Prazeres Maltidos

Page 227

—O que está planejando? — perguntou-me. Os demônios grunhiam à nossa volta. Estavam quase chegando. — Vou colocar fogo no galpão. Encharquei a porta de gasolina. O cheiro era forte, e me deixou com um nó no fundo da garganta. —Conosco aqui dentro? — perguntou ele. —É. —Prefiro um tiro na cabeça, se para você não fizer diferença. —Não está nos meus planos morrer esta noite, Edward. Uma garra arrebentou a porta e entrou no galpão, estraçalhando a madeira. Acendi um fósforo e o atirei na porta ensopada de gasolina. O fogo subiu, ruidoso, com uma chama azul e branca. O demônio soltou um urro, coberto pelo fogo, cambaleando para trás, afastando-se da porta em chamas. O fedor de carne queimada misturava-se com o da gasolina. Cabelos queimados. Tossi, cobrindo a boca com a mão. O fogo lambia a madeira do galpão, espalhando-se até o teto. Não precisaríamos de mais gasolina. O maldito lugar era uma armadilha incendiária. Conosco lá dentro. Não tinha imaginado que se espalharia com tamanha rapidez. Edward estava de pé, próximo à parede dos fundos, cobrindo a boca com a mão. Sua voz saiu abafada. — Tinha um plano de verdade para nos tirar daqui, certo? Uma mão entrou, estraçalhando a madeira e tentando agarrá-lo. Ele recuou, afastando-se dela. A criatura começou a arrancar as madeiras, até que conseguiu nos ver. Edward disparou-lhe um tiro bem no meio dos olhos, e o demônio desapareceu de vista. Peguei um ancinho que estava na parede oposta. Cinzas começavam a cair por cima de nós dois. Se a fumaça não nos pegasse primeiro, o galpão desabaria em nossas cabeças. — Tire a camisa — pedi. Ele nem sequer pediu um motivo. Prático até o fim. Despiu-se do coldre, puxou a blusa pela cabeça, atirou-a em minha direção e vestiu a arma sobre o peito nu. Enrolei a blusa dele nos dentes do ancinho e a ensopei de gasolina. Aproveitei o fogo das paredes para incendiá-la. Sem necessidade de fósforos. Da frente do galpão, chovia fogo sobre nós. Pequeninas pontadas ardentes, como vespas, em minha pele. Edward entrou na onda. Encontrou um machado e começou a golpeá-lo contra o buraco que o demônio havia feito. Em minhas mãos, a tocha improvisada e uma lata de gasolina. Passou-me pela cabeça que o calor poderia fazer aquela gasolina explodir. Não iríamos sufocar com a fumaça. Iríamos explodir. — Depressa! — disse eu. Edward espremeu-se pela abertura, e eu o acompanhei, quase queimando-o com a tocha. Os demônios já haviam desaparecido. Eram mais inteligentes do que aparentavam. Nós corremos, e a explosão atingiu-me às costas como um vento fortíssimo. Eu caí, aos tropeções pelo gramado, e todo o fôlego me foi arrancado. Pedaços de madeira em brasa caíam, fazendo estardalhaço pelo chão, dos meus dois lados. Cobri a cabeça e rezei. Do jeito que é a minha sorte, acabaria sendo atingida por um prego voador.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.