Proposta Paisagística para Um Jardim Residencial em Clima Semiárido no Sertão da Paraíba

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PROPOSTA PAISAGÍSTICA PARA UM JARDIM RESIDENCIAL EM CLIMA SEMIÁRIDO NO SERTÃO DA PARAÍBA Alexandre Augusto Bezerra da Cunha Castro Danniely Alves Benício Larissa Maria Nóbrega Santos Inácia de Fátima Morais Fernandes Ramos RESUMO Este trabalho foi desenvolvido a caráter de estudo que tem como proposta a elaboração de um projeto paisagístico de microescala, que atende as condições bioclimáticas do clima semiárido. Sua finalidade é agregar valor à edificação e também trazer qualidade de vida, privacidade, valorização, comodidade, lazer e relaxamento àqueles que habitam. Além do papel de recuperação da área transformada pela obra, o paisagismo pode acrescentar e explorar as possibilidades que o uso do espaço oferece, acrescentando valores estéticos com variações de cores que podem ser encontradas nas espécies vegetais. A pesquisa do uso de espécies nativas do semiárido, que se adequam ao clima, além de não requerer muitos cuidados, as mesmas embelezam o ambiente trazendo sofisticação e bemestar. A região vem sendo castigada pela falta e escassez de água e altas temperaturas, devido ao baixo índice pluviométrico, e mesmo assim ainda possui uma grande diversidade de plantas nativas da região, sendo que o semiárido é uma das mais ricas em espécies resistentes a falta de água. As famílias utilizadas foram: Cactaceae, Asteraceae, Agavaceae, Arecaceae, Bignoneaceae e Poaceae. Respeitando a funcionalidade que cada espécie tem no jardim, de acordo com a localização (fachada) em que se encontra, bem como respeitando os tipos de lazer (ativo e passivo), foram escolhidas 11 espécies vegetais. O perfil do cliente consiste em outro passo fundamental na escolha correta das espécies. Palavras-chave: paisagismo, semiárido, espécies nativas.

INTRODUÇÃO O projeto paisagístico tem como função integrar o homem ao meio ambiente, valorizar a edificação e trazer qualidade de vida, privacidade, conforto, comodidade, lazer e relaxamento àqueles que habitam. Além disso, o jardim ordena o espaço livre do lote, transformando o ambiente em um local agradável, relaxante e com a sensação de proximidade à natureza. Uma característica importante do paisagismo é a simplicidade e o melhor uso dos recursos naturais, que resultem num projeto de qualidade e de baixo custo, somando-se a isso um atendimento rápido e eficaz, com inovações e focado nas necessidades dos seus clientes. É por isso que deve ser dada máxima atenção ao projeto de paisagismo. Além do papel de recuperação da área transformada pela obra, o paisagismo pode acrescentar e explorar as possibilidades que o uso do espaço oferece. As espécies vegetais podem ser usadas em conjunto com os materiais de construção, em harmonia e solidariedade (FAISAL, 2015). No que diz respeito à vegetação, as plantas nativas constituem um importante patrimônio cultural e econômico para as populações locais. O melhor conhecimento 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 1


dessas plantas, sobretudo pela população jovem, cria um elo entre as gerações, valorizando-se assim as raízes culturais e assegurando a continuidade do saber local. Além disso, este conhecimento leva à apreciação, e esta, ao uso racional, que, por sua vez, reduzirá a crescente ameaça à biodiversidade (NASCIMENTO; OLIVEIRA, 2005). Com base no que foi exposto, este trabalho foi desenvolvido a caráter de estudo no quarto período (semestre 2016.1), na disciplina de Projeto de Paisagismo I, do Curso de Arquitetura e Urbanismo das Faculdades Integradas de Patos-PB, com o objetivo de elaborar um projeto paisagístico de microescala, que atendesse as condições bioclimáticas do semiárido. A partir da área externa disposta do lote, houve o início da proposta paisagística, com o estabelecimento de finalidade comercial e particular, necessidades quanto à proposta arquitetônica, escolha e distribuição das espécies que se adaptam às condições do clima quente e seco, a realização do grafismo (desenho semelhante à vista superior da espécie), maquete eletrônica e imagens tridimensionais, detalhamentos de projeto paisagístico e o memorial descritivo (apresenta as características e dados técnicos necessários para o entendimento da proposta paisagística). METODOLOGIA O trabalho foi realizado de acordo com o método de concepção projetual utilizado na disciplina de Paisagismo I (quadro 1), sendo dividido em três etapas: análise do terreno, onde foram coletadas as informações do local do projeto e dos clientes; referências e croquis, onde foram pesquisados projetos correlatos que embasassem as decisões projetuais e o desenvolvimento dos primeiros croquis; e a elaboração do projeto paisagístico, seguindo algumas das etapas descritas por Abbud (2008).

ETAPA 01

Quadro 1 – Etapas do projeto paisagístico. ANÁLISE DO TERRENO

ETAPA 03

ETAPA 02

REFERÊNCIAS

PRIMEIROS CROQUIS

PROJETO PAISAGÍSTICO

DIMENSÕES PERFIL DO CLIENTE TOPOGRAFIA VEGETAÇÃO EXISTENTE PROJETOS CORRELATOS CRIAÇÃO DE CENÁRIOS INTERFACE CASAJARDIM PLANO DE MASSAS PARTIDO SETORIZAÇÃO MEMORIAL BOTÂNICO EQUIPAMENTOS

Fonte: Elaboração Própria. 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 2


Procedimentos O terreno em que foi feito o projeto paisagístico é hipotético, com área de 641,16 metros quadrados. Os muros do terreno são esconsos, formando um losango, onde a frente do lote mede 23,40 metros, os fundos 18,00 metros, a lateral direta 20,10 metros e a lateral esquerda 27,40 metros (figura 1). Figura 1 – Planta Terreno do projeto paisagístico (escala não indicada)

N

Fonte: Acervo Pessoal.

No que diz respeito ao relevo, o terreno apresenta declive de 6 metros, sendo a parte mais baixa nos fundos do lote. O desnível não é uniforme no terreno: a porção noroeste dele é onde se encontra o ponto mais baixo. A fachada frontal encontra-se no mesmo nível da rua (figura 2). Figura 2 – Perspectiva do Terreno do projeto paisagístico

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Fonte: Acervo Pessoal.

Com relação às espécies vegetais existentes, o lote possui 3 árvores da espécie Ipê Roxo (Handroanthus impetiginosus), sendo uma delas na entrada do terreno. O projeto paisagístico foi planejado para uma residência unifamiliar, desenvolvida para o clima semiárido, e tinha como cliente uma família composta por um advogado, uma artista plástica e dois filhos. PROJETOS CORRELATOS Foram pesquisados projetos correlatos como forma de procurar referências que utilizassem espécies vegetais e soluções paisagísticas adequadas ao clima semiárido, e que servissem de inspiração para a concepção projetual aqui proposta. Através de pesquisa bibliográfica, constatou-se que há poucos projetos paisagísticos que utilizem espécies vegetais nativas do clima semiárido, muitos deles sendo apresentados em sítios eletrônicos de forma incompleta. Assim, o repertório projetual foi reduzido, e focou-se no potencial das espécies como diretriz para a elaboração do projeto do jardim. O projeto correlato utilizado como referência foi o Jardim dos Sertões, do Arquiteto Marcelo Faisal, projetado no ano de 2015, o qual utilizou em seu projeto várias plantas típicas da região e trouxe para ele beleza, sofisticação e também baixos custos. Teve como objetivo o bem-estar e o conforto do cliente, onde as necessidades e o conforto do mesmo foram primados. O projeto paisagístico agregou um grande valor estético para a edificação. O projeto Jardim dos Sertões foi elaborado em Alto dos Pinheiros, São PauloSP, de autoria do arquiteto Marcelo Faisal, exposto na 29ª edição da Mostra Casa Cor São Paulo. O local apresenta um espaço de 710 m², e o projeto paisagístico apresenta características de simplicidade e, ao mesmo tempo, sofisticação, com a utilização de soluções ditas sustentáveis, a exemplo do uso de madeiras, pedras e espécies vegetais que necessitam de pouca água e baixo custo, devido à utilização de materiais reutilizáveis. Com relação às espécies utilizadas, o projeto apresenta tipos vegetais diversificados: árvores, palmeiras, arbustos, cactáceas e forrações (figura 3). Segundo Faisal, a ideia de utilizar espécies nativas do semiárido surgiu a partir da 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 4


crise hídrica de 2015, então adotou uma solução que utilizasse plantas que pudessem ficar entre 15 e 30 dias sem serem regadas. Com esta baixa necessidade hídrica, o projeto pode depender exclusivamente do regime pluvial, havendo apenas a necessidade de podas no gramado, em períodos de até 60 dias.

Figura 3 – Jardim do sertão

Fonte: Revista Decorar.

Outro croqui foi elaborado, como mostra a figura 4. Optou-se por um desenho mais simples, cujos maciços vegetais fariam a composição paisagística juntamente com os elementos arquitetônicos. Pelas dimensões do terreno, foi possível o aproveitamento de quatro setores do lote para a composição do jardim, que foram divididos de acordo com a fachada em que se localizam. Figura 4 – Croqui do projeto paisagístico residencial

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Fonte: Acervo pessoal.

O projeto paisagístico necessita integrar-se com o projeto arquitetônico. Assim, os croquis iniciais mostram a planta baixa da edificação, com o programa de necessidades que o cliente requer: Escritório/Adega, Sala de Estar, Atelier, Dependência de empregada, Cozinha, Wc Social, Área de Serviço, Suítes e Área de Lazer (figura 5). Dessa forma, viu-se o potencial de utilizar todo o entorno da edificação para a proposição do jardim. Os croquis são peças fundamentais no processo de produção de um projeto, pois através deles são transmitidas, por meio da arte, a essência e a funcionalidade que o espaço irá proporcionar para os clientes. Figura 5 – Croqui das interfaces jardim-residência

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Fonte: Acervo pessoal.

Os fatores ambientais são componentes indispensáveis que se deve levar em conta na escolha das espécies e um dos fatores essenciais é a água, parte integrante do seu crescimento e desenvolvimento (CARNEIRO, 2004). Atualmente, muitas são as informações sobre a degradação da Caatinga, mas pouco se sabe sobre o aproveitamento econômico da biodiversidade existente nessa vegetação e as espécies que poderiam ter valor no mercado (ALVAREZ; KILL, 2014). A vegetação da Caatinga é algo singular, não é encontrada em nenhum outro lugar mundo, a não ser no Brasil (CASTRO; CAVALCANTE, 2011). O projeto do jardim foi distribuído pelas quatro fachadas da edificação, formando assim quatro ambientes distintos no jardim, com funções distintas: lazer ativo, descanso, estética e circulação (figura 6). Figura 6 – Vista Superior do projeto paisagístico

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Fonte: Elaboração Própria.

No anteprojeto paisagístico foi elaborado o memorial botânico. O memorial consiste em uma tabela que traz todas as informações das espécies vegetais que serão utilizadas no jardim, de acordo com a proposta. São informações básicas, como: nome científico, nome popular, família, diâmetros, porte, tipo vegetal, quantidade e localização da espécie no jardim. A maioria das espécies são nativas, como mostra o quadro 1. Quadro 1 – Memorial botânico com as espécies indicadas para o jardim proposto NOME CIENTÍFICO

NOME POPULAR

FAMILÍA

DIÂMETRO

LOCAL

PORTE

TIPO VEGETAL

QUANTIDADE

SEREUS REPANDUS

CACTO DO PERU

CACTACEAE

2M

FACHADAS NORTE E LESTE

2,4 A 3,0M

ARBUSTOS

4

SENECIO CONFUSUS

TREPADEIRA MEXICANA

ASTERACEAE

DE 6 A 10CM

FACHADA OESTE

ATÉ 4,7M

TREPADEIRA

5

MELOCACTUS ZEHNTNERI

COROA DE FRADE

CACTACEAE

0,25CM

FACHADAS NORTE E LESTE

0,15CM

HERBÁCEA

5

ECHINOCACTUS GRUSONII

CADEIRA DE SOGRA

CACTACEAE

ATÉ 60CM

FACHADA LESTE

0,6 a 0,9CM

HERBÁCEA

3

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NOME CIENTÍFICO

NOME POPULAR

FAMILÍA

DIÂMETRO

LOCAL

PORTE

TIPO VEGETAL

QUANTIDADE

AGAVE ANGUSTUFOLIA

AGAVE

AGAVACEAE

ATÉ 1,3M

FACHADAS NORTE E SUL

2M

HERBÁCEA

6

FEROCACTUS GLAUCESCENS

CACTO BOLA

CACTACEAE

0,25CM

FACHADAS NORTE E SUL

ATÉ 0,40CM

SUCULENTA

11

HANDROANTHUS IMPETIGINOSUS MATTOS

IPÊ ROXO

BIGNONIACEAE

ATÉ 0,90CM

FACHADAS OESTE E LESTE

ENTRE 20 A 35M

ÁRVORE

4

ZOYSIA JAPÔNICA

GRAMA ESMERALDA

POACEAE

0,6M

FACHADAS NORTE E SUL, LESTE E OESTE

0,3CM

GRAMA

160M²

BUXUS SEMPERIVENS

BUXINHO

BUXACEAE

ATÉ 1,5M

FACHADAS NORTE E SUL, LESTE E OESTE

1,6 A 2,4M

ARBUSTOS

64

COOPERNICIA PRUNIFERA

CARNAUBEIRA

ARECACEAE

ATÉ 15M

FACHADAS LESTE E SUL

10 a 20CM

PALMEIRAS

4

Fonte: Arquivo pessoal.

Na fachada frontal (Sul), encontra-se a entrada principal, onde o cliente tem sua entrada privada. Para delimitar caminhos, foi utilizado o buxinho, também para delimitar uma área mais privada na parte direita, ao redor de um dos ipês roxos. A ascensão da entrada está sendo representada pela cor fria, vista no ipê roxo (figura 7). Figura 7 – Fachada Sul

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Fonte: Elaboração Própria.

Na fachada Leste tem-se uma entrada social, onde o cliente pode direcionar as visitas por esse acesso. Nesse acesso, foi utilizado a espécie Copernicia Prunífera (Carnaubeira), como forma de verticalidade e ascensão. Os buxinhos foram utilizados como cerca viva (figura 8). Figura 8 – Fachada Leste

Fonte: Arquivo pessoal

Na fachada Oeste, encontra-se outro acesso para área de lazer. Uma proposta inovadora foi utilizada nessa fachada, o uso de jardim vertical, que trará beleza e amenização climática, já que essa fachada é a que mais necessita da funcionalidade de conforto térmico que as espécies vegetais podem desenvolver (figura 9). Figura 9 – Fachada Oeste

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Fonte: Arquivo pessoal.

Na fachada Norte, encontra-se a área de lazer da casa, que o cliente pode utilizar como lugar de descanso e lazer. Encontramos diversas espécies nativas da região, Cactos, Agaves e Carnaubeiras. Encontra-se também um caramanchão e uma piscina. Nesse espaço temos tanto lazer ativo como lazer passivo (figura 10). Figura 10 – Fachada Norte

. Fonte: Arquivo pessoal.

CONSIDERACÕES FINAIS Neste trabalho observou-se a importância do paisagismo na edificação. A relação homem e meio ambiente precisa ser resgatada e o paisagismo traz, na sua funcionalidade, o espírito de dinamismo e aconchego, proporcionado pelas espécies vegetais. A importância de resgatar e conservar a biodiversidade da região é de suma importância, utilizando assim espécies nativas nas propostas, quer de projetos 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 11


de residências (microescala), ou até projetos em espaços públicos. Portanto, os usos de espécies nativas são essenciais, pois se adequam ao clima, além de não requerer muitos cuidados, as mesmas embelezam o ambiente trazendo sofisticação e bem-estar aos usuários.

REFERÊNCIAS ALVAREZ, I. A; KILL, L. H. P. Arborização, Floricultura e Paisagismo com plantas da Caatinga. Informativo Abrates, vol.24, nº 3, 2014. CASTRO, A. S; CAVALCANTE, A. Flores da Caatinga. Campina Grande: Instituto Nacional do Semiárido, 2010, 116p. CURY,M.F. Jardim do Sertão. AUE Paisagismo Digital, 2015. Disponivel em: <www.paisagismodigital.com/noticias/defaut.aspx?codnot=415>. Acesso em: 27 de abril de 2016. CARNEIRO, M. I. Roteiro para Paisagismo no Semiárido Nordestino. Campina Grande, 2004. Disponível em: <www.hidro.ufcg.edu.br>

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