Políticas Sociais: Acompanhamento e Análise - 17 Volume 1

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Políticas Sociais: acompanhamento e análise

Observa-se que a justiça de 1a e 2a instâncias no país vem concedendo o benefício mesmo quando o usuário requerente ultrapassa o critério de um quarto de SM familiar per capita. De modo geral, verifica-se entendimento recorrente entre magistrados no sentido de que as decisões devem levar em consideração as especificidades de cada caso concreto, observando as peculiaridades e o estado de necessidade das famílias demandantes. Um destes processos encontrase, atualmente, no Supremo Tribunal Federal (STF) a espera de julgamento. A decisão do STF terá repercussão geral, passando a ser adotada em todos os casos semelhantes, o que poderá causar um impacto significativo na cobertura do programa. Esse movimento de recorrer à via judicial buscando garantir o acesso ao BPC está abrindo uma polêmica acerca do alcance do direito à Assistência Social e sua universalização haja vista as conhecidas limitações orçamentárias. O que se coloca em discussão é a questão da cidadania e da democracia que, mais do que direitos universais legalmente constituídos, requer a disponibilização e a generalização de recursos necessários ao seu exercício e à sua garantia. Em outras palavras, seria a própria democratização da Assistência Social que se põe em pauta. Cabe lembrar que a questão da judicialização não é específica ao BPC e vem ganhando visibilidade no campo das políticas públicas. Em parte, este fenômeno é causado por problemas, ainda persistentes no Estado brasileiro, no que se refere a implementação, com qualidade e ampla cobertura, de políticas sociais universalizantes, sobretudo aquelas decorrentes de preceitos constitucionais. No âmbito da saúde, em que o tema da judicialização vem gerando um intenso debate, afirmam-se pelo menos duas visões distintas sobre o assunto.39 De um lado, sustenta-se o argumento de que esta é uma forma de garantia do acesso e do direito à saúde. Tal posição, majoritária no Judiciário, encontra fundamento em favor do direito do cidadão a receber do Estado todas as ações e serviços de saúde de que necessitam, estando nestes incluídos os medicamentos. Outra interpretação é de que o crescente acesso a medicamentos e outros bens e serviços de saúde pela via judicial gera distorções na alocação de recursos e na gestão da política pública. Isto ocorreria pelo fato de o Judiciário desconhecer a política de saúde e não reconhecer que os recursos são escassos. A polêmica, longe de ser solucionada, parece evidenciar um conflito distributivo que deve ser enfrentado, não apenas pelo setor da saúde, mas pelos gestores de políticas públicas em geral. Motta (2009), citando a posição de alguns autores, argumenta que o fenômeno da judicialização constituiria uma nova tendência da democracia contemporânea, na qual o Judiciário aproxima-se da agenda pública e dos 39. Para mais detalhes consultar capítulo Saúde deste periódico.


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