Caderno C
MANAUS, SEGUNDA-FEIRA, 29 DE DEZEMBRO DE 2014
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O filho mais famoso de
Manacapuru
Jogador não esquece as raízes e, sempre que pode, visita a família e amigos na cidade de Manacapuru
THIAGO BOTELHO Equipe EM TEMPO
A
equipe de reportagem chega a Manacapuru e pergunta a um mototaxista: “Onde fica a rua Ezanor Athayde, na Terra Preta?”. A resposta é: vocês vieram entrevistar o Marcelinho? Ele é nosso orgulho, é só virar à direita e você vai ver uma casa bonita”, diz o solicito morador. Marcelinho, 30, é meio-campista do Ludogorets, da Bulgária. Recentemente, disputou a fase de grupos da Uefa Champions League e fez o primeiro gol da história do time búlgaro na principal competição de clubes da Europa. E não foi qualquer gol. Foi de cabeça e em cima do atual campeão de tudo, Real Madrid. A fama, a partir de então, foi inevitável. Realmente a casa é muito bonita. Fruto daquilo que o futebol tem dado a toda família Da Costa. A vida, nem sempre foi tão generosa assim, mas quis o destino que a milhas e milhas de distância do Amazonas, o manacapuruense pudesse fazer do esporte um instrumento de transformação financeira dos parentes. N a sala, o vídeo do momento mais importante d a vida profissional de Marcelinho passa a todo momento. Seu Agenor, pai do atleta, todo orgulhoso diz que o DNA fute-
bolístico é forte. “Eu sempre fui bom de pelada, meus filhos herdaram isso”, disse lembrando que Gustavo, seu filho mais novo, também é profissional e jogará o Campeonato Paulista de 2015 pelo Mogi Mirim. Do Brasil à Bulgária A história até chegar à Bulgária foi longa. Nasceu no campinho de várzea próximo à sua residência. Ali, com pouco mais de 10 anos, Marcelinho já se destaca, mas jamais poderia vislumbra o que aconteceria anos depois. A brincadeira virou coisa séria. O menino magro e de boa altura foi para as categorias de base do Princesa do Solimões. De lá, migrou para o Rio Negro em Manaus. Nesse momento conheceu alguém que mudaria sua vida. Mirandinha, ex-jogador do Corinthians e seleção brasileira e que à época treinava o Galo da Praça da Saudade. “Estava nos juniores e o Mirandinha foi quem me incentivou. Disse que eu tinha futuro e me deu algumas chances no time profissional”, lembra. O contrato com o Rio Negro terminou em 31 de agosto de 2001. Logo depois foi para o São Paulo, fazer testes nos juniores. Assim que chegou na capital paulista recebeu a notícia da convocação para a seleção brasileira sub-20. “Eu joguei pela seleção Amazonense em um torneio do Paraná. Ali, eles escolheram dois atletas de cada time para fazerem parte da seleção sub-20. E eu foi um dos chamados”, falou. Nesse meio tempo, um problema de falsificação de documentos quase acabou com a carreira do atleta. Sem se firmar no São Paulo, Marcelinho começou
FOTOS: IONE MORENO
Marcelinho do Ludogorets, da Bulgária, tem convivido com a fama após fazer gol no Real Madrid na Champions League
uma peregrinação pelo sudeste brasileiro. Foram 10 times em cinco anos. Em nenhum, atuou por mais de 11 meses. Cascavel (PR), São Caetano, Mogi Mirim, uma breve passagem pelo Toluca (MEX) e no futebol do Kuat até chegar ao Bragantino. No time alvinegro de Bragança Paulista em um jogo contra o Santos, pelo Campeonato Paulista, marcou de cabeça o gol da vitória por 2 a 1. No outro lado tinha Neymar, Ganso e Cia. Portas abertas Após o gol no Santos, as portas se abriram. A visibilidade foi tão grande que houve uma enxurrada de propostas. Uma delas chamou a atenção. A do Ludogorets da Bulgária. “O time tinha acabado de subir da série B. O presidente é riquíssimo e prometeu formar um time para ser campeão. Eu gostei da ideia e da proposta. Não pensei duas vezes e fui. Cheguei no mês de junho que é verão, então não peguei o impacto do frio. Aos poucos fui me acostumando é hoje sou muito feliz na Bulgária”, disse. Já no primeiro ano, o Ludogort foi campeão búlgaro, da Copa da Bulgária e da Supercopa da Bulgária. Marcelinho foi destaque é titular na campanha. Em três anos e meio já foram sete canecos levantados. Além do inusitado prêmio de melhor jogador da final da Copa Búlgara. “O melhor jogador da final um ano antes ganhou um carro e eu apenas um troféu. Meus companheiros z o a m comigo por isso”, da gargalhadas eu relatar.
Uma quase sessão de fotos Marcelinho desce do carro e para na entrada da cidade de Manacupuru. A ideia é tirar fotos ao lado dos cirandeiros que enfeitam o portal de entrada da Princesinha do Solimões. Na mesma velocidade dos cliques da máquina da repórter Ione Moreno, são as buzinas e acenos ao ídolo.
“Fala Marcelinho, que bom te ver aqui, cara. Vamos bater uma pelada?”, grita o motorista de caminhão. Mais à frente, no campo de barro no bairro Terra Preta, quando a chuva começar a querer atrapalhar uma voz surge debaixo da marquise. “Veio da Bulgária trazer
a chuva, Marcelinho?”, indaga um morador. O carinho do povo tem assustado o jogador. “As pessoas me param e pedem para tirar foto. Até autógrafo eu estou dando aqui na cidade”, conta.
Marcelinho comemorando o gol mais importante da carreira, marcado sobre o Real Madrid
Rio Negro: uma história de mentiras Mais de 13 anos depois só existem mágoas de uma ferida que por muito pouco não levou a carreira do jogador à morte. Em 2001, o garoto de 17 anos, recém chegado ao São Paulo, é pego de surpresa com a informação de que não poderia assinar contrato com o Tri-
color. Motivo? Um contrato “assinado” de cinco anos com o Rio Negro. As aspas valem pelo fato da assinatura ter sido falsificada. “Foi muito feio para eles. Na hora eu sabia que era uma assinatura falsa e falei isso para o São Paulo, mas eles não podiam fazer
nada. Naquele momento eu pensei que minha carreira tinha acabado. Minha mãe entrou em depressão. Foi um momento muito difícil para nossa família, mas, graças a Deus, a justiça provou que a assinatura era falsa”, relatou. “Eu confesso que nem
gosto de falar sobre esse assunto. É algo superado. Acho que serei, em breve, sócio do Rio Negro. Eles tinham que me pagar o valor da ação em 10 vezes, mas só me pagaram a primeira parcela. Com o juros, quando me pagarem, eu fico sócio”, brincou.