Akadémicos 64

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Semana Académica:

Alerta aos excessos

Suplemento integrante da edição nº 4024 de 30 de abril de 2014 do semanário REGIÃO DE LEIRIA. Não pode ser vendido separadamente.

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Tomás Oliveira Dias Advogado

A democracia não é só um direito: é também um dever págs. 6 e 7

págs. 4 e 5


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A ABRIR

MÚSICA 24 de maio Estádio Dr. Magalhães Pessoa

Xutos & Pontapés A banda de rock portuguesa celebra 35 anos de carreira e vem a Leiria fintegrar o cartaz da tradicional Feira de Maio. No próximo dia 24 de maio, terá oportunidade de ouvir e recordar musicas que marcaram uma geração e que continuam a chamar e a conquistar o público. O preço do bilhete é de 7 euros.

NÃO PERKAS

15 de maio Cinema City

Godzilla O Japão é revisitado por uma lenda. O que aparenta ser o início de um desastre nuclear revela uma realidade monstruosa. Uma força da natureza de dimensões titânicas desafia a humanidade, pondo em causa a sua existência ao procurar reestabelecer o equilíbrio. Uma mega produção há muito esperada.

CINEMA 8 de maio Cinema City

Andreia Narciso

Ondas de Abril TEATRO 3, 4, 17 e 18 de maio Centro Histórico de Leiria

A rota de um crime O Leirena Teatro - Companhia de Teatro de Leiria, levará para as ruas de Leiria uma adaptação do romance O Crime do Padre Amaro de Eça de Queiroz. Poderá assistir a este espetáculo na zona histórica da Cidade. Esta produção vem no seguimento do programa Eça 2014, criado pela Câmara Municipal de Leiria, com o objetivo de promover e aumentar a oferta cultural para os leirienses e visitantes, e tem o apoio do Teatro José Lúcio da Silva. Entre maio e agosto terá várias oportunidades para viajar até meados do século XIX. Diretor Francisco Rebelo dos Santos francisco.santos@regiaodeleiria.pt Coordenadores Pedagógicos Catarina Menezes cmenezes@ipleiria.pt Paulo Agostinho paulo.agostinho@ipleiria.pt Apoio à Edição Alexandre Soares asoares@ipleiria.pt

Maquetização e Projeto Gráfico Leonel Brites – Centro de Recursos Multimédia ESECS–IPL leonel.brites@ipleiria.pt Paginação Andreia Narciso Secretariado de Redação Marta Leite Ferreira

Esta produção franco-suiça realizada com a participação da Filmes do Tejo II, oferece-nos uma visão diferente daquela que foi a Revolução dos Cravos. Uma abordagem, mais cómica que o habitual, a uma realidade passada que toca a todos os portugueses. 23 de maio Teatro Miguel Franco

Meet the Fokkens

Uma abordagem optimista e cheia de humor a uma temática um pouco sensível e muitas vezes censurada, a prostituição. Duas irmãs, já com 50 anos de experiência no Red Light District em Amesterdão, contam-nos a sua história. Sem dramas ou desculpas dominam a profissão mais antiga do mundo. k Redação e colaboradores Andreia Lucas, Andreia Narciso, Andresa Cardoso, Carolina Batista, Catarina Pereira, Diogo Fernandes, Francisco Grosso, Guilherme Francisco, Inês Dias, João Anaquim, Mariana Lopes, Marta Leite Ferreira, Patrícia Gonçalves, Rui Miguel Marques

Presidente do Instituto Politécnico de Leiria Nuno Mangas presidencia@ipleiria.pt

Os textos e opiniões publicados não vinculam quaisquer orgãos do IPL e/ou da ESECS e são da responsabilidade exclusiva da equipa do Akadémicos.

Diretor da ESECS Rui Matos dir.esecs@ipleiria.pt Diretora do Curso de Comunicação Social e Educação Multimédia Catarina Menezes cmenezes@ipleiria.pt

akademicos.esecs@ipleiria.pt


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30 abril 2014

Hackers legais são opção original de trabalho Texto: Franciso Grosso

ESTÁ –a– DAR

«Em novembro do ano passado, consegui entrar no sistema da Google», afirma, orgulhoso, Manuel Sousa. Em resposta a um desafio da própria empresa, o jovem de 17 anos, residente em Leiria, recebeu perto de 3,200 dólares de prémio por ter furado o sistema, mas a recompensa maior é a possibilidade de vir a trabalhar como técnico de segurança de uma organização. A meta é ser um hacker legal, contribuindo para a segurança informática de muitas empresas. Recentemente, o site da Procuradoria-Geral da República foi vítima de pirataria informática, levada a cabo pelo movimento Anonymous Portugal. Os piratas roubaram palavras-passe e números de telefone de procuradores que constavam nas páginas da Internet da Procuradoria e do Sistema de Informação do Ministério Público. Aqui, o motivo foi político: denunciar as fragilidades do sistema.

Mas há empresas que promovem concursos para avaliar a própria segurança dos seus sistemas. Esse foi o caso de Manuel Sousa. «Descobri que ofereciam quantias avultadas por qualquer tipo de falhas que alguém reportasse», explica o jovem informático. Empresas como a Google, Adobe ou Siemens lançam os desafios, numa política de comunicação discreta mas eficaz, até porque permite captar talentos emergentes. Apesar de lucrativas, estas iniciativas têm alguns perigos, tanto para quem testa os sistemas, como para as organizações. «A linha que separa a ética da legalidade pode, por vezes, ser muito ténue», explica Alexandrino Gonçalves, professor coordenador de Engenharia Informática na Escola Superior de Tecnologia e Gestão (estg), de Leiria. Existem procedimentos aparentemente inofensivos, mas que podem ser considerados criminalidade informática. «O facto de uma rede não estar devidamente protegida, não implica que lhe possamos,

legalmente, aceder», salienta o professor da estg . «A existência de um reconhecimento para este tipo de ‘conquistas’ é sempre uma mais-valia quer para a empresa, quer para os visados; potenciar o know-how tecnológico dos funcionários acaba por manter uma empresa na vanguarda, no que à segurança informática diz respeito», conclui Alexandrino Gonçalves. Para Rui Cruz, diretor do blogue de informação Tugaleaks, que denunciou o recente ataque dos Anonymous, a desatualização dos sistemas governamentais, neste caso da Procuradoria-Geral da República, contribuiu para o sucesso destas tentativas. «O maior perigo é saberem que existe um ataque e continuarem com a falha», acusa Rui Cruz. Por isso, em muitos casos, a solução para combater estes ataques ilegais passa pelo reforço dos sistemas internos, mas também pela contratação de técnicos de segurança informática . É para isso que Manuel Sousa trabalha. k

Debates em Leiria

E “porque não” sair da caixa? Texto: Patrícia Gonçalves

O dia de comemoração dos quarenta anos da revolução dos cravos, 25 de Abril, foi estrategicamente escolhido para conversar sobre cultura, através do mote Leiria, Revolução Cultural. O Moinho de Papel recebeu os convidados Carlos Matos, Gonçalo Lopes e João Lázaro que discutiram o tema pela noite dentro. Este registo da segunda conversa “informal”, ou melhor será dizer, “fora-da-caixa”, foi ainda acompanhado pelo som do baixo de João Pascoal, jovem músico que surpreendeu os presentes com o que de melhor sabe fazer. O M|i|MO, a 14 de março, já tinha sido palco para a primeira conversa que reuniu representantes de várias juventudes políticas e uma plateia com dezenas de curiosos e interessados no

tema. Futuro dos Jovens vs Jovens do Futuro. Ainda assim, os convidados, Luís Isidro (Juventude Socialista), Fábio Bernardino (Juventude Social Democrata) e Fábio Joaquim (Juventude Popular) nem sempre tiveram opiniões opostas e no final responderam às perguntas da plateia. O sucesso da ovelha negra será o tema da última conversa, a realizar-se dia 30 de maio no Castelo, e para a qual também ficaram prometidas surpresas. Ao todo são três “conversas fora-da-caixa” que se traduzem em sessões de partilha de opiniões sobre diferentes temas e em espaços diferentes e característicos da cidade. O presidente da Why Not?, Associação responsável pela organização da iniciativa, Rodrigo Castro, admite que existem muitas «ideias para serem

trabalhadas», e que os jovens encontraram «espaço para crescer e aprender» na oportunidade de «debater assuntos que interessam a todos». De acordo com o presidente da associação, a Why not? começou por ser apenas um grupo de amigos leirienses que decidiram arregaçar as mangas e «acreditar nas potencialidades da cidade». Em 2010 organizaram a primeira edição da Guerra de Balões de Água que “inundou” a Praça Rodrigues Lobo e que se repetiu nos anos seguintes. Depois disso fizeram também uma recolha solidária no Natal e uma festa de Carnaval, sempre em parceria com várias entidades. Agora chegou a vez das “conversas fora-da-caixa”, mas já existem mais iniciativas na gaveta. k


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KAPA

Diversão sem riscos Em período de celebrações académicas, Leiria é palco da festa. Os técnicos de saúde alertam para os excessos. Texto: Mariana Lopes, Marta Leite Ferreira, Rui Miguel Marques Foto: Diogo Fernandes

A Serenata na Sé e o batismo dos trajes dos caloiros marcaram a abertura da Semana Académica de Leiria. Por tradição, as capas foram batizadas e cerveja escorreu nas capas dos estudantes. Não houve incidentes a registar e a noite ficou marcada pelo convívio, pela música e pelo minuto de silêncio em homenagem aos três estudantes universitários vítimas do acidente ocorrido em Braga. Embora tenha sido uma abertura serena, a verdade é que há registo de excessos nas semanas académicas, que são por vezes pautadas pelo exagero nos consumos de álcool. Os vendedores de bebidas alcoólicas dizem estar habituados a este tipo de tradições, bem como aos excessos que costumam advir deste tipo de atividades. «Há dez anos nesta vida junto aos estudantes, começo a habituar-me a uma certa indisci-

plina», conta-nos Marco Tocha, 34 anos, um dos comerciantes presentes no recinto. Dentro do recinto da Semana Académica deste ano, os preços praticados sobre as bebidas alcoólicas não ultrapassam o valor de 1,10€, sendo este o preço dos refrigerantes e também da água. Ainda assim, há estudantes que preferem comprar bebidas alcoólicas em supermercados, onde estas são significativamente mais baratas. Para alguns, a qualidade não é um fator a levar em conta, mas sim a quantidade: «Não interessa a qualidade, desde que “bata” na mesma», comenta entre si um grupo de estudantes à entrada daquela que consideram ser a melhor semana da sua vida. Médicos e bombeiros alertam para os riscos dos consumos de álcool que se iniciam, por vezes, na adolescência.

Consumo de álcool entre jovens preocupa técnicos

O consumo de álcool entre os jovens é uma preocupação em Portugal. O consumo regular em bares ou na rua, através do cada vez mais frequente botellon, cria hábitos que podem afetar o futuro. Borrego Pires, médico ex-coordenador do Núcleo de Alcoologia de Leiria refere que «os jovens de agora são absolutamente irresponsáveis, mas isto não é um paradigma da geração», alerta. Até porque a população portuguesa sempre teve uma grande tolerância social para o consumo de álcool, algo que era fomentado pela própria classe política. Exemplo disso são as campanhas salazaristas que defendiam o consumo de vinho. E essa ação de promoção deu resul-


5 tado: em Portugal, segundo dados da Organização Mundial de Saúde, 55 por cento dos portugueses consomem preferencialmente vinho. Entre os jovens, a situação é mais dramática. Segundo um estudo recente do Instituto da Droga e da Toxicodependência (idt), os jovens portugueses começam a experimentar cada vez mais cedo o consumo de álcool, bebem em maiores quantidades e embriagam-se mais vezes. Num inquérito a 13 mil jovens, oito por cento dos jovens até aos 13 anos revela que já apanhou uma “bebedeira”, uma situação vivida por mais de metade (53,9%) dos jovens com 18 anos. Para Borrego Pires, as causas começam na família que incentiva ou tolera o consumo do álcool em excesso. Borrego Pires reconhece que as festas académicas constituem um momento particularmente preocupante. O peso social é também evidente para este clínico: os principais patrocinadores das semanas académicas são companhias de bebidas alcoólicas, que utilizam estes eventos como estratégia de marketing. «Na nossa sociedade, é difícil não beber», reconhece Borrego Pires, que se mostra particularmente preocupado com as consequências do consumo excessivo em idades mais jovens. Até aos 18 anos, qualquer quantidade de álcool ingerida é prejudicial para todo o organismo, especialmente para o fígado, rins e cérebro. Os métodos são variados e cada vez mais perigosos. Começa-se, por exemplo, por ingerir bebidas fortemente alcoolizadas para chegar a um estado de euforia, bebendo depois copos de cerveja, por terem um preço mais acessível. O hábito de beber bebidas brancas, para “acelerar” o processo de embriaguez, seguido de um consumo mais suave de cerveja acaba por ter sequelas para o corpo, alerta o médico. Para além disso, essa alienação conferida pelo álcool oferece a ilusão de que os comportamentos são justificados pelo bloqueio da noção da realidade, acrescenta Borrego Pires. Daí que, globalmente, outras consequências venham sendo registadas. Em fenómenos como o Neknomination, os jovens bebem quantidades exorbitantes de álcool e depois dispõem-se a atividades arriscadas, que colocam em causa a sua segurança, incentivando outros colegas de diversão a seguir o exemplo. Comportamento de risco é ainda a condução depois da ingestão de álcool. O número de tragédias rodoviárias é proporcional com o consumo de substâncias alcoólicas fora dos limites legais. Os jovens costumam considerar que os percursos são demasiado curtos e que, para além disso, estão habituados a conduzir nestas condições. Combater o consumo de álcool

Muito critico relativamente à Semana Académica e às organizações dos eventos,

Almeida Lopes, comandante dos Bombeiros Voluntários de Leiria, diz mesmo que entram «em negação com os princípios básicos que a sociedade deve ter para com a formação dos jovens». Para o dirigente dos bombeiros, as festas da academia «têm por base o consumo de álcool e estão, à partida, mal estruturadas». A vigilância da Semana Académica de Leiria tem estado nas mãos dos bombeiros que tem vindo a verificar casos de consumo excessivo. Um sinal de que as campanhas de sensibilização que os bombeiros desenvolvem ao longo dos anos ainda não têm os resultados desejados. Numa parceria entre as Associações de Estudantes e os Bombeiros decorreram já durante eventos da Semana Académica campanhas de sensibilização anti álcool em que os próprios estudantes intervinham junto de colegas de modo a prevenir excessos. Para Almeida Lopes, a sociedade tem também de se organizar para combater socialmente o consumo de álcool. A mudança faz-se através do exemplo e de largar preconceitos quanto a este tema: «Temos a possibilidade de sermos nós a comandar o nosso próprio corpo». Por isso, a legislação tem-se tornado mais rígida para a venda de álcool a jovens. Proibiu-se o consumo de álcool a menores de idade e foram aumentadas as coimas para quem venda de forma ilegal. Para Borrego Pires, esta lei pretende proteger cada vez mais os jovens porque é “inaceitável” um «país que permite este comportamento». E a atenção aos jovens deve ser uma prioridade: «os jovens de hoje serão os governantes de amanhã e, portanto, devem ser um exemplo». Por onde passa a diversão

Mas nem todos os estudantes universitários vivem a Semana Académica da mesma forma. João Bem, 20 anos, é aluno de Gestão na Escola Superior de Tecnologia e Gestão. O estudante é um dos que defende que a festa académica deve ser vivida com peso e medida: «Não quero que as minhas memórias de estudante se resumam a meia dúzia de bebedeiras», sublinha. Esta é também a visão de Samuel Mendes. Com 23 anos, o estudante de Engenharia Informática, também do Instituto Politécnico de Leiria, valoriza a atividade desportiva que pratica e considera o consumo excessivo de álcool incompatível com o seu estilo de vida. «O gosto pela música durante esta semana ultrapassa a minha vontade de beber álcool», explica o estudante. Para os amantes de música, a Semana Académica de Leiria recebe o MC Regula na quinta-feira, 1 de maio, bem como a fadista Ana Moura na sexta-feira. Para terminar, os Expensive Soul e a banda leiriense Nice Weather For Ducks marcarão presença no palco do evento. Os preços dos bilhetes variam entre os onze e os treze euros. k

30 abril 2014

Mÿ!ced Gelados à medida

KO

Na Praça Rodrigues Lobo, KONSUMO pode agora saborear um OBRIGATÓRIO gelado feito à sua medida e gosto. Esta foi a ideia de dois empreendedores, Matilde Germano e João Gou- texto e foto veia, ao criarem a My!ced, Guilherme Franciso Carolina Batista uma geladaria que serve, entre variados produtos, iogurte gelado e Bubble Tea, ambos de acordo com o gosto do cliente. O cliente pode escolher uma base de iogurte, combinando-a com os mais variados toppings e coberturas, podendo servir-se a si próprio, com os gostos que pretender e nas quantidades que quiser. Além disso, pode também beber o Bubble Tea, um chá típico de Taiwan, que, na opinião de João, tem tido muita recetividade por parte dos jovens. Este projeto, nascido no restaurante de João Gouveia, na cidade de Seia, tem tido, segundo os dois empreendedores, uma larga adesão, devido ao conceito inovador e ao facto de o cliente ter uma larga liberdade de escolha e poder determinar a quantidade que pretende consumir. Para Matilde e João, o que distingue estes produtos é o self-service, aliado a uma aposta em produtos nacionais, saudáveis, feitos com iogurte e leite magro e ricos em probióticos (microrganismos que melhoram o funcionamento dos intestinos e absorção de nutrientes), como também na venda da bebida Bubble Tea, um chá frio que pode conter diferentes sabores, desde morango, limão, maracujá, maçã verde, pêssego e ananás, com pequenas bolas (“pérolas de tapioca”) com vários sabores. Segundo Matilde Germano, tanto a particularidade do self-service como o Bubble Tea são os “dois bebés” da geladaria. De acordo com os gerentes da My!ced, Leiria foi uma boa aposta para iniciar este projeto, devido à sua centralidade no país e também porque são ambos leirienses. No futuro pretendem iniciar um franchising, expandindo assim o negócio para outras zonas do país e, se possível, também para o estrangeiro. Apesar das dificuldades burocráticas e do receio relativo à aceitação do mercado, a curiosidade dos clientes tem superado as expetativas destes dois empreendedores. k


6 mais contestação. Por isso, apesar dos gestos de liberalização de Marcelo Caetano, que permitiu o regresso do bispo do Porto e de Mário Soares a partir de S. Tomé e Príncipe, as pessoas rebelaram-se. Foi por isso e porque as pessoas estavam em geral de acordo com o 25 de Abril que não houve derramamento de sangue. Foi por isso que ninguém defendeu o regime. E foi por isso que os soldados não obedeceram à ordem de disparo.

SENTADO NO MOCHO

As crises académicas tiveram algum papel na luta? No meu tempo, as crises académicas existiam, mas sem sinal político. Havia uma grande despolitização da Academia. Havia situações preocupantes, mas a grande crise académica surge em 1969, já no tempo de Marcelo Caetano. Com José Hermano Saraiva no Ministério da Educação, a crise académica englobou-se neste frentismo, onde as pessoas despertaram e politizaram-se. Tudo começou quando Alberto Martins, agora deputado do ps, pediu a palavra na qualidade de presidente da Associação Académica durante a inauguração de um edifício universitário em Coimbra. Foi-lhe negada essa prerrogativa e a Academia entrou de luto.

Tomás Oliveira Dias Advogado

Vai acontecer aquilo que os portugueses fizerem Tomás Oliveira Dias foi a voz da paz em tempos de ditadura. Com papel ativo na democratização do país, o advogado leiriense de oitenta anos foi um dos fundadores do Partido Social Democrata. Agora defende que a política precisa de se renovar na honestidade. Texto: Mariana Lopes, Marta Leite Ferreira, Inês Dias Foto: Diogo Fernandes

Como é que se mantinha o discernimento num ambiente de repressão? Grande parte das pessoas naquele tempo não tinha qualquer interesse pela política. Sabia-se que os cadernos eleitorais eram escassos e, muitas vezes, pouco rigorosos. Por outro lado, as pessoas estavam habituadas: a ditadura durou quase cinquenta anos, por isso a maior parte das pessoas tinham nascido já durante a repressão. Mas havia elites que estavam conscientes do problema. Numa época de repressão, basta estar atento, participar, tomar posições na medida do possível e criar dificuldades. Intervir na vida política.

Como é que equilibrava a luta pela liberdade religiosa e pelos direitos cívicos com a censura que se vivia na altura? A censura cortava os escritos com frequência. Era necessário reescrevê-los e limá-los a ponto de serem aceites. Por outro lado, as pessoas que estavam na minha linha não recorriam à violência. Era tudo pela força da persuasão, ao alargar o âmbito do pensamento a um número cada vez maior de pessoas. Travámos uma guerra complicada na Assembleia, embora tivéssemos apoio da imprensa e de partidos mais à esquerda, como o Partido Socialista, que nos enviavam mensagens de simpatia. A religião foi um pilar para combater a ditadura? Eu sou católico e nem por isso deixei de intervir na vida política. Tinha decorrido o episódio do Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, que sendo uma figura muito relevante da Igreja, incomodava Salazar. Depois de ter marcado a sua posição contra a reeleição de Salazar, a partir de Roma, Salazar barrou a sua entrada em Portugal no regresso, obrigando o bispo a exilar-se durante dez anos. A pouco e pouco, a própria Igreja foi intervindo numa linha de contestação. Em 1951, a posição já era muito clara: a defesa da liberdade, a defesa dos mais desfavorecidos. Uma posição democrática. A guerra de África ajudou à contestação, houve bispos e padres que tiveram de se exilar. Passou-se de uma fase de um certo apoio da Igreja para uma fase de cada vez

Como recorda o 25 de Abril? Com grande emoção. Eu estava a arranjar-me e liguei a telefonia. Então ouvi o comunicado das Forças Armadas. De facto, isto não tinha outra solução. Lembro-me perfeitamente de ter telefonado a alguns amigos porque nós, da Ala Liberal, tinhamos organizado um encontro de ref lexão política no verão de 1973 e abandonámos a vida política. Preparou-se uma manifestação que decorreu em Leiria dois ou três dias após o 25 de Abril que encheu a Praça Rodrigues Lobo. Eu lembro-me de ter abraçado o Doutor José Varela, que era comunista, e todos nos congratulamos com a possibilidade de, daí para a frente podermos falar, podermos exprimir-nos, podermos contribuir para uma vida democrática que não tínhamos, por causa da censura. E ela não existia só nos jornais, mas também nos livros que eram publicados, mas de acordo com a cartilha. E depois era a pide, que ia buscar as pessoas a casa. Tudo isso iria desaparecer. Considera que as gerações mais jovens estão desinteressadas da política? Sim, completamente desligadas da política. Mas não deviam, porque elas têm razões para contestar. A verdade é que se os jovens não participarem, as coisas não melhoram. No meu tempo era um entusiasmo! Quando vejo agora gente nova desinteressada da política, faz-me confusão. Porque naquele tempo, fosse qual fosse a cor política, as pessoas passavam a vida nos comícios ou nas sessões de esclarecimento. Portugal conquistou a democracia que merecia? Todos os povos merecem democracia. Portugal conquistou-a porque lutou por isso. A democracia não é só um direito: é também um dever. O


7 dever de fazer jus a esse direito, contribuir para uma democracia desde os cadernos eleitorais até à maneira como decorrem as campanhas, a participação das pessoas é fundamental. Construiu-se uma verdadeira democracia, onde efectivamente o povo é quem mais ordena. Mas agora já não se cantam essas coisas. Que comparação estabelece entre os valores e os princípios do 25 de Abril e de hoje em dia? A seguir ao 25 de Abril, havia uma certa preponderância de esquerda. O Partido Comunista sofreu algumas alterações. O Partido Comunista pautava-se pela realização do socialismo pela via da revolta. Hoje em dia, este partido já é favorável à conquista do poder pela via parlamentar. Na altura, o Partido Socialista apelidava-se pelo marxismo livre e democrático. E o Partido Social Democrata, hoje apresentado ao país como uma força de direita, era muito mais fiel aos seus princípios. Não correspondia de maneira nenhuma à situação actual, em que existe um partido chamado psd e que nunca fala da democracia social. Depois da revolução, existia um certo radicalismo de esquerda, mas pouco a pouco os partidos caminharam mais para a direita. O pc desistiu da conquista revolucionária do poder, o ps meteu o socialismo na gaveta, o psd fez o mesmo aos seus pilares de criação e o cds, que era um partido ao centro e até um pouco social, é hoje um partido marcado à direita. Como avalia as práticas políticas nos últimos 40 anos? Com altos e baixos, fez-se obra muito importante desde o 25 de Abril. Com muitos defeitos, é evidente. Um deles é o eleitoralismo: fazem-se coisas para agradar às populações, quando não são as mais necessárias. Mas houve coisas formidáveis. O analfabetismo desceu de vinte e cinco por cento para um valor residual de cinco por cento, porque a educação melhorou imenso. Outra coisa de que ninguém fala é a criação do Serviço Nacional de Saúde e o melhoramento dos hospitais. Em consequência, a mortalidade infantil baixou de noventa por mil para sete por mil, que é um número capaz no contexto internacional. E as estradas estão em condições muito melhores. Fizeram-se as auto-estradas, por exemplo, até demais, à conta do eleitoralismo. Tudo isto se fez porque aconteceu algo fundamental em 1986, quando Portugal entrou na cee. Houve coisas positivas, mas também houve coisas negativas: este desprezo, esta tendência de gastar acima das nossas possibilidades. E somando a isto a crise internacional, nós estamos nas mãos das grandes forças económicas internacionais. Uma política não pode ser só reduzir a dívida. A política tem de assentar no crescimento da economia, para que assim seja possível haver mais impostos. Uma política que se destina unicamente a reduzir a crise, não a consegue diminuir. Não somos livres? Hoje vivemos sobre proteção da União Europeia, perdemos muita da nossa independência. Portugal não tem liberdade. Inte-

gralmente não somos livres, porque houve erros fundamentais na vida política. A isso somou-se o desinteresse com que as pessoas acompanham o problema, ou então a revolta com que o fazem. A mentalidade é de assumir a nossa pobreza. A somar, há muita gente que não consegue pagar uma consulta num médico, há muita gente com fome e há muitas situações em que têm valido as ipss que têm dado de comer. Já somos um país em que um quarto da população vive no limiar na pobreza, portanto como dizia o novo bispo do Porto, “os pobres não podem esperar”. Precisamos de uma nova revolução? Não, nunca fui partidário de revoluções. O que era preciso era homens de Estado. Pessoas que soubessem o que estão a fazer, como foi Hernâni Lopes. Ele foi ministro da Economia durante a primeira crise económica e até dormia no Ministério. Mas hoje vivemos numa situação em que a vida política está entregue a meia dúzia de pessoas sem o mínimo de preparação. Percorrem juventudes partidárias porque formam futuros tachos. Depois, fala-se muito em corrupção. Eu não me lembro, no tempo da Assembleia Constituinte, com homens como Álvaro Cunhal, Mário Soares ou Sá Carneiro, de ouvir sequer esse termo. Porque eles tinham vidas organizadas, as profissões iam desde professores a operários, mas era gente de critério e que se pautava pelo interesse nacional. E agora muitas vezes não é isso que acontece. É por isso que há muita gente que preferia voltar à ditadura com condições socioeconómicas melhores? É por isso, mas seria pior. Um governo militar é um governo de incompetentes, pelo menos é o que nos diz a experiência. A ditadura levar-nos-ia para fora das instituições internacionais e o escudo sofreria uma desvalorização de cinquenta por cento. A ditadura teve uma época, em que as pessoas procuraram aderir aos partidos fascistas como defesa contra o comunismo desenfreado. Agora, apesar do ressurgimento de forças políticas de direita, não se coloca esse problema. Hoje em dia, a ditadura iria causar-nos grandes complicações a nível internacional. Ficaríamos piores, quer no aspecto monetário, quer no que diz respeito aos apoios europeus. Porque foi a partir deles que se resolveram muitas coisas dentro do país. Portanto, o que resolve não é uma revolução, mas sim o funcionamento pleno da democracia. O que nos reserva o futuro? O futuro está nas vossas mãos. Se não for por grande devoção democrática, que seja para defender a vossa vida. Eu acho que os grandes responsáveis políticos deveriam ser outros. A competência tem de ser devolvida aos governantes com políticos sérios, honestos, não corruptos. E é preciso que esses novos políticos tenham alguma experiência: um pouco de cabelos brancos também ajuda. É preciso que essa gente volte e que a gente nova compreenda que tem de intervir. Vai acontecer aquilo que os portugueses fizerem. k

30 abril 2014

KULTOS Francisco Grosso

Versos de um Crime Kill Your Darlings A revelação do Harry Potter Depois de ficar famoso como protagonista da saga Harry Potter, Daniel Radcliffe participa numa nova trama cinematográfica. O título - Kill Your Darlings – indicia uma das nuances do filme: o aparecimento do movimento Beat, nos anos 50. O filme marca uma rutura de Radcliffe com o cinema fantástico e estreia John Krokidas no mundo da realização cinematográfica. A história recua ao século passado e revela uma geração de inconformados com os estigmas sociais. A espontaneidade reina durante a narrativa. A vida do jovem Allen Ginsberg muda de um dia para o outro, quando conhece Lucien Carr (Dane Dehaan), um colega na Universidade de Columbia. Muito diferente do habitual, a excentricidade de Carr leva Ginsberg ao mundo boémio de 1944 e apresenta-lhe William Burroughs (Ben Foster) e Jack Kerouac (Jack Huston). Fugindo à conformidade da vida e da literatura, os quatro concordam em “rasgar” a tradição e fazer algo novo, acabando por reformular os dogmas impostos, dando origem ao que se tornou o Beat como estilo literário. David Kammerer (Michael C.Hall), um homem de 30 anos apaixonado por Carr, muito mais jovem, persegue-o sem fim. Carr decide terminar com a relação amorosa que mantinham, e Kammerer não reage como suposto. As visitas noturnas e os apelos desesperados levam Lucien Carr a assassinar brutalmente o seu ex-namorado, com facadas e um afogamento no mar. Quando Kammerer é encontrado morto, Kerouac, Burroughs e Carr são presos por associação ao assassinato. Carr pede ajuda a Allen Ginsberg, para escrever a alegação de inocência, e Ginsberg acaba por escrever a história do crime. Além de entregar ao procurador de justiça a “sentença” de Carr, Allen apresenta o texto a um professor, que o elogia bastante pelas suas capacidades líricas. Além das capacidades que também demonstrou na saga Harry Potter, Daniel Radcliffe parece estar a seguir um novo caminho no seu percurso. Esta interpretação permite concluir que o ator pretende desafiar outras vertentes do cinema. A atuação neste filme é prova disso mesmo: a versatilidade demonstrada garante-lhe outro estilo de papel dramatúrgico. Mas, além desta caraterística que revelou, Radcliffe mostrou que o pudor sexual fica de fora do argumento. O homoerotismo do filme pode ter iniciado um desvio narrativo no cinema internacional. Com as cenas heterossexuais a serem norma, chega agora a altura de revolucionar a forma de produzir conteúdos. Tal como o movimento Beat, este filme pode inspirar outros a recriar pensamentos. k


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Leiria foi palco do XVII Real FesTA Texto: Andresa Cardoso

A FECHAR

Uma equipa de cinco portugueses desenvolveu este software de gestão de finanças pessoais. O programa está disponível no website em verAndreia Lucas são experimental por 30 dias. Entre outras funcionalidades, permite importar automaticamente e de forma não invasiva os extratos bancários dos utilizadores, gerir agenda de pagamentos, identificar despesas supérfluas e planear orçamentos. Muitos portugueses já começaram a poupar graças ao Boonzi, do que estás à espera?

ON LINE

ÚLTIMAS Catarina Pereira

conferência de inovação e segurança alimentar

Os estudantes dos cursos de Tecnologia e Segurança e de Engenharia Alimentar da Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar (ESTM) apresentam no dia 8 de maio, a partir das 9h00, no auditório da escola, a 6ª edição da Conferência de Inovação e Segurança Alimentar (CISA). O evento reúne vários investigadores e profissionais da área alimentar de forma a promover a partilha de experiências com os estudantes. Serão ainda divulgados projetos de investigação aplicada e discutidas questões relacionadas com a segurança alimentar. O evento é dirigido aos alunos do ensino superior e do ensino secundário, a técnicos do departamento alimentar, industriais e a restante público com interesse na área. A inscrição pode ser feita em estm.ipleiria.pt. psicologia em contexto educativo

No dia 16 de maio, decorre na Escola Superior de Saúde (ESSLei), o 2º encontro de Psicologia em Contexto Educativo. Em discussão estarão temas como atribuições do psicólogo em contexto escolar, intervenção em jovens com comportamento agressivo ou depressão na adolescência. Durante a manhã, decorrem palestras dirigidas por membros da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, como Daniel Rijo e Ana Paula Matos. Ao longo da tarde irão realizar-se oficinas de formação relacionadas com a psicologia em contexto escolar e social. As inscrições podem ser efetuadas até ao dia 9 de maio e têm um custo de 10€ para estudantes, Alumni Leiria (registados na rede IPLeiri@lumni) e Estagiários da OPP. Para profissionais custará 15€. Para mais informações e registos consultar a página doiop.com/encontro.

Boonzi

No fim de semana de 25 e 26 de abril, Leiria pôde assistir ao Festival de Tunas, Real FesTA, organizado pela Tum’Acanénica – Tuna Mista da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais, do Instituto Politécnico de Leiria. O Festival decorreu no Teatro José Lúcio da Silva, tendo os prémios de melhor instrumental, melhor tuna e melhor Serenata em palco sido atribuídos à Tuna ForTuna, da Nova School of Business and Economics. Prémios como Serenata à Cidade, Tuna mais Tuna, Melhor Pandeireta e Melhor Estandarte foram atribuídos à escstunis, Tuna Mista da Es-

cola Superior de Comunicação Social de Lisboa. Presentes a concurso nesta xvii edição do evento, estiveram também a, a Real Tuna Académica da Escola Superior de Saúde Dr. Lopes Dias de Castelo Branco, a Quantunna e a Tuna Mista da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. O Festival contou ainda com a participação da Cuarentuna de la Coruña, Espanha e Augustuna, Tuna Masculina da Universidade do Minho. A apresentação esteve a cargo dos Jogralhos, Grupo de Jograis da Universidade do Minho. O evento iniciou na sexta-feira com a Serenata à Cidade, na Praça Rodrigues Lobo. k

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Universia Este portal é dedicado à preparação de recém-licenciados em busca do primeiro emprego. Existem ofertas de emprego, estágios e formação nos mais variados setores, como Contabilidade, Comunicação Social, Telecomunicações, Medicina ou Design. k

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colóquio envelhecendo e aprendendo

Refletir sobre o papel da aprendizagem ao longo da vida na promoção de um envelhecimento ativo, divulgar resultados de investigação e experiências de participação em programas de formação sénior são alguns dos objetivos do colóquio ‘Envelhecendo e Aprendendo: Olhares sobre a Aprendizagem nos Processos de Envelhecimento Ativo’. O evento decorre dia 15 de maio, no Auditório 2, da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Instituto Politécnico de Leiria. Programa e informação sobre inscrições disponíveis em aprendendo.ipleiria.pt. k

Festa do Atletismo em Faro Texto: Mariana Lopes e João Anaquim

No próximo sábado, dia 3 de maio, realiza-se o Campeonato Nacional Universitário de Atletismo de pista ao ar livre. O campeonato, organizado pela

Associação Académica da Universidade do Algarve e pela Federação Académica de Desporto Universitário, admite atletas masculinos e femininos e irá ter lugar na pista de Atletismo de Faro. Cândida Bairradas, coordenadora do desporto do Instituto Politécnico de Leiria, referiu que irão participar 16 estudan-

tes do instituto. Um dos atletas, Tiago Marques, consagrou-se em 2013 campeão nacional de 3 mil metros obstáculos. Entre as várias modalidades que o campeonato comporta, encontra-se o salto com vara, 10 mil metros de marcha, lançamento do peso e dardo; salto em comprimento; triplo salto e lançamento do martelo. k


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