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Desvio de finalidade do papel imune

No período de 2012 a 2021, configurando crime, 3,15 milhões de toneladas de papel imune destinadas a fins editoriais foram utilizadas indevidamente para produtos comerciais e promocionais.

De acordo com levantamento efetuado pela Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), R$ 3,5 bilhões deixaram de entrar nos cofres públicos em dez anos, no período compreendido entre 2012 e 2021, em decorrência do desvio de finalidade do papel imune. Desse total, a perda na arrecadação de impostos foi de 55% na esfera federal e de 45% para os Estados. À margem da lei, 3,15 milhões de toneladas de papel imune foram desviadas irregularmente para a impressão de produtos comerciais e promocionais.

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Instituído pelo Artigo 150 da Constituição Federal, o papel imune é aquele destinado à impressão de livros, jornais e publicações periódicas, que, para impulsionar a cultura e a educação, possui isenção de tributação em relação ao papel de uso comercial. O desvio de finalidade se dá quando esse papel, imune de tributação, é usado para outros fins, o que configura um crime fiscal.

“O desvio de finalidade de papel imune lesa o País de diferentes maneiras. Em primeiro lugar, a perda de arrecadação tira do poder público um montante que poderia ser investido em melhorias para a sociedade. Por outro lado, concorrencialmente torna o mercado desigual, uma vez que quem opera ilegalmente o papel imune trabalha com preços abaixo do mercado porque deixa de recolher os impostos devidos”, comenta José Carlos da Fonseca Jr., diretor executivo da Ibá.

Segundo os números da Ibá, os Estados com maior desvio de papel imune, considerando-se o valor representado, foram: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná. Somente nesses cinco Estados, a perda de arrecadação atingiu a soma de R$ 2,2 bilhões de 2012 a 2021.

COMBATE À FRAUDE

Há anos, a Ibá e outras entidades do setor vêm atuando junto aos governos estaduais para que as secretarias da Fazenda façam a regularização e aprimoramento do Sistema de Registro e Controle das Operações com Papel Imune (Recopi Nacional), que visa a auxiliar no controle das empresas que operam com o papel destinado a esse uso. Em paralelo ao trabalho do Recopi Nacional, a Ibá, desde 2016, vem tratando do problema de desvio de finalidade do papel imune junto à Receita Federal. A partir de 2017, o papel imune foi incluído no Plano Anual de Fiscalização. No final de 2021, a Ibá e a Receita Federal firmaram um convênio de cooperação técnica para a detecção de fraudes fiscais e aprimoramento dos mecanismos de controle e fiscalização. Em 2022, a entidade levou idêntica proposta para a Sefaz-SP e, depois, pleiteou o mesmo junto aos fiscos dos Estados de Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro.

A Es Da Abigraf

A exemplo da Ibá, a Abigraf Nacional há décadas atua fortemente, por iniciativa própria e em conjunto com outras associações, no combate ao desvio de finalidade de uso do papel imune. Nesse sentido, tem apresentado repetidos pleitos junto aos governos federal e estaduais solicitando maior rigor na concessão do registro especial para operar com papel imune, bem como maior fiscalização. Paralelamente, tem desenvolvido ações de orientação e conscientização das empresas da sua base de representação, seja através de palestras e elaboração de cartilha, assim como na criação do Selo Papel Legal, desenvolvido a partir de um trabalho em parceria com a Abro, Associação Brasileira das Empresas com Rotativa Offset. O selo foi criado com o propósito de combater o uso indevido do papel imune e atestar que o papel utilizado no processo produtivo está de acordo com a legislação tributária vigente.

Para a Abigraf, uma alternativa viável para desestimular esse tipo de fraude seria reduzir a carga tributária do papel comercial. Assim, a pequena diferença não compensaria a prática do ilícito e, em contrapartida, o governo ganharia com o aumento da base de recolhimento, ou seja, apesar da redução das alíquotas, arrecadaria sobre um número bem maior de transações.

Uma luta muito antiga

Na edição nº 119 do Boletim da Indústria Gráfica, BIG , de agosto de 1960, foi reproduzido o teor de carta assinada por Theobaldo De Nigris, presidente do Sindicato das Indústrias Gráficas no Estado de São Paulo; João da Cruz Vicente de Azevedo, presidente do Sindicato da Indústria do Papel no Estado de São Paulo; e Jorge Madi, presidente do Sindicato do Comércio Atacadista de Papel e Papelão de São Paulo, dirigida a Newton de Oliveira Quirino, delegado titular do Setor de Crimes contra a Fazenda – São Paulo.

Dela, extraímos o seguinte trecho: “De acordo com os dispositivos legais que regulam a matéria, esse papel goza de tão grandes vantagens para ser usado exclusivamente para jornais, revistas e livros. Entretanto, verificou-se que, apesar da fiscalização por parte da Alfândega e da Fiban, êste papel vinha sendo usado para fins outros que não os mencionados, como, por exemplo, para embalagens em açougues, padarias, mercados, peças de automóveis, para folhetos de propaganda, programas de cinema, fitas para máquinas de calcular, cadernos, blocos, etc. Êste uso indevido do papel linha d’água vinha propiciando a intermediários inescrupulosos, com sacrifício dos cofres da Nação, lucros ilícitos que cálculos modestos orçam em cerca de três bilhões de cruzeiros anuais.” www.iba.org www.abigraf.org.br

Passados mais de 60 anos, como diz o velho ditado, continua “tudo como dantes, no quartel de Abrantes”.

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