Aeroespaço04

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Um controlador de tráfego aéreo brasileiro deve ser proficiente (fluente) em inglês? Eduardo Silverio de Oliveira - 1º Ten Esp CTA Chefe da Subdivisão de Infra-estrutura do IPV, Engenheiro Civil, Licenciado Especial em Língua Inglesa, com especialização Lato Sensu em Lingua Inglesa e Mestrando em Educação na Universidade de São Paulo (USP), na linha de pesquisa Educação e Linguagem

Em 1951, a Organização de Aviação Civil Internacional (OACI) estabeleceu o inglês como língua internacional da aviação, língua franca, quando pilotos e controladores de tráfego aéreo falassem línguas diferentes (Crystal, 1997). A partir de 1952, foi publicada nos documentos da OACI uma listagem contendo determinados termos e ou expressões, em inglês, que deveriam ser utilizados nas comunicações radiotelefônicas piloto-controlador, objetivando uma padronização em nível internacional. Essa linguagem foi denominada fraseologia, que segundo a ICA 100-12 - Regras do Ar e Serviços de Tráfego Aéreo (98: 9-1), “é um procedimento estabelecido com o objetivo de assegurar a uniformidade das comunicações radiotelefônicas, reduzir ao mínimo o tempo de transmissão das mensagens e proporcionar autorizações claras e concisas”. DELIBO (1993:18) afirma que “a fraseologia que compõe a radiotelefonia é, portanto, o veículo pelo qual os pilotos e controladores, de diferentes países, com formações variadas, precisam se comunicar em língua inglesa, com eficácia, à distância. Possui o papel vital de ser o instrumento de garantia de que todos os enunciados dos interlocutores sejam objetivos e isentos de equívocos e deslizes. Portanto, qualquer má interpretação das mensagens veiculadas entre os interagentes pode gerar colisões entre aeronaves e entre aeronaves e obstáculos, tanto no solo quanto em vôo”. Não há dúvidas de que o contexto aeronáutico é, no mínimo, sui generis no que se refere a comunicação em língua inglesa, doravante L2. É fato que, em alguns dos acidentes ou incidentes aeronáuticos investigados, a falta de proficiência e compreensão da língua inglesa por parte dos pilotos e controladores de tráfego aéreo, foi considerado fator contribuinte.

Além do mais, a crescente demanda no uso de L2 nos céus de todo mundo é uma preocupação da OACI, que reconheceu, publicamente, que o aumento da segurança aeronáutica passa necessariamente pelo estabelecimento de uma linguagem radiotelefônica comum e aprimorada. Assim sendo, estabeleceu, a partir de sua assembléia de 1998, um grupo de expertos, denominado de Proficiency Requirements in Common English (PRICE) Study Group, para assistir a sua Secretaria no estabelecimento dos procedimentos e requisitos para a testagem da língua Inglesa padronizada e do nível mínimo de habilidades e requisitos para o uso comum da língua. Convém salientar que o Brasil não tem representante nesse grupo, aliás, nenhum país falante do português. A materialização deste trabalho se deu na 18ª reunião da 158ª Seção, realizada em 04 de dezembro de 2001, onde a Comissão de Navegação Aérea baixou a resolução A3216, denominada Proficiency in the English Language for Radiotelephony Communications, que altera, principalmente, os Anexos 1 (Personnel Licensing), e o 10 (Aeronautical Telecomunications, Volume II - Communication Procedures), e o PANS-ATM, Doc 4444 (Air Traffic Services and the Procedures for Air Navigation Services - Air Traffic Management). Dentre as novas recomendações, há o estabelecimento de uma escala de níveis de “proficiência” em L2 para pilotos, controladores de tráfego aéreo e operadores de estação aeronáutica (Anexo 2 e 3), que deve ser observada a partir de 1º de janeiro de 2008, e os prazos para que os envolvidos, de acordo com o seu nível, sejam avaliados (ATTACHMENT B to State letter AN 13/48.1-02/1[Anexo 1]). A testagem de L2, agora, é uma exigência internacional, e deve ser considerada como um importante passo para padronização e a elevação do nível de “proficiência” em L2 em nível mundial. Entretanto, essa medida impõe ao país prestador dos Serviços de Tráfego 10

Aéreo (ATS), no nosso caso, o Brasil, o estabelecimento de exames de “proficiência” em L2 que atendam às reais necessidades lingüísticas daquele pessoal. O Brasil, estado signatário, deve, agora, adotar medidas que assegurem que seus pilotos, operadores de estação aeronáutica e controladores de tráfego aéreo, envolvidos em operação no espaço aéreo, onde L2 seja requerida, sejam “proficientes” na condução e compreensão das comunicações radiotelefônicas naquela língua. Como falamos muito em “proficiência”, vamos agora discutir o que esse termo significa, para que possamos responder a pergunta-título. Scaramucci (2000:13) chama a atenção para a afirmação de Chalhoub-Deville (1997:3) de que o termo proficiência “parece fazer parte daquela categoria de palavras que são usadas freqüentemente sem uma atenção consciente com relação ao seu significado exato”. Como o termo não se restringe apenas à linguagem, embora seja aí que ele encontre solo mais fértil, há uma grande confusão entre os seus diversos usos e sentidos. A definição do termo proficiência contida no dicionário Collins Cobuild, como capacidade (ability) ou habilidade (skill). “Ele é proficiente em Inglês” ou “Você acha que calculadoras impedem as crianças de se tornarem proficientes em aritmética?”, apresentada pela professora Scaramucci (Ibidem. p.13), deixa claro o que entendemos como proficiente, ou seja, ser proficiente em uma determinada língua se pressupõe conhecimento, domínio, controle, capacidade e habilidade, independentemente do significado que possamos dar a cada uma dessas palavras. Entretanto, esse sentido dicionarizado, embora largamente encontrado na literatura do ensino de línguas em geral, é equivocado, porque está baseado em um modelo utópico de falante e em julgamentos empíricos. Todo esse conceito de proficiência tem


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