Editorial
Editorial Em agosto de 1964, o Papa Paulo IV brindou o povo de Deus com uma bela, oportuna e exigente reflexão sobre a presença e a missão da Igreja no mundo (Ecclesiam Suam). E afirmava, de forma lapidar: “a Igreja deve entrar em diálogo com o mundo em que vive. A Igreja faz-se palavra, faz-se mensagem, faz-se colóquio. Antes de convertermos o mundo, e precisamente para o convertermos, é
Sumário 02
Editorial
03 Missão no Mundo 05
Missão no Brasil
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Igreja
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Central
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Espiritualidade
16
Missionários
17
Testemunhos
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Colabore
necessário que nos acerquemos e lhe falemos”. Mais recentemente, o Papa Francisco retomou essa questão no horizonte do desafio de construir a fraternidade entre os povos, mediante o diálogo e a amizade social (Fratelli Tutti). “A falta de diálogo supõe que ninguém está preocupado com o bem comum, mas com obter as vantagens que o poder lhe proporciona ou, na melhor das hipóteses, com impor o seu próprio modo de pensar”, constata o Pontífice. “A paz social é laboriosa, artesanal. O que conta é gerar processos de encontro, processos que possam construir um povo capaz de recolher as diferenças. Armemos os nossos filhos com as armas do diálogo! Ensinemos-lhes a boa batalha do encontro”, escreve o Papa em forma de provocação pedagógica.
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Durante o período da quaresma, mas não só, os cristãos do Brasil foram convidados pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs a refletir e dialogar, em nossas comunidades cristãs e demais espaços eclesiais, sobre a fraternidade e o diálogo como compromissos de amor (Campanha da Fraternidade Ecumênica). No pano de fundo desse tema está o clima de intolerância frente às manifestações culturais, sociais, eclesiais e pessoais que trazem a marca da
Expediente
diferença ou da alternativa em relação àquilo que é considerado
Essa é uma publicação da:
padrão.
Província Brasil Meridional dos Missionários da Sagrada Família
“Não há nada que justifique a inimizade e a eliminação da
Produção:
diversidade humana. Não é possível estar com Deus e, ao mesmo tempo, discriminar e desrespeitar as outras pessoas por causa das suas diferenças étnicas, religiosas ou de gênero. A fé em Jesus Cristo nos compromete a derrubarmos os muros das divisões”. Estas são apenas algumas afirmações programáticas desta campanha ecumênica. Esta edição da Revista Bertheriano assumiu o desafio de abordar a relevante questão do diálogo como tema-gerador de suas páginas.
Responsáveis Conselho Provincial
Edição Aline Oliveira
Pe. Itacir Brassiani, msf Coordenador Provincial Pe. Domingos de Sá Filho, msf Vice Provincial Ir. Irio Luiz Conti, msf Conselheiro Provincial Pe. Lotário José Niederle, msf Conselheiro Provincial
Revisão de texto Andriele Pereira
Os diversos autores – que são, antes de tudo, pessoas do “mundo
Editoração Editora Acadêmica do Brasil Capa e diagramação Tuany Pereira
da vida” – desenvolveram suas contribuições nesta perspectiva. Esperamos com isso “temperar” o diálogo e a fraternidade, diferentes pratos do nosso dia a dia familiar, comunitário, eclesial e social.
Por Pe. Itacir Brassiani, msf Passo Fundo/RS
Contato e Pedidos Província dos Missionários da Sagrada Família (Brasil Meridional) Rua da Floresta, 1043 - Bairro Petrópolis Cx. Postal 3056 - CEP: 99051-260 Passo Fundo - RS - Brasil Fone: (54) 3313-2107 E-mail: secretaria@msagradafamilia.com.br Site: www.misafala.org Impressão e tiragem Passografic / 1.800 exemplares
O Pe. Elmar Luiz Sauer, recém-chegado à Bolívia, partilha sua caminhada missionária. Nestas linhas, quero partilhar algumas memórias, sentimentos e impressões que vivi há poucas semanas. São anotações feitas em três diferentes momentos: em Passo Fundo/RS, enquanto, do alto dos meus 67 anos, me
Missão no mundo
Aventuras e travessias missionárias que já duram 55 anos!
preparava para partir para uma nova missão; no dia seguinte à minha chegada na Bolívia (22 de fevereiro); e após alguns dias de observação e ensaios de atuação junto ao povo boliviano (4 de março).
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Missão no Mundo
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Por Pe. Elmar Luiz Sauer, msf Santa Cruz de la Sierra/Bolívia
Crédito foto: Banco de imagens freepick
Missão no Brasil
Educar aprendendo, aprender educando Com uma caminhada de pouco mais de três anos como formador dos aspirantes nativos, Fr. Ricardo compartilha suas descobertas e convicções sobre a formação em terras moçambicanas. Quando o assunto é formação em terras de missão,
próximo com a família é muito difícil, quase impossível.
é primordial não perder a sensibilidade da escuta e
A primeira dificuldade são as distâncias; a segunda,
do aprendizado. Mesmo que o formador tenha muitos
a língua. Entretanto, aos poucos vamos superando
anos de experiência na tarefa, ou esteja apenas
essas dificuldades e interagindo cada vez mais com as
iniciando, como é o caso dos formadores que estão
“sagradas famílias” dos nossos formandos.
atualmente no aspirantado em Nampula, sempre é preciso sentar com os formandos e escutar.
Mas, ao lado das muitas dificuldades, temos a enorme alegria de testemunhar grandes aprendizados
Os formandos chegam, como não poderia ser
e um bonito crescimento humano e espiritual
diferente, com uma carga cultural e histórica muito
dos formandos. Cativados, eles se tornam bons
forte. E não temos o direito de querer alterar ou
companheiros. Entre si, resolvem seus problemas
rechaçar essa riqueza que trazem consigo. O que
com conversas e posicionamentos claros e firmes.
precisamos fazer é usar esta riqueza e conjugar com os
Claro, nem todos. As refeições são muito animadas,
planos formativos propostos pela Congregação.
momentos em que percebemos a sinceridade de
Este é um grande desafio, pois, para fazer esta
cada um, momentos de risos e de fraternidade. Eles
conjugação é preciso conhecer muito bem a cultura
demonstram o anseio de aprender coisas novas, e a
local, e isso não é possível senão com o passar dos anos,
curiosidade faz parte do cotidiano. E isso não só sobre
estudo e muita observação. Dizia um padre dehoniano
a realidade do Brasil ou do mundo, mas também da
que está em Moçambique há mais de 40 anos: “estou
vida pessoal de cada um.
aqui há mais de quatro décadas, mas todos os dias aprendo coisas novas sobre a cultura Macua”.
Como a formação é substancialmente convivência, formar em terras de missão é um belo e exigente
A riqueza cultural sempre vem de berço. E não
processo de vivência e de convivência. Aprender é,
somente a língua, mas também as maneiras de
antes de tudo, escutar! É muito mais ficar sentado,
cozinhar, de estudar, de rezar e de se relacionar. A
aprendendo, do que de pé, ensinando. A formação
família possui uma influência muito grande em nossos
aqui em Moçambique nos ensina a sermos pessoas e
formandos, o que não é negativo, pois percebemos que
religiosos melhores. É preciso formar aprendendo e
existe uma grande responsabilidade do formando com
aprender formando.
relação à respectiva família. Porém, eles sabem dosar a interferência que devem ter com a família, pois, estando longe dela, não podem resolver os problemas que eventualmente ela enfrenta. Para os formadores, um relacionamento mais
Por Fr. Ricardo Klock, msf Nampula/Moçambique
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Crédito foto: Banco de imagens freepick
Missão no Brasil
Traíram o Evangelho! Mesmo que possa conter algumas afirmações questionáveis, vale a pena ler esta publicação de um jornalista brasileiro, comprometido com a criação de uma cultura da justiça e da paz.
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Não são poucas as igrejas evangélicas e os evangélicos
no final. E o pastor André Valadão, o menino rico que
que têm demonstrado apoio irrestrito ou silêncio
ostenta a boa vida em Orlando, acha estar defendendo a
conivente com o governo bolsonarista. Como o campo
Bíblia ao dizer que "igreja não é lugar para gays".
evangélico é extremamente diverso, é comum a alegação
Igreja Batista Lagoinha, Vitória em Cristo, Universal,
de que evangélicos possuem posicionamentos diferentes
Renascer, Sara Nossa Terra, Catedral do Avivamento,
e podem sustentar suas posições na Bíblia, porque isso
Igreja Batista Atitude, entre outras, não possuem
seria uma questão de interpretação. Mas não se trata
absolutamente nada do que foi a vida de Jesus.
de interpretação. A vida de Jesus está lá, nos quatro
Consequentemente, elas ferem e traem quem deposita
Evangelhos, para servir de referência.
nelas a credibilidade de conhecimento e compromisso
A posição desses pastores (seus impérios, sua conivência
com o Evangelho.
com a política bem-sucedida de indiferença com os
A precariedade e perversidade políticas do governo
cuidados da população) é uma traição inquestionável
Jair Bolsonaro também têm a chancela dos que fingem
àquilo que é a vida de Jesus. Chega a ser doentio que esses
racionalidade e imparcialidade, mas contribuem para
pastores busquem conquistar o país com uma mega-
blindar um governo que tem na violência sua principal
igreja em cada parte do território nacional, enquanto
linguagem, que prioriza mais as armas do que as
Jesus não teve qualquer apego aos templos por onde
vacinas e que continua atacando minorias sociais e
passou. Suas pregações mais conhecidas aconteceram
a democracia. Como o governo odeia tudo que tem
em meio ao povo, na rua, nos montes, às margens de rios,
aparência de "esquerda", "comunista" ou "progressista",
e nunca no templo, de onde ele tinha que fugir da elite
esses homens (sempre homens) da igreja usam o
religiosa, ameaçado de morte.
silêncio para chancelar tudo que o bolsonarismo tem
Homens como Silas Malafaia, Edir Macedo, Valdemiro
raivosamente implementado.
qualquer
Um país com um governo que patina no cuidado da
compromisso com uma forma de ser evangélico. São
saúde numa das maiores crises sanitárias de nossa
interesseiros milionários. É inexplicável que líderes
história, com a economia secundarizada para os mais
milionários se digam imitadores de alguém que mal
pobres, implorando por um auxílio emergencial para
tinha uma casa e fomentou que os ricos distribuíssem a
não tocar a fome, e o campo evangélico conservador
riqueza que tinham.
e fundamentalista dividido entre os que olham
Santiago
e
R.R.
Soares
não
possuem
O império desses homens também criou uma geração
ensimesmados para o céu e os que olham para suas
de pastores "playboys" que ostentam preconceito,
contas bancárias e para os privilégios da sua igreja. Aqui
racismo religioso e homofobia. O pastor Lucinho Barreto
não há nem sinal de inspiração em Jesus.
é um homem que age como menino, brincando de "cheirar a Bíblia", incitando racismo religioso, gabandose de atacar terreiros e dizendo que, contra bandido, o policial deve descarregar a arma e jogar o revólver na cara
Ronilso Pacheco (Colunista do UOL)
Formadores dos Jovens Missionários da Sagrada Família em Belo Horizonte, os padres Sóstenes e Moisés nos oferecem algumas reflexões e questionamentos que emergem da entrega generosa a esta desafiadora missão. Vivemos em uma sociedade barulhenta, ruidosa e assustada, que oferece as distrações e ilusões do ter e do curtir. Mas, desde março de 2020, fomos obrigados a mudar substancialmente nosso estilo de vida por causa dos limites que o Covid-19 provocou na comunidade mundial. E então, entrou na nossa história o paradigma do medo, do isolamento social, da obrigatoriedade do uso da máscara e do estudo on-line. E sentimos a urgência de parar e escutar a voz de Deus, que nunca se cansa de comunicar-se com a humanidade (cf. 1 Sm 3, 1-10.1920). A Igreja sentiu-se interpelada a abaixar-se ao nível da terra e colocar os ouvidos no chão, (cf. Is 43,19), sem medo do que iria escutar.
Um exercício de paternidade Qual seria a postura mais adequada do formador? Encontramos no modelo do bom pai de família, a exemplo de São José, uma possibilidade para conduzir o processo de formação, vendo o progresso e o crescimento integral do filho, ou seja, do formando. Educar a pessoa humana para a vida afetiva, espiritual, intelectual, pastoral e comunitária seria o motor motivacional para formar integralmente o vocacionado. O protagonismo do formador viria da sua capacidade nata de paternidade. Se nos sentimos estéreis e não assumimos o potencial paterno que há em nós, enfrentaremos grandes dificuldades na assimilação do nosso serviço como formador.
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Um dos grandes problemas na formação seria o formador assumir uma postura de chefe, de autoridade funcional, de cumpridor de obrigações. Fechar-se na funcionalidade e não se abrir à paternidade espiritual pode provocar uma crise na identidade do formador. Estaríamos assim, eliminando o potencial que a comunidade deve ter de família, espaço diferenciado de personalidades, oficina de trabalho e aptidões no reconhecimento dos talentos.
Conceitos e significados questionados Constatamos hoje um conflito nos conceitos e uma
desejo de vivência da consagração e do serviço a Jesus Cristo com alegria, por meio dos nossos carismas, torna-se uma aventura perigosa, que poucos querem assumir ou se responsabilizar. O desafio de desconstruir o conceito de formar (“colocar na forma” ou “cunhar”, como um artista que modela a madeira dando configuração à escultura) seria o marco da passagem para uma atmosfera propícia na arte de educar em nossas casas de formação.
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grande dificuldade de captar o sentido e o significado da missão de formar. Despertar nos vocacionados o
Igreja
Os desafios da formação para a vida religiosa
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Igreja
Então o desafio é transformar a casa de formação em uma Comunidade-Lar, onde estudo e vida se misturam, provocando-nos a perceber que somos sempre aprendizes na arte de conviver. “Lar” vem da palavra latina “lare”, que pode ser traduzida como
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Criar um ambiente de lar
recinto de acolhimento, de aconchego, onde se aprende a ser responsável e estar em estado constante
Assumir a postura de servo e servidor
de crescimento em vista da maturidade. Nesse horizonte, já não seria o formador uma
A palavra "serviço" possui muitas conotações, e pode
autoridade baseada no poder da nomeação para o
ser aplicada a diversas circunstâncias. Tratando-se
“cargo”, mas na responsabilidade de orientar aqueles
da vida consagrada e do chamado a uma atividade
que lhes são confiados, conduzindo-os com intuição
qualificada, podemos entender o serviço como sair de
paterna para um equilíbrio no paradigma de ser pessoa
si para dar-se aos outros. Como na derivação do original
humana integral.
grego, a qual diakonia significa estar à disposição para ajudar a outros. Stefano de Fiores afirma que serviço
É importante para o formador desenvolver uma atitude de escuta. Em latim, o verbo “udire” significa ouvir, ou seja, portar-se como quem escuta Deus e é capaz de ser sinal Dele em um mundo confuso e cheio de incertezas provocadas pelo niilismo e pela pandemia. Quem escuta o próximo é capaz de entendê-lo, animá-lo, admoestá-lo e amá-lo mais, numa proposição dialogante. Não é fácil desconectar-se e escutar o outro, requer de nós um exercício de interioridade e uma transcendência versus o interlocutor.
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indica aspecto fundamental à figura de Cristo, que Isaías já havia anunciado como o servo de Iahweh (cf. Dicionário de Espiritualidade). Nessa perspectiva, o formador será o servidor da comunidade, que, apoiado pela Congregação, entra na dinâmica de abaixar-se para elevar os outros e a comunidade. Consciente de suas fraquezas e limitações, dará espaço para que Deus manifeste a Sua fortaleza e o capacite para essa missão.
O risco de transformar o lar em arena
Assimilar a postura de formador como servidor da
Hoje, com todos os efeitos da pandemia, temos que
comunidade é outro desafio que devemos enfrentar.
ter sensibilidade de perceber que nossas comunidades
Hoje, facilmente o fundamentalismo pode entrar em
necessitam se tornar canteiros de boas amizades,
nossas casas de formação, disfarçado de um cuidado
de sadia convivência, de estudo teológico e reflexão
com as coisas de Deus ou de um saudosismo do
pastoral. Não ‘circus maximus’, a qual as pessoas
passado que alguns nem viveram.
vivem se digladiando ou confabulando exercícios estratégicos, que destroem a alteridade e a beleza das diferenças. O formador prudente procede como um pai silencioso que procura educar na alteridade e acolher o formando,
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dando-lhe a possibilidade de entender que vocação é resposta a um chamado amoroso e irrepetível que Deus faz a cada um de nós (cf. Jo 15, 9-17).
Pe. Moisés Furmann, msf Belo Horizonte/MG
Pe. Sóstenes Tavares Luna, msf Belo Horizonte/MG
Dialogar é preciso!
Compararemos o diálogo com uma construção. Iniciemos
preparando
o
terreno.
Façamos
a cumplicidade e tantas outras manifestações de
a
afeto nele compartilhados. A cama é significativa, não
terraplenagem, ou seja, ajeitemos o espaço e nivelemos
somente para um casal, mas também para um solteiro.
o mesmo, removendo as arestas da comunicação. A
O casal, nela, revela o resultado de sua relação numa
seguir, coloquemos seus fundamentos. Depois, façamos
entrega total, vivenciando a sua sexualidade até se
o estaqueamento, ou seja, cuidemos dos pilares que
tornarem uma só carne. O celibatário pode fazer da
deverão sustentar o diálogo. Como pilastras, temos
cama um móvel onde revê e planifica o seu dia a dia.
o respeito, a compreensão, a ternura, a acolhida e,
Central
Partindo da imagem da casa, esta meditação nos convida a refletir sobre o dinamismo e a força humanizadora do diálogo.
Como
pintaremos
o
diálogo?
Os
sentimentos
sobretudo, a escuta com o coração. Feito isso, levantemos
compartilhados, acolhidos mediante uma escuta com
as paredes da nossa construção dialogal.
o coração, farão com que a vida seja mais colorida e vistosa. Escutar com o coração enche de luz quem
Como proteger o diálogo? Como fortalecê-lo nas tempestades do dia a dia? Levantando as paredes com o auto e o heteroconhecimento. Superando os medos e preconceitos referentes a si próprio e ao outro. Superando a nossa fraca imagem, ou seja, acentuar demais as limitações, defeitos e carências e abandonando as atitudes e superioridades.
escuta, porém, particularmente, o escutado e o acolhido. Quem olha essa construção dialogal e contempla a vida dos seus ocupantes, percebe um relacionamento que desperta ou aprofunda seu amor. Falando em amor, de nada resolveria esta bela construção dialogal sem sua presença e dinamismo. O amor deve ser como o sol que irradia luz, calor, cumplicidade, compreensão e todas as outras virtudes que favorecem a construção de uma vida humana
Como é o teto dessa construção dialogal? Com certeza a capacidade para sentar, escutar e acolher o outro em suas partilhas é uma excelente ideia. Qual é o telhado dessa construção? Comecemos
e cristã. O diálogo é uma arte que só se aprende exercitando! Quem acompanhou a Campanha da Fraternidade percebeu algo semelhante à isso?
com o significado e a importância de um verdadeiro relacionamento. Por vezes, pensamos que um mero estar próximo do outro já é um diálogo. Enganamo-nos pensando que, quando dois se comunicam, seja por palavras faladas ou escritas, eles já estejam dialogando. Uma residência normal precisa de móveis, como a cadeira dialogal? O que serve para criar um clima para esse tão salutar exercício? Pensamos numa atitude de acolhimento para que, à mesa do diálogo, possam ser compartilhados os sentimentos, os pensamentos, as realizações e tantas outras coisas boas que a vida nos apresenta. Vamos para os quartos. Esses podem ser as áreas nas quais nos relacionamos. Qual é o conteúdo normal das
Crédito foto: Banco de imagens freepick
mesa, cadeiras, cama, armário e tantos outros. Como é
nossas conversas? Falamos de tudo e de todos, menos de nós próprios. O dormitório é importante. O quarto do casal testemunha o seu carinho, a ternura, a proximidade,
Pe. Jacob Inácio Kehl, msf Passo Fundo/RS
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Central
O Pontífice nos brinda na surpreendente e corajosa encíclica
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“Somos todos(as) irmãos(as)”
Muitas vezes, confunde-se diálogo, com uma troca febril de opiniões nas redes sociais, constantemente pilotada por uma informação mediática nem sempre confiável. Não passam de monólogos que avançam em paralelo, talvez impondo-se à atenção dos outros pelo seu tom alto e agressivo. A difusão altissonante de fatos e reivindicações nas redes sociais frequentemente obstrui as possibilidades do diálogo, pois permite a cada um manter intactas e sem variantes as próprias ideias, interesses e opções, desculpando-se com os erros alheios. E, muitas vezes, o debate é manipulado por determinados interesses que procuram desonestamente inclinar a opinião pública a seu favor. A falta de diálogo supõe que ninguém está preocupado com o bem comum, mas com obter as vantagens que o poder lhe proporciona ou, na melhor das hipóteses, com impor o seu próprio modo de pensar. Assim, a conversação se reduz a meras negociações para que cada um possa agarrar as maiores vantagens possíveis, sem uma busca conjunta que gere o bem comum.
Pressupostos e frutos o encontro generoso, a busca sincera da verdade íntegra,
respeitar o ponto de vista do outro. A partir da própria
o serviço, a aproximação dos últimos e o compromisso de
identidade, o outro tem algo para dar, e é desejável que
construir o bem comum.
aprofunde e exponha a sua posição para que o debate
Numa sociedade pluralista, o diálogo é o caminho
público seja ainda mais completo. Num verdadeiro
mais adequado para se chegar a reconhecer aquilo que
espírito de diálogo, nutre-se a capacidade de entender o
sempre deve ser afirmado e respeitado e que ultrapassa
sentido daquilo que o outro diz e faz.
o consenso ocasional. Aceitar que há alguns valores
Neste mundo globalizado, os meios de comunicação
permanentes, embora nem sempre seja fácil reconhecê-
social podem ajudar a nos sentirmos mais próximos
los, confere solidez e estabilidade a uma ética social.
uns dos outros; a nos fazermos perceber um renovado
Mesmo quando os reconhecemos e assumimos por
sentido de unidade da família humana, que impele a
meio do diálogo e do consenso, vemos que estes valores
solidariedade e a um compromisso sério para uma vida
basilares estão para além de qualquer consenso, os
mais digna. Mas é necessário verificar se as formas
reconhecemos como valores transcendentes aos nossos
atuais de comunicação nos orientam efetivamente para
contextos e nunca negociáveis.
Central
O diálogo social autêntico pressupõe a capacidade de
A arte de tecer a paz social A paz social é laboriosa, artesanal. Seria mais fácil
que possam construir um povo capaz de recolher as
conter as liberdades e as diferenças com um pouco de
diferenças. Armemos os nossos filhos com as armas do
astúcia e algumas compensações. Mas esta paz seria
diálogo! Ensinemos-lhes a boa batalha do encontro!
superficial e frágil, não o fruto duma cultura do encontro
Isto implica o hábito de reconhecer, ao outro, o direito
que a sustente. Integrar as realidades diferentes é muito
de ser ele próprio e de ser diferente. A partir deste
mais difícil e lento, embora seja a garantia duma paz real e
reconhecimento feito cultura, torna-se possível a criação
sólida. Isto não se consegue agrupando só os puros, porque
dum pacto social. Sem este reconhecimento, surgem
até mesmo as pessoas que possam ser criticadas pelos
maneiras sutis de fazer com que o outro perca todo o
seus erros, têm algo a oferecer que não se deve perder.
seu significado, se torne irrelevante, fazer com que na
O que conta é gerar processos de encontro, processos
sociedade não lhe seja reconhecido qualquer valor.
A desejável e possível amabilidade Ainda é possível optar pelo cultivo da amabilidade. Há
não nos deixa pensar nos outros, da urgência distraída
pessoas que conseguem, tornando-se estrelas no meio
que ignora que os outros também têm direito de ser
da escuridão. A pessoa que possui esta qualidade ajuda
feliz. O exercício da amabilidade não é um detalhe
os outros, para que a sua existência seja mais suportável,
insignificante, nem uma atitude superficial ou burguesa.
sobretudo, quando sobrecarregados com o peso dos
Dado que pressupõe estima e respeito, quando se torna
seus problemas, urgências e angústias. É um modo de
cultura numa sociedade, transforma profundamente o
tratar os outros, que se manifesta de diferentes formas:
estilo de vida, as relações sociais, o modo de debater e
amabilidade no trato, cuidado para não magoar com as
confrontar as ideias. Facilita a busca de consensos e abre
palavras ou os gestos, tentativa de aliviar o peso dos outros.
caminhos onde a exasperação destrói todas as pontes.
Supõe dizer palavras de incentivo, que reconfortam, consolam, fortalecem, estimulam, ao invés de palavras que humilham, angustiam, irritam, desprezam. A amabilidade é uma libertação da crueldade que às vezes penetra nas relações humanas, da ansiedade que
Papa Francisco (Fratelli tutti, §§ 200-224)
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Central
A missão como diálogo profético No decorrer da história, conhecemos várias compreensões de missão e, várias delas, convivem atualmente, não sem tensões. Mas há um modelo, ou perspectiva, que corresponde melhor à atual compreensão do mundo, aos desafios sociais e culturais, e à sensibilidade religiosa do nosso tempo: a missão como diálogo profético. A compreensão da missão, no fim do século XX, foi marcada por três perspectivas: a missão como participação na missão de Deus Trindade; a missão como serviço libertador do Reino de Deus e a missão como anúncio de Jesus Cristo, Salvador Universal. Essas três perspectivas lançaram as bases para uma nova e atual compreensão da missão: a missão como Crédito foto: Banco de imagens freepick
diálogo profético. Nessa nova perspectiva, dentro de um mundo plural e interdependente, a Igreja é chamada a ser
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uma comunidade que não apenas oferece algo de si mesma em serviço ao mundo e aos povos e suas culturas, mas que também aprende, expandindo a própria compreensão de Deus; uma Igreja radicada em Deus que salva por meio do esvaziamento de si mesma, e que não pode comportar-se superiora às populações no meio das quais opera. Testemunho e anúncio Ponto de partida: um Deus humilde e audaz
O primeiro elemento implicado na missão é o testemunho e o anúncio. O primeiro meio da
A humildade de Deus e da Igreja na missão deve ser
evangelização é o testemunho, escreveu Papa Paulo
também uma humildade audaciosa. A missão cristã
VI. Testemunho e anúncio são inseparáveis.
O
é, então, participação à vida e à missão dialógica da
anúncio é sempre um convite e uma resposta a uma
Trindade, mas tal diálogo é profético, ou seja: acolhe a
demanda.
realidade e a cultura, assume a inculturação por meio
A missão de Jesus foi caracterizada tanto pela
de uma interação criativa e, ao mesmo tempo em que
palavra, quanto pelas ações, e essas se explicavam
provoca mudanças, anuncia, confronta e propõe a
por si mesmas. As suas parábolas e ensinamentos
partir do Evangelho.
eram
pronunciamentos
proféticos
que
muitas
Se no passado a missão foi concebida numa
vezes contradiziam a tendência do saber e da práxis
perspectiva monofônica, como obra da salvação
predominantes. As suas curas e seus exorcismos
das almas, como “implantação da Igreja”, ou mesmo
eram parábolas em ação, e a sua práxis de incluir
como anúncio de Jesus Cristo, hoje, ela precisa ser
entre os discípulos e acolher em sua mesa aqueles que
concebida de forma decisivamente estereofônica,
estavam às margens da sociedade foi um testemunho
que implica vários elementos que fazem parte
potente da validade de seu ensinamento.
integrante da missão evangelizadora da Igreja.
A liturgia e a oração
Inculturação e interculturalidade Para guiar os cristãos com entusiasmo, mas na difícil tarefa de tornar possível um autêntico
desenvolvimento da missão como diálogo profético.
encontro entre a fé e os contextos locais, é necessária
Liturgia e missão devem estar em constante diálogo
uma espiritualidade da enculturação, deixar pra
com a assembleia cristã. Um ato de oração ou de culto
trás o senso de superioridade, o poder, a ilusão de
pode ser autenticamente missionário.
compreender uma cultura facilmente. Somente com
Na liturgia e na oração, descobrimos que somos
anos de escuta, aprendizado e diálogo no processo
Povo de Deus, e que participamos no mistério de
de evangelização, se poderá chegar à uma postura e
Deus. Trata-se de uma experiência divina que se
uma ação inculturada e dialogal. A inculturação é um
revela como dialogal, missionária e itinerante. Um
exercício exigente do diálogo profético.
Central
A liturgia, a oração e a contemplação são o segundo elemento implicado na compreensão e no
Deus que se apresenta como amor ativo e salvífico na sua misteriosa presença em meio a criação, por meio Crédito foto: Banco de imagens freepick
do Espírito Santo e do ministério redentor de Jesus de Nazaré. A liturgia e a oração são expressões criativas da vida, contemplam as diferentes tradições culturais e religiosas, assim como os ritos e manifestações originais e populares, e trazem presentes os desafios sociais e econômicos dos povos, em diálogo com a diversidade das interpretações e compreensões do mundo atual. Reconciliação Justiça, paz e defesa da criação O
serviço
da
reconciliação
da
Igreja
é
Agir pela justiça é parte da missão da Igreja hoje, e
indubitavelmente um ministério do diálogo profético.
a nossa participação na transformação do mundo
A reconciliação é um movimento contracultural,
é fundamental. A história nos oferece inúmeros
um apelo a imaginar um mundo não apenas
testemunhos de homens e mulheres radicalmente
reparado, mas uma nova criação. Esta reconciliação
envolvidos na proteção e na defesa da criação. E, a
da humanidade dividida é mediada por cristãos
partir da encíclica Laudato Si, do Papa Francisco,
solidários com as vítimas do mundo. O anúncio da
sabemos que defender a ecologia integral é elemento
reconciliação é o anúncio da centralidade de Jesus
intrínseco da missão.
Cristo, e é profundamente eclesial enquanto é uma ação relacional “face a face” dentro da comunidade cristã, a qual há espaço para a verdade, a confiança e
Diálogo inter-religioso
a reciprocidade.
O diálogo é a norma e o estilo necessário de toda a missão cristã e de cada parte dela. A promoção do diálogo ecumênico e inter-religioso está destinada a ser um dos maiores serviços missionários ofertados pela Igreja. Esse diálogo tem sua centralidade em
Por Pe. Júlio César Werlang, msf
Jesus Cristo, e se dá na abertura à realidade das outras
Roma/Itália
confissões e religiões, ao seu reconhecimento público e respeitoso e à cooperação com elas nas grandes causas da humanidade.
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Espiritualidade
Dialogar, convivendo em família Sirva de convite à leitura as linhas que o autor escreveu ao enviar seu texto: “Havia apenas acabado de escrever a palavra final, 'conflitos', no meu rascunho, quando ouvi o infausto atentado em Saudades. Perdi a tramontana, e, por falta de condições racionais e psicológicas, desisti de escrever uma segunda página para o meu texto. Parece que o 'príncipe deste mundo' do evangelho de ontem começou a reinar. Asseclas não lhe faltam país afora. Se julgarem a página que envio suficientemente 'substanciosa', publiquem-na.” Breve informe gramatical: optei por intitular o texto na forma verbal, e não nominal, do tema, para dar mais expressividade ao dinamismo e ação da concretização do diálogo no contexto familiar, e mediado pela forma do gerúndio do verbo conviver, à guisa de adjunto adverbial. Nesta, talvez, insólita introdução, estão insinuados já os elementos essenciais das exigências da ars dialogandi numa genuína convivência familiar. Pretendo explicitá-las à luz da antropologia e em curtas exemplificações da prática do diálogo da família
Armadilhas marcam presença nessa ótica da prática do diálogo convivial em família, sobretudo, na lábil mudança do esquema dialogal “Eu falo - Tu falas”, para o esquema “Eu falo – Tu ouves”, doutrinando, arbitrando ou, pior, oprimindo um polo da relação. Caberia analisar outras dimensões da ars dialogandi, em circunstâncias familiares, além da gratuidade e integralidade acima referidas.
de Nazaré. Quais são os elementos estruturantes e essenciais
Uma breve incursão na seara da Teologia Bíblica me
que um diálogo concreto pressupõe e exige numa
fornece dois versículos, cuja exemplaridade para a
ambiência de convívio familiar? A antropologia nos
prática do diálogo em família é digna de menção. Cito:
ensina que dialogar é relacionar falas (ou outras
“Meu filho, por que agiste assim conosco? Olha que
dicções comunicacionais). A categoria da relação (o tò
teu pai e eu, aflitos, te procurávamos (...)". "Por que me
pròs tí aristotélico) é a pedra angular sobre a qual se
procuráveis? Não sabíeis que devo estar na casa de
estrutura como causa formal o diálogo humano, em
meu Pai?” (Lc 2,48s).
geral, e, especificamente, também na família.
Eis um exemplo de diálogo transparente e sincero,
Há muitas formas hermenêuticas de explicitação
indicativo da insondável relação de filho de pai
dessa vivência relacional. Martin Buber, considerado o
carpinteiro e de Pai celestial. Outro texto: “Eles não
“filósofo da relação”, aposta na palavra-princípio “Eu-
têm mais vinho (...)", "Que há entre mim e ti, mulher?",
Tu” (ou “Eu-Outro”) da relação dialógica, em oposição
"Fazei tudo o que ele vos disser” (Jo 2,3-5). Por mais
à relação monológica do “Eu-Isso”. A filosofia da
insólito que seja este diálogo entre mãe e filho, ele nos
alteridade de Levinas reforça essa concepção. Otto
ensina que a convivência familiar não é sempre isenta
Bollnow, existencialista alemão, enfatiza, por sua
de conflitos.
vez, a palavra-princípio “encontro”, inseparável da gratuidade e integralidade do diálogo em família. Por Bertilo Brod
A Pedagogia da Libertação, de Paulo Freire, com seu intento de conscientização entre educador e
Erexim/RS
educando, é plenamente passível de aplicação ao Sitz im Leben da formação continuada também em família. Ser de relação no mundo com os outros, encontro instaurador de gratuidade e encanto em família e um processo de conscientização na faina dialogal do dia a dia familiar, eis algumas exigências da missão de “dialogar, convivendo em família”.
Crédito foto: Banco de imagens freepick
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Num tempo em que a respiração tornou-se ameaça dos outros, o Pe. Francisco nos convida a buscar e acolher a respiração de Deus. A pandemia que estamos vivendo desde 2019, e não
divina conosco mesmo, com os outros, com a natureza e
tem fim previsível, vem fazendo milhares de vítimas por
com Deus. Mesmo diante de tanta morte, não fiquemos
todo o mundo. São dias difíceis em que nos sentimos
desesperados, existe uma saída. Existe respiração!
caminhando “por um vale tenebroso” (Sl 23,4), nas
Johann Sebastian Bach tem uma peça musical
sombras da morte. Para não sermos atingidos de forma
intitulada air, cuja tradução é “ar”. Encontrar a tradução
mais violenta pelo vírus pandêmico, precisamos usar
de air no google não é difícil. Difícil mesmo é traduzir
máscaras, manter distanciamento social e lavar as mãos.
o sentimento que nos traz a composição. Uma das
Nossa respiração tornou-se agente de transmissão do
possibilidades é perceber o ar que nos rodeia, que nos
vírus. Por isso, nessa meditação quero partilhar algo que
envolve completamente de dentro para fora e de fora
nos vem da Bíblia sobre nossa constituição como corpo
para dentro de nosso ser. Deus nos envolvendo sem
que respira.
nos invadir, esperando nosso aceno, nosso dar-se conta
Quando Deus criou Adão do barro da terra, soprou sobre
de sua presença, como aconteceu com o filho pródigo,
aquele barro. Seu sopro de vida e barro tornaram-se ser
que apenas avistado foi abraçado por aquele que esteve
vivente (cf. Gn 2,7). Assim Adão foi feito do solo fértil
sempre à espera de sua volta: “ele estava ainda longe,
moldado por Deus e do sopro do próprio Deus. O Salmo
quando seu pai viu-o, encheu-se de compaixão, correu e
104,30 diz: “envias teu sopro e eles são criados, e assim
lançou-se lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos” (Lc 15,20).
renovas a face da terra”. Jesus ressuscitado se manifesta
Queira Deus, nossa espiritualidade cristã, judaica,
aos seus discípulos amedrontados por sua morte
islâmica ou outra, nos ajude a respirar o ar de Deus.
violenta e sopra sobre eles dizendo: “recebei o Espírito
Lembrando que ele dá seu ar, seu sopro a todos(as).
Santo” (Jo 20,22). Jesus Ressuscitado renova a vida dos
Todos(as) estamos incluídos no seu sopro de vida, num
seus discípulos pelo sopro da vida. No areópago de
diálogo interminável entre humano e divino. A palavra
Atenas, Paulo apropria-se de uma citação dos escritores
orante do salmista nos ajude a acolher Deus em tudo e
gregos: “pois nele vivemos, nos movemos e existimos”
em todos, especialmente no humano: “Para onde ir, longe
(Atos 17,28).
do teu sopro? Para onde fugir longe de tua presença? Se subo aos céus tu lá estás; se me deito no Xeol, aí te encontro" (Sl 139, 7-8).
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Espírito Santo, sopro divino, respiração, solo fértil. Deus e o Humano numa interação inconfundível. O que quero chamar a atenção é para o fato de existirmos por Deus, com Deus e em Deus. Sem Ele, somos só pó da terra. Quem nos faz existir é aquele que nos dá o hálito da vida. O terrível vírus da pandemia que tanto ameaça deve lembrar-nos de que sem o sopro de Deus, não podemos ser: nele vivemos, nos movemos e existimos. Precisamos recordar que somos seres materiais e espirituais. Estamos completamente ligados ao céu e à terra. Não temos uma espiritualidade, somos espiritualidade. Quando o poeta pergunta, na sua canção, “existirmos, a que será que se destina?”, uma das
Por Pe. Francisco Ary Carnaúba, msf
possíveis respostas pode ser para respirar, sentir o hálito
Porto Alegre/RS
da vida. Entrar na dinâmica da convivência humano/
Espiritualidade
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Respirar!
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No último dia 4 de maio, na pequena cidade de Saudades, localizada no Oeste de Santa Catarina, cinco vítimas perderam suas vidas brutalmente no atentado à Creche Pró-Infantil Aquarela. Como não poderia deixar de ser, esse fato triste chocou toda a população. A comunidade está sem palavras, e um silêncio dolorido e inconformado paira sobre todos. Brotam sentimentos
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Espiritualidade
“Saudades” hoje rima com “prantos"
de angústia e de justiça. Mas, ao mesmo tempo, surgem questionamentos sobre o porquê de tudo isso. e demais padres das paróquias vizinhas e do pastor
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Neste momento de sofrimento das famílias e da
da Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil
comunidade em geral, não há palavras que possam
(IECLB). Sucessivamente, durante três noites, na
preencher o vazio e responder a dor da perda dessas
Igreja matriz, realizamos o Tríduo da Esperança. Toda
pequenas e inocentes crianças e das duas professoras.
a comunidade está empenhada, dando o suporte e
E não há palavras que possam expressar a dor,
conforto necessário a todas as famílias das vítimas.
sofrimento e desolação que os pais das vítimas estão
Que a bravura e heroísmo da professora Keli Adriane
sentindo. Como membros da comunidade eclesial,
Aniecevski (de 29 anos) e de Mirla Renner (de 20 anos)
sofremos juntos com essas famílias, e nos sentimos
se transforme em estímulo, ânimo e coragem para
tremendamente desafiados a entender e crer na
seguir a luta das demais professoras e profissionais
Ressurreição. Jesus disse: “Eu sou a Ressureição e
da educação, apostando que, por meio do ensino já
a Vida. Quem acredita em mim, mesmo que morra,
desde tenra idade, construamos um outro mundo, no
viverá” (Jo11,25).
qual haja mais amor e empatia, e que não estimule, gere e embale pessoas transtornadas que, numa ação
Compreender os propósitos de Deus, perscrutar o
tresloucada, provoquem tamanha maldade. E que
sentido e as lições dos acontecimentos, muitas vezes
extirpemos, sem “se” nem “mas”, a ideia louca de que
pode se tornar uma tarefa difícil, principalmente
dando vazão à nossa raiva e irracionalidade, agredindo
quando a dor e a tristeza batem inesperadamente na
e eliminando o agressor, estaremos enxugando
nossa porta, como no caso desse atentado à creche. As
as lágrimas das pessoas enlutadas e purificando a
lágrimas brotam constantemente dos nossos olhos e a
sociedade de todos os males.
saudade só aumenta. Tentamos aliviar nossos corações
Saudades chora! Saudades se vestiu de feridas! A
apresentando a Deus nossas perguntas e protestos em
“aquarela” da vida foi reduzida à cor cinza. Oxalá o vazio
forma de preces. Fica a breve memória destas tenras
deixado pelas crianças Sarah Luiza Mahle Sehn (de 1
vidas, o vazio indescritível e as doces lembranças, que,
ano e 7 meses), Murilo Massing (de 1 ano e 9 meses) e
no momento, tem um sabor tremendamente amargo.
Anna Bella Fernandes de Barros (de 1 ano e 8 meses), se
Queremos, e esperamos, que a dor da perda seja
transformem em esperança e coragem para seus pais.
diminuída na medida que a chama da esperança a cada
Keli, Mirla, Murilo, Anna Bela e Sarah Luiza, Saudades
dia for alimentada e revigorada. Por isso, enquanto
chora de saudades de vocês. Honraremos suas vidas
comunidade católica da Paróquia Sagrada Família,
cuidando da vida, educando para a vida, lutando pela
unimo-nos a todas as famílias, dando o conforto e
vida, de todos(as)!
auxílio espiritual necessário para a superação do sofrimento pela perda de seus entes queridos. Um dia após o atentado, juntamente com as famílias e comunidade, na presença do Bispo Diocesano Dom Odelir José Magri, de Chapecó, presidiu a celebração de exéquias, juntamente com o pároco, Pe. Armando,
Por Fr. Adilson Juliano Assmann, msf Saudades/SC
Missionários
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Convidamos a recordar, com gratidão e compromisso, o testemunho deste jovem e generoso missionário, que foi dado à luz na Itália e se tornou luz em terras brasileiras.
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Testemunhos
Pe. Ezequiel Ramin (1953-1985)
Ezequiel nasceu em Padova, Itália, em 1953. Ainda jovem, decidiu dedicar sua vida aos mais pobres e necessitados como missionário além fronteiras. Foi ordenado sacerdote em 1980 e, aos 30 anos, foi enviado em missão ao Brasil. Antes de partir para o Brasil, disse: “ainda não sei aonde irei, porém estou contente com o fato de partir. É uma coisa mais forte do que eu”. Foi destinado a trabalhar em Cacoal, Rondônia. Em Cacoal, encontrou uma Igreja que caminhava
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junto ao povo, comprometida com os pobres e atenta às questões sociais. Havia comunidades consolidadas e lideranças que estavam sendo formadas e, por isso, eram capazes de exercer um protagonismo na vida eclesial e social destas pequenas comunidades. Cheio de entusiasmo, entrou com facilidade na realidade do povo. Encontrou-se num contexto de gritantes desigualdades pela falta de reforma agrária e de uso da violência pelos poderosos, que grilavam terras para ampliar seus latifúndios e expulsavam ou matavam os indígenas para ficar com as suas terras. Não demorou muito para se deparar com os conflitos. Os poderosos (grileiros) usavam os pobres (pistoleiros) para matar outros pobres. Essa realidade incomodava Ezequiel profundamente. Não se continha diante das desigualdades sociais, da
Logo, chegaram as ameaças e as perseguições, porém Ezequiel manteve-se fiel até o fim. Ele mesmo falou em uma das missas: "não aprovamos a violência, embora recebamos violência. O padre que está falando, recebeu ameaças de morte. Querido irmão, se a minha vida lhe pertence, a minha morte também lhe pertencerá”. No dia 24 de julho de 1985, o Pe. Ezequiel, com apenas 32 anos de idade, foi brutalmente assassinado quando voltava de uma missão de paz, na qual havia visitado posseiros na Fazenda Catuva para pedir que se retirassem, pois corriam perigo. Foi pego de surpresa pelos pistoleiros a mando de fazendeiros. Seu corpo recebeu muitos tiros de espingarda. Os mandantes do crime nunca foram presos.
Assim como tantos outros mártires, o Pe. Ezequiel tornou-se semente de novos cristãos. Seu martírio nos estimula a assumir uma vida cristã comprometida pela construção de um mundo melhor para todos. Sua entrega em favor dos pequenos nos impulsiona a sair de nós mesmos e ir ao encontro dos outros, em especial, dos que mais precisam.
concentração dos bens da criação nas mãos de poucos, das injustiças, da violência ou da manipulação das leis para oprimir os pequenos.
Ezequiel nos deixa o testemunho de que ser cristãos de verdade significa nos comprometer pela libertação do
Diante disso, Ezequiel colocou-se corajosamente em
pecado estrutural, que faz o mundo tão desigual, onde
defesa dos indígenas, que tinham um grande apreço
há milhões de pessoas que morrem de fome enquanto
por sua pessoa, e dos posseiros, na luta pelo direito à
alguns poucos concentram a maior parte da riqueza do
terra e à vida digna, vivendo de modo muito concreto
mundo, sem saber como gastar tanto dinheiro.
a opção pelos pobres. Esta postura lhe trouxe a estima dos pobres, mas o rechaço daqueles que achavam que o padre não pode se comprometer nas questões sóciopolíticas e ambientais, e deve restringir seu ministério aos sacramentos.
Pe. Rafael Gemelli Vigolo, mccj (https://www.combonianos.org.br/ martires/pe-ezequiel-ramin)
Colabore
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“Em Saudades se ouve uma voz, choro e grande lamentação. São as mães que choram seus filhos(as) pequeninos(as), e as crianças inocentes que clamam pelas suas amadas e dedicadas “tias” educadoras. Mas as vidas delas foram brutalmente ceifadas (cf. Mateus 2,18). Todos somos chamados a cuidar e defender a vida, em todas as suas expressões, especialmente a vida das criaturas mais frágeis e vulneráveis. Esta é a nossa vocação! Que todos tenhamos a coragem e a generosidade de responder: “Senhor, eis-me aqui!” E possamos discernir nosso lugar na Igreja e nos seus ministérios, e nossa forma de servir e cuidar da vida, sem jamais ceder à tentação de eliminar os agentes imediatos de uma ação tresloucada que causa tanto sofrimento, e talvez sejam tanto algozes quanto vítimas.
Que nossa resposta e nosso compromisso seja...
~ Edificar famílias que sejam espaços de diálogo e santuários da vida! ~ Manter escolas que sejam espaços de convivência e educação para a vida! ~ Construir comunidades cristãs que promovam e celebrem o cuidado e a defesa da vida! ~ Construir uma sociedade que priorize a defesa das vidas mais ameaçadas! ~ Despertar lideranças políticas comprometidas com a solidariedade e a vida! ~ Desenvolver uma agricultura com menos pesticidas e mais respeito à vida! ~ Lutar por uma justiça que se ocupe mais em restaurar que em punir! ~ Gerar uma cultura vacinada contra a indiferença e que cultive a empatia e a vida! Em memória dolorida e agradecida das vítimas inocentes e das vítimas heroicas da tragédia de Saudades/SC (5 de maio de 2021).