CLASSE #3

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Lirinha – Para nós o Cordel é sinônimo de história “A História do Fogo Encantado”, isso porque literatura de cordel é herança escrita. Nenhum poeta dizia “faço cordel”, dizia “faço folheto, romance, poesia”, e aí pendurava em cordões. Hoje eles até falam assim, mas muito por conta de um olhar intelectual pejorativo lançado sobre a poesia que faziam, e incorporaram esse nome. Mas usamos também para dizer que expomos nossa poesia e música nesse grande cordão que é o

Cena do show do Cordel do Fogo Encantado

mundo. O fogo é o elemento que mais representa o que somos e onde existimos, ao mesmo tempo é nosso lugar de origem, mas mutável. O encantado vem da visão apocalíptica de nossa poesia. Classe- No meio de tudo isso você ainda veio escrevendo seu livro? Lirinha – É, escrevo esse tempo inteiro.

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Estou com 32, escrevo o “Mercadorias e Futuro” desde os 25. Fiquei um pouco confuso quando fui publicar o livro porque eu não acredito no “ multiartista”. Eu acho que terminamos não aprofundando em nada. Fiquei receoso de ser mais uma coisa para fazer e sem fundo. Mas algumas pessoas me acalmaram dizendo que a palavra é algo que faço desde criança, ela foi, inclusive, meu primeiro material de trabalho. E o próprio nome do grupo “Cordel”, já marca nossa ligação com a literatura. No livro eu estava apenas registrando essa palavra, essa memória. Então percebi que estava retornando e registrando algo que é muito vivo. Classe – E o livro virou um monólogo. Esse círculo híbrido continua girando... Lirinha – No “Mercadorias e futuro” aparece o ator, mas é algo muito semelhante no que faço no Cordel. No espetáculo também vivencio teatro, poesia e música. Não me distanciei e nem inventei novas formas de dizer as coisas que acho. Há muito tempo estou fazendo um trabalho no limite do teatro, poesia e música. Em alguns momentos vou estar mais dentro do texto, como no caso do livro, em outros dentro da música, como no Cordel. Se, como eu disse, somos todos capazes de arte, a definição de artista soa para mim como pejorativa. A definição de artista como pessoa que faz arte já está enfraquecida pelo tempo e pelas surpresas que temos na vida, como o surgimento de poesia na boca de pessoas que não são consideradas poetas. O que percebo é que faço um trabalho que talvez pudesse ser definido como performance. Acontece que no Brasil, a palavra performance foi muito abalada nos anos 70 por uma utilização muito grande desse conceito na área da poesia. Por aqui, o entendimento de performance está como algo diluído, espalhado por várias artes, mas acho que seria a concentração desses terrenos. A performance é a união, a

JANEIRO/FEVEREIRO/MARÇO/2010 – Revista da Associação dos Docentes da UFF – CLASSE


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