A CASA em revista - Edição 3

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A CASA FOTO ARTE



A CASA EM REVISTA - ed.3


Capa Letargia Sobre a Dormência - LSD Sílvio Moréia


Editorial

A CASA em revista é uma publicação virtual de artes visuais com ênfase na fotografia contemporânea. Nasce dentro

do isolamento social necessário para evitar o coronavírus.

Inicialmente voltada para artistas que participam de projetos, encontros ou cursos A CASA, busca dar visibilidade em

tempos de pandemia para a emergente produção destes artistas, também servir de portfólio e ajudar a colocar novos

nomes e trabalhos em circulação dentro do sistema de arte. Além de ensaios fotográficos e trabalhos relacionados à

imagem, cada edição terá uma entrevista com um artista convidado, que apresentará também um ensaio, projeto ou

produção de sua autoria, escolhido e selecionado por ele mesmo.

A edição 3 da nossa revista traz Caroline Valansi, uma artista múltipla que usa a fotografia como um dos meios como

possibilidade de dialogar com o espectador. Já pertenceu

ao coletivo Opavivará e algum tempo vem construindo uma belíssima carreira solo nas artes visuais brasileira. O ensaio

que ela nos oferta nessa edição, demostra como expandido pode ser o conceito fotografia. Apreciem mais um número da nossa revista. Bem vindos!


A Realidade Fragmentada Através das Joiners

Aline Yamaki

Em tempos onde passamos a ver a vida através de molduras limitadas por quatro linhas, ou seja, por meio de celulares e/ou janelas configuramos perspectivas limitadas dos panoramas que nos cercam. Estamos criando pequenos quadros seccionados da nossa realidade atual. A minha releitura das Joiners de David Hockney é a necessidade de resgatar a nossa visão geral, mesmo que subdividida. Um espaço e múltiplas imagens que ressignificam a forma de enxergar os ambientes.









Antropologia da Face Mentirosa Bruno Almeida

A vanguarda na elaboração de imagens está nos processos de Inteligência Artificial. Retratos estão sendo feitos por computadores que aprendem a aparência humana a partir de milhões de fotos disponíveis na internet. Mas será que essas imagens carregam a essência das pessoas reais? Os traços que distinguem a expressão humana? Essas imagens conseguem enganar o expectador? Em Antropologia da Face Mentirosa levanto essas questões com rostos que foram produzidos por IA e refotografados inspirados no famoso trabalho de Arthur Omar, Antropologia da Face Gloriosa.











Sós!

Carlos Formiga - Só ! Como me sinto, nesses sombrios dias de isolamento. E essas imagens, feitas há algum tempo, surpreenderam-me por sua contemporaneidade: uma antecipação do futuro?











O Livro de Sonhos Clรกudia Yamada

Sonhei que o mundo estava acabando e acordei sem entender quando e onde estava. O mundo nunca mais serรก o mesmo.









Cárcere

Márcio Pinto Nosso

comportamento

cotidiano

principalmente

em

grandes

metrópoles passa constantemente a sensação de cárcere. Seja com a violência urbana, ou a ditadura de informações controladas pelos meios de comunicação, os programas de televisão que favorecem a alienação, as turvas intenções políticas, o alto preço cobrado pelo capitalismo e sua crise etc... Finalmente chega 2020 um novo ano, carnaval, futebol, novos sonhos: mas chega também uma pandemia, maior desafio das gerações pós segunda guerra. O isolamento social surge como único tratamento atenuador da crise. Agora sim estamos trancados em casa. Esse trabalho é anterior ao ano tempestuoso que vivemos, ele reflete a angustia dessa sensação de aprisionamento já mencionado mais acima, e ganha triste relevância nas condições atuais. Somos animais enjaulados, vertiginosos e desesperados frente um cenário avassalador pelo vírus mas que ja se apresentava terrível porem silenciosamente cruel.









Horizontes Possíveis Rafaela Celano

Horizontes Possíveis fala sobre as prisões internas às quais nos submetemos; fala sobre as limitações de nossas expectativas advindas de nossas frustrações; fala sobre a solidão e o medo de não ter controle sobre o amanhã e sobre determinadas situações.









Letargia Sobre a Dormência LSD Sílvio Moréia

Ritmos, sons e inúmeras sensações adentram um vasto campo onde as percepções e os sentidos se misturam em desorientadas e entorpecidas emoções. São palpitações que se perdem e se fundem com a profundidade das cores, a lentidão dos movimentos, a desproporcionalidade das formas e das imagens projetadas pelo inconsciente. O desejado através do torpor, uma verdadeira Letargia Sobre a Dormência - LSD. Não fuja! Perca o controle, mas não entre em pânico! Descubra-se! E não se contamine! “Brasil acima de tudo, o torpor acima de todos!”











Aprisionando Oiticica em Teias Simone Si

O ensaio revela um caminho na busca por linhas e formas através de diferentes traçados geométricos que venho tentando mostrar desde que comecei desenvolver trabalhos autorais. A partir da influencia do modernismo, sobretudo Geraldo de Barros e José Oiticica Filho , tento extrair expressões abstratas utilizando as construções arquitetônicas no espaço urbano para conseguir representar minhas ideias por meio dessas imagens.








Artista Convidada

Caroline Valansi Carne Viva


Entrevista A CASA: Caroline seja muito bem vinda a nossa revista A Casa. Vamos começar nosso bate-papo? Você é uma artista muito ligada a fotografia mas ela nunca foi um limite intransponível, muito pelo contrário. Quando você começa a sentir esse desejo de trabalhar com arte e porque a fotografia é tão importante na sua trajetória? CAROLINE VALANSI: Minha formação artística foi toda relacionada a fotografia. Seja ela mais tradicional ou ligada ao cinema ou artes visuais. Sempre me interessou os aparatos, o click e a surpresa da imagem pós revelada. Durante muito tempo fui fotógrafa no termo estrito da palavra (já fotografei de tudo nessa vida, casamento, produto, book...) e nesse processo tive dois professores que me abriram a percepção de que fotografia pode ir além dela mesma. Tive a sorte de ter encontrado Denise Cathilina e Marco Antônio Portela. Cada um abriu um portal.


A Denise, que foi a primeira, me mostrou experimentações com a própria câmera e as possibilidades de construir maquinários e a intervir na própria câmera no pré ato fotográfico. Portella, já me mostrou os processos mágicos no laboratório preto e branco e, como uma imersão no quarto vermelho, pode mudar a própria ideia do trabalho. Depois disso ficou impossível acreditar na fotografia apenas pelo meu click. Em paralelo, sempre me achei uma fotografa não muito boa, isso me ajudou a buscar outras formas de me satisfazer artisticamente. Queria ir além do papel fotográfico, assim parei de fotografar/produzir imagens profissionalmente, trabalhando mais com arquivos pessoais e imagens da internet. A CASA: Você trabalha com muitos meios, até performance. Para um artista ser aceito hoje precisa transitar nesses multimeios ou ainda temos espaço para artistas especialistas que se mantem firme na mesma e única técnica diversificando somente a poética?


CAROLINE VALANSI: Entendo que a contemporaneidade, com a facilidade do aprendizado e uso dos novos meios, fizeram os artistas terem interesses em várias áreas. As artes também abriram o leque de técnicas e com isso, hoje, mudamos até o nome da nossa área. Antes artes plásticas e agora artes visuais. Com isso iniciam-se desejos de diferentes formas de criações e meios. Vejo essa tendência mais como uma curiosidade, um exercício, de falar de formas diferentes, mais do que para ser aceito no universo artístico. A CASA: Seu trabalho hoje tem forte caráter político. Sempre foi assim ou é algo que foi se desenvolvendo durante sua trajetória? CAROLINE VALANSI: Durante muito tempo tive uma vida dupla nas artes. Me dividia entre meu trabalho individual e o coletivo OPAVIVARÁ!. No coletivo era político o tempo todo. Fazíamos muitas ações na rua e com pessoas, as pautas da cidade nos guiavam. A arte se infiltrava no universo político das pessoas. Já o meu trabalho individual existia em outras superfícies, menos explícitas, mais subjetivas, mais estéticas e formal, e me bastava assim.


Quando sai do coletivo no final de 2014, dei uma virada no meu trabalho de arte. Com mais tempo e atenção para as questões que surgiam, fui entendendo cada vez mais meu desejo de fazer trabalhos mais políticos, que tivessem uma camada estética, mas que de alguma forma pudessem ser usados no âmbito político. Esse processo começou quando encontrei cartazes de filmes pornôs da década de 70 e 80. Esteticamente eram bonitos aos olhos, mas o conteúdo não era tão palatável pra mim. Os corpos femininos eram sempre expostos e usados como algo que dá prazer e não que sente prazer. Senti falta de um olhar da mulher sobre esse universo. Então criei minha série chamada Pornografia Política a qual, eu crio novos cartazes com nomes de filmes, frases e desenhos mais atuais, sem o machismo tão evidente nos cartazes originais, criando um jogo com a linguagem usada na pornografia e as ações feitas na política com a sociedade. Uso do humor e da própria linguagem pornô para criticar e comunicar. Pra mim corpo é política. Os corpos femininos são sempre expostos de forma a manter uma opressão sobre eles. O sexo, ainda hoje, é


cerceado por tabus morais, politizá-lo é uma forma de falar sobre ele, debatê-lo e, assim, construir uma nova linguagem que pode servir de ferramenta crítica. Acredito que a série Pornografia Política dá conta desse caráter político. A CASA: Ter um filho é um evento divisor de águas. Depois do nascimento do seu filho mudou algo em sua produção artística, despertou novos desafios críticos ou estéticos ou sua trajetória e interesses são os mesmos? CAROLINE VALANSI: Logo que meu filho nasceu só lia literatura sobre maternidade. Não conseguia produzir, não conseguia pesquisar sobre pornografia ou sexo, que eram meu foco até Dante nascer. Aos poucos fui voltando a me conectar com as minhas coisas e processos para além daquele cordão umbilical e me perguntei durante um tempo como juntar maternidade e “sacanagem”, bebê e desejo. Meu primeiro trabalho foi todo feito em papel colorido que eu tinha em casa. Por tanta interrupção do bebê em qualquer processo que eu iniciava, consegui cortar e colar papel e, mesmo com todas as


interrupções, continuar. Criei durante um ano uma instalação que ia montando na parede da sala da minha casa, se chama Revulvações. Ao terminar achei algumas respostas sobre minhas perguntas e o que me despertou nesse processo foram questões sobre educação sexual para crianças e jovens. Acredito que a maternidade me fez olhar para esse assunto. Também vejo que posso contribuir com esse conteúdo. Esse processo de usar papel colorido deu origem a série Carne Viva que ilustra essa entrevista. A CASA: Um país machista como o nosso a pauta feminista cada vez mais precisa ser visitada e debatida pelas artistas, isso vem ocorrendo? Quem você destacaria? CAROLINE VALANSI: Gostaria de destacar A Cooperativa de Mulheres Artistas, que é um coletivo do qual que faço parte, existe há um ano e vem construindo novas formas de agenciamento no campo da arte brasileira. É um grupo heterogêneo e aposta nessa multiplicidade como uma estratégia para a infiltração da mulher artista como agente coletivo de transformação para um novo modo de economia artística.


A CASA: Carne viva tem forte apelo plástico dialogando com colagens aparentemente livres brincadeiras, mas carregando uma radiografia do intimo da mulher. Como você acha que o público masculino recebe esse trabalho? Eles conseguem perceber a natureza feminina mais forte que imposições sociais e culturais? CAROLINE VALANSI: Esse é um trabalho feito para todos os espectadores. Sem distinção. Eu o fiz pensando em como podemos criar novas imagens de um corpo interno, esse corpo que fica em baixo da pele, escondido, mas que vibra e pulsa. Como falar de um universo erótico sem precisar mostrar algo explicito e literal. Deixo ao espectador sua interpretação e construção mental da imagem.



CARNE VIVA - 2019 Tamanho:70x50 cm Técnica: Múltipla (começo do processo é uma colagem com papeis coloridos, depois a imagem é digitalizada e passa por interferências no computador e para finalizar é impressa em papel fotográfico.)











CARNE VIVA - 2019 Detalhes da obra









Artistas

Aline Yamaki Bruno Almeida Carlos Formiga Cláudia Yamada Márcio Pinto Rafaela Celano Sílvio Moréia

Artista

Convidada

Simone Si

Caroline Valansi


Conselho Editorial Greice Rosa Mรกrcio Menasce Marco Antonio Portela

Projeto Grรกfico Bruno Almeida


acasafotoarte.com


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