Kelly hunter paixao em istmbul

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Editado por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A. Núñez de Balboa, 56 28001 Madrid © 2013 Kelly Hunter © 2014 Harlequin Ibérica, S.A. Paixão em Istambul, n.º 1563 - Setembro 2014 Título original: What the Bride Didn’t Know Publicado originalmente por Mills &


Boon®, Ltd., Londres. Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A. Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência. ® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises


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Prólogo

Lena West não compreendia a pergunta. Tinha a ver com a fórmula de Euler e as incógnitas complexas, mas, além disso, não tinha ideia. Com uma careta, deixou cair o lápis sobre o caderno e concentrou-se nos trabalhos de casa. Era difícil, quando tinha o oceano mesmo à frente. O verão e os trabalhos de casa não eram uma boa combinação. Muito menos, quando tinha a praia a poucos metros e o irmão mais velho fora mergulhar na água assim que


chegara da escola. Não era justo que Jared conseguisse fazer os trabalhos de casa de matemática sem esforço. Também não a ajudava que os dois irmãos mais novos fossem génios declarados e conseguissem responder a perguntas como a que tinha à frente em dez segundos. Poppy tê-la-ia ajudado se estivesse em casa, mas, apenas com catorze anos, fora enviada para a Universidade de Queensland, onde seguia um programa especial de matemática para sobredotados. Damon, de treze anos, também não estava em casa. Fora novamente castigado depois da escola. Damon tinha a teoria de que, se se comportasse suficientemente mal, talvez conseguisse evitar ser enviado


para uma universidade para sobredotados. Embora Lena pensasse que não tinha muitas probabilidades de levar a sua avante. Quando as pessoas eram inteligentes, os outros percebiam. No entanto, Lena, com dezassete anos, não tinha de se preocupar com isso. Suspirando, voltou a pegar no lápis. Ali estava a pergunta número seis, a rirse dela. Uma pergunta simples a que o resto da família podia ter respondido em sonhos. – Idiota – murmurou ela. – Quem? – perguntou alguém, atrás dela. Lena assustou-se, pois não ouvira


ninguém a aproximar-se. Depressa reconheceu Adrian Sinclair, o vizinho do lado e o melhor amigo de Jared desde a creche. – Porque não bates à porta? – queixou-se, embora soubesse que Adrian nunca batia. Virtualmente, vivia lá. – Não queria interromper os teus pensamentos. – Já o fizeste. – Disseste «idiota». Pensei que falavas comigo. – Idiota. – Vês? Era impossível não sorrir com o olhar alegre de Adrian. – Não vais conseguir nada com esse


teu sorriso. – Isso não é verdade. Jared está? – Está ali – indicou Lena, apontando para o Pacífico. Jared estava a sair da água naquele momento, com a prancha de surfe na mão. – Porque não estás com ele? – quis saber. – Estava a pensar nisso. E tu? – Amanhã, tenho exame de matemática – informou-o e olhou para ele por um instante, pensativa. Adrian escolhera as mesmas disciplinas que ela e Jared. – O que sabes da fórmula de Euler? – Que pergunta não entendes? – inquiriu ele, olhando para o caderno. – A número seis.


– Muito bem – afirmou Adrian. Pegou no livro de matemática e começou a olhar para ele como se soubesse o que estava à procura. Tinha pulsos fortes, mãos grandes e dedos fortes e grossos. Lena teve vontade de lhe tocar para medir as suas palmas e verificar se as mãos eram quentes... Então, Adrian pousou o livro na mesa e tocou-lhe com o peito no ombro, enquanto apontava para um parágrafo do texto... De repente, a temperatura de Lena subiu. – Queres sentar-te? – convidou ela, pensando que, pelo menos assim, se afastaria um pouco.


– Passei o dia todo sentado. Estou bem. Lena mexeu-se na cadeira, sentindo como o cheiro de Adrian a envolvia. Cheirava a limpo. Era incrível que cheirasse tão bem depois de um dia inteiro na escola. Era como se tivesse tomado um duche antes de ir ver Jared, o que seria muito estranho, pois costumava sempre acabar a tomar banho no mar. – Bom... – começou, num tom mais rouco do que o habitual. Sim. A pergunta número seis. Lena voltou a concentrar a atenção no livro... Contudo, os seus olhos voltaram a fixarse nas mãos dele! A pergunta seis.


Devia concentrar-se... – O que estão a fazer? – perguntou alguém, da porta do pátio. Lena também conhecia aquela voz na perfeição. Antes de levantar o olhar, sabia que era o irmão Jared. Como ela, tinha o cabelo encaracolado e moreno, embora o dela fosse mais comprido e encaracolado. Ele tinha os olhos mais azuis, pois os dela tinham um toque cinzento. Ambos tinham compleições atléticas. E ambos estavam a franzir o sobrolho. – Que problema tens? – perguntou Lena. – As tuas admiradoras não foram ter contigo à praia? Jared tinha muito êxito com as raparigas. A maioria delas tornava-se


amiga de Lena para poder aproximar-se dele. O problema era que, como mudava de namorada a toda a velocidade, muitas deixavam de ser amigas de Lena depois. – Elas é que perdem – dissera Jared, quando a irmã se queixara de que as amigas desapareciam tão depressa. Depois disso, Jared deixara-a sair com ele e os amigos, embora tivesse sido apenas por compaixão. – Perguntei o que estão a fazer – repetiu Jared, num tom gelado. – Trigonometria – esclareceu Lena, pensando que uma resposta direta era o melhor para o acalmar. Jared olhou para Adrian e ambos os homens se entreolharam por um instante.


– Se estás incomodado com alguma coisa, Jared, diz. Jared olhou para ambos novamente e, devagar, Adrian endireitou-se, enquanto uma mensagem sem palavras parecia fluir entre ele e o amigo. – Já conheces as regras – recordoulhe Jared, com frieza. – Que regras? – interveio Lena. – Pensou que estava a tentar seduzirte – explicou Adrian, depois de um silêncio longo e tenso. – Como? – balbuciou Lena. Havia duas coisas implícitas naquela simples afirmação. A primeira era que Adrian podia estar interessado nela, o que duvidava muito. E a segunda... – Jared


West, tencionas assustar os rapazes? Se for assim... – acusou e afiou o olhar. – Foi por isso que Ty Chester não me convidou para o baile do sétimo ano? Ia fazê-lo, sei que ia fazê-lo. Mas não o fez. – Não – negou Jared. – Talvez tenha pensado que o convidarias para andar de avião contigo. Ouvi dizer que tem medo das alturas. – E dos gatinhos – acrescentou Adrian. – E da sua própria sombra. – Talvez quisesse experimentar algo diferente – queixou-se. – Talvez tivesse vontade de verificar como as pessoas bonitas e tranquilas vivem – comentou. E era verdade. Embora não fosse corajoso, Ty Chester era muito, muito


bonito. – Ter-te-ia comido viva. – Era disso que se tratava. Jared, juro-te que, se alguma vez descobrir que interferes na minha vida amorosa, transformarei a tua num inferno – ameaçou Lena. – E a tua também – indicou a Adrian, pelo sim pelo não. – A minha já é um inferno – murmurou Adrian. Jared olhou para ele em silêncio, voltando a comunicar com o amigo sem palavras. Lena estava habituada a isso, mas, naquele momento, estava a tirá-la do sério. – Porque não se vão embora e me deixam em paz?


– Sim, vamos – indicou Jared a Adrian. – A trigonometria não é para ti. – Se vamos fazer surfe esta tarde, lembra-me de te afogar – pediu Adrian, com um sorriso. Os dois amigos sorriram, sem se mexer. – Tenho coisas para fazer – recordoulhes ela, impaciente. Infelizmente, ao baixar o olhar para o livro, chamou a atenção do irmão sobre o assunto. – Desde quando precisas de ajuda para fazer os trabalhos de casa de matemática? – Desde que se tornaram difíceis. É uma pergunta tola, não achas? – A sério? Não consegues fazer


operações básicas de trigonometria? – Esta é a razão por que, às vezes, penso que não sou irmã dele – comentou Lena a Adrian. – Talvez seja filha do canalizador. – Sim, mas tens força de vontade. O que importa que demores um pouco mais do que eles a terminar um problema de trigonometria? Nunca te rendes. – Sim, mas não consigo seguir o ritmo deles. Se continuar assim, acabarão por me deserdar. – Não consegues seguir o nosso ritmo? – repetiu Jared, que nunca tivera de se esforçar para ser o melhor da turma. No entanto, Lena tivera de estudar muito para não ficar para trás. Cada vez


mais, notava que a diferença entre ela e os irmãos se tornava mais evidente. Era uma maldição ser uma pessoa normal numa família de génios. – Excluir-me-iam se ficasse para trás? Jared ficou a olhar para ela, confuso e sem palavras. No entanto, os olhos de Adrian sorriam. Era como se ele sempre tivesse adivinhado as inseguranças de Lena, mas achasse graça por estar a expressálas naquele momento. – Tanto faz – balbuciou ela. – Não vais ficar para trás – contradisse Jared, no fim. – Eu não deixarei.


Jared não entendia. – Olha, é melhor que cada um estude de acordo com o seu nível. – Nada disso – negou Jared. – Não gosto que sejas tão derrotista. – Ninguém vai deixar ninguém para trás – declarou Adrian, para acalmar a tensão. – E ninguém vai ser derrotado. Jared nunca vai excluir-te, Lena. É muito protetor contigo. Não viste como ficou só porque me tinha atrevido a aproximar-me de ti? – Sim... Mas fá-lo para te proteger, não a mim – replicou ela. – Talvez queira proteger os dois – indicou Jared. – Não pensaram nisso? – Pedes demasiado – murmurou ela e,


quando Adrian assentiu para se mostrar de acordo, deu uma gargalhada que quebrou a tensão. – O que acham de começarmos a conversa de novo? Irei direta à questão. Sinto-me como uma imbecil porque não compreendo a pergunta seis. Preciso de ajuda para a acabar e poder ir fazer surfe. Foi assim que Lena conseguiu dois tutores de matemática durante o resto do curso. E foi assim, também, que Adrian ganhou a alcunha de Trig, pelo seu domínio da Trigonometria.


Capítulo 1

Não era fácil passar todo o dia verde de inveja. E era o que Lena sentia quando via os outros a andar sem esforço e sem dor. Embora tentasse afastar o ressentimento, a inveja costumava vir acompanhada de tristeza e raiva. Depois de lhe terem dado um tiro na barriga há dezanove meses, não conseguira parar de se sentir assim. Devia concentrar-se no aspeto positivo, tal como o fisioterapeuta recomendara.


Estava viva. Conseguia andar. E era forte, dissera-lhe o fisioterapeuta, tocando-lhe na cabeça. No entanto, recomendara que deixasse os exercícios para mais adiante e que esperasse até o seu corpo sarar. Lena recusara-se com teimosia, apesar de o mais provável ser que o fisioterapeuta tivesse razão. A mesma teimosia levara-a ao aeroporto naquela manhã e até à sala de espera, prestes a embarcar no avião. Com um suspiro de alívio, deixou cair o corpo cansado numa cadeira. Conseguira. Em breve, estaria em Istambul e,


quando chegasse, procuraria o irmão Jared e obrigá-lo-ia a voltar a casa no Natal. Conseguia fazê-lo. Lena levou as mãos aos olhos e esfregou-os. Arranjara-se e até alisara o cabelo. Naquele dia, parecia menos uma inválida e mais uma mulher com uma missão. Então, quando alguém se sentou ao seu lado, olhou para ele e gemeu. Era Adrian Sinclair, com os olhos fixos nela. Adrian era um homem muito alto e bem proporcionado, com ombros largos e mãos fortes. Porém, porque importava? Lena era de altura média e sentia-se bem com isso.


– Vai-te embora – pediu, a modo de cumprimento. – Não. Disseram-me que suspendeste o teste físico para voltar para o trabalho. – Faço-a noutra altura. – Não conseguirás. – Vais impedir-me? – Sobrestimas a minha influência – murmurou ele. – Lena... – Não – interrompeu-o. – Não quero que me digas nada sobre o meu estado de saúde. Não quero ouvir. – Sei que não, mas já estou farto de não poder falar – queixou-se, com os dentes cerrados. – Quando vais meter nessa cabecinha teimosa que nunca vais recuperar o teu antigo emprego?


Lena não disse nada. – Isso não quer dizer que não possas fazer outra coisa – prosseguiu ele. – Atrás de uma secretária? – Controlo de operações. Na cúpula do poder. É divertido. – Fá-lo tu. – O que acreditas que fiz nos últimos dezanove meses? Para além de deixar tudo para ir cuidar de ti, claro. Porque achas que estava de baixa no programa de rotação? Lena teve a decência de corar. Como ela e Jared, Trig fizera parte de uma equipa de serviços secretos australiana e, como ela, amara o seu trabalho. Adorara o perigo, a excitação e os picos


de adrenalina. Sem dúvida, devia ter saudades, adivinhou ela. – Porque estás de baixa? Podiam terte atribuído outra equipa. Ninguém te pediu para te sentares atrás de uma secretária e, muito menos, para cuidares de mim. – Sim, sim – confirmou e esticou as longas pernas, tentando ficar confortável na pequena cadeira. – Trig, o que estás a fazer aqui? – Damon ligou-me. Assim que passaste a alfândega, localizou-te. – Meu Deus, odeio isto! – comentou ela. Quem queria ter um irmão Hacker? – É impossível ter privacidade. – Mas é útil. Para que queres ir a Istambul?


– Para encontrar Jared. – O que te faz pensar que continua lá? – Não sei. É a única pista que tenho. Há dezanove meses que não sabemos nada dele. E se precisar de ajuda? – Se precisar de ajuda, pedirá. – E se não puder? Tenho a intuição de que está em apuros. Não é próprio dele deixar passar tanto tempo sem entrar em contacto connosco. – Talvez não possa fazê-lo para não pôr a sua operação em perigo. – Se é tão perigoso, não devia estar lá. Trig encolheu os ombros. – Jared quer respostas. Precisa delas. Se te intrometeres, não vai gostar.


– Não vou meter-me. Não me subestimes. – Não te subestimo, nunca o fiz. Embora sejas muito impulsiva... – E tu és um machista. – Nada disso. – Não tencionas agarrar-me à força e tirar-me do aeroporto? – Chamaria demasiado a atenção – indicou e começou a carregar nuns botões do telemóvel. Lena desviou o olhar. Sempre gostara das mãos de Trig. Questionava-se o que poderia fazer com elas se quisesse... Embora ele nunca tivesse tentado tocar nela. – Damon, Poppy e eu fizemos uma


votação. Decidimos que, se não conseguir convencer-te a ficar aqui e a ser prudente, iria contigo. Damon comprou-me um bilhete. Podes agradecer-lhe depois. – Agradecer não é exatamente o que tenho em mente. – Damon preocupa-se contigo, Lena. Já tem um irmão desaparecido. Não quer que te aconteça nada e eu não quero ter de explicar a Jared porque te deixei ir procurá-lo sozinha. Já vai custar bastante explicar-lhe porque te deixei ir comigo. – Aprovas o que está a fazer – acusou ela, com amargura. – Não queres que esteja a salvo. Queres que descubra quem sabotou as operações em Timor.


– Claro que sim. – O que fizeram? Atiraram uma moeda ao ar para ver quem ia e quem ficava a cuidar da inválida? – Não foi necessário. Jared foi. Eu fiquei – afirmou Trig, olhando para ela nos olhos. Lena desviou o olhar. Não fora muito boa companhia nos últimos dezanove meses... Estivera muito sobrecarregada com os calmantes e a autocompaixão para ser amável. Seguir em frente custara-lhe muito e não tivera em conta os sentimentos dos outros. Trig merecia que o tratasse melhor. E a família também. – Lamento – desculpou-se ela. –


Lamento muito. – Eu sei. Porém, a menos que fizesse algo para mudar a sua atitude, pedir desculpas não ia ser suficiente, pensou ela. – Vais sentar-te comigo no voo? Trig assentiu, percorrendo os outros passageiros com o olhar. – Damon mudou o teu bilhete. Vamos em primeira classe. Vais precisar de poder esticar as pernas. Nesse mesmo instante, o nome de Lena ouviu-se pelo altifalante. – Queres que vá? – ofereceu-se Trig. – Não. Eu vou. No balcão de embarque, trocaram o bilhete de Lena. Quando, sem dizer nada, Trig se


levantou para a ajudar a voltar a sentarse, agarrando-a pela cintura, não lhe agradeceu. Lena não lhe agradecia pela sua força. Nem pelo seu silêncio.

Tinham viajado juntos muitas vezes. Tinham partilhado a mesa e até tinham dormido juntos em praias, em bosques e em sarjetas. Lena conhecia o cheiro de Trig, sabia como eram as costas e os ombros largos dele. Era um homem forte. Ela sabia bem pela facilidade com que pegara nela ao colo quando lhe tinham dado um tiro. Em parte, Lena odiava não poder


estar à altura de Trig. A sua velocidade e agilidade já não podiam competir com a força dele. No entanto, outra parte dela desejava aninhar-se no peito forte e deixar-se consolar. A chamada para embarcar ecoou nos altifalantes. – Lena... – Não me peças para reconsiderar – interrompeu-o. Não conseguia suportar que passassem o tempo a recordar-lhe como era frágil. – Tenho de o encontrar. Tenho de verificar se está bem. Assim que o vir com os meus próprios olhos, ir-me-ei embora. Prometo. Mas tenho de me certificar de que está bem e quero que veja que estou bem. Trig não disse nada. Limitou-se a


agarrar na pequena mochila de Lena. – Eu posso levá-la... – murmurou, agarrando-a ao mesmo tempo. – Lena, se não me deixares levar a mochila, terei de te dar um tiro – avisou ele. – Quero ajudar. Preciso de te ajudar, da mesma maneira que tu precisas de ver o teu irmão e resolver as coisas com ele. Portanto, deixa-me levar a maldita mochila. Lena soltou a mochila. – Penso que não serias capaz de me dar um tiro – murmurou ela. – Mesmo que tivesses uma pistola. És um mentiroso. – Nada disso – defendeu-se ele, andando ao seu lado. – Sou cruel e


implacável e muito capaz de cumprir as minhas ameaças. Gostaria que o recordasses. Se Lena não o conhecesse tão bem, talvez acreditasse. O problema era que ela sabia como aquelas mãos grandes podiam ser suaves quando tocavam numa ferida. Sabia que Trig as cortaria antes de a magoar. Contudo, devia parar de se obcecar com as mãos dele!, repreendeu-se. No avião, encontraram os seus lugares e Trig guardou as malas enquanto Lena se sentava. Depois, deulhe uma almofada que ela aceitou e pôs atrás dos rins. – Tens algum plano para quando chegarmos a Istambul? – perguntou Trig,


dando-lhe outra almofada. Lena pensou em tirar-lha das mãos e bater-lhe com ela, mas decidiu pousá-la junto do apoio de braços. – Tenho um plano – informou ela. – E combinei encontrar-me com Amos Carter dentro de dois dias. – Por favor, diz-me que não baseaste todo o teu plano em Carter te dizer onde Jared está – indicou. – Já tentei. Carter pensa que o viu em Bodrum, mas não tem a certeza. E foi há seis semanas. – Eu sei. Por isso, se Amos não tiver mais nada para me dizer, irei a Bodrum para fazer de turista e dar uma vista de olhos. Os meus olhos são mais atentos do que os dele. Além disso, conheço os


hábitos de Jared e, se estiver lá, vou encontrá-lo. Se esteve lá, descobrirei para onde foi. Lena lançou um olhar especulativo a Trig, tentando pensar como o faria encaixar no seu plano. – Podemos fingir que estamos de férias juntos. Podemos dizer que vamos de lua de mel. Seria uma boa cobertura. Trig observou-a, perplexo. – Não temos de o fazer. Bodrum é o lar do turismo e do vício. Está cheio de festas, clubes ao ar livre e discotecas. Não penso que seja o sítio adequado para casados. – Tens razão – confirmou, disposta a melhorar o plano. – Podíamos ser um casal de sadomasoquistas, com couro e


tudo. – É melhor não. Lena sorriu para a assistente de bordo que estava parada ao seu lado com uma cesta com toalhinhas quentes. Aceitou a que lhe dava e esfregou as mãos e os braços com ela. Trig pôs a dele na cara e deitou a cabeça para trás. – Continuo aqui – afirmou Lena. – Não me recordes. – Pelo menos, os lugares são confortáveis. Até há espaço para as pernas. Estás com sorte. – Os lugares não são importantes. A única coisa que me importa ultimamente é prevenir riscos e minimizar danos.


«Ena!», pensou Lena. – Desde quando pensas como os adultos? – Desde o dia vinte e dois de abril. O dia em que tinham dado um tiro a Lena.


Capítulo 2

Vinte e seis horas depois, Trig pegou nas malas e conduziu Lena para fora do aeroporto de Ataturk para apanhar um táxi. Não fez nenhum comentário sobre ela andar tão devagar e alegrou-se. Também se alegrava por ter decidido acompanhá-la. – Para onde? – perguntou o taxista, em perfeito inglês, depois de lhes dar uma olhadela rápida e adivinhar que eram ingleses. – Para o Best Southern Presidential


Hotel, junto do Grande Bazar – indicou Lena. – E pode passar pela Mesquita Azul? – Senhora, será um prazer – anunciou o condutor. – É a sua primeira visita à nossa magnífica cidade? O seu marido e a senhora devem ir também a Topkapi Sarayi e a Ayasofya, a Basílica de Santa Sofia. E ao Bazar, claro. O meu primo tem uma banca de tapetes de seda. Posso dizer-vos onde e vai tratar-vos como se fossem família. Tomem – e deu-lhes um pequeno cartão de visita. – É do meu primo. A loja é em Sahaflar Caddesi. Lá, muitos vendedores tentam aproveitar-se dos incautos, mas o meu primo não é assim. Digam-lhe que vão da parte de Yasar Sahin, que sou eu.


Escrevi o nome no dorso do cartão. Trig aceitou o cartão em silêncio, com a esperança de que o taxista parasse de falar e começasse a conduzir. Lena sorriu. Sabia que Trig tinha fraqueza pelos tapetes e as tapeçarias. – Estás desejoso de comprar um – sussurrou ela. – Não te atrevas a mencionar a joalharia – murmurou ele. No entanto, foi demasiado tarde, pois Yasar ouviu. – Quer ouro? – perguntou o condutor, tirando outro cartão. – Este homem é meu irmão e tem joias que farão com que a sua esposa chore de alegria. – Não quero que chore – afirmou


Trig, mas aceitou o cartão. – Têm fome? Nesta rua, é a minha banca favorita de kebab. A melhor da cidade. – É de outro irmão? – perguntou Lena. – Do meu irmão gémeo – esclareceu o condutor, causando uma gargalhada a Lena. Não pararam para comer kebabs, mas viram a Mesquita Azul ao anoitecer e chegaram ao hotel sem nenhum contratempo. Trig deu uma boa gorjeta ao taxista, porque aquele tipo conseguira fazer com que Lena sorrisse. Também ficou com o seu cartão de visita. – Pode precisar dele, porque também sou guia turístico e soluciono problemas


– afirmara Yasar. – Ah, sim? – Sim. O hotel que Lena escolhera era central e de quatro estrelas. Na receção, dissera que Trig era o seu marido e o gerente acrescentara os seus dados ao quarto duplo sem pensar duas vezes. – Tens a certeza? – sussurrou Trig, enquanto o gerente procurava as suas chaves. – Porquê? Queres quartos separados? Trig não sabia. – É um quarto duplo com duas camas. Porém, continuava a ser um só quarto, pensou ele. Arrependendo-se, Trig reparou no


pequeno espaço que separava ambas as camas. Tinham passado por muitas coisas juntos, Lena e ele. Embora partilhar um quarto de hotel não fosse uma delas. Trig pousou a bagagem de Lena na cama mais afastada da porta, enquanto ela inspecionava a casa de banho com um ar de satisfação, pois tinha uma banheira de hidromassagem como pedira. Depois, abriu as torneiras e foi tirar roupa limpa da mochila. – Queres tomar banho enquanto a banheira enche? – perguntou ela. – Aviso-te de que, quando entrar na casa de banho, não vou querer voltar a sair. – Dói-te alguma coisa? – Só quero relaxar os músculos.


– Está bem – acedeu, pigarreando. Baixando o olhar, rebuscou na mala, tentando não pensar que Lena estaria nua na banheira a poucos metros dele. – Sim... Bom. Tomarei banho agora – decidiu e agarrou numas calças de ganga gastas e numa t-shirt. – Onde queres ir jantar? – quis saber. Isso podia fazê-lo mudar a sua escolha de t-shirt. – Eu gostaria de pedir serviço de quartos, se tiverem algo interessante no menu. E não o digo porque não quero andar – defendeu-se. – Jantar no quarto sempre fez parte do meu plano. Trig não tinha nenhuma intenção de objetar. – Sou eu ou este quarto é muito


pequeno? – perguntou, olhando novamente para a distância entre ambas as camas. – Talvez se parasses de crescer... – Já não cresço mais – declarou. Já era suficientemente alto. – E essas camas parecem de miniatura. – Suscetível. – Estás a meter-te comigo? – Sim, gosto disso. Faz-me sentir relaxada – admitiu ela. Trig esboçou um sorriso de troça. Com dezasseis anos, a sua única forma de esconder como estivera louco por Lena fora meter-se com ela. Ainda estava louco por ela, mas já se cansara de brincar. Sem se entreter mais, Trig agarrou no


nécessaire e entrou na casa de banho, que era do tamanho de uma caixa de fósforos. Não tinha parede para a separar do quarto, só um biombo de madeira. – Eh, Trig – chamou-o Lena, do outro lado. – Diz-me cinco coisas que nunca quiseste fazer. Para além de ser a minha ama. Nunca quisera estar apaixonado pela irmã do melhor amigo, refletiu Trig. Sobretudo, quando ela nunca lhe correspondera. – Nunca quis ser mecânico de carros – indicou. – A sério! – Falo a sério – insistiu, tirou a roupa


e deixou-a cair no chão. Naquele momento, Lena parou na entrada. – Bolas, Lena! Estou num lugar privado! – protestou ele, embora não procurasse uma toalha para se tapar. Já lhe vira quase todo o corpo noutras ocasiões. Quanto ao que faltava ver... Bom, ele não tinha nada de que se envergonhar. Lena baixou o olhar para essa parte da sua anatomia e engoliu em seco. – Eu... – Sim? – Eu... – voltou a balbuciar ela e, depois de um grande esforço, olhou para a cara dele. – Lamento. Esqueci-me do que ia dizer-te.


– É por causa do tamanho, não é? – Bom... Eu não sabia que... – murmurou ela e virou-se, refugiando-se no outro extremo do quarto. – Tinha ouvido rumores... As tuas antigas namoradas não eram muito discretas. – Não? – replicou ele. Tivera algumas namoradas ao longo dos anos, não muitas. E tentara, sem êxito, apaixonar-se por cada uma delas. – E o que diziam? – Digamos que se mostravam agradecidas. Agora, entendo porquê. – Nada disso – queixou-se e entrou no duche, sem se incomodar em voltar a fechar o biombo. – Como sabes que não era porque sou um vencedor?


– Sei que gostas de ganhar, isso é verdade. – Dizes sempre isso. – Deve haver alguma razão... Durante toda a sua adolescência, Jared e Lena sempre tinham competido para ser os melhores, os mais rápidos e os mais corajosos. Isso causara-lhes muitos problemas e também os levara a fazer parte dos serviços secretos. Jared fora promovido porque tinha dotes de líder e Trig e Lena tinham sido promovidos com ele, pelos seus próprios méritos e porque os seus superiores tinham sabido reconhecer uma boa equipa neles. Por isso, conheciam-se na perfeição.


Conheciam todos os defeitos e qualidades um do outro. Trig sabia que Lena o amava como um irmão e como um companheiro de batalha. O que era muito. No entanto, às vezes, Lena via nele o jovem rebelde que fora, em vez do homem em que se transformara. Outras vezes, fazia-o competir em jogos que ele já não queria continuar a jogar. – Há hambúrguer no menu? – perguntou ele, do duche. – Espera... – indicou, aproximando-se da entrada da casa de banho. – Sim, há hambúrguer de cordeiro. Também há almôndegas com batatas, saladas, feijões e muitos bolos.


– Baklava? – Montanhas de baklava. De noz, de pistacho, de pinhões... Queres a tua banhada em água de rosas? – Não – respondeu ele e levou as mãos à cabeça para lavar o cabelo. – Estás a posar de propósito? – E tu? Estás a olhar de propósito? – quis saber. – Não importa. Se quiseres, podes olhar mais de perto – acrescentou e começou a abrir a porta de vidro do duche. Lena protestou e saiu dali. – Pensei que não tinhas medo de nada – observou Trig. – Isso era antes de me pregarem um susto de morte. Agora, sou mais


prudente. Não quero que me assustem duas vezes. – Estou de acordo – concordou, num tom sério, e pôs a cabeça de baixo de água, tentando não recordar o dia em que vira Lena na lama, a sangrar entre os seus braços, enquanto tudo à sua volta explodia. Oxalá pudesse tirar aquela imagem da mente para sempre. – Que tipo de baklava queres? – inquiriu ela. – Há um prato com vários tipos? – Posso perguntar. Trig ouviu como Lena pedia a comida. Tentou recordar qual era a verdadeira razão por que estavam na Turquia. O objetivo era que Jared e


Lena se vissem e soubessem que estavam ambos a salvo. E, depois, levála-ia dali a toda a pressa. Era um plano simples. Embora não precisasse de um génio para adivinhar que executá-lo não ia ser nada fácil.

Trig saiu da casa de banho, limpo e um pouco mais tranquilo. Lena tinha a televisão ligada e estava a mudar os canais. – A comida chegará dentro de uma hora – informou ela. – Pensei que ias demorar mais. Quero tomar um bom banho de espuma.


Ao imaginá-la nua e ensaboada a poucos passos dele, Trig decidiu que era melhor não ficar no quarto. – Vou dar um passeio – informou ele, mal-humorado.

Lena apoiou-se na parede assim que Trig saiu pela porta. Não sabia porque andava de tão mau humor nesses dias. Tão depressa brincava como se zangava. Isso sempre fora mais típico dela. Trig sempre se mostrara sólido e estável em qualquer situação de crise. Ele soubera manter a calma, mesmo quando Lena estivera a sangrar na lama. Então, pegara nela ao colo. Até tivera a


coragem de não se mexer quando Jared chegara e lhe ordenara que se afastasse. Jared cedera e ocupara-se de procurar um transporte para a levar para um sítio seguro onde pudessem cuidar dela. Trig fora a única coisa sólida nesses momentos, enquanto o mundo de Lena se derrubava à sua volta. – Não morras – sussurrara, num tom implacável. – Luta, bolas! É o que fazes sempre. Lena lutara. E continuava a lutar. Não só lutava contra a dor, também o fazia contra os seus sentimentos por Trig. Não conseguia esquecer como lhe sussurrara palavras doces ao ouvido, pensando que estava inconsciente.


– Fica comigo, Lena, por favor. Não te atrevas a ir para onde não posso seguir-te. Uma vez, no passado, Lena teria estado disposta a precipitar-se para os braços dele se lhe tivesse demonstrado o mínimo interesse. No entanto, no presente, não podia fazê-lo. O que ia oferecer-lhe? Mal conseguia cuidar de si própria e custava-lhe controlar a raiva que sentia. Além disso, também tinha as feridas. Um corpo tão bonito como o de Trig merecia um corpo igualmente belo, não como o dela, cheio de cicatrizes e lesões. Ela nunca poderia ter filhos e ele


sabia. Trig estivera presente quando o médico lhe dera a notícia. Nesse momento, enquanto ouvira o veredicto do médico, Trig encostara a cabeça entre as mãos e não levantara o olhar. Depois, não fizera nenhum comentário, mas a expressão dele estivera cheia de tristeza. Tentando fugir dos seus pensamentos, Lena reparou numa garrafa de vinho que havia sobre o pequeno frigorífico do quarto. Abriu-a e serviu-se de um copo generoso. Depois, escolheu roupa limpa e entrou na casa de banho com ela. A água far-lhe-ia bem. Ajudá-la-ia a relaxar e a pensar com clareza. Devia encontrar Jared. Esse era o seu objetivo.


Tinha a certeza de que o objetivo de Trig era cuidar dela. Depois, quando cumprissem a sua missĂŁo, poderiam encontrar outra maneira de se comunicar. Talvez ele conseguisse deixar de ser demasiado protetor e ela poderia deixar de estar Ă defesa. Talvez pudessem ser mais honestos, pensou, bebendo um gole do vinho. Pelo menos, ela preferiria poder demonstrar como gostava dele.


Capítulo 3

Trig regressou quando o jantar chegou. Cumprimentou Lena com um gesto da cabeça, deu uma gorjeta ao empregado e começou a pôr os pratos do carrinho numa pequena mesa que havia junto da janela. Lena serviu vinho para os dois e, ao vê-lo tão tenso, decidiu esperar e não lhe perguntar como correra o seu passeio. – Tomaste analgésicos? – perguntou ele, depois de olhar para a garrafa que


estava quase a meio. Não era bom misturar álcool e medicação. – Ainda não. Esta noite, vou escolher o vinho. – Por alguma razão em especial? – Foi um dia muito longo. E estamos numa cidade onde tudo é novo para mim – afirmou. Embora a verdadeira resposta tivesse a ver com ele estar ali. Antes, Lena costumava ser capaz de adivinhar os pensamentos de Trig só de olhar para ele. Nos últimos dias, no entanto, fora impossível. Trig sentou-se e deu uma dentada ao hambúrguer. Lena sentou-se à frente, provou a sua salada de frango e bebeu mais vinho. – Quando combinaste encontrar-te


com Carter? – Amanhã às duas da tarde na porta Nuruosmaniye do Grande Bazar. Queres vir? – Eu estarei a observar. – De longe? – Não tão longe. – Se te portares bem, talvez te compre um cachecol de seda. – Não são o meu estilo – indicou Trig, com um sorriso. – Como está o hambúrguer? Trig assentiu e deu outra trinca. O hambúrguer estava bom. – Pede um – sugeriu ele, depois de dar uma olhadela à salada dela. – Para que saibas, esta salada está


deliciosa. E é muito saudável – informou Lena. No entanto, só de ver o hambúrguer de Trig sentia água na boca. Lendo-lhe a mente com um suspiro, Trig deu-lhe metade do que restava. – Os meus irmãos não são tão atenciosos – indicou, aceitando-o com um sorriso. – Eu não sou teu irmão – corrigiu, num tom sombrio. Lena ficou sem palavras. Por sorte, pôde concentrar-se no vinho e no hambúrguer. – Adrian, tens algum problema comigo? – inquiriu ela, enquanto ele olhava para ela com o sobrolho franzido. – Há muito tempo que somos amigos e sei que, nos últimos dois anos,


me apoiei muito em ti. Foste mais do que paciente comigo e agradeço-te porque sei que a maior parte do tempo sou insuportável. O que se passa é que... Ultimamente... É como se te tivesses fartado de mim. E seria compreensível. Se for o caso, tens de te ir embora e deixar que cuide de mim própria. Sabes que sou capaz. – Tens a certeza? – Claro que sim. A minha família pensa que sou frágil e enviaram-te para cuidar de mim. Penso que não é justo para ti. Não tens de o fazer. Tens a tua própria vida para viver. Trig ficou a pensar nisso enquanto terminava o último bocado de


hambúrguer, acabava o copo e olhava para a baklava. – Diz-me porque estou aqui – pediu, finalmente. – És a ama escolhida pela minha família. Enviaram-te para cuidar de mim – esclareceu, sem hesitar. – Essa é uma razão, mas não é a principal. – Por lealdade a Jared. – Não tem nada a ver com isso. – Porque adoras baklava? – Não o suficiente para atravessar meio mundo – replicou Trig, olhando para ela sem pestanejar. Lena sentiu-se incapaz de desviar o olhar ou de respirar. – Podes procurar Jared sozinha, Lena


– afirmou Trig. – E tens de saber que, se estou aqui, é porque quero estar aqui. Contigo. Não há nenhum sítio onde eu gostasse mais de estar do que contigo. Deves saber que o que sinto por ti não é o amor de um irmão. E deves saber que, ao mesmo tempo, gosto e odeio que me trates como se fosse da família – confessou e, depois de respirar fundo, continuou. – Também é necessário que saibas o que se passa quando nos registas num hotel como marido e mulher. Fazes com que fique com ideias. Lena não entendia. Trig dera-lhe demasiada informação em muito pouco tempo. – Eu... Como?


– Amo-te. – Sim? – Sim. – Mas... Não podes. – Claro que posso. – Estou destruída. – Não, só um pouco amolgada. – Estou destruída... Por dentro. – Sim – concordou, sem perder a calma. Contudo, Lena estava muito nervosa. E precisava de recuperar o controlo dos nervos. – Como está a baklava? – Sabe a cinza. – Mais vinho? – ofereceu ela e serviu-o na mesma. – Tens de me dar um


pouco de tempo. – Para que saibas, Lena, não precisas de tempo. Conhecemo-nos há muito. Estive a tentar impressionar-te desde a primária. Ou gostas de mim ou não. Ou me amas ou não. – Não é assim tão fácil. – É, sim. – Vi-te nu há um instante – começou a dizer ela, sem saber como prosseguir. – O teu corpo é perfeito. – É apenas pele. – Continua a ser perfeito. – Achas que não consigo ver sob a tua pele? Tens defeitos, tal como todos nós. Ninguém está a enganar-se. – Olha para mim, Adrian. Pensa em todas as coisas que podes fazer e eu,


não. Odiar-me-ias por isso. Tens de estar cego para querer estar comigo. – Não estou cego. A nossa relação pode funcionar – assegurou ele. – Mas tu tens de querer – acrescentou e passou uma mão pelo cabelo. – Isto não está a correr bem, pois não? Não pensas em mim como eu, em ti. – Não disse isso! Não ponhas palavras na minha boca – defendeu-se ela, pensando no que podia fazer para não o assustar. – És importante para mim, Adrian. Sempre foste. Não tens medo de que, se não funcionar, possamos perder a nossa amizade? – Nunca tive tanto medo como quando te vi a ficar inconsciente pela sexta vez


em duas horas. Pensei que ias morrer nos meus braços. Nada pode ser mais assustador do que isso. – Para mim, sim. Estou aterrorizada – reconheceu ela. Aproximou-se e, quando segurou no pulso dele entre dois dedos, verificou que tinha o coração acelerado. – E tu não estás tão calmo como aparentas. – Estou um pouco nervoso. Isso não significa que não tenha pensado bem – insistiu ele, afastou a mão, pegou no telefone e carregou num botão. – O que estás a fazer? – Disseste que precisavas de tempo. Vou dar-to – informou-a e falou ao telefone. – Sou Adrian Sinclair. Vou precisar de outro quarto e tem de ter


uma cama grande – pediu e ouviu por um instante. – Não, não tem de estar ligado a este. Obrigado – agradeceu e desligou. – O empregado virá dentro de uns minutos. – Não era necessário – indicou. Não queria que se fosse embora. – Adrian, eu... – Vemo-nos ao pequeno-almoço, está bem? Bolas, pensou Lena. – Está bem – acedeu e voltou a tentar. – Não te disse que não. Não rejeitei nada do que me disseste. Eu também pensei que gostava de ti, de vez em quando. Como podia não gostar? Sou uma mulher.


Trig tentou sorrir. – Mas pensa bem, Adrian. Tens a certeza de que é o que queres? A verdade é que acho que não pensaste bem. Ele franziu o sobrolho, inclinou-se e deu-lhe um beijo suave nos lábios. Lena semicerrou os olhos para desfrutar do seu calor e da sua suavidade. – Já pensei nisso – reiterou ele, depois de se afastar, olhando para ela com olhos cheios de desejo. – Agora, pensa tu. Dito aquilo, Trig pegou na mala e saiu pela porta.


Não fora uma declaração muito afortunada, pensou Trig, enquanto se dirigia para o elevador. Lena nunca fora muito romântica. Na sua adolescência, fora muito competitiva e audaz com os rapazes e todos tinham fugido dela. Depois, fizera o possível para ter uma relação estável, mas não conseguira encontrar nenhum homem que merecesse ser namorado dela. Pelo menos, devia ter decidido isso. E, sem dúvida, era o que Jared e Trig pensavam. Talvez o pai, um banqueiro internacional bem-sucedido, e os irmãos a tivessem feito esperar demasiado dos


homens. No entanto, Lena sempre se sentira um pouco culpada por não poder ser mais feminina ou mais doce. Tentara, sim, mas a sua fraqueza tinham sido os desportos de ação. Nunca conseguira resistir a aceitar um convite de Jared ou Trig para fazer surfe quando as ondas estavam mais altas. Até lhe darem um tiro. Então, mudara tudo. Naqueles dias, ninguém se atrevia a desafiar Lena a ir mais depressa nem a fazer algo mais difícil, embora ela continuasse a tentar. Todos olhavam para ela com preocupação. Trig sabia que também o fazia. Era por isso que Lena lhe pedia


para a deixar em paz. Tinham sido dois anos muito difíceis. Porém, as coisas estavam a melhorar. Lena sentia-se um pouco melhor e podiam encontrar uma maneira de se dar bem e entreter-se, se ela quisesse. As portas abriram-se e um rapaz uniformizado saiu do elevador. – Senhor Sinclair? Trig assentiu. – Deixe-me levar-lhe a mala – ofereceu-se o empregado. – Temos o quarto 406 para si. Tenho aqui a chave. Trig seguiu-o. Só tinha de convencer Lena a tentar, pensou.


Capítulo 4

Trig levantou-se com o som do muezim numa mesquita próxima. A sua noite estivera cheia de pesadelos, todos de perda. Sonhara com Lena a afastar-se dele porque lhe pedira demasiado. Lena a desaparecer na lama de Timor. Lena a escapar-lhe das mãos, de uma forma ou de outra, sem que conseguisse evitá-lo. Fechando os olhos, esfregou a cabeça e rezou para que tivessem um bom dia e ela não se tivesse assustado com a sua declaração do dia anterior.


Temia que se sentisse incomodada ou que pensasse que ele merecia alguém melhor. Trig não entendia como uma mulher tão maravilhosa podia ter uma autoestima tão baixa. Lena dissera-lhe, em muitas ocasiões, que se sentia como uma maçã podre numa família de pessoas extraordinárias. Enquanto esperava que ela atendesse o telefone, começou a impacientar-se. Não podia ter fugido, pensou. E, se o fizera, encontrá-la-ia onde combinara com Amos Carter. Não podia escapar tão facilmente. – O que foi? – perguntou, ao atender finalmente. – Queres ir tomar o pequeno-almoço


numa pequena cafetaria que vi ontem quando fui dar um passeio? – Quando? – Agora. – Que horas são? – Cinco e dezassete. Lena deixou escapar um gemido de protesto que, infelizmente, pareceu muito sensual a Trig. – Queres tomar o pequeno-almoço agora? – Estou cheio de fome. – Tens sempre fome. – O pequeno-almoço especial é lentilhas e tortas com queijo. – Vai tu. E traz-me uma chávena de chá – murmurou ela e desligou. Com um sorriso, Trig levantou-se. De


repente, sentia-se mais esperançado. Lena não lhe dissera que não, nem parecera incomodada. Também não lhe pedira para a fazer dele naquele instante, mas isso era uma fantasia inalcançável. Depois de tomar o pequeno-almoço, Trig foi procurar a porta onde Lena tinha o seu encontro com Carter e examinou os possíveis pontos de observação. Às sete da manhã, estava de volta ao hotel, a bater à porta da companheira com um chá numa mão e um iogurte com mel na outra. – O pequeno-almoço – informou ele. Lena deixou-o entrar e fechou a porta depois, bocejando.


Era uma mulher muito bonita. Esbelta, com cabelo castanho e encaracolado e uns olhos cinzentos impressionantes. Uma vez, uma agência de modelos quisera contratá-la quando a vira na praia. Também tivera propostas de patrocinadores de surfe. No entanto, Lena rejeitara ambas as ofertas com perplexidade, sem entender o que tinham visto nela. – É assim que vais cortejar-me? – quis saber ela, enquanto Trig deixava o chá e o iogurte na mesa. – Quero saber se queres que te corteje antes de tentar – esclareceu ele. – Ah, desculpa – desculpou-se e bebeu um gole de chá. – Porque estás


tão entusiasmado? – Para além de querer saber se vais sair comigo? – Sim, além disso. Ainda não estou suficientemente acordada para tomar uma decisão definitiva. E, ontem à noite, não conseguia pensar com clareza suficiente. – Isso foi por causa do vinho. – Talvez – concedeu ela e, quando provou o chá quente, deu um suspiro de prazer. – Então, porque estás tão contente esta manhã? – Tens de ver o bazar. – Estás entusiasmado porque vais às compras? – Não são apenas compras. Regatear é um desporto muito excitante.


– Já há alguma coisa aberta? – Algumas bancas. – O que compraste? – Vi um tapete e disse para o guardarem enquanto penso nisso. – Sim. E quanto pedem? – Isso é o que estamos a negociar. – Mais ou menos. – É um tapete muito bonito. De seda. Pediram-me sete mil dólares – respondeu ele. – É um bom investimento. – É mágico? – Não perguntei. Talvez queiras acompanhar-me quando voltar. – Quando vais voltar? – Depois de fazer o resto das minhas


compras. – Não te reconheço, Trig. – É uma nova faceta – brincou ele. – Bom, já estás bem acordada? – Não. – Quero que me digas se vais sair comigo. – Continuo a pensar nos prós e contras. – Trouxe-te o pequeno-almoço. Isso seria um pró – sugeriu ele. – Mas acordaste-me às cinco da madrugada. – De nada – indicou, com um sorriso. – Como está o teu corpo hoje? – Funciona – respondeu ela e provou o iogurte. – E a nossa relação de sempre? –


perguntou ele. – Continuamos a ser amigos, não é? – Sim – afirmou ela, embora não tivesse a certeza. – Continuamos a ser amigos.

Trig voltou a ir às compras antes do encontro com Carter. Quando chegou o momento de Lena se encontrar com ele, ficou a vigiar a certa distância, fingindo ser mais um turista no mercado. Carter aproximou-se de Lena, estendeu-lhe ambas as mãos e sorriu, antes de a beijar nas faces. Ela sorriu também. Pareciam velhos amigos. Trig seguiu-os quando começaram a entrar no


mercado, conversando amigavelmente. Antes, no entanto, certificou-se de que mais ninguém os seguia naquele lugar tão cheio de gente. Carter comprou um saco de rebuçados a Lena, beijou-a em ambas as faces com um sorriso e, num suspiro, desapareceu novamente entre a multidão. Lena não olhou para Trig. Conhecia o jogo demasiado bem. Comprou três lenços de seda e um punhado de amêndoas. Deteve-se um bom bocado numa loja de tapetes, embora os vendedores não conseguissem convencêla a comprar nada. Não parecia estar a ser seguida, decidiu Trig. No entanto, continuou sem se aproximar, pois queria ter a certeza.


Não sabiam em que Jared estava envolvido e, além disso, Carter era bastante imprevisível e nunca estava claro para quem trabalhava. Chegaram a um corredor estreito de tapeçarias de cores atraentes. Havia tecidos pendurados por todo o lado. Então, um grupo de jovens passou junto de Lena e fê-la cair ao chão. Ninguém tentou deter a queda. Ela bateu com a cabeça na perna de metal de uma mesa de exposição. Não se levantou. Quando Trig chegou ao lado dela, Lena já não tinha o porta-moedas. Os jovens tinham desaparecido sem deixar rasto. Ninguém os perseguiu. – Lena – chamou-a e tentou procurar


os sinais vitais. – Lena. Um grupo de gente formou redemoinhos à sua volta. – Está contigo? – perguntou um homem a Trig. Trig assentiu. Umas mãos desconhecidas aproximaram-se. – Não! – gritou Trig, afastando as mãos. – Não lhe toque. Alguém tentou fazer com que a multidão dispersasse um pouco. Outra pessoa estendeu-lhe um pano húmido. – Para a cabeça. Trig pôs-lho na testa, mas ela continuou sem se mexer. Quando lhe tocou na cabeça, encontrou um bom galo. O golpe fora suficiente para a


deixar inconsciente. – Pode chamar uma ambulância? – pediu Trig ao homem que lhe passara o pano. – Privada ou pública? – Privada. – Apanhe um táxi. É mais rápido – sugeriu uma mulher. Pouco depois, o homem que estava ao seu lado começou a discutir com ela. Não pareciam uma ameaça, pensou Trig. Só queriam ajudar. Então, Lena mexeu-se um pouco e entreabriu os olhos. – Lena? No entanto, ela não recuperou a consciência.


Alguém deu uma garrafa de água a Trig. – Obrigado. Enquanto o público era cada vez mais numeroso e a conversa à sua volta começara a girar em torno dos grupos de carteiristas, Lena voltou a abrir os olhos. – Tenta mantê-los abertos um pouco mais – pediu, tapando-lhos com a mão. Tinha o coração acelerado, sem conseguir esquecer a emboscada que tinham sofrido em Timor. – Deixa-me examinar-te as pupilas para ver como respondem à luz. – És médico? – perguntou o homem que não se afastara do seu lado.


– Tenho algumas noções de primeiros socorros, isso é tudo. Então, Trig afastou as mãos dos olhos de Lena e verificou que as pupilas dela se mexiam da forma adequada. Olhou para a multidão, assustada, e voltou a olhar para Trig. – Onde estou? – No Grande Bazar – informou-a e, diante do ar espantado dela, acrescentou. – Istambul. – Ah... – Caíste e magoaste a cabeça. Uns carteiristas roubaram-te o porta-moedas. – Estou enjoada – afirmou e inclinou a cabeça, antes de voltar a cair num estado de inconsciência.


Ele tentou não ficar nervoso, enquanto lhe punha o pano húmido no galo. Estava cada vez maior. – Descansa – pediu ele, quando Lena abriu os olhos novamente. – Não tens de te mexer. Uma ambulância vem a caminho. – Espero ter seguro – murmurou ela, olhando para ele com olhos perplexos. – Claro que tens. – E a pergunta seguinte é... Trig baixou-se para conseguir ouvi-la melhor. – Quem és tu?

Lena não gostava de hospitais. Mal


conseguia recordar o seu próprio nome, mas tinha a certeza de que não gostava de hospitais. E de que estivera em muitos. Quando teve de se despir e vestir a bata para lhe fazerem um exame, viu as cicatrizes que lhe percorriam a barriga e uma perna. Talvez tivessem sido o resultado de um acidente de viação, pensou. Não conseguia lembrar-se. – Tens pregos e placas de titânio na perna esquerda e a anca – informou-a o tipo que estava ao seu lado, a preencher o seu historial. – Passaste por várias operações recentes e segues um tratamento intensivo de fisioterapia. Aquele homem também conhecia o seu grupo sanguíneo e o seu nome.


Lena Sinclair. Então, começou a recuperar a memória. Recordou que estivera a ver lenços no mercado. Alguém estivera a segui-la. Chamava-se Lena, sim, e o tipo que estava com ela, de quem não se lembrava muito bem... Ele era o marido. Chamava-se Adrian. Lena ouvira-o quando a registara na receção do hospital. Era-lhe muito familiar e sentiase segura ao lado dele. Mas, para além disso, não conseguia lembrar-se de mais nada. Era o homem mais bonito que já vira. – O meu nome é Lena Sinclair – indicou ao médico. – Estava a fazer


compras no Grande Bazar quando uns ladrões me atiraram ao chão e me roubaram o porta-moedas. Lena lembrava-se de tudo o que acontecera no mercado. No entanto, tinha uma grande lacuna a respeito da sua vida anterior. Sabia que era australiana e que crescera numa praia com dois irmãos e uma irmã, cujos nomes não recordava. – Traumatismo craniano leve – decretou o médico, depois de a examinar. Lena sentia que a cabeça ia rebentar, tinha náuseas e a luz magoava-lhe a vista. – A confusão temporária e a perda de memória são resultado do golpe –


explicou o médico, quando lhe contou que as suas lembranças estavam muito nubladas. – Os calmantes que lhe dei também não terão ajudado. Lembra-se de quem é? – Lena. Lena Sinclair. – Lembra-se da família e do seu passado? – Um pouco. – É comum não recordar os acontecimentos prévios ao golpe – esclareceu o médico, para a tranquilizar. – Lembra-se do seu marido? – Sim – afirmou ela. Recordava que se sentia segura ao lado dele. E recordava as mãos dele. – Tem de descansar. Dei-lhe anti-


inflamatórios e calmantes para a dor. Deixo-a nas mãos do seu marido. Pedilhe para a acordar várias vezes ao longo da noite. Se sentir ansiedade, diga-lhe. Se a dor de cabeça ou as náuseas piorarem ou se se sentir desorientada ou com problemas de coordenação... Digalhe e ele terá de a trazer de volta. – Está bem. – Já tinha problemas de coordenação devido a lesões anteriores. Não me refiro a esses, falo de algo novo. – Está bem – acedeu, num murmúrio. Queria sair o quanto antes do hospital. Odiava hospitais. Na saída, um táxi esperava por eles. O condutor parecia conhecer o seu marido.


– A sua mulher deve estar sempre consigo – indicou o taxista. – Esta cidade nem sempre é segura. Onde foram? – Leve-nos para o hotel! – ordenou Trig, num tom ameaçador, sem responder à pergunta. Em completo silêncio, o taxista deixou-os no hotel. Ao passar à frente do restaurante em direção ao elevador, ele ficou a olhar para o bufete. – Tens fome? – Um pouco. O seu marido estivera ao lado dela todo o dia. Não se afastara e, sem dúvida, não tivera tempo para comprar nada para comer.


– Podíamos comer no bufete. – Eu estava a pensar em ligar para o serviço de quartos. – Também podemos comer agora – sugeriu ela, pensando que podia demorar se pedissem no quarto. – Tens fome? – Não, mas tu tens. Eu posso comer qualquer coisa. – Prefiro levar-te para o quarto. – Tenho a cabeça dorida, mas não me dói. Os analgésicos fizeram efeito – assegurou ela. – O que achas de comermos agora e, se me sentir mal, te avisar? Ele não parecia convencido. – Está bem. Podes observar-me com


atenção durante a refeição e, se achares que me sinto mal, avisas-me. – Não pareces estar muito bem neste momento. – Penso que consigo resistir outros vinte minutos – insistiu ela. – Ou podemos ficar aqui parados, a discutir. Quando Adrian sorriu, Lena ficou embevecida a olhar para ele, cativada por aquele sorriso carinhoso. – És a mesma de sempre – murmurou ele, conduzindo-a para a entrada do restaurante. Depois, esperou que se sentasse. – Vou à receção mudar a nossa reserva. Ficaremos aqui mais alguns dias. Vais ficar bem? – Sim. Lena viu-o a ir-se embora. Era um


homem imponente, de costas largas, ancas finas e pernas compridas. Quando desapareceu da sua vista, no entanto, ela teve de usar toda a sua força de vontade para não entrar em pânico. Ia correr tudo bem, tentou tranquilizar-se. Tinham um quarto de hotel e, assim que precisasse, podia refugiar-se nele. Além disso, o seu marido estava ali e não se ia embora. Regressaria em breve. O empregado perguntou-lhe o que queria beber e Lena pediu água com gás para ambos. Tinha a sensação de que o marido bebia cerveja, mas não sabia se quereria uma com a comida. Cinco minutos depois, Adrian


regressou. – Já está? – Sim. – Para onde íamos depois de termos estado aqui? – Não te lembras? – Não – respondeu ela, sem querer alarmá-lo muito sobre a lacuna enorme que ocupava a sua memória. – As minhas lembranças são um pouco imprecisas. – Íamos a Bodrum procurar Jared. – Ah... – murmurou ela. Seria um bom momento para lhe confessar que não sabia quem Jared era? – Está bem. Então, o marido ficou a olhar para ela com um ar divertido. Adrian... Aquele nome não encaixava, pensou Lena.


– Tens outro nome, para além de Adrian? – Trig – esclareceu. – Chamas-me Trig. – Está bem – assentiu ela. – Ah, o empregado veio e pedi água com gás. Não sabia se quererias cerveja. – Esta noite, não. Trig acompanhou-a ao bufete e ficou ao seu lado enquanto ela se servia um pouco de tudo. Depois, ele encheu o prato até transbordar. Regressaram à mesa, onde Lena o observou enquanto devorava a comida. – Porque não temos alianças? – quis saber ela. Trig engasgou-se com a comida.


– O quê? – conseguiu dizer ele, depois de beber um gole de água. – Ao princípio, pensei que os ladrões me tinham roubado a minha, mas vi que tu também não tens uma. Pestanejou, Trig bebeu mais um gole. – Lena, o que recordas do nosso passado? – inquiriu ele, olhando para ela com atenção. – Fragmentos soltos – confessou ela. – Mas não me lembro do nosso casamento. – Qual é o teu nome de solteira? – Eh... – E os nomes dos teus irmãos? – Dan. Não, Damien. Um deles chama-se Damien.


– Damon. – Isso, Damon – repetiu ela, enquanto pensava na imagem de um jovem sorridente com uma prancha de surfe. – Adora o mar – aventurou, mas, ao ver o rosto dele, sentiu-se insegura. – Não gosta? – Sim. – Vês? Estou a recuperar a memória. No entanto, o marido não parecia pensar o mesmo. – Lena, lembras-te da razão por que estamos na Turquia? – Na verdade, não. Mas lembro-me de ti. Sei que me sinto segura contigo. És o meu marido. Trig. De repente, Lena pensou noutra coisa.


– Somos recém-casados? Tínhamos vindo aqui para comprar as alianças? – perguntou ela. – Estamos em lua de mel? Depois de um longo silêncio, Trig olhou para ela nos olhos. – Sim.


Capítulo 5

Lena mal se lembrava dele. Trig tentou esconder o seu pânico crescente com outro bocado de comida. Lena pensava que estava casada com ele, pois fora o que dissera no hospital para que os atendessem melhor. – Lamento muito. Estraguei tudo, não foi? – perguntou. – Os detalhes são imprecisos, mas sei que te conheço. Também gostas do mar. E brincávamos juntos quando éramos crianças. Tu, eu e outro menino.


– Jared – indicou ele. Lena nem sequer se lembrava de Jared, pensou. – Sim, Jared. O meu... Trig esperou. Lena franziu o sobrolho. – Irmão – informou-a, sem conseguir suportar o seu olhar de confusão. – Sim. Tenho a certeza de que o golpe está a pregar-me partidas. – Não me digas... – replicou ele, com sarcasmo. Lena mal tocara na comida. – Devias tentar comer alguma coisa – sugeriu ele, mal-humorado. Com inapetência, Lena pôs um pequeno pedaço de beringela assada na boca. A sua amnésia era pior do que Trig


pensara. Tinha de a levar para a cama para descansar. – Queremos comprar anéis de platina – afirmou, de repente. O que podia responder àquilo? – E também queríamos um tapete – continuou ela. – De seda – afirmou ele, sentindo-se culpado por se aproveitar da situação. – Era muito caro? – Oh, sim! – E... achas bem? – Sim. De facto, penso que precisamos dos dois – afirmou, sem pensar. – Somos ricos? – quis saber ela, sem continuar a esconder que não se


lembrava de nada. – Temos os nossos recursos – respondeu ele, pensando que não era mentira. – E o teu pai é um homem muito rico. – Não vivo às custas dele, pois não? – Não, mas estás habituada a viver bem. Os teus irmãos e tu viajam para onde querem e quando querem. Têm várias casas e apartamentos da família à vossa disposição. – Mas a casa da praia é nossa. Lembro-me dessa casa. – É de Damon. – Ah... – murmurou Lena, enquanto as lágrimas enchiam os seus olhos. – Pensei que era nossa.


– Passámos muito tempo lá ultimamente – explicou ele. – Tem uma piscina coberta que usaste muito para a tua reabilitação. – Ah... Trig pousou o guardanapo e levantouse de forma abrupta. – Vamos, já estou cheio e tens de descansar. Quando Lena tentou imitá-lo, bateu com a anca na mesa e encolheu-se. – Calma, não há pressa. – Nada funciona – sussurrou ela. – Funciona, sim, só que não é como esperavas. – Tenho bengala? – perguntou, agarrando-se ao braço dele enquanto se


dirigiam para os elevadores. – Sim. – Ofereceste-ma para que a usasse quando não estivesses presente? – Sim. – Foi o que imaginei. No elevador, Lena também não lhe soltou o braço. Faziam um bom casal no espelho, pensou Trig. No entanto, não podia aproveitar-se da amnésia dela. Queria que recuperasse a memória o quanto antes. – Devo ter uma personalidade excelente – comentou ela. – Porque dizes isso? – Olha para ti – indicou, olhando para o espelho. Quando Trig observou o seu reflexo,


só viu o mesmo homem corpulento que não fora capaz de proteger Lena. – Pareces um herói de ação – elogiou e, pensativa, franziu o sobrolho. – Não serás ator? – Não. – Atleta profissional? – Não. – Bombeiro? Dizem que esses tipos levantam pesos no seu tempo livre. – Onde ouviste isso? – És bombeiro? – Não. – O que fazes? – inquiriu ela, depois de um silêncio. – A tua mulher devia saber. – Trabalho para os serviços secretos


australianos. – A sério? És espião? – Tu também. Quando as portas do elevador se abriram, Trig pegou nela ao colo sem lhe dar tempo para protestar. Lena já andara o suficiente naquele dia. Contudo, talvez o fizesse porque precisava de a apertar contra o seu peito e fingir que estava tudo bem. – Pegas em mim ao colo com frequência? – quis saber, relaxando nos braços dele. – Sempre que posso. Lena encostou a cabeça no pescoço dele e respirou fundo, abraçando-o. – Lembro-me do teu cheiro. Trig desejou que a terra o engolisse.


Quando ela o beijou no pescoço, apertou-a um pouco mais contra o peito. – Porque te chamo Trig? – Porque te dava aulas de trigonometria no liceu. – Se precisava ajuda, isso quer dizer que não sou assim tão inteligente. – Depende da pessoa com quem te comparares. Eras a melhor da tua turma. O que se passa é que os teus irmãos são génios e isso fazia com que exigisses muito mais de ti própria para tentar estar à altura deles. – Não parece que seja uma pessoa muito segura de mim própria. Não era, reconheceu Trig. Sobretudo, depois de Timor. Todos na sua família


tinham de a convencer de que a amavam por quem era, pelo seu bom senso admirável e pela sua vontade de aço. Quando Trig abriu a porta, Lena observou as duas camas separadas. Ele decidira seguir o conselho do médico e vigiá-la durante a noite. Assim, pedira que voltassem a levar-lhe as malas para o quarto dela. – Não tem aspeto de ser uma suíte para lua de mel – comentou ela. – Sim... A respeito disso... – começou a dizer ele, interrogando-se se seria o momento adequado para a informar de que não eram casados. Ou talvez pudesse esperar até ao dia seguinte e rezar para que ela tivesse recuperado a memória.


– Às vezes, precisas de espaço para esticar a perna que te dói. Além disso, esta noite, com o golpe na cabeça e a tua perda de memória, será um alívio não ter de partilhar a cama comigo, não é? – Ah... – murmurou, sentindo-se perdida. – Aqui tens todas as tuas coisas – esclareceu, apontando para a cómoda. – Posso encher a banheira enquanto tomo um duche – ofereceu. – Não quero tomar banho. Tomarei um duche depois de ti e irei para a cama. Esta – indicou, escolhendo a que estava mais perto da janela. Trig assentiu, pôs a mala de viagem em cima da outra cama e tirou alguma


roupa limpa. Precisava de um duche e de se afastar de Lena. No entanto, ela chamou-o quando ia correr o biombo que separava a casa de banho do quarto. – Por favor, não – pediu ela, com ansiedade. – O que foi? – Podes fechá-lo, claro. Mas se não te importares de o deixar aberto... Sintome melhor se conseguir ver-te. O que podia fazer? Não o fechou. Entrou na casa de banho e tirou a roupa depressa. Não queria que Lena o observasse. E, sobretudo, não queria que se aproximasse dele e lhe tocasse. Por isso, entrou no duche antes de


abrir a torneira. Tentou afastar o medo e ganhar coragem. Naquela noite, podia dar a Lena o consolo e a segurança de que precisava. Já passara muitas noites ao lado dela no hospital e aquilo não era muito diferente. Fizera-o antes. Não tinha de se preocupar. Se esquecesse que ela pensava que era o seu marido...

Lena procurou entre as suas roupas enquanto o marido tomava um duche. Queria vê-lo quando saísse, molhado e nu. Aquela imagem devia estar gravada na sua mente, mas não era assim. Tirou o seu estojo de higiene pessoal


e abriu-o, olhando para o interior. Encontrou maquilhagem de marca e um frasco de perfume de rosas. Com a esperança de que avivasse as suas lembranças, cheirou o perfume e, pouco depois, veio-lhe à mente a imagem de uma mulher morena a rir-se com um tocado de plumas na cabeça. – Conheço alguém chamado Ruby? – perguntou ela. – A mulher de Damon – respondeu Trig, do duche. – É tua amiga. – Compra-me perfume? – Leva-te às compras, algo por que lhe estou muito agradecido. Talvez te tenha comprado perfume... Não tenho a certeza. – Porque lhe estás agradecido?


– Ruby pensa que as mulheres devem vestir-se para ser sensuais. E eu estou de acordo. Lena rebuscou na bagagem, onde só havia roupas confortáveis. Tirou umas cuecas brancas de algodão sem nenhuma graça. Que tipo de mulher usava aquela roupa interior na sua lua de mel? – Talvez devesses ter-te casado com ela. – Não. Não sabe fazer surfe. Nem consegue acertar com uma bala no centro de uma roda em movimento a meio quilómetro de distância. – E eu consigo? – Costumavas fazê-lo antes. Agora, é um pouco diferente – explicou, depois


de hesitar por um instante. Lena não conseguia lembrar-se disso, embora também não lhe parecesse muito exagerado o que o marido lhe contava. – Porque tenho todas estas cicatrizes? E porque tenho a perna magoada? As torneiras fecharam-se de repente. Trig espreitou. Pegou numa toalha e secou o cabelo e a cara, enquanto as gotas lhe jorravam pelos ombros. Lena não conseguia vê-lo abaixo da cintura... No entanto, adorava a ideia de que aquele corpo forte e bronzeado pelo sol era dela. Como conseguira atrair um homem assim?, questionou-se. – Não te lembras do que aconteceu à tua perna? – quis saber ele, enquanto


continuava a limpar-se, escondendo a parte inferior do corpo por trás da cortina do duche. – Não. – Deram-te um tiro. Numa missão. Há dezanove meses. Recuperaste muito bem, tendo em conta os prognósticos médicos. – Quais eram? – Uma cadeira de rodas. Oh, ena... – Melhor para mim. – Melhor para todos. Face ao olhar desiludido de Lena, Trig vestiu-se. Ela esperou que não se deitasse de pijama. – O duche está livre – indicou ele.


– Já vou – afirmou, percebendo a indireta de que devia lavar-se e livrarse do cheiro do hospital. – Mas não consigo encontrar a minha camisa de noite, que se usa em qualquer lua de mel. Onde a tenho? Trig abriu a boca e voltou a fechá-la. Abanou a cabeça. – Rasgaste-a? – quis saber, procurando sob a almofada. Trig continuou sem falar. – Talvez a empregada da limpeza a tenha levado para lavar – aventurou ele. – Ah... Quando Lena entrou no duche, pensou ouvi-lo gemer. Era culpa dela, sem dúvida. Estragara a sua lua de mel ao


ser vítima de um grupo de carteiristas. Só de pensar nisso, estava a começar a doer-lhe a cabeça e só queria deitar-se nos braços do marido e aninhar-se com ele para dormir. No dia seguinte, veria as coisas de outra maneira. Recuperaria a memória e poderia seguir em frente com a sua vida. Podia ter sido pior. Tinha a sorte de estar casada com um homem que sabia como tomar conta dela.

Trig pousou o portátil quando Lena saiu do duche, embrulhada numa toalha. Tirou uma t-shirt cinzenta e uns calções às riscas da mala e voltou para a casa de banho.


Trig agradeceu por ela não se despojar da toalha à frente dele e continuou a ler as notícias locais. Podia ser-lhes útil e servia-lhe de distração enquanto Lena se preparava para a cama. Esses preparativos incluíram pôr creme em cada milímetro de pele. Também escovou o cabelo e fez uma trança comprida e solta, enquanto os seios subiam e desciam com suavidade ao mexer os braços. Trig não pôde evitar desejar desfazê-la. No fim, Lena deslizou sob os lençóis, mas não se deitou a dormir. A tortura continuou, ajeitando as almofadas, esticando o edredão...


– Vais demorar muito? – perguntou ela, olhando para ele com um olhar de convite. – Porquê? – conseguiu dizer ele e pigarreou. – A luz incomoda-te? Ainda tenho trabalho para fazer, mas posso apagar a luz – ofereceu. – O teclado ilumina-se sozinho. – Sei que, às vezes, dormimos em camas separadas, mas podias dormir aqui comigo quando acabares? – Sim, claro – aceitou, jurando não se deitar até ela adormecer. A tentação era muito forte. Lena recostou-se na almofada com a cabeça inclinada para não se magoar onde tinha a contusão. Emitiu um


pequeno suspiro que só serviu para aumentar a ansiedade de Trig. – Estás bem? – inquiriu ele, de mau humor. – No Céu. – Fecha os olhos. – Porquê? – Dizem que dormimos melhor com os olhos fechados. – Está bem. Posso fechá-los se vieres abraçar-me. Como podia negar-se? Trig deitou-se ao lado dela, sem se meter sob os lençóis, e afastou-lhe o cabelo da cara. Ela sorriu. Então, quando lhe acariciou a face com o polegar, ela deixou escapar um pequeno murmúrio de prazer, virando o rosto


para ele. – Preciso de um beijo de boa noite – pediu ela, com os olhos semicerrados. – É melhor se mo deres antes de dormir. Estava ferida. Podia fazê-lo, pensou Trig, dando-lhe um beijo nos lábios. Durou menos de dois segundos. – Isso não é um beijo. – É, sim. – Não é um beijo de lua de mel. – Isto é uma pausa na nossa lua de mel. – Que pena. – Tens de melhorar, primeiro. E recuperar a memória. – Não me lembro dos teus beijos – admitiu ela e acariciou-lhe os lábios


com a ponta dos dedos. – Quero lembrar-me. Trig nunca a beijara na boca antes. Só nas faces. – Só um – rogou ela, olhando para ele nos olhos. – Lena... – Não é todos os dias que uma mulher tem a oportunidade de receber o seu primeiro beijo. – Não te lembras de nenhum beijo? – Não. Dá-me o primeiro. Um, dois... Bolas! Trig beijou-a devagar, contendo o seu desejo. Não usou a língua, só apertou os lábios contra os dela. Eram tão suaves e quentes... Então, Lena tocou-lhe com a ponta da


língua e fê-lo abrir os lábios. Ambas as línguas se entrelaçaram, enquanto ele tentava conter a paixão que crescia no beijo. No entanto, as suas bocas pareciam encaixar na perfeição. Tanto que ele não teve outro remédio senão fazer o que sempre quisera: render-se e entregar-se.

Lena não conseguia acreditar que esquecera os beijos daquele homem. Eram tudo o que sempre imaginara de um beijo, primeiro lento e doce, depois, cheio de desejo e paixão. Era perfeito. Era um homem grande e o seu corpo parecia pedir que o explorasse, pensou,


enquanto lhe mordiscava o queixo. Trig gemeu como resposta, tremendo. Então, quando ela começou a beijar-lhe o pescoço, praguejou, apertando-a contra o seu peito. – Agora, lembro-me porque me casei contigo – sussurrou-lhe ela ao ouvido. – Lena... – Sim? – Lena, por favor – rogou ele, como se estivessem a torturá-lo. – Tens de parar. Para. Por favor. A súplica só alimentou a excitação de Lena, que se questionou o que mais podia pedir-lhe. Também gostaria de pedir outras coisas, se tivesse a coragem necessária. Trig beijou-a outra vez, como se


quisesse devorá-la e, imediatamente, saiu da cama como um raio. Pegou no telemóvel e calçou os sapatos. – Tens de recuperar – murmurou ele e abriu a porta para sair. – E eu tenho de fazer algumas chamadas.


Capítulo 6

Trig percorreu o corredor, esperando que Damon atendesse. Não queria falar com ele, mas com a esposa, Ruby. No entanto, havia um protocolo a seguir quando se ligava para a esposa de outro homem a meio da noite e ele queria cumpri-lo. – É melhor teres uma boa razão para ligar – declarou Damon, assim que atendeu. – Tenho, sim. Quero falar com Ruby. Preciso do conselho dela.


– Sobre o quê? – Não queres saber. – Quero saber. – A tua irmã caiu hoje e bateu com a cabeça. – Vou pôr em mãos livres – avisou Damon, num tom de preocupação. – Fizeram-lhe um exame e dizem que não é grave. Deram-lhe alta, mas tem uma boa contusão e perdeu a memória – explicou Trig e fez uma pausa, procurando as palavras para dar a notícia seguinte. – Pensa que somos casados. Trig ouviu uma gargalhada camuflada do outro lado da linha. – E como é isso? – quis saber Ruby.


– Lena não tinha nenhuma documentação quando a internaram e eu tinha. Foi mais fácil dizer que era a minha esposa. O que se passa é que não se lembra de nada. Nem sequer sabe quem é Jared. Pensa que estamos em lua de mel. Está no quarto. Quer que durma com ela! Sabes há quanto tempo quero fazê-lo? – perguntou Trig, nervoso. – Se tocares na minha irmã nessas condições, terei de te matar – avisou Damon. – Não o ameaces – repreendeu-o Ruby. – Assim, não vais ajudar. – Não tens de me ameaçar – indicou Trig. – Se lhe tocasse agora, também não me perdoaria. Mas não para de me


pedir para a abraçar, Ruby. Quer que lhe dê segurança. Pensa que é a minha mulher. O que posso fazer? – Abraça-a, idiota. – Sim, idiota – acrescentou Damon. – E se não recuperar a memória? E se acordar de manhã e continuar a pensar que é a senhora Sinclair? – Compra um anel – sugeriu Ruby. – Que conselho... – Trig, querido, se Lena continuar a pensar que está casada contigo amanhã, vem para a casa da praia ter connosco. Não lhe digas que não são casados. E trá-la para casa. Esse é o meu conselho. – Posso fazê-lo. – Sabemos que podes. É por isso que ninguém está a dar voltas ao quarto


como um lunático – afirmou Ruby, a modo de indireta para o marido. Depois, o tom suavizou-se. – Adrian, querido, dá um abraço a Lena se precisar disso... Ninguém vai castrar-te por isso, nem sequer ela quando recuperar a memória. Só deves ter cuidado para não perderes o controlo. Diz-lhe que queres esperar até estar recuperada antes de terem relações sexuais. É a verdade, não é? Deve ser a razão por que não te aproveitaste da situação. – Bom, também há o meu medo da rejeição. – Isso aconteceu a todos – indicou Ruby, num tom seco. – Não tens nada de especial.


– Não sou especial. – Mas és um homem que merece ser amado – apressou-se a esclarecer Ruby. – O facto de não deveres aproveitar-te da situação agora não significa que não tentes alguma coisa com ela depois. Todos queremos que o faças. – Ah, sim? – quis saber ele. Nunca falara dos seus sentimentos por Lena com nenhum dos irmãos dela, mas valorizava muito a sua aprovação. – Falas por Damon também? – Sim – disse Damon. – E por toda a família. – Isso inclui Jared? – Não sei. Jared não está aqui – indicou Damon.


– Sugiro que deixes que Lena se ocupe de convencer Jared, no caso de ele ter objeções – indicou Ruby. – Ele está em dívida com ela. – Porquê? – Por ter desaparecido. Por ter posto a vingança acima da família – afirmou Ruby, num tom frio. Acontecera o mesmo com o seu pai, que desaparecera sem deixar nem rasto. – Castigaremos Jared quando voltar, por se ter portado mal. – Aviso-te de que Jared não gosta de reprimendas – avisou Trig. – Foi o que ouvi – replicou Ruby e bocejou. – Bom, quero que me reserves um


lugar na primeira fila para presenciar o teu primeiro encontro com ele – pediu Trig, sorrindo. – Põe-te na fila – interveio Damon. – Cuida da minha irmã. Confio em ti.

Mais tranquilo, Trig regressou ao quarto e fechou a porta atrás dele sem fazer barulho. Respirando fundo, tentou reunir os nervos de aço que todos os outros pareciam acreditar que tinha. Dirigiu-se para a cama onde estava Lena, ferida, confusa e... A dormir profundamente.


Capítulo 7

A terça-feira de manhã começou com o som do muezim. Estava em Istambul, com as suas mesquitas, o seu legado cultural rico e os seus carteiristas, pensou Lena. Doía-lhe a cabeça... Era hora de tomar mais analgésicos. Ali estavam, na mesa de cabeceira, ao pé de um copo de água. Depois de os tomar, voltou a deitarse, com cuidado para não se apoiar na parte da cabeça que magoara e ali estava Trig, ao seu lado. Parecia mais


jovem quando estava a dormir e o corpo dele parecia ainda maior ao vê-lo de perto. Continuava a ser o homem mais bonito que vira. Incapaz de resistir a tocar nele, pôslhe a mão no peito. Se esperasse cinco ou dez minutos, talvez a dor de cabeça desaparecesse e conseguisse acordá-lo como uma mulher devia acordar o marido durante a lua de mel, pensou ela. No entanto, naquele momento, a única coisa que pôde fazer foi apoiar a face no ombro dele. Então, Trig virou-se para ela e abraçou-a. Missão cumprida e, com um suspiro suave e sonolento, adormeceu novamente.


Lena continuou à espera que a dor desaparecesse. Até adormecer também.

Trig acordou com Lena abraçada a ele. Madeixas do cabelo preto e encaracolado faziam-lhe cócegas no queixo. Ela mexeu-se e apertou-se ainda mais contra ele. – Lena... – sussurrou Trig, percebendo que tinha uma mão apoiada na cintura dela. – Lena, tenho de me levantar. – Não. – Sim – insistiu ele, beijou-a com suavidade no ombro e afastou-se dos


braços dela. – O que queres comer ao pequeno-almoço? – Quero-te a ti. Lena continuava com os olhos fechados. Abraçou-se à almofada dele e, provavelmente, não estava suficientemente acordada para se aperceber do que dizia. – E um pouco de iogurte e chá – murmurou ela. – Como os que me trouxeste ontem. – Então, lembras-te. – O chá era bom. – Sobre sermos marido e mulher... – Eu sei – interrompeu-o ela. – Quem quer ter uma esposa que perde a memória no seu primeiro dia de lua de mel? Sou um desastre. Mas vou


compensar-te, prometo. Pensei em ir às compras. As esperanças que Trig albergara de que Lena tivesse recuperado a memória de manhã desapareceram de repente. – Penso que tens de descansar – afirmou Trig, pensando que, enquanto isso, compraria os bilhetes de regresso. – Podes ir às compras noutro dia. – Enganas-te – recusou-se e olhou para ele com olhos semicerrados. – Viste as roupas que tenho na mala? Parecem de funeral. Penso que me enganei na mala. – Tens uma mala para funerais? – Deve ser. Não há outra explicação. – Consigo pensar numa. Queres que te


diga? – Não. Quero ir às compras. E comer iogurte. E bolos. Muitos bolos. Estou cheia de fome. Trig também tinha fome. – Lena, lembras-te de onde estamos? – Em Istambul. – Sabes porque estamos aqui? – Estamos em lua de mel. Muito bem, pensou Trig. Estava na hora de fazer outra visita ao hospital. – Queres que te traga mais alguma coisa? – Sim. Morangos e champanhe.

Cinco horas depois, o médico declarou que o inchaço na cabeça de


Lena reduzira e Trig declarou que a memória dela melhorara. Falara de Damon, Poppy e do pai. Falava de Jared e das coisas que tinham feito juntos no passado. Porém, não se lembrava do que se passara em Timor, nem da recuperação longa e tortuosa, nem que Jared desaparecera à procura de quem os traíra. Continuava a pensar que era a senhora Sinclair. O médico proibiu-a de fazer viagens de avião naquele momento, mas nem tudo estava perdido. Também proibiu o sexo. – Entendido – dissera Trig ao médico. – Não haverá sexo. Muito descanso.


Ordens do médico. Então, quando Lena olhara para ele com olhos acusadores, a situação teria sido engraçada e aduladora para Trig, se não fosse tão trágica. Ao regressar ao hotel, ela dormiu uma sesta de duas horas e, depois de acordar, decidiu que estava farta de estar no quarto. Queria ir dar um passeio pelo hipódromo que havia junto da Mesquita Azul. – Tem alguma coisa a ver com a lua de mel? – perguntou Trig, com desconfiança. Ele queria evitar qualquer coisa relacionada com o assunto. – Não, tem a ver com fazer turismo. – O médico disse que tinhas de descansar.


– E já descansei. Agora, preciso de fazer alguma coisa. – O passeio vai cansar-te. – Nesse caso, o que achas de um banho turco? Água quente, relaxação. Ouvi dizer que até fazem massagens. – Adoras água. Lembras-te? – Penso que sim. E também que fiz muita reabilitação para a perna numa piscina – afirmou ela e franziu o sobrolho. – Disseste que me deram um tiro em serviço. Não me lembro de nada disso. – É melhor para ti. – Podes descrever o que aconteceu? – Não. Lena lançou-lhe um olhar assassino e,


quando ele pensava que ia insistir, ela limitou-se encolher os ombros e a tirar um fato de banho da mala. – O que preferes? Banho turco ou ser interrogado sobre o que aconteceu? Foi assim que acabaram numa casa de banhos turca. Trig foi conduzido através da porta do vestiário masculino e Lena foi para o feminino. – Espera por mim quando saíres! – ordenou ele, contrariado. – Não o faço sempre? Ao pensar bem, Trig surpreendeu-se por perceber que a resposta era sim. Sorriu. – Lembra-te. Descanso e relaxação – indicou ele. – Estou a tratar disso.


No vestiário masculino, um homem mostrou-lhe o duche. – Deve tomar banho primeiro. Depois, esta porta vai levá-lo à zona de banhos. Trig assentiu, olhando para as fotografias dos banhos que havia nas paredes. Salas de mármore com cascatas de água. Grandes banheiras de pedra onde as bolhas da água obravam maravilhas. Muito vapor. O programa de fisioterapia de Lena incluíra exercícios na água e, mesmo que não se lembrasse, um banho quente e uma massagem iam fazer-lhe bem. Trig tomou banho e guardou a roupa no cacifo. Segundo parecia, não era


necessário vestir fato de banho, conforme dizia a placa de instruções que havia junto da porta. A primeira coisa que chamou a sua atenção ao entrar na zona de banhos foi o teto alto e abobadado e as paredes de azulejos. O segundo foi Lena a entrar por outra porta na parede oposta da sala. Porque havia vestiários separados se a zona de banhos era mista? Como ele, Lena só tinha uma diminuta toalha quadrada para a cara. Não havia mais do que meia dúzia de pessoas por baixo da cascata ou a flutuar na água. Nem homens, nem mulheres pareciam prestar muita atenção uns aos outros. Não importava. Lena estava nua e


queria cobrir as cicatrizes com o pequeno pedaço de tecido. Trig aproximou-se dela sem hesitar e deu-lhe a toalha dela. – Toma. Usa a minha. – Como? É muito pequena – indicou ela. – Entra na piscina! – ordenou ele. Pelo menos, a água podia protegê-la um pouco dos olhares que começavam a pousar neles. – Deviam ter-nos dito que era um banho misto quando entrámos. Lena começou a descer as escadas, agarrada ao corrimão com força. – Relaxa. Eu gosto – assegurou ela. – Tens a certeza de que não queres a toalha? Talvez precises da tua e da


minha para te tapares, porque a maioria das mulheres e alguns homens estão a olhar para ti e a salivar – indicou e percorreu-o dos pés à cabeça com o olhar. – A verdade é que os compreendo. Há muito para admirar. Trig seguiu-a para a água a toda a velocidade. Nunca fora tímido com o seu corpo, mas... – Tapa-te com as toalhas. Porque estás tão tranquila? Não te incomoda que todos te vejam? – Estou muito ocupada a observar-te – confessou, com um sorriso. Então, afundou-se na piscina. – Ai, que agradável! – Não seria mais agradável se não estivesses... Nua?


– Adrian Sinclair – queixou-se, num tom carinhoso. – Tens vergonha? – Parece que sim – reconheceu ele, metendo-se na água, que tinha uma temperatura deliciosa. – Também me sinto muito possessivo contigo. E penso que devias tê-lo em conta se o massagista te propuser uma massagem – sugeriu, olhando para o massagista em questão, que estava ocupado com um cliente deitado numa mesa de mármore. – Talvez devesses deixar isso para outro dia, porque, se te esfregar com muita força e magoar as cicatrizes, vou ter de lhe arrancar os braços. – Tenho a certeza de que sabe fazer o seu trabalho.


Ambos observaram como o massagista esfregava uma toalha escorrida nas costas da outra pessoa e com muito pouca suavidade. – Talvez deixe as flagelações para outro dia, sim – cedeu Lena, finalmente. Naquele momento, o massagista atirou um balde de água à pessoa que massajava. – Não esperava aquilo – adivinhou Lena, vendo como o homem se levantava, assustado. Então, o massagista atirou-lhe outro balde ao peito. – Sabes que é água fria? – Sim. – Agora, vais contar-me porque tenho tantas cicatrizes? – perguntou, com um


sorriso. – Estou pronta para o ouvir. Preocupa-me não conseguir recordar, para o caso de ter tido a culpa do que aconteceu. – Não tiveste culpa. – Podes explicar-me um pouco melhor? – Não quero falar disso. – Trig, quando me olho ao espelho, vejo as cicatrizes e sinto a dor, mas não sei de onde vêm. É muito perturbador. Eu gostaria de saber. Entendo que não seja uma lembrança agradável para ti, mas... Por favor... Trig esfregou a cara. Não era capaz de resistir a uma súplica de Lena. – Estávamos numa missão de reconhecimento em Timor. Tinham


mudado os planos no último momento e pediram-nos para examinar um velho laboratório de armas químicas que devia estar abandonado há três anos. Fomos com cuidado, como fazemos sempre, e encontrámo-lo cheio de teias de aranha e pó. Não tinha pegadas nem rastos de ter estado a ser usado. Não havia nada sobre as mesas, nem nos armários. O sítio estava limpo – contou Trig. – Quando saímos, de repente, começaram a disparar sobre nós com metralhadoras. Acertaram-te. Não sei porque disparavam, pois não havia nada ali para proteger. Se tivessem demorado mais dois minutos a chegar, já não estaríamos lá.


– Capturámos o atirador? – Não. – Temos ideia de quem foi? – Não. E nenhum grupo terrorista o reivindicou. Ninguém falou daquele incidente, nem apareceu na imprensa. O caso foi arquivado como o ataque fortuito de um rebelde. – Não pareces convencido com esse veredicto. – Não. Penso que há mais. Jared está a investigar. Lena assentiu. Trig esperou. No entanto, ela não pareceu recordar que estava na Turquia para procurar o irmão. – Penso que vou fazer a massagem –


afirmou, apoiando a cabeça na beira da piscina com os olhos fechados. – Só tenciono abrir os olhos para ver como te atiram um balde de água fria. Não quero perder isso. – Os teus olhos nunca verão isso. – Bom, não importa. Gostaria que usasses uma aliança para poder provar que me pertences. Quando vamos comprá-las? Tenho algumas ideias sobre o que gostaria de comprar. – Ah, sim? – Sim. E encontrei uma carteira cheia e alguns cartões de crédito na minha mala, em nome de Lena West. Penso que posso pagar as alianças. – O cavalheiro paga, Lena. – Desde quando?


– É uma regra. – Seguimos sempre as regras? – Sempre. De que tipo de aliança gostarias? – De platina lavrada. Larga. – Com diamantes? – Não. – E se te oferecer um anel de noivado de diamantes? – Não devia ter um? – perguntou ela, franzindo o sobrolho. – Eu gostaria de conseguir recordar como me pediste em casamento. Quero saber como conseguiste escapar sem me dar um anel. – Talvez te tenha prometido o mundo em vez disso. – E a lua e as estrelas?


– Também. E os anéis de Saturno. – Típico – troçou. – Pediste-me em casamento à luz da lua? Naquele momento, Trig tomou a decisão de fingir e aceitar as consequências. – Estávamos na praia, a ver como as tartarugas saíam dos ovos e voltavam para o mar. Era uma noite muito estrelada. – Entendo. Podia pedir que gravassem uma tartaruga no meu anel – murmurou ela, depois de uns segundos. Ou não, pensou ele. – Ou a data. Ou não, repetiu-se ele. – Em que dia nos casámos?


– No dia vinte e oito de novembro. – Estou casada há uma semana? – perguntou, com um sorriso sedutor. – Vais ter de me levar para a cama depressa, porque me sinto mal por não conseguir recordar a nossa noite de núpcias. – Não penses nisso. Não tens culpa. – Não me lembro de termos tido sexo antes de nos casarmos. – Lena, por favor, podemos parar de falar disso? Estou nu num banho público e não sou de pedra. – Queres que te devolva a toalha? – Não! Vais precisar dela para te tapares, quando saíres da água. – Não gostas disto, pois não? Não


estás relaxado. – Talvez se parássemos de falar... Lena ficou calada durante menos de cinco minutos, tempo suficiente para Trig tentar convencer-se de que conseguia continuar com aquela farsa sem perder a cabeça. – Gostarias que fosse de platina? – quis saber ela. – Sim – afirmou ele e não era mentira. – Podia ter uma onda gravada, decorada com pequenas safiras da cor do mar. – Sim. – Talvez possamos falar com um designer de joias. – Talvez – acedeu. – Estás cansada? Eu estou.


– Isso é por causa da água quente. Posso fazer-te mais uma pergunta? – Dispara. – É dia quatro de dezembro e estamos na nossa lua de mel na Turquia. Quanto tempo vamos estar aqui e onde vamos passar o Natal? – Isso são duas perguntas – observou ele. E não conhecia a resposta para nenhuma. – Duas semanas de lua de mel... Ainda que, se não recuperares a memória, tenhamos de encurtar a viagem e tenha de te levar para casa o quanto antes. Lena não disse nada. – Falo a sério. – Eu sei. Consigo perceber pelo teu


tom de voz – indicou e começou a traçar círculos com a mão na água. – Cada vez me lembro de mais coisas. Lembro-me de que tentava igualar-vos, a ti e a Jared, quando era pequena e me zangava porque eram mais fortes e mais rápidos. E lembro-me de que quis arrancar os olhos a Jessica quando a convidaste para o baile de graduação. – A sério? – Lembro-me como se fosse ontem. Foi a primeira vez que te vi com fato e gravata e não sabes como me excitou. Quanto a Jessica, tinha um corpo lindo, o cabelo comprido e não parava de sorrir. Só tinha olhos para ti. – Sim, Jessica era uma boa rapariga e muito atenciosa – comentou ele. O


problema fora que ele não quisera levar as coisas mais longe no fim daquela noite. – Certamente, continua a ser. – Sou uma esposa ciumenta. – Tu também és muito atenciosa – outorgou ele. – Sim? Lembro-me de que gosto muito de ganhar. – Isso é verdade. – E que sou má perdedora. – Não gostas de mostrar a tua fraqueza à frente dos outros – reconheceu ele. – Odeias quando acontece. – Quem não é assim? – Apoiar-te noutra pessoa quando precisas não significa que sejas fraca.


Só quer dizer que és humana – indicou ele, falando com uma sinceridade que nunca se atrevera a partilhar com ela. – Às vezes, gostaria que aceitasses mais a ajuda dos que te amam. – Não quero depender dos outros para tudo. – Não digo que quero atar-te os sapatos. Mas, se estás a sofrer com as limitações do teu corpo e se tens medo de ficar para trás, qual é o problema de pedir ajuda? – E o que posso dizer? Leva-me ao colo? – Algo parecido. – Já me levaste ao colo algumas vezes. – Sim.


– Não entendes que, se me apoiar nos outros, a minha autoestima se ressente? A última coisa que quero é ser um fardo para ti. – Não é isso. Trata-se de dar e receber ajuda. – Sim, Adrian, sim. Mas diz-me uma coisa. Alguma vez alguém te levou ao colo?

A conversa tornara-se demasiado séria para Lena, que tentava com desespero que Trig entendesse os seus sentimentos a respeito de precisar dos outros para coisas que devia conseguir fazer sozinha.


Confiava nele. Confiara nele no dia anterior e deixara que a levasse ao colo. Até gostara. Também estava a confiar nele naquele momento, a pedir-lhe ajuda e a desfrutar da sua companhia. Que outra coisa podia fazer? Passaram mais uma hora na piscina quente e sob a cascata, embora rejeitassem a oferta do massagista. Uma hora e vinte minutos depois, saíram para a rua novamente, limpos e a cheirar a rosas. Lena adorava aquele cheiro, nela e em Trig. Sentia-se mais leve do que em muito tempo. – Andas melhor – observou ele. – Eu sei – confirmou ela. «O meu


marido não deixa escapar nada», pensou. – Adoro os banhos turcos. Sei que te sugeri que fôssemos ver alianças depois disto, mas estou a mudar de ideias. Estou cansada – admitiu, fazendo um esforço para reconhecer a sua fraqueza. – Estou com dores de cabeça e gostaria de me aninhar na cama com um prato de fruta e um filme. – Lena West, admites que não tens forças para ir às compras comigo? – Sim. E espero que te lembres de que não me chamo Lena West, mas Lena Sinclair. Mandaram parar um táxi para ir para o hotel e, quando chegaram, pediram que lhes levassem bolos, fruta, café e chá. O corredor que conduzia ao quarto


desde o elevador era muito longo. A meio caminho, Lena decidiu que podia aceitar um pouco de ajuda. Sobretudo, se isso envolvesse estar mais perto daquele marido tão bonito e que cheirava tão bem. – Ai – queixou-se e parou. – Preciso de ajuda. – Com o quê? – Se me levasses ao colo, chegaríamos mais depressa ao quarto. Estou desejosa de chegar. – Estás desejosa, eh? Com um sorriso radiante, Trig pegou nela ao colo. – A tua autoestima está ressentida, princesa?


– Não, sinto-me muito confortável. – Criei um monstro. – A verdade é que pedir ajuda não é assim tão mau – reconheceu ela. – Neste momento, no entanto, sinto-me com falta de ar. Talvez precise de respiração boca a boca. Trig levou-a para o quarto. E beijou-a com paixão. A comida chegou dez minutos depois, durante os quais Trig fez o possível para não se deitar com ela. Ofereceu-se para lhe encher a banheira, abriu o seu portátil e leu algumas mensagens de correio eletrónico, bebeu duas chávenas de café e olhou para as paredes como se quisesse subir por elas. No processo,


Lena começou a sentir-se cada vez mais nervosa. – Recebi uma mensagem do teu irmão – informou-a ele. – De Jared? – De Damon. Diz que nos reservou lugares num voo que sai dentro de três dias. Lena olhou para o marido nos olhos. – E se tiver recuperado a memória? – Suponho que iríamos a Bodrum. – O que há em Bodrum? – Barcos – indicou, depois de um segundo de hesitação. Pela primeira vez desde que recuperara a consciência depois do golpe na cabeça, Lena questionou-se se o marido estava a mentir.


– Não penso que tenhamos viajado para tão longe por algo que temos de sobra no nosso país. – Também podemos mergulhar. – Estamos a falar do Bósforo. Também não é assim tão maravilhoso para mergulhar. – A tua geografia não está nada mal – murmurou ele. – Deve ser um bom sinal. – Preocupa-te muito que recupere a memória, não é? – adivinhou ela, deixando-se levar pelo seu sexto sentido. – Nada disso – contradisse, baixando o olhar. – Discutimos? – Discutimos muito. Normalmente,


sem razão. – Portanto, tivemos uma discussão. – Eu não diria isso. – Há algo que não queres dizer-me. Há algo que não sei? Frustrado, Trig passou a mão pelo cabelo. – Não sei o que sabes ou não. Há coisas que a tua mente está a bloquear. – Coisas más? – Sim. E não sei se devia contar-te mais neste momento. Prefiro esperar que recuperes a memória sozinha. Oxalá amanhã acordes e tentes partir-me o queixo, porque assim saberia que és a mesma de sempre. – Deve ter sido uma boa briga. – Não tivemos uma briga.


– Porque não consigo lembrar-me do dia do nosso casamento? Porque estou a bloquear isso? – inquiriu ela, nervosa. – Foi um mau dia? A nossa noite de núpcias foi um desastre? – Que Deus me ajude... – Diz-me! – Não. – Não queres dizer-me ou não foi um desastre. – Não foi um desastre. – Temos fotografias do nosso casamento? – insistiu ela, pensando que não vira nenhuma no portátil dele. – Não sei. Fomo-nos embora depois... da cerimónia – afirmou ele. – Lena, podes esquecer o assunto, por favor?


– Não posso – admitiu ela, baixando o olhar. – Não me lembro do nosso casamento, nem de quando me pediste em casamento, nem de como é estar contigo. É o que mais quero recordar. Parece-me... Uma falta de respeito não conseguir lembrar-me. Quem se esquece do seu próprio casamento? – Não é uma falta de respeito. – Damo-nos mesmo bem? Não estaremos prestes a divorciar-nos depois de uma semana? – Não – resmungou ele. – Não, Lena. Tenho de sair para dar uma volta. Estou a enlouquecer. – Vais buscar as alianças? – O quê? – perguntou, desmoralizado


por completo. – Podias ir às lojas. Gostas disso. – Eu... Não tinha pensado nisso. – Podias fazê-lo? Por favor – suplicou ela, cheia de ansiedade. Pedira-lhe para não esconder os seus medos. – Seria algo sólido a que me agarrar quando não consigo recordar. Algo real. Trig ficou muito quieto e muito sério. – Tens a certeza de que não preferes esperar até recuperar a memória? – perguntou ele, num sussurro. – Não quero esperar. Se quiseres que vá contigo, posso fazê-lo amanhã, mas não quero esperar. Sei que escolherás bem. – Vou dar uma vista de olhos – cedeu,


finalmente, depois de passar uma mão pela cara num gesto de desespero. Depois, passou-lhe o computador para que se entretivesse e saiu pela porta. Lena respirou fundo ao vê-lo a ir-se embora. Bolas! Desejava conseguir recordar que problema havia entre eles. Porque sabia que alguma coisa estava mal e não sabia como solucioná-la. Inquieta, abriu a pasta de música do computador. Depois, rebuscou entre as fotografias e encontrou muitas dela com Trig e Jared... Na maioria, a praticar algum desporto de risco. Também havia fotografias de Poppy e dela numa casa muito elegante que adivinhou que


pertencia ao pai. E uma imagem de Damon a dar aulas de surfe a uma ruiva exuberante que devia ser Ruby. Estava a recuperar a memória, a pouco e pouco. Quando acabou com as fotografias, perdeu-se na coleção de vídeos de Trig. Havia alguns de corridas de carros que não lhe interessaram. Uma gravação de surfe de que gostou. Uma aula de culinária. E séries de televisão sobre um circo e sobre tipos com poderes sobrenaturais. Quando Trig chegou quatro horas depois, Lena continuava a ver a série sobre o circo. Adormecera algumas horas. A luz do dia fora-se embora e a escuridão banhava o quarto.


– Vejo que relaxaste um pouco – comentou ele, com um sorriso. – Ordens do médico – afirmou ela. – Sabes que já tinhas visto esta série? – Para mim, é tudo novo. E estive a pensar que aconteceria o mesmo com o sexo. É como se fosse virgem outra vez. – Não fales disso – avisou, apontando para ela com um dedo. – Pensa nisso. Mal fui beijada. Os meus seios nunca foram tocados... – Lena! – Adoro quando te zangas – brincou ela e recostou-se nas almofadas. – Não vai haver sexo. Ordens do médico. – Mas estamos na nossa lua de mel! –


protestou ela. – O que se passa é que te aborreces. – Entretém-me – pediu ela. – O que fizeste lá fora? – Bom, ir às compras na Turquia é uma experiência estranha e temos de rezar quando entramos num táxi. Desta vez, o condutor chamava-se Boris. – Sabias onde encontrar alianças? – Claro que sim. – Encontraste alguma de que gostasses? – Queres vê-las? Lena levantou-se imediatamente. Claro que queria vê-las. Trig tirou uma caixinha de veludo do bolso das calças e atirou-a para a cama. Lena olhou para ela com excitação.


– Obrigada pela entrega rápida, mas não devias ajoelhar-te e pôr-me a aliança no dedo? Por favor. Volta a pedir-me em casamento. – Não chega pensares nas tartarugas na praia? – Por favor. Então, quando Trig se ajoelhou, olhou para ele com falta de ar. – Está bem – acedeu e pigarreou. – Consigo fazê-lo. – Um momento – pediu ela. Arranjou o cabelo e endireitou as costas. – Estou pronta. – Pelo menos, um dos dois está. – Leva o tempo que precisares. – Conhecemo-nos há muito tempo –


começou a dizer ele, com a respiração entrecortada. – Também te amo há muito tempo. És a mulher dos meus sonhos. Não há nenhum sítio onde gostasse mais de estar do que ao teu lado. Lena Aurelia West... Queres casar-te comigo? – Sim – afirmou ela, com lágrimas nos olhos. – Sim. Eu também te amo. Trig respirou fundo. Lena apercebeuse de que estava muito nervoso. – Porque estás a tremer? Sabias que ia dizer que sim – quis saber ela. Depois de deixar o computador de lado, agarrou no braço do marido e fê-lo sentar-se na cama. – Foi muito bonito. Quero que o faças outra vez. – Uma vez foi suficiente. – Quererás dizer duas vezes. Esta foi


a segunda, recordas? – Sim. – Estás pálido. – Deve ser de medo. Trig pegou na caixa, abriu-a e segurou em três alianças na palma da mão, duas mais pequenas e adornadas do que a terceira. Lena pegou numa das pequenas. Era de platina, com uma onda lavrada à volta. A outra era igual, embora a onda tivesse safiras. Ficavam-lhe na perfeição. – São o que querias? – Sim – concordou. Deviam ter-lhe custado uma fortuna, pensou. Depois, Lena pegou na terceira, a


maior. Era de platina, como a dela, mas lisa. Observou-a antes de a pôr no dedo de Trig. – Fica-te muito bem – murmurou ela. – Disse-te ultimamente como gosto das tuas mãos? – O quê? – As tuas mãos. Enlouquecem-me há muitos anos. – Quantos? – Lembras-te daquele gatinho que encontrámos preso num esgoto? – Sim e lembro-me da mãe, que nos encontrou dois minutos depois. Mordeume. – Sim – confirmou Lena, sorrindo ao lembrar-se dos detalhes. – És muito cuidadoso, embora sejas grande. Foste


cuidadoso com o gatinho, mesmo quando a mãe te mordeu. Foi então que me apaixonei pelas tuas mãos. Quando o marido corou, Lena sorriu ainda mais. – És um homem muito bonito, por dentro e por fora. Gostaria de recordar o que fiz para te merecer, porque quando olho para mim... Adrian, posso fazer-te outra pergunta que não vais querer responder? É uma grande pergunta, que não me deixa em paz. – Posso reservar-me o direito de não responder? – Quando me deram um tiro... Tenho muitas cicatrizes... Ainda posso ter filhos?


Trig não teve de falar. Os olhos dele responderam por ele. Lena assentiu, mordendo o lábio com força. – Está bem – replicou, num murmúrio. – Céus, não sei o que vês em mim. – Não digas isso! – protestou ele, imediatamente. – Porque dizes essas coisas? És a mulher da minha vida. Sempre foste e, se quiseres ter filhos, talvez possamos adotar algum. Concordo com o que decidires. Promete-me que nunca te esquecerás. E promete-me que não vais esquecer-te de como estamos agora. Lena sentou-se ao colo dele, abraçouo com braços e pernas e beijou-o. – Faz amor comigo – rogou ela, num


sussurro. Ansiava fazê-lo dela. – Podemos fazê-lo devagar. Penso que o médico não se oporá. – Não podemos – negou ele, beijando-a no pescoço. – Não posso. Primeiro, deves recuperar a memória. – Para isto? – perguntou ela, enquanto lhe causava calafrios de prazer, beijando-o na clavícula com delicadeza. – Podemos construir novas lembranças juntos. – Lena, o médico disse que não devemos fazê-lo. Tens o costume de ignorar as ordens do médico. – E é mau? – Não costuma trazer boas consequências. – Ah...


Trig apoiou-se na cabeceira, com Lena ainda sentada em cima dele. Enquanto lhe acariciava as costas, ela balançou-se com suavidade sobre as pernas dele. – Como vais tratar disso? – inquiriu ela, referindo-se à ereção dele. – Isso pode esperar. Estou habituado a sofrer. – A sério? – Parece que sim – confirmou, acariciando-lhe a nuca. – Amanhã. Vejamos como te sentes amanhã.

Trig não conseguiu dormir. Como ia dormir perdido no cheiro da mulher que


amava e com o coração partido por todas as mentiras que lhe contara. Embora não fosse um engano. A sua proposta de casamento fora sincera. Falara dos seus sentimentos mais íntimos e só podia esperar que ela recuperasse a memória de manhã. Com sorte, depois, encontrariam Jared. Trig não esquecera a razão por que tinham viajado até ali e sabia que, se a levasse de volta a casa, quando ela conseguisse recordar o seu passado, voltaria a procurar o irmão. Por isso, estava a pensar em procurar Jared nos dois dias seguintes, deixar que ambos os irmãos se vissem e, depois, levar Lena para casa.


Sem fazer barulho, Trig vestiu a tshirt, pegou no telemóvel e saiu do quarto. Marcou um número que sabia de cor e esperou que o atendedor de chamadas atendesse. O correio de voz não estava cheio, como devia ter estado se Jared não estivesse a ouvir e a apagar as mensagens recebidas. – Olá! – cumprimentou Trig, com cuidado para não dizer o seu nome. Jared reconheceria a sua voz e não havia necessidade de revelar demasiado, no caso de outra pessoa ter o telemóvel dele. – Há muito tempo que não te vemos e estamos por aqui, portanto, vamos visitar-te. Deves-me uma. E tens


de atender.


Capítulo 8

Lena acordou na manhã seguinte com a cabeça mais limpa do que nos dias anteriores. Trig não estava lá. Recordou que, quando estava ensonada, ele murmurara algo sobre ir buscar o pequeno-almoço e pedira que continuasse na cama, pois eram apenas cinco da manhã. E Lena obedecera com gosto. O marido era um homem madrugador. Possivelmente, ela também fora quando ainda conseguia fazer surfe ou andar de


caiaque. Ainda que, se pensasse bem, talvez ainda conseguisse usar o caiaque. Talvez pudesse comprar uma casinha junto do rio com um alpendre com vista para a água. Podia pôr uma banheira gigante numa das divisões. Talvez até pudesse instalar um banho turco. Trig chegou com o pequeno-almoço, afastando-a dos seus pensamentos. Tinha bolos de nozes, iogurte de morango e ovos mexidos com especiarias. Lena sentou-se na cama e afastou o cabelo da cara. Esperava que Trig gostasse do seu aspeto despenteado, pois o seu cabelo não era nada fácil de domar. – Achas que podemos comprar azulejos como os da casa de banhos


onde estivemos ontem? – Porquê? – perguntou ele, deu-lhe o iogurte e inclinou-se para lhe dar um beijo fugaz na comissura dos lábios. – Quero ter um banho turco na casa que vamos comprar à beira de um rio. – Vamos comprar uma casa? – Na margem de um rio. Assim, poderei acordar e ir andar de caiaque e tu podes ter a tua oficina de carpintaria – sugeriu ela. O pai de Trig era carpinteiro e passara muitos verões com um cinto com ferramentas à cintura. – Queres que use um cinto de ferramentas? – Só quando não estiveres em serviço. E, se estiver calor, podes tirar a


t-shirt. Até posso fazer um calendário com fotografias tuas. – Não te atreverias... – Claro que me atreveria. Devias saber. Trig esboçou um sorriso amplo. – Sentia a falta do teu temperamento de sempre – comentou ele e, ao olhar para as alianças que estavam na mesa de cabeceira, o seu sorriso desapareceu. – Como está a cabeça? – Está menos inchada – esclareceu e tocou no galo. – Olha. Trig tocou-lhe com suavidade, enquanto ela fechava os olhos e desfrutava do seu contacto. – Hum... Ele soltou-a imediatamente e


escondeu-se do outro lado da mesa. – És muito tímido nas tuas demonstrações de afeto – observou ela, incomodada. – Ordens do médico. – Vou voltar ao hospital para apagarem essa prescrição do meu historial. – Continuas sem conseguir recordar, não é? – Todos os dias me lembro de um pouco mais. Tenho baixa por incapacidade no trabalho. E acabei de chumbar no exame para me darem alta. Trig fez uma careta. – Para esses carteiristas, foi como assaltar um pato. Não vou voltar ao


serviço. Embora também não saiba se queria voltar. Preciso de pensar noutra coisa. Talvez estude algo novo – indicou e olhou para ele com curiosidade. – Alguma vez pensaste em fazer outra coisa? – Ainda não. – Mas aceitaste um lugar de escritório. – Lembras-te disso? – Não te lembrarias? – Sim – confirmou, esfregando a têmpora. – Como é? – Muita papelada. – Muito frustrante? Trig assentiu. – Podias regressar à ação.


– O quê? E deixar-te sozinha numa casa no rio? Quem ia pôr a decoração de Natal no telhado? Trig esquecera a carreira por causa do que acontecera a Lena. Por um lado, ela alegrava-se por a amar tanto. Por outro, angustiava-a que ele tivesse renunciado a fazer o que gostava para poder estar com ela. – Queres pôr decoração de Natal no telhado? – E em todo o lado. – Estou a pensar que, em vez de uma casinha junto do rio, podíamos ter uma velha quinta, com espaço para guardar as bolas de Natal e os adornos quando não os usarmos. Mas, se vivermos no


rio, quero ter uma lancha muito rápida. Podia fazer corridas. – Sim, sim. Então, não poderia deixar-te sozinha. – Podias aprender a navegar. – Claro. – Bom, vou ligar a Poppy ou a Jared para lhes contar – declarou ela. – Tenho uma mensagem no telemóvel de alguém com o nome de Amos Carter. Trig franziu o sobrolho. – Deixa-me ver – pediu ele e, ao ver a mensagem, franziu o sobrolho ainda mais. – Quem é? – Um velho contacto do trabalho. – Jericho3, Milta Bodrum Marina – explicou. – É o nome de um barco ou de


um míssil? – Não sei. – E queres saber? – Sim. Deixa-me investigar. Descansa. Lena bebeu um gole do chá. – Continuo sem conseguir recordar o dia do nosso casamento. Trig lançou-lhe um olhar de aviso, mas ela não se rendeu. – O que quero dizer é que, se continuar sem me lembrar, talvez fosse boa ideia repetir a cerimónia. Achas que as nossas famílias quereriam ir outra vez? – Penso que a tua família faria qualquer coisa por ti. E, quanto à minha,


podíamos convencê-los. – Farias qualquer coisa por mim? – Tens dúvidas? – quis saber, observando-a. Lena foi a primeira a desviar o olhar. – Sim, penso que podíamos fazê-lo – continuou ele. – Recupera e qualquer coisa será possível. – Referes-te à minha perna. – A tua perna já não vai melhorar mais. Andar de caiaque e acelerar com uma lancha são boas opções para ti. Gosto que tenhas pensado nelas. – Promete-me uma coisa. Promete-me que competirás comigo. – Não esperes que te dê vantagem – afirmou, levando a mão ao coração com um sorriso.


– Aceitaria isso como um insulto, se me desses vantagem. Bom, que planos há para hoje? Sei que disseste que iríamos para casa se continuasse sem recuperar a memória, mas estou a melhorar. Lembrei-me de que o teu pai é carpinteiro e de que tu trabalhavas para ele no verão para poderes comprar pranchas de surfe. É verdade ou não? – É verdade. – Quero ficar. Talvez possamos continuar com os nossos planos de lua de mel e aproveitar o tempo juntos. Trig abriu a boca para protestar. – Depois de ir ao médico hoje e de me dar a sua aprovação, é óbvio. – Que atenciosa...


– Não sou sempre? Trig quase se engasgou com o café. – Sim. Não. Penso que é um efeito secundário do golpe. – Preferes que seja mais atenciosa? Gostas mais de como sou agora ou de como era antes. Ele levou o seu tempo a responder. – Antes, eras de muitas maneiras. Lembro-me de ti quando eras crianças. Lembro-me de ti como camarada de luta. Lembro-me de ti a tentar fazer com que o teu corpo funcionasse como antes, com medo de que as pessoas te deixassem por causa da lesão. Custou-me muito fazer-te ver e apaixonei-me ainda mais por ti por causa disso. Além disso, és


como eras antes de te darem um tiro... Embora agora sejas um pouco mais suave e mais segura de ti própria. Podia habituar-me a este novo aspeto. – Mas qual é a Lena que amas? – Todas. Boa resposta, pensou ela. – Então, se o médico me der a sua aprovação, para onde iremos depois? – A Bodrum. – Já sabes o que é Jericho3? – Não – murmurou ele. – Mas vou descobrir.

Lena recebeu a aprovação do médico para viajar e permissão para deixar a medicação. Também lhe examinou a


perna lesada e perguntou se estava pior do que antes do golpe. – Não, está como sempre – assegurou ela. – Toma medicação para a dor? – Só tomo calmantes e antiinflamatórios quando me custa muito mexê-la – explicou. – Tenho-a muito melhor do que há dezanove meses. – Não sabia que tinhas deixado de tomar calmantes de forma regular – observou Trig. – Não os deixei por completo. Mas, quando tenho um bom dia, posso passar sem eles. Doutor, e posso ter sexo com o meu marido? Estamos em lua de mel – explicou ela.


– Ah... – disse o médico. – Se tiverem cuidado e forem prudentes, não há problema. Lena esboçou um sorriso radiante. Trig franziu o sobrolho. Para um homem na sua lua de mel, não parecia muito contente com o facto de o médico ter levantado a proibição. – Queres voltar para casa, não é? – perguntou ela, com um olhar acusador, quando saíram da consulta. – Passou-me pela cabeça. – Porquê? – Porque continuas a sofrer de amnésia. – Nem tanto. – Isso é o que tu dizes...


– Não vamos encontrar-nos com Jared aqui? Quando combinámos? – Não consegui falar com ele – respondeu Trig e fez um gesto para o seu táxi. Quando o carro parou, abriu a porta a Lena e seguiu-a. – Ainda estou a decidir se devíamos ir a Bodrum ou não. – Bodrum é um destino muito agradável – afirmou o taxista, que se chamava Yasar. – Prometo descansar – prometeu Lena, tentando convencer o marido. – E terás de fazer tudo o que te pedir. – Jurei isso quando me casei contigo? Duvido muito. Trig suspirou. – Pelo menos, podias fingir


obediência. De que outra forma tencionas persuadir-me para irmos a Bodrum? Eu sei que é uma má ideia. – Eu gostaria de ir – insistiu ela, com um sorriso. – Posso descansar enquanto tu trabalhas um pouco no computador. Podíamos apanhar um avião até lá depois de irmos às compras esta tarde. – O que queres comprar? – Roupa – respondeu ela e inclinou-se para o taxista. – Yasar, há algumas lojas de roupa por aqui? – Claro que sim – respondeu Yasar, sem muito entusiasmo. – Porque haveria de querer lá ir quando posso levá-los às melhores lojas da cidade, que lhes oferecerão um bom desconto...? – Hoje, não, Yasar – interrompeu


Trig. – Leva-nos à que estiver mais perto. Dez minutos depois, Yasar deteve-se à frente de um grande centro comercial. – Quanto tempo vão demorar? – Meia hora. – Meia hora – repetiu Yasar, olhando para Trig. – Estarei neste mesmo ponto às dez para as onze. Querem que vos traga kebabs e refrescos? – Sim – aceitou Trig. – Yasar, tens jeito para reservar voos? – Tenho um dom para isso – assegurou o taxista. – Também tenho um primo que gere uma agência de viagens. – Pede-lhe para nos reservar um voo para Bodrum para esta tarde, por favor.


Yasar assentiu. – Um tipo muito serviçal – comentou ela, quando o taxista se foi embora. – Soluciona problemas. Entraram nos armazéns e chegaram a umas escadas rolantes, onde um grande cartaz indicava o que podiam encontrar e em que sítio. – Sugiro que nos dividamos – propôs ela. – Tu vais para o segundo andar. – O segundo andar é de roupa de noite feminina. – Sim. Preciso de um vestido para dançar. Não me tragas algo com as costas a descoberto, nem cor-de-rosa ou com folhos. – Porquê?


– Porque não vestes um smoking púrpura? – Entendido. Onde vais estar? – No quarto andar – esclareceu, com um sorriso angelical. – Lingerie.

Trig chegou ao segundo andar com medo no coração e desejo na alma. Quando Lena queria alguma coisa, costumava consegui-la. Enquanto ela e s c o l hi a lingerie, pedira-lhe para comprar um vestido de noite. Se não se enganava, tinha a intenção de repetir a experiência da noite de núpcias. Com ele. Uma empregada exuberante


aproximou-se dele e observou-o, até ver a aliança. – Posso ajudá-lo? – Preciso de um vestido para a minha esposa. Quer ir dançar. Vinte e cinco minutos depois, Lena e Trig encontraram-se na porta de entrada. Yasar e o seu táxi estavam à espera, com duas chávenas de café na mão. Lena esboçava um sorriso atrevido, com três sacos nas mãos. Trig tinha um apenas um saco e uma boa dor de cabeça.

– Yasar, sabias que estamos de lua de mel? – perguntou ela, quando entrou no táxi e aceitou o café e o kebab que o


taxista lhe oferecia. – Não. – Mas estamos e, embora não conheça Bodrum, sei que quero ficar em algum sítio mágico e luxuoso esta noite. Um hotel com cortinas de gaze e almofadas de veludo, onde nos tragam bolinhos numa bandeja de prata. Até poderia ser um hotel com uma suíte nupcial reservada para a ocasião. Trig conteve um gemido. Aquilo não podia ser bom. – Senhora Sinclair, conheço o lugar que procura em Bodrum. É bastante famoso e caro. – Tenho cartão de crédito. – O pagamento só pode fazer-se com


cartão – indicou Yasar. – E não é um lugar a que qualquer um possa aceder. Eu nunca estive lá – acrescentou e olhou para Trig pelo retrovisor. – Há outras opções. Trig estava desejoso de explorar essas outras opções. – Como se chama? – A Caravana de Saul. É uma velha residência de pedra com vista para a cidade. Diz-se que, no passado, pertenceu a uma concubina do rei. – Já reservámos um hotel? – perguntou Lena a Trig, com olhos implorantes. – Não, mas... – Mas o quê? – Dói-me a cabeça. Penso que estou a


chocar uma gripe. Esta noite, não serei de muita utilidade. Não me sinto muito romântico. Vamos deixá-lo para outra ocasião. Lena observou-o, pensativa e, depois, virou-se para Yasar. – Yasar, o que tens para a dor de cabeça? – Há uma bebida... – começou a explicar Yasar, por cima da música do rádio.

Lena reservou um quarto de duas noites na Caravana de Saul. O hotel em que tinham estado até então não tivera nada de especial e, entre isso, os


carteiristas e as visitas ao hospital, tinha a sensação de que precisava de uma solução para mudar o rumo da sua lua de mel. Um condutor enviado pela Caravana de Saul foi buscá-los ao aeroporto. O fato imaculado e o Mercedes impecável que conduzia davam uma pista do que podiam esperar. O hotel era no topo de uma colina, rodeado por muros altos de pedra salpicados de jasmim. – Olha – indicou Lena, aproximandose de Trig para ver melhor pela janela. – Tem uma torre. Sempre quis uma torre. – Eu sempre quis um cachorro – afirmou, com um sorriso. As portas esculpidas da entrada principal podiam ter sido tiradas do


palácio de Versalhes. Os azulejos que formavam mosaicos no chão podiam ter pertencido a um museu. Uma mulher muito bonita recebeu-os e apresentou-se como Aylin, a dona do hotel. Sem se incomodar em pedir os seus dados, levou-os para a suíte. Foi como entrar na gruta do Aladino. Havia candelabros de prata sobre mesinhas e cómodas de madeira. A cama com dossel estava protegida por cortinas de gaze e coberta com os lençóis de linho. Velhas tapeçarias adornavam as paredes e tapetes persas, o chão. A suíte tinha um pequeno jardim, com vistas fabulosas de Bodrum e do mar.


Havia uma mesa para comer lá fora e uma pequena piscina de interior, separada do resto por um biombo de madeira e um leão de mármore de tamanho natural. Num canto do quarto, havia uma estátua da Virgem Maria e um Buda de jade no canto oposto, enquanto um manuscrito do que devia ser uma oração muçulmana cobria outra parede. Também havia uma harpa, uma pianola e um gongo no quarto. – Oh, sim... – murmurou Lena. – Estás nas nuvens, não estás? – adivinhou ele. Sem responder, Lena aproximou-se da piscina. – Eh, Trig! Há um espelho com forma


de prancha de surfe. E há roupa aqui também, penso que é para nós – indicou ela. – Adoro este lugar. Trig olhou à sua volta, não muito convencido. Aylin sorriu. – Este quarto tem uma iluminação estratégica para a noite – indicou a dona do hotel. – Por exemplo, há luzes por baixo da cama. – Não nos eletrocutaremos? – quis saber ele. – Não me diga que teremos de pagar um extra por elas. – Não. – Vês? – replicou Lena, que gostava cada vez mais de Aylin. – É um lugar maravilhoso. – Só uma noite – avisou ele.


– Reservei duas. – Há um querubim pendurado no teto. Lena olhou para cima, onde viu uma estátua de gesso do Cupido. – Sim, duas noites – repetiu ela, com um sorriso e, virando-se para Aylin, confirmou. – Duas noites. Aylin assentiu e desviou-se para deixar que o empregado entrasse com as malas. Seguiu-o uma moça com uma bandeja com refrescos e outra com uma travessa com fruta. – Sentes-te suficientemente mimada, princesa? – quis saber Trig. – A cama é suficientemente grande para ti? – perguntou ela. Era a maior cama que vira. Antiga e tentadora. –


Estamos em lua de mel – disse à anfitriã. Aylin olhou para Trig, avaliando com o que ele podia contribuir para a noite de núpcias. E sorriu.

Se existia um lugar perfeito para uma mulher assustada e gravemente ferida seduzir um homem, era aquele, pensou Lena, quando os empregados do hotel os deixaram sozinhos. A decoração era magnífica, embora a combinação de móveis tivesse um certo toque absurdo e inesperado. Os mosaicos do chão da casa de banho eram lindos, apesar de terem uma greta num dos lados. Podia achar-se beleza na imperfeição. Da mesma maneira, possivelmente, uma


mulher imperfeita poderia encontrar a coragem necessária para seduzir um homem. Por alguma razão, o seu marido não se mostrou muito carinhoso. Sim, beijara-a, abraçara-a e acariciara-a... Mas sempre com a roupa vestida. Cada vez que Lena se deitava na cama, ele saía do quarto. Talvez fosse por causa das ordens do médico, embora não acreditasse. Por exemplo, naquele momento, tinham tudo o que precisavam para desfrutar de uma tarde de prazer. Tinham água e vinho, uma bandeja cheia de bolos deliciosos e até uma seleção de tabacos. No entanto, Trig estava ali


parado, incomodado, com o sobrolho franzido e os olhos fixos em Bodrum. A verdade era que ele não deixara de franzir o sobrolho desde que lera uma mensagem no telemóvel, que continuava a segurar na mão. Um dos telemóveis, pois tinha vários. Lena não sabia em que o marido estava a pensar, mas sabia que queria que pensasse apenas nela. Aproximou-se dele, com um robe de seda esmeralda que encontrara atrás da porta da casa de banho. – É o teu telemóvel de trabalho? – Não. É de Damon. Deu-mo para que pudesse ligar-lhe sem que ninguém detetasse quem sou. – Ena...


Quando Trig olhou para ela, franziu ainda mais o sobrolho. – Não é que não goste do que tens vestido, mas onde está a tua roupa? – Pensei que gostarias que a tirasse – indicou e, ao ver o olhar assustado dele, arrependeu-se. – Ou não. – Bom, não tão depressa. Pensei que quererias comer primeiro. E beber – indicou ele e aproximou-se da mesa. – Champanhe? – ofereceu, abriu a garrafa e serviu dois copos delicados de cristal esculpido. Depois, bebeu o dele de um gole. – Não sabia que o champanhe se bebia assim – comentou ela, bebendo um gole do copo.


– Há sempre uma primeira vez – murmurou ele, sem querer olhar para ela. – Vou tomar banho. Preciso de o fazer – declarou e desapareceu a toda a velocidade na casa de banho. Lena observou-o a ir-se embora, suspirando. Depois, pegou no vestido que Trig lhe comprara. Era azul, com uma saia de folhos de gaze. – Folhos? Não me parece que use folhos. Deixando o robe de lado, Lena vestiu o sutiã sem alças que comprara e as cuecas a condizer. Depois, vestiu-se. O vestido ficava-lhe na perfeição. O tecido era leve e suave, uma delícia


para a pele. E adorava os folhos. No entanto, esquecera-se de lhe pedir sapatos. Não importava, pensou, podia dançar descalça no quarto. Depois, agarrou no estojo de higiene pessoal e maquilhou-se num espelho que havia na parede, junto de três patos de gesso. O quarto estava cheio de curiosidades. Se se aborrecessem, sempre podiam começar a abrir gavetas. Parecia que era possível encontrar qualquer coisa ali. Vinte minutos depois, Lena já se maquilhara o melhor possível e já se penteara e o marido continuava sem sair da casa de banho. Bateu à porta. – Adrian, querido, tens de sair. Tenho


planos para ti. Trig gemeu. – Algum problema? – perguntou ela. – Lena, sei o que queres – admitiu ele, num tom rouco. – O que se passa é que penso que não sou capaz de te dar a noite de núpcias mágica que esperas. Lena apoiou-se na porta da casa de banho. – Porquê? – Sinto-me muito pressionado. – A sério? – inquiriu ela, com incredulidade. – És um homem fabuloso e não penso que sejas inexperiente – acrescentou e, ao baixar o olhar para a aliança, as lágrimas toldaram-lhe os olhos.


Trig não disse nada. – Se te servir de ajuda, eu também não me sinto segura neste aspeto da nossa relação. Algumas partes do meu corpo não são flexíveis. Não sei como funcionará quando... Diz-me... Funcionamos na cama? Tu e eu? – Sim – afirmou, com reticência e, olhando-se ao espelho, rezou, pedindo clemência. – Funcionamos bem. Que outra coisa podia dizer? Como ia dizer-lhe que não sabia e que devia parar de se preocupar com isso?, questionou-se Trig. – Bom, já acabaste? – Sim – afirmou ele, que passara dez minutos a olhar para os mosaicos do


chão, enquanto a água lhe caía pelas costas. Não sabia se conseguiria sobreviver mais uma noite. – Já saio. Dançaremos, comeremos, falaremos, mas não iremos para a cama. Ainda, não. Quero cortejar-te primeiro – declarou. Como conseguira pensar numa desculpa tão tola?, pensou. – Queres que abra outra garrafa de champanhe? – ofereceu ela. – Parece-me bem – acedeu. Talvez pudessem embebedar-se e, assim, Lena seria incapaz de o levar para a cama. Era uma boa maneira de sabotar a sua noite de núpcias, pensou. No entanto, duvidava muito de que conseguisse fazer com que Lena bebesse demasiado. – Não, é melhor não. Talvez mais tarde.


Lena suspirou do outro lado da porta. Trig bateu com a cabeça na parede. Então, teve outra ideia. Podiam ter uma discussão. Tinha de fazer com que Lena o expulsasse do quarto. Contudo, também não queria discutir com ela. – Devíamos sair esta noite – propôs ele. – Podias seduzir-me enquanto estamos fora. Ou poderias interessar-te por fazer turismo e deixar a sedução para outro dia. Vamos jantar e dançar, como se fosse um encontro – sugeriu. – Aposto que não te lembras de nenhum dos nossos encontros – acrescentou. Certamente, Lena não se lembrava, porque nunca tinham saído juntos.


– Lembro-me da primeira vez que me levaste a fazer surfe. – Isso não conta, porque o teu irmão estava presente. Bodrum tem um castelo que transformaram num museu marítimo. Porque não vamos vê-lo? Certamente, tem torres. – Achas que te sentirias menos pressionado? – Talvez. Também me ajudaria se parasses de mencionar o que esperas de mim esta noite. – Ah... Entendido. Então... Vamos fazer turismo e jantar, não é? – Sim – afirmou ele. Talvez conseguisse cansar Lena, isso seria uma boa ideia.


– Uso o meu vestido? – Para fazer turismo, não. – Vamos voltar aqui antes do jantar? – Não tenho a certeza. – Vou pensar que sim. Podíamos jantar aqui se não me apetecer voltar a sair. Ou não, pensou Trig. Talvez conseguisse organizar-se de forma a não voltarem para o hotel antes de jantar. Assim, evitaria ter de presenciar a nudez de Lena enquanto mudava de roupa, já para não mencionar vê-la com aquele vestido sensual que a empregada o obrigara a comprar de manhã. Lena com aquele vestido e naquele lugar só podia causar problemas,


refletiu ele e, com os olhos fixos no seu reflexo no espelho, respirou fundo. – Sairei dentro de um minuto e iremos. – Não há pressa – esclareceu ela. – Ainda tenho de mudar de roupa.

O marido demorou meia hora a tomar banho, barbear-se e vestir uma t-shirt e umas calças de ganga gastas. Lena tirou o vestido azul e vestiu uns calções cinzentos e uma simples t-shirt de algodão. Ainda teve tempo de se servir de outro copo de champanhe antes de ele sair da casa de banho. Sem dúvida, valia a pena esperar por Adrian Sinclair.


Lena observou-o do sofá que havia no terraço, enquanto ele andava com os pés descalços, à procura dos sapatos. Ela conhecia bem os pés dele, que vira muitas vezes sobre uma prancha de surfe. E as mãos dele. Sabia como era o rosto dele, pois vira-o mil vezes. Conhecia aquele homem e amava-o. E sabia que ele a amava. Não entendia porque Trig se sentia ansioso, nem pressionado com ela. – Estás pronta? – perguntou ele. – Temos um motorista à nossa disposição – informou-o, assentindo. – Vai levar-nos onde lhe pedirmos – acrescentou. – Sabias que este hotel pertence à mesma família desde que foi


criado? Há cinquenta anos, estavam perto da falência e uma das paredes caiu, mas, por sorte, encontraram uma caixa de ferro enterrada nos alicerces. Estava cheia de joias. – De princesa? – Melhor ainda. Eram joias desenhadas para agradar a uma concubina real. Venderam três peças, ficaram com o resto e puderam restaurar o lugar e transformá-lo num hotel de luxo que, hoje em dia, funciona na perfeição. Sabias que só alberga dez hóspedes de cada vez e tem oitenta empregados permanentes? – Eu sei. – E sabes que nos farão as compras se lhes pedirmos o que queremos?


– O que queres? – Sapatos a condizer com o vestido que me compraste. É lindo. Já o experimentei. – Fica-te bem? – Perfeito. – Não sabia se gostarias da cor. – Adoro. Faz-me sentir como uma bailarina e acentua as minhas curvas – afirmou. Nunca tivera muitas curvas. – Lembro-me do vestido que tu, Jared e Poppy me ajudaram a escolher para ir ao baile da minha graduação. Na ausência da mãe, Lena pedira-lhes ajuda. Recordava como, com cada vestido que experimentava, Trig e Jared mostravam a sua desaprovação. Não


tinham gostado do pequeno vestido preto porque era muito curto. Nem do de seda verde porque tinha um decote muito provocador. Nem tinham aprovado nenhuma das criações femininas que Poppy sugerira. Finalmente, escolhera um vestido vermelho e comprido, cheio de pedraria. – Aquele vestido era horrível. – Eu não votei nele – recordou Trig, calçando os sapatos. – Era horrível e pesava uma tonelada. – Alguma vez te disse que, quando dançava, as franjas da saia batiam nas pessoas que havia por perto? – Talvez estivesses demasiado perto. – Não, eram umas franjas muito compridas. Não dancei muito perto de


ninguém nessa noite. – Seria por causa do vestido. – Ou por mim – corrigiu ela. – Ninguém queria sair comigo – reconheceu, pensando que talvez o seu amor pelos desportos de risco tivesse assustado os rapazes naquela época. – Lembro-me de que quis pedir-te para ires comigo nesse dia. – E porque não o fizeste? – Estavas a centenas de quilómetros de distância. E Jared disse-me que estavas ocupado. – Não tão ocupado – respondeu Trig, depois de uma pausa. – Também não sabia se era boa ideia complicar as coisas entre ti e Jared. Não


queria que tivesses uma ideia errada... Ou acertada. Jared e tu eram os meus únicos amigos, não encaixava em nenhum outro grupo. Se a nossa relação tivesse falhado, teria ficado sozinha. Trig assentiu, sem parar de franzir o sobrolho. – Pensaste nos riscos. – Sim. Ele assentiu novamente com gesto indecifrável. – A respeito do presente... Estás pronta para ir? Lena estava pronta.

Trig tinha mais de um motivo escondido para fazer com que o


motorista os deixasse no porto e não no castelo. Amos Carter dirigira-os para lá. Jericho3 podia ser o nome de um barco. Parecia muito fácil, mas não era impossível. A sua outra razão era mais vil, pois tinha o plano de fazer com que Lena andasse desde o porto até ao castelo e se cansasse no processo. – Estamos à procura de alguma coisa em concreto? – quis saber ela, com os olhos fixos nos iates do cais. Eram barcos luxuosos, pilotados por jovens sorridentes e bronzeados. – Jericho3, talvez? – Sim. – Eu sabia – confirmou, deslizando o braço sob o dele. – Sabia que tinhas um


motivo escondido para vir aqui esta tarde. Achas que é o nome de um barco? – Podemos verificar – sugeriu ele, olhando para as pessoas à sua volta. – Não há mulheres. – Talvez estejam dentro dos iates. – Talvez possamos entrar num deles. É uma boa forma de investigar. – Não penso que queiras ir passear num desses barcos – indicou, uma mulher sorridente, que se aproximou deles. – Voltem amanhã de manhã antes das dez se quiserem fazer uma visita. – Talvez queiramos dar um passeio noturno. – Mas não nesses barcos. Vês todos os rapazes bonitos? Oferecem os seus serviços em troca de dinheiro. Os


quartos são lá dentro. São barcos de prazer. – Ah... – murmurou Lena, corando. – Não estamos interessados – afirmou Trig, com um sorriso. – Eu sei – confirmou a rapariga. – Talvez estejam interessados no meu barco. Só ofereço serviço de táxi. Posso levar-vos à volta do castelo e à baía. Posso trazer-vos de volta ou deixar-vos no castelo, se preferirem. Só peço vinte e cinco liras. – Parece um pouco caro. – Também vos salvei dos barcos noturnos. – E se estivéssemos à procura de um barco do prazer? – inquiriu Trig, com


curiosidade. – Então, teria recomendado o do meu amigo Akbar. É o mais sério de todos, porque não admite droga a bordo nem excessos. Também não droga os clientes, nem lhes rouba todo o seu dinheiro, ao contrário dos outros. – Que cavalheiro – comentou Lena. – E onde está o teu táxi? – Aí mesmo. O táxi aquático da rapariga tinha um aspeto muito decente. – Tenho coletes salva-vidas – informou a mulher, saltou para bordo e manobrou para aproximar o barco de uma escada próxima. – Tenho licença. Vou pedir apenas vinte liras, porque gosto de vocês. E posso contar-vos


histórias sobre Bodrum durante o passeio. Lena olhou para Trig. – Assim, não terei de ir a pé para o castelo. Apetece-me dar o passeio de barco. – E como vais entrar? – Com muito cuidado. E com a tua ajuda. Portanto, entra primeiro e, quando vires que estou prestes a cair, segurame. Disseste que gostas que peça ajuda. – Lembras-te? – perguntou ele, franzindo o sobrolho. – Sim, porquê? Não é assim? Queres que seja mais independente? – Não – negou ele, entrou no barco e levantou Lena pela cintura para a pôr a


bordo. – Se queres ajuda, sou o teu homem. – Que bonito – comentou a rapariga, piscando um olho a Lena. – O que aconteceu à tua perna? – Parti-a – declarou Lena. – E a anca e parte da coluna. – Devias sentar-te – indicou a rapariga, pondo o barco a trabalhar. – Irei devagar. – Faz-me um favor e não o faças – pediu Lena, parando junto dela. – Quero comprar uma lancha de corridas. Quero sentir a velocidade no corpo. – Como queiras... – replicou a outra mulher e acelerou em direção ao castelo, enquanto Lena estava de pé ao seu lado, agarrada ao assento com uma


mão. Nem sequer estava a tentar seduzi-lo, refletiu Trig. Lena só estava a ser ela própria... Sempre a aproveitar as oportunidades da vida. Só precisava de olhar para ele e sorrir para o seduzir. Naquele momento, Lena olhou para ele com o cabelo despenteado sobre a cara. E sorriu. – Estou bem – assegurou ela. – Veremos como estás amanhã. Lena ergueu o queixo com determinação. Aquela era outra coisa de que gostava dela. Nunca aceitava uma derrota e conseguia sempre o que queria. – Este é o castelo – indicou a


rapariga, por cima do barulho do motor. – Foi construído pelos templários. Chamaram-lhe Castelo de São Pedro e serviu como refúgio para os cristãos daquela época. Depois, foi entregue ao sultão Suleiman, que o transformou numa mesquita. Depois, foi destruído pelos franceses durante a Segunda Guerra Mundial e, hoje, é um museu. Devem visitá-lo. É muito especial. – E as coisas que os guias turísticos não contam? – quis saber Trig. – Há barcos muito caros nesta baía. De onde sai o dinheiro? A rapariga olhou para ele com desconfiança, enquanto Trig fazia o possível para aparentar ser inofensivo. – Dos turistas do prazer. Vêm do leste


da Europa, a maioria. Aqui, pode conseguir-se qualquer coisa, por dinheiro. Muitas pessoas vêm apenas por isso. – Existe crime organizado? – Sim. – E quem são os líderes? – Turcos e russos. – Algum asiático? – Não. – Alguma vez ouviste falar de um barco chamado Jericho3? – Não tenho nenhuma relação com Jericho3 – declarou a rapariga, com um ar sério. – E quero que continue assim. – Sabes onde podemos encontrá-lo? – Não.


– Não o perguntaria se não precisasse de saber. – Não posso ajudar-te. É por uma questão de sobrevivência. – Está bem – acedeu Trig, com um sorriso, para dissipar a tensão. – Falanos da vida noturna de Bodrum, então. A rapariga contou-lhes como eram os clubes noturnos ao ar livre que havia junto do bar. Falou-lhes de concertos nos bares, de festas na rua e de espetáculos. Quando os deixou no cais do castelo, Trig deu-lhe uma boa gorjeta. – Não tens de nos levar a nenhum outro sítio – indicou ele. – Deixaste-me preocupada, homem –


afirmou a rapariga, recuperando o sorriso. – Não há razão para isso. – Esse barco de que falaste. O que sabes dele? – inquiriu a mulher. – Só o seu nome. Talvez o meu amigo esteja lá. – Por escolha própria? Trig encolheu os ombros. A rapariga abanou a cabeça. – É um iate enorme, com helicópteros, um sistema de defesa e setenta marinheiros muito musculados, quase todos russos. Tem cerca de trinta quartos para convidados. Embora nem todos estejam lá por escolha própria. – Não vejo nada assim por aqui. – Está em alto mar. Lá, podem fazer o


que quiserem. – Como põe combustível? – Com um tanque que vai abastecê-lo. – Alguém sai alguma vez de lá? – Uma mulher e uma criança. Vêm ao hospital uma vez por semana, pontuais como um relógio. – Que dia? – Amanhã. Chegam numa lancha de luxo a este mesmo cais, por volta das dez da manhã. – Obrigada. – Pareces agradável. Não procures uma morte antecipada – avisou a rapariga, antes de se ir embora. – Pelo menos assim, não teremos de ler o nome de todos os iates do porto –


comentou Lena. – Não tinha vontade de o fazer. – Não consigo acreditar que o tenhas admitido. – O quê? Que andar me cansa? – Sim. – Não é nenhum segredo. – Eu sei, mas, normalmente, não gostas de o admitir. – Agora, sou mais sábia. Também não me importo de admitir que não sei porque estamos aqui. Sabes que não percebo porque esse barco é tão importante? Nem sei quem esperas encontrar nele. – Já percebi. – Podes partilhá-lo comigo? – Agora, não. Estamos em lua de mel,


lembras-te? – Sim – afirmou ela e olhou para o castelo. – É muito alto. – A vista da torre deve ser magnífica. – Se tivesse uma semana, iria tentar – afirmou. – Antes, não me importava de subir escadas. Agora, fazem-me tremer os joelhos. – Eu levo-te – sugeriu ele. – Então, ficarias cansado – objetou ela. – Vamos conformar-nos com ver o museu. Visitaram metade do museu antes de fechar, evitando cuidadosamente qualquer escada. De qualquer forma, Lena ficou cansada. – A dor não importa quando estamos


a divertir-nos – comentou ela, enquanto esperavam que o motorista fosse buscálos para voltarem para o hotel. – Mas, por favor, diz-me que já acabou o dia. – Ainda temos de ir jantar e dançar. – Ah... – murmurou ela, encolhendose um pouco. – É verdade. – A dor não importa quando estamos a divertir-nos – declarou, com um sorriso. Lena deu-lhe um murro suave no braço e ambos se riram. O sol estava a pôr-se quando chegaram ao hotel. Lena ficara um pouco rígida durante o trajeto, por causa da dor, e custou-lhe bastante sair do carro. – Temos uma piscina de água quente que é muito relaxante – afirmou o


motorista, que se apercebera da situação de Lena. – Refere-se à do quarto? – perguntou ela. – Para além dessa. – Adoro a Turquia – murmurou ela. – Também temos sala de massagens. – Perfeito. Como temos de nos vestir para a piscina? – Com fato de banho. Não precisam de touca para cobrir a cabeça. – É preciso usá-la noutros sítios? – Sim, por razões culturais. Nesses sítios, as zonas de banho estão separadas para homens e mulheres. Aqui, não – explicou o condutor e olhou para Trig. – Vou pedir bebidas para


dois na piscina. – Para mim, não. Tenho de fazer umas chamadas – respondeu Trig. – Mas talvez Lena queira alguma coisa. – O que me sugere? – perguntou ao motorista. – Para a sede, sugiro susurluk ayarani. É uma bebida gelada de iogurte com menta. Muito refrescante. – Eu gostaria, sim – afirmou ela. – Queres que te leve o fato de banho à piscina? – ofereceu-se Trig, que estava a começar a sentir-se muito culpado por a ter feito andar tanto. – Não, mudo de roupa no quarto – decidiu ela. – Não te importas que tome um banho e te deixe sozinho? – Nada disso. Demora o tempo que


quiseres e relaxa. – Sabes o que seria perfeito? Se pedisses o jantar para ser servido no nosso pequeno jardim privado. – Não queres sair para jantar? – Não. Podíamos jantar e dançar aqui. E podes levar-me para a cama quando adormecer com a cabeça no teu ombro. – Tentador. – Sabia que pensarias assim. – Vai à piscina. Farei com que te levem um lanche. Sabes como te mimo? – És um homem bom. – Logo veremos se o espelho me diz o mesmo – replicou ele, pensado que o seu reflexo lhe recordaria que estava a ser um idiota.


Lena dirigiu-se para a suíte, enquanto Trig saia para os jardins do hotel. Queria investigar o que havia por ali e precisava de privacidade para fazer uma chamada. Tirou o telemóvel de Damon do bolso, mas não tinha mensagens. Depois, ligou a Damon. – Estou em Bodrum, no palácio de uma concubina com vista para o Castelo de São Pedro – informou Trig, quando o amigo atendeu. – Amém – troçou Damon. – É tudo o que consegues dizer? – Se quiseres, podes falar com Ruby. Talvez tenha alguma coisa a acrescentar. – Está bem.


– Não. Como está Lena? – Continua a pensar que estamos em lua de mel. – Então, porque não estão no avião rumo a casa? – Porque estou a seguir uma pista que pode levar-nos Jared. Há um iate enorme chamado Jericho3. Preciso de saber mais sobre ele, qualquer coisa que possas descobrir nas próximas oito horas. – Estás a pensar em visitá-lo? – Não. Penso que seria um suicídio. Espero que Jared consiga sair de lá. Se não, talvez seja um prisioneiro. – Como vais descobrir? – Com sorte, Jared virá ter comigo.


– Se conseguir fazê-lo. – Sim – murmurou Trig. – Vais envolver Lena nisto? – Estou prestes a fazê-lo. – É boa ideia? Não está muito operativa. – Posso protegê-la. Só quer ver Jared e saber que está vivo. Manteremos a distância. – Lembra-se de que queria vê-lo? – Eu digo-lhe. E, quando o fizer, já o terá visto e não teremos de voltar à Turquia para o procurar. Se não, talvez a leve para casa e, uma semana depois, tenhamos de repetir a operação. Damon suspirou. – Está tudo sob controlo. Vou levá-la


de volta a casa assim que vir Jared. Quanto tempo demoram a chegar à casa da praia? – Chegaremos em breve. Tens a certeza de que não precisas de nós? – A tua irmã pensa que estou casado com ela. Queres que to recorde? – Não, entendido. – Adoraria casar-me com Lena – assegurou Trig. – Mas ainda não o fizemos e vai querer matar-me quando descobrir. Vai precisar de ter alguém com quem desabafar. E sou eu. Depois, vai precisar de ter alguém com quem discutir, quando se acalmar. E serás tu. E, depois, precisarei que alguém interceda por mim. É aí que Ruby entra. – Ruby sabe que é a tua advogada de


defesa? – Ainda, não. Deixa-me falar com ela. – Não posso. Está a dormir e não tenciono acordá-la. Tem de dormir por três. – O quê? – Está grávida de gémeos. – Meu Deus! – Aceito as tuas felicitações. – Parabéns! – apressou-se a dizer Trig. – Sim... Parabéns duplos. Trig sentiu-se mal porque o seu primeiro pensamento não fora alegrar-se por Damon e Ruby, mas sentir que nunca ia desfrutar da paternidade. Lena nunca poderia ter um filho dele. – Ruby e os bebés estão bem?


– Sim. Está tudo bem. Não há nenhuma razão para Ruby não poder ir para a casa da praia, mas... – Entendo – interrompeu Trig. E era verdade. – Lena pode vir a Hong Kong. Podem vir os dois. Faremos os nossos respetivos papéis aqui – propôs Damon. – Combinado – acedeu Trig. Que outra coisa podia dizer? O pai de Lena vivia em Hong Kong, portanto, não era território desconhecido para ela. – Tenham cuidado – pediu Damon e desligou. Trig reviu as fotografias que tinham tirado do castelo e escolheu a que tinham tirado do cais. Enviou-as para o


número de Jared. Não acrescentou palavras, mas pensou nelas. «Estamos aqui. E, como não podemos ir ter contigo, vais ter de vir tu. Se conseguires.»


Capítulo 9

O jantar foi um festim. Os empregados prepararam uma mesa esplêndida e não só por causa da comida. Lena descobriu que as chávenas de porcelana fina não tinham de ser todas iguais, se fossem de uma qualidade deliciosa. E que as bandejas de prata eram muito pesadas. Quando chegou o cordeiro assado com especiarias, ela estava cheia, pois provara todas as entradas que lhes tinham servido.


– Quanto pediste? – perguntou Trig, que também estava cheio. – O menu tradicional para dois – respondeu ela. – Aylin mencionou algo sobre cinco pratos. Penso que vamos no terceiro. E sei que, no fim, trarão café. Lena serviu-se de uma pequena porção de cordeiro e rejeitou o arroz. Depois, serviu Trig. – Chega para ti? – Sim, obrigado. Ele portara-se como um cavalheiro durante toda a noite. Fizera com que o seu copo nunca estivesse vazio e elogiara o vestido, ignorando que não tinha sapatos e que ainda tinha o cabelo húmido depois do banho.


Embora tivesse feito um esforço para se arranjar. Maquilhara-se e pusera perfume. Trig também, pois fizera com que lhe engomassem uma camisa branca para a ocasião. Para Trig Sinclair, nunca fora fácil passar desapercebido. A altura dele chamara a atenção com facilidade e o brilho dos olhos enfeitiçara as mulheres. Quando estava com Jared, o coquetel era duplamente explosivo. As mulheres queriam ir para a cama com eles, os homens queriam competir com eles. Lena costumava sentir desejos de lhes dar uma cabeçada e de lhes dizer que se comportassem como adultos. Ao olhar para Trig naquela noite, com


o sorriso e o olhar receoso, Lena pensou que talvez se tivesse tornado adulto. – Diz-me cinco coisas que nunca quiseste – pediu ela. Era um velho jogo entre eles, uma maneira de se entreterem e recolherem informação um sobre o outro. – Sinto-me tão culpado. – Porquê? – Por ti. Sempre pensei que, ao deixar que viesses connosco quando íamos fazer surfe, correr ou qualquer outra coisa do estilo, Jared e eu estávamos a mostrar-te o mundo. Nunca teria pensado que estávamos a limitar as tuas opções. Quando nos dedicámos a realizar operações secretas, tu seguistenos, sem pensar nas consequências.


Nenhum de nós pensou nelas, mas foste tu que ficaste ferida. Isso pesa-me muito. – Como começaste a pensar nisso? – Há um instante, falei com Damon. Falámos de ti e das tuas limitações. – Obrigada por nada. – Ruby está grávida. – Ah... – murmurou, recusando-se a sentir inveja ou nostalgia. Não tinha o direito de se entristecer com a notícia. – Fico feliz. Vou ser tia. Estou desejosa, tu não? – Talvez – concedeu Trig, suavizando o olhar. – Está grávida de gémeos. – Ena, é uma boa notícia – comentou ela, rindo-se. – Acreditas que pode emprestar-nos um?


– Quero ter filhos, Lena. Lena ficou petrificada. De forma instintiva, adivinhou que nunca tinham falado disso. Porque nunca tinham falado disso? – Eu não posso ter filhos biológicos. Conheço as minhas limitações nesse aspeto. – Podíamos adotar – propôs ele, com um ar sombrio. – Sim – afirmou ela. – Ou podia ter um filho biológico com outra pessoa. Podíamos investigar a opção de contratar uma barriga de aluguer. – Não te oporias? – Não, mas talvez tivesses de procurar um psiquiatra para mim.


– Teríamos de partilhar o hospício por um tempo. – Podia ser a tua terapeuta, se quiseres. Nos últimos dois anos, conheci a fundo a frustração, a impotência, a raiva, a inveja e todo o tipo de comportamentos irracionais. Posso falar-te muito disso. Trig sorriu. – Não penses que é impossível – pediu ela, cobrindo-lhe uma mão com a sua. – Nunca. Fora por isso que Lena se casara com aquele homem. – Sinto-me como se tivesse chegado a um ponto em que não tenho de continuar


a tentar estar à altura – confessou ela. – Não posso correr. O melhor que posso fazer é manter-me de pé e coxear por aí. E sabes que mais? Tu continuas ao meu lado e a minha família também, porque não se tratava de estar à vossa altura. Só precisava de me sentir como uma de vocês e, agora, sei que o sou. Sou feliz assim. Casei-me contigo e, certamente, foi o mais inteligente que fiz na minha vida. – A respeito disso... – começou a dizer e pousou os olhos na cama. – Sim, a respeito disso. Não nos pressionaremos. – Está bem – acedeu, em voz baixa. – Gostas da comida? – perguntou Lena, para falar de outra coisa, pois era


evidente que o marido se preocupava com o assunto. – Está boa – respondeu ele e levou um garfo cheio à boca. Lena sorriu e provou também o cordeiro. Estava muito saboroso. – Esquece a cama. Ainda faltam vários pratos e temos de dançar. Vesti o vestido – indicou ela. – Mas não tens sapatos. – Não preciso deles. – Não há música. – Encontrei discos para a pianola. Queres ver se funciona? – Adoras este quarto – observou ele, enquanto ela o agarrava pela mão para o levar para junto da pianola.


– Sim. É bonito, fascinante e, quando olhamos de perto, está cheio de imperfeições. Espero que seja assim que me vês. A verdade é que ainda não entendo o que vês em mim. Lena preparou a pianola e a máquina começou a tocar uma melodia francesa. – Parece um pouco lenta – comentou ele. – É perfeita. Em que tapete queres dançar? – No azul, ao fundo da cama – respondeu ele, sorrindo. – Esse é o teu favorito? Estava a pensar em comprar um igual para a nossa casa junto do rio. – Eu gosto da ideia do rio – admitiu


ele e, momentos depois, rendeu-se ao sorriso dela e estendeu-lhe a mão. Ao chegar ao tapete azul, Trig abraçou-a. Lena apoiou a cabeça no seu peito, ouviu-o suspirar e sentiu que os mamilos endureciam através da fina camisa de algodão. Quando lhe acariciou um com suavidade, ele gemeu. – Gostas? Trig assentiu. – E disto? – perguntou ela, beijando-o no queixo. – Não me queixo. – Também não estás a encorajar-me. – A respeito disso... Lena beijou-o no pescoço e deslizou as mãos sob a sua camisa, enquanto ele ficava parado, tremendo ao sentir o seu


contacto. Era delicioso seduzir o marido, pensou ela. – Não íamos dançar? – Para isso, temos de nos mexer. Portanto, Trig rodeou-lhe a cintura com um braço e começou a mexer-se. Ainda que, quando era adolescente, lhe custasse mexer-se na pista de dança, aprendera a fazê-lo. Lena deixou-se levar, desfrutando do contacto do seu corpo. Com um olhar de desejo, Trig afastou-lhe uma madeixa de cabelo da cara. – Gostas de me fazer isso. – Queria fazê-lo há anos. – O que te impedia? – Não sabia se ias gostar. Ainda não


tenho a certeza. – Eu tenho – afirmou ela. – Vamos acabar o festim – sugeriu ele e levou-a para a mesa. Pouco depois, uns empregados sorridentes retiraram os pratos e trouxeram a sobremesa e o café. Lena gemeu ao ver a mesa cheia de bolos deliciosos. – Não posso. Estou cheia. Com um sorriso, Trig pôs uma baklava na boca. – Bom, farei um esforço – decidiu ela e provou outra baklava. Quando Trig se riu, foi como música celestial para Lena. Ele não se rira muito naquela viagem. Parecia que estava a passar por um inferno.


– Tens medo de ter sexo comigo? – quis saber ela. – Não entendo porquê. – Só quero que recuperes a memória primeiro – explicou, depois de engolir o bolinho de repente. – Também não entendo isso. Qual é o problema de não me lembrar? Será como começar de novo. Trig recostou-se. – É o quarto? Não gostas? – insistiu ela. – Eu adoro. Se me despisse aqui, as minhas cicatrizes não pareceriam tão feias. Sinto-me bem aqui. É como se pudesse esquecer os meus complexos. – Que complexos? – Bom, as cicatrizes... Não me passou desapercebido como as pessoas


olhavam para mim na casa de banhos. Sei que não são bonitas, mas são minhas e são uma ferida de guerra. – Lena... – Não temos de ter as luzes acesas. Podíamos apagá-las. – Não disseste que ias esquecer os teus complexos? – Só quero que te sintas bem. Não sei se estás preocupado com as cicatrizes. – Não preciso que apagues a luz – assegurou ele. – Não é necessário tocares nas cicatrizes – continuou ela. – Não sei como costumamos fazê-lo, mas podes... Ignorá-las. – Lena, não sabes do que estás a falar – afirmou, num tom gelado. – Amo-te tal


como és. Porque haveria de ignorar alguma parte do teu corpo? Num abrir e fechar de olhos, Trig abraçou-a, deitou-a na cama e deitou-se ao lado dela, depois de atirar as almofadas ao chão. Deitando-se sobre ela, segurou-lhe os pulsos por cima da cabeça. – Não tenciono ignorar nada – repetiu ele, percorrendo-lhe a cara com os lábios. – Como podes pensar isso? Então, as suas bocas encontraram-se. Ele sabia a champanhe, a canela e a desejo. Depois de um beijo longo e delicioso, Trig deslizou para os ombros e o pescoço. Quando chegou ao decote,


Lena estava a retorcer-se de desejo, impaciente para que continuasse. Depois de lhe desabotoar o vestido, lambeu-lhe um mamilo, chupando-o com suavidade. Trig começou a baixar-lhe o vestido, mas ela parou-o. – Apaga a luz. – Não. Ele despiu-se sem pensar duas vezes, enquanto ela o observava com um pouco de timidez. Depois, tirou-lhe o vestido e deixou-a apenas com a roupa interior, enquanto traçava um caminho de beijos sobre uma cicatriz desde a anca até à coxa. Ela tremeu. – Não – sussurrou ela. Não tinha de fazer aquilo. No entanto, Trig continuou a beijar o


resto das cicatrizes, até pousar a língua no centro das cuecas e começar a traçar círculos com ela. Num instante, ela tirou-as. Segurou-lhe as nádegas e voltou a pousar a boca no mesmo lugar. Lena não conseguia parar de olhar para ele, enquanto ele a beijava e a acariciava. Depois, voltou a dedicar atenção às cicatrizes, acariciando-as com os lábios. – Não tens de as esconder de mim – murmurou ele, sem deixar de fazer maravilhas com os dedos, fazendo com que se sentisse cada vez mais excitada. – Vi-as. Vi-te a ficar furiosa e desesperada com elas. Mas só sinto amor por elas, porque são parte de ti. E


amo-te. Trig levantou-se para olhar para ela na cara. – Diz-mo – pediu ele, em voz baixa. – Diz-me que nunca porás em dúvida que te amo e que amo tudo em ti. – Trig ama-me – sussurrou ela. – Mais alto. – Trig ama-me – repetiu ela, com mais firmeza. – Outra vez. – Amas-me. Agora, podes demonstrar-mo? – Passei anos a demonstrar-to. Trig deitou-se de barriga para cima, olhando para ela, com a intenção de fazer com que o seguisse. Lena sentou-se em cima dele. Era um homem muito


dotado. Ela não ia magoá-lo com o seu peso, isso era certo. O que não sabia era se tinha de ser cuidadoso para não a magoar. – Devagar – murmurou ele. – Não há pressa. – Fico feliz – replicou ela, que não tinha nenhuma pretensão de acelerar as coisas. Lena começou a tocar-lhe nos ombros. Sem deixar um pedaço de pele por acariciar, continuou mais para baixo, até chegar à ereção. Devagar, pô-la na boca. No entanto, não pôde continuar, pois era demasiado grande. – Bolas, é estranho que me tenha


esquecido disto – comentou ela. – Não sei como podia praticar sexo oral contigo, a menos que seja muito mais experiente do que me lembro. Com um gemido de prazer, Trig agarrou-a pelas axilas para a fazer subir e beijá-la em profundidade, ao mesmo tempo que lhe segurava o cabelo com as mãos. Depois de um beijo longo e apaixonado, Lena levantou-se e pôs-se em cima da ereção dele. Ele agarrou-a pelas ancas e, com olhos ardentes, mexeu-se para cima. Lena deu um grito abafado. Trig parou, fechou os olhos e respirou fundo. Ela inclinou-se para a frente. – Beija-me – pediu Lena.


E ele fê-lo, enquanto a penetrava. – Estás bem? – quis saber ele. – Ficarei. – Tens a certeza? – Já me conheces. Adoro desafios. – Não estás a encorajar-me muito. – Não precisas que te encoraje. Fizemos isto antes – replicou ela e mexeu-se devagar. Trig levantou-a pela cintura com suavidade, até quase sair por completo e, depois, voltou a penetrá-la. Dessa vez, ambos gemeram. – Estás a conter-te – observou ela. – Estou a fazer o que posso – assegurou ele. – Se fosse melhor, acabaria muito depressa.


– Mas... – Porque falas tanto? – perguntou e beijou-a. Lena deixou de pensar, enquanto o beijo a enchia de ternura e doçura. Com suavidade, ele continuou a mexer-lhe as ancas. – Gostas? – Adoro. Portanto, Trig continuou dessa maneira, transportando-a para um lugar onde não havia pensamentos racionais. Só sensações.

Trig acordou antes do amanhecer e ficou a ver como Lena dormia durante


um bom bocado. Invadido pela culpa e pelo arrependimento, recordou-se que a enganara. Disse-se que não tivera oportunidade de lhe dizer que não eram casados. Embora soubesse que podia tê-lo feito na noite anterior. Ou antes dessa. Saiu da cama, vestiu as calças e saiu para o pátio. Precisava de um pouco de ar. Dali, observou as vistas da cidade. Segundo alguns, aquele era um sítio de corrupção, onde as pessoas esqueciam as suas inibições e perseguiam o que realmente queriam. Na noite anterior, ele perseguira o que quisera, sem pensar nas consequências.


Naquela manhã, não se sentia capaz de se olhar ao espelho. Atrás dele, ouviu um barulho e, ao virar-se, viu Lena a sair da cama e a coxear até à sua mala. Tirou uma camisa de noite branca e vestiu-a. Depois, tentou arranjar o cabelo com os dedos. Em que estaria a pensar?, questionouse Trig. Porque fora tão fácil recordar umas coisas e esquecer outras? E porque lhe custara tanto acreditar que continuavam casados? Quando Lena se aproximou dele, Trig sentiu-se incapaz de olhar para ela e observou o horizonte. Não devia ter-se rendido, repreendeu-se. Abusara da confiança de Lena e nunca poderia


perdoar-se. – Não conseguias dormir? – Não. – Tem alguma coisa a ver comigo? – Não. – Tenho a certeza de que estás a mentir. – Sim, está bem. – Porquê? – perguntou ela, rodeandolhe a cintura com os braços. – Uma má decisão leva a outra, suponho – indicou. – Não tenho desculpa para ti, Lena. Ela ficou em silêncio por um instante, mas não se afastou. Aproximou-se um pouco mais, apoiando a cabeça no peito dele. – Sobre o que mais me mentiste? –


quis saber ela. Por onde começar?, questionou-se Trig. – Amas-me? – sussurrou ela. – Muito – afirmou ele, fechando os olhos. Essa era a única verdade que nunca mudaria. – Então, estás a mentir-me sobre o trabalho. Não paras de olhar para o telemóvel. Passa-se alguma coisa. É uma missão? – Sim, há uma missão – admitiu ele e amaldiçoou-se por lhe oferecer a resposta mais fácil. – E tens de saber algo sobre isso, porque tem a ver com Jared e porque, antes de te magoares na cabeça, tu eras a líder da missão.


Lena pestanejou. – Não me lembro. – Eu sei. – É a razão por que estamos aqui. – Para encontrar Jared, sim. – E depois? – Depois, vamo-nos embora. – Isso não parece uma missão. – O objetivo é encontrá-lo. – Jericho3 – murmurou ela. – Fiz com que Damon investigasse um pouco. O dono é um traficante de armas russo. – Especialista em quê? – Em tudo. – E achas que Jared está lá? – A verdade é que não sei. Podia ter


adotado uma identidade falsa. Talvez não possa contactar connosco para não o descobrirem. – Se está a trabalhar numa operação infiltrada, porque quer ver-nos? – Não sei se quer ver-nos. Somos nós que queremos. – Porquê? – Estavas preocupada com a segurança dele. Há muito que não envia sinais de vida. – E tu estás preocupado com a segurança dele? – inquiriu ela. – Não tanto como tu. – A agência está preocupada com a segurança dele? Trig hesitou, sem responder. – Trig, diz-me que Jared não está a


trabalhar por conta própria. – Não posso dizer-to. – Mas está em contacto com alguém, não é? – quis saber ela, levando as mãos à cabeça. – Contigo? – Não. – Há quanto tempo é que ninguém o vê? – Algum. – Quanto, Trig? – Dezanove meses. – O quê? – perguntou ela, com ansiedade, sem compreender. – Como nos casámos sem ele estar presente? – acrescentou, depois de um momento. Trig podia ter aproveitado esse momento para lhe dizer que não estavam


casados. Mas não o fez. – A rapariga da lancha, de ontem, disse-nos que uma mulher e um menino vêm a terra uma vez por semana para ir ao hospital, acompanhados por dois guarda-costas e o piloto da lancha. Hoje, é esse dia. Eu tentei dizer a Jared que estamos aqui. Alguém revê as mensagens do telemóvel dele. Talvez não seja ele, mas se for, saberá como e onde nos contactar. – Achas que virá com a tripulação dessa lancha? – Se puder, sim. – E se não vier? – Terei de te levar para casa e voltar sozinho. Tentarei fazer com que me


convidem para o Jericho3. – Não! – gritou ela, abraçando-o com força. – Não quero perder-te também. – Lena... – Não. Se Jared não conseguir sair do barco, deixaremos que alguém vigie, iremos para casa e contaremos a Poppy e a Damon. Não quero que sejas tão idiota como o meu irmão. Não te deixarei. – Meu Deus, adoro como és agora! – exclamou ele. Pegou nela ao colo e sentou-a num pequeno muro de pedra, enquanto ela o abraçava como se não quisesse soltá-lo. – Ainda bem, porque estou a começar a pensar que antes era uma tonta –


afirmou ela. – Amo-te. Mesmo que tenhas segredos. Trig beijou-a para não ter de responder. Enquanto isso, um segredo amargo continuava a queimá-lo por dentro... Quando o revelasse, sabia que destruiria o mundo de Lena e o seu. E não podia culpar ninguém senão ele próprio.


Capítulo 10

– Não gosto disto – queixou-se Lena, às nove e quarenta e cinco, enquanto estavam parados no cais do castelo de Bodrum. Um barco cheio de turistas atracara. Mais à frente, uma dúzia de iates flutuavam na baía. – Há muitas saídas. – Muitas mulheres com crianças – replicou ela, ansiosa. – Não sabemos que tipo de barco vão trazer. E se nos passarem desapercebidos? – Será uma lancha de luxo, feita para


navegar em alto mar e a mulher e o menino terão guarda-costas. Não serão difíceis de reconhecer. Ainda não chegaram, isso é tudo. – Odeio esperar. Que horas são? – Nove e cinquenta. Estavam ali desde as sete e meia, a fingir ser turistas. O cais era um sítio lindo para tirar fotografias, mas Lena estava cada vez mais nervosa. – Tenho um mau pressentimento. E não sei porquê – indicou ela. – E há muita gente aqui. Poderiam identificarnos. Trig deu-lhe a mão e levou-a para um dos barcos turísticos. – Porque haveriam de o fazer? Não vamos fazer nada que chame a atenção.


Dez minutos depois, tinham chegado ao final do seu passeio pelo cais e continuava sem haver sinais de Jared. – Como está a perna? – perguntou ele. – Dói-me muito. – E o resto do teu corpo? – Por causa do sexo? – Sim – afirmou ele, depois de pigarrear, corando. – Custou-me muito ganhar essas pequenas dores e incómodos e estou a saboreá-los – murmurou ela. – Não consigo acreditar que me tenha esquecido de que o fazes tão bem. Trig olhou para ela como se quisesse que a terra o engolisse. – Eh! – exclamou, com suavidade. –


Lamento não conseguir recordá-lo. Devia ser capaz, porque foi fantástico. Digo-to no caso de teres alguma dúvida. Confia em mim, a tua forma de fazer amor é algo que nenhuma mulher devia esquecer. Trig riu-se, mas ficou paralisado ao ver algo na baía. – O que foi? Jared? – perguntou ela, com ansiedade. De repente, sentia a urgência tremenda de verificar se o irmão estava são e salvo. – Trezentos metros à esquerda do barco grande – murmurou ele. – Uma lancha de último modelo cor de laranja com seis lugares. Muito grande. Lena procurou o que Trig indicava. Ali estava.


– Ena! Não são muito discretos, pois não? É bonita. – Por favor, não me digas que queres uma igual. – Não poderia pagá-la – queixou-se ela, sem dúvida, devia ser um brinquedo muito caro. – Há um menino lá dentro. Trig assentiu. – Não vejo as caras. – Espera. – Parece que está a dirigir-se para o outro lado do cais – indicou ela, ansiando correr nessa direção. Trig segurou na mão dela e fez com que o observasse para ter toda a sua atenção. – Lena, deste-me a tua palavra de que


só querias ver Jared e deixar que ele te visse. Prometeste-me que não te intrometerias no que estiver a fazer. – Não consigo lembrar-me dessa promessa. – Tens sorte por eu me lembrar. – Podemos, pelo menos, aproximarnos um pouco? – Sim, mas não te afastes de mim. – Está bem! Vamos. A lancha estava prestes a atracar. Tinha quatro homens, uma mulher e um menino. – O piloto – indicou Trig. Lena tropeçou ao ver o irmão. Estava muito moreno, mais do que nunca. Trig segurou-a para que não caísse. – Estou bem – assegurou ela,


enquanto os olhos se enchiam de lágrimas. Num instante, Jared desapareceu da sua vista no outro lado do cais. – Lena? – Estou bem. Dói-me a cabeça – afirmou ela, desviando o olhar. Não queria que o irmão a visse a chorar. – O que estão a fazer? – Estão a atracar. – Quem saiu? – A mulher e o menino. Os homens da segurança. – Jared, não? – Não. – Viu-te? – quis saber ela. Pela sua estatura, era mais fácil ver Trig.


– Sim. Lena virou-se e observou o barco, fingindo admirá-lo. Depois, olhou para Jared. Ele tirara os óculos de sol e estava a limpá-los com a ponta da tshirt. Observava-a. – Vai atirar a tua garrafa de água para o lixo! – ordenou Trig. – Querias que Jared te visse andar, portanto, anda. Certifica-te de que consegue ver-te. Lena soube que era verdade. Queria que o irmão visse que não ficara inválida. Portanto, endireitou-se e dirigiu-se para o caixote do lixo, tentando fingir que não lhe custava nada. «Estou de pé», quis dizer a Jared. «Consigo andar, tonto!»


Deitou a garrafa vazia fora e virou-se para verificar que Jared estava a observá-la com um pequeno sorriso. «Vês? Fiz a minha parte», quis gritar ela. «Não deixes que te matem a fazer a tua. O importante é que voltes para casa e esqueças a... Vingança.» Os passageiros do barco de Jared saíram. Os guarda-costas estavam alerta, atrás da mulher e do pequeno, que se baixou para atar um sapato e levantou a cara para Lena, sorrindo. Não parecia doente. A mulher deteve-se e olhou para trás. – Celik! – chamou-o, num tom de reprimenda. Celik levantou-se e correu para o


lado da mulher. Nenhum deles olhou para trás. Lena olhou para Jared. Ao ver que estava a sair do cais, a afastar-se, sentiu um aperto no coração de tristeza. Queria que o irmão voltasse. Era bom se encontrasse o responsável pelo que acontecera, mas não queria que arriscasse a sua vida. – Deixa que outro salve o mundo – murmurou ela e, naquele momento, decidiu que não queria ter nada a ver com a agência. Não se importava se Jared, até Trig, continuassem a trabalhar como espiões. Ela estava farta e queria deixá-lo. Então, Lena sentiu uma dor aguda atrás dos olhos e levou as mãos à


cabeça. Enquanto a visão começava a toldar-se, tentou voltar para junto de Trig. Precisava da força dele. Trig era o seu melhor amigo, o seu amante e o seu... Marido. – Maldito canalha... – murmurou ela, ao compreender. Adrian Sinclair era muitas coisas para ela, mas não era o seu marido. Era por isso que não conseguia lembrar-se de quando a pedira em casamento, nem ter tido sexo com ele. Era por isso que não tinham fotografias do casamento. Mal teve tempo de olhar para ele. Trig aproximou-se a correr e o mundo


de Lena tingiu-se de preto.

Lena recuperou a consciência nos braços de Trig, abraçada ao peito dele. Estavam sentados num dos bancos do cais. Não havia curiosos à volta e ela sentiu-se tremendamente agradecida. Com esforço, Lena levantou-se. Arranjou o cabelo, tentando pôr o caos das lembranças em ordem. – Eu... – Desmaiaste – concluiu Trig e deulhe uma garrafa de água. – Durante quanto tempo? – Alguns minutos. – Jared viu? – Não sei, mas foi-se embora. Tenho


de te levar ao hospital outra vez. – Tencionas dizer-lhes que és o meu marido? – Lembraste-te – observou ele, num tom sério. Lena assentiu, devagar. – Ao ver Jared, todas as minhas lembranças me assaltaram como um tsunami. Recordei quando me deram um tiro, quando tu me pedias para resistir, quando fomos ao hospital em Darwin e... Tudo encaixa agora. – Fico feliz. – Mas não me lembro de me ter casado contigo. Trig não disse nada. – Não estamos casados, pois não?


– Não. Lena assentiu, retorcendo a aliança no dedo. Baixou a cabeça para que não conseguisse vê-la a chorar. – Porque me fizeste acreditar que sim? – Roubaram-te a carteira com toda a tua documentação. No hospital, disse que era o teu marido porque assim te tratariam mais depressa. Só percebi que pensavas que era verdade quando chegámos ao hotel. – Porque não me disseste a verdade? – Não queria preocupar-te. Queria proteger-te. Também esperava que, no dia seguinte, tivesses recuperado a memória.


– Mentiste-me. Trig assentiu. – Eu confiei em ti. – Ainda podes fazê-lo. – Como? Fizeste-me parecer uma tonta. – É o que achas? – Que outra coisa posso pensar? – perguntou, tirando as alianças e segurando-as na palma da mão. – Fizeste-me acreditar nisto. – Tu pediste-me as alianças. – Não sabia o que dizia. Como pudeste deixar que acreditasse em algo que não era real? – Não foi assim. – Eu estava lá. Foi assim – afirmou


ela, olhando para as alianças. Se virasse a mão, cairiam ao chão. – Lamento – desculpou-se ele, fechando a mão sobre a dela e as alianças. – Não é de estranhar. Confiei em ti. Fui para a cama contigo. E deixaste-me fazê-lo! – Foi muito difícil negar-me. – Ah, portanto, é culpa minha. – Não, a culpa é apenas minha – reconheceu ele, passando uma mão pela cabeça. – Sei que devia ter-te metido num avião em direção à Austrália assim que o médico nos disse que podíamos viajar. Mas, em vez disso, trouxe-te aqui, com a esperança de que conseguisses ver o teu irmão. Essa é a


razão por que estamos na Turquia. A única razão. Sei que, nos últimos dias, tomei muitas decisões erradas, mas pensei que vir a Bodrum e tentar ver Jared seria o melhor. Sabia que isso significava dormir outra noite contigo e pensei que conseguia lidar com a situação. – Pensaste que conseguias manipularme. – Devia ter sabido que não era possível – continuou ele, olhando para ela nos olhos. – Mas nem tudo foram mentiras, Lena. Eu quero casar-me contigo. Quero ver como navegas em lanchas de corridas e agarras a vida com ambas as mãos. Quero viver contigo


nessa casinha no rio. – Mas isso não te dá o direito de tirar o que queres sem mais nem menos – repreendeu-o, com lágrimas nos olhos. – Podíamos voltar atrás e começar a sair. Ela não pôde evitar rir-se com a audácia dele. – Eu confiava em ti. – Ainda podes fazê-lo. – Não – negou Lena e deu-lhe as alianças. Depois, encostou a cabeça entre as mãos, ansiando esconder-se do mundo. – Não posso.

Trig não mudou de ideias em relação a levá-la ao hospital. Em Bodrum, os


médicos quiseram interná-la toda a noite, para a vigiarem. Fez com que lhes enviassem o historial de Istambul. Levou-lhe roupa e o estojo de higiene pessoal ao hospital e ligou à família para os pôr ao corrente. – Sinto-me bem – assegurou Lena a Trig, quando a enfermeira chegou ao quarto para o fazer sair, pois a hora de visita acabara. – Vai-te embora – pediu. Quando a enfermeira saiu, os dois ficaram em silêncio. Sobre eles, pesava a tensão de todas as coisas que não tinham dito nas últimas horas. Trig ajudara-a a encontrar Jared, mas também tinha traído a sua confiança. E partiralhe o coração.


– Quero agradecer-te – declarou. – Jared está vivo e agora sei. Vi-o e ele viu-me. Não posso impedir que continue a fazer o que está a fazer. Quer salvar o mundo e essa é uma ambição nobre. Embora já não queira seguir os seus passos. Agora, só quero sobreviver cada dia sem perder as forças. – Estás a fazê-lo muito bem – murmurou ele. – Não. Nada disso. Quero que te vás embora. Quero que vás para casa. Por favor. Quando chegou a hora de visita do dia seguinte, Poppy estava lá. E Trig não.


Capítulo 11

Cinco dias depois, Lena regressou à casa da praia de Damon. Poppy voltara para Darwin, onde o seu amado Sebastian esperava por ela. Poppy não fizera perguntas sobre o que acontecera entre Trig e Lena na Turquia. Alegrarase por Jared estar vivo e, sobretudo, sentira-se aliviada quando tinham dado alta à irmã no hospital. – Agora, podes deixar de te preocupar com os outros e percorrer o teu próprio caminho? – sugerira Poppy a


Lena, enquanto faziam as malas. – Tens uma vida pela frente, à tua espera. Tinham passado cinco dias desde que Lena pedira a Trig para se ir embora. E a solidão e a sensação de se ter enganado estavam a consumi-la. Em casa de Damon, tinha tudo o que precisava. Era confortável, espaçosa e tinha uma piscina interior. Lá, passara dias incontáveis, a fazer reabilitação, a esticar os músculos e a tentar fazer com que a sua perna esquerda se mexesse, mais um milímetro cada dia, com dores terríveis. Também recordava que Trig sempre estivera ao seu lado, a cuidar dela e a encorajá-la. Às vezes, ia-se embora, quando gritava que a deixasse em paz, mas voltava sempre em pouco


tempo. Não era o tipo de homem que abandonava uma mulher. Daquela vez, no entanto... O mais provável era que não voltasse. Quando o telemóvel de Lena tocou na mesa junto da porta, sentiu um aperto no coração. A toda a pressa, olhou para o ecrã para ver quem era, mas suspirou, dececionada. Não era Trig, era Ruby. – Parabéns! – exclamou Lena, ao atender. – Já sei a notícia. – Obrigada. Disse a Damon que queria contar-te pessoalmente, mas os rapazes são uns mexeriqueiros. Parece que Trig e ele não tinham outra coisa para falar quando estiveram na Turquia. Bom, para além do facto de ter


encontrado Jared e de ter fingido estar casado contigo. É por isso que estou a ligar-te. Sei que continuas zangada com o meu segundo homem preferido do planeta. – Fez-me pensar que estávamos em lua de mel, Ruby – queixou-se Lena, sabendo que o melhor com a cunhada era ir direta à questão. – Mentiu-me várias vezes. Como posso perdoar algo parecido? – Tens de analisar as coisas com detalhe – aconselhou Ruby. – Disse-te que estavam em lua de mel? Talvez tenhas sido tu a tirar essa conclusão e Trig se tenha limitado a não te corrigir. Talvez o médico tenha ordenado que descansasses. Não devias pensar muito,


nem preocupar-te. Talvez Trig tenha pensado que, depois de uma noite de sono reparador, acordarias na manhã seguinte com a memória recuperada. – És a advogada de defesa? – Se fosse, não estaria a ligar-te. A tua amnésia parcial pôs Trig numa situação muito difícil. Fez o melhor que pôde. Ele pensa sempre no melhor para ti. – Mentiu-me. Deixou-me parecer uma tonta, Ruby – insistiu Lena, sem conseguir conter um soluço. – Era tão feliz... Tinha feito todo o tipo de planos para nós... – Como quais? – Queria que comprássemos uma


quinta. Pôr decorações de Natal. Ter filhos. Eu não posso ter filhos, mas aceitei adotar ou contratar uma barriga de aluguer. Até pensámos em pedir os teus filhos emprestados de vez em quando. Pensámos em tudo. Pensei que era real. Fui para a cama com ele. – Foi para a cama contigo? – Sim. – Pobre Trig! – Pobre Trig? E eu? – Ele sabia que, mais cedo ou mais tarde, descobririas que não eram casados. Pensou que, desde que a farsa matrimonial não chegasse muito longe e visses Jared, tudo seria para melhor. Pôs as tuas necessidades à frente das dele. Como conseguiste fazer com que


fosse para a cama contigo? Da última vez que falei com ele, estava decidido a não o fazer. – Ah, já me conheces – indicou Lena, esfregando as têmporas. – Sou muito insistente, aproveito as fraquezas dos outros e não aceito um não como resposta. – Tenho a certeza de que não foi assim – comentou Ruby, com cautela. – Tu não estavas lá. – Então, não culpas Trig por essa parte da história. – Enganas-te. É um alvo perfeito para a minha raiva. Talvez seja porque tem os ombros tão largos. O que se passa é que... Embora aceite toda a


responsabilidade dessa parte, não me faz sentir melhor. – Não, mas tens de começar por algum lado – opinou Ruby. – Isto é o que vais fazer. Prepara um chá, senta-te e desenha duas colunas num papel. Na primeira, anota os factos que aconteceram na Turquia. Na segunda, escreve o que queres que aconteça agora. – E o que Trig quer? – Acrescenta outra coluna e pede-lhe para a preencher. Sabes que está perdidamente apaixonado por ti? Não o adivinhaste? – Sim. Mas olho-me ao espelho e não entendo o que vê em mim. – Uma companheira, um espírito


afim... – Não posso fazer as coisas que fazíamos antes. – Concentra a tua atenção na segunda coluna – recordou-lhe Ruby, com paciência. – Nela, escreve todas as coisas que podes fazer, que queres fazer e que gostarias de fazer com Trig. – Isso são mais três colunas. – Fá-lo assim. Liga-me amanhã para me dizeres o que se passou. Liga a Trig. Não te culpes, nem a ele, por uma situação que não estava sob o vosso controlo. No entanto, agora, podes tomar as rédeas do que te está a acontecer. – Tens a certeza de que não és terapeuta?


– Às vezes, tenho de o ser um pouco. Lena ficou calada por um instante. Ruby tornara-se parte da família. Era uma mulher forte e sábia, com uma longa trajetória. Era o tipo de pessoa em que podia confiar. – Posso ligar-te se precisar de mais ajuda? – Claro. – Obrigada. Dá lembranças a Damon da minha parte. – Está bem – acedeu Ruby e despediu-se. Lena dirigiu-se para o sofá com a perna dorida. Lembrou-se de Trig nos banhos turcos, a tentar tapar a nudez dela. E de como lhe falara de noites


estreladas e de tartarugas. Lembrou-se de dançar entre os braços dele ao som de uma pianola. E como ele se despira e fizera amor com ela. «Trig ama-te», obrigara-a a dizer. Trig amava-a. Dois minutos depois, Lena adormeceu.

Adrian Sinclair estava a enlouquecer à espera que lhe ligasse. Não conseguia permanecer sentado. Não conseguia dormir, nem trabalhar. Nem sequer cansar-se a fazer exercício físico o ajudara a relaxar. Nas últimas três noites, deitara-se cansado e acordara a sonhar com Lena.


Trig sabia que ela estava em casa. Poppy ligara-lhe para o informar. Mas Lena, não. Quando falara com o pai ao telefone, Trig perguntara quanto podia valer uma velha quinta nas margens de um rio. Contudo, Lena continuava sem ligar. Adrian Sinclair sempre perseguira os seus objetivos. Porém, com a indómita Lena West era diferente. Passara toda à vida à espera do momento e do lugar adequado para tentar. No entanto, estava farto de esperar. Precisava de um plano de ataque, algo que fizesse com que Lena agisse com ele da mesma maneira do que na Turquia. Se ela fora feliz com ele lá, podia


repeti-lo. Lutaria até conseguir. Quando chegou a casa do trabalho naquela tarde, Trig já forjara um plano. E, quando abriu o seu correio e viu a fotografia de uma antiga fazenda que o pai lhe enviara, o plano perfilou-se ainda mais. Ligou a Lena, mas ela não atendeu. Meia hora depois, voltou a ligar e ela atendeu. – Lembras-te do que te obriguei a dizer quando estávamos a fazer amor no hotel de Bodrum? – perguntou ele, sem rodeios. – O quê? – Diz-me. Diz que sabes que te amo e que sempre te amarei. – Não sou um papagaio. – Está bem. Menti-te ao dizer-te que


estávamos casados. Devia ter esclarecido as coisas, não o fiz e acabei com um pé no paraíso e outro no inferno. Deixaste-me ver o que podíamos partilhar se ambos nos comportássemos como queremos. Eu quero casar-me contigo. Podemos fazê-lo. Podemos realizar todos os planos de que falámos, se quisermos. Lena não respondeu e, do outro lado da linha, Trig só percebeu um som abafado que esperava que não fosse um soluço. – Amo-te, Lena. Sempre te amarei. Vê o teu correio eletrónico. Depois, Trig desligou. Enviou-lhe a fotografia da velha quinta que o pai lhe


enviara, com links para a informação de venda. Incluiu também o cálculo estimado que o pai fizera da reforma. – Onde está o rio? – perguntou ela, noutra mensagem, dez minutos depois. – Sob a colina. A casa é no topo porque, quando chove, o rio cresce – respondeu. Ela não respondeu. Trig decidiu não o aceitar como uma derrota. Sabia que conseguir fazer com que o perdoasse não ia ser fácil. Na manhã seguinte, antes de ir trabalhar, Trig enviou-lhe outra mensagem com links de vários fabricantes de azulejos, indicando-lhe que eram para o chão do banho turco. Ela ligou-lhe naquela tarde, quando


Trig ia no carro de volta a casa. – Preciso que me ajudes a preencher um formulário – pediu ela. – Que tipo de formulário? – Tem três colunas. Uma é o que aconteceu na Turquia, chamei-lhe a coluna dos factos. Outra, é a que quero que aconteça de agora em diante. A terceira é o que tu queres que aconteça. É uma ideia de Ruby. – Adoro essa mulher. – Dizes isso muitas vezes. Confundeme um pouco. – Adoro-te mais. Lena suspirou. – Posso enviar-te o formulário? – Preencheste a tua coluna?


– Preenchi as duas primeiras. Demorei dois dias. – E se não estiver de acordo com os factos da Turquia? – Podes acrescentar correções. Ruby disse que podias fazê-lo. – Uma mulher inteligente. Houve um silêncio. – Tu também és inteligente – acrescentou ele. – Eu sei. – É melhor não falares mais – declarou e desligou.

Trig chegou a casa num tempo recorde. Levou o computador para a cozinha e pô-lo na mesa, junto dos


restos de piza da noite anterior. Ligou-o, tirou um refresco do frigorífico e esperou que carregasse. No fim, encontrou o correio de Lena e abriu-o. Ela não se incomodou em acrescentar uma introdução. Começava com a primeira coluna. Os factos Lena ama Trig (e não como um irmão). Está apaixonada por ele. Nunca ninguém foi capaz de estar à sua altura. Nem de longe. Trig não fora consciente desse facto até àquele momento. Ao lê-lo, engasgouse com o refresco e salpicou a mesa com ele. No entanto, concordava com aquele


facto. Leu-o outra vez, só para se certificar de que lera bem, antes de continuar com o facto número dois. Trig ama Lena. Também concordava. Todos, menos Lena e Trig, sabem que Lena ama Trig e que Trig ama Lena (este facto foi contribuído por Ruby, Poppy, o namorado de Poppy, Damon e Damon em nome de Jared). Eram umas pessoas muito inteligentes, pensou ele.


Lena e Trig foram a Istambul para encontrar Jared. Encontraram-no. Lena caiu e bateu com a cabeรงa, perdeu a memรณria e pensou que estava casada com Trig. Trig deixou-a acreditar que estava casada com ele. Era a verdade, pensou. Lena queria ir para a cama com Trig. Trig sorriu e bebeu um gole de refresco, nessa ocasiรฃo, sem entornar. Trig resistiu.


Lena continuava a querer ir para a cama com ele. Trig resistiu. Lena sentia-se frustrada. Lena seduziu Trig. Trig permitiu. Lena viu Jared, recuperou a memória, apercebeu-se de que não estava casada com Trig e sentiu-se confusa e furiosa. Em resumo, fora assim, refletiu ele. Lena pensou que obrigara Trig a fazer algo que não quisera fazer. O quê? Quando lhe dera a sensação


de não saber o que queria? Queria estar com ela e nunca lho escondera. A menos que estivesse a falar das primeiras noites, em que Lena tentara fazer com que fosse carinhoso com ela e ele se recusara... Ou quando lhe pedira uma noite de núpcias para recordar e ele se escondera no duche e dera a desculpa de se sentir pressionado... Muito, talvez Lena tivesse razão, admitiu Trig. Embora o facto de lhe ter proclamado o seu amor antes, durante e depois do ataque de amnésia devesse contar para alguma coisa. Trig continuou a ler. Lena pensou que Trig podia tê-la obrigado a fazer algo que ela não


queria. Não sabia o que pensar nem o que era real ou não. – Acredita em mim – suplicou ele, na solidão da cozinha. Lena ignorou temporariamente o facto de amar Trig e de Trig a amar e que poderiam fazer um bom casal. Aquele era o último dos factos, segundo Lena. Trig passou a mão trémula pela cara. Havia alguns pontos muito positivos, sobretudo, os dois primeiros e o último. O amor era invencível. Contudo, também havia alguns pontos não tão bons, reconheceu.


Suspirando, continuou com a segunda coluna. O que Lena quer: Lena nunca pensou realmente no que queria. Ena. Isso não era de muita ajuda. Seguiu Trig e Jared para fazer parte dos serviços secretos porque queria estar com eles. Nem sempre amava o seu trabalho, mas era mais ou menos feliz porque tinha Jared e Trig ao seu lado. Trig franziu o sobrolho. Era importante que Lena admitisse que não


se sentira bem nos serviços secretos. Porque nunca se apercebera? Lena já não quer trabalhar para os serviços secretos. Precisa de uma nova carreira. Está a pensar em ser fisioterapeuta ou psicoterapeuta para ajudar as pessoas com problemas de mobilidade. Tem dinheiro para voltar a estudar. Lena era inteligente e Trig conseguia imaginá-la a cumprir os seus desejos. Tinha a certeza de que conseguiria o que quisesse. Nunca se rendia e gostava disso nela.


No seu tempo livre, Lena quer navegar. Se Trig e Lena compararem lanchas de corridas, ela ficará com a vermelha. Trig riu-se. Lena quer casar-se com Trig. Trig sentiu um aperto no coração. E quer viver numa quinta numa colina perto de um rio que, às vezes, transborda. E ajudar a criar os filhos adotados e alguns cachorros. Lena quer que as crianças lhe chamem mamã e que os cães pensem que ela é a chefe.


Trig passou uma mão pela cara. Tudo o que ele sempre quisera estava naquela coluna. Lena também quer um banho turco dentro da casa, que tenha cascatas e jorros de água. Lena quer que Jared volte para casa para poder dar-lhe um pontapé no traseiro por não ter entrado em contacto com a família, mas isso pode esperar. Lena quer superar as suas limitações físicas, em vez de sofrer por elas. Talvez precise que lho recordem de vez em quando.


Bolas, amava aquela mulher, pensou Trig. E Lena ama Trig. E quer saber o que quer ele para que possam ajustar os planos. A terceira coluna, intitulada «O que Trig quer», estava em branco. Teve a tentação de copiar a coluna anterior. No entanto, abriu uma página nova e decidiu pensar com atenção no seu futuro. Meia hora e doze palavras depois, pensou que era um homem de mais ação do que de palavras. Portanto, entrou no carro e dirigiu-se para a casa da praia de Damon. Para procurar Lena.


Lena acordou ao ouvir como alguém batia à porta com impaciência. Gemeu ao verificar que eram cinco e vinte da madrugada. Antes de dormir, esperara uma resposta de Trig, mas ele não ligara, nem escrevera. Finalmente, ligara-lhe e descobrira que tinha o telemóvel desligado ou sem rede. Ao voltar a ouvir a campainha, Lena levantou-se da cama. Quem mais estaria a bater à porta àquelas horas? Lena chegou à entrada a toda a velocidade. Abriu-a e ali estava Trig, com um sorriso radiante. A sombra de barba no queixo e a camisa amarrotada tornavam-no mais atraente. – Trouxe croissãs – afirmou. – Ainda


estão quentes. Quando Lena se afastou para o deixar entrar, viu o seu carro. – Vieste de carro? – Não é assim tão longe. – Quantos cafés bebeste? – Perdi a conta – murmurou ele e beijou-a nos lábios. – Estou muito acordado. Trig dirigiu-se para a cozinha, seguido de Lena. – Vieste de carro – repetiu ela. – Os aviões são muito lentos. – E escolheste o carro. – Não estás tão acordada como eu, pois não? Segundo parecia, não. – Na tua mensagem, dizias que me


amas – continuou ele, sem conseguir conter-se. – Decidi perdoar-te por isso, mas, precisava de vir pessoalmente para te responder. Porque é assim que se fazem estas coisas, pessoalmente. – Ah... – murmurou Lena, tentando esconder o seu sorriso. Apoiou-se na mesa da cozinha, agarrando as mãos para não o abraçar e deixá-lo falar. – Pensei que já te tinha dito pessoalmente que te amo – indicou. – Lembro-me muito bem. Foi da segunda vez que me pediste em casamento. Ou foi da primeira? Ou essa vez não conta porque eu pensava que já estávamos casados e não era assim? – Conta – replicou ele, com uma


careta. Lena sorriu. – Para alguém com um aspeto tão angelical, és uma torturadora. – E gostas – observou. – Amas-me. – Sim – afirmou ele, tirando um pedaço de papel amarrotado do bolso. – É a tua lista do que queres. – E a tua? – Está na minha cabeça – respondeu ele, deu uma olhadela rápida ao papel e prosseguiu. – Não quero deixar os serviços secretos, ainda que, quando tivermos filhos, tencione deixar o trabalho de ação e ficar no escritório de operações. Parece-te bem? – Sim. É o teu trabalho – aceitou ela. – Muito bem. Também quero


acrescentar algumas coisas ao projeto da piscina. Quero que tenha uma sereia de pedra nas escadas e luzes sob a água. – Porque não? – murmurou ela. – Sim. E, embora gostasse que Jared estivesse no nosso casamento, não vou esperar mais. Enviaremos o convite e veremos se aparece. Em junho, pareceme bem. – Junho, está bem. – Em relação aos cães, quero que os tiremos de uma casa de acolhimento e que, quando crescerem, me cheguem ao joelho. Vou treiná-los para que não magoem as crianças. E tanto as crianças como os cães pensarão que sou o chefe. – Sempre gostei de desafios –


comentou ela. – Certo. E quero passar a lua de mel na Caravana de Saul. – Perfeito! Trig deixou o papel na mesa e aproximou-se dela para a beijar. – Queres que te peça em casamento outra vez? – Sim. – Queres fazê-lo à luz da lua e das estrelas? – E com tartarugas. – Sabia. Então, Lena abraçou-o e beijou-o devagar, com ternura, enquanto lhe desabotoava a camisa. – Amo-te, Lena. – Eu sei – sussurrou ela e segurou na


cara dele. – E tens razão. Dizê-lo em pessoa é melhor. Adrian Sinclair, eu também te amo.


Capítulo 12

Seis meses depois... Lena não chegava ao fecho das costas. Por sorte, era para isso que serviam as damas de honor. Poppy e Ruby ajudaram-na com o vestido de seda e tule com corpete bordado e longa saia de tule. Lena escolhera-o, com a aprovação da irmã e da cunhada. Ruby escolhera os sapatos e os acessórios para o cabelo. Os sapatos eram brancos. A tiara


tinha flores brancas e delicadas e era perfeita para um casamento no campo, como o que estavam prestes a celebrar nas margens do rio. Ruby usava um vestido verde musgo que destacava a barriga exuberante. O vestido de Poppy era azul. O quarto principal da quinta fora restaurado e mobilado na semana anterior. Fora um presente de casamentos do futuro sogro de Lena. A cama era enorme, feita à medida. O chão era de madeira, polida e envernizada. Os tapetes de seda provinham da Pérsia. Lena comprara-os num leilão há três semanas e, entretanto, escondera-os na lareira para fazer uma surpresa a Trig. Na noite anterior, no entanto, ele


quisera acender a lareira. Por sorte, Damon e Sebastian, o namorado de Poppy, tinham-no obrigado a cortar lenha. Assim, Lena, Ruby e Poppy tinham podido mudar o esconderijo dos tapetes. Com Ruby grávida de seis meses, Lena coxa e Poppy sem parar de se rir, custara-lhes bastante, mas tinham conseguido pô-los num duche de uma casa de banho que ainda estavam a restaurar. E, naquela manhã, o pai e o irmão de Trig tinham-nos posto no quarto. Lena esperava que Trig gostasse. Se não, sempre podia comprar outros. – Falta meia hora – informou-a


Poppy. Lena olhou pela janela que dava para a pradaria onde a cerimónia teria lugar. Um trio de empregados oferecia refrescos aos convidados sob um toldo. Havia sombrinhas, tapetes na relva e toalhas para os convidados intrépidos que queriam tomar um banho no rio. Várias mesas para a comida estavam dispostas sobre a erva, com toalhas brancas de linho, talheres de prata e arranjos florais. Dois antigos Aston Martin estavam estacionados à porta, preparados para levar Ruby, Poppy, Lena e o pai desde a casa até à margem do rio, onde teria lugar a cerimónia. Um dos carros era prateado e, o outro, verde. Eram um


presente do pai para os noivos. Trig ainda não sabia dos Aston Martin, nem que, duas vezes por ano, se celebrava uma corrida deste tipo de carros antigos em Brisbane. Ia ser muito divertido, pensou ela. O fotógrafo tirou algumas fotografias das três mulheres a preparar-se para o grande momento. – Estou a esquecer-me de alguma coisa, mas não sei o quê – indicou Lena, que estava quase pronta. – As joias – observou Poppy e abriu uma caixa de veludo com reverência. Pertencera à mãe. Com cuidado, ajudou a noiva a pô-las. – Estás bonita – comentou Ruby, com


os olhos cheios de lágrimas. – A noiva está pronta? – perguntou a mulher que Lena contratara para organizar o evento. – Está pronta – respondeu Poppy. – Ainda bem. Os músicos estão aqui e está tudo preparado. O encarregado do cateringue tem tudo controlado na cozinha e o noivo e os acompanhantes já estão no rio. – Espero que não se molhem – murmurou Ruby. – Penso que vêm em lanchas de corridas – indicou a organizadora. – Numas muito rápidas. – Imagino – comentou Lena, com um sorriso. Não tivera tempo para comprar lanchas, pois estivera muito ocupada a


comprar a quinta e a restaurá-la. Além disso, inscrevera-se na universidade e também encontrara tempo para planear o casamento. Contudo, talvez Trig tivesse tido tempo para ir às compras, pensou. A única coisa que podia estragar aquele dia tão maravilhoso era a ausência de Jared. Conforme parecia, continuava na fortaleza flutuante do traficante de armas. – Eu gostaria que Jared estivesse aqui – admitiu Lena. – Ele é que perde – indicou Ruby, com carinho. – Claro que sim – afirmou Lena. Embora continuasse a custar-lhe, não só por ela, mas também por Trig.


– Teria vindo se pudesse – defendeuo Poppy, imediatamente. Ou se quisesse, pensou Lena, mas não lho disse. Não tinha sentido albergar pensamentos negativos. A alegria e a gratidão enchiam os seus dias. Era uma mulher feliz e cheia de amor. E o amor tornava tudo possível. A organizadora do evento deu uma olhadela a uma mensagem que acabara de lhe chegar ao telemóvel e sorriu ainda mais. – O teu pai está aqui. Está junto dos carros. Reservámos dez minutos para as fotografias. Vinte minutos depois, sairemos para a margem do rio. O rio não era longe. A maioria dos


convidados optara por ir a pé até à margem. Poppy entregou o ramo de noiva a Lena. Juntas, Poppy e Ruby puseram-lhe o véu na cabeça. – Estás muito bonita – elogiou Poppy. – Sim – assentiu Ruby. – A esperança fica-te bem. E a felicidade também. – Estás pronta? – perguntou Poppy. Lena assentiu. Sim, estava pronta.

Trig odiava esperar. Sobretudo, odiava esperar à frente de trezentos convidados, mas aguentou o melhor que pôde e cumprimentou as pessoas até o


telemóvel de Damon tocar. Ruby informava-os de que Lena estava a caminho. Damon conduziu o noivo e Matthew, o irmão de Trig e o seu padrinho, ao altar improvisado onde ia celebrar-se a cerimónia. Um Aston Martin verde apareceu em direção ao rio, seguido de outro prateado. – Que bonitos – comentou Matthew. – Muito bonitos – concordou Damon. Virou-se para Trig e ajeitou a flor que tinha no bolso do fato. – São um presente de casamento. O meu pai pediu-me para te dizer que um deles é para ti e que o verde é mais rápido.


Bem-vindo à família. – Obrigado – agradeceu Trig. Mal conseguia respirar, enquanto via como Ruby e Poppy saíam do primeiro carro e ajudavam Lena e o pai a sair do segundo. Demoravam uma eternidade a aproximar-se. – Alguma coisa está mal – adivinhou Trig. – Não, tenho a certeza de que está tudo normal – replicou Matthew. – É normal – confirmou o sacerdote. – Estão à espera da música. Ah! A música. Então, um solo de guitarra indicou o momento adequado. Ruby e Poppy desviaram-se, deixando Lena e o pai passar. Lena estava muito bonita. Era a


guardiã do seu coração e guardava-o com a mesma força e determinação com que fazia tudo na vida, pensou ele. – Respira – recordou o irmão a Trig. Então, Lena chegou ao seu lado, acompanhada por Poppy e Ruby. – Queridos irmãos – começou a dizer o sacerdote. Trig relaxou um pouco. Aquilo era real. Finalmente, estava a acontecer. De repente, o barulho de uma lancha irrompeu em cena. Franzindo o sobrolho, o sacerdote virou-se para o rio. – Queridos irmãos – repetiu, mas interrompeu-se novamente. Todos olharam para a lancha que se


aproximava a grande velocidade, incluindo Lena. Trig afiou o olhar, pois era um barco que lhe parecia familiar. Era quase igual ao dele, mas o dele era preto e aquele era vermelho. – Trig – começou a dizer ela, nervosa. – Aquele louco que conduz a lancha não é Jared? Parece-se muito com Jared. Era Jared, pensou Trig, com vontade de o matar. – Tu sabias disto? – perguntou Trig a Damon. – Sabias que vinha e não nos disseste? – Não! – exclamou Damon, levantando as mãos. – Não. Não tenho nada a ver. Foste tu que lhe enviaste a mensagem de texto a convidá-lo.


– Algum de vocês sabia? – voltou a perguntar Trig, tentando não perder a calma. Todos responderam que não. Matthew virou-se para os convidados. – Vamos fazer uma pausa de cinco minutos, amigos. Só mais cinco minutos e estariam casados, pensou Trig, enquanto a lancha se aproximava a toda a velocidade. Jared parou ao chegar à margem e não bateu contra a lancha de Trig por apenas uns centímetros. Então, Jared saiu do barco e dirigiuse para eles. Parecia cansado. Era melhor não falar das calças de ganga e


da t-shirt suja. – Não confirmaste que vinhas – acusou Lena, tensa e com vontade de chorar. – Mas vim – afirmou Jared, suplicando-lhe com o olhar que o compreendesse. Depois, virou-se para Trig. – Será um prazer ser a tua testemunha. Pensavas que ia perder algo parecido? – Roubaste-me o barco. O de Lena. – É uma pena que não tenhas podido roubar também um fato – murmurou Ruby. – Não penso que nos tenham apresentado – indicou Jared, olhando para a barriga de Ruby. – Ruby, Jared. Jared, esta é a minha


mulher – apresentou Damon, dando um passo à frente. – Perdeste o nosso casamento – queixou-se Ruby. – Eu sou Sebastian – apresentou-se o namorado de Poppy, tirou o casaco e deu-lho. – Poppy e eu ainda não nos casámos. Jared vestiu o casaco que lhe oferecia e apertou-lhe a mão com força, como era de esperar. – Trig? – chamou Lena, trémula. – O que precisas? – perguntou Trig, imediatamente, concentrando-se só nela. – Podemos ignorá-los e casar-nos? – Para mim, não existem – confirmou Trig. – Só existes tu – afirmou, beijando


a mão dela. O sacerdote sorriu e começou outra vez. – Querido irmãos... Cinco minutos depois, os familiares e amigos que se reuniram junto da margem aplaudiram, aclamaram-nos e sorriram, cheios de alegria. A noiva e o noivo estavam casados.


Se gostou deste livro, também gostará desta apaixonante história que cativa desde a primeira até à última página.


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Table of Content Página de título Créditos Prólogo Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8


Capítulo 9 Capítulo 10 Capítulo 11 Capítulo 12 Volta


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