NOVA em Folha | Maio 2022

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NOVA em Folha o jornal da aefcsh. maio 2022

ESPECIAL "FINALISTAS" ENTREVISTA A CELSO MARTINS ARROZ XAU XAU (COM TOFU) E ainda crónicas, poemas, exclusivos, críticas, sudokus, ...! Um jornal d@s estudantes para @s estudantes!


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NOVA em Folha o jornal da aefcsh.

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nova em folha maio 2022

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REDAÇÃO | REVISÃO

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João Martins Liliana Marques Maria Gonçalves

Ana Catarina Tiago Beatriz Cabanilhas Beatriz Mateus Catarina Aires Francisco Mendes Barata Francisco Nunes Guilherme Machado João Martins Liliana Marques Madalena Carvalho Madalena Craveiro Mafalda Carvalhal Manuel Pinto Margarida Honório Margarida Ribeiro Maria Gonçalves Rita Coutinho

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Beatriz Cabanilhas João Martins Tânia Pereira

Liliana Marques Madalena Carvalho Maria Gonçalves Maura Francisco Tânia Pereira

CCB C.L Eneko Irigoyen Inês Raposo Maria Linhares Michelle Caldeira NDFCSH Pedro A. P. dos Santos Vasco Martins

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es o e g u F o lh a s á J em ok o VA N O a ceb a m ? F r o n ta g In s u o e/


Índice maio 2022

Notícias 1 2 3 4

AEemFolha - Vasco Martins Novidades FSCH - João Martins Abril em Resumo - Equipa de Notícias Internet em Resumo - Beatriz Mateus

Poesia 5 6 7

sustentável leveza - Maria Linhares Pessoa - C.L O outro - Eneko Irigoyen

Queres ficar a saber que textos, arte e novidades são inspirados pela eclética experiência de que disfrutam @s estudantes da FCSH? Além de ler as nossas edições mensais, ...

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ESPECIAL "Finalistas" 8 9 11 12 13

Manual de Sobrevivência para uma Trabalhadora-Estudante - Rita Coutinho Pela Última Vez - Inês Raposo Do Alentejo para a Avenida de Berna: Três Anos de Memórias - Liliana Marques 756 - Manuel Pinto Sou finalista e… espero ter-me lembrado de ser feliz. - Rita Coutinho

Entrevista 14

Celso Martins, Co-Fundador do NeF - Francisco Mendes Barata

Opinião 16 19 23 25 27 28

Tolerar a Intolerância - Michelle Caldeira Quando Raskólnikov Encontra Putin - Pedro A. P. dos Santos Na fronteira entre Realismo e Idealismo - Manuel Pinto Os Césares mudam, o Império continua - Vasco Martins A Insurreição dos Estudantes - Guilherme Machado A Pegada Ecológica Censurada - Francisco Mendes Barata

Cultura | Lazer 30 32 34 39 40

Europa, Oxalá - Margarida Honório Agenda Cultural: Maio - Equipa Cultural Programação Abril-Junho - CCB Arroz Xau Xau (com Tofu) - Madalena Craveiro Para passares o tempo...


NOTÍCIAS | AEFCSH

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O mês de Abril representa, para a AEFCSH e para todo o país, um mês de celebração da Liberdade e da Democracia, onde podemos recordar tudo o que a Revolução dos Cravos nos trouxe enquanto conquistas para o povo como um todo, e para o ensino em particular. Foi por isso VASCO MARTINS um mês onde um conjunto de iniciativas da Associação se focou na celebração deste momento histórico e fundador da nossa Democracia, lembrando não só os anos de resistência à noite fascista como, também, tudo o muito que Abril nos trouxe. O mês de Abril representa, para a AEFCSH e para todo o país, um mês de celebração da Liberdade e da Democracia, onde podemos recordar tudo o que a Revolução dos Cravos nos trouxe enquanto conquistas para o povo como um todo, e para o ensino em particular. Foi por isso um mês onde um conjunto de iniciativas da Associação se focou na celebração deste momento histórico e fundador da nossa Democracia, lembrando não só os anos de resistência à noite fascista como, também, tudo o muito que Abril nos trouxe. No entanto, podemos começar por lembrar a Semana da Saúde e do Ambiente, iniciativa que a AEFCSH vem organizando há anos, e que nos recorda a importância não só da Saúde enquanto um bem colectivo como, também, do Ambiente como elemento central da nossa realidade política, social e económica, cada vez mais uma questão premente na nossa sociedade. Por forma a podermos celebrar estes dois aspectos, organizámos, no dia 4 de Abril, a visualização do filme Estou me guardando para o Carnaval chegar (2019), do realizador Marcelo Gomes, seguida de uma conversa com o Professor Pedro Florêncio. Aqui pudemos observar como toda uma comunidade no Brasil se orientou, numa verdadeira fábrica a céu aberto, para o lucro de uma empresa, e quais as consequências sociais, económicas, culturais e, também, ambientais que isso teve nessa cidade. Já no dia 5 de Abril, a AEFCSH organizou uma colheita de sangue que, pela grande adesão de todos quantos quiseram participar, mostrou, não só, a importância do acto de doar sangue como atitude individual de preocupação e solidariedade para com o outro como, também, a importância da Saúde enquanto um bem público e colectivo que é pertença de toda a sociedade, e que cabe à sociedade preservar. Encerrando as comemorações desta semana, no dia 7, a AE organizou, em parceria com a Faculdade e a Cicloficina, um passeio de bicicleta até Campolide acompanhado de um piquenique, iniciativa que juntou os dois elementos – Saúde e Ambiente – como aspectos importantes e complementares. Mais ainda podemos recordar o quiz que a AEFCSH organizou para comemorar o Dia Mundial da Arte, a 15 de Abril, e cujo vencedor terá direito a dois bilhetes para visitar, dia 8 de Maio, às 17h00, a exposição “Interferências”, no MAAT. Com esta iniciativa a Associação de Estudantes não só desenvolveu uma actividade lúdica para a comunidade estudantil – com um quiz com perguntas sobre arte das mais diversas épocas da História humana –, como recordou aquele que é um direito central para todos os estudantes e para todas as pessoas – o direito à fruição e criação cultural, artística e intelectual, o direito ao lazer e ao recreio, o direito à Cultura em todas as suas dimensões. Já entre os dias 19 e 21 de Abril, a AEFCSH, tal como tem vindo a realizar ao longo dos anos, organizou a Semana de Abril, relembrando aquela que foi a Revolução dos Cravos, da Liberdade e da Democracia, a revolução que derrubou a sombria ditadura fascista de Salazar e Caetano e que abriu portas para um novo regime democrático, de paz e de direitos. Começámos a semana com a organização de uma exposição de nossa autoria, “Abril de Novo”, que esteve no átrio da Torre B entre terça e sexta-feira, e que relembrou os longos anos de resistência ao regime repressivo do fascismo e quais as principais lutas e conquistas que se alcançaram com a Revolução de Abril. Ainda durante toda a semana, no balcão do espaço da AEFCSH, realizámos uma feira de livros como forma de vincar que a Cultura e o Conhecimento são direitos que queremos universais e de acesso geral. Já para dia 20, conseguimos que o Museu do Aljube – Resistência e Liberdade oferecesse à AEFCSH, para serem disponibilizados gratuitamente aos estudantes da FCSH, trinta bilhetes para uma visita livre a este museu, recordando os anos de resistência anti-fascista e a dura luta que se travou em favor da Democracia e dos direitos do Povo. Ainda no 19 de Abril, a Associação de Estudantes organizou uma conversa informal com o tema “(Des)Colonizar a Memória”, juntando a um auditório cheio de estudantes curiosos Henrique Mendonça (pela Associação Conquistas da Revolução), Adolfo Rodríguez (investigador no HTC) e José Augusto Pereira (investigador no IHC), que nos falaram sobre a Guerra Colonial, a sua importância para a queda do fascismo e a relevância dos movimentos de libertação nacional nas antigas colónias portuguesas. Já na quarta-feira desta semana, a AEFCSH organizou, no seu espaço, a visualização do filme Outro país (1999), de Sérgio Tréfaut, seguida de uma conversa com o Professor Pedro Florêncio e com a Professora Alice Samara, combinando os conhecimentos de ambos sobre Cinema e História num interessante encontro destas duas disciplinas em torno da temática da Revolução de Abril. Ainda pudemos contar, neste evento, com um vídeo que o realizador do filme gravou especialmente para a iniciativa e que foi mostrado a todos quanto estavam presentes. Por fim, no dia 21 de Abril, pudemos organizar a conversa “Arte e Liberdade”, com a presença de Pedro Penilo (artista plástico) e Ana Biscaia (ilustradora), sobre as intersecções entre a Arte e a Cultura, por um lado, e a Liberdade e a Luta, por outro. Ainda neste mês, a AEFCSH apelou à participação de toda a comunidade estudantil da FCSH no desfile realizado entre o Marquês de Pombal e o Rossio, referente às Comemorações Populares do 48.º Aniversário do 25 de Abril. Aqui pudemos mais uma vez testemunhar que o Povo saiu às ruas para celebrar a Liberdade, a Democracia e os Direitos que conseguiu conquistar mas, também, o muito que ainda falta alcançar. Nestas gigantescas comemorações, gostaria a AEFCSH de valorizar a intervenção da Presidente da AEFPIE-UL, que realizou o apelo à juventude, já na praça do Rossio, um apelo que sintetizou o muito pelo qual devemos lutar – a Liberdade, a Paz, os nossos Direitos e um Ensino Superior verdadeiramente Público, Democrático, Gratuito e de Qualidade. “25 de Abril Sempre! Fascismo Nunca Mais!”

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NOTÍCIAS

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novidades fcsh João Martins (adaptação) Já te candidataste a Mestrado?

A 1.ª fase de candidaturas a Mestrados e Doutoramentos na NOVA FCSH terminou a 29 de março (31 para as Pós-Graduações). No entanto, os estudantes que vão terminar a licenciatura no final do presente ano letivo e que pretendem ingressar num Mestrado apenas devem apresentar a sua candidatura à 2.ª fase, que estará aberta entre 18 de maio e 4 de julho, com vagas previamente fixadas e as sobrantes da 1.ª fase. Todas as informações sobre os critérios de seleção, o número de vagas e os documentos a apresentar, bem como o valor da propina, estão disponíveis no edital de candidatura de cada curso, na respetiva página do site. No próximo ano letivo 2022/23, a NOVA FCSH oferece 44 Mestrados (dos quais 8 são Mestrados em Ensino), 13 Pós-Graduações (e um Curso de Especialização) e 26 Doutoramentos . As candidaturas são realizadas online, através do portal do Inforestudante. 100 anos de Gago e Sacadura

A 17 de junho de 1922, o hidroavião Lusitânia, um Fairey F III-D MkII, finalizou com sucesso a amaragem na Baía da Guanabara, nas águas do Rio de Janeiro. Pilotado por Gago Coutinho e Sacadura Cabral, concluiu assim a primeira travessia aérea do Atlântico Sul. Esta façanha, que representou uma etapa de grande inovação na aeronáutica, é um dos muitos contributos para o desenvolvimento posterior da aviação de longo curso, especialmente transatlântica, tanto do ponto de vista geográfico como tecnológico. Do mesmo modo, o momento foi simbólico do ponto de vista das relações entre o Brasil e Portugal. Trocando naus por aviões, portugueses e brasileiros aproveitaram para comemorar os laços entre os dois países e reforçar a sua memória coletiva comum. A data escolhida para realizar a travessia – 1922 – não foi obra do acaso, mas sim uma ideia do próprio Sacadura Cabral para marcar com impacto as comemorações do centenário da Independência do Brasil. Comemorando os 100 anos deste acontecimento, a Mostra Bibliográfica «Travessia Aérea do Atlântico Sul» pretende divulgar algum do acervo disponível sobre este tema nas bibliotecas da NOVA FCSH, ocorrendo no átrio da Torre B (Campus da Av. de Berna) entre os dias 30 de março e 17 de junho de 2022. Literatura Feminina: Natalia Ginzburg

Dia 26 de maio, realizar-se-á a sessão «Natalia Ginzburg: infância e dicionário», conduzida por Clara Rowland (Univ. NOVA de Lisboa). Enquadrado no V Ciclo «Literatura Escrita por Mulheres», o evento resulta de uma parceria entre o CHAM – Centro de Humanidades (NOVA FCSH) e a Biblioteca Nacional (Campo Grande, Lisboa). É nesta última que decorrem todas as sessões, presencialmente e com entrada livre, às 18h. A programação completa está disponível em: https://cicloliteraturaescritapormulheres.weebly.com/ NOVA EM FOLHA


NOTÍCIAS

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abril em resumo Manuel Pinto, Francisco Nunes, João Martins

13 - ORÇAMENTO DE ESTADO 2022

Teve início o processo orçamental no Parlamento, com o Ministro das Finanças a entregar a proposta do governo à Assembleia. A votação final global do Orçamento de Estado para 2022 ficou agendada para 27 de maio. Até lá, haverão audições setoriais, propostas de alteração do orçamento, tanto em comissões como em plenário, e votações para cada uma das decisões. Por isso, o OE2022 só deverá entrar em vigor no segundo semestre de 2022, atraso que se deve à crise política gerada após a rejeição da anterior proposta, a 27 de outubro de 2021. 14 - ‘MOSCOVO’ VAI AO FUNDO

O cruzador de mísseis Moskva, maior unidade da frota russa do Mar Negro, naufragou após um devastador incêndio a bordo. Para além dos danos simbólicos da perda do seu navio almirante, batizado em honra da capital, Moscovo, a Rússia já admitiu a morte de, pelo menos, 40 marinheiros. Contudo, o Ministério da Defesa alegou que o naufrágio se deveu a uma explosão de munições não controlada, ao passo que a Ucrânia afirma ter atingido o Moskva com dois mísseis anti-navio. 20 - SUÉCIA E FINLÂNDIA NA NATO

Após várias reuniões, as primeiras-ministras finlandesa e sueca favoreceram um pedido de adesão conjunto à NATO, expectável para o fim de maio. O parlamento da Finlândia irá discutir esta hipótese, tendo em conta uma inversão da vontade popular (68% de apoio à adesão) que também se registou na Suécia (com uma maioria menos expressiva de 57%). Devido à invasão russa da Ucrânia, Estado não-membro da NATO, os países nórdicos (que também integram a União Europeia) podem tornar-se os mais recentes membros da Aliança Atlântica. 23 - GENOCÍDIO ARMÉNIO

Joe Biden torna-se o primeiro Presidente norte-americano a reconhecer o Genocídio Arménio, ocorrido em 1915, sem, no entanto, atribuir culpa diretamente ao estado turco. A importância deste reconhecimento, apesar de meramente simbólico, é central nas relações entre os EUA e o seu aliado da NATO mais próximo de Putin, a Turquia. Fontes: Público, Diário de Notícias, Expresso, The Guardian, Reuters Imagens (por ordem): Renascença, Plataforma Media, Atlantic Council, Contacto-USA NOVA EM FOLHA


NOTÍCIAS | NÚCLEOS

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internet em resumo

Beatriz Mateus

Memefication do caso de abuso Heard vs. Depp

Mais do que era da internet, vivemos numa era de memes, em que tudo se pode transformar numa piada. Neste momento, vemos precisamente essa situação no que toca ao caso Heard vs Depp, em que Johnny Depp tenta provar a sua inocência perante as alegações de violência doméstica que mancharam o seu nome junto do público geral. Não só estão a ser usados sons do julgamento para a criação de vídeos, como excertos da filmagem do próprio julgamento. 'As It Was', sucesso imediato ou meme imediato?

Lançada a 1 de abril, 'As It Was' conta já com 253 390 060 streams, sendo a popularidade do artista Harry Styles o principal motivo para a viralidade da música. No entanto, desde que a app Tiktok ganhou destaque nas nossas vidas, há uma questão que se coloca: será a canção popular “musicalmente” ou sobretudo perfeita para criadores de conteúdo? Até agora, a música já foi usada em mais de 1.3 milhões de tiktoks, com muitos a usar o áudio como estratégia para aparecer nas páginas de recomendados, visto que a app é conhecida por promover vídeos com os sons populares no momento. Estará o Facebook a tentar destruir o Tiktok?

A guerra entre os gigantes das redes sociais é tão antiga como a existência das mesmas. No entanto, a rivalidade entre Facebook e Tiktok está a ir um pouco para além do esperado. O Facebook já tinha sido anteriormente criticado pelo seu desinteresse no problema sério que a sua plataforma enfrenta com as fake news. Porém, a maior rede social do mundo elevou agora a fasquia ao espalhar propositadamente notícias falsas sobre a aplicação concorrente, procurando virar o seu público-alvo mais velho contra a utilização do Tiktok pelos jovens. Twitter vendido a Elon Musk por 44 mil milhões de dólares

Anteriormente o mais popular “troll” da plataforma, Musk é agora o dono da rede social Twitter. Depois de diversas controvérsias protagonizadas pelo dono da Tesla, começam agora a surgir as primeiras publicações de utilizadores preocupados com o futuro da rede social relativamente à transparência e liberdade anteriormente experienciadas dentro do Twitter, e muitos começam a ameaçar apagar as suas contas para tentar boicotar a venda.

Gostas de desenhar e gostavas de partilhar o teu conhecimento com os outros? Ou não tens qualquer experiência e gostavas de aprender mais? O NDFCSH é o teu núcleo! Junta-te a nós em diversas sessões e eventos, de GarticPhone a aulas de anatomia! Desperta o artista que há em ti! E-MAIL: nucleodesenhofcsh@gmail.com INSTAGRAM: @ndfcsh DISCORD: Hey_Wasdle#5680 (tag a contactar em caso de interesse :)

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POESIA

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SUSTENTÁVEL LEVEZA MARIA LINHARES

Nunca pensei pensar querer-te ou sequer encontrar-te. Do ser platónico ao real ser, do delinear-te ao tocar-te, do olhar ao ver-te . Do peso a uma leveza descomedida, desregrada, solta, vândala, livre. Numa miragem da beleza, onde só vê quem tu permites. E eu, presa a ti, que libertas deste paradoxo que é querer sentir.

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POESIA

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PESSOA C. L.

Aquele tipo de pessoa, Que pelo outro tanto se magoa, E que, por mais que lhe doa, A tudo e todos perdoa. Que pelo quotidiano voa, E, a pouco a pouco, o aperfeiçoa. Com uma bondade que não leiloa, A todo o ser vivo se afeiçoa. Com um sorriso que atordoa, Um “estou bem” que atraiçoa, E que do coração destoa. Mesmo quando tudo se amontoa, E se vê girar à toa, Palavras ternurentas apregoa, Voz que num poço ecoa. Digna de carregar uma coroa, É para mim tão boa, Aquele tipo de pessoa.

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POESIA

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o outro ENEKO IRIGOYEN

Um completo frenesim de pensamentos Me consome a alma enquanto espero Pacientemente, mas sem tempo nem alento, Que chegue a caixa de lápis a que chamam metro. Rodeado de pares que simultaneamente ímpares são. Histórias não contadas sem narrador que as conte Para o meu consciente inconsciente de nada mais passarão Que um obstáculo na correria mundana do dia a dia. Tarefa árdua a de ver humanidade no humano Imaginar a complexidade de uma vida Naquele que para o outro sou eu O estorvo no decorrer do seu dia mundano.

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ESPECIAL "FINALISTAS"

MANUALPARADEUMASOBREVIVÊNCIA TRABALHADORA-ESTUDANTE

RITA COUTINHO

“Queres ir sair hoje? Não posso, vou trabalhar às 18.” “Olha vamos passar um fim de semana fora todos juntos! Epah não dá, só tenho o fim-de-semana para conseguir fazer as coisas da semana toda da faculdade.” “Amanhã não queres ir beber um café? Desculpa, é o meu único dia de folga e preciso mesmo de dormir…”. Pois é, se reconheces os pequenos diálogos em cima, parabéns: pertencemos ao grupo especial dos para sempre sem tempo e com olheiras até ao joelho. Digamos que tenho quase a certeza que este não é o melhor grupo de todos, mas a gente lá se arranja. Sou trabalhadora-estudante desde que entrei na faculdade e devo dizer que apesar do meu caso não ser, nem de perto, dos piores, isto de trabalhar e estudar tem que se lhe diga. E muito. Exatamente por isso e no sentido de deixar algo de útil (pelo menos alguma coisinha tinha de deixar não é) para aqueles que virão depois de mim, aqui vão as 5 regras principais para conseguires sobreviver a 3 anos de licenciatura (sanidade mental e algumas outras coisas podem ter sido perdidas no caminho). Acredita, é possível! Regra nº1: eu sei que é difícil, mas tenta conversar. Não temos todos as mesmas ferramentas, mas estamos todos no mesmo barco! Uns com mais à vontade e outros mais tímidos, a verdade é que entrar numa nova situação e conhecer gente nova é sempre desafiante. Contudo, não há nada mais importante que conhecer pessoas na faculdade. Alguma vez ouviste a expressão “o curso não se faz sozinho?” Não faz mesmo. As pessoas são o pilar e vão facilitar tudo o que faças. Regra nº2: arranja uma agenda! Ela é a tua nova melhor amiga! Para ti, master da memória que se lembra de tudo a toda a hora, tenho uma coisa para te dizer: não vai ser sempre assim. As coisas acumulam-se, misturam-se e damos por nós a ter de gerir as mil facetas da nossa vida ao mesmo tempo. Uma coisa escrita e organizada, seja em papel ou online, faz com que asseguremos que nada nos falhe. Ouveme que eu não duro sempre. Regra nº3: dá a conhecer a tua situação aos professores! Nem todos vão perceber, mas alguns podem surpreender! Esquece tudo o que possas ter ouvido sobre professores da faculdade. É verdade que existem os bons e os maus, mas não é como muitas vezes ouvimos. Alguns são realmente surpreendentes ao ponto de ficarem incomodados com o facto de não lhes pedirmos ajuda quando necessitamos. Existe alguma coisa confusa? Era melhor para ti se os powerpoints fossem partilhado? Precisavas de alguma ajuda extra? O “não” está sempre garantido. Regra nº4: não conseguimos ser 100% a toda a hora em tudo o que fazemos. Dá-te espaço para abrandar. É preciso ter calma também, não é? É o trabalho, a faculdade, casa, amigos, família, tentar ser uma boa pessoa no meio disso tudo. Não vamos estar completamente dedicadas a tudo a toda a hora. É preciso aprender a definir algumas prioridades e a que é que devemos dedicar o nosso tempo e em que momento. Tudo se faz, só não tudo de uma vez. Regra nº5: lembra-te que também tens de te DIVERTIR! Não se trata apenas de fazermos as coisas bem na faculdade e no trabalho certo? Faz tempo. Acredita, é difícil, mas possível. Às vezes é apenas um café de uma hora que vai mudar o teu dia. E acredita, fazes tudo o que tens para fazer com um sorrisão nos lábios. NOVA EM FOLHA


ESPECIAL "FINALISTAS"

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PELA ÚLTIMA VEZ INÊS RAPOSO

Lembro-me do último dia de secundário como se fosse ontem. Aliás, parece ter sido ontem, apesar de já terem passado três anos. Foi dia de festa e cerimónia. Perfilados em pose majestosa junto aos “putos” dos anos abaixo, eu e os meus pares escutavámos o discurso que dias antes ajudara a escrever, recitado por alguém com melhor dicção. Os meus lábios moviam-se em silêncio, acompanhando as palavras que tinha escutado, revisto e reescrito cem vezes (com a ajuda de uma rapariga que nunca mais vi e de um rapaz cujo nome não guardei na memória). Hoje, à beira de completar uma nova meta letiva e rumar a outra fase da vida, dou por mim a recordar o parágrafo que escrevi para “os nossos sucessores”, os colegas de 11º ano. Era a parte que conhecia melhor, pois calhara-me a função de a redigir sozinha, e lembrome de a proclamar em surdina, de olhos fechados, entre os ombros e cabeças dos meus colegas: “O futuro é complicado e caprichoso, não vale a pena tentar entender a sua dinâmica - mal o esperamos e já ele nos bate à porta para nos levar. É por isso que o presente é tão importante, e nunca se deve subestimar o seu valor. Aproveitem-no”. Não sei se os “sucessores”, distraídos e tagarelas, interiorizaram aquelas palavras emotivas, ou sequer se as escutaram. Sei que eu escutei, mas não interiorizei. E é por isso que, em face da minha última oportunidade de ser finalista e partilhar a sabedoria adquirida pela experiência, decidi descrever o meu insucesso em seguir os meus próprios conselhos. Espero que quem vier a ler a seguinte fábula perceba a importância de não deixar o tempo passar em vão e de aproveitar a vida académica como eu não consegui/quis/tentei/..., porque o tempo de ir embora atinge-nos, mais tarde ou mais cedo. Pretendo ser breve e direta, pelo que esclareço já os dois maiores obstáculos à vivência profícua dos meus anos de licenciatura: a pandemia e as frustrações curriculares (agravadas em parte pela confusão burocrática que é a FCSH). No fim de contas, não tive muito azar. Consegui realizar algumas disciplinas que efetivamente escolhi (nem perto de todas as que me haviam sido prometidas) e apenas vivi dois semestres

de aulas completamente isolada da convivência social e académica (e outros dois meio-isolada). Podia ter sido pior, permitam-me dizer, fazendo jus ao inigualável pessimismo otimista que abunda no espírito português. Ora, quando na faculdade assisti às primeiras aulas, percebi que as coisas seriam algo diferentes da escolinha, mas não tanto assim que fosse preciso esforçar-me mais do que estava habituada. Porém, quando chegou a época de frequências, tive de arrancar o sucesso relativo à força de lágrimas de ansiedade e noitadas de recuperação de conteúdos. Não deixem as coisas para a última, maltinha... Vejam sempre se vale a pena ler tudo o que vos enviam, mas não caiam na ilusão do “ainda falta tanto!...”. Um pouco de trabalho contínuo aqui e ali e ficam bem. Por outro lado, cuidem de aproveitar o tempo livre para travar amizades e conhecimentos fortuitos. Não se prendam com quem não vos acrescenta, nem tenham medo de se revelar. Três anos parecem imenso, mas às vezes uma má escolha inicial e uma teimosia conformista são suficientes para garantir que as melhores oportunidades ficam adiadas ou escapam totalmente. No meu primeiro semestre encontrava-me a finalizar a carta de condução, fazia desporto extracurricular, tinha compromissos românticos, etc.. Não seria justo culpar nenhuma dessas situações, que me roubavam dias inteiros, pelo insucesso em cultivar boas companhias. Mas, ao reimaginar o que poderia ter sido diferente, não posso ocultar que um primeiro semestre mais desimpedido e uma maior espontaneidade teriam sido muito benéficos. Há ondas que ou surfamos ou nos arrasam... lllVinda a pandemia e os semestres confinados, fechei-me do mundo, meio deprimida, meio resignada, tanto mais que o primeiro semestre se tinha saldado em mais prantos que sorrisos. Instalara-se aquele desalento estreante em que flutuam questões como “será que estou no curso certo?”, “onde andam as pessoas mais interessantes?”, “porque raio me parece que todos já encontraram os melhores pares e parcerias, e eu não?”, “como é que vou recuperar todas as festas, atividades, palestras, ... a que não fui?”, etc.. NOVA EM FOLHA


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Quanto às dúvidas “psicotécnicas” reconheço agora que, se não quisesse mesmo estar onde estava, não sentiria aquela hesitação constante ao pensar em mudar, aquele gosto latente e teimoso pelas temáticas que estudava - por isso, ainda bem que fiquei. Já as questões psico-sociais, são mais difíceis de deslindar... Foi apenas há umas semanas que frequentei a minha primeira jantarada com as pessoas que cobicei (não me interpretem mal) ao longo de toda a licenciatura. Mas, sem querer, pus cerveja no copo de quem abominava álcool, e escutei pela primeira vez certas histórias de coisas passadas há muitos semestres atrás, para dar alguns exemplos. A verdade é que não tive tempo de conhecer estas pessoas, e nem me apercebi. Não as procurei durante os confinamentos, dei prioridade a conquistas curriculares quiçá não tão relevantes assim, fui tímida durante demasiado tempo. Agora tenho medo de não conseguir deixar uma marca que impressione o suficiente para, fora do cenário letivo e do clima académico, manter o contacto com esta malta fixolas... Receio parvo, devo dizer. Só fará falta quem ficar para a posteridade (ou assim quero acreditar). Tudo considerado, não sei precisar ao certo o que

ESPECIAL "FINALISTAS"

poderia ter feito para mudar o curso da minha viagem frente às circunstâncias pandémicas, à pressão paralela para obter, além do sucesso universitário, uma vasta gama de “apêndices” curriculares, e às inibições sociais de que sofro por defeito de personalidade. Tudo poderia ter sido diferente. Penso que para melhor. Enfim, não sei, não é possível saber. No entanto, esta é a última vez que assumo o papel de finalista (noutros ciclos académicos não acho que tal estatuto tenha grande importância), ou seja, é a última vez que posso posar como figura de autoridade na arte da vida letiva para uma audiência de “sucessores”. Espero, por isso, que o meu testemunho sirva de inspiração a ações ousadas e conscientes entre os que ainda estiverem em posição de aproveitar estes anos fugazes que não se repetem. Pois o “presente é tão importante, e nunca se deve subestimar o seu valor. Aproveitem-no”. Não desfazendo, talvez a maior lição da minha experiência seja que, apesar de todas as lacunas e do sentimento de incompletude, ainda apanhei uns resquícios da onda que hesitei surfar, e que desejo sinceramente que vocês, bravos “sucessores”, apanhem e disfrutem. Isto do pessimismo otimista tem muito que se lhe diga :) NOVA EM FOLHA


ESPECIAL "FINALISTAS"

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DO ALENTEJO PARA A AVENIDA DE BERNA: TRÊS ANOS DE MEMÓRIAS LILIANA MARQUES

Passada uma hora restrita às quatro paredes estéreis de uma sala branca, numa luta contra o tempo e contra o vento, deparo-me com uma cena tão especial: um pai e um filho a entrar no carro, a cantarem juntos uma música do Panda e os Caricas. Por mais aleatória que possa parecer esta sequência de eventos, é muito isto que descreve a minha licenciatura e o tempo passado na FCSH. Estes três anos foram uma montanha-russa de emoções e momentos. Ri, chorei, conheci novas pessoas e fiz novos amigos e cresci, enquanto pessoa e enquanto estudante. Entrei pela primeira vez na faculdade meio a medo, com receio de dar um passo em frente e iniciar uma nova fase na minha vida. Uma licenciatura e muitos mental breakdowns depois, não quero sair daqui nem por nada. Faculdade minha, que se tornou casa, e que me viu crescer nestes três anos de tantas aventuras e peripécias. Viu-me a apaixonar-me pela escrita e pelo jornalismo, viu-me a cantar e dançar nos churrascos, viu-me a sair da minha zona de conforto e a desafiar-me a mim própria todos os dias. Eu cresci durante este tempo na FCSH e ela cresceu comigo: tantas pessoas foram embora e continuaram o seu percurso noutro lugar, outras estão de saída, e tantas outras chegaram, entretanto, e estão a começar agora um percurso pessoal e académico, que espero ser tão bonito quanto o meu. Enche-me o coração ter encontrado na Avenida de Berna o lugar, o conhecimento e as pessoas que me enchem as medidas e que me fazem sair da torre B, às seis da tarde, com um sorriso na cara. Não sei o que me reserva o futuro, mas de uma coisa tenho a certeza: aquilo que estes três anos me deram, ninguém me tira. De mochila às costas, auscultadores postos e eyeliner feito, lá vou eu para a minha próxima aventura. NOVA EM FOLHA


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ESPECIAL "FINALISTAS"

756 MANUEL PINTO

Nasci na Cruz Vermelha, em São Domingos de Benfica. Vivi em Algés por uns anos e, pouco tempo depois, regressei à terra onde os meus avós se instalaram para viver nos anos sessenta, com o mesmo objetivo. É de Alcântara (precisamente, de Santo Amaro) que guardo a maioria das minhas memórias e, por isso, também de Alcântara que digo que sou. A minha relação com o território e gentes de onde vivo é forte, tão forte como a ligação que me une à família e amigos, o que implicou que, desde cedo, fosse um utilizador frequente dos transportes públicos de Lisboa e me deslocasse pela capital o melhor que podia e sabia, para comparecer nos mais variados programas. No entanto, fui sempre acompanhado por uma presença irregular no meu mapa mental dos transportes de Lisboa: o 756. Esse (para mim) mítico autocarro cuja paragem terminal está a meros 40 metros de minha casa, na rua da Junqueira, partia, tanto quanto sabia, para nenhures. Afinal, para alguém que de Olaias não conhecia mais que o nome, era perfeitamente normal desconhecer o trajeto e paragens intermédias. Eis senão quando recebo o desejoso email de aceitação na NOVA FCSH para o curso de Ciência Política e Relações Internacionais. Os meus pais, no normal ritual de entrada dos filhos em qualquer “mundo” novo - como é o do Ensino Superior - foram-me avisando e alertando para algumas das mudanças que sentiria. Uma delas, anunciada pela minha mãe assim que soube as notícias de aceitação, foi a de que trocara uma caminhada de dez minutos até à Escola Secundária, por vinte minutos no 756, e que, por isso, estava perto de casa. Apesar da intriga que me provocara a utilização da expressão “perto de casa”, numa declaração que implicava o duplicar do meu tempo de trajeto, lá fiquei satisfeito por finalmente preencher esse espaço mental vazio que era, para mim, o 756 e o seu trajeto. Quem diria que me levaria, na paragem da Avenida de Berna, aos melhores 3 anos da minha vida. A FCSH é uma casa como nenhuma outra. Na qual fiz amizades que levo para a vida, me instruí sobre o que mais gosto, conheci professores e funcionários excelentes e cresci enquanto pessoa. Nestas derradeiras semanas de licenciatura sou invadido por uma nostalgia inexplicável. Sofro por antecedência, o que logicamente só deveria sofrer lá para junho. Sofro por sair duma casa que me marcou com o maior selo de qualidade, não só académica, mas principalmente, humana que existe – o selo FCSH. Desta casa sairei por virtude da inexorabilidade do tempo, mas esta, ficará, para sempre, comigo. Aos que ainda têm tempo para aproveitar e aos que ainda estão por chegar, aproveitem tanto quanto possam. É mesmo verdade o que dizem, o tempo passa a correr. Por isso, aproveitem cada dia na única esplanada com faculdade no país, sabe-se lá se, sei lá, não aparece por aí uma pandemia ou coisa do género para vos comer 2 anos de FCSH. Afinal, a intriga resolveu-se, pois vindo a expressão “perto de casa” da minha mãe, que por cá andou em 19871991, percebe-se o porquê da sua utilização numa frase sobre a FCSH, mesmo que referente à duplicação do tempo de trajeto. O meu desejo? Que todos os trajetos de vida incluíssem paragens como a que o 756 me deu. NOVA EM FOLHA


ESPECIAL "FINALISTAS"

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SOU FINALISTA E… ESPERO TER-ME LEMBRADO DE SER FELIZ. RITA COUTINHO

Pois então já dizia uma voz sábia que vocês conhecem, também conhecida como Rita Coutinho, que é no meio dos planos e expectativas que as coisas mais correm como menos planeamos e esperamos (acabei de inventar a frase, mas eu cá acho que é muito verdadeira). Nunca fui uma pessoa que tivesse sonhado propriamente em ir para faculdade. Sabia apenas que, chegado o momento de terminar a escola, sonhava em aprender e fazer mais. Se a faculdade era a maneira de o fazer, então era lá que me encontrariam. No entanto, a primeira vez que fiz a minha escolha e tive a minha experiência, entrei na faculdade e… detestei completamente. Achei que a minha vida tinha terminado e que nunca iria ter a possibilidade de sentir na pele a frase “faz o que gostas e nunca terás de trabalhar um dia na tua vida”. Pela primeira vez, planeei, criei expectativas e nada aconteceu. Na segunda vez que entrei na faculdade, não fui à espera de nada. Fui sem ter a noção de que esta era supostamente uma altura da minha vida que deveria aproveitar da melhor maneira, porque acontece uma vez. Fui à espera de não fazer amigos e de só me deixar estar e deixar o tempo passar. Fui à espera de nada e aconteceu tudo. A minha experiência da faculdade não foi daquelas que se vêem em filmes americanos ou em livros. Spoiler alert: essas experiências não existem. Eu ia muito com a ideia de que todas as coisas deveriam ser e trazer-me determinadas sensações e de que aconteceriam determinadas coisas. Não aconteceram e está tudo bem. Percebo isso agora, ao escrever-vos isto. A faculdade é alegria desmesurada, é choro, é amor, amizade, é aprendizagem, é injustiças, é mudança, tanta mudança e mais um bocadinho de mudança. A faculdade é cansaço, é tempo que deixa de haver, é dúvida, é gosto e desgosto, são opiniões que hoje são e amanhã já não. A faculdade são colegas que confundimos com amigos, encontros improváveis e uma misturada de sentimentos tal, que existem dias em que é difícil levantar sequer da cama. Tenho pela frente um mês cheio de trabalhos, trabalhos e adivinhem lá… trabalhos. Mas sinto que é nesta altura que mais tenho aproveitado e que mais quero aproveitar esta fase tão única. Por isso, para além de estar desejosa de ver aquele papel a dizer “LICENCIADA”, depois de tanto ter esperado e planeado antes, hoje sonho. Mas vivo. E no meio de tudo o que corre mal ou bem, vou-me lembrando de ser feliz. NOVA EM FOLHA


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ENTREVISTA

CELSO MARTINS co-fundador do NOVA em Folha

NOVA EM FOLHA


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NeF: No ano em que ingressou na faculdade, qual era o ambiente político que se vivia? CM: O muro de Berlim caiu em 1989, eu tinha 18 anos nessa altura, teve um efeito importante em mim, pelo simbolismo, mas o que teve mesmo impacto foi o dominó de regimes a caírem a leste, uns atrás dos outros. Senti pela primeira vez que a história se movia em frente aos nossos olhos. Para mim aqueles regimes tinham existido desde sempre, eu não tinha a melhor opinião deles e agora caíam com estrondo. Tinham sido também os anos de Reagan e Thatcher. Em 1992 veio o Fukuyama a dizer que tínhamos chegado ao fim da História, tese de que desconfiávamos largamente. Por cá, Cavaco Silva e a sua tecnocracia reinavam. Odiávamo-lo. Eu e os meus amigos da FCSH formávamos um grupo um bocado excêntrico politicamente. Éramos declaradamente de esquerda, mas não encaixávamos na oferta disponível. PCP e PSR pareciam à maioria de nós relíquias históricas, embora os respeitássemos, por razões diferentes nos dois casos. Claramente, afastávamo-nos deles pela questão europeia, tínhamos entusiasmo por essa construção e achávamos os argumentos da esquerda tradicional contra ela meras projeções ideológicas. E depois, havia a queda da URSS (1991), que nós obviamente saudámos, e os comunistas já davam sinais de não saber lidar com aquilo. Ao mesmo tempo, éramos genuinamente pessoas preocupadas com a questão da igualdade e da justiça social, com os direitos das minorias de todo o tipo, isso já estava lá, nomeadamente a questão do racismo. Aos olhos da esquerda académica de então, bastante influenciada pelos partidos (o que vai do PCP ao PSD), éramos uns tipos difíceis de classificar. Eu era talvez o mais ideologicamente próximo da esquerda do PS. Gostava do modelo sueco dos anos 70 e continuo a gostar, um contrato social muito equilibrado no que toca à tensão entre liberdade e igualdade. Enfim, passados mais de 30 anos acho que estou no mesmo lugar, politicamente. Não se aprende nada (riso). Como é que o pós-revolução de abril influenciou a mentalidade na esfera académica? Bem, eu comecei a sentir-me consciente e curioso politicamente por volta de 1985, entre o Bloco Central e o primeiro governo minoritário do Cavaco. O ímpeto revolucionário estava já totalmente dissipado. Do ponto de vista cultural isso era muito importante. Depois veio o Independente do Paulo Portas e do Miguel Esteves Cardoso. Estávamos a léguas deles ideologicamente, mas sentíamos uma enorme atração por aquela frescura cultural toda. O MEC falava do Beckett e dos Joy Division e isso era muito diferente da cultura baladeira e xaroposa dos anos anteriores.

ENTREVISTA

Qual era a maior tendência político-ideológica dos estudantes do Ensino Superior na época? A norte, a direita e o PS dominavam, mas a sul, Belas-Artes, Ciências e a FCSH eram de esquerda, na maioria dos casos próximas do PCP. Uma coisa unia a esquerda toda: éramos radicalmente contra a implementação das propinas. Não acreditávamos nem um bocadinho na retórica do governo, secundada por intelectuais como o António Barreto ou a Fátima Bonifácio, de que as universidades ficariam melhores se os alunos as financiassem. No que toca à comunidade estudantil, sente que se tratava de uma comunidade politicamente dotada e ativa? Como? Era uma coisa muito heterogénea. A massificação trouxe ao ensino gente de muitas proveniências, com backgrounds muito diferenciados e isso foi bom. Muita gente iniciou a sua aprendizagem política na universidade. E continua a ser assim. Percebo isso na ESAD onde dou aulas, são lugares de grande transformação pessoal e coletiva. Em 1992, foi aprovada a Lei das Propinas que previa o aumento progressivo das mesmas. Qual a reação e, consequentemente, a ação dos estudantes na época? Aconteceram dois tipos de reações: uma que corria os partidos de esquerda, totalmente contra as propinas (isso incluía a JCP, o PSR e a JS), na qual nos enquadrávamos e que resultou em todas as grandes manifestações que conhecemos; e uma postura meio “nem nem”, de diálogo, da JSD, que estava preocupada com o equilíbrio entre “agarrar” a juventude e manter-se fiel ao partido do governo. De certa forma, pela sua intelectualidade e nível educativo, sente que os estudantes do Ensino Superior representavam uma voz que era, de facto, ouvida e considerada plausível? Na verdade, não. Estávamos no tempo da massificação do ensino. Os estudantes não eram considerados intelectuais e não éramos intelectuais consumados. Aparecíamos mais na televisão quando mostrávamos o rabo à ministra da educação (Manuela Ferreira Leite) do que quando fazíamos aquilo que achávamos que eram grandes declarações. Mas esses tempos foram fundamentais para o surgimento de uma nova elite política e de uma consolidação ideológica em vários pontos do espectro político.

uma entrevista de Francisco Mendes Barata NOVA EM FOLHA


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TOLERAR A INTOLERÂNCIA MICHELLE CALDEIRA

Uma amêndoa de chocolate que sobrou da Páscoa na boca, uma playlist do Spotify a tocar algo – é impossível dizer o quê perdendo-me como me perco na escrita considero justamente o que escrever. Faria sentido, creio, dado o aproximar do final do ano falar da minha experiência na FCSH como finalista, se é que termino este ano. Duvido seriamente, pois apesar de já estar no meu quinto ano numa licenciatura de três, as mesmas dificuldades e incapacidades assolamme, tal como me assolam ano após ano. O meu nome é Michelle Caldeira, estou no meu quinto ano da Universidade e passei de fazer 54 ou 48 ECTS nos meus primeiros anos a fazer uma ou duas cadeiras por ano. Preguiça, má vontade de estudar e falta de disciplina para aparecer nas aulas mesmo não tendo amigos que “assinem a presença” por mim? São tudo teorias que já me foram dadas, atiradas assim como insultos, tentando fazer-me sentir mal por não estar a conseguir realizar o curso universitário. A minha absurda média de entrada na universidade (19 valores como me gostam de lembrar!) uma prova de que “não és burra e, portanto, tens que o fazer”. Mas tais sentimentos de culpa não são novos. E, magoando quanto magoem não é como se estivessem inteiramente errados. “Sobredotada”, “uma génia”, “esperta”, foram todos adjetivos aplicados a mim, mesmo que numa versão masculina incorreta. Sempre conseguira ouvir a matéria uma vez e, três meses passados descarregá-la para uma folha de teste ou de exame e ter uma nota de 5. Pelo menos no secundário. Mas com cada ano que passa sinto menos capacidade de aparecer numa sala de aula e ficar simplesmente calada a ouvir, com cada ano sinto menos vontade de me levantar e ainda menos capacidade para lidar com os meus colegas. É complicado, sem dúvida, mas a cada ano perco a capacidade de simplesmente fingir conseguir. Tenho autismo, previamente aspergers, agora ASD, os nomes vão variando à medida que a comunidade médica melhor explora a questão (e com vinte e tal anos já vi grandes evoluções em como a questão é tratada) mas várias coisas se mantêm. A hipersensibilidade ao barulho, em que colegas a falarem e a trabalharem em grupo atrás de mim, ou o “zoom zoom” do projetor no topo da sala de aula são suficientes para me fazer morder o lábio e apertar os punhos, tentando não explodir. A recusa em olhar pessoas nos olhos e a

tendência a não começar uma história pelo ponto, mas dar uma volta e divagar antes de lá voltar. Tipo aluno de História, se me permitem a piada que colegas desse curso poderão achar engraçada, não é “O que aconteceu no dia do evento X” mas “Para melhor se compreender o evento X temos que primeiro olhar para tensões e politicas de 40 anos antes de X”. E, claro os “carrapitos nas pernas”, ou seja o não conseguir estar quieta, e à medida que a ansiedade e a sobre estimulação aumentam começar a abanar, esfregar, bater, gemer e uma outra variedade de maneiras de lidar. Adoro como tema de estudo e área académica os Estudos de Tradução e até demonstro um amor peculiar pela linguística, mesmo que discorde em grande parte com as posições de vários dos meus professores. Não é esse o problema; na verdade, vindo à faculdade posso garantir que acho as aulas interessantes e que me captam a atenção. Falar de Chomsky e do seu impacto linguístico, muito antes das suas contribuições políticas, discutir o impacto da tradução e a responsabilidade do tradutor ou olhar para uma obra e assumir as minhas próprias conclusões, são coisas que me dão grande prazer. São áreas que me capturam o interesse ao ponto de ter contribuído para jornais académicos da faculdade. O problema, é claro está, em levantar-me. Para chegar à universidade tenho que apanhar um autocarro ou o metro, dada a distância desta. Tenho sorte, suponho que a universidade me tenha arranjado acomodações mesmo com má vontade (um tema ao qual voltarei em breve), e que não tenha, como nos meus primeiros anos de faculdade de apanhar comboio ou barco e depois o metro para cá chegar. São viagens curtas ou mais curtas do que poderiam ser mas…de muitas maneiras são um inferno para mim. Barulho tão alto que nem a música nos fones com o som no telemóvel ao máximo se consegue ouvir, vibrações que se sentem nos dentes e tanta gente que o metro ou o autocarro mais se parece com uma lata de sardinhas e onde às vezes é difícil conseguir entrar sequer no meio de transporte porque já não há espaço em pé e as pessoas têm que se ajeitar e puxar são coisas que, como se pode imaginar não são ideais para alguém como eu. Chego ao Campo Pequeno exausta, como se tivesse corrido uma maratona, o coração a bater a mil, a respiração presa na garganta, quase a suar mesmo nos meses de Inverno. Isso já serviria como justificação para não NOVA EM FOLHA


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ir às aulas nos muitos dias em que não estou bem, mas não acaba aí. Por vezes sinto-me culpada quando me queixo da universidade, quando me queixo da FCSH e das suas politicas, seja em questões trans seja em questões de neurodivergência porque a verdade é, consigo ver que quase toda a gente com quem lido dentro da universidade está a tentar. Quando tinha estes “ataques de tiques” em que perturbava a aula com os meus sons ou movimentos no secundário era-me dito que na universidade isso não seria tolerado, que chamariam a ambulância imediatamente e que ninguém se iria dar ao trabalho de me “proteger”. Mas a verdade é que tenho notado um esforço tremendo da maior parte dos meus professores para me acomodar. Trabalhos de grupo em que posso apresentar a minha parte mais tarde apenas ao professor e não à turma, crises de gaguez ou momentos de não verbalidade em que uma paciência de santa é demonstrada e trocas de emails depois da aula quando eu saio a meio desta antes de “explodir” para garantir que estou bem e me entregar os slides da aula a que perdi. Se no secundário me pintavam a universidade como a vida real, em que ninguém iria lidar com os meus problemas e tinha que ser normal ou falhar noto que, em grande parte dos casos isso não é verdade. Não sendo burra (como me gostam de lembrar) sei perfeitamente que, quando em crise perturbo a aula de uma forma ou de outra. É difícil falar de temas de especialidade quando a aluna a menos de 3 metros na fila da frente está a fazer um “espetáculo”. Não posso negar que os esforços para me integrar e me ajudar apesar das minhas dificuldades têm sido ótimos mas, como em tudo no que toca a esta faculdade há o tentar e há o fazer. Assumir que o meu comportamento, ou a minha ausência são sinais de que estou intencionalmente a tentar causar problemas ou a não me aplicar são respostas que já obtive. Não é algo novo na minha vida, se estou a ser honesta. Custa, e magoa mas é algo a que estou habituada. Seria de uma arrogância extrema numa turma de 60 esperar que a professora se lembre de mim e que tenha em consideração as minhas dificuldades, claro. Exigir que um professor que ensina centenas de alunos por dia se lembre que “oh a Michelle tem dificuldade com barulho” é injusto mas, creio, é ainda mais injusto simplesmente notar eu não estar presente apenas para o mencionar na aula seguinte, quando peço ajuda com a matéria que perdi. De muitas formas, creio que a sociedade em geral simplesmente assumiu que pessoas como eu, com necessidades educativas especiais não continuaria os estudos pelo ensino superior. Sim, até ao décimo segundo ano as coisas são obrigatórias, mas porque continuariam

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alunos como eu a sua educação? Há, suponho a ideia de que alunos de NEE são maus na escola, têm dificuldades de aprendizagem, são, por falta de melhor maneira de o expor “incapazes de ter boas notas”. O facto do estatuto das necessidades educativas especiais só se expandir ao ensino superior nos últimos 5 ou 6 anos demonstra isso mesmo. É uma realidade com a qual estou familiarizada “porque precisas tu de apoio se estás a tirar boas notas?”. Portanto creio ser ignorância, não malicia o que condiciona estes comportamentos por parte de professores e serviços. Que grande parte esteja a tentar o seu melhor é claro, mas que as falhas sejam igualmente numerosas também o é. Podia listar dezenas, centenas de momentos em que as atitudes e respostas perante a minha neuro-divergência foram incorretas ou “problemáticas”. Momentos em que simplesmente usar uma bola de estresse “distrai” o professor e os meus colegas, ou os (muitos) momentos em que fui chamada de “porca” ou pior por ter dificuldade em manter uma rotina de higiene e um espaço limpo (tal como, aliás consta do meu processo dada indicação do meu psiquiatra). Podia estar aqui e queixar-me do João, da Joana, do Paulo e da Ana, nomes inventados que escondem comportamentos bastante reais mas, agora, pergunto, para quê? Não é meramente uma questão prática, em que ignoro emoções e me foco na lógica, mesmo que seja assim como o meu cérebro em grande parte processa as coisas. Não é por (provavelmente) estar aqui outro ano e não valer a pena hostilizar pessoas com poder sobre mim. Não, é uma questão de intuição e de certezas. Não é normalmente como eu funciono ou como eu faço as coisas. Sou aquela pessoa autística que incomoda toda a gente ao perguntar, vez e vez sem conta porquê? Que não aceita “sempre foi assim” ou “é porque é” como resposta e que obriga as pessoas a pensarem nas respostas. Tenho um sentido de empatia demasiado desenvolvido ao ponto de uma semana depois ainda pensar na pessoa a quem “roubei” o lugar sendo mais rápida nos meus passos no refeitório mesmo que esta se tenha sentado nem 30 segundos depois e uma necessidade de saber que significa que raramente simplesmente aceito as coisas sem prova ou justificação. “Acreditar” que estão a fazer o melhor possível dado o seu conhecimento é algo que, muito honestamente provavelmente não colaria comigo na maior parte das vezes. Como alguém que aprendeu o que era romance e amizade lendo sobre isso e como alguém que exige sempre recibos após uma compra para comprovar que foi feita sou alguém que necessita de provas. É portanto, tomem nota, assim tão óbvio. Sei que, tal como não sou a única pessoa trans na NOVA EM FOLHA


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universidade certamente que não sou a única pessoa no espetro na FCSH. Não só porque é algo que se “apanha” por assim dizer ao falar com colegas nas aulas mas também por razões meramente estatísticas. Embora números exatos sejam difíceis de descobrir, é fácil ver que dezenas, senão centenas de alunos como eu estarão na escola. E é por isso que esta “tolerância à intolerância” é tão magoante. Porque não sou só eu (e a minha psicóloga discorda com a ideia de que eu não importo) mas porque são vários os alunos, e são várias as pessoas afetadas por isto. Onde um aluno autista bom é um aluno autista invisível, onde é esperado que a melhor coisa que possas fazer é simplesmente ir às aulas, não causar ondas, fazer testes e sair da aula. Onde bater com os punhos no teu peito ou pontapetear a cadeira vazia mais próxima é ser “incomodativo”. Não nego, claro, que possa ser uma distração mas histórias que oiço, e momentos que experiencio em que a resposta do professor é veneno – implicações tão cortantes que mesmo alguém com autismo apanha o desagrado – magoam e, honestamente fazem-me sentir culpada e magoada. E parte disto é interesse próprio, não o nego. Porque já não consigo estar numa sala de aula hora e meia sem falar ou me mexer sem me forçar, ao ponto de doer, a ficar lá. Porque preciso de três ou quatro cafés a meio da tarde para ir a mais que duas aulas por dia. Mas mais que a minha experiência é esta a questão não é? Sim eu gemo, eu faço barulho, eu levanto-me e sim, eu falto semanas inteiras. Muitas vezes levanto-me tomo banho apanho o autocarro ou metro apenas para não conseguir chegar à universidade porque alguém apitou com impaciência ou uma mota passou de rasão e o barulho faz com que “desligue” mesmo estando já na Avenida de Berna a dois minutos a pé. Mas o que não ajuda é eu chegar a uma aula e ouvir “Decidiu juntar-se a nós hoje, foi?”, ou estar na residência apenas para receber um email a chatear-me porque me pediram a chave antes de sair e eu atirei-a para cima da mesa em vez de a entregar à mão da recepcionista a sorrir (contacto é muitas vezes outra coisa complicada para pessoas autísticas). Se o objetivo é inclusão, se o objetivo é integrar-nos tais comportamentos apenas dificultam a coisa. Porque já tive momentos em que chego à universidade às 10:02 e, sabendo que tenho aula às dez, simplesmente não vou, porque sei que se entrar depois de já toda a gente estar sentada vai haver um comentário. Porque já tive momentos em que hiper-fixo nalguma coisa, talvez escrever, talvez ler, talvez algo tão simples como garantir que os apontamentos que tirei na aula estão espaçados de forma regular (uma linha de intervalo entre pontos, margens não ultrapassadas) apenas para ser puxada para fora disso forçosamente.

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E claro, como disse muitos dos meus professores tentam. Sei até que alguns deles procuraram recursos para aprenderem a melhor lidar comigo. – É uma dedicação, uma paixão por ensinar que respeito e admiro. Uma paixão que gostaria de emular mesmo que não ao ensinar porque eu mais uma sala de alunos barulhentos não combina. Como finalista (mas provavelmente não), isto não é mais uma daquelas vezes em que escrevo e comento aos meus amigos e colegas “Pá, a NOVA está tão atrás”, porque acredito genuinamente que não é uma questão de conservadorismo, ou de quem trabalha na NOVA ser retrógrada. Isto é simplesmente um caso em que, não obstante as melhores das intenções acho que simplesmente se tem que fazer melhor. E sim, se calhar sou cobarde, porque aluna de 19 quando começa a stressar sobre não saber a matéria tal contribuiu para eu não aparecer, e no que toca a confrontação tendo a calar-me e a pedir desculpa. Se calhar sou ingénua, ou mesmo injusta no que exijo. Mas sei que podemos fazer melhor. 5 anos de aulas (e de novo, provavelmente mais um) ensinaram-me que a FCSH não tem medo de mudar. Sejam mudanças causadas por necessidade (as aulas online, a terrível internet, como nos adaptamos) ou por querer fazer melhor ou vontade coletiva (todas as mudanças que as associações de estudantes conseguiram trazer). A Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova é mais que a Playstation 4 na Associação de Estudantes onde levo uma abada no FIFA, a cantina dos ricos ou a “única faculdade com esplanada”, não, a FCSH é um local onde mudança e fazer o melhor por todos é não só aceite como aceite em êxtase. Podemos fazer melhor, e, se a FCSH me ensinou alguma coisa (para além de conceitos de linguística) é que sem dúvida que o faremos.

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QUANDO RASKÓLNIKOV ENCONTRA PUTIN PEDRO AFONSO PEDROSA DOS SANTOS 09/04/2022

(contém spoiler do livro Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski)

Fiódor Dostoiévski, escritor russo, nasceu e morreu no século XIX (1821-1881). Na sua altura, as convulsões revolucionárias de 1848 ameaçavam os poderes políticos na Europa. Como seria de esperar, os líderes políticos respondiam implacavelmente, recorrendo à violência. Assim, foi exilado na Sibéria, pelo czar Nicolau I, cerca de 10 anos, e esteve mesmo para ser executado. Apesar disso (ou por causa disso?), aquele que foi um dos principais vultos da História da Literatura, deixa-nos uma obra ímpar, de enorme valor cultural. Por isso mesmo, é com inegável surpresa que assistimos ao cancelamento precipitado de um curso de uma universidade de Milão [1], sobre Dostoiévski, no seguimento da invasão russa da Ucrânia. É claro que não podemos dissociar a cultura do povo e a maioria dos russos apoia a invasão [2]. No entanto, a cultura é parte do humano e quando estamos a falar de um dos principais vultos da História da Literatura Mundial, o cancelamento de um autor é, também, o cancelamento da Humanidade. De facto, isto é tanto mais verdade se tivermos em conta a questão da absurdidade dessa mesma acção, como se o autor que há 141 anos retornou ao pó fosse cúmplice do que se passa a Leste e comandasse as vontades de Putin. Em todo o caso, Dostoiévski deixou-nos um legado literário absolutamente virtuoso. De entre as suas obras mais aclamadas destaca-se o texto sobre o qual se debruça este meu artigo. Crime e Castigo veio a público ao longo do ano de 1866. Consta que foi sendo publicado, dividido em 12 partes, no jornal O Mensageiro Russo, após o exílio. Corresponde, portanto, ao período “maduro” do autor e tem influências claras da sua experiência (sofrimento) na Sibéria. Raskólnikov, o personagem principal, luta contra os imperativos da vida. De uma família pobre, a mãe é doente e a irmã vai casar-se por razões financeiras. Esse matrimónio de conveniência faz o nosso protagonista sofrer, pois não consegue compreender como a irmã pode renunciar à felicidade para dar condições de vida à família. Além disso, Raskólnikov é estudante de Direito, mas não consegue pagar os seus estudos. Desesperado, comete não um, mas dois crimes. Já com o plano traçado para matar e roubar a senhoria, nem tudo corre como previa e a irmã dela aparece no local. Forçado a assassinar à machadada a segunda mulher também, o roubo acontece de forma catastrófica e aleatória. Ródia [3] deixa para trás a maior parte da fortuna da velha senhoria, escondida num baú, levando apenas algum dinheiro e objectos de pouco valor. No final, acaba por fugir (por um triz) e esconde o que roubou. Ao longo da história, sabemos que Ródia não usufrui sequer daquilo que trouxe. No entanto, é forçado pela ordem emocional das coisas a entrar constantemente em estados febris e de delírio. Enfim, a certa altura, percebemos que o estudante de Direito escreveu um artigo para um jornal… Um pouco antes de chegarmos a metade da leitura, encontramos, contado pelos personagens, o argumento que aparentemente figuraria no semanário “Discurso Periódico”. Esse ponto de vista, avançado por Raskólnikov, captura em breves páginas a natureza essencial do decurso, e do devir, de um Mundo cuja História é escrita pelos seres humanos. Com efeito, Raskólnikov considera que existem dois tipos de seres humanos, natural e funcionalmente distintos. Por um lado, há os vulgares ou ordinários. A única função deste grupo, numericamente muito significativo, é a procriação, ou seja, a perpetuação da própria espécie. Constituem este primeiro grupo “o material”, ou seja, “pessoas conservadoras por natureza, correctas, que vivem na obediência e gostam de ser obedientes”. Esta classe inferior tem também a obrigação de ser obediente, pois é esse o seu destino. NOVA EM FOLHA


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O segundo espécime é o das pessoas invulgares ou extraordinárias. Os seres invulgares são os “que violam a lei, que são destruidores ou têm propensão para o serem, consoante as suas capacidades”. Estas pessoas são extremamente raras e é-lhes permitido serem criminosas pela sua própria natureza. Por um lado, como são promotores de uma qualquer ideia ou prática nova, vão necessariamente violar a lei velha. Aqui deixem-me introduzir uma citação que é particularmente esclarecedora. “[O]s legisladores e os inovadores da humanidade, começando pelos mais antigos e continuando com Licurgo, Sólon, Maomé, Napoleão, etc., eram criminosos, visto que, ao proporem uma nova lei, violavam por esse facto uma lei antiga, venerada religiosamente pela sociedade e herdada dos antepassados, e visto também que, evidentemente, não recuavam perante o sangue, caso esse sangue (às vezes inocente e derramado heroicamente em defesa da lei antiga) os pudesse ajudar. É mesmo notável o facto de a maioria desses inovadores e benfeitores da humanidade terem sido uns derramadores de sangue particularmente terríveis. Numa palavra, deduzo que todos os homens, e não só os grandes, que saem, um pouco que seja, dos limites normais, isto é, capazes de dizer algo um pouco mais novo, têm de ser, pela sua natureza, obrigatoriamente criminosos – mais ou menos criminosos, evidentemente. De outro modo, ser-lhes-á difícil sair dos limites, quando eles não podem aceitar ficar dentro dos limites, por força também da sua natureza, e, na minha opinião, eles têm mesmo a obrigação de não aceitar tais limites.”. Por outro lado, as consciências das pessoas extraordinárias são de um tipo diferente e não serão afectadas pela transposição dessas mesmas barreiras. “Os crimes destas pessoas, evidentemente, são relativos e muito variados; na maioria dos casos exigem de diferentes maneiras a destruição do presente em nome da ideia do melhor. Se um desses indivíduos precisar, para concretizar a sua ideia, de passar por cima de um cadáver, do sangue, então poderá, a meu ver, no seu íntimo e em consciência autorizar-se a si mesmo a fazê-lo – isso, aliás, depende da ideia e da envergadura da ideia, há que notá-lo.” Como são extraordinários e os ganhos que oferecem ao Mundo são de tão elevada dimensão, não só conseguem transpor todas as barreiras e obstáculos que se impõe no seu caminho, como também são louvados na dimensão dos seus feitos. A “elevada dimensão” não deverá ser interpretada num sentido moral, obviamente, mas tão só de magnitude; e quando escrevo “todas as barreiras”, quero dizer que, na prática, não há limites para a eventual crueldade dessas pessoas, se se aperceberem de que são invulgares e de que propõem algo novo, de uma dimensão notável. Portanto, “[a] primeira categoria é sempre senhora do presente, e a segunda é senhora do futuro. Os primeiros conservam o mundo e multiplicam-no numericamente; os segundos movimentam o mundo e levam-no até um objectivo. Ambas as categorias têm o direito absolutamente igual de existir. Numa palavra, na minha ideia todos têm direito igual, e – vive la guerre éternelle – até à Nova Jerusalém, como é evidente!”. A mundivisão apresentada é uma de natureza essencialmente conflitual. Vivemos numa guerra eterna (“guerre éternelle”) até voltarmos para junto de Deus, para a Nova Jerusalém. Essa oposição é marcada pela existência de duas classes, uma que reproduz o Mundo e outra que movimenta o Mundo, sendo que a segunda é necessariamente criminosa e derramará sangue, se necessário. Desta forma, não são as massas ordinárias que conduzem ao conflito, mas antes um número deveras limitado de seres invulgares. Os líderes políticos parecem pertencer a esta segunda categoria, uma vez que têm o poder de declarar a Guerra e de dispor das vidas das pessoas ordinárias. Historicamente, são incontáveis os anos que são passados em Guerra [4]: Roma viveu cerca de metade da sua existência em conflito; os EUA, desde 1776, estiveram 100 anos em combate; no último século, a Europa foi o epicentro de duas Guerras Mundiais. De facto, é das Guerras que surge a configuração dos países e, portanto, do Mundo. “Don’t you know the world is built with blood!”, dizia Socko [5]. Na mesma linha, Virgílio já havia escrito que “[o] mundo é como um carro à desfilada” [6]. Infelizmente, a Guerra comanda os destinos da Humanidade e dos seres humanos, colectiva e individualmente. O Mundo move-se com as Guerras. Daqui se depreende que o tempo e o aperfeiçoamento moral não andam necessariamente de mãos dadas. Frequentemente, esquecemo-nos disso mesmo. Por cá, apesar da Guerra Colonial (1961-1974), a população vai perdendo a memória do conflito. A nossa geração só conhecerá os seus episódios pelos livros ou pelos avós. Em Portugal, vivemos em Paz há 48 anos: sensivelmente ao mesmo tempo em que vivemos em Democracia. Para o bem e para o mal, o ser humano tem uma capacidade de adaptação tremenda. Assim, quando a Paz se torna regra, habituamo-nos a ela. Inversamente, se for a Guerra a realidade, a violência é o dia-a-dia. Ingenuamente, quando vivemos em Paz, tendemos a negligenciar o conflito. Desta feita, as teorias que melhor NOVA EM FOLHA


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enquadram e explicam o conflito nas Relações Internacionais (e que costumam cheirar a bolor) ficam esquecidas. Se vivêssemos num Mundo completamente uniformizado, com as mesmas concepções sociais, culturais, históricas, económicas, políticas, geopolíticas, geoestratégicas e de relações internacionais, isso não seria um problema. Na verdade, isso não acontece e, como tal, nem todos valorizam a democracia liberal nem a ordem internacional liberal. As preocupações com a segurança e sobrevivência dos Estados, a par do interesse nacional definido em termos de poder, são ideias realistas que, sempre que uma nova guerra surge, voltam a estar na vanguarda da explicação das Relações Internacionais. Ao mesmo tempo, com o advento da Guerra, os actores estatais e os próprios indivíduos dirigem os seus interesses e preferências no sentido da securitização: o Estado volta ao lugar de destaque e o indivíduo aceita ser protegido pelo mesmo. Desta feita, Finlândia e Suécia já se preparam para aderir à NATO, numa viragem histórica dos cidadãos no sentido da preferência pela adesão [7]. Do mesmo modo, a Alemanha reforçou o seu orçamento militar para “proteger a liberdade e a democracia” [8], uma decisão com um impacto geopolítico e geoestratégico tremendo. Na mesma linha, o anterior Ministro da Defesa português, João Gomes Cravinho, anunciava a hipótese bem próxima de um aumento do orçamento militar [9]. Certamente outras teorias terão enorme potencial explicativo. Todavia, enquanto nos debruçamos sobre elas, há um Mundo real que continua à desfilada: e esse segue os caminhos da única constante da História – a natureza humana. Quando falamos da invasão da Ucrânia, todos os caminhos vão dar ao indivíduo que lidera a Rússia. Vladimir Putin está no centro dos holofotes desde Fevereiro, após ter anunciado, pasme-se, uma “operação militar especial” na Ucrânia [10]. Recentemente, têm vindo a público os crimes de guerra cometidos em Bucha [11]. Em Mariupol, a situação não é menos dramática [12]. De facto, parece-me que Putin é um ser invulgar e as pessoas extraordinárias serão sempre criminosas. Seja quando atropelam uma lei antiga, seja quando violam a lei internacional. Cometerão crimes, com certeza, para levar avante as suas ideias novas. Putin, aparentemente, não está satisfeito com a ordem internacional: como tal, avançará implacavelmente, como todo o seu poder, sobre o sangue e os cadáveres. É claro que não sabemos as verdadeiras intenções do Kremlim, mas, pegando em Raskólnikov, o potencial destrutivo de Putin é do tamanho da envergadura das suas ideias: e não lhe interessa minimamente que, para o Mundo conhecer as suas ideias, seja necessário passar por um, dez ou cem cadáveres (ao dia de hoje, já são vários milhares… [3]). NOVA EM FOLHA


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Putin é um derramador de sangue particularmente terrível e, por força da natureza, não aceitará manter-se nos limites da ordem internacional actual. A questão é que enfrentamos três problemas que impossibilitam o julgamento dos crimes: o sistema internacional é anárquico, não havendo uma entidade superior aos Estados; a Rússia faz parte do Conselho de Segurança da ONU; a Rússia recusa a jurisdição do Tribunal Penal Internacional. Infelizmente, a realidade do Mundo é muito mais dura do que gostaríamos que fosse. Nada podemos esperar da justiça terrena. Assim, resta-nos a justiça divina. Desta forma, podemos ter a certeza de dois factos. Por um lado, Raskólnikov, uma pessoa vulgar (embora acreditasse ser extraordinário), conseguiu a misericórdia divina. Por isso, como Lázaro, terá direito à redenção e viverá na Nova Jerusalém. Por outro, o destino de Putin não poderia ser mais distinto: nunca passará no purgatório. Em consequência dessas acções e ideias novas de Putin e em sentido inverso, a classe inferior (dos vulgares e ordinários) ucraniana tem fins absolutamente desagradáveis [14]. Os homens adultos, dos 18 aos 60 anos, são obrigados a manter-se no país e, eventualmente, serão colocados nas fileiras para lutarem contra o invasor. As mulheres, as crianças e os idosos fogem como podem, refugiando-se noutras partes da Ucrânia ou fugindo para a Europa, nomeadamente os países fronteiriços que pertencem à NATO. Desta forma, temos os seres humanos vulgares e ordinários com as suas vidas destrutivamente reformuladas. Obedientes ao seu destino, morrem na (ou pela) sua pátria ou fogem dela – e nada há de humilhante nisso. As únicas constantes do Mundo são, por isso, a obediência aos nossos destinos e o sofrimento: aos vulgares, atinge-os em vida, mas têm possibilidade de redenção; aos invulgares, atinge-os após a morte, e não há lugar para a redenção. Continuando a seguir Crime e Castigo, apercebemo-nos da proximidade amorosa, talvez transcendental, de Raskólnikov e de Sónia, que aceita sofrer com o protagonista. Num dos diálogos entre os dois, Raskólnikov diz: “– Não é a ti que reverencio, mas todo o sofrimento humano.” Resta-nos, pois, reverenciar o sofrimento humano.

[1] [2] [3] [4]

https://www.publico.pt/2022/03/09/culturaipsilon/noticia/cancelamento-curso-dostoievski-causa-indignacao-italia 1998240 https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60859247 Nome carinhoso de Raskólnikov Holslag, Jonathan. 2018. A Political History of the World – Three Thousand Years of War and Peace. Londres: Penguin Books. // Holslag, Jonathan. 2019. Guerra e Paz – Uma História Política do Mundo. Alfragide: Dom Quixote, p.512-513 [5] https://www.netflix.com/title/81289483; https://www.youtube.com/watch?v=KiiebNenB0k [6] Holslag, Jonathan. 2018. A Political History of the World – Three Thousand Years of War and Peace. Londres: Penguin Books. // Holslag, Jonathan. 2019. Guerra e Paz – Uma História Política do Mundo. Alfragide: Dom Quixote, p.194 // Virgílio. Smith Palmer Bovie, trad. para inglês, 1956. Virgil’s Georgics: A Modern English Verse Translation. Chicago, IL: University of Chicago Press, p.102 [7] https://www.tsf.pt/mundo/finlandia-e-suecia-na-nato-eventual-adesao-pode-ser-bastante-rapida-14748129.html [8] https://eco.sapo.pt/2022/02/27/alemanha-reforca-orcamento-militar-para-proteger-liberdade-e-democracia/ [9] https://www.publico.pt/2022/03/10/politica/entrevista/gomes-cravinho-aumento-despesa-defesa-ja-proximo-programa governo-cimeira-nato-1998188 [10] https://24.sapo.pt/atualidade/artigos/putin-anuncia-operacao-militar-especial-na-ucrania-combates-entre-forcas ucranianas-e-russas-sao-uma-questao-de-tempo [11] https://pt.euronews.com/2022/04/05/imagens-confirmam-massacre-em-bucha [12] https://expresso.pt/guerra-na-ucrania/2022-04-06-Ao-minuto-Mais-de-cinco-mil-mortos-civis-em-Mariupol-40-das infraestruturas-sao-irrecuperaveis-1be18afe [13] Com o caos que ainda se vive em território ucraniano, é impossível fazer um balanço credível das vítimas. No entanto, sabe-se que, infelizmente, já há milhares de vítimas. [14] https://www.publico.pt/2022/02/28/mundo/video/fugir-criancas-salvar-vida-20220228-082954 NOVA EM FOLHA


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NA FRONTEIRA ENTRE REALISMO E IDEALISMO MANUEL PINTO

Confesso que sinto uma certa predisposição para abordagens pós-positivistas às ciências sociais. Não consigo, conscientemente, silenciar a individualidade humana e pautar as nossas ações pelas mesmas metodologias que analisam, estudam e relatam o comportamento de certos minerais num conjunto controlado de variáveis específicas. Se é verdade que nos humanos há minerais de toda a espécie, é igualmente verdade que os humanos são muito mais que a somatória dos diferentes elementos que nos compõem. Analisar, estudar e relatar o comportamento Humano nunca alcançará a totalidade do Ser e das suas relações se o estudarmos sem incluir a possibilidade dos mesmos estímulos originarem resultados divergentes.

sociais, onde a cientificidade não se encontra na operacionalização de parâmetros desajustados, a política é eficaz quando deixamos de operar apenas segundo parâmetros redondos (idealistas ou realistas) e passamos a atuar de acordo com os nossos anseios e ambições mas regrados por um realismo objetivo que nos faça compreender como os alcançar. 2022 veio, ao cair do pano da minha licenciatura, provar a utilidade e veracidade de posições práticas e operativas guiadas por ideais quiméricos.

O meu ponto não é o de rejeitar a “cientificidade” das ciências sociais, mas argumentar, antes, precisamente o contrário. Se as ciências sociais o querem realmente ser, devem saber lidar com as tímidas fronteiras entre o objetivo e o subjetivo e com a forma como as predisposições dos observadores influenciam o que é observado. Apesar desta visão estar em linha com os desenvolvimentos das ciências sociais das últimas décadas, penso que a particularidade da visão de quem pensa como eu reside no papel que reservamos a uma mundividência realista, que transforma tímidas fronteiras na força das ciências humanas e não na sua fraqueza.

Por um lado, no plano interno, com o resultado das eleições de 30 de janeiro. Do ponto de vista dos vencedores, estes alcançaram bons resultados pois souberam perseguir o seu ideal com tacticismo e paciência louváveis, mantendo a sua linha discursiva em questões relevantes para o eleitor comum, como a da “estabilidade governativa” no caso do PS, ou da “asfixia tributária” no caso da IL. Do ponto de vista dos perdedores, mantiveram os discursos em questões menos palpáveis ou até, contraditórias, como o BE que defendeu no mesmo programa eleitoral a eliminação das “regras do mercado interno comunitário (…)” e o reforço das “políticas de coesão” ou o PSD, cujo líder oscilou entre distribuir pastas ministeriais antes das eleições e pedir humildade ao incumbente durante a campanha.

Foi com este conjunto particular de crenças que ingressei na FCSH, onde compreendi a importância e necessidade de dosear a nossa ação política crítica com uma dose q.b. de realismo. Tal como as ciências

Por outro lado, no plano externo, o retorno da guerra à Europa. O Presidente Zelensky tem apelado, várias vezes, a uma maior entrega da comunidade internacional na causa ucraniana, especificamente NOVA EM FOLHA


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em termos de ajuda militar concreta. Se alguns veem neste apelo uma prova da conflitualidade inerente à natureza do seu poder, eu vejo a materialização prática daquela que tem sido uma das minhas causas. A da defesa da nossa ordem democrata, liberal e justa, apenas conseguida se, em última análise e recurso, tivermos um corpo capaz, disposto e motivado para o defender. “How are you going to defend yourself, if you’re so slow in supporting us in Ukraine” é uma frase que “bate perto de casa” a quem apoia uma maior uniformização das políticas externas e de defesa da União Europeia que me fez relembrar umas letras que escrevi neste mesmo jornal em fevereiro de 2021: "Em suma, a UE enquanto comunidade política composta por vários estadosmembros independentes, mas comprometidos na sua segurança comum, tem, em última análise, que ser capaz de se defender de ameaças externas e pressões de ordens iliberais". Para muita pena minha, esta constatação com mais de um ano feita muito antes da guerra não se deve a poderes videntes, mas à simples aplicação do seguinte método – perseguir cenários ideias a partir de análises realistas. Se o cenário ideal é o de, no mínimo, não regredir nas conquistas da UE, então em última análise a defesa dessas conquistas deve ser feita pela coesão na política externa e de defesa. A necessidade de prever situações que não se verificam no imediato é mais uma razão pela qual a eficácia da política reside na capacidade de analisar a veritá effetuale.

Regressamos por isso ao meu ponto de partida. Espero sinceramente que este seja o momento duma profunda reflexão na UE sobre como interpretamos a realidade social. Não há nenhuma fórmula milagrosa que racionalize, qual ciência exata, as nossas escolhas políticas ao ínfimo custo mas parece-me que as nossas políticas devem ser pautadas pelo ideal e assentes no real se têm alguma intenção de sensatez e calculismo. Isto passa, no plano externo, pela solidificação da coordenação das forças, equipamentos e políticas via Agência Europeia de Defesa. No plano interno, pela coesão entre propostas e discurso. Reforço, não se trata de abandonarmos os nossos ideais, mas de reconhecer as melhores maneiras de os alcançar. NOVA EM FOLHA


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Os Césares mudam, o Império continua VASCO MARTINS

Em tempos de guerra, incerteza e angústia, resta-nos esperar pelo desenrolar dos cenários e lutar pela Paz e pela solução política de um conflito com origens políticas. Nos entretantos – e reconhecendo a nossa por vezes esquecida, ou feita esquecer, capacidade de pensar o passado – podemos lembrar esse mesmo passado, não muito distante – não nos alongaremos mais para trás do que meados do século XX – e falar um pouco de um protagonista nesta peça em que se desenrola a vida, a política, a guerra e o mundo – os Estados Unidos da América. Por vezes, em tempos em que, com toda a razão, se manifesta repúdio pelas acções beligerantes de um Estado, tendemos a esquecer o que os outros fizeram – ou fazem – no mundo. Talvez seja tendência do ser humano, ter um limitado foco de atenção, mas para isso servem estes simples textos, para relembrar o que, manifestamente, não deve ser esquecido. Começaremos esta curta viagem pela Ásia, e aqui podemos aterrar na Coreia, esse país distante – suficientemente distante para ninguém querer muito saber do que lá se passou. Mas poderemos recordar que, durante a Guerra na Coreia, não foi a Rússia que despejou 32 mil toneladas de napalm sobre o seu território, não foi o Irão que matou 15% da população local, nem foi a Síria que fez explodir mais bombas em território coreano do que em todo o território do Pacífico durante a II Guerra Mundial – não sendo nenhum membro do eixo do mal, foram os imperadores do eixo do bem, os Estados Unidos. Já que estamos na Ásia, podemos por lá continuar, e lembrar o que ocorreu no Camboja – com a sua participação directa na Guerra Civil Cambojana, ou com o largar de meio milhão de toneladas de bombas sobre o território do país – ou, então, no Laos que, com o largar de mais de dois milhões de toneladas de bombas (mais do que todas as bombas largadas pelos Estados Unidos no teatro europeu da Segunda Guerra) destruindo um país e povo na sua luta pela conquista de um novo poder político popular e de uma verdadeira independência, livre do colonialismo, do neocolonialismo e do imperialismo.

Mas prolongando ainda mais esta paragem na Ásia, podemos lembrar o Vietnam que, reclamando um caminho próprio, independente e soberano face às garras do Império – seja ele francês, japonês ou estadunidense – se viu empurrado para uma guerra destruidora, com a participação activa, directa ou através dos seus aliados, dos Estados Unidos contra todo um povo que ousou erguer-se, escolher um outro caminho que não aquele traçado pelo centro do mundo para a sua periferia. Uma guerra que, tal como todas as outras guerras, fez real e concreta a grande necessidade dos povos do mundo – a Paz. Poderemos, agora, voltarmo-nos para a América Latina, essa gigantesca região que, depois de se libertar das garras do colonialismo espanhol e português, passou a ser lidada pelos Estados Unidos como aquilo que eles muito gostariam que ela fosse – o seu quintal. É difícil falar da América Latina sem referir, em primeiro lugar, Cuba. E atenção, aos mais distraídos, aqui não estaremos a julgar se gostamos muito ou gostamos pouco do sistema que este país – assim como todos os outros – escolheu para si. Com toda a honestidade, gostemos ou não do modelo que o povo cubano adoptou para si (inclusive referendado mais que uma vez), este foi e é o modelo do povo cubano, e aquela foi e é a revolução do povo cubano, e isso é inalterável. O que poderia ser alterado, sejamos francos, é a atitude que os Estados Unidos e todos os seus aliados assumem perante Cuba: talvez não devêssemos ousar invadir um outro país soberano (e falhar miseravelmente na batalha de Girón), nem devêssemos mobilizar todos os esforços para dizimar um povo com a fome e a falta de recursos através de um dos mais criminosos bloqueios, ao mesmo tempo que tentamos apresentar-nos nesse palco global em que se desenrola a história e política do mundo sob a máscara de paladinos da democracia e da liberdade (ah! essa democracia e essa liberdade que não se importa de destruir países alémfronteiras, nem se importa de apoiar os mais vis e teocráticos regimes, nem mesmo se importa de ter tido instituído, só falando em termos legais, um sistema de NOVA EM FOLHA


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segregação racial dentro os limites do seu território). Mas já que estamos na América Latina, porque não recordar a participação dos Estados Unidos no apoio ao golpe militar de 1964 no Brasil, contra o então Presidente João Goulart que, tendo uma governação meramente reformista no quadro do chamado trabalhismo, ousou afrontar, ainda que de forma leve e moderada, os interesses do império e das elites brasileiras suas aliadas. E já agora, porque não, também, recordar o apoio estadunidense aos grupos Contras, na Nicarágua, organizações paramilitares contra-revolucionárias que combateram ferozmente o governo sandinista instalado após uma dura revolução contra a ditadura dos Somoza. Ou ainda o apoio dado pelos Estados Unidos ao tão conhecido golpe de Pinochet contra o governo democraticamente eleito de Salvador Allende. E ainda, porque não poderia deixar de ser, as inúmeras tentativas de desestabilização, as sanções, os bloqueios orquestrados e dirigidos contra o povo venezuelano – outra vez repito, não falemos aqui se gostamos ou não dos governos de cada país, falemos sim das inúmeras tentativas, bem-sucedidas ou não, dos Estados Unidos promoverem ingerências, ataques e guerras. Ou, então, porque não referir também – e finalizaremos aqui, que se nos detivéssemos a falar de tudo quanto são os golpes e ataques do império a esta região, nunca mais daqui sairíamos – o apoio claro dado pelo governo estadunidense ao golpe de Estado perpetrado na Bolívia em 2019 (felizmente interrompido com a eleição de 2020). Como última região que aqui falaremos, poderemos ter como última paragem o chamado mundo árabe. E aqui, meus amigos, poderíamos referir o Iraque, como podemos referir a Síria, o Iraque, o apoio norte-americano à Arábia Saudita... Enfim, como o texto já está longo – tal como é longa acção dos Estados Unidos nesta região – fiquemo-nos pelo Afeganistão. Aqui podemos observar como, em pleno final do século XX, os Estados Unidos, como bons senhores imperiais que são, e numa tentativa bem-sucedida de depor o governo então existente, e em nome da boa e velha liberdade ocidental (essa curiosa liberdade mantida pela força das balas e da dominação), patrocinaram e armaram os grupos mujahideen, organizações paramilitares permeadas por sentimentos tão democráticos como é o fundamentalismo religioso, a promoção da guerra e a desestabilização da nação afegã. Andando, agora, uns anos à frente, podemos ver o resultado dessa acção: não só a desestabilização do Afeganistão, com a consequente tomada de poder pelos Talibã, como, também, a evolução destes grupos mujahideen para organizações terroristas conhecidas como a Al-Qaeda, com as acções por todos nós já conhecidas. Dizem-nos os britânicos the king is dead, long live the king. Quando falamos dos Estados Unidos, esta ideia

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também pode ser repetida, com dirigentes de partidos diferentes a assumirem e a saírem da presidência – os reis entram e os reis saem... – e, no entanto, as políticas mantêm-se – estas políticas de destruição, confronto e afronta ao mais basilar do direito internacional, da soberania dos povos e da Paz. Falando nós de um país cujos tentáculos de pólvora e golpes se estendem um pouco por todo o mundo, podemos até recordar César, esse perpétuo ditador de Roma que, sendo morto, apenas o foi para ser sucedido por Augusto como senhor de um dos mais reconhecidos impérios da história humana. Caso será para dizer que se sente no trono o César que se sentar – mais liberal, mais conservador, mais republicano, mais democrata... – este império continuou, este império continua e este império continuará. Mudem os senhores, e as suas políticas continuarão. Coloquem-se as máscaras de afáveis heróis ou de terríveis vilões, que a face que está por baixo – essa face que congrega interesses económicos, intervenções, ataques, bloqueios, sanções, ingerências, desrespeito, golpes de coturnos ou golpes de fato e gravata – continuará a mesma. Resta-nos recordar o passado mas, também, lutar hoje e no futuro por um mundo de respeito mútuo, diplomacia e, sobretudo, Paz.

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A INSURREIÇÃO DOS ESTUDANTES GUILHERME MACHADO

Observações sobre a Insurreição Muito debatida é a questão da guerra como arma revolucionária. Não que este tópico seja predominante em qualquer setor da esquerda institucional, que em Portugal vive um contexto político muito diferente daquele que marcou os tempos do PREC. Ninguém considera seriamente uma espécie de insurreição armada de espírito totalizante e alcance maximalista - é uma opção inviável, e as memórias de sublevação dos trabalhadores durante todo o Estado Novo, Ditadura Nacional e Primeira República ficam relegadas ao esquecimento em prol de uma narrativa de construção pacífica da democracia liberal. Mas esta questão não se debate em praça pública, e muito menos em espalhafatosos comícios de unidade ou conversas descontraídas numa faculdade. É subjacente à atuação política da esquerda, e manifesta-se nos momentos de reflexão interna de um marxista, que se apercebe, talvez de forma cínica, do autêntico combate desigual dos comunistas contra a sociedade capitalista. O que isto significa é que a guerra não abandonou a política. E também que a política nunca se alheou da guerra. O conceito de uma política assente na paz entre as classes, entre os interesses divergentes e os partidos é relativamente recente, pelo que é um pináculo ideológico do capitalismo de vigilância e do Estado de segurança que se recrudesce já desde a década de 90. O confronto físico - a ocupação de espaços de poder, de vida pública por corpos em revolta - foi lentamente (pelo menos no mundo Ocidental) erodida por um desequilíbrio cada vez maior de concentração de riqueza e de poder detido/utilizado pelas elites mundiais em prol do espetáculo da paz, da segurança e da harmonia do mundo liberal. As coisas nem sempre foram assim. A história humana está repleta desta inquietação social, que se produz em ciclos, ondas e reações que começam por abanar levemente o corpo social e político, culminando em momentos de êxtase e de completo abalo de toda a sociedade - o que poderíamos considerar uma revolução. A República Romana é um exemplo desta constante vibração do tecido social, subjacente à vida política e parte integrante da mesma. Era a “política de rua” na qual facções políticas ocupavam as ruas e os espaços da vida pública: estas pessoas não viviam a política, elas eram a política. O exemplo da República Romana dá-nos o vislumbre de um aspeto quase que essencial ao comportamento social: a insurreição constante que caracteriza tanto rebeliões locais como atos de resistência ao fascismo. Mas acima de tudo, conta-nos uma versão da história humana que temos sempre muito medo de ouvir: uma versão que primeiramente

deslocaliza a dimensão política para todos os aspetos quotidianos, familiares e religiosos, mas que também nos diz que raramente uma hierarquia e um centro de poder é perene e sagrado. Tudo pode ser derrubado. Eu gostaria de aplicar esta ideia à situação estudantil em Portugal. Reitero de novo como não estou a fazer apelos desesperados e ingénuos a uma revolução - pelo facto de que não creio nem nas hipóteses desta triunfar, nem na capacidade da mesma de mobilizar a sociedade no núcleo imperialista e no seio da OTAN nas condições de exploração e de vida política que perduram na sociedade ocidental. Mas a situação estudantil é interessante porque refere-se a um aspeto da vida comum e do quotidiano de uma grande parte da população jovem. Há muitas coisas que se podem fazer e alterar por completo - desde coisas simples como o fim da propina até aos assuntos verdadeiramente estruturais, como o assédio sexual na academia e a descolonização do currículo - com uma mobilização estudantil que consiga capturar para si as rédeas da condução do Ensino Superior em Portugal, ao lado dos professores, dos funcionários e de todos os que constituem o meio universitário. Neste sentido, a guerra é relevante pelo facto de que esta não tem de ser convencional nem funcionar de acordo com os parâmetros tradicionais. A guerra existe nos mais pequenos atos de desafio e irreverência, nos mais comuns momentos de recusa - de constatação de que o poder não é sagrado. Assim, podemos de facto, “declarar guerra” ao sistema de educação e ao Estado português. E para isso servirnos deste ímpeto de revolta que nos define e pela primeira vez em muitos anos, não cumprir as regras. Não aceitar a disciplina das instituições e recusar participar no espetáculo da educação. Não apenas precisamos de ocupar os espaços políticos da vida universitária, como precisamos de construir as nossas próprias experiências renovadas de dirigir o ensino e organizar o acesso e a relação dos estudantes com o sistema de ensino. Vivemos numa sociedade que nos tirou o prazer e a necessidade de viver o político na rua, entre as pessoas, e inserido num corpo social que se contrai. A política ficou relegada para os corredores espaçosos e os gabinetes no Terreiro do Paço - para nós, a política é o amigo que está na jotinha, aquelas horas entediantes do telejornal e os vídeos do Parlamento que tanto exaltam os espíritos. Em França, os estudantes ocuparam as faculdades e as escolas secundárias porque a vida política da sua sociedade está a fragmentar-se à frente dos seus olhos, e nada mais podem estes jovens fazer sem ser observar e esperar pelo melhor. Em Portugal acho que falta aprendermos com estes exemplos de uma determinada resistência imediata e imanente à vida social, para conseguirmos replicar as nossas próprias experiências de ocupação e de desafio à autoridade. No caos do estado a que chegámos, a desobediência civil como arma de negociação, de reivindicação e de pressão face ao sistema de educação e de Ensino Superior é fundamental e necessária como meio estratégico do movimento estudantil - é necessário encontrar a guerra no seio do político. NOVA EM FOLHA


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A PEGADA ECOLÓGICA CENSURADA FRANCISCO MENDES BARATA

A degradação ambiental está em processo de agravamento e de intensificação constante na atualidade, o que torna a irreversibilidade das suas consequências uma possibilidade cada vez mais próxima. Em face de uma pesquisa sobre o assunto supra referido, deparei-me com um relatório publicado pela Organização das Nações Unidas onde alegava que a pecuária produz mais gases com efeito de estufa que todo o setor de transportes combinado. Eu questionei-me como seria possível ser a primeira vez que ouvia falar sobre isto, uma vez que desde há uns anos para cá, a temática do aquecimento global, do buraco de ozono e da poluição era algo bastante presente. A questão que surgiu de imediato foi a seguinte: porque é que a maior causadora desta degradação não é mencionada pelas grandes organizações não-governamentais que lutam contra as alterações climáticas, ou até, porque não tenta ser combatida? A climatologia indica que o nível de segurança mais elevado de emissão é cerca de 350 partes por milhão de dióxido de carbono e gases com efeito de estufa na atmosfera, e neste momento, o nosso planeta já ultrapassou as 400, sendo que, o dióxido de carbono já presente na atmosfera está a guiar o mundo para a próxima grande extinção . A situação atual é conhecida pela maioria, contudo, é-nos dito para termos atenção à utilização de plástico de uso único, para trocar os sacos de plástico por outros feitos de papel, para não deitar lixo para o chão - práticas que no fundo, são regras de bom senso cívico, mas… Porque haveria a maior pegada ser ocultada desta realidade? E quanto mais a fundo eu pesquisava sobre isto, mais chocante se tornava. A indústria agrária intensiva produz uma quantidade substancial de gás metano que é oitenta e seis vezes mais destrutivo que o dióxido de carbono produzido pelos restantes agentes de poluição. É ainda a maior causadora do consumo de recursos naturais e de desgaste ambiental, sendo responsável por 30% do consumo de água mundial, por 91% da destruição da Amazónia, de habitat natural e extinção de espécies, e ocupa mais de 45% da superfície da Terra. Ao navegar pela internet e pelos websites de organizações ambientais, não havia nenhum incentivo para a diminuição do consumo de carne ou até mesmo informação sobre o peso que esta indústria tem no ambiente, porquê? Foi-me recomendado o documentário “Cowspiracy – O Segredo da Sustentabilidade” de Kip Andersen e Keegan Kuhn, que no fundo, são ativistas que procuraram resposta à mesma questão. A ocultação desta realidade justifica-se, então, por ser socialmente considerado um ataque direto ao prazer humano que comer carne representa na sua dieta. A questão é que a sociedade não pode ser egocêntrica ao ponto de não abdicar de um prazer em nome da saúde ambiental. Eu fiz a conta para realizar um pequeno exercício mental, a produção de um bife de 450 gramas utiliza 9460 litros de água que é o equivalente a um banho por dia durante cinco meses e meio. Se a escolha fosse obrigatória face à seguinte questão: comer um bife de 450 gramas ou tomar banho durante os próximos cinco meses e meio? Eu acredito genuinamente que fosse abdicado o prazer de comer aquele bife. É claro que num cenário ideal, porém, utópico, a solução seria a população se tornar vegan, contudo, está perfeitamente ao nosso alcance reduzir o consumo de produtos de origem animal. É necessário agir em benefício ecológico como criar o hábito de reciclar, reduzir e substituir alguns produtos na nossa dieta e, até na esfera política, aumentar as áreas protegidas, terrestres e AMP, proteger património ambiental e reservas naturais e criar ações de consciencialização coletiva no que é referente a este assunto. NOVA EM FOLHA



CULTURA

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EUROPA, OXALÁ MARGARIDA HONÓRIO

A exposição “Europa, Oxalá”, que reúne um conjunto diversificado de obras de artistas contemporâneos afrodescendentes residentes na Europa, estará quase seis meses no edifício sede do Museu Calouste Gulbenkian. Abriu portas a 4 de maio e pode ser visitada até 22 de agosto de 2022. A curadoria foi feita por António Pinto Ribeiro, Katia Kameli e Aimé Mpane. Dos três curadores, apenas um (António Pinto Ribeiro) não figura na exposição como artista. Esta exposição une numa só sala do Museu Calouste Gulbenkian, que se desdobra em diferentes espaços articulados, fragmentos do passado, presente e futuro da Europa, continente geográfico a que Portugal pertence. A narrativa desenvolve-se precisamente sobre a construção desse sentimento de pertença (ou- identidade-), e sobre o significado da geografia não só física como sócio-cultural deste continente. Neste sentido, muitos artistas trabalham profundamente nesta exposição a memória, individual e coletiva, como base para a construção consciente e ativa de uma história de forma responsável e inclusiva. As obras de 21 artistasprodutores europeus descendentes de países das antigas colónias em África dão o espaço e voz necessários a estes cidadãos num contexto pós-colonial em que tentamos repensar a geografia europeia e reconstruí-la juntos, de forma a podermos pensar numa cultura plural capaz de construir uma sociedade sã através de uma ecologia pessoal que cura feridas. A renovação que encontramos nesta exposição, própria do processo transacional, está presente em muitas das obras como um conceito ecológico, de renovação interior. Mónica de Miranda, em “Tales of Lisbon” mostra-nos várias fotografias de objetos que, através das marcas do seu uso e destruição, contam as histórias das famílias afrodescendentes que foram desalojadas de casas na periferia de Lisboa. Na obra de Nu Barreto, “Traços Diário 3” (2020), vemos a própria palavra “recycler” num dos desenhos expostos. Os materiais utilizados parecem também reutilizados. O vulcão que explode ou a água do mar que corre no vídeo de Josèfa Ntjam lembram-nos de processos regenerativos naturais da própria Terra que habitamos. Ainda numa lógica de reutilização ou reciclagem de materiais e também ligado a uma vertente da ecologia mais conectada com a própria Natureza, a instalação de Sammy Baloji expõe uma prática popular na bélgica, de usar antigos obuses usados na guerra como vasos de flores para albergar plantas tropicais que se tornam descontextualizadas quando instaladas nestes ambientes domésticos burgueses. Ao mesmo tempo, este processo de reforma interior trabalha intimamente com a memória, individual e coletiva, conceito chave da exposição. Nas obras mencionadas, o conceito de diário mostra esse registo temporal, tal como o trabalho que se assemelha com uma inventariação de Mónica de Miranda. A gota de água, que parece uma lágrima no vídeo de Josèfa Ntjam, junta-se ao oceano da memória coletiva e a memória de um evento marcante como a guerra viaja nos vasos de Sammy Baloji. NOVA EM FOLHA


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CULTURA

Os materiais utilizados pelos artistas contêm também esse memento. Délio Jasse serve-se de processos analógicos de revelação de fotografias para deixar marcas de adesivos na sua revelação. Utiliza por vezes a folha de ouro na impressão, permanecendo esse vestígio como pista que remonta à sua cidade natal de Luanda. John K. Cobra, através das suas esculturas e vídeo, traz a memória embebida nos materiais que utiliza para a representação das suas personagens. A borracha, o cobre, o ferro e o latão estabelecem relações entre os continentes africano e europeu. Também com a intenção de refletir sobre a nossa memória coletiva, Aimé Mpane desafia uma perspetiva eurocêntrica na construção daquilo a que chamamos História em Table de Fraternité (2020), neste caso a História da Arte. Malala Andrialavidrazana lança o mesmo desafio através da cartografia em "Figures 1883, Reference Map for Business Men", "Figures 11856", "Leading Races of Man" e "Figures 1876, Planisphère élémentaire". Outra forma de representação de memória coletiva presente no espaço público são as esculturas que muitas vezes tomam o nome de memoriais. Katia Kameli mostra-nos a intervenção do artista M’hamed Issiakhem sobre o antigo memorial de guerra "Le Grand Paris" de Paul Landowski, através de um registo fotográfico com um elemento tridimensional, um desdobrável, expondo também as várias camadas de significação atribuídas a este monumento que, tendo já sido concebido por um escultor, foi também interpretado por estes artistas. Esta concentração na memória dos espaços constrói também uma ponte com as transformações urbanas (-do domínio coletivo-) e como estas afetam quem habita estes espaços (-domínio pessoal-), dando grande destaque à sua fragilidade. A escultura de Carlos Bunga (2004) que articula planos construídos com papelão através de fita de embalagem denuncia estruturas frágeis do meio urbano. Esta fragilidade é depois refletida nas pessoas que habitam estes espaços, como nos retratados da série "Afro Descendentes" de Pauliana Valente Pimentel. É de destacar a pluralidade de suportes e linguagens, tal como alguns meios técnicos utilizados que, pela atualidade da própria ferramenta de trabalho, ganham uma expressão inequivocamente ligada ao sujeito contemporâneo. O vídeo "Khtobtogone" (2021), de Sara Sadik, é um bom exemplo desta marca. Nesta obra, a artista mostra grande capacidade de controlo de um sofware que traduz uma linguagem pertencente a uma geração que cresceu com a Internet e com acesso a vários mundos virtuais. Esta exposição não só nos traz essa vertente de uma geração familiarizada com o mundo digital como também afirma a inexistência de linguagens obsoletas para estes artistas, como podemos ver no uso de técnicas com mais história, como desenho de expressão hiper realista (como nos traz Pedro H. Paixão) ou na pintura (como nos traz Francisco Vidal). Em 2022, fazem sessenta e cinco anos desde que o Tratado de Roma instituiu a Comunidade Económica Europeia. Desta instituição surgiu a União Europeia, que tem vindo, desde aí, a crescer no número de países aderentes. Será que esta construção política e económica ajuda a definir o que é a Europa, ou será que o espírito europeu se encontra muito para além dos valores e regras que regulam os estados-membros desta instituição ou até mesmo dos países que integram o continente europeu? A Europa está a renovar-se ou lutar para manter uma estrutura de poder político e económico que pode evoluir para um novo tipo de colonização, dentro do próprio continente? Numa altura em que várias minorias com vasta representação no continente europeu começam a ganhar consciência da sua herança cultural e a construir uma memória da sua história, este tema não podia ser mais pertinente. Nesta exposição somos presenteados com a obra de artistas que nos mostram como sentem em si os valores europeus, mesmo que tenham não só as suas raízes familiares fora da Europa mas precisamente em países das excolónias europeias, onde a estrutura de poder político e económico deste continente criou destruição e perda numa relação agressiva de invasão. A ecologia interior a que os artistas se sujeitam ao criar sobre este tema que os toca pessoalmente pode transitar para o nosso corpo se mantivermos esta exposição na memória. NOVA EM FOLHA


AGENDA CULTURAL: MAIO

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Ana Catarina Tiago & Mafalda Carvalhal

OS FILHOS Teatro Aberto texto: Lucy Kirkwood encenação: Álvaro Correia 20 abril a 4 junho Quarta e Quinta às 19h Sexta e Sábado às 21:30h Domingo às 16h Escrita por Lucy Kirkwood, a peça Os Filhos segue a vida de Hazel e Robin, um casal de físicos nucleares reformados. Após um acidente na central nuclear que contaminou a área circundante com radioatividade, o casal recebe uma vista inesperada de uma antiga colega, Rose, que lhes propõe um regresso ao trabalho para repararem os danos causados. Esta peça não nos fala apenas de energia nuclear, mas sobre o preço que podemos pagar no futuro por degradarmos o presente, incidindo também questões relevantes sobre responsabilidade social e a forma como ter ou não ter filhos poderá ter implicações sobre a nossa perceção da mesma.

Teatro FESTIVAL PANOS Teatro D. Maria II - Sala Estúdio e Sala Garrett 13 a 15 maio Sexta a Domingo às 19h e 21h30 PANOS é um projeto que encomenda, anualmente, peças originais a escritores reconhecidos, para serem representadas por jovens, cruzando o teatro escolar e juvenil com as novas dramaturgias. Nesta edição, conta com textos originais de Afonso Cruz - As cigarras septendecim e tredecim -, Keli Freitas - Fábrica de matar baleia - e Joanna Murray-Smith, com tradução de Joana Frazão - Rio Sombrio. Apenas 6 das mais de 45 encenações terão a oportunidade subir ao palco do Teatro Nacional Dona Maria II, na sala Garrett e sala Estúdio, durante o Festival PANOS.

FIMFA LX22 – FESTIVAL INTERNACIONAL DE MARIONETAS E FORMAS ANIMADAS CAMa - Centro de Artes da Marioneta - Salas Luis Miguel Cintra, Bernardo Sassetti e Mário Viegas 13 e 14 maio 17 e 18 maio WORK QUELQUE CHOSE S’ATTENDRIT Claudio Stellato (Itália-Bélgica) Renaud Herbin (França) 14 maio 20 e 21 maio LE PRÉSENT C’EST L’ACCIDENT EARTHBOUND (AKA THE CAMILLE STORIES) Jean-Pierre Larroche – Les Ateliers Du Marta Cuscunà (Itália) Spetacle (França) 21 e 22 maio 15 maio SIMPLE MACHINES MASTERCLASS DE CLAUDIO STELLATO Ugo Dehaes – Kwaad Blod (Bélgica) A 22.ª edição do FIMFA decorre neste mês de maio! Para quem não conhece, o FIMFA é um projeto artístico de dimensão internacional que pretende promover e divulgar o universo das formas animadas. É um dos mais importantes pontos de encontro do teatro de marionetas contemporâneo, onde se apresentam espetáculos para todas as idades, que revelam tanto técnicas ancestrais como linguagens inovadoras, estabelecendo ligações entre a marioneta e outras áreas artísticas, como a dança, vídeo, circo e teatro. NOVA EM FOLHA


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Cinema CICLO DOUBLE BILLS Cinemateca - Sala M. Félix Ribeiro 14 maio às 15h30 Smithereens de Susan Seidelman Privilege de Peter Watkins 21 maio às 15h30 Le Trésor des Îles Chiennes de F. J. Ossang Liquid Sky de Slava Tsukerman 28 maio às 15h30 Decoder de Muscha Tetsuo: O Homem de Ferro de Shinya Tsukamoto

Em maio, as sessões mensais da rubrica “Double Bill” (uma sessão, dois filmes, um bilhete único) são dedicadas às relações entre o cinema de culto com a cultura musical underground da segunda metade do século XX. A 14, 21 e 28 de maio não percas filmes como Smithereens, um dos mais icónicos filmes no wave, e Liquid Sky, um filme de Slava Tsukermanque mistura aspetos das subculturas underground e do punk.

Diversos FESTIVAL TEMPS D’IMAGES vários locais 27 e 28 maio às 20h15 5 a 12 maio Parque do Vale do Silêncio Appleton Mas onde está a espada? De Gelo - Diamante em Bruto de Isadora Alves de João Bento 3 e 4 junho às 19h30 e 5 junho às 17h 19 a 22 maio às 21h Teatro do Bairro Alto Teatro Meridional Para Acabar com o Julgamento de deus Documentário de Jenna Thiam, Catarina Rôlo Salgueiro e Surma de Silly Season 16 a 18 junho às 21h e 19 junho às 16h 26 e 27 maio às 21h CAL Primeiros Sintomas Black Box (CCB) Anima Ciclone de Pedro Batista de Leonor Cabral O festival Temps D’Image é um festival multi-disciplinar que apresenta peças de teatro, performances, diversos espectáculos, instalações, exposições e filmes em vários locais de Lisboa. Nesta 20.ª edição, regressa “com obras que explicam o cruzamento entre a arte ao vivo e a imagem”. NOVA EM FOLHA


OS MODOS DOS MUNDOS Crystal Pite, Teatro Praga, Marlene Monteiro Freitas, Miguel Loureiro, Hermeto Pascoal, Virgínia Rodrigues entre muitos outros

Os próximos meses no CCB marcam a plenitude da retoma da atividade cultural, agora que a pandemia parece ter, finalmente, dado tréguas. A programação continua seguir o mote Mundos, criado para a temporada 2021/2022, aberta às diferentes formas de entender o mundo. A programação de abril a junho é marcada por uma continuada aposta na dança e na apresentação de obras de grandes coreógrafos contemporâneos no Grande Auditório. É o caso de Revisor (29 e 30 abril), criação da canadiana Crystal Pite com o dramaturgo Jonathon Young e a companhia Kidd Pivot, um híbrido de dança e teatro que foi descrito pelo jornal The Guardian como «fascinante, tanto pela articulação inventiva dos corpos individuais quanto pela dinâmica afinada do elenco». O alemão Moritz Ostruschnjak regressa ao CCB com YESTER:NOW (8 e 9 abril), que aborda temáticas como a propaganda e a violência a partir da ubiquidade da cultura pop. Já a grega Kat Válastur apresenta Eye, Lash! (20 e 21 maio), no qual a coreógrafa e performer irá encarnar vários arquétipos e personas femininas.


Neste trimestre, retomamos ainda o ciclo HOTSPOT: Solos Internacionais de Dança com espetáculos de dois ícones da dança contemporânea atual que têm influenciado de uma forma marcante a paisagem da dança internacional na última década – Jefta van Dinther com On Earth I’m Done: Mountains (24 e 25 junho) e Marlene Monteiro Freitas com Guintche (25 e 26 de junho). No teatro, há uma nova criação de Miguel Loureiro – BOOM! (8, 9 e 10 abril) – versão integral da peça The Milk Train Doesn’t Stop Here Anymore, de Tennessee Williams. Um espetáculo sobre a redenção, o erotismo, o misticismo, a doença e o fim dos caminhos. Há ainda uma grande aposta na nova obra do Teatro Praga, em parceria com a Orquestra Sinfónica Metropolitana – A Sagração da Primavera (17 e 18 de junho). Entendendo-se esta obra como um marco na história das artes performativas, e tendo em conta o seu peso simbólico, A Sagração da Primavera do Teatro Praga segue a vontade de trazer história para o palco e entender como ela reverbera na contemporaneidade. Na música erudita, mantêm-se as parcerias com a Metropolitana e o Teatro Nacional de São Carlos, que trazem diferentes mundos culturais para o palco do CCB. Na Páscoa, a Orquestra Metropolitana de Lisboa apresenta o Concerto da Paixão (14 abril). A representação do sofrimento de Cristo na Cruz é assumida neste concerto por três compositores temporalmente distantes entre si: Joseph Haydn (1732-1809), Johannes Brahms (1833-1897) e Frank Martin (1890-1974). Iremos ainda ouvir uma das mais amadas obras de Brahms – Um Requiem Alemão (24 abril) – pelo Coro do Teatro Nacional de São Carlos e pela Orquestra Sinfónica Portuguesa (OSP). A OSP irá ainda dedicar todo um concerto à obra de Luís de Freitas Branco (8 maio). A música de câmara terá um especial destaque com recitais de Raquel Cravino e Cristiano Holtz (1 abril); Ensemble Pulcinella (3 abril); Folefest Ensemble (22 abril); Ophélie Gaillard e o Quarteto Tejo (29 abril); Jill Lawson (6 maio); Marta Menezes (13 maio); Tatiana Samouil e Frank Braley (15 maio). Mantemos a parceria com o Museu do Fado, através do ciclo Há Fado no Cais, com concertos dos fadistas Jonas (22 abril), Gisela João (13 maio) e Vânia Duarte (9 junho). Todos estes concertos realizam-se não só presencialmente como serão transmitidos na plataforma da BOL, numa continuada aposta no mundo digital. Continuamos com o ciclo de conferências Políticas da Estética: O Futuro do Sensível, que traz ao CCB alguns dos mais marcantes pensadores contemporâneos, conectando a estética, a política e a reflexão ecológica, neste trimestre com palestras de Sandra Laugier (21 abril), Catherine Larrère (12 maio), Alain Caillé (26 maio) e Jean-Marie Schaeffer (23 junho). Entre abril e maio propomos ainda o ciclo de conferências Visualidades Negras, durante o qual se irá pensar sobre as questões de representação numa ótica de descolonização. Com a participação da antropóloga brasileira Heloisa Pires Lima (6 abril), do cineasta norte-americano Billy Woodberry (13 abril), da professora norte-americana Deborah Willis (27 abril), do curador canadiano Kenneth Montague (4 maio) e da professora norte-americana Ruth Wilson Gilmore (18 maio). A Garagem Sul vai manter um programa de exposições intenso. Sound it. Rádio Antecâmara, com curadoria de Alessia Allegri e Pedro Campos Costa e instalação sonora de João Galante, abre novas perspetivas sobre o ambiente construído, questionando e expandindo o seu sentido. É por meio de diálogos entre arquitetos, artistas, designers, e nas conversas com poetas ou paisagistas, entre os interlúdios feitos de sons e de música, que a Rádio Antecâmara observa mais de perto a nossa contemporaneidade. Já a exposição Os Novos Novos, com curadoria de André Tavares, destaca o trabalho de cinco ateliers de arquitetos portugueses — rar.studio, fala, Diogo Aguiar Studio, Ponto Atelier, Barão-Hutter — que constroem um retrato das preocupações, objetivos e processos de trabalho de hoje, naturalmente diferentes de outros arquitetos e arquiteturas que precederam o nosso tempo.


A atenção à infância na Fábrica das Artes será uma constante, com a apresentação de espetáculos internacionais – Loo (28, 29 e 30 abril) da companhia catalã Ponten Pie e 9 (3, 4 e 5 junho) da companhia canadiana Cas Public e do teatro belga Kopergietery –, mas também com o encerramento do ciclo Sete / Novos Criadores das Infâncias e ainda a estreia de um novo espetáculo de Margarida Mestre e Rui Ferreira, Balada das vinte meninas friorentas, que parte de um poema com o mesmo nome de Matilde Rosa Araújo. E, cereja no topo do bolo, destaque para a presença da música brasileira com o extraordinário Hermeto Pascoal e o seu Grupo (3 junho) e a figura singular que é Virgínia Rodrigues (14 maio), esta última integrada na continuação da Carta Branca a Jonathan Uliel Saldanha. Portanto, presenças muito fortes nas áreas da música, do teatro, da dança, do pensamento e da reflexão, da arquitetura e da bolsa criativa para a infância.


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RECEITA

ARROZ XAU XAU (com tofu) M a d a l e n a

C r a v e i r o

INGREDIENTES 1 Cebola 1 Alho Arroz Azeite 1 Pimento 1 Cenoura Ervilhas 1/2 courgette molho de soja 1 colher de chá de curcuma 1 folha de louro 2 ovos

PREPARAÇÃO 1. Picar a cebola e refogar com azeite.

COM TUFU SABE MELHOR!

2. Adicionar o arroz e deixar fritar até alourar. 3. Juntar ao arroz os legumes e deitar duas canecas de água (ou mais, dependendo da quantidade de arroz). Adicionar sal e deixar ferver. 4. Pôr em lume brando e aguardar que o arroz coza. 5. Numa frigideira deitar um fio de azeite, uma folha de louro e um dente de alho. Quando aquecida, deitar o arroz e deixar fritar em lume médio. 6. Afastar o arroz para as bordas da frigideira de modo a criar um pequeno buraco onde se vão adicionando os ovos devagar, de modo a ficarem mexidos e envolvidos no arroz. 7. Finalizar com a colher de chá de curcuma e molho de soja a gosto. NOVA EM FOLHA


Para passares o tempo...

Vertical

1. Caberá a ... & Blanco defender o título dos Måneskin para Itália. 2. Sentes que a Eurovisão é o teu ... Pleasure? Vota em Mia Dimšić, da Croácia! 3. A música espanhola SloMo tem alta probabilidade de ficar em nº 5, pois é interpretada por ... 5. Os noruegueses ... trazem uma exigência muito específica ao festival: Give That Wolf A Banana.

Horizontal

4. Os Citi Zēni, da Letónia, vão diretos ao assunto no seu tema Eat Your Salad: “ Instead of meat, I eat ...” 6. A música do Chipre, interpretada por Andromache, tem como título uma complicadíssima palavra em português ;) 7. Julgaram-te por gostares da Eurovisão? Faz como a Emma Muscat, representante de ..., e canta de volta: I Am What I Am!

Está aí a Eurovisão! Já conheces as músicas (e as letras) que vão a concurso nesta edição?


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