saber como foram os embates em torno da proposta de criação da EFOA. Com o material documental disponível até o momento, pode-se imaginar que a Escola surgiu de um consenso político de variados setores da sociedade local. A lista de participantes na ata de inauguração da instituição é um indicador disso. Além dos membros que compuseram a sua primeira congregação (os quais integraram o que poderia ser definida como a comissão científica de implantação do Curso de Farmácia, os médicos Amador de Almeida Magalhães e Donato Melo e os farmacêuticos Gabriel de Moura Leite, Nicolau Coutinho, José da Silveira Barroso e Afonso Ladislau da Gama), também estiveram presentes as seguintes pessoas: o Juiz de Direito da Comarca de Alfenas, Augusto de Albuquerque Cabral Vasconcelos, que presidiu a sessão solene; o Vigário da Paróquia de São José e Dores, Cônego Lauro de Castro; o advogado José Maria Leite; o presidente da Câmara e agente executivo municipal, Cel. José Bento Xavier de Toledo; o senador Estadual Gaspar Lopes; e o delegado de polícia Francisco Pereira da Silva.9 7

Essa questão (a ação do indivíduo na história) é muito discutida no meio acadêmico. Entre outros grandes expoentes do pensamento ocidental, o historiador Jules Michelet e o filósofo Hegel (aos quais se atribuem grande parte da canonização da forma de pensar e praticar a historiografia ao longo do século XX) consideram que, por mais extraordinário que seja um ato, ele é a expressão de uma coletividade, de uma época e de um mundo. Assim, somente pode ser compreendido em sua profundidade ser for observado como resultado das múltiplas conexões que os diversos ritmos temporais produzem, criando as possibilidades de ação. A esse respeito ver, por exemplo, Reis (2011). 8 Em 1933, também fundou uma Escola de Direito em Alfenas, a qual acabou sendo fechada em 1939, quando, por razões de divergências políticas com os grupos que ascenderam ao poder com a Revolução de 1930, teve que se afastar da instituição, o que a enfraqueceu em um momento em que ainda buscava se consolidar. Foram essas mesmas razões que o afastaram da Direção da EFOA em 1933 e, posteriormente, do próprio corpo docente da instituição em 1939. 9 Livro de Atas da Congregação, n. 1, 03/04/1914, Secretaria Geral da UNIFAL-MG, p. 1-2.

FORMAÇÃO HISTÓRICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS

15


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.