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“Introdução à fotogravura”, capítulo 9

Figura 32 – Originais Imagem e letra. Notas do autor no verso da “Introdução à fotogravura”, capítulo 9.

Ainda dentro do material inédito, temos nove capítulos relativos à tipografia que totalizam 275 laudas datilografadas e comentadas, formando um conjunto equivalente a mais um volume de Imagem e letra. Possivelmente, eles seriam a espinha dorsal da Letra proposta no título. Ao estudar esse material, encontramos outra questão interessante: o bibliólogo apresenta uma classificação tipográfica nada usual para o campo de design. Os capítulos sobre tipografia podem divididos em três grupos: uma introdução, na qual encontramos a história da tipografia e seus principais conceitos, com 36 páginas; dois capítulos sobre a fundição de tipos, nos quais ele trata das fundidoras e das máquinas de composição a quente; e uma descrição, onde encontramos o detalhamento da anatomia dos tipos. Por fim, temos mais seis capítulos, em cinco dos quais o autor trata de classificação tipográfica e reserva o último para falar de composição, apresentando todo o equipamento utilizado e descrevendo os seus principais processos de produção para, depois, apresentar modelos de imposição de páginas e de montagem de cadernos. Nesse capítulo, temos um interessante parágrafo no qual Orlando da Costa Ferreira comenta os principais erros na composição tipográfica:

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os erros tipográficos mais notáveis são o pastel, quando os caracteres estão misturados e confundidos; a gralha, quando há alguma letra trocada, fora do lugar ou virada; o salto, quando o compositor omite parte do original, ou – já aqui mais propriamente um “defeito” de composição do que um erro tipográfico – o canal ou rua, quando a coincidência de claros vizinhos forma no impresso raias brancas de efeito

desagradável (INÉDITOS, CAP 23:20) (GRIFO DO AUTOR).

Acreditamos que esse capítulo iniciaria o encerramento da etapa de pré-impressão e serviria de ponto de ligação dos primeiros volumes com trechos posteriores. Em seguida, teríamos o capítulo “O prelo manual”, dedicado a provas de prelo e que definitivamente encerraria a pré-impressão e prepararia o caminho para as etapas de impressão e de pós-impressão, procurando habilitar o leitor ao objetivo final de Imagem e letra, e viabilizar a definição de uma classificação bibliográfica descritiva completa e voltada para a materialidade do produto gráfico.

Os cinco capítulos referentes à classificação começam pelo capítulo “Tipos classificação”. Com 22 páginas, ele apresenta um panorama histórico dos primeiros fundidores de tipo para, em seguida, criticar, em ordem cronológica, os principais modelos de classificação tipográfica utilizados na época. Dalmazo, Thibaudeau, Updike e Vox são citados e comentados demoradamente pelo autor. Ao fim desse capítulo, o bibliólogo conclui que,

de maneira mais ampla, conveniente à perspectiva bibliográfica, classificam-se preliminarmente os tipos segundo o seu emprego usual em textos para leitura corrente ou em títulos e impressos publicitários em geral. Visados, então, essas duas grandes faixas, os caracteres passam a ser considerados apenas quanto ao seu destino e é assim que são habitualmente distinguidos como “tipos de obra” e “tipos de fantasia” ou, em outras línguas, caracteres labeur e caractères de fantaisie, caratteri da opere e caratteri di fantasia, body type e display type, segundo a linguagem tradicional dos mestres-tipógrafos (INÉDITOS, FIG. 29: 16.17)

(GRIFO MEU).

Defendendo a proposta de uma classificação tipográfica a partir do uso, por atender melhor à perspectiva bibliográfica, Orlando da Costa Ferreira comenta que

como em outros tantos episódios da história da escrita [...], a terminologia alemã é sempre mais precisa (esquecendo-se o caso da norma DIN!) e, de acordo com ela, diríamos Werkschrift, Auszeichnungschrift e Zierschrift, ou seja, “tipos de obra”, “tipos de realce” e “tipos de ostensão”. Serão, pois, essas três grandes rubricas que encabeçarão os capítulos seguintes (INÉDITOS, FIG.29) (GRIFO DO AUTOR).

Orlando afirma que optou por esse caminho por entender que se adéqua melhor ao objetivo do livro. Em nenhum momento, desconsiderou as qualidades de outras classificações tipográficas, porém, durante o texto, deixa clara a existência de

inconsistências entre elas e comenta a complexidade de algumas e a necessidade de aprofundamento em anatomia tipográfica de outras. Entendemos que ele defende a classificação de tipos de obra, tipos de realce e tipos de ostensão, também porque ela seria próxima do vocabulário cotidiano. Classificar em tipos de obra (tipos de trabalho) para de texto e tipos de fantasia para fontes displays e demais categorias seria simples para o usuário comum. Isso, com certeza, ampliaria o campo de atuação da classificação, tornando-a acessível a um público maior, porém muito distante das questões técnicas da tipografia. Assim, o bibliólogo opta pela classificação em três categorias, incluindo tipos de realce e transformando os tipos de fantasia em tipos de ostensão. Segundo essa classificação, os tipos de obra são os herdeiros da caligrafia no seu sentido primeiro: o de registro do conhecimento. Dentro dessa categoria, temos todos os tipos de texto com serifa e sem serifa. Esse capítulo é praticamente todo dedicado a história da escrita, começando na caligrafia e comentando os principais desenhos do tipo existente até aquele momento. O capítulo 2, é voltado para a história do itálico, suas questões estruturais e sua posterior aplicação em textos, daí vem o termo Realce. O terceiro capítulo trata das tipografias góticas, manuscritas, display, toscanas e fantasia. Apontamos, ainda, que tal classificação não é comumente encontrada em bibliografias sobre a tipografia ou o design gráfico, porém ela esteve presente no dicionário Aurélio Buarque de Holanda nas suas primeiras edições. Em algumas edições mais recentes, a partir da década de 1990, encontramos somente tipos de obra e tipos de fantasia, o que seria uma alusão à primeira classificação definida por seu uso ou por seu destino “como textos para leitura corrente ou em títulos e impressos publicitários em geral” (INÉDITOS, FIG. 33). Apesar da já comentada relação de Orlando da Costa Ferreira com o dicionário de ABH, cabe ressaltar que uma classificação similar também pode ser encontrada nos dicionários Aulete e Houaiss, o que reafirma o seu uso na linguagem

comum.

Figura 33 – Originais Imagem e letra, trecho inédito sobre a classificação tipográfica.