Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA - 191

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VICKY CRISTINA BARCELONA Woody Allen reúne Javier Bardem, Penélope Cruz e Scarlett Johansson numa comédia sensual

ANDRÉ OLIVEIRA “O Processo de Bolonha dificulta a participação na AAC”

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27 de Janeiro de 2009 Ano XVIII N.º 191 Quinzenal gratuito

Director: João Miranda Editor-executivo: Pedro Crisóstomo

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MULHERES Partidos debatem-se com regras de paridade em ano de eleições P 12

a cabra Jornal Universitário de Coimbra

UC discute novas regras de avaliação até ao final do ano Durante o período de exames, A CABRA foi perceber como está a decorrer a implementação do pressuposto da avaliação contínua apontado pelo Processo de Bolonha, após um ano da adesão em pleno da Universidade de Coim-

inquiridos sobre as diferenças entre avaliação final e contínua, admitem optar pela última. No mesmo sentido, os responsáveis da UC e da Associação Académica de Coimbra referem um aumento da prática da avaliação contínua.

Estudantes preferem fazer avaliação contínua a final

Museu Académico de Coimbra Tradição esquecida num espaço que parou no tempo P 10 e 11

bra (UC) ao espaço europeu de ensino superior. Os alunos queixam-se da obrigatoriedade da realização de exames, independentemente da frequência desta modalidade. Ainda assim, quando

O Observatório de Bolonha vai começar a discussão de um novo regulamento de avaliação para toda a universidade, que estará concluído no final deste ano lectivo.

Filipe Albuquerque

TAGV

Piloto de Coimbra brilha no A1 GP

Salários em atraso criam instabilidade

Na quarta prova da temporada, Albuquerque arrecadou mais um pódio. O jovem de 23 anos, que representa Portugal, faz um balanço positivo da participação nacional e fala no desejo de chegar à Fórmula 1.

Dificuldades financeiras do teatro Gil Vicente é uma das razões indicadas pelo director-adjunto, Francisco Paz, para o atraso no pagamento de salários aos funcionários da frente casa. Cooperativa de trabalhadores criada no final de 2008 afirma que, caso a situação não seja resolvida, todas as opções estão em aberto. Desde 2006 que têm vindo a acontecer sucessivos atrasos.

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DESTAQUE

AVALIAÇÃO CONTÍNUA NA UC

ANA COELHO

APESAR DE MUITOS ESTUDANTES terem feito avaliação contínua, não estão dispensados de exames finais

Observatório de Bolonha discute avaliação Um ano após a implementação em pleno do Processo de Bolonha na UC, os responsáveis pelo acompanhamento apontam um aumento no acesso à avaliação contínua. Discussão de uma proposta para toda a universidade vai estar concluída no final do ano lectivo. Por João Miranda om o final das aulas e o início da época de exames, as salas de estudo dos diferentes edifícios da Universidade de Coimbra (UC) ligam os sistemas de aquecimento e as mesas são ocupadas por estudantes carregados de livros, sebentas e apontamentos. À porta da sala de estudo improvisada nas Cantinas dos Grelhados, a estudante de Ciências Bioanalíticas, na Faculdade de Farmácia da UC, Diana Mariano faz uma pausa no estudo. “Estou a estudar para os exames. Fiz avaliação contínua a todas as seis cadeiras, mas só três é que não envolviam a realização de exame”. Não muito longe, também a estudante de Biologia, na Faculdade de Ciências e Tecnologia da UC, Joana Oliveira faz um intervalo à porta da sala de estudo da Associação Académica de Coimbra (AAC). A estudante refere que se inscreveu em avaliação contínua a

C

todas as cadeiras, contudo, isso não a dispensa de ter de realizar exames a todas as cadeiras. Esta é, de resto, uma questão transversal a vários estudantes da UC. A aplicação do Processo de Bolonha referia o pressuposto da incrementação da avaliação contínua nos institutos de ensino superior. Passado um ano da implementação da revisão na UC, a Coordenadora-Geral da Pedagogia da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) e responsável do Observatório de Bolonha da AAC, Cátia Viana, adianta que, ao longo deste ano, existiu um aumento da avaliação contínua na universidade, assim como um aumento do número de cadeiras disponíveis para a avaliação contínua. Contudo, a estudante refere que existe “um ‘handicap’ de nem todas as pessoas terem a possibilidade de aderir de imediato. Existe uma restrição do número de vagas em

alguns cursos, o que acaba por não estar com o que seria pressuposto com Bolonha”. A vice-reitora da UC para os assuntos pedagógicos e membro do Observatório de Bolonha da UC, Cristina Robalo Cordeiro, partilha da opinião positiva sobre o ano

“A avaliação contínua tem ocupado um lugar muito mais importante do que até agora“ transacto: “a concretização do Processo de Bolonha que estamos a fazer em Coimbra desde há um ano, implicou ou implica mudanças pedagógicas estratégicas muito grandes. A avaliação contínua tem ocupado um lugar muito mais importante do que até agora

na maioria das faculdades”. Porém, a docente também coloca algumas questões sobre a efectividade da aplicação do processo. “Há faculdades que têm tido mais dificuldades que outras na sua aplicação. Por exemplo, na faculdade de Direito, onde sabemos que há turmas acima de centenas de estudantes, não é possível fazer uma avaliação contínua séria e plural”, lembra Cristina Robalo Cordeiro.

Regulamento geral é próxima prioridade A pluralidade de regulamentos pedagógicos traduz-se numa pluralidade de interpretações da aplicação da avaliação contínua. Na reunião do Senado Universitário, em Julho de 2008, foi aprovado o novo Regulamento Pedagógico da UC, fruto da discussão do Observatório de Bolonha. Cátia Viana lembra que existiu uma proposta avançada pela DG/AAC: “em mui-

tos pontos conseguimos que fosse bastante além. No caso da avaliação contínua, foi quase imediato que se tinha de deixar esse ponto para depois, não se chegou a discutir.” Para Cristina Robalo Cordeiro, a aplicação do regulamento actual “não invalida que cada faculdade depois não tenha as suas particularidades, as suas especificidades, que têm de estar consideradas nos seus regulamentos próprios”. Contudo, adianta que o “próximo trabalho do Observatório diz respeito à criação de um regulamento de avaliação – não só sobre a contínua – mas um regulamento geral sobre a avaliação: final, periódica, contínua, com as várias categorias e modalidades destas classificações”. A vice-reitora acredita que este trabalho estará concluído no final do ano lectivo, pois “é preciso conciliar e harmonizar as várias faculdades, que têm especificidades muito gran-


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DESTAQUE

des e formas de trabalhar muito diversas”.

Soluções a curto prazo Cátia Viana explicita ainda como um entrave à incrementação da prática da avaliação contínua na UC o parco número de docentes, o que, por sua vez, implica a concentração de alunos em poucas turmas ou a restrição no número de vagas.

Opinião semelhante tem o expresidente do Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior (CIPES) e director do Instituto Politécnico de Leiria, Luciano Almeida, que aponta que “as instituições têm de encontrar novas formas de permitir o ensino presencial”. O investigador avança com a opção do ensino à distância e o horário pós-laboral. Cristina Robalo Cordeiro ex-

plica que a questão do horário pós-laboral e do funcionamento lectivo por módulos, na UC, está incluída na agenda de discussão do Observatório de Bolonha. A vice-reitora reitera a opinião de existir a necessidade de contratar docentes. No entanto, explica que “não vale a pena pensar que isso vai acontecer porque os cortes orçamentais são muito grandes”. Para Luciano Almeida a efec-

tiva aplicação da avaliação contínua no ensino superior só se poderá concretizar após uma avaliação das instituições, dos docentes e num plano de financiamento “adequado” do superior. Quanto à acção da AAC, Cátia Viana conclui que “é preciso que os alunos percebam que existem regulamentos e um conjunto de condições a que têm direito e de que podem usufruir”.

Realidades diferentes nas faculdades Experiências de avaliação contínua ainda não são conclusivas. Falta de espaço físico e recursos humanos são entrave Catarina Domingos

A PRÁTICA LABORATORIAL e o acompanhamento dos professores é comum nos cursos das ciências

Estudantes preferem avaliação contínua ‘Sim’ à avaliação contínua. A resposta dos estudantes é clara quando perguntamos as vantagens e as desvantagens entre contínua e final Hugo Anes A principal razão pela qual os alunos não aprendem – diz-se – é porque não trabalham as matérias. A avaliação contínua tem por objectivo mudar esta aparente inércia e motivar os estudantes a trabalhar mais. Quando perguntamos aos estudantes da Universidade de Coimbra (UC) sobre a aplicação deste método a avaliação contínua parece não assustar quase ninguém e há mesmo quem o prefira em relação a outras formas, embora apontem algumas insuficiências e excessos. Os estudantes do primeiro ano de Psicologia, Fernando Ventura e Inês Correia, explicam porque preferem ser avaliados continuamente: “a avaliação por exames desresponsabiliza-nos mais. É mais fácil aprender por contínua, porque quem vai fazer exame só começou a estudar agora”.

Rui Mendes frequenta actualmente um mestrado em Física e descreve como é avaliado: “fazemos trabalhos semanais, apresentações, resolvemos exames em casa, aulas práticas, o laboratório, relatórios e a apresentação de resultados”. Apesar de afirmar que se aprende “mais” com este regime, o estudante lamenta que não haja “tempo para mais nada”, devido à carga horária. Se há quem se lamente pela falta de tempo e pelos prazos muito curtos para a apresentação

de trabalhos, mesmo em época de exames, outros reclamam e exigem mais trabalho. É o caso de João Santos, licenciado em Engenharia Electrotécnica, e aluno do primeiro ano de Psicologia, que critica: “a avaliação contínua não se pode resumir à apresentação de um trabalho por semestre, porque, assim, estamos a falar antes de avaliações pontuais”. O estudante sugere, pois, uma estratégia: “por exemplo, em cada semana, ou em cada aula teóricoprática, o professor poderia dar-

nos uma questão a que tivéssemos de responder, de modo a obrigarnos a rever o que foi dado na aula”. Tudo para “ir ao encontro daquilo que falta, que é o estudo contínuo, o chegar a casa e rever o que foi dado na aula”, acredita. O aluno de Psicologia revela também que não existe uma componente prática propriamente dita no primeiro ano do curso, o que dificulta a realização de mais trabalhos práticos. Já nas áreas das ciências e tecnologias, os trabalhos são uma prática comum. Quem o confirma é Sérgio Santos, estudante de Arquitectura. “Somos obrigados a estar constantemente a fazer alguma coisa, e, inevitavelmente, acabamos por aprender”. Também para João Sousa, de Engenharia Informática, “a avaliação por trabalhos e frequências é uma preparação para o exame final”. Outro dos problemas mais apontados pelos estudantes é a diferença de métodos de avaliação entre as várias cadeiras. É o caso de Irina Fortes e Rute Barros, alunas do quarto ano de Ciências Farmacêuticas, que reconhecem os benefícios da avaliação contínua: “como temos a pressão de fazer as frequências e os trabalhos, estudamos mais e não deixamos tudo para o fim”.

Aprovado em Julho de 2008, o Regulamento Pedagógico da Universidade de Coimbra (UC) não definiu as tipologias de avaliação a aplicar, estabelecendo que as várias formas seriam objecto de “regulamentação própria e autónoma”. “Foi um pouco controverso porque consoante as áreas do saber, havia sensibilidades diferentes”, conta a presidente do Conselho Pedagógico (CP) da Faculdade de Farmácia da UC, Maria da Graça Campos. À espera de definições mais claras, as faculdades tentam, agora, aplicar a avaliação contínua, tal como prevê o Processo de Bolonha. No geral, todas as experiências feitas são ainda “pouco conclusivas”, como considera o presidente do CP da faculdade de Direito, Jorge Monteiro. A mesma opinião é partilhada pela responsável do CP da Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da UC (FCDEFUC), Paula Tavares. Mesmo assim, a docente acredita que “o sucesso escolar aumentou e a taxa de aprovação subiu em relação ao ano passado”. Na FCDEFUC, o que tem vindo a complicar o sistema de avaliação contínua é a falta de espaço físico, lamenta a professora. O problema é comum à faculdade de Farmácia. “A nível percentual, a avaliação contínua não é muito implementada pela razão do espaço físico e pela razão dos recursos humanos”, avalia Maria da Graça Campos. A responsável relata que se procurou distribuir a carga de trabalhos para os estudantes com uma reunião de docentes no início do semestre. Nesta faculdade, não foram colocados ‘numerus clausus’ para a avaliação contínua. No entanto, “quem, numa primeira fase, não tem notas mínimas não continua”. No caso da faculdade de Ciências e Tecnologia, a avaliação contínua conta entre 20 a 30 por cento para a classificação final. O presidente do CP, Rogério Leal, descreve que “o recomendado foi, neste ano lectivo, não se ir para a avaliação contínua a 100 por cento”. “Houve alterações substanciais com a entrada do Processo de Bolonha, o que alterou o paradigma da avaliação como esta era feita, e todos nos estamos a adaptar”, conclui.


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ENSINO SUPERIOR ANDRÉ OLIVEIRA

“A AAC movimenta muitos interesses” No último dia como presidente da associação académica, André Oliveira acredita que a Academia está mais credibilizada. Reconhece que há falta de renovação de pessoas nas estruturas da AAC e que os estudantes ficaram a ganhar com a proximidade à reitoria mento em que não há uma oposição ao reitor, a AAC tem de saber redefinir a sua posição. Por que é que não te recandidataste? Tenho o meu curso para terminar. Achas que há falta de renovação de pessoas nos órgãos de direcção da associação? Deveria haver uma renovação maior. Mas é bom que as pessoas se mantenham sempre ligadas à AAC; são muito importantes em transições e na compreensão da casa, porque a AAC movimenta muitos interesses, a todos os níveis. Talvez nas secções culturais e desportivas fosse positivo uma maior renovação e uma maior participação de estudantes nos cargos de direcção. Pedro Crisóstomo Cláudia Teixeira Há um ano, assumiste como uma das prioridades para o teu mandato unir e credibilizar a AAC. Pensas que o conseguiste? Acredito que a associação saiu com uma imagem mais credível, principalmente devido às áreas de intervenção que considerámos prioritárias para este mandato. Mas isto junto de quem - dos estudantes, da sociedade civil, do governo ou da reitoria? De tudo. Naturalmente, a nossa actuação em primeira instância é dirigida para os estudantes, mas a AAC, devido ao seu historial, àquilo que representa, tem um papel na sociedade. É recorrente quem assume a direcção-geral frisar que a associação é a melhor academia do país. Mas o papel político da AAC a nível nacional tem caído muito nos últimos anos. Não concordo, principalmente em relação a este ano. No Encontro Nacional de Direcções Associativas (ENDA), não tenho a menor dúvida de que continua como a mais activa. A meio do mandato, afirmaste estar disponível “para trazer mais estudantes à AAC”. Foste capaz? Estamos num contexto complicado, que é o Processo de Bolonha, e todas as secções sentem a dificuldade em trazer mais estudantes a participar. Acho que temos de se-

guir exemplos de sucesso, como a campanha de marketing desportivo. Isso traduziu-se numa maior afluência de atletas e em novas pessoas a chegarem à AAC. Neste momento, tem de haver uma campanha muito semelhante em termos das secções culturais. O Processo de Bolonha, devido à carga horária, à exigência de apresentar trabalhos e à avaliação contínua, dificulta a participação na AAC. Bolonha está há três anos implementado na universidade. Como vês a adaptação da UC neste último ano? Bolonha ainda está numa fase de maturação na UC e acredito que noutras universidades também. Ao fim deste ano, verificamos alguns pontos que se tornaram positivos: o Suplemento ao Diploma; o Regulamento Pedagógico da UC... Há outra novidade, que é o Sistema de Gestão de Avaliação Pedagógica, em que percebemos algumas lacunas do processo.

Por que é que acho este reatamento de relações importante neste caso específico? Porque o regulamento pedagógico, na forma como foi discutido e apresentado em Senado, contou com a nossa cooperação com a reitoria. Mas o que é que mudou efectivamente? O diálogo existia [no mandato anterior], mas uma coisa é haver um diálogo institucional, outra coisa é haver um diálogo de proximidade sem qualquer divergência com as pessoas que estão… Acreditas que havia diálogo, então? Não tenho a mínima dúvida. Havia diálogo e havia muito mais, o que ia contra uma moção de Assembleia Magna.

Serias a favor da avaliação dos professores do ensino superior? Sim, faz sentido.

Até a moção ser aprovada (em Março), também houve diálogo no teu mandato? Sempre dialogámos, naturalmente, mas estou a falar da relação institucional. Fizemos questão de cumprir [o corte de relações] e, portanto, tivemos a magna um mês após tomarmos posse.

E achas que é possível acontecer quando? Neste momento é complicado. Mas acredito que podemos caminhar para essa avaliação ao fim de um ano do regulamento pedagógico a funcionar.

Pensas que devia ter sido tomada uma decisão em magna, um ano antes? Sim. A partir do momento em que o reitor é reeleito. A postura de 2008 deveria ter sido logo a postura de 2007.

Desde que houve o reatamento de relações com o reitor, o que é que mudou?

Embora a recandidatura seja de continuidade. Com certeza. Mas a partir do mo-

Falas de quê especificamente? À volta da AAC, devido à dimensão que assume, há muitos interesses económicos, não nas pessoas que participam, mas da sociedade de uma forma geral. Tem de haver alguma estabilidade, porque é uma casa com uma facturação muito grande. O teu mandato ficou marcado pela revisão dos estatutos da UC. Embora a DG/AAC não estivesse directamente representada na revisão, não houve uma posição clara em relação às vantagens ou desvantagens do diploma. Não estamos contra. Em relação à representatividade dos estudantes e à competência de determinados órgãos temos de ter uma noção integrada do processo, que é uma assembleia estatutária que estava condicionada por uma lei restritiva e injusta, que é o regime jurídico... Temos algumas reservas em relação ao funcionamento, daí dizermos que os estatutos deviam ter sido mais ambiciosos. Prometeste ficar vigilante e proactivo. O que fizeste desde que os estatutos entraram em vigor? Reunimos com os estudantes eleitos para o Conselho Geral, em termos de prioridades para os próximos anos. Acreditas que os outros estudantes conhecem a posição da DG/AAC em relação aos estatutos? A posição foi clara e afirmada pu-

blicamente. Não fizemos nenhuma campanha virada para os estudantes a dizer qual era a posição da AAC – temos meios de comunicação social que também servem para isso. Sempre assumiste como bandeira estar próximo dos estudantes. Consideras que uma conferência de imprensa para marcar posição sobre os estatutos foi a melhor forma de os estudantes saberem qual a vossa posição? Considero que, após termos reunido com os estudantes dos órgãos de gestão, após termos lançado campanhas para os estudantes participarem explicando o que era o Conselho Geral e o Senado, fizemos aquilo que devíamos. Em Novembro, a tvAAC realizou uma sondagem em que 32,4 por cento dos estudantes disse que o tema que mais os preocupa é o valor da propina. Ela aumentou 4,8 por cento, mas não houve reacção por parte da DG/AAC. Porquê? Há um repúdio em relação ao aumento. Afirmámos, desde o início, que somos contra a existência de propinas. Achamos é que, neste momento, não faz sentido contestar. Na primeira Assembleia Magna do teu mandato, prometeste “requalificar a atitude interventiva da AAC”. Não é um contra-senso reclamar uma atitude interventiva quando dizes radicalmente ‘não’ à luta? Não. Requalificar é uma questão muito genérica e pode ter muitos sentidos: o de reclamar uma atitude interventiva no desporto, reclamar uma atitude interventiva em relação àquilo que os estudantes têm direito. 2009 foi prometido, pelo ministro Mariano Gago, como o ano do ensino superior. Como é que esperas ver as universidades daqui a um ano? É complicado. Não tinha ouvido essas declarações. Aquilo que espero em relação às instituições é que tenham um financiamento adequado. Temos instituições com cortes gravíssimos e que restringem muito a sua actividade. Mais em

acabra.net


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ENSINO SUPERIOR

Trabalhadores do TAGV reclamam salários desde Setembro ANA COELHO

Director-adjunto Francisco Paz justifica atrasos com questões processuais. Cooperativa de funcionários pode resolver a questão a curto prazo Cláudia Teixeira Os 19 funcionários de frente casa do Teatro Académico de Gil Vicente (TAGV) reclamam o pagamento de quatro meses em atraso, situação que, segundo António Frazão, um dos trabalhadores, se arrasta de forma consecutiva desde 2006. O director-adjunto do TAGV, Francisco Paz, reconhece que “houve meses com atrasos significativos no processamento dos documentos”, mas explica que isso se deve, em parte, a “dificuldades financeiras que o teatro atravessou nos últimos quatro meses”. De acordo com o responsável, soma-se o facto de os funcionários, maioritariamente estudantes, trabalharem em prestação de serviços, o que atrasa todo o processo. O número de horas de trabalho dos funcionários varia todos os meses, dependendo da programação do TAGV, razão pela qual, só depois da análise “do que foi feito no fim do mês” é que tem início o procedimento para os serviços da

FUNCIONÁRIOS da frente casa constituíram cooperativa em Novembro de 2008

UC tratarem dos pagamentos, explica Francisco Paz. Não sendo o teatro que lhes paga directamente, os serviços centrais da Universidade de Coimbra (UC) procedem aos pagamentos através da cooperativa GATO CRL, criada em Novembro de 2008, por parte dos trabalhadores. António Frazão explica que, para evitar sucessivos atrasos nos

pagamentos, “foi dito ao longo dos anos que os trabalhadores tinham de se organizar numa cooperativa”. Já anteriormente houvera uma entidade do género que estava responsável pelos pagamentos – a EMAcadémica da Associação Académica de Coimbra – mas desde a sua extinção o processo tem vindo a arrastar-se. Agora, o presidente do Conselho

Docentes discutem implementação de Bolonha O Auditório da Reitoria recebe quinta-feira, 29, as Jornadas Espaço Europeu de Ensino Superior. O encontro é organizado pela Reitoria e pelo Observatório de Bolonha da Universidade de Coimbra (UC) e vai contar com a participação do reitor da UC, Seabra Santos, da vice-reitora para os assuntos pedagógicos, Cristina Robalo Cordeiro, do novo presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Jorge Serrote, e de docentes das diferentes faculdades e departamentos. A vice-reitora afirma que “volvido um ano desde o seu [Processo de Bolonha] início é importante fazer o ba-

lanço da situação e perceber quais as dificuldades que ocorreram”. O objectivo é “definir linhas de correcção e soluções alternativas” e “procurar uma estratégia para o futuro”. Cristina Robalo Cordeiro explica que a iniciativa partiu do Observatório de Bolonha – grupo com representação da reitoria, de docentes das oito faculdades e estudantes – que ao longo do ano analisaram as mudanças operadas pelo diploma em Coimbra. “Vimos, no fundo, o que é que de melhor podemos ainda fazer do ponto de vista pedagógico e a tudo aquilo que diz respeito ao Processo de Bolonha”, declara. Cristina Robalo Cordeiro faz um balanço positivo da

implementação de Bolonha, mas tem consciência de que “há ainda um grande percurso a fazer”. “As falhas que existem são corrigíveis a médio e longo prazo” e prendem-se essencialmente com “a própria logística, a mudança do paradigma de ensino e os programas de mobilidade estudantil”, explica. Cláudia Teixeira

Fiscal da GATO CRL, Hugo Fernandes, assegura que os salários referentes aos meses de Setembro a Dezembro de 2008 ainda não foram disponibilizados. “Foi pedido, apenas na sextafeira passada [23], um documento da Segurança Social que, até ao momento, não era necessário [apresentar para se processarem os pagamentos]”, aponta. “O que

nos dizem é que a GATO CRL não avisou atempadamente da sua existência, quando o fizemos por carta e pessoalmente a quem de direito”, concretiza Hugo Fernandes. Francisco Paz acredita que o atraso nos pagamentos se deve a questões técnicas, pois, “neste momento, o que pode estar a acontecer é o bloquear de verbas por parte do Estado”. “Esta situação cria instabilidade e problemas no relacionamento interno e quem não recebe tem sempre razão”, continua. Ainda assim, António Frazão duvida que a situação venha a ser regularizada brevemente: “foi-nos dito para criar a cooperativa, mas continua tudo igual. Se a questão não foi resolvida com a solução que nos foi dada, duvido que agora o seja”. Em relação à actuação da cooperativa, caso a situação não seja resolvida, Hugo Fernandes afirma que todas as opções estão em aberto. A 17 de Setembro passado, aquando do concerto de abertura solene das aulas, os funcionários manifestaram-se contra o atraso de três meses de ordenados com uma greve de zelo. Já antes, em Março de 2007, foi feita uma acção de sensibilização dos espectadores para o facto de também na altura haver três meses de atraso nas remunerações. Com Pedro Crisóstomo e Vanessa Quitério

Nova DG/AAC toma posse esta tarde Críticas ao governo por causa do financiamento do ensino superior deverão marcar o discurso do presidente eleito da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Jorge Serrote. A cerimónia está marcada para hoje, 27, às 18 horas no Auditório da Reitoria. As palavras do novo presidente vêm no seguimento do aumento de cinco por cento no Orçamento de Estado que, de acordo com o dirigente associativo, é insuficiente para as necessidades das universidades públicas. “O ensino superior, em Portugal, não é visto como uma prioridade”, critica. Por isso, uma das primeiras activi-

dades do mandato vai “consistir numa campanha de levantamento dos principais problemas que os estudantes sentem para depois ser entregue um documento à tutela”. “Queremos que a sociedade civil tenha noção de que o ensino superior é um instrumento de formação dos nossos quadros”, acrescenta. Jorge Serrote assegura ainda que amanhã “vai sair uma AcTua Academia [publicação da DG/AAC]”, no mesmo dia em que a direcção da AAC vai estar presente nas faculdades “com o objectivo de diminuir o fosso entre a direcção-geral e a comunidade estudantil”.

Cláudia Teixeira PUBLICIDADE


6 | a cabra | 27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira

CULTURA cultura Semana Cultural da UC já mexe cá

por

28 JAN

YAKETY BAND Música FNAC • 22H • ENTRADA LIVRE

28

A crise académica de 1969, o bicentenário do nascimento de Charles Darwin e o Manifesto Futurista de Filippo Tommaso Marinetti impulsionam a próxima Semana Cultural da UC

JAN

CAMINHO PARA A PERDIÇÃO

Tiago Carvalho

CICLO PAUL NEWMAN TAGV • 21H30 • 4,5¤ PREÇO ESTUDANTE: 3,5¤

30 JAN

RODRIGO LEÃO CINEMA ENSEMBLE TAGV • 21H30

31 JAN

SLIDE Musica FNAC • 22H •ENTRADA LIVRE

até

31 JAN

EXPOSIÇÃO DE PINTURA DE ANTÓNIO COSTA

A Universidade de Coimbra (UC) realiza, de 1 a 7 de Março, a XI Semana Cultural, sob o tema “Velocidade e Movimento”. Este ano, o objectivo é, pois, destacar a velocidade, o movimento e o futurismo como temas principais. O pró-reitor para a Cultura da UC, António Bandeirinha, salienta que esta edição recorda três acontecimentos base. Primeiro, “o bicentenário do nascimento de Charles Darwin, visionador da condição humana como fase evolutiva da vida”; “a crise académica de 1969 e o movimento estudantil”; e o centenário do Manifesto Futurista de Filippo Marinetti”, que, na perspectiva do docente, “pretendia impulsionar as artes e a produção cultural e artística em direcção à recusa total dos

factos e dos compromissos com o passado”. Fruto da parceria entre alunos, docentes, funcionários, departamentos, faculdades e unidades orgânicas da UC, a próxima semana cultural tem como intuito, segundo o pró-reitor, “criar algo que seja um grande elo de ligação” entre todas as actividades. Proporcionar uma “intensidade de acontecimentos muito grande” a todos os seus visitantes em todas as “actividades, exposições, espectáculos de dança, teatro e música” existentes é também a intenção da organização, remata o António Bandeirinha. Sendo a semana cultural aberta a iniciativas de toda a universidade, Bandeirinha realça que “a preocupação é encontrar algo que potencie, amplie e dê mais visibilidade às acções que as diversas entidades nos propõem”.

pela Cultura na UC avança que a faculdade de Letras vai “comemorar o futurismo”, a faculdade de Ciências do Desporto “articular velocidade e movimento” e o Museu da Ciência “comemorar o bicentenário do nascimento de Darwin”. As secções culturais da Associação Académica de Coimbra também fazem parte do programa, que vai estar pronto brevemente. Projectos como o “Até Breves” e a Revista Via Latina integram-se também na semana cultural. O concurso de curtas-metragens da tvAAC, “Até Breves”, segundo a responsável pelo projecto, Ana Mesquita, “realça a importância da produção audiovisual amadora no panorama nacional”, sendo que este é um con-

curso extensível a estudantes de todo o país, com a finalidade de “organizar uma digressão nacional com as curtas-metragens distinguidas”, adianta Ana Mesquita. A revista Via Latina, que este ano assimila o tema da semana cultural, conta com a colaboração do escritor valter hugo mãe e do humorista João Moreira. O director da revista, João Picanço, destaca “o factor surpresa dos colaboradores da revista” e adianta que a “sobriedade da revista vai-se manter, seguindo o modelo adoptado em anos anteriores”. Centrada em torno da universidade, mas aberta a toda a gente, a nova edição da semana sultural pretende exaltar o factor cultural da cidade e da Universidade de Coimbra, que conta já com 719 anos que, para António Bandeirinha, “é um marco”. Com Sara Oliveira

O que movimenta a UC Adequar o ponto de partida da semana à realidade é a função dos seus organizadores. O responsável

CAFÉ SANTA CRUZ ENTRADA LIVRE

até

1

FEV

CABARÉ DA SANTA TEATRÃO OFICINA MUNICIPAL DE TEATRO 6ªF E SÁB. • 21H30 DOM • 19H

até

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TIAGO CARVALHO

O PROGRAMA da Semana Cultural vai, segundo António Bandeirinha, ser divulgado brevemente

FEV

“O SOL NASCE A SUL”

Em Exposição • O Sol nasce a sul

Fotografia GALERIA ALMEDINA ENTRADA LIVRE

D.R.

até

6

FEV

WALALE ANGOLA Exposição de Ana Rita Rodrigues GALERIA SANTA CLARA ENTRADA LIVRE até

14 FEV

PADRE ANTÓNIO VIEIRA O SEMEADOR DE PALAVRAS GALERIA FERREIRA CORREIA ENTRADA LIVRE Normal – 10¤ Estudante – 5 ¤ até

24 FEV

PINTASPINTURAS Exposição de Pintura de Teresa Bravo CAFÉ COM ARTE ENTRADA LIVRE

Por Sara Oliveira

A fotógrafa de origem belga, Lieve De Boeck, passeia a sul e descobre as cores de um continente perdido. A exposição chega agora a Coimbra depois de ter estado na Bélgica Sara Oliveira Entre as cores quentes que agora predominam numa das salas de exposições na Galeria Almedina, estão 28 peças cujo enquadramento desenhou paisagens, casas, coisas e pessoas. Peças, essas, que chegam a Coimbra, depois de serem vistas pelos belgas, em Bruxelas, no Festival de Verão de Fotografia de 2008. A sala de exposições é completa-

mente branca e essa é a condição primeira para os olhos não se distraírem. Numa fotografia, os pormenores que a vista alcançam são ínfimos. Entre rasgos de alegria que os sorrisos albergam e o quente das paisagens, o universo daquele povo é o cenário de um país de extremos. Um rosto cheio de rugas, uma expressão suspensa, gestos no ar, uma mancha azul de meninos em uniforme e a frescura da infância personificada em tantos rostos são trazidos por Lieve De Boeck num passeio a Sul. Ali estão os mercados feitos na rua, onde os alimentos se confundem com a terra batida. Oito meninos entre uma “linha de comboio”, um olhar que sai da moldura, uma cidade em movimento, onde a coca-cola não foi esquecida na parede, são fotografias que não fugiram ao olhar de Lieve De Boeck. Mais à frente no espaço e no

tempo, um movimento de felicidade estampada na esquina de uma rua, uma “vista de pássaro sobre a ilha”, a água a jorrar no centro de uma panorâmica aparentemente simétrica, um amontoado de paredes de quatro lados, velhas e dispersas, são ingredientes de um sítio cheio de pessoas com poucas coisas. Ao percorrer toda a sala, a direcção do olhar perde-se na ideia de imaginar uma realidade diferente daquela que as fotografias passam. A componente humana é forte, as vivências e o ritmo de todo um povo pulsam nos traços precisos da objectiva que constrói uma narrativa onde o outro e a paisagem estão alheios à tristeza e à desolação. A exposição está patente ao público até 5 de Fevereiro. Quem quiser ir mais longe, e ficar com os quadros, vai encontrar preços que estão entre os 95 e os 695 euros.


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DESPORTO

FILIPE ALBUQUERQUE

P•R•O•LONGA•M•E•N•T•O

À espera de um lugar na Fórmula 1 Albuquerque voltou a brilhar no A1 Grand Prix, ao ser terceiro na Nova Zelândia, quarta prova da época. O jovem sempre quis ser piloto e sonha chegar à Fórmula 1 TIAGO CARVALHO

Tiago Carvalho Catarina Domingos O representante português da A1 Team Portugal está há menos de um ano na prova das nações. Filipe Albuquerque teve a sua estreia em Fevereiro de 2008, em Durban, na África do Sul. Logo aí, o piloto conimbricense alcançou um resultado positivo, somando 14 pontos. Nesta temporada, Filipe Albuquerque já atingiu o resultado máximo no A1 Grand Prix (GP). Venceu no circuito de Chengdu, na China, segunda corrida da época, conquistando a primeira vitória lusa na prova, que existe há quatro anos. Depois de quatro corridas, Portugal é terceiro na classificação geral, com 49 pontos. “O balanço é óptimo”, considera Filipe Albuquerque. Dar o primeiro triunfo a Portugal e ver a felicidade de todos foi o que mais o marcou. “A melhor sensação é estar lá em cima e ter toda a gente a olhar e a respeitar-nos”, confessa. Estar no grupo da frente e manter a qualidade que tem tido até agora é a meta traçada.

Da brincadeira à competição A paixão pelo automobilismo começou aos sete anos, pela mão do pai, que o levou a um kartódromo com o irmão. O interesse foi imediato. Ao mesmo tempo, Filipe Albuquerque via competir Ayrton Senna na Fórmula 1. A partir daí seguiram-se as idas aos karts e aos treinos todos os fins-de-semana. “Começou tudo numa brincadeira e acabou por chegar a este ponto”, recorda o automobilista. As provas iam correndo bem, com Filipe sempre a tentar superar limites. Na sua cabeça não havia outra profissão. O corredor não se imaginava “a ir para o trabalho com a pasta na mão, a fazer sempre a mesma rotina”. “Sem querer cheguei a integrar-me no programa da Red Bull e a experimentar Fórmula 1 em testes privados”, lembra. Até chegar ao A1 GP, conta-se a

HÓQUEI EM PATINS A equipa sénior da Académica venceu em casa o Oliveira do Hospital por 8-3 e continua no comando do Campeonato Nacional de 3ª Divisão Zona Norte B, com 35 pontos, mais cinco pontos que o segundo classificado. A equipa de Miguel Vieira segue invicta dentro de portas, somando já sete vitórias em casa. Na próxima jornada, a AAC joga em Leiria com o Marrazes.

FUTEBOL

O PILOTO conimbricense deu os primeiros passos no automobilismo aos sete anos

participação no Campeonato Espanhol de F3, na Fórmula Renault alemã, na Fórmula Renault europeia e no Campeonato Norte Europeu de Fórmula Renault. Em 2007, Filipe Albuquerque concorreu na GP2 Series e na World Series by Renault. A conquista da Fórmula Renault europeia, há dois anos, é eleita como o momento inesquecível da curta carreira do jovem de 23 anos. “Sabia que se ganhasse o campeonato ia continuar em direcção à Fórmula 1 como principal objectivo”, sublinha. A prova europeia já foi ganha por Kimi Raikkonen, Felipe Massa e Scott Speed, nomes que já alcançaram a mais popular competição do automobilismo mundial. Em Abril, a A1 GP chega a Portugal. O Autódromo Internacional do Algarve recebe as 20 nações participantes. Filipe Albuquerque já pensou no momento em que vai correr em casa, uma vez que sabe que vai ter “uma pressão acrescida, com os media, amigos e familiares”. “Seria excelente ganhar, mas tenho de abordar a prova de Portimão como mais uma”, an-

PERFIL DATA DE NASCIMENTO • 13 Junho 1985 CIRCUITO FAVORITO • Circuito de Shangai (China) SONHO • Fórmula 1 ÍDOLO • Ayrton Senna e Michael Schumacher UMA VELOCIDADE • 320 Km/h UMA MULTA • De estacionamento no segundo dia de carta, em frente ao Automóvel Clube de Portugal UMA CIDADE • Coimbra OUTROS DESPORTOS • Natação e atletismo

tevê. Para as corridas, a preparação inclui treinos de resistência como corrida, bicicleta, remo, ginásio; e exercícios de pescoço. Num total o piloto treina três horas por dia de segunda à sexta. No tempo que sobra, Filipe Albuquerque aproveita para ir ao cinema e estar com os amigos. O automobilista nasceu e viveu sempre em Coimbra e, em 2006, chegou a ser distinguido com a Bandeira da Cidade. Na sua opinião, o ambiente estudantil “é óptimo, bem-disposto, com um à-vontade enorme”. “Vou muitas vezes para fora e sei o que tenho aqui”, acrescenta. A tradição académica também não lhe é indiferente. “Gosto de ir à Queima das Fitas, estar neste mundo de estudantes, embora não o seja e não tenha tirado nenhum curso”. Na estrada, como condutor, o piloto considera-se tranquilo, contando que deixa “o stress todo nas pistas”.

O sonho maior “Sou muito persistente e dedicado. Quando tenho uma coisa

na cabeça, quero atingi-la a todo o custo e faço o possível para que nada falhe”. É como se define Filipe Albuquerque, que sorri quando se fala no sonho de chegar à Fórmula 1. “Quando me começo a aproximar, começo a ver os pontos negativos, muita política, muitos interesses económicos”. Ainda assim, o desejo fala mais alto e solta um “quem me dera estar lá”. Do mundo restrito da modalidade, Albuquerque tem como ídolo Michael Schumacher. O piloto luso já lidou com engenheiros que trabalharam com o alemão, que confessavam que o heptacampeão do mundo era “um escravo do trabalho”. “É uma lenda viva”, resume Albuquerque. O automobilista de Coimbra já fez testes privados com as equipas Red Bull e Toro Rosso. Para si, as marcas estão a querer pilotos cada vez mais jovens, dando como exemplo a ida de Sebastian Bueni, de 20 anos, para a Toro Rosso. “Se me contratarem como piloto de testes, é porque estão a investir em mim, a não ser que já tenha trinta anos”, defende.

NO DOMINGO, Albuquerque cortou a meta na terceira posição

A AAC venceu o Mocidade FC por 0-2, em encontro da 16ª jornada da Série A da 1ª Divisão Distrital da Associação de Futebol de Coimbra. Com este triunfo, a Académica SF alcança a terceira vitória consecutiva e soma 31 pontos. Na próxima jornada, a Briosa recebe o Desportivo de Lagares, que tem 15 pontos.

VOLEIBOL Este fimde-semana foi de jornada dupla para a equipa sénior masculina de voleibol da AAC. No sábado, a turma de Carlos Marques perdeu com o Centro de Voleibol de Lisboa por 0-3. No domingo, a Académica venceu o Gueifães em casa por 3-2. A equipa sénior feminina ganhou ao Juventude de Leiria por 3-2. No próximo fim-de-semana, a equipa masculina joga fora com o Sporting Clube das Caldas, enquanto que os femininos jogam defrontam a Juventude Pacense.

ANDEBOL No sábado, a AAC conquistou a sua terceira vitória consecutiva no Campeonato Nacional de 2ª Divisão Zona Centro, ao vencer fora a SIR 1º Maio por 25-26. Com este resultado, a Académica soma 44 pontos e ocupa o quarto lugar. Na próxima jornada, a turma de Ricardo Sousa recebe a JOBRA, que lidera o campeonato com 49 pontos. Catarina Domingos


8 | a cabra | 27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira

CIÊNCIA & TECNOLOGIA PAULO GAMA MOTA

“A ciência casa muito mal com a ditadura” Gosta de aprender e de ensinar o que aprende. É doutorado em Biologia, mas o seu interesse estende-se à Antropologia. No mês em que tomou posse a Comissão Científica para o programa da segunda fase do Museu da Ciência da UC, fomos conversar com o director Diana Craveiro Quando começou o interesse pela ciência? A partir de certa idade, creio que na minha adolescência, comecei a interessar-me muito por perceber porque é que as coisas eram como eram. Porque é que o Universo onde vivíamos tinha as características que tinha. As respostas que comecei a encontrar foram aparecendo na minha formação. Na altura deliciava-me com os meus professores e isso começou a interessar-me muito. Fiz outras leituras também, sobre o religioso, o esotérico, mas achei que as respostas que tinham consistência eram as respostas que a ciência procurava. Pensa que o interesse pela ciência tem vindo a aumentar? Em Portugal há determinados estratos da sociedade que têm mais interesse pela ciência. Há estratos que estão profundamente alheados da ciência e de outras coisas. Penso que é uma batalha que nós não conseguimos vencer e que tem a ver com o interesse pela cultura de um modo geral. A seguir ao 25 de Abril partimos de uma situação calamitosa, em que tínhamos uma percentagem elevadíssima de analfabetismo. O país era dos mais atrasados da Europa, e caminhou-se muito para ultrapassar essa situação. Mas acho que ainda falta ganhar as pessoas. Não tem só a ver com a ciência, mas também tem porque a ciência é, por natureza, uma actividade intelectual. Mesmo o acompanhamento e interesse que temos sobre a realidade pressupõe que as pessoas se interessam pelo que se passa à volta delas. É isso eu acho que é o meu trabalho de todos os dias. Espaços como o Museu da Ciência foram estruturados precisamente com o objectivo de fazer com que o interesse da sociedade pela cultura e, em particular, pela cultura científica, cresça. Licenciou-se em Biologia mas também se interessa bastante por Antropologia. Porquê? Tem a ver um pouco com contingências do próprio percurso académico. Na altura em que me licenciei havia no departamento de Antropologia interesse por pessoas que quisessem trabalhar em aspectos biológicos do comportamento, que era exactamente o que

DIANA CRAVEIRO

queria. Concorri para o departamento nessa altura e acabei por ir desenvolvendo a minha actividade lá e por manter uma relação forte com as várias pessoas que fazem investigação na área da Antropologia. Qual foi a investigação que mais o desafiou? A resposta trivial é “a próxima”. É sempre a próxima que será o maior desafio, porque os outros teriam sido já vencidos e ultrapassados. Uma parte do desafio ou da valorização que damos ao desafio está nos resultados. Quando desenhamos uma experiência e conseguimos realizar um teste que depois produziu um resultado observável claramente diferenciado, é muito recompensador. Mas os desafios estão sempre continuadamente a surgir. Fazemos uma experiência, procuramos obter um conjunto de dados e, subitamente, os resultados são completamente ao arrepio do que estávamos à espera, isso obriga-nos a reflectir sobre o que correu mal. Fizemos mal algum procedimento? Ou descobrimos um fenómeno novo? E isso é um desafio imediato. Tem alguma investigação que sempre tenha pensado em fazer e que nunca fez? Sim. Há investigações que gostava de ter feito, mas não tive condições materiais para as poder realizar. Tenho trabalhado muito com aspectos relacionados com a selecção sexual; a escolha do par em função de sinais que normalmente evoluem por causa de características sexualmente seleccionadas. A espécie de aves com que temos trabalhado tem uma estrutura de canto que é uma produção compacta, com uma grande quantidade de sons por unidade de tempo. Gostava de poder manipular o processo de desenvolvimento desses animais para ver como é que as minhas manipulações iam alterar a estrutura do canto e, depois, tentar ver em termos de estruturas neurológicas o que está por trás disso. O que significa para si dar aulas na universidade onde estudou? Não é importante para mim dar aulas na universidade onde estudei. Mas é muito importante, enquanto cientista, dar aulas. Sempre tive imenso gosto em ensinar e tentar transmitir conhecimentos, procurando entusiasmar os alunos da mesma forma que

GAMA MOTA está à frente do Museu da Ciência desde o início do projecto

aqueles conhecimentos me entusiasmaram a mim. Procuro dizer o quão fascinante aqueles conhecimentos podem ser, não para que eles sigam o que eu faço, mas porque acho que é muito interessante. Para mim, procurar conhecer implica desejar transmitir esses conhecimentos. E assumo isso como uma responsabilidade. Qual foi o maior desafio que encontrou no Museu da Ciência? Foi fazê-lo. Estou no projecto do Museu da Ciência desde o início, mesmo antes de ser projecto. Quando começaram a surgir ideias da necessidade de procurar agregar os vários museus para criar uma estrutura mais moderna, eu abri-me a estas ideias e comecei a fazer sugestões. Isso foi de facto um grande desafio, porque não tinha a noção da complexidade do processo da construção do museu, com a enorme quantidade de especialidades que estão envolvidas e da necessidade de conseguir compatibilizá-las.

E quanto ao museu digital? Para já é o maior museu digital de instrumentos científicos em Portugal, porque a universidade tem uma colecção muito grande e não é comparável com outra instituição. Mas acho que o museu digital vai dar um salto quando associarmos a esta disponibilização das colecções uma outra forma de as visitar, através da construção de um passeio virtual. Participa com outros professores num blogue que também fala de ciência…

Muitos dos ‘posts’ que se fazem no blogue são sobre o lado social da ciência, as implicações que tem na sociedade. Procuramos ajudar as pessoas a perceber que a ciência é uma forma de colocar perguntas sobre a realidade. A ciência casa muito mal com a ditadura e com regimes onde não pode haver liberdade de pensamento e liberdade de expressão. Por isso, achámos que havia todas as condições para que um grupo de pessoas com formações diversas pudesse manter ali um espaço de diálogo e informação. PUBLICIDADE

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CIDADE

DANIEL TIAGO

500 METROS DO MONDEGO poderão vir a ser atravessados por quatro pontes

Nova ponte divide opiniões A nova ligação entre as margens do Mondego opõe ambientalistas, Câmara de Coimbra e oposição. Os pilares da ponte e a passagem pelo Choupal condicionam o projecto Patrícia Neves Marta Pedro A 30 de Dezembro de 2008 saiu das mãos do secretário de Estado do Ambiente a aprovação de um projecto que irá oferecer uma nova ponte a Coimbra. O novo viaduto que vai atravessar a Mata Nacional do Choupal e terminar em mais uma ponte que atravessará o rio Mondego tem vindo a originar polémica. No mesmo plano em que o novo projecto vai recair, já existem hoje três pontes. Uma quarta ponte em Coimbra e a sua utilidade são questões que se colocam quando se fala no novo projecto. A histórica ponte do Açude, a ponte de Santa Clara e a recente ponte Rainha Santa Isabel constituem o lote de edificações que ligam as duas margens do rio. A centralidade da ponte de Santa Clara torna-a a mais frequentada, concorrendo com a ponte Rainha Santa Isabel, que lhe roubou a circulação rodoviária excedente. Com cerca de 70 mil automóveis que cruzam as vias da mesma, a ponte do Açude apresenta-se degradada pelos vários anos de existência. “A ponte Açude que

serve o Itinerário Complementar N.º 2 (IC2) atingiu o ponto máximo da sua capacidade de absorção de tráfego e portanto, é necessária outra ponte próxima daquele local para resolver este problema”, acredita o presidente da Câmara Municipal de Coimbra (CMC), Carlos Encarnação. Segundo os planos para o futuro, 500 metros do Mondego vão ser atravessados por quatro pontes, ou por três pontes e um túnel, dependendo da aprovação dos dois projectos que estão em cima da mesa. O primeiro diz respeito a um novo troço do IC2 que passará pelo Choupal e terminará na nova ponte. O outro projecto diz respeito à passagem do Transporte de Grande Velocidade (TGV) e implica a construção de um túnel sobre o Mondego. Estes dois planos urbanos têm vindo a agitar a opinião pública em Coimbra, colocando-se como grande questão a necessidade destes investimentos. “As duas propostas podem colidir”, defende o sociólogo e docente da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Fernando Ruivo. De acordo com os planos governamentais, a construção do novo IC2, no lado poente de Coimbra, e do novo

IC3, a nascente, resultará na concentração de rodovias com carácter de auto-estrada e portagens. Por nove quilómetros, vão encontrar-se três auto-estradas, a ligar o Norte e o Sul do país: o IC3 (Setúbal/Coimbra); o IC2 (Lisboa/Porto); e a A1 (Lisboa/Porto). Mais para Oeste, passa a A17 (Leiria/Aveiro). Para o Provedor do Ambiente e da Qualidade de Vida Urbana de Coimbra, Salvador Massano Cardoso, “neste processo, não há alternativas, e isso torna este projecto curioso”. A falta de alternativas é reiterada por Carlos Encarnação, que justifica a posição da ponte com o facto de não haver outra solução: “não pode ser feita noutro local, e portanto tem de ser ali”.

Uma estrada polémica O que torna o troço controverso não é apenas a falta de alternativas. “O cruzamento do viaduto pelo Choupal, que implicará a passagem de uma das estradas mais movimentadas a nível nacional, torna este projecto grave”, argumenta o presidente do Núcleo Regional da QUERCUS em Coimbra, António Luís Campos. O ambientalista sublinha o carácter ambiental negativo do projecto, argumentando

que “o facto de obras serem feitas no leito do rio não é bom”. Por seu lado, Massano Cardoso comenta que “o que está em causa não é estimular o desenvolvimento e o progresso”, mas “a necessidade de haver alternativas que preservem o património”. Apesar de a comissão responsável pela avaliação do projecto, encarregada de ponderar o impacto ambiental do troço, ter considerado que, nesta área, eles “seriam negativos, muito significativos e permanentes”, a Declaração de Impacto Ambiental (DIA), assinada pelo Secretário de Estado do Ambiente, Humberto Rosa, descreve um novo troço “favorável, mas com condicionantes”. Tendo em conta as contradições apontadas, a DIA estabelece algumas restrições ao projecto inicial. “Os pilares que recairão sobre o leito do rio devem possuir uma forma hidrodinâmica e um eixo orientado no sentido do escoamento e o fundo do leito do rio deve ser revestido”. Outra das limitações presentes na DIA implica que o corte de árvores para a construção do viaduto seja compensado com a plantação de árvores da mesma espécie. “As obrigações ambientais estão asseguradas e têm de

ser cumpridas”, reafirma Carlos Encarnação. O momento em que o projecto surgiu e os moldes que seguiu tornamno ainda mais controverso, entende o presidente do Núcleo Regional da QUERCUS, para quem “isto são decisões políticas, não técnicas”. Fernando Ruivo entende igualmente que “não é só um projecto de obras públicas”. “É evidentemente um projecto político”, atesta o sociólogo. A incerteza quanto à necessidade da nova ponte é contrariada pela maior parte das entidades. Os benefícios pouco falados são sublinhados por Carlos Encarnação, que qualifica o projecto como “necessário”. Do lado da oposição, a opinião é partilhada, em parte, pelo vereador da Coligação Democrática Unitário na CMC, Jorge Gouveia Monteiro. “Para o trânsito local, as três pontes são suficientes; já para o tráfego de passagem que se soma ao trânsito local, as três pontes existentes não são suficientes”, contrapõe. O vereador do Partido Socialista, Vítor Batista, critica a forma como surge esta proposta num ano de decisão autárquica, devendo-se pensar numa nova “ponte pedonal”. PUBLICIDADE


10 | a cabra | 27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira

TEMA

O

MUSEU

QUE NINGUÉM CONHECE Abre de segunda a sexta, mas tem sempre a porta fechada. Poucos são os estudantes que ouviram falar dele. Menos ainda os que o visitaram. O Museu Académico de Coimbra nasceu em 1951, está há 22 anos nos claustros do Colégio de São Jerónimo, na Universidade de Coimbra e parece ter parado no tempo. Talvez, por isso, passe despercebido à maioria de quem frequenta a Alta, na corrida entre a entrada e a saída das aulas. As visitas – esporádicas, deixando o museu vazio, com as luzes desligadas até que alguém toque à campainha – são sobretudo de turistas estrangeiros, que querem conhecer melhor a história da universidade e da vida académica. Quisemos entrar. Mas, primeiro, pusemos os estudantes à prova. De mapa na mão, sem me identificar, perguntei, onde ficava o museu a 35 estudantes que passavam na Rua Larga e no Pateo das Escolas. As respostas foram surpreendentes. Uns apontaram o dedo para o Museu Zoológico, outros para o Arquivo da UC. Mais do que uma vez sugeriram que passasse a Porta Férrea, e houve até quem dissesse que para chegar ao café “Académico” tinha de descer as monumentais. “É mesmo Académico? Nem sabia que isso existia”, disse-me outro. Isto sem esquecer os redondos ‘nãos’ como resposta. No final, feitas as contas, só uma estudante soube indicar por onde devia seguir. Fomos, então, abrir as portas ao museu… Duas horas de visita reunidas, agora, em fotografia e texto. Fotorreportagem por Pedro Monteiro e texto por Pedro Crisóstomo

Somos a quarta visita do an livro de visitantes poisado na m ao lado da entrada prova que são poucos, mas os agradecim tos tantos quantos os objectos se estendem pelas vitrinas, ar rios e mesas da exposição. Mu dos objectos que ali resistem fendas e à humidade, que cre com as infiltrações do tecto, doações ou relíquias que adqu das pela universidade desde o culo XIX. Azulejos de setecen guitarras de Coimbra, cerâm das Repúblicas, troféus do d porto académico. De miniatu da tricana aos ‘tipos’ de Coim não esquecendo o traje mascu do século XIX, de tudo o que ligado à UC e à Academia se contra nos corredores e degra dos do museu.


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TEMA

no. O mesa eles menque rmáuitos m às esce são uirio séntos, micas desuras mbra, ulino está e enada-

Sobre uma mesa coberta a veludo, formando nuvens almofadadas, repousam livros manuscritos, folhas carcomidas nos cantos e apontamentos deteriorados na inconfundível cor a papel velho. Vemos, rasgadas, “Lições de Physiologia Geral” que datam de 1897 e que pertenceram à Biblioteca da Associação Académica de Coimbra. Em três prateleiras, cabem quase duas dezenas de distinções à AAC. Uma delas é a Ordem do Infante Dom Henrique, assinada por Sophia de Mello Breyner, em 1987. E, sombreados nos contrastes da luz, repousam dois badalos da Cabra, roubados por estudantes, entre 1863 e 1933. Presos com fita-cola a um expositor forrado a pano preto estão exemplares de jornais de algumas repúblicas. Entre os vários objectos praxísticos, encontramos códigos antigos, um Decreto do Conselho de Veteranos, uma palmatória e uma “moca”, estas duas que terão pertencido a Antero de Quental. O lugar que a Queima das Fitas, Luís de Camões e o Fado de Coimbra ocupam na exposição, cada um com salas distinguidas, mostra que este não é apenas um museu da universidade. É, com tanto de história como de tradição, um ensaio da cidade. Ali, quase sempre adormecida.


12 | a cabra | 27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira

PAÍS & MUNDO D.R.

A LEI DA PARIDADE foi aprovada em 2006 depois de o Presidente da República ter vetado o primeiro diploma

Novo panorama político com quotas para mulheres Os partidos que queiram concorrer às próximas eleições têm de contar pela primeira vez com a lei da paridade para formar as suas listas Rui Miguel Pereira O panorama da política portuguesa está prestes a mudar. Em pleno ano de eleições autárquicas, legislativas e europeias, as listas de cada partido vão ter de apresentar uma percentagem mínima de 33 por cento de cada sexo. Apesar de esta lei ter sido aprovada em 2006, será 2009 o ano onde os seus efeitos se farão realmente sentir. Portugal encontra-se, actualmente, em 27º lugar no ranking da União Interparlamentar com uma percentagem de mulheres eleitas nas eleições legislativas de 21,3 por cento. Sendo que nas últimas eleições, em 2005, a posição no mesmo ranking era a 42ª. Foram eleitas em 2005 49 mulheres para 230 lugares, contando o Partido Socialista (PS) com 35, o Partido Social Democrata (PSD) com seis, o Partido Comunista Português (PCP) com duas, o Partido Popular (CDS-PP) com uma, o Bloco de Esquerda (BE) com quatro e Os Verdes com (PEV) com uma. Um dos principais problemas apontados pelos partidos a esta lei da paridade é a dificuldade em preencher a necessária quota a tempo das eleições. O secretáriogeral do PSD/Porto, Virgílio Macedo, já tinha reiterado esta

dificuldade: “arranjar mulheres para as listas é fácil, o difícil é arranjar mulheres com qualidade”. Segundo as declarações do dirigente laranja, proferidas em 2008, existe uma clara preocupação do partido em dar formação às candidatas de maneira a assegurar a “qualidade” e “capacidade” das mesmas. A activista do Movimento Democrático de Mulheres (MDM), Ana Pina, reconhece que “ao nível das autárquicas existe uma série de partidos que terão muita dificuldade em preencher as suas quotas” mas ressalva que o problema não é falta de interesse das mulheres na política, mas sim o facto de estas não poderem. Como explica a investigadora do Centro de Estudos Sociais (CES), Virgínia Ferreira, “o problema da não participação das mulheres na política é o facto de as mulheres terem a casa para gerir, a família para gerir e o seu próprio trabalho para gerir”. Segundo Ana Pina, as mulheres ainda “têm maior instabilidade no emprego que os homens, ganham menos que os homens e têm a seu cargo muitas responsabilidades, que muitos homens não têm”.

A necessidade de uma lei discriminatória Ana Pina não acredita que a lei da

paridade “por si só” resolva os problemas e aponta para a necessidade de medidas sociais e económicas. Explica, ainda, a activista que um dos problemas desta lei é criar a ilusão que vai passar a existir igualdade no acesso à política. A socióloga e investigadora do CES, Marisa Matias, acredita que “numa sociedade justa e paritária, as quotas não deveriam ser necessárias, mas isso não anula a necessidade da sua implementação

como reforço à mudança de práticas”. Por sua vez, Virgínia Ferreira não tem dúvidas quanto à necessidade e importância desta lei: “se seguirmos o ritmo natural de feminização teremos paridade lá para 2500 ou 2600”. Várias são as recomendações internacionais que têm sublinhado a necessidade de medidas concretas, como a lei da paridade, para garantir a igualdade entre os géneros. Exemplo disso é a Plataforma de

Acção sobre os Direitos das Mulheres no âmbito das Nações Unidas e várias recomendações do seio da União Europeia com vista pressionar os países a acelerar o esbatimento de desigualdades entre sexos. Existe uma clara evolução quanto ao acesso das mulheres no ensino superior, são já mais de 60 por cento, o que, no entanto, não traduz o proporcional acesso a cargos superiores e igual remuneração por trabalhos iguais. A lei laboral é na opinião de Virginia Ferreira “uma lei de enunciado de princípios e não uma lei sancionatória da infracção”. Marisa Matias critica a forma como “continuam a ser despedidas mulheres porque engravidaram ou porque querem ter filhos”. A lei existe e tem sido sucessivamente aprofundada. O Código Penal de 1886 permitia, por exemplo, ao marido matar a mulher em flagrante adultério, a redacção original do Código Civil de 1966, ditava para a mulher um estatuto menor, em relação ao seu marido. Foi com o 25 de Abril e a posterior Constituição de 1976 que se proibiram as discriminações directas ou indirectas, baseadas no sexo e limitações no acesso ao emprego por parte das mulheres, caberia ao Código de Trabalho aprofundar esta matéria. No entanto, falta ainda uma efectiva fiscalização para o cumprimento efectivo das normas. A primeira proposta da lei da paridade aprovada em Assembleia, mais rígida nas sanções a atribuir aos partidos incumpridores, foi vetada pelo Presidente da República, Cavaco Silva, classificando-a de “excessiva” e “desproporcional”. Rejeitada esta proposta, o Partido Socialista faz aprovar uma nova lei da paridade, mais branda quanto às sanções a aplicar, que prevê a redução na participação de 80% ou 75% da subvenção pública para as campanhas eleitorais dos partidos que não cumpram. Esta nova lei contou com a abstenção do Bloco e os votos contra de todos os outros partidos.


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PAÍS & MUNDO

Eurodeputados portugueses criticam cepticismo checo D.R.

Desde o início do ano que a República Checa sucedeu à França na presidência da UE. As divergências entre o Presidente e o Primeiro-Ministro checos podem ser negativas João Ribeiro A República Checa preside a União Europeia (UE) nos próximos seis meses e a tarefa que se avizinha não parece fácil. Os desafios são numerosos e as expectativas dos deputados portugueses não são as mais optimistas. O deputado europeu do Partido Socialista (PS), Luís Capoulas Santos, é categórico ao afirmar que “as expectativas não são muito elevadas devido ao cepticismo dos actuais dirigentes checos”. “Quem é céptico face à UE tenho dúvidas que possa dirigi-la bem”, adverte. O Presidente checo, Vaclav Klaus, é uma personalidade que longe de ser consensual entra frequentemente em colisão com o primeiro-ministro, Mirek Topolanek. O deputado europeu pelo Partido Social Democrata (PSD), Vasco Graça Moura, define Klaus como “um teórico da economia liberal” e um eurocéptico: “não é muito entusiasta do Tratado Europeu”. A deputada do Partido Comunista Português (PCP), Ilda Figueiredo, realça também as opções económicas dos dirigentes checos ao afirmar que “a presidência [checa] tem uma visão

ultra-liberal da economia e portanto tem uma posição de um ‘salve-se quem puder’”. A mesma deputada acusa a presidência de ser “completamente cega e indiferente aos dramas sociais e ao agravamento das desigualdades que se estão neste momento a verificar na UE”. Para além dos problemas internos, a presidência checa terá de lidar com uma grave crise económica, com o agravamento do conflito israelo-palestiniano e com um novo possível desentendimento entre a Rússia e a Ucrânia quanto ao preço do gás natural.

Inevitável comparação afrancesada A presidência checa sucede à francesa e, como refere Capoulas Santos, “a comparação vai ser inevitável.” “A liderança francesa foi, de facto, extraordinária, tendo em conta a sucessão de acontecimentos imprevistos e a forma como deu resposta e assumiu a chefia”, confessa o deputado socialista. Vasco Graça Moura concorda, dizendo que “a República Checa sucede a uma presidência muito enérgica, que teve bons resultados e marcou muito a UE” e questiona “se a actual estará à altura da exigência da presidência francesa”. Ilda Figueiredo discorda da avaliação feita pelos dois deputados à presidência francesa, notando que “foi profundamente negativa no que se refere aos direitos dos trabalhadores”. Um dos episódios que marcaram o início desta presidência foi o da Entropa, uma exposição em que um escultor de cada um dos 27 países membros da UE faria uma

A CRISE DO GÁS foi um dos primeiros desafios desta presidência

obra sobre o seu país de origem. Contudo, o que na realidade aconteceu foi que David Cerny, um

controverso artista checo, fez as 27 esculturas, cada uma representando de forma estereotipada um

UM COMEÇO SEM ARTE A exposição tem como objectivo comemorar a presidência checa do Conselho da União Europeia. As 27 esculturas foram, supostamente, criadas por artistas dos 27 Estados-membros em coordenação com o artista checo David Cerny. No entanto, e após a apresentação da exposição em Bruxelas, Cerny afirmou ter inventado os artistas colaboradores e as biografias dos mesmos. A escultura encomendada pela República Checa apresenta os Estados-membros da UE segundo uma visão estereotipada. Portugal é representado como uma tábua com três pedaços de carne em forma de ex-colónias, Itália é um campo de futebol com jogadores distribuídos, alguns em poses sexuais. As autoridades checas já se desculparam publicamente com o sucedido.

país da UE. Um mau começo para os dirigentes checos, dado que esta exposição servia para comemorar a presidência. Uma das iniciativas dos novos líderes da UE irá incidir sobre o Processo de Bolonha. Vasco Graça Moura, deputado na área da Educação e Cultura, confessa que “Bolonha não tem tido resultados muito satisfatórios”. “Vai haver uma conferência com todos os países membros do Processo de Bolonha, que são 46, e a República Checa vai tentar fazer o balanço dos resultados e ver quais serão as prioridades para 2010”, adianta ainda o deputado socialdemocrata.

BREVES Islândia Foram milhares os manifestantes que pediram a demissão do governo islandês, este fim-desemana. O primeiro-ministro, Geir Haarde, alertou publicamente para o perigo de a Islândia cair nos próximos dias na bancarrota, avisando que “muita gente vai perder dinheiro”. Nenhum outro país viveu até à data tamanho revês na sua economia, nem mesmo os Estados Unidos. Com o espoletar da crise económica mundial, pôs-se a descoberto o endividamento excessivo à banca e o crédito mal parado de proporções gigantescas. Estes dois elementos, combinados com o pânico geral dos investidores e consumidores, já levou o governo a

D.R.

suspender os bancos islandeses na bolsa de valores, passando o Estado a controlar todas as decisões da banca. E apesar de todas as tentativas para salvar a economia da ilha europeia, a factura para com os clientes dos bancos islandeses é de milhares de milhões de euros. Nem mesmo com os empréstimos facilitados do Fundo Monetário Internacional a situação dá sinais de inverter. O ministro do comércio, Bjorgvin Sigurdsson, assumindo a pressão da crise económica, renunciou este domingo ao seu mandato. O primeiro-ministro já anunciou a intenção de realizar eleições antecipadas. R.M.P.

EUA • Afeganistão Sri Lanka Era já conhecida a intenção do presidente dos Estados Unidos da América, Barack Obama, em reforçar a presença militar no Afeganistão. O presidente vem agora pedir tempo para “realizar progressos” de uma forma “racional”. A situação de violência tem-se agravado nos últimos meses, sem que as forças militares internacionais, aí presentes, consigam controlar. Obama, apelou à coesão e solidariedade dos membros da NATO para fazer face aos ataques talibã. Um dos problemas é a fronteira com o Paquistão, que tem permitido às forças talibãs o reequipamento e formação dos seus membros. R.M.P.

O exército da Sri Lanka tomou a cidade de Mulaitivu, o último reduto do grupo rebelde dos Tigres Tâmeis. Segundo declarações do General Sarath Fonseka, esta conquista “representa 95 por cento do trabalho para derrotar” os rebeldes. Esta conquista surge quase um mês depois da tomada da cidade de Kilinochi, capital do movimento dos Tigres de Libertação da Pátria Tâmil. A origem desta guerra civil, iniciada em 1983, assenta nas pretensões da minoria tamil, em oposição à maioria cingalesa, em garantir a independência de uma pátria no território do Sri Lanka. R.M.P.


14 | a cabra | 27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira

CINEMA

ARTES FEITAS

Vicky Cristina Barcelona ”

V

DE WOODY ALLEN COM SCARLETT JOHANSSON PENÉLOPE CRUZ JAVIER BARDEM 2008

Romance para quatro nessa Catalunha adentro CRÍTICA DE DÁRIO RIBEIRO

icky e Cristina são duas grandes amigas. Apenas não partilham a mesma visão do amor. Vicky faz tudo por honrar compromissos, casando com o seu homem idealizado. Cristina, rebelde, acredita em arriscar no desconhecido. Após o recente doutoramento de Vicky, numa viagem a Barcelona, são abordadas por Juan Antonio, um pintor idealista acabado de sair de uma anterior relação muito conturbada. O convite dele inclui uma breve passagem por Oviedo, com uma noite sexual a três de permeio. Se a racional Vicky torce o nariz à arrojada proposta, já a espontânea Cristina arrasta a confidente para a aventura. Porém, as coisas complicam-se quando Doug, o noivo de Vicky, e Maria Elena, a caótica ex-mulher de Juan Antonio, se juntam ao ramalhete. Se, num realizador tão reconhecido e profícuo como Woody Allen, muitos não conseguem

acompanhar todas as obras de tão vasta filmografia ao ritmo que elas vão estreando, sabemos também que existe sempre a hipótese de a próxima ser melhor do que a anterior. A um fracasso comercial que foi “Cassandra’s Dream”, sucede o regresso a um terreno já muito explorado por Allen, desde as buscas do sentido da vida, passando pelos desejos sexuais, até às obsessões. As conhecidas marcas autorais também se fazem notar. Estão lá as neuroses, os complexos de culpa, os diálogos assertivos que motivam (e são) a própria acção, a mais recente musa (Johansson) e até um narrador, desta vez infelizmente, redundante e desnecessário. Mas a verdadeira diferença está no argumento aprimorado por um Woody Allen refinado, com um “quarteto amoroso” muito apelativo, onde podemos olhar um pouco de Allen himself reflectido em cada um dos constituintes desse conjunto de amantes. É verdade que o filme ganha

mais interesse, a meio, na tour de force de uma alienada Penélope Cruz. Mas os restantes actores principais complementam-se bem, num misto de sensibilidade e sensualidade, habilmente seguidos pela câmara do (desta vez apenas) realizador. Todos enquadrados, não na cidade natal de Allen, mas numa Espanha iluminada em tons dourados, em vários locais onde este Allen vintage se diverte a chocar o puritanismo norte-americano contra a fogosidade de nuestros hermanos. E não é só em pormenores que Allen mostra admiração por Gaudi ou Barcelona, mas também em planos abertos, outrora dedicados com tanto fulgor apenas a Manhattan e arredores. Porém, também percebemos que não há amor como o primeiro. Talvez por isso que, apesar de tudo, “Vicky Cristina Barcelona” seja apenas mais um postal, fugazmente apaixonado, desse turista nova-iorquino de passagem pela Europa.

O Estranho Caso de Benjamin Button”

B

enjamin Button nasceu sob circunstâncias inusuais. É desta forma que Brad Pitt apresenta o seu personagem poucos minutos depois do início da projecção. Mas a verdade é que a palavra “inusual” cedo se começa a revelar muito pobre para classificar o sucedido. Com poucas horas de vida, o organismo de Button apresenta todos os defeitos (chamemos-lhe assim) próprios de uma pessoa em idade avançada. A sua mãe não sobreviveu ao parto e o seu pai, horrorizado, resolve desfazer-se dele abandonando-o à porta de uma casa de idosos (requintada metáfora). Felizmente é recolhido por Queenie, mulher

crente em Deus de coração generoso, que o recebe como seu filho e lhe dá todo o amor e cuidados necessários para sobreviver. O inesperado acontece quando Benjamin começa estranhamente a rejuvenescer. Partindo deste conceito, o argumentista Eric Roth (timidamente inspirado no conto homónimo de F. Scott Fitzgerald) com a ajuda imprescindível de David Fincher, consegue criar uma das mais intrigantes e charmosas fábulas sobre o sentido da vida alguma vez projectadas no grande ecrã. “O Estranho Caso de Benjamin Button” é uma película de proporções épicas (as suas quase três horas não enganam) que

nos conduz através da vida de um rapaz que se viu forçado a amadurecer cedo de mais. Sem ser melodrámatico, Fincher obriga o espectador a uma conexão emocional única e real com os personagens e situações que vai fazendo desfilar no ecrã. Algumas das sequências chegam mesmo a roçar a genialidade (veja-se a forma engenhosa como o realizador resolveu filmar um simples acidente). No entanto não é um filme de actores. Cate Blanchett e Brad Pitt estão bem, mas sem nunca deixar de ser funcionais. A magia de Benjamin Button é muito mais profunda.

MILENE SANTOS

DE

DAVID FINCHER COM

BRAD PITT CATE BLANCHETT TARAJI P. HENSON 2008

Uma vida do avesso


27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira | a

cabra | 15

ARTES FEITAS

OUVIR

LER

Merriweather Post Pavillion” “A quase tropicalidade da nova pop ibérica”

esmo entre aqueles que não acharam Strawberry Jam um quase imperdoável mergulho nas águas turvas da mediocridade (entre os quais me incluo, diga-se), persistia a dúvida se os Animal Collective, apesar de continuarem a conseguir bons momentos no seu estilo que, apesar de já frequentemente imitado continua a ser único e intocável, não teriam entrado numa certa “normalidade”, se se teriam esquecido de todas as coisas bonitas e fora do comum que já nos tinham dado. Parece que a resposta é um categórico “NÃO”, posDE sivelmente sublinhado com ANIMAL COLLECTIVE um “porra!”. EDITORA O trio de Maryland (DeaDÓMINO kin ficou de fora) volta a ser brilhante em Merriweather 2009 Post Pavillion (MPP), mesmo que ouvir o álbum não aperte o coração de felicidade com a mesma intensidade de Feels ou de Sung Tongs , mesmo que não tenham aprendido a lição de concisão de alguns dos grandes discos do ano passado (Abe Vigoda, Times New Viking…), e tenham algumas canções pouco menos que dispensáveis, como Lion in a Coma. À parte isso, os Animal Collective voltam a roçar a perfeição em vários momentos ao longo de MPP: É a estrutura, o refrão e as palmas na maravilhosa My Girls, é o êxtase de Summertime Clothes a cantar-nos “I wanna walk around with you/ just you, just you”, é o sol de uma cidade que Noah Lennox vê como quase tropical em Brothersport a aquecer a pele e a encadear-nos. A quase tropicalidade da nova pop ibérica (ou, pelo menos, com alguma ligação à península), que os Animal Collective já tinham tocado, por exemplo no EP Water Curses, e que aqui é também evidente, por exemplo, na complexa Bluish merece, aliás, alguma reflexão. Mas só depois do final de “Merriweather Post Pavillion”. O tempo em que o álbum estiver a tocar é de contemplação jubilosa: Corações ao alto! Estão de volta os velhos Animal Collective!

M

O Arquipélago da Insónia”

Intervalos de Silêncio

DE

ANTÓNIO LOBO ANTUNES EDITORA DOM QUIXOTE 2008

faz o leitor sentir-se perdido e ao mesmo tempo maravilhado. Espécie de chamada contínua para a descoberta – do mistério que encerramos dentro de nós – não na fórmula de resposta, mas como objecto de procura. À semelhança de um sonho, também a narrativa não obedece a uma sequência temporal, esta pára, avança, irrompe sem se apagar no emaranhado de vozes que a consomem. Um ritmo inquietante, delirante cercanos ao longo do discurso narrativo. As palavras interrompem-se – são cortadas – literalmente, sugerindo uma ginástica na leitura, que desperta. Em todas as páginas uma melodia rasgada que emociona sobretudo quando os espaços brancos, que separam as palavras, se abrem, e nisto, estamos a fazer parte do clã, ao qual pertence o “idiota” – as mesmas vozes sem nome que existem dentro de nós – os sentimentos contraditórios. Longe de contar apenas uma história, subterfúgio ficcional – até porque os bons romances, como Lobo Antunes assume, não contam histórias mostramnos a nós mesmos – aproxima-se do seu objectivo: escrever palavras que não estejam lá, mas possam ser lidas. E assim, do princípio ao fim, a sentirmo-nos pequenos, e a crescer com as palavras (por dentro) – a completar o silêncio.

FÁTIMA ALMEIDA

VER

O Caimão” “

Berlusconi a três tempos

JOSÉ AFONSO BISCAIA

GUERRA DAS CABRAS A evitar Fraco Podia ser pior Vale a pena FILME

A Cabra aconselha A Cabra d’Ouro

EXTRAS

Artigos disponíveis na:

O

Arquipélago da Insónia”, a obra mais recente de António Lobo Antunes, tem como pano de fundo um Portugal Rural. Numa Herdade, à margem, (do rio que corre para a Trafaria), constrói-se a história – que não se conta – da ascensão e declínio de uma família latifundiária, ao longo de três gerações. No início há uma casa que “apesar de igual quase tudo lhe falta”. Nela as pessoas, agora, são fotografias antigas a saltarem entre a vida e a morte – misturando-se – numa polifonia de sons feitos de sombras em torno de vozes que se somam na cabeça de um autista. Há um avô (a comandar o mundo), empregadas submissas (agarram-lhes o pulso - “chega cá”), uma avó (a tremer ao compasso de uma chávena num pires), e dois irmãos, (um que é o autista: “não responde a nada, interessado na música”, um feitor (“a disparar de olhos fechados”) e um ajudante, um pai (o meu avô a passar por ele e – “Idiota”), uma mãe (“sempre de costas para mim”). Outras personagens se acrescentam a estas, e todas tornam a narrativa mais densa de um sentido que se apura na terceira parte do livro. Isto porque outras vozes surgem, conjunto da mesma voz, a confirmar o sonho como se fosse a realidade. O livro assenta numa construção complexa – genial – na forma como o autor

DE

NANNI MORETTI EDITORA ATLANTA FILMES 2007

impossível que ninguém em Itália tenha feito um filme sobre Berlusconi”, comenta a certa altura Teresa (Jasmine Trinca). Este deve ter sido, aliás, o pensamento que passou assaltou Nanni Moretti, quando idealizou “O Caimão”. Em vez de optar pelo simples documentário ou por uma narração explícita da vida do primeiro-ministro italiano, Moretti cria um enredo em que Berlusconi aparece representado em três linhas de exposição que se cruzam ao longo do texto: a do guião da jovem cineasta Teresa, que juntamente com Bruno Bonomo (Silvio Orlando), um realizador conservador, falhado em todos os aspectos da sua vida, tenta concretizar numa película; a das imagens reais (que não surgem de forma inocente), que os dois personagens visionam ao longo da história e a do Berlusconi, que aparece figurado no Caimão de Teresa (o filme dentro do filme), interpretado por Moretti. Mas Caimão é mais do que a elementar exposição da vida de Berlusconi. Talvez inspirado pela herança do realismo de Rosselini (bem presente na sequência de um barco a

É

percorrer as ruas de Roma) e de De Sica, Moretti retrata uma Itália desprovida de toda a imagética histórica a que Bertolucci nos habituou. Sob a alçada da Atlanta Filmes, esta edição de DVD presenteia-nos dois discos. O primeiro, inteiramente dedicado ao filme, e um decepcionante trailler, e o segundo repleto de extras, entre estes encontramos o Diário do Caimão, um documentário de uma hora sobre a rodagem do filme, com testemunhos dos vários actores. Ainda no segundo DVD, podemos deliciar-nos com uma entrevista de Carlos Vaz Marques, o do Pessoal e Intransmissível, a Moretti, algumas cenas cortadas e, finalmente, a ‘piéce de resistance’, a cereja no topo do bolo, parte da ante-estreia portuguesa do filme, no Cinema Monumental, com Moretti a interagir com o público (lembre-se que Portugal foi o único país que o realizador visitou para apresentar o filme). Este último disco assume, ainda, a função de DVD-ROM, com várias fotos da rodagem d’”O Caimão” e artigos sobre o filme.

JOÃO MIRANDA


16 | a cabra | 27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira

SOLTAS

CRÓNICA DE VIAGENS

ITÁLIA • VENEZA ANDREIA SILVA

UMA CIDADE FEITA DE ÁGUA E DE SONHOS

S

ubitamente amanheceu e do negro se fez uma imensa claridade. Desci a escadaria da estação de comboios e vi uma cidade feita de rios, barcos e velhas casas. Há como que uma passagem para um mundo diferente, numa espécie de magia. Foi assim que Veneza me surgiu. E, ao ver aqueles prédios antigos rodeados de água por todos os lados, com o sol ainda tímido por detrás do céu, senti-me parte integrante de um postal ilustrado, daqueles com imagens de sonho que nunca julgamos ser possível existirem. Mas em Veneza as imagens são reais.

VENEZA é uma cidade rodeada por rios, barcos e casas velhas

Àquela hora a cidade ainda estava a acordar, tentando fazer todas as coisas que acontecem numa cidade normal: os cafés abriam as portas, as pessoas corriam para os empregos, as crianças, de mochila às costas, percorriam, faladoras, as ruas. Mas Veneza está longe de ser normal, tendo de se adaptar ao que a natureza lhe deu para fazer as coisas do dia-a-dia: existem barcos para tudo, desde transportar comidas e bebidas para um café local, a pessoas e turistas. Continuei a caminhar pelo silêncio das suas ruas e descobri uma

Veneza algo labiríntica, com ruas muito semelhantes, que parecem ir todas dar a um mesmo ponto difícil de encontrar. Esse ponto é a famosa praça de S.Marcos, o clímax de beleza que as ruas de Veneza vão antevendo aos poucos. Quando a encontrei já o sol iluminava todo aquele lugar imenso. E aqui importa respirar a praça cheia de pessoas, o rio ali tão perto coberto de raios dourados, as gôndolas azuis à espera de partirem, e, ainda assim, os pombos que atacam quando menos esperamos. Sendo a cidade também famosa

JANEIRO DE 1999 • EDIÇÃO N.º 44 • QUINZENAL • GRATUITO

CAPOTE NA PRESIDÊNCIA”

m Janeiro de 1999, tomava posse, como presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Hugo Capote. A CABRA destacava o facto de Capote ser “o novo líder da AAC até ao final do milénio”. A cerimónia estava marcada para o fim da tarde do dia 19, na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universi-

E

dade de Coimbra. Além do próprio presidente eleito, a tomada de posse ia ser marcada pelos discursos do reitor Fernando Rebelo e do presidente cessante, António Silva. O Jornal Universitário de Coimbra tentou descobrir que temas iam ser abordados nos discursos. Fernando Rebelo, que assistia “pela primeira vez como reitor à posse dos dirigentes estudantis”, ia falar de “um assunto externo à universidade”: a co-incineração, antecipava A CABRA. “Diz respeito a todos nós”, defendeu na altura. Política educativa, o Pólo II, o Centro Cultural D. Dinis e o parque desportivo previsto para esse espaço seriam os outros assuntos escolhidos pelo reitor. A Lei do Financiamento do Ensino Superior também ia ser abor-

dada, mas o reitor não adiantava posições, referindo que o desenvolvimento da contestação da lei na academia coimbrã iria depender da política da nova DG. Quanto às palavras de Hugo Capote, o jornal universitário escrevia que o estudante de Medicina estava “cauteloso”. “O novo presidente pouco revela acerca das matérias que vai abordar durante a sua intervenção, limitando-se a garantir que focará os pontos essenciais da política que tenciona desenvolver”, podia ler-se. Num outro artigo, A CABRA tinha “Hugo Capote em pessoa”, no qual o novo presidente era descrito como “alentejano, benfiquista e comunista”. António Silva, o presidente cessante, que tinha conduzido a

pelo seu carnaval, vale a pena comprar uma máscara. Há para todos os gostos e em todo o lado, desde as mais simples até as que têm cristais Swarovsky incorporados. Sendo bela à primeira vista, Veneza pode tornar-se uma contradição. Quem chega com a ideia de romantismo, corre o risco de se deparar com uma cidade rodeada de água por todos os lados, um labirinto de ruelas, gôndolas e canais, onde é muito fácil perder-se. Outros é que levam dela recordações para uma vida inteira. Injustamente, a beleza da cidade depende muito do tempo. Com sol Veneza é

maravilhosa, especialmente ao fim do dia, em que as águas do rio brilham, onde o prateado das águas se misturam com os raios dourados do sol. Com chuva, a cidade torna-se uma amálgama confusa de céu cinzento com demasiada água, para além de haver a possibilidade de encontrar lixo acumulado á beira dos rios, nos passeios. Para mim, Veneza surgiu-me bela, e assim ficou. Tive a sorte de, ao me despedir dela, ver as suas águas prateadas, enquanto o sol me dizia adeus. Por Andreia Silva

18ºANIVERSÁRIO A CABRA sai do arquivo...

academia nos últimos dois anos, anunciava que ia procurar fazer um balanço da sua direcção, dando como exemplo a criação do Conselho Desportivo da AAC e a actualização dos protocolos com o Ministério do Ambiente. A aposta nas saídas profissionais e o equilíbrio financeiro eram objectivos que considerava realizados. Antes de dizer adeus, António Silva sublinhava que, relativamente à Lei do Financiamento do Ensino Superior, a DG/AAC tinha empreendido “uma grande

luta”, que deveria ser continuada pela nova direcção. Catarina Domingos


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cabra | 17

O MUNDO AO CONTRÁRIO

SOLTAS

MEXICO Os incómodos vestígios de pastilha elástica, pisados e repisados, nos passeios deixaram de ser um problema no México, após a aquisição, por parte do governo, de vários sistemas de limpeza a vapor. Contudo, segundo o jornal Globo, a iniciativa foi mais longe quando avançaram com uma campanha que pede aos habitantes que engulam as pastilhas.

TEM DIAS... Por Licenciado Arsénio Coelho

EM EXAMES

O

que estás a fazer com este jornal na mão? Larga isto.

Estás em exames, lembras-te? Não podes ocupar o cérebro com crónicas

CARICATURA POR GISELA FRANCISCO E ILUSTRAÇÃO POR TATIANA SIMÕES

JAPÃO Com a chegada dos exames, um pai japonês de 54 anos apoquentou-se mais do que o seu filho. Assim, disfarçou-se, colocou uns óculos, alisou o cabelo e tomou o lugar do filho na realização da prova. Os professores acabaram por descobrir facilmente a golpada, relata a CNN. Inquirido, o filho alegou que não sabia de nada. EUA Segundo a agência AP, na cidade de Bismark, uma jovem de 17 anos telefonou para a esquadra da polícia, local onde denunciou uma situação de condução sobre efeito de álcool. A condutora era, porém, a própria jovem. A polícia acabou por deter a adolescente, que confirmou ter conduzido várias horas embriagada. João Miranda

idiotas. Há todo um mundo de Ciências Biológicas e Biomédicas à tua espera. A época de exames faz Coimbra parar. As pessoas (ou melhor, os estudantes) comportam-se como se houvesse uma espécie de vírus no ar. Arrastam-se pelas ruas com a pele macilenta e livros fotocopiados debaixo do braço. Quando és pequeno e vives sem exames és feliz. Vais à pré-primária, depois à primária. Fazes ditados, desenhas uma tartaruga ninja, fazes outro ditado, desenhas um carro. És afortunado. Eu quando tinha seis anos era a pessoa mais feliz do mundo. Ia pela rua a saltar e a cheirar as flores que encontrava na berma. Uma vez tentei apanhar um trevo que estava no meio da estrada mas infelizmente o 24 T foi mais rápido do que eu. Estive quatro meses no hospital. Mas não me importei porque não tinha exames e era feliz. Não fazia a mínima ideia do que era um 10, ou um 15, ou um 20 – se bem que ainda hoje não sei o que é um 20. Mas os anos passam e chegam os exames. O teu rosto fica mais severo e tornas-te numa criatura hostil. Não te apetece estudar. Durante a época de exames tornas-te no maior adepto do programa do Goucha, conheces todos os desenhos animados da 2 e até limpar o quarto te parece boa ideia. Claro que, como em tudo na vida, não precisas de te esforçar. Foi para isso que Deus inventou as cábulas. As cábulas são um caso raro de inversão

dos paradigmas humanos. Quanto mais pequenas melhores. Ainda hoje tenho em casa algumas que me parecem indecifráveis. Como se tivessem sido escritas num universo paralelo. O único problema das cábulas é tirálas cá para fora. A tua taxa de sucesso depende dos seres que estiverem a vigiar a sala (também conhecidos como professores). Há aqueles que se estão nas tintas – esses normalmente levam uma revista para o exame e se for preciso até se viram de costas (a consciência é uma coisa tramada). E depois há os outros. Os Dementors. São conhecidos por vaguearem pela sala de aula, com as mãos atrás das costas. Costumam parar atrás de ti para verem o que estás a escrever. Não os podes olhar nos olhos. Se o fazes nunca mais te largam. Há alturas em que te apanham a olhar para eles. Nesse momento disfarças. Olhas para o horizonte. Finges que estás a tentar lembrar-te da matéria... aquela que tens escrita na cábula que aquele filho da mãe não te deixa usar. E até começas a falar sozinho. Mas ele sabe muito bem o que estás a fazer. É como quando estão duas pessoas dentro de um carro e começa a cheirar mal. Ambos sabem o que se passou mas ninguém diz nada. É tudo uma questão de sorte. Mas de uma coisa podes ter a certeza: não é a ler isto que te vais safar Todas as crónicas em

arseniocoelho. blogs.sapo.pt

COM PERSONALIDADE ANA COELHO

MANUEL MARQUES • 33 ANOS • ACTOR

O HUMORISTA QUE NÃO É DE RISO FÁCIL É possível ser actor em Portugal, mas tem de se trabalhar muito para isso. Comecei com a Maria Rueff, a fazer pequenos papéis. Depois o Herman convidou-me para trabalhar com ele. A mim e ao Nuno Lopes. Adoro contracenar com ele. Para além da Maria Rueff ter sido uma professora nas lides do humor, o Nuno Lopes também o foi na minha formação de actor. A parte de compor uma personagem, estudar os tiques dela, a concentração, em tudo isso foi o Nuno Lopes que me ajudou. A situação do humor em Portugal não podia estar melhor, porque há imensa oferta. Há humor para todos os gostos. No humor fascina-me poder brincar com tudo e com bom gosto. Não sou de riso fácil. A coisa mais difícil no mundo é fazer rir. Acho que para ser humorista, primeiro temos que ter uma grande capacidade de auto-crítica e saber gozar connosco. Geralmente acredito sempre no que estou a fazer. Não finjo nada. Mesmo no humor não finjo. A pior coisa para um humorista é achar-se graça. Eu não acho piada nenhuma às coisas que faço. Mas espero que achem piada. A partir do momento em que eu achar muita graça ao que estou a fazer, perde a piada. Quando estou a fazer uma personagem tenho de acreditar nela. Neste momento estou a fazer três coisas que realmente adoro. É o “Portugalex”, porque adoro fazer rádio; “Os Contemporâneos”, porque é o meu género de humor e o grupo de actores com quem gosto de trabalhar; e é este musical, que era um sonho que tinha em fazê-lo. Não era grande fã de musicais, mas vi “Os Produtores”, em Londres, pela primeira vez, e fiquei completamente apaixonado, porque tem o humor do Mel Brooks, que eu adoro. Nunca acreditei que fizessem este musical em Portugal. Significa muito para mim. Eu gosto de fazer televisão a partir do momento em que esteja a fazer aquilo que gosto de fazer. Tenho tido a felicidade de fazer o que realmente me interessa. Paralelamente à comédia interessa-me fazer cinema e papéis mais sérios; não ficar rotulado como o “palhaço de serviço”. Mas interessame fazer outras coisas, e tenho feito, não tanto como gostaria, mas tenho feito. Gostava de fazer cinema e papéis sérios. Já experimentei drama e gosto muito.

É muito mais difícil fazer rir do que fazer chorar, todos os actores dizem isto, eu sei, mas é mesmo muito mais difícil. Entrevista por Diana Craveiro


18 | a cabra | 27 de Janeiro de 2009 | Terça-feira

OPINIÃO

D.R.

O RACISMO ESTÁ CADA VEZ MAIS ENRAIZADO NAS INSTITUIÇÕES SOCIAIS DA CIDADE DE

COIMBRA

Hector Costa *

Mesmo na UC (...) há indicadores da selecção racial e da inferiorização cognitiva da população negra

Cartas ao director podem ser enviadas para

acabra@gmail.com

O racismo é a crença segundo a qual as capacidades humanas são determinadas pela raça ou grupo étnico, muitas vezes expressa na forma de uma afirmação de superioridade de uma raça ou grupo sobre os outros. Ou seja, é entendido como uma manifestação particular do preconceito negativo. Gaertner e Dovidio (1986;1998) propõem na sua teoria um novo aspecto: o racismo aversivo, distinto do racismo tradicional. O racismo aversivo procurará encontrar uma justificação que não seja definida socialmente como racista para um comportamento racista. Vala, Brito e Lopes (1999) distinguem entre racismo subtil e racismo flagrante, de acordo com a conceptualização de Pettigrew e Meertens (1995). O racismo subtil e o racismo flagrante funcionam de forma diferente. O racismo flagrante assenta numa atribuição de traços estereotípicos negativos aos negros. Já o racismo subtil assenta não nessa utilização dos estereótipos negativos, mas na negação de atributos positivos a este grupo. Factos: O racismo em Portugal, bem como na Europa é objecto de censura pública. Apesar do racismo ser anti-normativo e contrário ao princípio democrático da igualdade, ele persiste assumindo expressões subtis. A cidade de Coimbra é exemplo disso mesmo. Assiste-se sociológicamente nesta cidade, a persistência do racismo do tipo subtil. Isto é, a população estudantil africana é sistematicamente vítima da diabolização e marginalização por parte das instituições sociais radicadas na cidade. Caros(as) leitores(as) se tiverem a possibilidade de olhar as paisagens sociais dos grandes Centros Comercias , tais como , o Continente , Worten e a Vobis e, se se dirigirem ao Teatro Académico Gil Vicente, bem como ao café do mesmo, irão constatar que, por um lado, existe uma selecção racial dos seus colaboradores (trabalhadores) e, por outro lado, o atendimento é insólito, irónico, hipócrita e desigual, quando se trata da população afri-

cana. A situação torna-se mais grave e inquietante, no domínio da inserção no mercado de trabalho. Desde já, a taxa da exploração das relações laborais, do trabalho informal e “escravo” são mais elevadas para esta população. Na cidade em epígrafe, não basta ter um bom curriculum vitae técnico ou académico, é preciso e fundamental ser-se branco ou pintar-se de branco para a partir daí ter acesso ao mundo do contrato social ou ter acesso a cidadania, respeito e a dignidade humana. Caros(as) leitores(as) , não pensem que esta atitude é inerente aos grupos socias sem a capacidade reflexiva ou académica. Pois, mesmo na Universidade de Coimbra, nomeadamente nos serviços centrais de atendimento ao público, em algumas faculdades, nos grandes centros de investigação, onde paradoxalmente, se produzem teorias e conhecimentos ditos científicos, há indicadores da selecção racial e da inferiorização cognitiva da população negra. Ou seja, estamos perante a “ morte” da Universidade, pois, ela já não consegue produzir Homens socialmente competentes, reflexivos ou auto-reflexivos, capazes de contribuir para a transformação ascendente da comunidade humana. A universidade na nova era do capitalismo, especializou-se na produção/reprodução da ignorância. Eu não pretendo com estas asserções existenciais lutar para conseguir um lugar na “Liga dos Últimos” do estrato social em Portugal, nem tão pouco na Universidade de Coimbra. Estas afirmações são, frutos da minha capacidade reflexiva, enquanto cidadão do mundo, enquanto sociólogo crítico e transformador social que tem o sonho de um dia ver o mundo humano, justo, inter-racial, includente, em suma, que possamos transformar o mundo numa verdadeira “comunidade humana”, onde os laços sociais são baseados nos afectos, e não na superficialidade. * Mestrando em Sociologia na Faculdade de Economia da UC

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OPINIÃO “TEMOS CONDIÇÕES PARA CONSTRUIR A UNIVERSIDADE DE REFERÊNCIA QUE AMBICIONAMOS”

EDITORIAL REGULAMENTO NÃO RESOLVE PROBLEMA ESTRUTURAL

João Filipe Queiró *

Convida-me a direcção d’A CABRA, na minha condição de membro do Conselho Geral da Universidade, para um depoimento sobre o futuro da Universidade de Coimbra. Aproveito a oportunidade para uma curta exposição da actividade do Conselho desde a sua eleição no passado dia 24 de Novembro. O Conselho Geral da Universidade de Coimbra vem, com passos seguros e com o espírito correcto, cumprindo a primeira fase das suas obrigações. Em 6 de Janeiro foram cooptadas – por unanimidade – as dez personalidades externas, cujo nome e capacidade falam por si. Todas têm experiência de direcção de grandes organizações. Três são doutoradas – mas com profissões não académicas. Oito foram estudantes da Universidade de Coimbra, o que poderá potenciar a sua dedicação aos trabalhos do Conselho. Todas juntas, representam uma boa diversidade de áreas de intervenção, da cultura à ciência e à comunicação, da sociedade à política e à economia. Em 10 de Janeiro foi eleito Presidente do Conselho Geral o Dr. Artur Santos Silva, prestigiada personalidade do nosso país, antigo estudante e docente da Universidade de Coimbra, com experiência de altas responsabilidades nos campos político, económico, social e cultural. O próximo desafio do Conselho será organizar-se de forma ao seu trabalho futuro poder ser eficaz e produtivo, para que o órgão seja uma sede de supervisão e estratégia útil à universidade. O défice na concepção e avaliação estratégica, na organização e coordenação dos órgãos de governo e na circulação da informação foi recentemente apontado como uma deficiência da Universidade de Coimbra. É responsabilidade do Conselho Geral contribuir para colmatar esse défice. E isso passa também, de forma decisiva, pela sua organização e eficiência internas. Por obrigação estatutária, será em breve promovido um debate aberto e profundo sobre a conveniência ou não de proceder a uma reestruturação dos saberes, com eventual influência na estrutura orgânica da

universidade. Para além disso, a nossa ambição deve ser reforçar a Universidade de Coimbra como centro de saber, cultura e ciência, mas também de organização, responsabilidade, serviço e respeito pelos estudantes que nos procuram. A situação actual não é fácil, num momento em que aos drásticos cortes orçamentais se junta a crise financeira e económica, e em que à conhecida hostilidade ministerial em relação às instituições se junta uma cultura de propaganda, a que a universidade é naturalmente avessa. Mas a Universidade de Coimbra revela novos dinamismos em muitos sectores, os cursos vêm conseguindo atrair bons estudantes de variadas proveniências, as unidades de investigação obtiveram classificações elevadas na recente avaliação internacional da investigação científica, colocando a universidade em boa posição a nível nacional. Temos uma boa base para melhorar em muitos aspectos. Isso é missão de todos. Numa circunstância envolvente tão difícil, cada estudante, cada funcionário, cada professor e cada investigador têm uma responsabilidade comum: a Universidade de Coimbra são eles. As verdadeiras instituições caracterizam-se pela continuidade e pela assunção da sua cultura pelos seus membros. Mas a força vem-lhes também da capacidade de adaptação e transformação. A Universidade de Coimbra tem uma cultura institucional suficientemente forte para atravessar dificuldades, com diferentes leis e diferentes governos. Mas a Universidade e os seus membros – estudantes, funcionários, docentes e investigadores – não devem fechar os olhos ao mundo que os rodeia e à evolução do contexto em que as questões do ensino superior se colocam. Se não olharmos demasiado para dentro nem nos agarrarmos ao passado, temos condições para construir a universidade de referência que ambicionamos. * Docente da Faculdade de Ciências e Tecnologia e membro do Conselho Geral da UC

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Quando em 1999 foi assinada a Declaração de Bolonha, um dos pressupostos que o documento incluía era a dinamização de uma, efectiva, avaliação contínua nas instituições do ensino superior, ideia essa que se reforçou e foi desenvolvida na reunião de Praga, em 2001. Passados três anos da implementação dos princípios de Bolonha na Universidade de Coimbra (UC), e um ano da aplicação em pleno, a situação não sofreu grandes evoluções. E se a culpa é muitas vezes depositada nos estudantes, que “não gostam de ir às aulas” e que “não querem fazer nenhum”, a verdade é que se torna muitas vezes impossível a esses mesmos estudantes assistir às aulas. A falta de docentes em várias licenciaturas, a acumulação dos blocos de horários, a concentração de um grande número de estudantes em poucas turmas e, muitas vezes, as próprias restrições criadas pelas infra-estruturas implicam a limitação das vagas de inscrições para avaliação contínua. Um novo regulamento de avaliação aplicado a toda a UC poderá criar algumas soluções, contudo, o problema é mais profundo e nunca poderá ser resolvido no clima de cortes orçamentais que o ensino superior vem sofrendo.

A concentração de um grande número de estudantes em poucas turmas implica a limitação das vagas de inscrições para avaliação contínua

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Hoje no Auditório da Reitoria vai ter lugar a tomada de posse da nova Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra. Não podemos falar num virar da página para um novo capítulo da associação, até porque a actual direcção já admitiu continuar o trabalho da cessante. Num momento de graves ataques ao ensino superior e em que se perspectiva o agravamento da situação actual, exige-se desta nova direcção que cumpra os propósitos a que se propôs e que esteja vigilante e sempre presente nas faculdades e departamentos a informar os seus pares. Mas exige-se mais, exige-se que saibam dar combate às políticas governamentais para o ensino, e que saibam envolver os estudantes nesse mesmo combate. Para que se cumpra, em parte, a vontade do Governo e 2009 seja mesmo o “Ano do Ensino Superior”. João Miranda

A CABRA ERROU Um erro de paginação na infografia que representava o mapa mundo e os momentos mais marcantes do ano de 2008, constante das páginas centrais (10 e 11) da última edição do Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA (n.º 190), criou uma alteração na correspondência entre a imagem e o texto. Aos leitores, pedimos desculpa pelo lapso. A direcção

Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA Depósito Legal nº183245/02 Registo ICS nº116759 Director João Miranda Editor-Executivo Pedro Crisóstomo Editora-Executiva Multimédia: Vanessa Quitério Editores: Ana Coelho (Fotografia), Cláudia Teixeira (Ensino Superior), Sara Oliveira (Cultura), Catarina Domingos (Desporto), Marta Pedro (Cidade), Rui Miguel Pereira (País & Mundo), Diana Craveiro (Ciência & Tecnologia) Secretária de Redacção Sónia Fernandes Paginação Pedro Crisóstomo, Sónia Fernandes, Tatiana Simões Redacção Adelaide Batista, André Ferreira, Andreia Silva, Carolina de Sá, Eunice Oliveira, Filipa Faria, Hugo Anes, João Picanço, João Ribeiro, Patrícia Gonçalves, Patrícia Neves, Pedro Nunes, Tiago Carvalho, Vanessa Soares Fotografia André Ferreira, Caroline Mitchell, Daniel Tiago, João Ribeiro, Pedro Coelho, Pedro Monteiro, Tiago Carvalho Ilustração Gisela Francisco, Marco Moura, Rafael Antunes, Tatiana Simões Colaboradores permanentes Ana Val-do-Rio, Carla Santos, Carlo Patrão, Cláudia Morais, Dário Ribeiro, Emanuel Botelho, Fátima Almeida, Fernando Oliveira, François Fernandes, Inês Rodrigues, José Afonso Biscaia, Milene Santos, Pedro Nunes, Sofia Piçarra, Rafael Fernandes, Rui Craveirinha Publicidade Sónia Fernandes - 239821554; 914926850 Impressão FIG - Fotocomposição e Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra


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Página Web UC

A página Web da Universidade de Coimbra (UC) é a 14.ª europeia mais vista e a 43.ª do mundo, segundo o mais recente ranking do International Education Directory of Colleges and Universities, que usa como indicador os motores de busca Google, Yahoo e Alexa. Este número adquire ainda mais importância, tendo em conta que Portugal nunca teve uma posição tão elevada e em estudo estavam 8750 universidades. C.D.

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AAC/OAF

Domingos rejeitou tratar-se da melhor exibição da Académica esta temporada e chamou ao encontro com o Guimarães “um jogo com intensidade”. Independentemente disso, a Briosa, depois do triunfo sobre os vimaranenses, dobra a primeira volta com 17 pontos, o melhor registo em sete anos. Ainda falta outra metade, mas este é o caminho para a manutenção. Para já os estudantes estão cinco pontos acima da zona perigosa. C.D.

André Oliveira

Notas sobre arte...

Num mandato que ficou marcado pela revisão dos Estatutos da Universidade de Coimbra e pela eleição do Conselho Geral, e de uma entidade externa e privada para seu presidente, esperava-se mais do que distribuições de electrodomésticos e inaugurações de ginásios dos órgãos gerentes da AAC. André Oliveira prometeu uma imagem mais credível da associação académica, mas para quem? C.T. PUBLICIDADE

A Sesta • João Mendes Ribeiro Cenografia • 2009

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A apropriação do objecto e a transformação do seu maior significado em algo palpável, protagonista de si só, é uma ideia que foge ao simples olhar desnudado. Na junção da arte física com a arte da imaginação tudo é possível. A imagem e a cenografia só ganham real sentido integrados no híbrido sentido da fusão dos géneros artísticos. O transpor das barreiras conceptuais explora o espaço e o ser que ousa penetrar nesse mesmo espaço e dar-lhe forma. Num contributo incisivo, a mistura entre a representação e o ambiente físico da arte criam uma linguagem vivificadora das emoções que cada espectáculo acarreta. “Arquitecturas em Palco” apresenta o trabalho de um homem ligado fortemente a Coimbra. João Mendes Ribeiro vive a arte de criar espaços para as pequenas estórias que bailarinos dão corpo e coreógrafos idealizam. Os elementos que rodeiam o palco misturam-se confundindo o ambiente imaginário com novos lugares e

realidades. E o espírito do experimentalismo das sensações renomeia a concepção da cenografia. O projecto do arquitecto, professor e ideário das cenografias , aparece como forma de discussão do papel dos espaços físicos na vida de um palco. Em “A Sesta”, revivem-se memórias. As “malamesa” apoderam a realidade que se conjuga com uns bailarinos com cabeça de animais. A impossibilidade de usufruírem do manjar dos deuses terrestres enfurece-os. O arrancar das toalhas acompanha-os no trajecto até à sesta reconfortante e, no imaginário de cada um, fica a sensação de liberdade. A exposição já recebeu a medalha de ouro na categoria “Best Stage Design”, percorreu Barcelona, São Paulo, Porto, Lisboa e Aveiro. “A Sesta” e outros quadros com cenografias de João Mendes Ribeiro podem, agora, ser vistos até 28 de Fevereiro, no Teatro da Cerca de São Bernardo. Por Vanessa Quitério

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