Revista Zacatraz nº 215

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Ao assumir com um enorme orgulho e sentido de responsabilidade, no passado dia 22 de Março de 2019, a Presidência da Direcção da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, não queria deixar que as minhas primeiras palavras não fossem de agradecimento ao meu antecessor, Cordeiro Araújo, por toda a sua entrega, dedicação e esforço no desenvolvimento da imagem da nossa Associação, bem como do nosso Colégio Militar.

Dito isto, e respeitando e elogiando o trabalho desenvolvido, não nego que temos uma tarefa árdua e difícil pela frente.

Em primeiro lugar porque temos de continuar a colaborar com a Direcção do Colégio Militar, com Associação de Pais dos Alunos do Colégio Militar, com o Conselho de Delegados e com o Conselho Supremo, para que o Colégio Militar continue o seu já iniciado caminho para ser novamente reconhecido como um “Colégio de Excelência”.

Mas, um Colégio de Excelência necessita de uma Associação de referência. E a nossa

EditorialAssociação só se imporá como uma Associação de referência se for forte. Uma Associação forte necessita de sócios e sócios pagantes. Ora, nos últimos anos, não temos captado sócios e, muito menos, pagantes.

Assim, o nosso primeiro objectivo é reerguer a nossa Associação, fazendo-a crescer e ter a sabedoria de integrar, de uma forma activa, os novos Antigos Alunos do Colégio Militar.

Para tal, é absolutamente necessário que todos os Antigos Alunos sintam que a Associação lhes pode ser útil. E a Associação só é realmente útil aos Antigos Alunos se alargarmos o nosso conceito de solidariedade, para um conceito de entreajuda. A Divisa “UM POR TODOS, TODOS POR UM” tem de ser aplicável à vida real.

Não! Não podemos querer viver, crescer e ser sustentáveis, só com o orgulho de usar a “barretina” Não!

Temos de ter orgulho em demonstrar que somos organizados e que aglutinamos An-

tigos Alunos porque, efectivamente, há um conceito de entreajuda entre todos nós, sempre que for necessário e viável.

Actualizar digitalmente o “Quem é Quem” é pois indispensável.

Mas, todo este trabalho só valerá a pena se todos assumirmos o compromisso de o realizar e, seguidamente, pô-lo em prática. Vamos ao trabalho!

Chamemos para a Associação o máximo de Antigos Alunos possível e tenhamos orgulho de pertencer a uma Associação que tem um fio condutor de entreajuda.

Pelo Colégio Pela AAACM Pela nossa Divisa

“UM POR TODOS, TODOS POR UM”

3 Editorial Revista
“ZACATRAZ”
Um ZACATRAZ

Ficha Técnica

CORPOS SOCIAIS DA ASSOCIAÇÃO PARA O TRIÉNIO 2016-2018

ASSEMBLEIA GERAL

Presidente

Martiniano Nunes Gonçalves (9/1958)

Vice-Presidente João Paulo de Castro e Silva Bessa (200/1957)

1º Secretário António Luis Henriques de Faria Fernandes (454/1970)

2º Secretário Afonso Castelo dos Reis Lopez Scarpa (222/2000)

DIRECÇÃO

Presidente Filipe Soares Franco (62/1963)

Vice-Presidente José Francisco Machado Norton Brandão (400/1961)

Secretário Pedro Arantes Lopes de Mendonça (222/1958)

Tesoureiro Pedro Pinho Veloso (429/1986)

1º Vogal José Mário Fidalgo dos Santos (253/1951)

2º Vogal Manuel Agostinho de Castro Freire de Menezes (423/1955)

3º Vogal Marco António Martinho da Silva (456/1983)

4º Vogal João Luis de Mascarenhas e Silva Schoerder Coimbra (54/1984)

5º Vogal Luis Manuel Marques Cóias (190/1990)

1º Vogal Suplente Tiago Simões Baleizão (200/1987)

2º Vogal Suplente Eduardo de Melo Corvacho (343/2002)

3º Vogal Suplente Alikhan Navaz Nadat Ali Sultanali (306/2005)

CONSELHO FISCAL

Presidente António Santos Serra (95/1959)

1º Vogal Eugénio de Campos Ferreira Fernandes (180/1980)

2º Vogal Rui Manuel Gomes Correia dos Santos (225/1981)

1º Vogal Suplente Diogo Rodrigues da Cruz (504/1986)

2º Vogal Suplente Bruno Miguel Fernandes Pires (27/1995)

Ficha Técnica

PUBLICAÇÃO TRIMESTRAL

Fundada em 1965 Nº 215 Março/Junho - 2019

FUNDADOR Carlos Vieira da Rocha (189/1929)

DIRECTOR

Nuno António Bravo Mira Vaz (277/1950) nunomira.vaz@aaacm.pt

CHEFE DE REDACÇÃO

Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957) luisfbarbosa@aaacm.pt

REDACÇÃO

Pedro Manuel do Vale Garrido da Silva (53/1961) José Mário Fidalgo dos Santos (253/1951)

CAPA

O Presidente da República e a Associação

ENTIDADE PROPRIETÁRIA E EDITOR Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar

MORADA DO PROPRIETÁRIO e SEDE DA REDACÇÃO Quartel da Formação - Largo da Luz 1600-498 Lisboa Tel. 217 122 306/8 Fax. 217 122 307

TIRAGEM - 1350 exemplares DEPÓSITO LEGAL Nº 79856/94

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Isenta de registo na Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC), ao abrigo do nº 1 da alínea a), do Artigo 12º do Decreto Regulamentar nº 8/99, de 9 de Junho.

Os artigos publicados são da responsabilidade dos seus autores. Esta publicação não segue o novo acordo ortográfico.

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Curso de 1962/1969 Romagem dos 50 Anos de Saída

Curso de 1986/1994 Romagem dos 25 Anos de Saída

Curso de 2001/2009 Romagem dos 10 Anos de Saída

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Sumário 66 Figueiredo Valente. Um exemplo. 38 A Contagem do Tempo 54 Allegro Perna Santa Marta, Colombia, para o Panamá 23 Foi há100 Anos Conferência de Paz 1919
Torneio de Golfe
Almoços e Jantares do 3 de Março
Assembleia Geral Novos Orgãos Sociais
Professor Armando da Rocha Trindade (195/1947)
O Marechal António Teixeira Rebelo
A Defesa Militar da República
Portugal e o Algarve
O Batuque das Mulheres do Lugenda
Antigos Alunos em Destaque
Antigos Alunos nas Artes e nas Letras
Curso de 1952/1959 Romagem dos 60 Anos de Saída
que nos deixaram

216º Aniversário do Colégio Militar

216º Aniversário do Colégio Militar. 2 de Março

CERIMÓNIA NA FEITORIA

Da forma que já se tornou tradicional, as comemorações do aniversário do Colégio começaram manhã cedo, pelas 8H00, na Feitoria, onde se concentrou a Direcção do Colégio, os Alunos Comandante de Batalhão e a «Batalhãozinho», parte da Escolta apeada e os representantes dos órgãos directivos da nossa Associação, com o objectivo de proceder à cerimónia simbólica do acender da chama colegial e da sua transferência para o Colégio na Luz, para o antigo hospital, da Ordem de Cristo, de Nossa Senhora dos Prazeres, onde o Colégio se instalou pela primeira vez, em 1813 há mais de dois séculos.

O início das cerimónias deu-se com o Aluno Comandante de Batalhão, com a ajuda da «Batalhãozinho», a hastear a Bandeira Nacional, acto que foi acompanhado pela marcha de continência, executada por um terno de clarins e por um tambor. A Escolta apeada acompanhou o acto na posição de apresentar armas, com todos os assistentes perfilados e em respeitoso silêncio. Com a Bandeira desfraldada no topo do mastro, agitada pela leve brisa matinal,

passou-se ao acto seguinte, que consistiu em acender a Chama Colegial, acto que foi protagonizado pelo Director do Colégio, coronel de Artilharia António Emídio da Silva Salgueiro (461/1972), acompanhado pelo Antigo Aluno mais antigo presente, Raúl Miguel Socorro Folques (380/1952), Presidente da Mesa da Assembleia Geral da nossa Associação, em conjunto com o Aluno Comandante de Batalhão e com a Aluna «Batalhãozinho». Ateada a Chama, o terno de clarins executou o toque da alvorada, que é talvez o toque mais belo do conjunto de toques da ordenança. Este é sempre um acto altamente simbólico, que recorda a criação do Colégio, exactamente naquele local, na Feitoria, em 1803, pelo então Coronel Teixeira Rebelo, comandante do Regimento de Artilharia da Corte. A divida de gratidão que têm para com ele todos os Antigos Alunos do Colégio, é uma divida que nunca poderá ser saldada. É a divida resultante do privilégio de terem frequentado o Colégio por ele sonhado e iniciado, que todos queremos que continue a existir e a cultivar as virtudes militares, que constituem o seu traço identitário. Teixeira Rebelo sempre que escrevia sobre o Colégio

por si idealizado, dizia ser o mesmo um estabelecimento de Educação e Ensino, o que o colocava e queremos que continue a colocar, muito para além de um normal estabelecimento de ensino.

Para terminar a cerimónia foi aceso na chama, que se erguia altaneira, um pequeno archote, com que se fez a transferência da chama para uma lanterna envidraça, que a conduziu de seguida para a Luz, para a continuação das cerimónias no Colégio.

CERIMÓNIA NA PARADA MARECHAL TEIXEIRA REBELO

As cerimónias no Colégio iniciaram-se às 10H00, com o Batalhão, incluindo a Escolta, formado na Parada Marechal Teixeira Rebelo. O início desta parte das cerimónias coincidiu com o abrir de um Sol radioso, que se manteve até ao final do dia. Terá sido uma compensação dada por S. Pedro, para o facto de o ano passado esta parte da cerimónia não se ter efectuado, devido a uma intensa chuvada que então caiu. A compensação foi porém algo exagerada, pois o Sol forte acabou por criar dificuldades para alguns Alunos, que na

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Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa

216º Aniversário do Colégio Militar

parte final das cerimónias acabaram por ter de ser retirados da formatura. O início desta parte das cerimónias deu-se com a apresentação do Batalhão Colegial ao Director. Feita esta apresentação, foi hasteado o guião colegial no mastro da Parada, enquanto o Batalhão, acompanhado pela Banda de Música do Exército, entoava o Hino do Colégio Militar. Estava assim montado o cenário e tudo a postos, para o Presidente da nossa Associação, por deferência da Direcção do Colégio, dirigir a sua mensagem ao Batalhão Colegial. Foi esta a última vez que José Eusébio Pereira Barata Cordeiro Araújo (591/1972), cujo mandato à frente dos destinos da nossa Associação estava prestes a terminar, se dirigiu ao Batalhão naquela qualidade. Fê-lo, como é seu timbre, com uma mensagem forte, incisiva e transmitida com paixão. Reproduzimos de seguida esta mensagem.

ALUNOS DO COLÉGIO MILITAR

(Alunos do 1º Ciclo e Alunos do Batalhão Colegial)

Hoje, como Presidente da Direção da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, foi-me dada a suprema honra de dirigir algumas palavras ao Batalhão Colegial.

Aqui, na Parada Marechal Teixeira Rebelo, sobre o olhar vetusto da Cúpula da capela.

Na comemoração de mais um Aniversário do NOSSO Colégio.

Já lá vão 216 ANOS, repito, duzentos e dezasseis anos.

TODOS sabemos que o segredo desta longevidade do Colégio Militar está na sua Identidade, afirmada por sucessivas gerações numa prática de elevados Princípios e Valores e veiculada também por uma SIMBOLOGIA prenhe de significado.

Simbologia esta muito própria e particular-

mente evidenciada nas nossas comemorações, como vos sublinharei.

ALUNOS DO BATALHÃO COLEGIAL

Sim, porque NÓS somos um BATALHÃO. Sois os que hoje têm o privilégio de envergar a FARDA COR de PINHÃO, sim, porque os Alunos do Colégio Militar envergam uma FARDA.

Farda essa que não é um simples uniforme de parada ou de ostentação espúria.

É o símbolo duma Instituição cujos filhos, os Meninos da Luz, subscreveram ao longo dos tempos páginas e páginas de Serviço, Honra e Brio.

É ainda, o uniforme da igualdade entre

Alunos, aquela que não admite distinções. Igualdade essa que se materializa numa Camaradagem que une solidária e nobremente.

CAMARADAS

Sim, porque somos CAMARADAS, pois na NOSSA vivência aprofundámos uma reciprocidade de confiança e lealdade, para toda a vida.

Amanhã teremos o NOSSO grande dia, dia este que ilustra magistralmente o que é o NOSSO Colégio Militar.

Amanhã, no Desfile na Avenida, afirmaremos mais uma vez, de forma publica e inequívoca, porque somos uma INSTITUIÇÃO DE REFERÊNCIA, DISTINTA E SINGULAR.

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Guarda de Honra na Feitoria.

216º Aniversário do Colégio Militar

Tudo se iniciará no Parque Eduardo VII

Em conjunto e a uma só voz, teremos a oportunidade de entoar o HINO DO COLÉGIO MILITAR, sim, porque NÓS temos um HINO.

Depois perante o mais alto magistrado da Nação, o Presidente da República, entoaremos o Hino Nacional com aquela emoção caracterizadora daqueles que não esquecendo os seus egrégios avós assumem uma rima que liga o passado e o futuro.

Seguidamente, daremos o nosso GRITO ZACATRAZ, sim, porque NÓS temos um GRITO.

Grito que é sinal da presença do Colégio Militar e da Comunidade de todos os que envergaram a farda cor de pinhão.

Que belo prenúncio, para o desfile!

Depois tudo se inicia, num movimento único pleno de sincronismo colegial.

À frente o ESTANDARTE NACIONAL DO COLÉGIO MILITAR, sim, porque NOS foi concedida a suprema honra de empunharmos o ESTANDARTE NACIONAL.

Estandarte este, elevado por sucessivas gerações de Meninos da Luz na afirmação do nosso LEMA “SERVIR”, sim, porque NÓS temos um LEMA.

Lema este constantemente assumido perante a Nação, merecendo reiteradamente o reconhecimento Pátrio, dando-nos o profundo orgulho de ostentar as mais elevadas condecorações.

Logo depois, destaca-se o GUIÃO DO COLÉGIO MILITAR, sim, porque NÓS temos um GUIÃO.

Guião onde se evidencia a DIVISA “UM POR TODOS, TODOS POR UM”, sim, porque NÓS temos uma DIVISA. Divisa esta que a todos tanto nos diz e numa síntese suprema resume aquela tão

caraterística camaradagem, aprofundada intemporalmente no geral e na camarata. Depois … Permitam-me duas únicas particularizações

Primeiro aos RATAS

RATAS, sim, porque é com esta expressão protetora que denominamos os NOSSOS mais novos.

RATAS

Nesta altura do ano já palpita em VÓS um novo espírito de independência, mas mais que isso, de interdependência, aquilo que indicia a camaradagem, que se continuará a apurar ao longo dos anos.

RATAS

Este é o vosso primeiro desfile, no princípio a Avenida vai-vos parecer longa. Mera ilusão para um MENINO DA LUZ, sim porque sois MENINO DA LUZ. Não vos assusteis, ireis descê-la sempre no conforto do amparo Colegial e com o orgulho final de mais uma meta conseguida.

Convosco estarão os ANTIGOS ALUNOS, sim, porque NÓS temos uma expressiva e empenhada comunidade de Antigos Alunos.

Todos ostentando orgulhosamente na lapela a nossa BARRETINA, sim, porque esta é uma Barretina que fica para a vida, como símbolo inequívoco de pertença institucional e de uma camaradagem transgeracional;

Todos eles vos incentivarão no seu vocabulário próprio, por vezes incompreensível e rude, mas sempre motivador, por VÓS e em vossa honra se sublimarão em enormes Zacatrazes.

mento e não cala as lágrimas de profundo orgulho pelo vosso brio.

FINALISTAS

GRADUADOS, sim, porque NÓS temos

GRADUADOS

Este será o vosso último desfile envergando a Farda Cor de Pinhão.

Sem dúvida, um misto de Orgulho e Nostalgia, que será bem evidente nos abraços finais e nas lágrimas fraternalmente derramadas no Palácio da Independência.

Para vós um particular e fraterno abraço, de quem sentiu essa especial emoção há precisamente 40 anos atrás.

Também convosco tereis os vossos familiares, sim porque NÓS pertencemos a uma enorme e intensa FAMÍLIA COLEGIAL; Uma FAMÍLIA que sente o vosso empenha- Içar da Bandeira Nacional na Feitoria.

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216º Aniversário do Colégio Militar

MENINOS DA LUZ

TODOS, novos e mais antigos

Amanhã TODOS iremos desembocar no Rossio.

O mesmo Rossio onde há 100 anos atrás a Companhia de Alunos do Colégio Militar, no funeral do Presidente Sidónio Pais, se manteve serenamente composta, impassível e disciplinada, perante uma multidão completamente desvairada e em debandada.

Esta cena, gravada na imaginação de muitos portugueses e que constitui sem dúvida uma das mais belas páginas da história do NOSSO Colégio, diz muito da NOSSA fibra.

ALUNOS DO COLÉGIO MILITAR

Deixo-VOS uma exortação final Depois de amanhã novos dias virão, o FUTURO, sim, porque sereis VÓS a erigir o FUTURO.

É pensando nesse FUTURO, que concluo recorrendo ao CÓDIGO DE HONRA , sim, porque NÓS temos um CÓDIGO DE HONRA , que nos seus preceitos, de palavras simples e fórmulas intemporais, nos indica o caminho.

Por isso, não esqueçais o seu preceito 4º: “Dedicar à sua formação todo o seu esforço e inteligência”.

O empenhamento demonstrado na Avenida, amanhã terá que ser continuado no empenhamento escolar.

Como entoáveis há pouco, no NOSSO HINO, “Sirvamos …a Minerva…”

Termino, com um pedido

Comandante de Batalhão, camarada 371 - Cunha

Que o primeiro ZACATRAZ destas comemorações seja por PORTUGAL, Pátria que servimos, amamos e respeitamos.

Muitos Parabéns ao NOSSO COLÉGIO,

Um profundo agradecimento ao NOSSO MARECHAL.

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A Chama Colegial acesa na Feitoria. O Batalhão nos Clautros em continência no Estandarte Nacional. O Estandarte Nacional após receber a continência do Batalhão. Alocução do Presidente da direção da nosssa Associação ao Batalhão Cologial.

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Terminada esta alocução, procedeu-se ao acender da Chama Colegial, em local apropriado existente junto ao monumento comemorativo do 175º aniversário do Colégio, situado no topo Leste da parada, usando-se a chama que tinha sido acesa na Feitoria e transportada para o Colégio numa lanterna envidraçada. Este acto foi de novo protagonizado pelo Aluno Comandante de Batalhão e pela Aluna «Batalhãozinho», acompanhados pelo Director do Colégio e pelo Presidente da Direcção da nossa Associação.

Acesa a Chama Colegial e com todos de regresso às suas posições, o Batalhão prestou de novo continência ao Director, encerrando-se a cerimónia na Parada Teixeira Rebelo com o Batalhão dando um ZacatraZ por Portugal, no que foi acompanhado pelos numerosos Antigos Alunos presentes.

CERIMÓNIA NOS CLAUSTROS

Pelas 11H45, o Batalhão formou de novo, desta vez nos Claustros, para prestar honras militares ao Vice-Chefe do Estado-Maior do Exército, tenente-general Rui Davide Guerra Pereira, que ia presidir às cerimónias.

Seguidamente procedeu-se à integração do Estandarte Nacional na formatura e, com tudo a postos, deu-se início à cerimónia de homenagem aos nossos mortos, durante a qual, intercaladas nos sucessivos toques da tradição, foram proferidas pelo capelão do Colégio palavras de gratidão pelos sacrifícios feitos pelos mortos e de esperança no seu eterno descanso. No final, o terno de clarins executou o emotivo e vibrante toque de alvorada, um fecho exaltante,

mas também bonito, para uma cerimónia de tão profundo significado. Falou em seguida o Director do Colégio , para expressar o seu agradecimento a quantos, militares ou civis – Professores, Instrutores, Funcionários, Alunos, Pais, e Antigos Alunos – se esforçam para manter o Colégio como Instituição de referência, e também para exortar os Alunos a dar o seu melhor no mesmo sentido. Destacam-se, pelo seu especial significado, as palavras dirigidas aos Alunos:

As instituições não sobrevivem só pelas melhores recordações e feitos do passado, o presente é fundamental e determinante para o futuro. Se falamos em escola de princípios e valores, se falamos em responsabilidade e bom exemplo, não podemos esquecer o valor académico, pois a função primária de um Aluno é

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O Batalhão nos Clautros ouvindo a alocução do Diretor do Colégio.

216º Aniversário do Colégio Militar

aprender e estudar e a da escola ensinar. Sejamos claros: gostar de ser “Menino da Luz” e amar o Colégio impõe-vos estudar mais e melhor, ser mais ambiciosos, seguir o exemplo de quem melhor vos enquadra e aconselha.

Orgulhoso, como vós, do passado e da herança que nos legaram e da barretina que ostentamos, como antigo Aluno e atual diretor, estou bem ciente das dificuldades de um passado recente e das críticas e descrenças de cidadãos da sociedade em que vivemos.

Temos a obrigação de manter um rumo determinado e positivo, assente em princípios e valores de que nunca poderemos abdicar e em qualidade, qualidade a todos os níveis, na exigência de quem ensina, no empenho e no exemplo de todos os que aqui servimos, e no trabalho académico de quem aqui estuda... sim.... porque sendo vós, Alunos deste Colégio, a razão da sua existência, a essência da sua alma e o motivo da sua azáfama diária, é com os vossos resultados que se reforça o prestígio.

Aos Alunos finalistas, independentemente da graduação ou na ausência dela, expresso o meu público reconhecimento pelo vosso desempenho! Registamos todos, com agrado e satisfação, a vossa entrega e o contributo para a mudança desejada e anunciada. Sois um grupo de jovens dos dias de hoje, com uma matriz de competências diferenciada, com objetivos distintos e, obviamente, com rumos cada vez mais autónomos e singulares. Nesta reta final exorto-vos a continuar a fazer o vosso melhor. Hoje e amanhã, comemorando com orgulho, garbo e aprumo mais um aniversário colegial, nestes momentos únicos nos Claustros e na Avenida, ireis sentir a nostalgia do último desfile, dar e sentir abraços de verdadeira Camaradagem e Amizade. Esses sentimentos não têm escala, nem ran -

king, são puros e únicos, são a essência do que une os “Meninos da Luz”. Mas, e há sempre um mas, a única razão que vos faz estar aqui presentes é a de que sois Alunos do Colégio Militar e a única forma de retribuirdes é serdes trabalhadores e dedicados aos estudos e aos resultados académicos que tão determinantes são para o vosso futuro e para o sucesso do nosso Colégio. Façam-no em reconhecimento da Casa que tanto vos dá e tanto nos orgulha.

Tomou depois a palavra o Vice-Chefe do Estado-Maior do Exército, tenente-general Rui Davide Guerra Pereira, para expressar o apreço em que o Exército tem o Colégio Militar e para manifestar a sua convicção de que o futuro servirá para reafirmar a sua imagem de Escola ao serviço de Portugal, ensinando, educando e mostrando o caminho do Dever a novas gerações de Meninos da Luz. Da sua alocução, destaca-se o seguinte trecho:

Ter o privilégio de observar nestes Claustros o aprumo, o garbo, a convicção o orgulho saudável que nos transmitem os Alunos, merece de todos nós uma retribuição.

Retribuir com as melhores condições possíveis para que concretizem os seus sonhos.

E devemos sonhar também: sonhar com a contínua melhoria dos resultados escolares; sonhar com o Colégio Militar no topo do Ranking das escolas dos mesmos níveis escolares; sonhar com o permanente e total envolvente de toda a comunidade educativa do Colégio Militar.

E temos o dever de pugnar com incendiável dedicação para a concretização destes sonhos.

Estamos também cientes de que os Estabelecimentos Militares de Ensino, se constituem como um importante “instrumento” na promoção da imagem

do Exército e na sua estreita ligação à sociedade, assumindo particular importância num grande centro urbano, como Lisboa, o que, naturalmente, se constitui como fator de desafio acrescido, pelo que a aposta é e terá que ser na Qualidade do ensino e formação aqui ministrado, e no exemplo que transmite para o exterior.

O acto seguinte consistiu na imposição de Medalhas de Comportamento Exemplar, destinadas a galardoar os militares que manifestem ao longo da sua carreira exemplar conduta moral e disciplinar, zelo pelo serviço e comprovado espírito de lealdade. Foram condecorados com o Grau Prata quatro militares em serviço no Colégio e com o Grau Cobre outros dois. Foi também condecorado um militar em serviço no Colégio com a Medalha Comemorativa de Comissões de Serviço Especiais, atribuída aos militares que, integrando ou não forças constituídas, nacionais ou multinacionais, tenham cumprido missões de serviço no estrangeiro.

Seguiu-se a atribuição de prémios a Alunos do Colégio Militar. O Prémio Instrução Militar destina-se ao Aluno do 12º ano que obtenha a melhor média a Instrução Militar ao longo do ensino secundário, a par de comportamento igual ou superior a “Bom” em todos os correspondentes períodos lectivos, bem como tendo obtido a menção de “Satisfaz Bem” na disciplina de Instrução Militar no 12.º ano. Recebeu o Prémio a Aluna nº 534, Ana Pinto. Os Prémios Educação Física, Esgrima e Equitação, destinam-se aos Alunos que, em regra, nos dois últimos anos, melhor tenham correspondido aos parâmetros de avaliação em Educação Física, Esgrima e Equitação, a par da notável dedicação e empenho pelas atividades, nomeadamente em competições e representações exteriores. Receberam os Prémios os seguintes Alunos: Prémio Educação Física:

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216º Aniversário do Colégio Militar

nº 264, Diogo Fernandes; Prémio Esgrima: nº 200, Diogo Valdrez; Prémio Equitação: nº 10, Sebastião Carvalho.

Chegou então a vez de uma homenagem aguardada com forte expectativa: a entrega ao Colégio, pelo Presidente do Comité Olímpico Português, Professor José Manuel Constantino, do Troféu «Comité Olímpico Internacional 2018». Este prémio distingue instituições, iniciativas ou pessoas que tenham tido um papel de elevada importância na afirmação do valor social do desporto, destacando o trabalho e os relevantes serviços prestados ao país e ao desporto português. Para a atribuição deste troféu contribuíram de forma muito especial os Antigos Alunos que, ao longo dos últimos cem anos, integraram as missões olímpicas nacionais, sendo justo destacar-se a elevada qualidade das prestações dos nossos cavaleiros, as quais mereceram medalhas e classificações de elevado mérito. Para os homenagear, o Colégio Militar exibiu, no corredor de ligação entre a Parada Marechal Teixeira Rebelo e os Clautros, painéis ilustrativos com breves resumos das participações de cada um nos diversos Jogos Olímpicos. No próximo número da revista apresentaremos um artigo exclusivamente dedicado a este assunto.

A finalizar as cerimónias nos Claustros, o Batalhão cantou o Hino Nacional, acompanhado por toda a assistência. O resultado foi um emocionante momento cénico e sonoro, que tem de ser vivido para se apreender o profundo sentimento de união e transcendência que invade todos os presentes.

Por último, o Batalhão desfilou no Largo da Luz perante o tenente-general Vice-Chefe do Estado- Maior do Exército, acompanhado pelos repetidos e vibrantes gritos de ZacatraZ, que os mais jovens Antigos Alunos não se cansaram de entoar.

3 de Março

As cerimónias tiveram este ano a presidi-las o Presidente da República, que quis,

com a sua presença, sublinhar a importância que atribui ao nosso Colégio. Devido à presença do Presidente da República, as cerimónias realizaram-se cerca de uma hora mais tarde do que o habitual,

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O Batalhão formando na parte baixa do Parque Eduardo VII. Continência ao Estandarte Nacional. O Presidente da República saúda o Estandarte Nacional.

216º Aniversário do Colégio Militar

tendo-se iniciado com a formatura do Batalhão, incluindo Escolta a Cavalo, na parte baixa do Parque Eduardo VII, onde estava colocado um pequeno plinto destinado ao Presidente da República.

Formado o Batalhão, soou cristalino no espaço, tocado pela requinta, o inconfundível sinal do Colégio Militar, imediatamente seguido pela execução, pela Banda do Exército, do Hino do Colégio, acompanhado, em uníssono, pelo Alunos do Batalhão Colegial e por todos os Antigos Alunos ali presentes. Foi um sinal claro de que algo muito especial iria ali acontecer. Foi como que uma saudação do Colégio à cidade, a dizer-lhe «Estamos aqui de novo, prontos a alindar-te com mais um dos nossos desfiles. É dia de festa para todos nós».

Entoado o Hino do Colégio, procedeu-se à integração na formatura do Estandarte Nacional. O Batalhão completo formado, com Escolta a Cavalo incluída, é sempre um espectáculo digno de ser visto. Não nos cansamos de o admirar e, para nosso espanto, já nada estranhamos a presença das Meninas da Luz no Batalhão, é como se elas lá estivessem estado sempre, e não conseguimos dirigir maior elogio à forma com elas se souberam integrar no Colégio. Este já não é o Batalhão integralmente masculino, que era o «nosso» Batalhão, mas continua a ser um Batalhão de que nos orgulhamos.

Um aspecto para nós de muito agrado, foi o de ver que os sabres-baioneta, calados no extremo das armas, não estavam embainhados, estando as bainhas no seu devido lugar, ou seja, nas respectivas suspensões, fixadas aos cinturões. Fica sempre bem, ver as lâminas dos sabres baioneta a brilhar ao Sol incomparável de Lisboa. É o Sol a associar-se à nossa festa.

Estando o Batalhão pronto, começaram a chegar as altas entidades que iriam acompanhar o Presidente da República no de-

correr das cerimónias. Chegou em primeiro lugar, como «dono da casa», o Chefe do Estado-Maior do Exército. Seguiram-se os Chefes de Estado-Maior da Armada e da Força Aérea e o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas. Todos eles foram prestar continência ao Estandarte Nacional. Com as chefias militares todas a postos,

deu-se a chegada do Ministro da Defesa Nacional, que terá tido o seu primeiro contacto com o nosso Colégio e que também foi saudar o nosso Estandarte Nacional. Deu-se de seguida a chegada do Presidente da República, que tomou lugar no plinto a si destinado, perto do qual estavam os Presidentes dos órgãos sociais da nossa

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O Presidente da República e a multidão entoando o Hino Nacional. O Batalhão desfilando na Avenida. Em continência à direita.

216º Aniversário do Colégio Militar

Associação, os Presidentes do Conselho Supremo e do Conselho de Delegados e o Portão-Guião da Associação. O Batalhão apresentou armas e cantou-se, com orgulho e emoção, o Hino Nacional. A festa estava iniciada. A expressão de satisfação nas caras dos presentes era geral. Íamos viver mais uma jornada especial.

Apresentado que estava o Batalhão ao Presidente da República, foi a vez deste e de toda a sua «entourage» tomarem os respectivos carros e dirigirem-se ao Monumento aos Mortos da Grande Guerra, a meio da Avenida da Liberdade, onde estava montada uma tribuna, para daí poderem melhor assistir ao desfile do Colégio. Antigos Alunos e famílias dos actuais Alunos já estavam então colocados, em grande número, ao longo da Avenida, entre o Marquês de Pombal e o Monumento referido, formando um cordão humano contínuo, que viu passar e saudou o «cortejo» presidencial.

Seguiu-se o desfile do Batalhão, tendo à frente a Banda do Exército, tocando marchas marciais, de acordo com a ocasião. O maestro da Banda não se deve ter apercebido que era seguido por uma primeira companhia de soldados em miniatura, com passos de pequena amplitude, pelo que a Banda, ao marchar com passada normal à frente do Batalhão, acabou por passar diante da tribuna bem antes do Batalhão. Como a Banda acabou por ficar estacionada um pouco abaixo da tribuna, para que todos pudessem ouvir distintamente a marcação da cadência da marcha no ponto crucial do desfile, a coisa acabou por não ter repercussões de maior.

À Banda seguiu-se o Estandarte Nacional, que impressiona qualquer um, pela carga de condecorações que ostenta, que não tem igual no nosso País. Vinha depois o Comandante de Batalhão, seus Adjunto e Ajudante, seguidos pelo nosso Guião, onde se destacam o desenho da cúpula da

nossa capela, à sombra da qual fomos todos criados, e a nossa divisa, que a todos irmana, e nos compromete para toda a vida. Por isso lá estão sempre na assistência Antigos Alunos dos mais veteranos, até nonagenários para, com a sua presença, dizerem aos actuais Alunos «Nunca marcharão sozinhos».

Passado o «Estado-Maior», luzindo todas as suas medalhas, foi a vez da passagem da 1ª Companhia, com os «ratas» a darem o melhor de si próprios, para manterem os alinhamentos correctos, esforço este nem sempre completamente bem-sucedido. A assistência é porém benevolente, não faltando gritos de incitamento dos Antigos Alunos, nem fundos suspiros de admiração de «Mamãs» desvanecidas.

À 1ª Companhia foram-se sucedendo as Companhias seguintes. Lá passou a 2ª, a 3ª e finalmente a 4ª Companhia, com a qualidade da sua marcha em crescendo e sem que nada ficassem a dever, em garbo, sincronismo e correcção de movimentos, a qualquer tropa adulta e madura. Se ali estivesse presente Ramalho Ortigão, cremos que não teria hesitação

em escrever, algo semelhante ao que escreveu, há mais de 130 anos, quando se deu a primeira apresentação pública do então Real Colégio Militar, no dia 14 de Janeiro de 1882, por ocasião da parada de recepção, dada por El-Rei D. Luiz, aos Reis de Espanha:

«Quando se abriu uma clareira na enorme multidão compacta que coalhava toda a superfície do Rossio e que no quadrilátero descoberto sobre o macadame o batalhão colegial apareceu, uma sensação nova percorreu os nervos do grande público lisbonense.

Dir-se-ia que cada um via então pela primeira vez o exército nacional na sua expressão mais genuína. Este regimento em miniatura representava efectivamente na sua encarnação virginal o mais puro espirito militar da nação.

Não sabem ainda bem o que é o peso das armas, mas aprenderam já o que é o peso do dever e o que é a força do heroísmo. Têm a estética da sua profissão, conhecem o que é belo dentro da esfera das suas aspirações e dos seus actos.

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A Tribuna presidencial.

216º Aniversário do Colégio Militar

Bravo! Bravo! – gritava-lhes em coro de todos os lados a multidão comovida. E eles, graves, sérios, como granadeiros da velha guarda, de cabeças altas, olhar em frente, clavinas ao ombro, marchando triunfantes como se fossem conquistando passo a passo o terreno em que pousavam os pés, passavam entre palmas, como ao regressarem vitoriosos de uma campanha. E afinal era efectivamente de uma vitória que eles vinham, porque equivale a uma vitória conquistada toda a noção do dever adquirida.»

E lá seguiu todo o Batalhão, como que entoando um hino de mocidade, alegria e orgulho, rumo ao Rossio, onde há 100 anos deu um exemplo de coragem e disciplina, mantendo-se imóvel e coeso no meio de rebentamento de bombas durante o cortejo fúnebre do Presidente da República Sidónio Pais. Como escreveu o Dr. Oliveira San Bento no «Correio dos Açores», ouviu-se, no meio do tropel, do burburinho e da gritaria, uma voz de comando «COLÉGIO MILITAR FIRME! E ficaram firmes, os Meninos da Luz, sem se moverem, em postura impecavelmente militar……enquanto a multidão se perturbava num pânico geral…»

Concluída a passagem do Batalhão, foi a vez do habitual compasso de espera para o desfile da Escolta a Cavalo, cujo galope requer que haja um espaço livre bem extenso à sua frente, para poder desfilar sem constrangimentos. A multidão de espectadores fica impaciente, mas a espera é bem compensada pela beleza do espectáculo que se segue, o que voltou a acontecer.

A Escolta passou imponente, num galope cadenciado, todos os cavaleiros com os cavalos bem na mão, respeitando as coberturas pela frente e os alinhamentos. O desfile da Escolta sabe sempre a pouco, quer para os cavaleiros, quer para os espectadores. Para os primeiros, a Avenida parece sempre bem curta. O que eles dariam para poderem galopar assim, numa avenida duas ou três vezes mais extensa.

Para os espectadores, tudo se passa num ápice, tendo dificuldade em guardar nas suas retinas, toda a beleza e a cor daquele movimento conjunto. Como seria bom, se pudessem ver tudo em «slow motion». É todo esse, o fascínio dum espectáculo destes, em qualquer parte do

Mundo. Só que há poucos países no Mundo que tenham o privilégio de poder ver um espectáculo destes e executado por cavaleiros tão juvenis.

Ao nosso lado a ver desfilar o Batalhão, incluindo a Escoltaa Cavalo, estava o nos-

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O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa e o nosso Guião.

216º Aniversário do Colégio Militar

so camarada de curso Rui Manuel Marques Pires (437/1955), vindo expressamente de Otawa, Canadá, para esta festa. Desde os nossos tempos no Colégio, já lá vão mais de 55 anos, nunca mais tinha assistido a um desfile de 3 de Março. Não foi preciso perguntar-lhe se tinha gostado, a sua cara não enganava.

Concluído o desfile, o Presidente da República, seguido da sua «entourage», desceu da tribuna e decidiu dirigir-se a pé, Avenida abaixo, até à Igreja de S. Domingos, para aí tomar parte na cerimónia religiosa. Assim que desceu da tribuna, foi completamente «assaltado» pelos repórteres e «cameramen» das televisões, na tentativa de obterem declarações suas relativamente aos aspectos mais variados da vida nacional, sem qualquer relação com o desfile que terminara, que pouco pesa nas contagens das «audiências», que tudo condicionam nas televisões. O Presidente da República a tudo foi respondendo, com uma paciência inexcedível, enquanto os turistas, que por ali estavam em grande número, não escondiam o seu espanto, com aquele procedimento, completamente insólito para eles. Foi necessário explicar a alguns o que se estava a passar.

Saciadas as televisões, foi a vez do assalto dos familiares dos Alunos e de populares em geral, para obterem as suas «selfies» com o Presidente. A descida da Avenida revelou-se pois difícil, mas o Presidente nunca esteve sozinho. Todo o tempo, a seu lado, esteve o Porta-Guião da nossa Associação, que, com a «entourage» do Presidente da República, o conduziu, são e salvo, até à igreja de S. Domingos. Ao passar no meio da multidão de Antigos Alunos mais novos, reunidos, como de costume, em frente ao botequim da «ginjinha» , foi saudado com um enorme ZacatraZ, a que correspondeu com acenos e um largo sorriso. Se fosse em tempos idos, os Senhores

Antigos Alunos, que estariam todos de fato escuro, chapéu ou cartola, ter-se-iam descoberto, guardado respeitoso silêncio e inclinado as cabeças num cumprimento, acompanhando tudo com um sorriso de apreço e gratidão. Os tempos mudaram.

A missa em S. Domingos foi celebrada pelo bispo das Forças Armadas, D. Rui Valério, coadjuvado por três sacerdotes, sendo um deles o capelão do Colégio e outro o Antigo Aluno João Luís Rodrigues Quintas (280/1998), que foi um «Antigo Aluno em Destaque» no número 212, de Julho/Setembro de 2018, desta nossa revista, justamente pela sua ordenação como sacerdote. Muito gostaria o nosso Capelão Braula Reis , que tantas missas para nós celebrou, naquela sua «casa» de S. Domingos, de ter visto ali um Antigo Aluno sacerdote como ele. Daqui lhe enviamos um forte abraço, de todos aqueles que foram seus Alunos e que não o esquecem.

A missa teve acompanhamento musical pela Orquestra e pelo Coro colegiais, que desempenharam bem os seus papéis.

Da homilia de D. Rui Valério, destacamos: Reconheço aqui o caráter sapiencial do Colégio Militar. Oferece muito a cada um dos que aceitaram viver de acordo com o seu espírito. Desde logo, oferece a glória e o prestígio que foi acumulando ao longo da sua profícua existência histórica de mais de dois séculos; oferece ainda a formação escolar que ministra com rigor e competência, bem como a formação humana, moldando o caráter de acordo com os princípios que advoga, transformando, assim, cada aluno num homem novo, de acordo com os mais elevados padrões humanistas… mas também transmite uma rara capacidade de envolvimento e compromisso na construção da história e da sociedade, patente no modo como os alunos, tanto antigos como atuais, organizam as suas vidas e se envolvem dedicadamente em prol do bem comum. A vossa história e tradição atestam que haveis dado a outros o que de outros haveis recebido. O que gratuitamente vos foi oferecido, tornou-se ação incomensurável no serviço e na entrega, sob o lema que congrega para a unidade: “um por todos, todos por um”. Neste sentido, o Evangelho oferece-nos

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Escolta na Praça da Figueira. Missão cumprida.

216º Aniversário do Colégio Militar

um manancial de referências que todos reconhecem no Colégio Militar: “Todo o discípulo perfeito deverá ser como o seu mestre”; “Cada árvore conhece-se pelo seu fruto”; “O homem bom, do bom tesouro do seu coração tira o bem”.

As festividades encerraram-se com o tradicional jantar no refeitório do Colégio, que decorreu de forma agradável habitual, com o reencontro de muitos camaradas que há muito se não viam. Decorreu tudo da forma tradicional, com serviço às mesas e o pessoal todo sentado, por cursos ou segundo as suas afinidades. O caldo verde estava bom e o mesmo sucedia com o amarelo, sendo que o arroz doce estava muito aguado (não podia ser tudo bom). De notar que em vez de vinho do Porto, tivemos, para acabar, um Carcavelos, para nos recordar as origens do Colégio na Feitoria. Notou-se que este ano havia menos Antigos Alunos no jantar, o que se poderá ter ficado a dever ao facto de ter ocorrido em domingo de Carnaval.

Foi mais um aniversário do Colégio, de acordo com os pergaminhos da Casa e que fica assinalado para a posteridade pela presença do Presidente da República, cujo significado não carece de explicação.

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NOTA: Todas as fotografias de Leonel Tomaz. Igreja de S.Dominguos. Vista da Capela Mor.

Torneio de Golfe

No âmbito das comemorações do seu 216.º Aniversário, o Colégio Militar organizou no Beloura Pestana Golf Course, no dia 23 de Março, o seu 1.º Torneio de Golfe em formato de equipas. As quatro equipas foram constituídas em função do equilíbrio de handicaps, sendo o torneio limitado a 80 jogadores. O torneio foi jogado em 18 buracos na modalidade Stableford Full handicap. O HCP (de jogo) máximo era de 36 (Homens e Senhoras).

A CLASSIFICAÇÃO FINAL POR EQUIPAS FICOU COMO SEGUE:

– 1º Classificado: “Feitoria”, 505 Pontos

– 2º Classificado: “1803”, 487 Pontos

– 3º Classificado: “Zacatraz”, 472 Pontos

– 4º Classificado: “Barretina”, 447 pontos.

A Equipa vencedora era constituída pelos seguintes jogadores: Nuno Leite Faria , 39 pontos; Gonçalo Júdice , 37 pontos: Manuel Teles Grilo , 37 pontos; José Pinheiro , 36 pontos; António Porfírio ,

35 pontos; António Martins Pereira , 35 pontos; Gabriela Bentes , 32 pontos; Ricardo Floreano , 31 pontos; José Palma de Mendonça, 31 pontos; José Gonçalves Roberto , 31 pontos; Nuno Patra -

quim da Conceição , 30 pontos; Raul Passos , 29 pontos; José Pedro Fernandes , 27 pontos; José Sanches Osório , 26 pontos; José Afonso Lopes , 26 pontos; Miguel Carlos Santos , 23 pontos.

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Um aspecto do torneio. Os troféus em disputa.
Torneio de Golfe

O conjunto dos participantes.

VENCEDORES INDIVIDUAIS:

– 1º Gross - Mário Silva, 32 pontos

– 1º Net, 1ª Cat - José Domingos, 40 pontos

– 1º Net, 2ª Cat - Waldemar Marcelino, 38 pontos

– 1º Net, 3ª Cat - José Guedes da Silva, 33 pontos

– 1º Net, Senhoras - Isabel Magalhães, 36 pontos

– 1º Net, Juniores - Diogo Salgueiro, 29 pontos

– Drive Mais Longo - Zulmira Alves

– Bola Mais perto da Bandeira - João Lhano

Torneio de Golfe

O Director do Colégio no uso da palavra.

O Presidente da Direcção da AAACM na distribuição dos prémios.

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Almoços e Jantares do 3 de Março

Almoços e Jantares do 3 de Março

AÇORES - S.MIGUEL PONTA DELGADA

Os Antigos Alunos residentes na «Ilha Verde» não esquecem o seu Colégio, tendo-se reunido para mais uma comemoração gastronómica do 3 de Março. Pelo que se pode observar na foto, substituíram o amarelo pelo clássico bitoque com ovo a cavalo. Sugerimos que para o ano se dirijam às Furnas e aí ataquem um bom cosido, feito com a panela enterrada junto às fumarolas. Ficarão decerto mais bem servidos. Os comensais esqueceram-se de se identificarem. Reconhecemos porém no meio do lado direito o Carlos Miguel Ribeiro Ferreira Barbosa (16/1961). Bem hajam.

BRASIL CIDADE DE VITÓRIA

Lá longe, nas terras de Vera Cruz, também o aniversário do Colégio foi devidamente comemorado. Reuniram-se num jantar, no dia 12 de Março, os quatro Antigos Alunos que se podem observar na foto, fazendo-se acompanhar por uma barretina colocada em lugar de destaque em cima da mesa, simbolizando a sua união com todos os Antigos Alunos residentes em Portugal e por esse mundo fora. Em primeiro plano temos os manos Leal da Costa, cujo pai (222/1950) foi nosso contemporâneo no Colégio, e em segundo plano o Paulo Barahona e o Armando Canelhas, antigo comandante da Escolta a Cavalo. Daqui lhes enviamos um forte

abraço e apresentamos de seguida a sua identificação completa:

Armando Nuno Saraiva Valente Perfeito Canelhas (591/1959), Paulo Alexandre Gallis Pereira Barahona (614/1970), Luis Kock Leng Leal da Costa (77/1980) e Gonçalo Kock Moon Leal da Costa (87/1982).»

Continuem sempre a recordar o Colégio.

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Vitória.

Almoços e Jantares do 3 de Março

LISBOA. TURF CLUB

Cumprindo o que já se tornou uma tradição, os Antigos Alunos Sócios do Turf, do tauromáquico e Pé Leve, reuniram-se num almoço no dia 8 de Março.

Estiveram presentes os seguintes antigos alunos: António Sobral (112/1950), João Diogo Weinstein (186/1950), Manuel de Castello Branco (384/1954), João Bandeira Ennes (335/1955), Diogo de Castello Branco (225/1957), Eurico Paes (306/1957), João Almeida Fernandes (208/1959), José

E.U.A FLORIDA, MIAMI

Na continuação de já longa tradição, o 3 de Março foi mais uma vez celebrado em Miami pelo nosso «Delegado» na bela capital da Florida, o sempre activo Manuel de Lucena (405/1953), que desta vez teve como companheiro o António Manuel da Silva Inácio Quelhas (677/1972), que é Director senior da Wells Fargo em Miami. A foto que nos enviaram não permite descortinar se a ementa da refeição terá sido o clássico «amarelo», ou algum sucedâneo do mesmo, de origem local. Mas uma coisa é certa, o Espirito do Colégio esteve bem presente, como o atesta a barretina, estrategicamente colocada entre os dois comensais, que os acompanhou durante toda a refeição. Bem hajam amigos, estejam sempre em pensamento com o nosso Colégio.

António Corrêa de Sá (228/1959), Pedro Campilho (257/1960), Pedro Cudell (3/1961), Filipe Soares Franco (62/1963), António Reffóios (529/1963), João Clara (372/1964), José Gatta (263/1965), Pedro Fuzeta da Ponte (143/1969), Miguel Félix António (302/1972) e João Brito e Cunha (121/1982).

A anteceder o almoço foi guardado um minuto de silêncio pelo José Luís Bessa (73/1955), que morreu recentemente e que foi um dos dinamizadores destes encontros, e lida a seguinte mensagem de S.A.R. o Duque de Bragança (97/1960):

É com muita pena que não poderei participar porque, no regresso da minha visita ao país do velho Crocodilo, Timor, estarei de visita a comunidade luso-descendente no Ceilão (Sri Lanka) . Eles pediram-me uma estátua de N.Sra. de Fátima, que encomendei com as Armas Reais e as de Ceilão no manto… Um abraço, Duarte de Bragança.

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Miami.
Turf Club.

Almoços e Jantares do 3 de Março

E.U.A. NEW YORK

Para celebrar mais um aniversário do Colégio, reuniram-se em New York os seguintes Antigos Alunos, que labutam na cidade que não dorme:

Jorge Álvaro Castelbranco Soares (437/1976), Francisco Júlio Timóteo Thó Madeira Monteiro (27/1978), José Ricardo Nazareth de Carvalho Figueira (17/1981), João Miguel Vicente Carita (370/1981), João Mário Baptista Antunes Gonçalves (386/1982), Pedro Miguel Saraiva Pinheiro (447/1983).

Se a vista não nos atraiçoa, um deles apresentou-se com camisola de ginástica do Colégio. Esperemos que não tenha feito uma série de cambalhotas e flic-flacs em pleno restaurante, como

sessão de aquecimento para o repasto, em homenagem aos seus mestres colegiais.Se o fez, talvez tenham dificul -

não é mesma de outros tempos, em que se reuniam de 20 a 30 Antigos Alunos, que convidavam para a reunião o nosso capelão Braula Reis, que daqui saudamos, que se integrava nos festejos, ido expressamente de Lisboa. Bons tempos. Agora há por lá menos pessoal, mas o espirito é decerto o mesmo. Para a posteridade, aqui fica a identificação dos participantes naquela jornada de júbilo.

BRUXELAS

No reino dos belgas o Colégio nunca é esquecido, tal como se pode comprovar pela foto anexa, que ilustra a

comemoração do 3 de Março deste ano na capital do reino. O local da comemoração foi o restaurante português DONLUIS, tendo-se realizado o jantar no dia 5 de Março. A representação colegial em Bruxelas já

Da esquerda para a direita:

Paulo Sérgio da Silva Antunes (405/1982), David Miguel Alves de Brito Antunes (315/1990), João António Eduardo da Silva Santos (358/1970), João Francisco Ramalho Ortigão Delgado (531/1969), André Salgado Paula Santos (192/1995), António José de Jesus Neves Correia (358/1977), Pedro Rui Bastos Teixeira Chaves (277/1966) e Rodrigo Filipe de Oliveira de Ataíde Rodrigues Dias (473/1985).

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New York. Bruxelas. dades para o ano, em marcar mesa no mesmo restaurante.

Assembleia Geral Novos Orgãos Sociais

Assembleia Geral. Novos Orgãos Sociais.

No passado dia 22 de Março de 2019, reuniu em sessão ordinária, no Teatro D.Luiz Filipe, no Quartel da Formação, a Assembleia Geral da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar (AAACM), com a seguinte Ordem de Trabalhos:

Ponto 1 – Apreciação e Votação do «Relatório do Exercício de 2018» e das «Contas do Exercício de 2018».

Ponto 2 – Deliberação sobre quaisquer propostas formuladas nesse relatório ou no Parecer do Conselho Fiscal sobre ele exarado.

Ponto 3 – Apreciação da acção da Direcção e do Conselho Fiscal.

Ponto 4 – Eleição dos novos Órgãos Sociais da AAACM para o triénio de 2019/2021.

Ponto 5 – Apreciação e votação da Proposta de Orçamento para 2019.

Ponto 6 – Eleição de novo membro para o Conselho Supremo.

2 – Assuntos antes da Ordem do dia.

O Presidente da Mesa da Assembleia Geral propôs a dispensa da leitura da acta da última Assembleia Geral, dado um exemplar da mesma ter estado disponível para consulta na sede da AAACM. A Assembleia aceitou a proposta de dispensa da leitura da acta e aprovou a mesma acta.

O Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Geral, José António Pina de Bastos e Silva (67/1957), explicou qual era o seu entendimento relativo às procurações apresentadas para representação nas Assembleias Gerais e formulou um agradecimento especial ao Presidente da Mesa, Raúl Miguel Socorro Folques (380/1952) pelo honroso convite que lhe fez, para ser seu Vice-Presidente.

António José Fonseca de Cavaleiro Ferreira (332/1950) submeteu à apreciação da assembleia um voto de pesar e solidariedade para com Moçambique, pela tragédia vivida naquele país em consequência da passagem do ciclone Idai. Este voto de pesar foi aprovado por unanimidade e ficou de ser transmitido à Embaixada de Moçambique em Portugal.

Foi aprovada uma proposta do Presidente da Mesa para troca dos pontos de ordem 5 e 6 da Agenda de Trabalhos.

3 – Apreciação do Relatório e Contas do Exercício de 2018.

Apresentados e discutidos os Relatório e Contas e apresentado o parecer do Conselho Fiscal sobre as contas, foram os mesmos aprovados por unanimidade. Foi ainda aprovado um voto de louvor à Direcção, proposto pelo Presidente do Conselho Fiscal.

4 – Deliberação sobre propostas formuladas no Relatório da Direcção ou no Parecer do Conselho Fiscal sobre ele exarado.

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O novo Presidente da Direcção assinando o termo de posse. ©Fotos Leonel Tomaz.

Assembleia Geral Novos Orgãos Sociais

As 15 propostas apresentadas foram aprovadas por unanimidade.

5 – Apreciação da acção da Direcção e do Conselho Fiscal.

Não havendo inscrições para a apreciação agendada, o Presidente da Direcção cessante, José Eusébio Pereira Barata Cordeiro de Araújo (591/1973), agradeceu à Mesa e ao Conselho Fiscal o apoio que lhe deram durante o seu mandato. O Presidente da Mesa propôs um voto de louvor ao Conselho Fiscal, que foi aprovado por unanimidade.

6 – Eleição de novos Órgãos Sociais e de um novo membro do Conselho Supremo.

A lista única concorrente para os Órgãos Sociais da Associação foi posta à votação, tendo sido aprovada por uma larga maioria de votos. A composição dos novos órgãos Sociais é apresentada em local próprio da presente revista.

Foi votada a proposta conjunta do Conselho Supremo e da Direcção da Associação de nomeação de António José Sousa Vales e Saraiva de Reffóios (529/1963), como novo membro do Conselho Supremo, para preenchimento da vaga aberta pelo falecimento de Gonçalo Salema Leal de Matos (371/1949). A proposta foi aprovada por uma larga maioria de votos. Durante o escrutínio dos votos foi tratado o ponto restante da agenda.

7 – Apresentação e votação da Proposta de Orçamento para 2019.

Apresentada a proposta de orçamento para 2019, foi a mesma sujeita a votação tendo sido aprovada por unanimidade.

Concluído o escrutínio dos votos, o Presidente da Mesa propôs um voto de louvor à Direcção cessante, que foi aprovado por aclamação. Deu de seguida os parabéns aos membros dos Órgãos Sociais acaba-

dos de eleger, desejando-lhes as maiores felicidades nos cargos que iriam assumir.

O Presidente da Mesa cessante deu posse ao novo Presidente da Mesa, Martiniano Nunes Gonçalves (9/1958), desejando-lhe as maiores felicidades. O novo Presidente da Mesa agradeceu os votos formulados e afirmou ser para si uma honra assumir o cargo, para que acabava de ser eleito.

Os membros eleitos para os diferentes Órgãos Sociais assinaram os respectivos Termos de Posse.

A finalizar a sessão, o novo Presidente da Direcção, Filipe Soares Franco (62/1963), usou da palavra para: - Agradecer à anterior Direcção e em especial

ao seu Presidente, a forma empenhada como sempre defenderam os interesses do Colégio.

- Manifestar o seu empenho em alargar o universo dos associados da AAACM.

- Referir a necessidade de alargar o conceito da Solidariedade, não o cingindo ao de um mero apoio financeiro.

- Referir a sua intenção de continuar a dar prioridade à resolução da questão do Prédio Militar nº 34 (Quartel da Formação), questão esta de importância estratégica para o futuro da AAACM.

Finda esta intervenção o novo Presidente da Mesa deu por encerrada a sessão.

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O novo Presidente da Direção Filipe Soares Franco (62/1963). ©Fotos Leonel Tomaz.

Foi há 100 Anos Conferência de Paz 1919

Conferência de Paz 1919 Foi há cem Anos

A CONFERÊNCIA DE PAZ DE PARIS DE 1919

Em 18 de Janeiro de 1919, na presença de 70 delegados em representação de 25 países, teve início a Conferência de Paz de Paris, para a qual foram convidados todos os países que haviam participado na I Grande Guerra, com excepção da Rússia, que se havia retirado do conflito em 1917, após a Revolução de Outubro. O objetivo da Conferência consistia na obtenção dum consenso entre as Nações vencedoras relativamente às condições em que poderiam estabelecer a paz com os vencidos, e em particular com a Alemanha. Os diversos pontos da agenda foram objecto de discussão entre todos, mas os diversos Tratados de Paz têm o claro cunho dos «Três Grandes»1 – Wilson, dos EUA, Lloyd George, da Grã-Bretanha e Clemenceau, da França – e foram na verdade impostos aos países vencidos. Em simultâneo, as discussões permitiram abrir caminho para a criação de um órgão internacional – a Sociedade das Nações2 – vocacionado para impedir a eclosão de outra guerra numa escala semelhante àquela que terminara recentemente e que tanto sofrimento causara.

1O Comité dos Quatro, que formalmente presidia aos trabalhos, incluía Orlando, chefe do Governo italiano, mas foram os três primeiros aqueles que de facto marcaram o ritmo e a intensidade das discussões, sendo que o mais duro foi Clemenceau e os mais maleáveis os anglo-saxóniccos.

2Também conhecida como Liga das Nações, tinha por base os «Quatorze Pontos», do Presidente dos Estados Unidos, Woodrow Wilson, com destaque para a diplomacia aberta, liberdade de circulação marítima, desarmamento geral, retirada de barreiras comerciais, decisão imparcial quanto às pretensões coloniais, evacuação pela Alemanha da Bélgica e de território russo, e fundação da Sociedade das Nações.

O Pacto para a criação da Liga das Nações estava contemplado nos 30 primeiros artigos do Tratado de Versalhes e o seu objetivo consistia em mediar e arbitrar conflitos entre Estados, por forma a manter a paz e a ordem no mundo. Com sede em Genebra, dispunha de Secretariado, Assembleia Geral e Conselho Executivo. Autodissolveu-se em 1942, na sequência da eclosão da II Grande Guerra. Em 18 de abril de 1946, as suas responsabilidades foram assumidas pela recém-criada (24 de outubro de 1945) Organização das Nações Unidas.

Curiosamente, os EUA nunca participaram da Liga das Nações por o Congresso norte-americano entender que a adesão à Liga das Nações obrigaria o país a desviar-se da sua tradicional política externa.

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Foi Há Cem Anos Conferência de Paz 1919

Os trabalhos da Conferência estiveram a cargo de 58 Comissões e decorreram durante seis meses. De entre a vasta documentação a que deu origem, salienta-se o Tratado de Versalhes,3 assinado em 28 de Junho de 1919 e ratificado pela Sociedade das Nações em 20 de Janeiro de 1920. Do seu articulado deve destacar-se (artigos 231.º a 247.º) que a Alemanha aceitava todas as responsabilidades por causar a guerra e, em consequência, estava disposta a proporcionar reparações a um certo número de Nações da Tríplice Entente.

A assinatura alemã foi tudo menos fácil, porque a delegação chefiada pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, conde Breckdorf-Rontzau, se recusava a aceitar a «cláusula de culpa» constante do Memorandum inicial. As desinteligências entre os 75 membros da delegação alemã chegaram a fazer recear o reacender da luta armada, mas as alterações de pormenor constantes das versões de 7 de Maio e de 16 de Junho desbloquearam a recusa e o Tratado pôde finalmente ser assinado. Enquanto isto se passava em Paris, o comandante dos navios alemães que há seis meses aguardavam destino em Scapa Flow, ao largo da Escócia, tendo sabido que o Tratado determinava a entrega de todos os navios de guerra aos Aliados, ordenou em 21 de Junho que fosse aberto em todos eles um rombo que os afundasse. Setenta e quatro foram ao fundo. Só no dia 28, quatro horas antes de expirar o prazo concedido pelos Aliados, é que o Tratado foi assinado.

As reparações impostas à Alemanha incluiam o pagamento de pesadas reparações financeiras,4 a perda de todas as colónias e de diversos territórios na Europa, o termo do serviço militar obrigatório e a proibição da produção de aviões de combate, carros de combate, peças de artilharia, navios de guerra de grande porte e submarinos. Além disso, a Alemanha ficou impedida de aderir à Sociedade das Nações. Estas duras exigências geraram no

povo alemão um profundo ressentimento, que os especialistas consideram ter sido parcialmente responsável pela ascensão de Hitler ao poder e pelo desencadear da II Grande Guerra.

A dureza das reparações só pode compreender-se se se tiver presente a dimensão devastadora do que acabara de acontecer na Europa: oito milhões de mortos imputáveis directamente às operações militares, outros vinte milhões com sequelas de algum tipo e prejuízos económicos incalculáveis, estimando-se que a Inglaterra e a França tenham perdido um terço da sua riqueza e que o conjunto dos países europeus terão sofrido perdas de 30% no sector agrícola e no parque industrial. No plano social, o desencanto não era menor, sobretudo com uma classe política que deixara arrastar um conflito onde se perdera praticamente toda uma geração.

Algumas das disposições mais importantes do Tratado de Versalhes eram contempladas nos artigos seguintes:

– 45.º – determinava a cedência à França da exploração das minas de carvão do Sarre.

– 51.º – estabelecia que a Alsácia e a Lorena voltariam à posse da França.

– 102.º – determinava que Dantzig era considerada cidade livre e administrada pela Sociedade das Nações.

– 119.º – determinava que todas as colónias alemãs passariam para a posse dos Aliados.

– 160.º – estabelecia em 100 mil soldados, todos voluntários, o efectivo máximo do Exército alemão.

– 168.º – ficava sujeito a aprovação dos Aliados o fabrico de todo o tipo de armamento.

3 “(...) O tratado de Versalhes é o mais importante dos vários acordos impostos pelas nações vitoriosas lideradas pelos Estados Unidos da América, o Reino Unido, a França e a Itália aos vencidos de 1918: Alemanha, Império Austro-Húngaro, Bulgária e Turquia. Tendo todos os tratados sido preparados em conjunto, e obedecendo todos à mesma lógica, é comum confundir-se a parte - Versalhes (imposto à Alemanha, tida como responsável pelo desencadear da guerra, e contendo a Carta da Sociedade das Nações) - com o todo (...)” (Menezes, Filipe Ribeiro de, A Grande Guerra de Afonso Costa ed D. Quixote, 2015).

4 O Tratado previa que uma Comissão se encarregasse de determinar a dimensão precisa destas reparações. Em 1921, o valor total foi oficialmente fixado em 33 mil milhões de dólares, mas ele só foi pago parcialmente e, em 1931, foi mesmo suspenso.

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Os quatro membros do Comité que presidia aos trabalhos.

Foi Há Cem Anos Conferência de Paz 1919

– 198.º – impedia a Alemanha de possuir meios navais e aéreos para fins militares.

– 231.º – estabelecia o reconhecimento da culpa dos alemães pela guerra e por todas as perdas e danos dos Aliados.

Nos termos do Tratado de Versalhes, a Áustria-Hungria, sucessora do Império Austro-Húngaro que se dissolvera aquando do Armistício depois de dominar a Europa Central durante cinco séculos, foi repartida por diversos países (Áustria, Hungria, Checoslováquia e Jugoslávia). A Rússia, que se retirara da guerra após a Revolução de Outubro de 1917, perdeu grande parte dos seus territórios a Ocidente, dando lugar à Estónia, Finlândia, Letónia e Lituânia.5 A Bessarábia foi reanexada à Roménia. O Império Otomano desintegrou-se e muito do seu território foi tomado por várias potências Aliadas como protectorados, enquanto o núcleo turco foi reorganizado como República da Turquia, a qual só assinou um Tratado de Paz com os Aliados em Lausanne, em 1923. Outros Tratados relevantes da Conferência de Paris, posteriores ao de Versalhes,

foram: o de Neuilly, que obrigava a Bulgária a ceder a Trácia aos Aliados, tendo-a estes depois transferido para a Grécia; o de Saint Germain, segundo o qual a Itália recebia da Áustria importantes parcelas de território, a Sérvia ganhava a Eslovénia, grande parte da Dalmácia e a Bósnia-Herzegovina, e a Checoslováquia ficava com as províncias austríacas da Boémia e da Morávia; o de Trianon, que tratava das províncias húngaras da Áustria-Hungria e nos termos do qual a Roménia recebia a Transilvânia, a Checoslováquia obtinha a Eslováquia e a Ruténia, e a Croácia passava a integrar a Jugoslávia. No seu conjunto, as cláusulas dos diversos Tratados relacionados com a Conferência de Paz de Paris, modificaram drasticamente a fisionomia política da Europa.

Fora da Europa, “(…) A França recebeu a Síria e o Líbano, a Grã-Bretanha recebeu a Mesopotâmia (Iraque) e a Palestina. (…) O Japão, a Nova Zelândia e a Austrália partilharam entre si os territórios da Alemanha no Pacífico. O império africano da Alemanha foi também distribuído pelos vencedores. O Japão recebeu as concessões de exploração de carvão e de linhas férreas

na China. A França e a Grã-Bretanha foram contempladas com a maior parte dos direitos e concessões comerciais obtidos por tratado pela Alemanha antes de 1914 em Marrocos, Egipto, Sião e Libéria (…)”.6

Em consequência das profundas alterações ocorridas no sistema internacional, um pouco por todo o lado surgiram novas tensões e focos de conflito que marcaram de forma significativa quase todo o século XX e o início do século XXI, como por exemplo a questão curda – consequência da dissolução do Império Otomano –, ou a persistente conflitualidade entre Hutus e Tútsis na região dos grandes lagos, no centro da África, na sequência da entrega da região à Bélgica.

5 Outra alteração de relevo devida à I Grande Guerra – e não ao Tratado de Versalhes – foi a reconquista da independência por parte da Polónia. O país, que fora dividido entre os Impérios Russo e Austro-Húngaro em 1795, recuperou os territórios perdidos aquando do Armistício.

6 GILBERT, Martin, História do Século XX, vol 2, distribuído com o Expresso, p. 44

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Conferência de Paz de Paris. Assinatura do Tratado de Versalhes na Galeria dos Espelhos.

Professor Armando da Rocha Trindade (195/1947)

Professor Armando Teófilo Silva da Rocha Trindade (195/1947)

vocação militar: o General Teófilo da Trindade, seu pai, entre vários cargos públicos (Ministro, Governador no Ultramar, Comandante da Escola do Exército em 1918) foi nomeado 1º Presidente da Junta Autónoma de Estradas.

Dois irmãos do Dr. José Trindade frequentaram o Colégio Militar (Teófilo Rocha Trindade 301/08 e Luís Rocha Trindade 50/18), que decidiu colocar o seu filho Armando Teófilo Silva da Rocha Trindade no Colégio Militar. Provavelmente por sua influência, o pai de outro Mirense de apelido Graveto, nele inscreveu também o seu filho Victor Manuel Nascimento Graveto E assim receberam os respectivos Números no Colégio:

Na Década de 40 do Século passado, em Mira de Aire (uma vila e freguesia do concelho de Porto de Mós com 4000 habitantes, em plena pujança de desenvolvimento, na área têxtil) foi colocado o médico Dr. José Cândido Trindade.

Ali exerceu Medicina durante alguns anos, criando fortes laços de amizade e foi sócio fundador de um clube local de cariz sociocultural ainda hoje existente –o Clube União Mirense.

No âmbito da sua família destaca-se uma

- O 195/47 Armando Teófilo Silva da Rocha Trindade - O 336/47 Victor Manuel Nascimento Graveto

Quatro anos depois seguiram-se, também por influência do Dr. Trindade, novas inscrições:

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O 195/1947 como Comandante de Batalhão e como Porta Guião (6º Ano).

Professor Armando da Rocha Trindade (195/1947)

- O 303/51 - Carlos Manuel Querido Batista (eu próprio)

- O 69/52 - Luís António Amado Carreira

- O 56/55 - Paulo Amado Carreira

- O 452/58 – Armando Querido Batista

A pequena Vila de Mira de Aire, de apenas 4000 habitantes, habituava-se assim à farda dos “Meninos da Luz”.

O Victor Graveto (336/47) completou a sua vida colegial, sendo no seu 7º ano Graduado Comandante da 2ª Companhia.

Frequentou posteriormente o curso de Engenharia Civil no Instituto Superior Técnico/IST. Esteve ligado ao Gabinete (na fase da Construção) da Ponte sobre o Tejo (hoje Ponte 25 de Abril), finalizando a sua carreira como Professor Catedrático Jubilado do Departamento de Engenharia Civil (DEC) da Universidade de Coimbra. Faleceu em 2016 e está sepultado em Mira de Aire.

Um neto do Armando Trindade, Rúben Teófilo Vasconcelos Moreira Rocha Trindade (a quem agradeço muita da informação sobre os Rocha Trindade aqui exposta), frequentou o Colégio (195/1993); dois outros netos frequentam-no na actualidade: o Hugo André Rocha Trindade (195/2013) e a Constança Leonor Rocha Trindade (194/2014).

Mas hoje, é sobre a vida e obra do Armando Teófilo Silva da Rocha da Trindade (195/47), que vos quero deixar as linhas que seguem:

Armando Rocha da Trindade, nascido em Lisboa, a 28 de Maio de 1937, foi aluno do Colégio Militar (195/1947) onde concluiu o 7º Ano, tendo sido Graduado como Comandante de Batalhão.

Detentor dos graus académicos de Licenciatura em Engenharia Electrotécnica (Instituto Superior Técnico, 1961),

Docteur ès Sciences Physiques (Faculdade de Ciências da Universidade de Paris, Orsay, 1970), Professor Extraordinário e Agregado em Física (Instituto Superior Técnico, 1974), Professor Catedrático do Grupo de Disciplinas de Física (Instituto Superior Técnico, 1980), transitou nesta qualidade para o quadro da Universidade Aberta em 1998.

Além das funções docentes que desempenhou no Instituto Superior Técnico (1961-65 e 1970-77), na Faculdade de Ciências de Paris, Orsay (1966-70), na Academia Militar (1972-1975) e na Universidade Aberta (1990-2003), desenvolveu actividades de investigação no Centro de Estudos de Electrónica da Comissão de Estudos da Energia Nuclear (1961-65), no Laboratoire de Physique des Plasmas da Universidade de ParisOrsay (1965-70) e no Centro de Estudos de Electrodinâmica do Complexo Interdisciplinar (1970-1976), no quadro do qual lançou em Portugal a especialidade de Física de Plasmas. A partir de 1978 verificou-se uma inflexão nos seus domínios de investigação e de leccionação, que se passaram a centrar nas Ciências da Educação e na especialidade de Ensino e Formação a Distância.

Nesse contexto, desempenhou cargos relacionados com o planeamento e gestão de educação, como Diretor-geral do Ensino Superior (1975-1976), Presidente da Comissão Pedagógico-Científica do Ano Propedêutico (1978-1981), Presidente do Instituto Português de Ensino a Distância (1980-1988) e Presidente do Instituto de Tecnologia Educativa (1987-1988).

Dedicou grande parte da década de 80 a actividades relacionadas com a concepção, projecto e criação de uma universidade de Ensino a Distância em Portugal, sempre com o objectivo de contribuir para a melhoria dos índices de formação superior de vastas camadas da população

portuguesa, apostando em metodologias e instituições que pudessem proporcionar formação contínua e superior a adultos, já plenamente inseridos na vida activa.

Na sequência desse seu labor, fundou a Universidade Aberta, em 1988, tendo ocupado o cargo de Reitor até à aposentação.

Nessa qualidade desenvolveu as conversações e negociações que envolveram um grupo de parceiros de Hong Kong, o governo de Macau e os representantes da República Popular da China no Território, com vista à criação da Universidade Aberta Internacional da Ásia (Macau), o que viria a concretizar-se em 1992. Foi membro do respectivo Conselho Académico.

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Armando Rocha Trindade 195/47 com o Neto Ruben R. Trindade 195/93. Neto, Ruben Rocha Trindade (195/93), como Porta Guião.

Professor Armando da Rocha Trindade (195/1947)

Faleceu em Lisboa no dia 28 de Maio de 2009, dia em que completava 72 anos de idade.

É titular das condecorações francesas: Ordre des Palmes Académiques (Comendador) e Ordre National du Mérite (Oficial). É Doutor Honoris Causa (Humane Letters) da State University of New York (1997) e igualmente da Open University do Reino Unido (1998); é Professor Catedrático Honorário da University of External Studies da Federação Russa, Moscovo (1996) e Honorary Advisor da Shanghai Television University, da República Popular da China (1998).

Deixou viúva Maria Beatriz Rocha-Trindade, socióloga, Doutorada pela Universidade René Descartes, Paris V - Sorbonne e Agregada pela Universidade Nova de Lisboa (FCSH). Exerceu funções docentes na qualidade de Professora Catedrática na Universidade Aberta, onde fundou (1989) o Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais (CEMRI), reconhecido pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) desde 1994.

Entre a sua vasta obra, é autora de um artigo sobre a emigração portuguesa para os Estados Unidos, que analisa em particular o caso de Mira de Aire, que registou um grande surto de saídas para os EUA, antes do seu desenvolvimento industrial.

No decurso dessa investigação, na década de 70, estando ligado à autarquia local, tive o prazer e a honra de os receber em Mira de Aire por ocasião do almoço de homenagem e evocação ao Dr. José Cândido Trindade (médico em Mira de Aire na década de 40, e pai do Armando Rocha Trindade).

Trinta anos depois da fundação da Universidade Aberta, e a propósito dessa efeméride foi publicado recentemente na imprensa um texto de João Araújo – Pro-

fessor Catedrático do Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências e Tecnologia, UNL, que com a devida vénia, se transcreve:

Quando passam 30 anos sobre a fundação da Universidade Aberta, lembro Rocha Trindade, um português extraordinário, um ho-

mem capaz de estudar e realizar segundo o lema do Infante: Talant de bien faire.

Armando Teófilo Rocha da Trindade nasceu em Lisboa em 28 de maio de 1937 e morreu em 2009 no dia do seu aniversário. Licenciou-se no IST em engenharia eletrotécnica (1961), doutorou-se em física em Paris (1970) e chegou a cate -

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Rocha Trindade - Quadro da autoria de Maluda, Sala de Actos - Universidade Aberta

Professor Armando da Rocha Trindade (195/1947)

drático do IST em 1980. Acima de tudo, foi o maior especialista do seu tempo em ensino a distância (EaD) e uma referência incontornável para quem quiser fazer a história do EaD, tendo exercido posições destacadas como Vice-Presidente da European Distance Education Network (1990-1998) e Presidente do International Council for Open and Distance Education (1995-1999).

Quando no Ano Propedêutico (19781981) foi preciso ensinar milhares de alunos dispersos pelo país o Governo desafiou Rocha Trindade a liderar o processo. Eu era miúdo, mas recordo as preleções entusiasmadas sobre Eça do jovem Prof. Carlos Reis, e recordo também que os «furos» eram preenchidos por um misterioso solo aflautado de uma tristeza sublime. (Quando estudei em Inglaterra nos anos 90, ofereceram-me um disco de Gheorghe Zamfir que julgo desvendou o mistério).

Parte do sistema universitário inglês é igual ao nosso: aulas com professores a ensinar e alunos a anotar, mas não é exatamente assim em algumas universidades (as melhores) onde o sistema assenta em tutores que atribuem tarefas (e.g., fazer até sexta-feira um ensaio de mil palavras sobre o teorema fundamental do cálculo), assistem à apresentação, sugerem reformulações e dão a tarefa seguinte. É o ensino personalizado por excelência.

Fatalmente, alguém acabaria por notar que tal sistema não requer alunos e tutor no mesmo lugar ao mesmo tempo. Assim Michael Young, o grande ideólogo do partido trabalhista pós-guerra, concebeu a Open University para levar o conhecimento às periferias geográficas, económicas e culturais. Criada em 1969 pelo Governo de Harold Wilson é em Inglaterra a primeira universidade em número de alunos de licenciatura.

Rocha Trindade viu no Ano Propedêutico o embrião de uma universidade semelhante à Open. O Reino Unido lançara uma revolução educativa imparável, mas a replicação do êxito em Portugal dependia da criação de uma excelente universidade aberta capaz de desenvolver o know how específico e estabelecer padrões e referenciais de qualidade em EaD.

Passar esta mensagem ao poder político não foi fácil. Só nos anos 80 Rocha Trindade encontrou quem o entendesse: Roberto Carneiro, também ele um engenheiro do IST e estudioso do ensino (são-lhe creditadas peças fundamentais do Processo de Bolonha), foi o ministro da Educação que primeiro viu cristalinamente a urgência de criar a Universidade Aberta. Isso aconteceu em 1988 com Rocha Trindade como primeiro Reitor e sita num palácio com valioso património histórico e artístico (sobretudo azulejos, e, atualmente, um maravilhoso Maluda) na R. da Escola Politécnica em Lisboa.

Rocha Trindade, o estudioso de reputação internacional, mostrou ser também homem de preclaro pensamento estratégico e de ação. Com o apoio do LNEC fez uma recuperação esplendorosa do Palácio Ceia e tomou uma série de medidas com vista à criação de uma universidade de excelência. Assim:

A) Desejou (e julgo não ser polémico que conseguiu) tornar a Universidade Aberta o maior e melhor editor científico do país, definindo regras muito rigorosas de redação e revisão dos materiais didáticos, tanto em termos científicos como em termos de adequação ao ensino a distância, o que conferiu características únicas a estas obras. O objetivo era levar os professores das universidades do Norte a Sul a adotarem os livros da Aberta, expondo assim uma geração inteira de licenciados portugueses à marca Universidade Aberta como marca de qualidade.

B) Para pensar e desenhar cada cadeira contratou sempre um dos maiores vultos da área conseguindo que os cursos da Aberta fossem verdadeiras «seleções nacionais» de professores.

C) Num tempo de expansão em que as universidades contratavam licenciados para dar aulas, a Aberta foi a primeira a exigir o grau de mestre. Rocha Trindade não podia exigir o grau de doutor por não os haver em número suficiente, mas repetia insistentemente que a docência universitária é para doutorados, visão consagrada 20 anos mais tarde pelo Ministro Mariano Gago.

E) Criou um estúdio de TV com mais de 70 pessoas, especialmente treinadas no ensino a distância, com regras muito claras sobre conteúdo e forma, e com equipamento que na altura rivalizava com o da RTP. A Universidade Aberta assegurava cerca de 5 horas de emissão semanal na RTP2.

F) Lançou uma política muito agressiva de formação de quadros (quis todos os docentes a doutorarem-se em tempo inferior ao máximo legal, apoiou doutoramentos em universidades estrangeiras de topo e promoveu a formação dos próprios trabalhadores incentivando-os a tirar licenciaturas, mestrados e doutoramentos). Desde o início, desejou fundar a escola portuguesa de investigação em ensino a distância. Outras universidades investigavam na área, como o grupo do Prof. Paulo Dias da Universidade do Minho, mas era sempre investigação em ensino a distância feita à distância: o laboratório vivo de EaD, como diz Paulo Dias, é a Aberta.

Mais tarde os sucessivos governos viram a enorme utilidade de haver uma universidade pública de EaD. Por exemplo, no final dos anos 90, no conflito entre professores licenciados e não licenciados, o Governo dissolveu a questão formando estes últi-

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Professor Armando da Rocha Trindade (195/1947)

mos, algo só possível porque havia uma universidade capaz de levar licenciaturas a cada cidade, a cada vila, a cada aldeia.

Outro exemplo. Perguntei a um aluno veterano de bioquímica da FCT/UNL por que razão muitos alunos repetentes a matemática tinham voltado a reprovar quando a prestação dos caloiros tinha sido excelente. Resposta: É preciso ter em conta que os caloiros deste ano sabem muito mais matemática do que nós; eles foram os primeiros a ter as metas do 10º ao 12º. Uma explicação luminosa, de facto. Mas a introdução das metas exigiu dar formação a todos os professores, de Monção ao Corvo ou Porto Santo, pelo que o ministro Nuno Crato recorreu à Aberta.

Ao mesmo tempo, lá fora deu-se a explosão do EaD: Índia (4 milhões de alunos/ ano), Paquistão (1.3 milhões), UNED e UOC-Espanha (300 mil), Coreia do Sul (200 mil), UK (170 mil), Alemanha (77 mil), Israel (40 mil), Holanda (15 mil), crescimento acompanhado por muita investigação na área, revistas dedicadas, conferências internacionais, etc.

Infelizmente, e apesar dos esforços dos sucessivos reitores, o peculiar modelo de financiamento da Aberta assente num subsídio, uma espécie de liberalidade de cada Ministro sujeita a variações imprevistas e inexplicáveis, conduziu a que a universidade tenha apenas 6 mil alunos, não obstante servir uma das maiores comunidades linguísticas do mundo.

Uma comissão de peritos estrangeiros (convocada pelo Ministro Mariano Gago) veio cá avaliar o EaD e recomendou o aumento significativo (6 ou 7 vezes) da população estudantil e do financiamento correspondente. A OCDE pronunciou-se em sentido análogo. Por razões desconhecidas este investimento nunca ocorreu bloqueando tanto o de -

senvolvimento como a própria manutenção. Foram gastos milhões na requalificação de escolas, mas não foi possível canalizar uma gota desse oceano para manutenção do Palácio Ceia que segundo o LNEC está em risco de derrocar.

Outro efeito da falta de enquadramento financeiro foi a impossibilidade prática de gerir promoções na carreira. A Universidade Aberta tem uma percentagem anormalmente elevada de cientistas prestigiados (na lista dos 2500 professores portugueses com maior H-index tem quase o dobro dos que proporcionalmente deveria ter, no que só é ultrapassada por duas ou três outras universidades), é uma das universidades portuguesas com artigos em revistas de topo, incluindo a Nature, e tem fornecido Associados e Catedráticos às melhores universidades presenciais do país como Porto, Aveiro, Lisboa ou Nova (no meu caso). Paradoxalmente, e a título de exemplo, cerca de 50% dos professores da Universidade do Porto são associados e catedráticos enquanto na Aberta não chegam a 15%. Em nenhum lado se vê tão alta concentração de grandes cientistas combinada com tão modesta taxa de recompensa do mérito.

Já no século XXI, Carlos Reis, colaborador de Rocha Trindade no Propedêutico, catedrático de provas dadas em Coimbra, ex-diretor da Biblioteca Nacional, viria a assumir a reitoria da Aberta conseguindo o que a nível mundial nunca nenhuma outra universidade tinha sequer tentado: em um ano migrou do sistema industrial de EaD para a universidade online que é hoje, promovendo ligações muito mais estreitas aluno/ aluno e aluno/professor, abrindo a possibilidade (concretizada) de grandes cientistas estrangeiros lecionarem na Aberta a partir dos seus países e levando a qualidade científica dos professores portugueses (da Aberta ou de universidades com quem esta tem cursos

conjuntos como a Universidade Nova de Lisboa, Coimbra, Porto, IST, etc.), aos 4 cantos da lusofonia. Carlos Reis verdadeiramente refundou a Universidade Aberta, o que só foi possível pela sua liderança firme e clarividente, aliada a uma dedicação completamente invulgar de funcionários e professores. Nas palavras de um professor da Aberta: Estive em muitas universidades em Portugal e no estrangeiro, mas nunca vi tanto amor á camisola como aqui.

Rocha Trindade simbolizava as universidades de EaD por uma antena de TV, representava as presenciais por uma catedral, e, após anos de estudo e reflexão, considerou que o futuro seria das catedrais com antena de TV (ou rato e teclado). Não obstante, só em 2015, já com o Prof. Paulo Dias vindo da Universidade do Minho para assumir a reitoria da Aberta, é que finalmente uma catedral mostrou entender o alcance da proposta de Rocha Trindade: o então Reitor da Universidade de Coimbra, Prof. João Gabriel (outro engenheiro), percebeu como um consórcio entre as duas universidades («a mais antiga e a mais moderna») permitiria alcançar novos públicos no espaço lusófono, com novos formatos, potenciando o impacto de ambas as instituições e reforçando a afirmação de Portugal no mundo. Este consórcio é, na minha opinião, o resultado da visão dos Reitores Paulo Dias (Aberta) e João Gabriel (UC), do trabalho desenvolvido por Carlos Reis na senda da visão fundacional de Rocha Trindade e ao magistério de influência de um herdeiro conceptual de ambos, o Prof. Domingos Caeiro, atual Vice-Reitor da Aberta.

A última peça nesta história de 30 anos estava reservada para o atual Ministro Manuel Heitor (outro engenheiro do IST) que realmente percebeu a necessidade de dotar a Aberta do enquadra -

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Professor Armando da Rocha Trindade (195/1947)

mento financeiro e legislativo necessário a cumprir a missão de estabelecer a fasquia da qualidade em EaD, permitir que ninguém ficasse excluído de uma formação superior de qualidade e cooperar com as universidades presenciais na criação de uma rede nacional de formação superior a distância, dando assim às «catedrais» os meios para montar a «antena de TV». (Marcelo Rebelo de Sousa condecorou em novembro a Universidade Aberta e embora eu não tenha nenhuma informação sobre o assunto, não ficarei surpreendido se se vier a descobrir que teve um papel não negligenciável, ou até vital, neste momento da história do EaD em Portugal).

Esta introdução de técnicas de EaD nas universidades presenciais tem um enorme potencial formativo e de qualificação da população lusófona, difícil de descrever ou até de antecipar. Permitirá promover a racionalização de meios e o aprofundamento da qualidade de docência tornando as universidades presenciais mais parecidas com as universidades inglesas de topo. Permitirá cursos cujo corpo docente seja uma seleção nacional de grandes cientistas. Permitirá levar a muitos falantes do português aquele curso de reciclagem ou requalificação de que precisam na sua atividade profissional, mas falta-lhes tempo para voltar durante um ou dois meses aos bancos da universidade mais próxima; é essa requalificação em massa pela Aprendizagem ao Longo da Vida (outro marco devido a Carlos Reis) que ficará ao alcance de um clique.

Evidentemente, tudo isto é mais fácil de dizer do que fazer, sobretudo porque esta mudança exige alterações relativamente profundas no funcionamento e na cultura das universidades presenciais; sei-o em primeira mão! Mas o caminho está aberto. E o futuro também… Outra vantagem das «catedrais com an -

tena de TV» é que se muitos portugueses se orgulham de terem sido alunos do professor tal, no ensino a distância é o professor que se orgulha de ter lecionado a alunos extraordinários – heroicos – com a tenacidade e garra que lhes permite somar às suas obrigações familiares e profissionais as horas necessárias a executar brilhantemente tarefas e atividades na plataforma. Como escreveu Peter Cameron um dos grandes que lecionou na Aberta: ‘’I like the idea of teaching open university students. If one can make invidious comparisons, they are on the whole more committed and enthusiastic than regular university students, since they are making very big sacrifices to study in their own time.’’

Julgo que ainda hoje sou o professor que esteve mais tempo no Conselho Geral da Aberta e por isso, quando passam 30 anos sobre a sua fundação, deixo aqui o meu contributo para a sua história e uma pequena homenagem a Rocha Trindade: um português extraordinário, um visionário, um homem capaz de estudar e de realizar segundo o lema do Infante: ‘’Talant de bien fair’’. Mas graças ao trabalho dos seus continuadores e ao Ministro Manuel Heitor, parece-me que o melhor ainda está para vir!...

NOTA FINAL

Numa altura em que se discutem os rankings nacionais das escolas, pergunto-me em que lugar estaria o Colégio Militar na altura em que ‘’colocou à disposição do nosso país’’ gente deste quilate.

A nossa escola, o nosso Colégio, apesar de algumas vicissitudes, continua a colocar ao serviço da nação, grandes valores.

Parafraseando alguém: ‘’há mais vida para além dos rankings...’’

Há disciplinas, disciplina e valores ministrados aos Alunos e agora também Alunas do Colégio Militar, que procuro nas tabelas de rankings ou nas demais escolas, e não as encontro... mas deveriam ser levados em conta.

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O Marechal António Teixeira Rebelo

O Marechal António Teixeira Rebelo

O MARECHAL ANTÓNIO TEIXEIRA REBELO SIMPATIZANTE DAS IDEIAS MAÇÓNICAS?

1. PREÂMBULO

Deverá começar por se esclarecer que o texto que se segue deve ser entendido, antes de mais, como uma tese, a partir de conjecturas baseadas na personalidade e no percurso de vida do Marechal António Teixeira Rebelo, sem outra intenção que não seja deixar algumas interrogações sobre os seus primeiros anos como militar.

Com efeito, se nos ativermos ao percurso de vida do Marechal, havemos de verificar que são inúmeras as vezes em que Teixeira Rebelo teve oportunidade de se encontrar e conviver com outros militares e outras personalidades que, indubitavelmente, professavam ideias maçónicas.

É verdade que será difícil atribuir a Teixeira Rebelo o epíteto de “livre pensador”, mas tem de se reconhecer que o Marechal era um homem de espírito livre, capaz de pensar pela sua cabeça, avesso a tudo o que fosse adverso aos seus princípios morais e éticos.

Há no entanto ténues sinais da sua simpatia, que não necessariamente adesão às ideias maçónicas por parte de Teixeira Rebelo, como é exemplo o episódio seguinte.

Tendo-se verificado uma questão disciplinar que opôs Teixeira Rebelo ao então coronel Gomes Freire de Andrade durante a guerra do Rossilhão, e tendo um seu camarada alertado para a conhecida cólera de Gomes Freire, replicou «o brioso artilheiro com altiva dignidade que, não sendo adverso a Freire, antes só a ele vinculado por laços afectuosos, a tudo antepunha as suas obrigações».

Vamos então à história do Marechal desde os seus primeiros tempos, esta sim feita a partir de fontes conhecidas, tendo por base o que nos tem sido contado em grande número de obras sobre o Colégio Militar.

António Teixeira Rebelo nasce a 17 de Dezembro de 1750, escassos cinco meses após o falecimento de D. João V e subsequente aclamação de D. José I como rei, a que se segue a nomeação de Sebastião José de Carvalho e Melo como secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra.

Durante os primeiros anos o jovem António ia dando bem conta de si nos estudos, de que se tinha aliás encarregado o próprio pároco da terra, entusiasmado com a sede de conhecimento do rapaz, e à falta de escola própria que não havia por aquelas terras.

Deste modo, sabendo que tinha sido estabelecido em Valença do Minho um regimento de artilharia, logo António pensou em se aproveitar para ali ir melhorar os seus conhecimentos e dar um sentido à vida.

Por sorte, nesse regimento de artilharia eram ministradas aulas por oficiais estrangeiros que tinham chegado ao país sob os auspícios do general conde de Lippe, o que reforçou o desejo de António se apresentar ali como voluntário.

Convencidos os pais, António põe-se a caminho de Valença, onde se alista em 27 de Setembro de 1764, como simples soldado no recém criado regimento de artilharia ali aquartelado, ainda antes de fazer catorze anos.

Quando Teixeira Rebelo chega ao Regimento de Artilharia de Valença já as ideias iluministas vindas da Europa, que preconizavam a liberdade de

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O Marechal António Teixeira Rebelo

pensamento e de expressão, estavam espalhadas por toda a intelectualidade que lia avidamente Voltaire, Rousseau e Diderot, apesar da proibição da Igreja Católica.

Nessa época, os maçons portugueses eram principalmente recrutados entre os oficiais que constituíam as unidades militares do exército e da marinha, já que eram os que estavam mais sujeitos à influência dos seus camaradas estrangeiros colocados nessas unidades e, pela sua formação, eram mais esclarecidos que o comum da população.

A difusão desses ideais maçónicos em Portugal, na segunda metade de setecentos, teve pois como origem, para além de alguma intelectualidade de Lisboa e da Universidade de Coimbra, as unidades militares existentes, com forte presença de oficiais estrangeiros que viriam a desempenhar as mais altas funções no Exército Português.

O Regimento de Artilharia de Valença foi uma dessas unidades militares, tal -

vez a que mais contribuiu para a emanação do livre pensamento, mercê do vasto conjunto de oficiais estrangeiros que ali tinham sido colocados, quase todos eles homens interessados na cultura e na ciência, verdadeiros intelectuais cujas leituras ultrapassavam o que era habitual nos meios culturais e sociais do país.

No Regimento de Artilharia de Valença, que na altura era comandado pelo escocês James Ferrier (1734-1780?), já se verificava entre o corpo de oficias estrangeiros, que representava aliás um terço de toda a oficialidade, um clima de grande abertura para essas novas ideias iluministas.

Este fenómeno que fazia de Valença o epicentro das ideias maçónicas foi certamente contagiando Teixeira Rebelo que, além das discussões a que assistia entre os militares que o rodeavam, tinha oportunidade de aceder à extensa biblioteca de Ferrier, onde coexistiam obras de Pope, Voltaire ou Holbach, há muito conside -

radas pela Igreja de Roma heréticas e subversivas.

Em 1778, quando a situação subversiva de Valença já era do conhecimento de grande número de entidades do Estado e da Igreja, a Inquisição manda prender um grupo de dez militares de Valença, entre os quais José Anastácio da Cunha, um respeitado intelectual e professor.

Na sequência do julgamento e consequente condenação, os dez militares sofrem pesadas penas incluindo açoitamento público, degredo e proibição de voltar às suas terras de origem.

2. O PERCURSO MILITAR DE TEIXEIRA REBELO

Como já vimos anteriormente, quando Teixeira Rebelo se alista no Regimento de Artilharia de Valença, era seu comandante James Ferrier que, além do mais, era conhecido como simpatizante das ideias maçónicas, sendo mesmo possivelmente maçon. Oriundo de uma família de origem francesa que se re -

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Anastácio da Cunha Teixeira Rebelo Gomes Freire Andrade

O Marechal António Teixeira Rebelo

fugiou em Inglaterra na sequência das perseguições religiosas no seu país, veio para Portugal com o Conde de Lippe colaborar na reforma do Exército.

Além de oficial e engenheiro de fortificações, James Ferrier era professor de Artilharia, sendo igualmente conhecido pelas suas leituras das obras dos filósofos franceses, Voltaire, Rousseau, Montesquieu – proibidas pela Inquisição – cujos livros se permitia fazer circular pelos oficiais portugueses do regimento.

Entretanto, Teixeira Rebelo sempre desejoso de aumentar os seus conhecimentos inscreve-se na “Aula Real de Artilharia”, recém-criada no regimento de Artilharia de Valença, e que vai influenciar a cultura da época.

Em Julho de 1768, após quatro anos de formação militar, Teixeira Rebelo é promovido a furriel, fruto do seu empenho, trabalho e dedicação ao estudo, vindo a ser colocado em 1774 no Regimento de Artilharia de Faro, recentemente criado, onde ascende ao posto de sargento em Janeiro de 1775, regressando posteriormente a Valença do Minho.

Teixeira Rebelo, já com o posto de sargento, obtém entretanto autorização para vir frequentar em Lisboa a Academia Real de Marinha, proposto pelo novo comandante do Regimento de Valença, o brigadeiro Christiano Frederico de Weinholtz (1726-1790?), alemão nascido na Alsácia de família nobre. Será portanto em 1780 que Teixeira Rebelo se instala em Lisboa para frequentar durante cerca de quatro anos as aulas de matemática na Academia Real de Marinha, ascendendo entretanto ao posto de segundo tenente em Novembro de 1784.

Teixeira Rebelo vem a ser finalmente transferido em 1785 para o Regimento de Artilharia da Corte onde prossegue

com grande sucesso a sua carreira militar, sendo nesse ano promovido a primeiro tenente de Artilharia, em Agosto de 1788 a capitão e em Setembro de 1793 ao posto de Sargento Mor.

Entretanto, pelos anos noventa Teixeira Rebelo está igualmente empenhado num trabalho encomendado pelo Ministro da Repartição da Guerra para proceder à tradução de inglês para português do importante Tratado de Artilharia da autoria de John Muller que vem a ser editado no ano de 1792.

Em Setembro de 1793, na sequência dos acontecimentos de França com a implantação do Regime de Terror e a declaração de guerra, o governo leva a efeito uma mobilização geral, constituindo uma força onde se integra uma brigada de artilharia tendo como segundo comandante o Sargento Mor Teixeira Rebelo que se dirige para os Pirenéus espanhóis onde irão ter lugar os combates com as forças francesas.

Negociada a paz em Julho de 1795, finda a que ficou conhecida como a Campanha do Rossilhão (do nome do Cantão do Principado da Catalunha), Teixeira Rebelo regressa a Portugal e é promovido a Tenente Coronel em Dezembro desse ano.

Em 1799 Teixeira Rebelo é encarregado de reorganizar a defesa da costa de Lisboa, intervindo em todas os fortes, desde a Fortaleza de Cascais até ao Forte de S. Julião e ao Cabo da Roca.

Pouco tempo depois, em 1801, tem lugar a chamada “guerra das laranjas”, com a invasão pelo Alentejo por um exército franco-espanhol, tendo pelo lado do exército português Teixeira Rebelo, entretanto já graduado em Coronel, como comandante do parque de artilharia dessa força.

Naquele mesmo ano dá-se o falecimento de Henrique de Pratt, e Teixeira Rebelo assume novas funções em Fevereiro de 1802 como comandante do Regimento de Artilharia da Corte.

A partir de agora a história de vida de António Teixeira Rebelo passa também a ser a história do Colégio Militar até 6 de Outubro de 1825, quando Teixeira Rebelo vem a falecer em Lisboa, nas instalações do Colégio que era a sua casa, cerca de seis meses antes do falecimento de D. João VI em Março do ano seguinte.

3. OS CAMARADAS DE TEIXEIRA REBELO EM VALENÇA

Quando Teixeira Rebelo chega ao Regimento de Artilharia de Valença, vai encontrar um jovem militar, seis anos mais velho, José Anastácio da Cunha (17441787), tradutor de vários excertos das obras dos autores proibidos que eram distribuídas por Ferrier.

Sendo embora de origem modesta, Anastácio da Cunha, tinha sido educado em Lisboa, no Convento de Nossa Senhora das Necessidades, da Congregação do Oratório, onde lhe ensinaram Gramática, Retórica e Lógica, tendo ele aprendido Física e Matemática como autodidacta.

Colocado como Tenente no Regimento de Artilharia do Porto em Valença do Minho, Anastácio da Cunha teve oportunidade, tal como Teixeira Rebelo, de conviver com os muitos oficiais estrangeiros que ali prestavam serviço e que o influenciaram culturalmente.

Terá sido por ocasião da sua permanência em Valença do Minho, possivelmente desde 1764, e da sua amizade com os oficiais estrangeiros que serviam no re -

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O Marechal António Teixeira Rebelo

gimento de artilharia, que Anastácio da Cunha abraçou os ideais iluministas da liberdade, da democracia e da igualdade, o espírito filantrópico e o aperfeiçoamento intelectual, acabando finalmente por aderir aos princípios da maçonaria.

Embora reconhecido como um notável matemático e pedagogo, tendo mesmo sido nomeado lente de Geometria na Universidade de Coimbra pelo Marquês de Pombal, Anastácio da Cunha, após a morte de D. José I, é denunciado à Inquisição, preso e condenado à pena de reclusão pelo crime de heresia pelo seu envolvimento com os oficiais protestantes estrangeiros de Valença.

Outro oficial com quem Teixeira Rebelo se cruzou nas aulas de artilharia que frequentou foi o oficial suíço Jean-Victorie Miron de Sabione (1726-1810), protestante e descendente de uma família de refugiados huguenotes na Suíça, que ministrava as disciplinas de Matemática, Fortificação, Táctica, Artilharia e Desenho.

Teixeira Rebelo também se terá cruzado em Valença com o Sargento-Mor do Regimento de Infantaria de Valença, Miguel de Kinselach (1721-1781?), natural de Bruxelas, acusado formalmente de pertencer à maçonaria.

Kinselach que se alistou aos 16 anos na corte do Imperador Carlos VI, viajou pela Hungria, manteve relações com as elites da época e conviveu com diversas personalidades e realidades sociais que o levaram a aderir aos ideias maçónicos.

As acusações que impendiam sobre Kinselach respeitavam à posse de livros proibidos e da leitura dos mesmos, o que levou o Tribunal do Santo Oficio a detê-lo por «herético e libertino, pertencente à seita dos pedreiros livres». Cerca de 1770, Kinselach recebe do ca -

pitão escocês Dugood, pertencente ao Regimento de Artilharia da Corte, instalado no Forte de São Julião da Barra, a informação da constituição em Lisboa de uma loja maçónica, procurando de imediato introduzir-se nela.

Um outro contemporâneo de Teixeira Rebelo no regimento de Valença foi o engenheiro militar português Custódio José Gomes de Villas-Boas (17711809), autor de diversos estudos de cartografia regional, tendo-se tornado um dos mais eminentes cartógrafos do final do século XVIII que produziu diversos tipos de mapas para o serviço da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra.

Custódio Villas-Boas veio a ser acusado de ser maçon, talvez fruto das suas ideias iluministas e progressistas, que decorriam do ambiente científico em que se movia, sendo membro da Academia Real das Ciências de Lisboa e da Real Sociedade Geográfica, Marítima e Militar. Na sequência destas acusações Villas-Boas acabou por ser preso em Viana do Castelo, sendo mais tarde resgatado da prisão pelo General Bernardim Freire de Andrade.

Ainda uma outra personalidade que terá sido igualmente contemporânea de Teixeira Rebelo no Alto Minho, o português Manuel Félix de Negreiros, um heterodoxo leitor dos filósofos franceses, frequentador de tertúlias no Porto, em Lisboa e em Viana, onde se encontrava desterrado pela Inquisição.

4. EPÍLOGO

Para concluir, convenhamos que é difícil atribuir ao Marechal de Campo António Teixeira Rebelo o epíteto de “livre pensador” , mas tem de se reconhecer que o marechal era um homem de espírito livre, capaz de pensar pela sua cabeça, avesso a tudo o que fosse adverso aos seus princípios morais e éticos.

Apesar de tudo, vale a pena transcrever como é que um historiador contemporâneo francês se referiu de forma simplista à difusão da maçonaria, afirmando que «A loja maçónica é para o notável do século XVIII o que o círculo é para o burguês do século XIX, ou o Rotary ou o Lyons Club para as classes dominantes do século XX».

Teixeira Rebelo foi certamente «um homem notável, que viveu toda a sua vida com o objectivo de servir o exército e o país. Foi um militar exímio e um homem de eleição, inspirado por nobres ideais de altruísmo e amor pátrio, competentíssimo no saber e vocacionalmente dotado para o ensino».

Arredado da política e da vida em sociedade, sem disposição para se submeter aos ditames e obrigações sociais, cultivando a discrição e a simplicidade, dedicou a sua vida ao ensino e à formação dos jovens, cultivando valores de dever, honra, lealdade e disciplina que ainda se perpetuam hoje no Colégio Militar que fundou.

Manuel de Negreiros era reconhecido como grande adepto da nação francesa, daí o apodo de jacobino, e um assíduo leitor de Voltaire desde a juventude, cujos textos gostava de declamar junto do seu círculo de companheiros, sendo-lhe atribuída por isso a sua ligação à maçonaria.

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A Defesa Militar da República

A Defesa Militar da República

Muitos cidadãos podem pensar, erradamente, que Portugal está imune a ameaças como a guerrra e o terrorismo. Não é verdade.

Aprende-se nas escolas militares que a ameaça é o produto lógico das capacidades pelas intenções. Assim, um país vizinho pode ter meios militares significativos, susceptíveis de serem utilizados contra Portugal, mísseis de alcance adequado, por exemplo, mas esse governo estrangeiro, não manifesta intenções de invadir ou adquirir pela força recursos portugueses. Assim sendo, aquele Estado não constitui uma ameaça. Porém, se tiver os meios ofensivos necessários e tencionar utilizá-los contra nós, constituirá, efectivamente uma ameaça. Os Serviços de Informações são essenciais nesta área.

Sendo a política internacional o que é, regendo-se pelos interesses percebidos por cada Estado, o nosso País deve manter-se atento à evolução das capacidades militares dos vizinhos a Leste e a Sul, especialmente no tocante à sua evolução política e as possíveis intenções dos respectivos governos, não descurando a preparação das nossas Forças Armadas (FA).

É importante, como disse o Professor Adriano Moreira, olhar para a evolução do mapa da Europa nos últimos duzentos anos, como se espreitássemos por um caleidoscópio, constatando como se alteraram as fronteiras, como desapareceram Estados e se criaram outros, em consequência de guerras, como um Estado pode passar de amigo a inimigo e vice-versa.

O nosso País não está livre, por exemplo, de inopinadamente, serem descobertos recursos minerais raros, em terra ou no subsolo marinho sob a sua jurisdição, que suscitem a cobiça de outros Estados. O nosso grande vizinho ibérico, sujeito a importantes forças centrífugas internas, através da história sempre sonhou em dominar a península, nomeadamente os portos da vertente atlântica. As potências atlânticas, em especial o Reino Unido e os Estados Unidos da América têm sido os nossos aliados tradicionais na preservação da independência Nacional. Por isso o País é membro, fundador, da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Perante a eclosão de uma guerra mundial, Portugal pode ser cobiçado por uma grande potência beligerante que pretenda conquistar a Europa, como aliás já

aconteceu durante a II Grande Guerra. Os Estados que compõem a União Europeia divergem significativamente na política externa, o Reino Unido, uma das duas potências nucleares europeias, poderá desligar-se em breve e vislumbram-se outras fissuras. A Rússia é percebida de modo diferente pela Alemanha e pela França e outros países europeus. Por isso uma Defesa comum europeia credível sem o apoio dos EUA, é problemática.

Portugal, também não está imune ao terrorismo islâmico, quando recebe anualmente cerca de onze milhões de turistas europeus, americanos e chineses.

Acresce ainda a possibilidade de o País ser colocado subitamente perante uma ameaça inteiramente nova e imprevisível neste momento.

Perante este quadro, Portugal, à semelhança de outros Estados, não pode deixar de possuir Forças Armadas (FA) com competências suficientes para constituirem um dissuasor, interoperarem com as FA dos Estados aliados, mostrando que os portugueses querem continuar como Nação independente. É indispensável que as FA preservem as infra-estruturas e a organização que

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A Defesa Militar da República

lhe permitam, em caso de necessidade, aumentar os efectivos, por forma a assegurar o recrutamento e a mobilização geral dos cidadãos. Segundo o Artigo 276º nº 1 da Constituição da Republica, a Defesa da Pátria é direito e dever fundamental de todos os portugueses.

As nossas FA têm como missão principal a defesa militar da República e a participação nas Alianças de que Portugal faz parte. Na sua capacidade sobrante podem desempenhar missões de serviço público, como o salvamento marítimo, a patrulha do espaço jurisdicional aéreo e marítimo, a fiscalização da pesca, a colaboração com o Serviço Nacional de Proteção Civil, nomeadamente em catástrofes e no combate aos incêndios florestais. Para além das suas obrigações constitucionais quando é decretado o Estado de Sítio ou de Emergência, as FA devem poder cola -

território Nacional, especialmente no combate ao terrorismo, ao tráfico de seres humanos e estupefacientes e outra ameaças.

Acontece que os nossos políticos e governantes, de um modo geral, no seu discurso ao País, provavelmente para não alarmar a população, têm procurado justificar a necessidade da existência das Forças Armadas com as missões de serviço público que executam, escamoteando o verdadeiro e primordial objectivo da sua existência, a Defesa da Pátria. Por isso a Nação exige dos militares total dedicação, inclusivamente o sacrifício da própria vida no cumprimento da missão, se necessário. No entanto, parece-me oportuno lembrar que a preparação do militar deve ser no sentido de fazer o inimigo morrer pela pátria deles, como disse às suas tropas o General Patton, o

vésperas do desembarque nas costas da Normandia, no inesquecível Dia “D”. Assim, em tempo de paz, a principal preocupação dos militares é manter um elevado nível de exigência no plano ético, moral e de treino incessante, procurando nos exercícios simular o mais possível o ambiente de guerrra, assegurando um elevado grau de prontidão e de interoperabilidade com os seus congéneres aliados, para que não constitua o elo mais fraco.

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©Foto
Sérgio
Garcia
(326/1985) ANTIGO ALUNO USA A BARRETINA

A Contagem do Tempo

A Contagem do Tempo

NOTA PRÉVIA

Não tendo qualquer contrato ou compromisso de escrita de textos para a ZacatraZ , tenho tido vários textos meus incluídos nela, por decisão exclusiva dos editores da nossa revista (que aceitam as minhas propostas).

Como é que os meus artigos acontecem? Quase sempre da mesma maneira. Quando investigo um tema que por qualquer motivo me despertou a curiosidade, penso se fará sentido gastar mais algum tempo e escrever algo que seja aceitável para os editores da revista. Há alturas em que tenho 2 ou 3 artigos ‘meio-escritos’ à espera de que me apeteça construir uma ‘coisa aceitável’; noutras ocasiões, fico sem nada em arquivo após enviar um artigo acabado de escrever. Nos últimos anos têm-me sempre aparecido – algo inesperadamente, pois não ando à procura - temas que despertam o meu interesse e me levam a conseguir enviar um artigo-candidato aos editores para cada número da revista (quando não aparece nada meu tem sido devido à falta de espaço editorial). Mais tarde ou mais cedo (quando a minha curiosidade diminuir) acontecerá não ter nenhum texto para enviar. Para vos mostrar como esta minha ‘actividade’ realmente funciona, eis o exem -

plo mais recente. Recebi um email do ‘Joel’ (Luís Joel Alves de Azevedo Pascoal - o ‘145’ de 1948/54) com um artigo que apareceu em Forbes.com em 20 de Dezembro de 2018, escrito por Steve H. Hanke – ‘It’s time to change the calendar, once for all’ – e dei por mim a pensar:

O que é que eu sei de calendários? (Para além do facto de saber que nós usamos actualmente o calendário Gregoriano, que mais parece uma manta de retalhos desirmanados e sem qualquer nexo, que um calendário feito como deve ser). NADA.

Parece impossível! Vai estudar, António! E assim fiz.

Daí a surgir a ideia de compor um texto para a ZacatraZ foi um ápice (a decisão é normalmente rápida; a sua execução toma bastante mais tempo).

Como é de tempo que vamos falar, voltemos atrás no tempo (uns 65 anos!) e passemos a descrever o que encontrei na minha memória (real ou virtual):

Estava eu muito ‘sossegado’ no início do meu 4º ano do Colégio (desde sempre, com o objectivo de passar despercebido) quando fui nomeado para, com

mais 2 ‘voluntários’, passar a tomar as refeições na mesa do ‘3 estrelas da 3ª’, o ‘145’, o ‘Joel’.

A minha primeira reacção terá sido –possivelmente - algo como:

Só me faltava mais esta! Nem às refeições posso estar ‘descansado’! Só espero que ‘o gajo não seja parvo’!

Na realidade, fiquei apenas com memórias difusas (mas agradáveis) das refeições desse ano (infelizmente, os outros dois ‘voluntários’ companheiros de mesa, ambos do meu curso, já faleceram: o ‘64’-Bagulho e o ‘199’-Morais Leitão). Direi que – ‘se bem me lembro’ – o ‘graduado’ falava pelos cotovelos e vendia a sua ‘filosofia’ (e eu tenho a vaga ideia de ter tido o cuidado de ser sempre ‘diplomático’ quando não concordava totalmente com ela).

Ao longo do tempo , só esporadicamente as nossas vidas se tocaram, mas a amizade que foi construída ao longo desse ano, ficou para sempre.

E agora já posso – finalmente – iniciar o artigo sobre a contagem do tempo! Abordaremos definições, unidades de medida, inícios das contagens do tem -

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po, divisões do tempo em intervalos, influência das religiões, da lua e do Sol, e sistemas para contagem e agrupamento de dias que atendem principalmente às necessidades civis e religiosas de uma cultura (calendários).

A noção de tempo é inerente ao ser humano, visto que todos somos, em princípio, capazes de reconhecer e ordenar a ocorrência de acontecimentos percebidos pelos nossos sentidos (os recémnascidos não têm a noção do tempo e os adultos com certas doenças neurológicas ou psiquiátricas podem perdê-la).

Aliás, o tempo é tão inerente ao ser humano, que a pergunta ‘O que é o tempo?’ coloca-nos em enorme dificuldade, pois encontrar uma sua definição global é extraordinariamente difícil e a ela se têm dedicado estudiosos, matemáticos, físicos, filósofos e até ‘curiosos’,

ao longo da história da humanidade. Eis algumas definições de que gostei:

“Cada segundo que passa é um milagre que jamais se repete.” – frase (recorrente) dita na ‘Rádio Relógio’ do Rio de Janeiro.

A Contagem do Tempo

“Uma ilusão. A distinção entre passado, presente e futuro não passa de uma firme e persistente ilusão.” – Albert Einstein.

De acordo com a sua teoria da relatividade, o tempo é considerado como uma

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1954 - 1 - Luís Joel Alves de Azevedo Pascoal (145/1948). 2 - António Rafael Passarinho Franco Preto. 2019 - 1 - Luís Joel Alves de Azevedo Pascoal (145/1948). 2 - António Rafael Passarinho Franco Preto.
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A Contagem do Tempo

quarta dimensão do continuum espaço-tempo do Universo (que possui três dimensões espaciais e uma temporal).

“É a solução da natureza para não deixar que tudo aconteça de uma vez só.” –John Wheeler, físico teórico americano, seu colaborador.

Sem uma unidade de medida padrão, é impossível ‘medir o tempo’ . Ela é o segundo , que – ‘ao longo dos tempos’ – tem sido definido de várias maneiras. Actualmente a sua definição tem, para os não interessados em física e química, um aspecto algo ‘retorcido’:

“Um segundo é o tempo da duração de 9.192.631.770 vibrações da radiação emitida pela transição do electrão entre os níveis ‘hiperfinos’ do estado

fundamental do átomo de césio (Cs)” . Diga-se que o césio é um metal alcalino macio de cor prateada-dourada, com um ponto de fusão de 28,44° C, sendo um dos únicos cinco metais que se podem encontrar em estado líquido à temperatura ambiente ou perto dela (os outros são o mercúrio, o rubídio, o frâncio e o gálio).

E como o espaço acompanha o tempo , referimos também – já agora – a definição actual da unidade padrão da medida, o metro :

“O metro é a distância percorrida pela luz, no vácuo, no intervalo de tempo de 1/299.792.458 do segundo”.

E antes que o leitor abandone de vez a leitura deste artigo, vamos passar imediatamente – tal como prometido – a aspectos relacionados com a contagem e/ou medição do tempo ao longo da história da humanidade (deixando-nos de considerações que caem nos domínios da física e da química).

A ORIGEM DA CONTAGEM DO TEMPO

Desde que o homem notou pela primeira vez o movimento regular do Sol e das estrelas, começou a interrogar-se sobre a passagem do tempo. A população pré-histórica (período da história que ante-

cede a invenção da escrita, desde o começo dos tempos até aproximadamente 3 500 anos antes de Cristo) certamente que tinha em atenção as fases da Lua.

Desde então, a contagem do tempo tem sido a maneira pela qual a humanidade tem observado os céus e representa de certa maneira, o progresso da civilização.

Os primeiros eventos naturais a serem reconhecidos aconteciam nos céus, mas, durante o curso de um ano, muitos outros eventos climáticos indicavam alterações significativas no ambiente. Ventos e chuvas sazonais, inundações de rios, florescimento de árvores e plantas, e os ciclos de reprodução ou migração de animais e aves; tudo isso levou a divisões naturais do ano, que culminaram com o reconhecimento das estações.

Nota: Vamos sempre referenciar a contagem do tempo ao nascimento de Cristo.

(a.C. ou A.C. para ‘antes de Cristo’; d.C., D.C. ou ausência de indicativo, para ‘depois do nascimento de Cristo’).

A CONTAGEM DO TEMPO PELO SOL

Conforme o Sol se move no céu, as sombras mudam de direção e comprimento, de modo que um simples relógio de sol pode medir a duração de um dia. Assim, não foi difícil perceber que a duração

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da luz solar em cada dia, dependia da época do ano.

PRIMEIRA DIVISÃO DO DIA EM PARTES

O povo egípcio foi um dos primeiros a usar relógios de sol para marcar os dias, e, devido a evidências arqueológicas, os historiadores acreditam que essa tenha sido a primeira civilização a dividir o dia em partes menores.

Por volta de 1500 a.C., os egípcios desenvolveram um relógio de sol em forma de “T” , colocado no solo e calibrado para dividir o intervalo entre o nascer e o pôr do sol em 12 partes, com base no número de ciclos lunares. Essa divisão em intervalos de tempo durante o dia, foi uma primeira representação dos intervalos de tempo, (como que percursores das “horas”). Sem luz para contar as horas durante a escuridão, os egípcios recorreram a um conjunto de 24 estrelas, das quais 12 marcavam a passagem da noite.

dos, é devida ao sábio grego Eratóstenes (n. 276 a.C. - m. 194 a.C.).

Eratóstenes de Cirene foi um importante geógrafo, matemático, astrónomo e filósofo pré-socrático. É considerado o pai da Geografia na Antiguidade, em função dos importantes estudos sobre as medições da Terra que realizou. Foi um dos principais cientistas e pensadores da Grécia Antiga.

Mesmo assim e durante muito tempo, os relógios dividiam as horas em metades, terços ou quartos e nunca em 60 minutos. Isto só começou a acontecer com o aparecimento dos primeiros relógios mecânicos (provavelmente inventados por asiáticos).

(Em 725 d.C., Yi Xing , um monge budista chinês desenvolveu um relógio mecânico que tinha um complexo sistema de engrenagens e 60 baldes de água que correspondiam aos 60 minutos e que fazia uma revolução completa em 24 horas; no mundo ocidental, o papa Silvestre II - 950 d.C. a 1003 d.C. – é no entanto referido como o seu inventor).

A CONTAGEM DO TEMPO NA HISTÓRIA

A Contagem do Tempo

UM DIA - 24 HORAS

60 MINUTOS - 60 SEGUNDOS

Foi só entre 147-127 a.C. que surgiu a divisão do dia em 24 horas com base na observação dos dias de equinócio. Antes, porém, por volta de 2000 a.C., os babilónios desenvolveram um sistema de cálculo astronómico baseado no número 60. Mas a segmentação da hora em 60 minutos, cada um com 60 segun -

A contagem do tempo na História varia de acordo com cada povo e época. Os primeiros povos fizeram os seus calendários tendo como referência os ciclos da natureza, as suas crenças e os seus costumes. Por isso, nem todos os países/povos seguem o mesmo calendário, sendo a religião – provavelmente – o elemento mais importante na adopção dum calendário. Eis um aspecto gráfico dum calendário cristão com os períodos litúrgicos observados pela Igreja Católica Romana (Natal, Quaresma, Tempo Pascal e Advento, com os intervalos de ‘Tempo Comum’ a separá-los).

CRISTIANISMO

Para os cristãos os acontecimentos são registados – como já referido – entre o que aconteceu antes de Cristo (a.C.) e depois do seu nascimento (d.C.).

É importante referir que nem todas as igrejas cristãs seguem o calendário ‘cristão’ actual (Calendário Gregoriano) que está em vigor desde 1582. A Igreja Católica Ortodoxa não aderiu à reforma Gregoriana e continua a utilizar o calendário Juliano (implantado pelo líder romano Júlio César em 46 a.C.) como base para definir as suas datas mais significativas. Por isso festeja o Natal a 7 de Janeiro (dia correspondente ao dia 25 de Dezembro no calendário Gregoriano).

E por utilizar um processo de cálculo astronómico diferente para calcular a Páscoa (que é no Domingo imediatamente a seguir à lua cheia do equinócio da primavera, sendo por isso uma festa com data ‘móvel’) a Páscoa da Igreja Católica Ortodoxa comemora-se, na maioria dos anos, no domingo seguinte ao nosso domingo de Páscoa e não no mesmo dia. O último ano em que coincidiram foi em 2017 (em 2019 estas datas foram a 21 e 28 de Abril e o próximo ano em que a Páscoa será festejada simultâneamente pelas duas liturgias é em 2025, no dia 20 de Abril).

Enquanto os cristãos contam o tempo referenciando ‘antes e depois do nascimento de Cristo’, povos com outras religiões, utilizam tempos históricos diferentes.

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A Contagem do Tempo

Seguem-se os exemplos do Judaísmo e do Islamismo.

JUDAÍSMO

De acordo com a tradição judaica, a contagem do tempo é feita a partir da criação de Adão. Conforme esta tradição, tudo começou ao pôr do sol de quinta-feira (Yom omysh), 7 de outubro de 3761 a.C.

Em concreto, o ano 2019 da nossa era, abrange parcialmente os anos 5779 e 5780 do calendário Judaico (porque, como se vê no diagrama apresentado, os respectivos inícios não são coincidentes).

HISTÓRIA E ORIGEM DOS CALENDÁRIOS

A História e Origem dos Calendários tem início com a necessidade de organizar o tempo, de registar a sua evolução, bem como de comemorar certas datas fixas recorrentes. Há calendários que se baseiam nos ciclos lunares (como o calendário islâmico) , outros nos ciclos solares (como o calendário europeu gregoriano) e outros ainda em ambos os ciclos (como os calendários chinês e judaico, que por isso se chamam lunissolares).

O CALENDÁRIO ‘LUNAR’

Um calendário lunar é aquele cujos meses seguem a Lua, no sentido em que o primeiro dia do mês coincide com a Lua Nova. Portanto, a metade do mês será a Lua Cheia. O melhor exemplo de um calendário lunar é o calendário islâmico, que abandona por completo o percurso do Sol para se reger exclusivamente pela Lua.

O CALENDÁRIO ‘SOLAR’

Um calendário solar é aquele em que as estações começam cada ano, mais ou menos nas mesmas datas. O calendário civil usado actualmente no mundo ocidental e chamado calendário (cristão) gregoriano, é o exemplo mais típico do calendário solar. Por exemplo, neste calendário as datas em que começará a Primavera durante os próximos mil anos só podem ser os dias 19, 20, 21 e 22 de Março (e esta última data apenas em certos lugares da Terra).

A vantagem e superioridade do calendário solar é que, conhecendo-se uma data, ficamos a saber o ponto em que nos encontramos do ciclo estacional ( que é o período natural que mais condiciona a nossa vida quotidiana, e que têm grande influência na actividade económica, como por exemplo, no turismo ou na agricultura).

(Diagrama de um calendário judaico com os nomes dos meses em hebraico e seus correspondentes no calendário cristão).

ISLAMISMO

Os islâmicos têm como referência e ‘início do seu calendário’, o dia em que Maomé fugiu de Meca para Medina (acontecimento a que chamam Hégira), uns 622 anos depois do nascimento de Cristo. Em concreto, o ano 2019 da nossa era, abrange parcialmente os anos 1440 e 1441 do calendário islâmico (porque, como se vê no diagrama apresentado, os respectivos inícios não são coincidentes).

Como antes foi dito, a duração média da lunação é de 29 dias e meio aproximadamente. Isto quer dizer que os meses dos calendários lunares só podem ter durações de 29 ou 30 dias, o que faz um total de uns 354 dias por ano, 11 dias a menos que a duração do ano astronómico. Devido a esta curta duração do ano lunar, as estações não permanecem nas mesmas data num calendário lunar. Por esta razão, se conhecermos uma data neste calendário, não ficamos a saber automaticamente em que estação do ano nos encontramos.

Eis um exemplo específico de um calendário solar da antiguidade: O calendário solar criado pelos egípcios tinha 365 dias e era dividido em 12 meses com 30 dias e mais 5 dias acrescidos no final do ano. Não havia ano bissexto e os anos eram divididos em três estações: Inundação, Inverno e Verão.

O CALENDÁRIO ‘LUNISSOLAR’

Um calendário lunissolar segue da melhor maneira possível (e ‘simultâneamente’), o Sol e a Lua. Os seus meses são lunares (isto é, iniciam-se normalmente com a Lua Nova) e além disso as estações começam mais ou menos nas mesmas datas, ainda que seja inevitável um desvio que pode atingir até um mês. Entre os calendários lunissolares actualmente em uso podemos citar o calendário judaico e o calendário chinês

(Diagrama de um calendário islâmico com os nomes dos meses em árabe e seus correspondentes ao calendário cristão)

Para conseguir este difícil compromisso de ‘seguir’ o Sol e a Lua, é necessário que alguns anos tenham 13 meses, ou seja, uma duração de uns 384 dias, com o que

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se compensa a curta duração dos anos lunares de 12 meses. Aproximadamente em cada três anos é necessário colocar um mês extraordinário nos calendários lunissolares. A este mês extra dá-se o nome de mês embolísmico ou embolístico e o ano que tem 13 meses chama-se abundante

O exemplo específico do Calendário Chinês

CASO ESPECIAL: A COMPLEXA CONTAGEM DO TEMPO NO CONTINENTE INDIANO

O termo calendário hindu é um termo bastante confuso (a imagem anexa é de um detalhe de um calendário Hindu), pois é referente a um conjunto de calendários regionais da Índia, que se comportam de formas muito distintas.

O governo da Índia adoptou em 1957 um calendário nacional, o calendário hindu, para unificar os cerca de 30 calendários existentes no país, usados para determinar festas religiosas hinduístas, budistas, jainistas e islâmicas.

Embora coincida com o gregoriano na contagem de dias e nos anos bissextos, o novo calendário conta o tempo a partir da ‘Era Saka’, que foi no ano 79 da Era Cristã.

A Contagem do Tempo

O calendário chinês é lunissolar , ou seja, ele considera tanto o ciclo solar como o ciclo lunar (como já foi referido). É formado por ciclos de 12 anos, quase sempre com início em Fevereiro (na Ásia, diversos países adoptam calendários parecidos com o calendário chinês).

Cada ano possui doze lunações representando um total de 354 dias. Para não se perder a sincronia com o ciclo solar (de 365,25 dias), é acrescentado um mês aproximadamente a cada três anos. Desta forma não se perde para sempre a sincronia nem com o ciclo solar, nem com o lunar.

Os animais do horóscopo chinês (rato, boi, tigre, coelho, dragão, serpente, cavalo, carneiro, macaco, galo, cão e porco) identificam cada ano. Desde 5 de Fevereiro de 2019, estamos no ano 4717 do calendário chinês e é o ano do Porco.

Eis uma descrição ‘simplificada’ da diversidade de calendários hindus e da contagem do tempo no continente indiano:

Num calendário hindu, o dia começa com a aurora, ou seja, no momento do nascer do sol, no horário local.

O início do ano varia segundo as regiões: No sul da Índia, o Ano Novo é o primeiro dia do mês Chaitra (março); a leste e ao centro, adopta-se o primeiro dia de Kartik (outubro) e finalmente para a comunidade Tamul, o Ano Novo é celebrado no mês Vaishakh (abril).

Os meses hindus começam na lua nova em algumas regiões e na lua cheia, noutras. O calendário hindu é baseado no movimento da Lua e compreende doze meses de 29 dias e meio.

Os doze meses completam, portanto, um total de 354 dias, ou seja, 11 dias de menos do calendário solar. Para compensar essas diferenças, intro-

duz-se um mês suplementar – Adhik Maas – adicionado periodicamente para sincronizar o calendário com as estações.

O mês lunar é dividido em quatro semanas, sendo que cada dia tem o nome de um planeta. Como praticamente todos os países, a Índia tem um calendário solar para fins administrativos (político, negócios e viagens) mantendo no entanto vários calendários regionais, por motivos religiosos e tradicionais.

CHEGOU AGORA O MOMENTO DE NOS DEDICARMOS AOS CRISTÃOS E AO SEU CALENDÁRIO.

CALENDÁRIOS (EUROPEUS) JULIANO E GREGORIANO

O calendário Gregoriano é um calendário de origem europeia, utilizado oficialmente pela maioria dos países e é adoptado para demarcar o ano civil praticamente no mundo inteiro, facilitando o relacionamento entre as nações. Essa unificação decorre do facto de a Europa ter, historicamente, exportado os seus padrões para o resto do globo.

O Papa Gregório XIII reuniu – em comissão ‘ad hoc’ – um grupo de especialistas para corrigir o calendário Juliano (implantado pelo líder romano Júlio César em 46 a.C.). O objetivo da mudança era fazer

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A Contagem do Tempo

regressar o equinócio da primavera para o dia 21 de março e desfazer o desvio de 10 dias já existente na época. Essa comissão produziu em 1577 um documento, o ‘Compendium’, que foi enviado aos ‘Príncipes da Igreja católica’ para decisão final.

Neste grupo de especialistas participaram Christopher Clavius, jesuíta alemão, sábio e matemático e os italianos Ignazio Danti, dominicano, matemático, astrónomo e cartógrafo e Luigi Giglio, médico, filósofo, astrónomo e cronólogo.

Após cinco anos adicionais, foi promulgada a 24 de Fevereiro de 1582 a bula papal Inter Gravissimas que substituia o calendário Juliano pelo calendário Gregoriano. Quando este entrou em vigor (no dia seguinte à quinta-feira, dia 4 de outubro de 1582 do calendário Juliano) passou-se para sexta-feira, dia 15 de outubro de 1582 do calendário Gregoriano). Foram assim feitos desaparecer dez dias e neutralizado o desvio existente.

ALGUMAS CRÍTICAS FACTUAIS AO CALENDÁRIO GREGORIANO

Não obstante todos os estudos, o calendário gregoriano apresenta defeitos, tanto sob o ponto de vista astronómico, como no seu aspecto prático. Por exemplo, o número de dias de cada mês é irregular (28 a 31 dias); além disso, a semana, adoptada quase universalmente como unidade laboral de tempo, não se encontra integrada nos meses e muitas vezes fica repartida por dois meses diferentes, prejudicando a distribuição racional do trabalho e dos salários.

Outro problema é a mobilidade da data da Páscoa, que oscila entre 22 de março e 25 de abril, perturbando a duração dos trimestres escolares e de numerosas outras atividades económicas e sociais.

A ACEITAÇÃO DO CALENDÁRIO

A mudança para o calendário gregoriano deu-se ao longo de mais de três séculos. Primeiramente foi adoptado por Portugal, Espanha, Itália e Polónia; e de modo progressivo pela maioria dos países católicos europeus.

Os países europeus onde predominava o luteranismo e o anglicanismo tardariam a adoptá-lo, caso da Alemanha (Baviera, Prússia e demais províncias) em 1700 e Grã-Bretanha (Inglaterra e País de Gales) em 1752.

Mas houve vários países que só adoptaram o calendário Gregoriano no século XX. Por exemplo, a China aprovou-o em 1912, a Bulgária em 1916, a Rússia em 1918, a Roménia em 1919, a Grécia em 1923 e a Turquia em 1926.

Nota especial na área da ‘história política’ (resultante da minha actividade de ‘investigador de tudo e de nada’)

Eis uma consequência das alterações havidas na contagem do tempo (relativamente à extinção do calendário Juliano):

A aceitação tardia pela Rússia do calendário Gregoriano significa que – de facto – a famosa e historicamente muito comemorada Revolução de Outubro na Rússia, também conhecida como Revolução Bolchevique ou Revolução Vermelha (1917) iniciou-se na realidade a 7 de Novembro pelo nosso calendário Gregoriano actual (embora a 25 de Outubro pelo extinto calendário Juliano).

Como devem ser evitadas comemorações antecipadas de factos históricos (tal como também não festejamos antecipadamente o dia do nosso aniversário), aqui fica o aviso para os eventualmente interessados.

PROPOSTA DE UM CALENDÁRIO PERMANENTE (HHPC)

‘HHPC

Uma crítica adicional importante ao calendário Gregoriano actual diz respeito a problemas causados pela disparidade de dias de cada mês relativamento ao cálculo de juros, pois verificam-se discrepâncias entre os dias que realmente passaram (e que deviam ser contados para efeito de cálculo de juros do capital) e os 30 dias que para efeitos desses cálculos, alguns governos e empresas privadas da área financeira (e não só) determinam que todos os meses têm.

Diremos que a frase ‘tempo é dinheiro’ está muito bem ilustrada neste conflito que se mantém.

Os autores da proposta deste calendário permanente, apresentam no artigo que referi no início deste texto, alguns exemplos de problemas criados na área financeira, incluindo nas bolsas de valores (‘stock exchange’) derivados – directa e indirectamente – da utilização do calendário Gregoriano.

Para evitar os inconvenientes já apontados (e para acabar com a necessidade de produção de calendários novos todos os anos) Steve Hanke e Richard Henry propõem a substituição do actual calendário Gregoriano por um calendário permanente: o HHPC ( H ank- H enry P ermanent C alendar).

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Autores do ’ (Hank-Henry Permanent Calendar): Steve Hanke - professor of applied economics at ‘Johns Hopkins University’ and senior fellow at the Cato Institute Richard Conn “Dick” Henry – ‘Johns Hopkins University’ professor of astronomy

EIS AS SUAS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS:

• Cada data do ano é sempre no mesmo dia da semana (por exemplo, o primeiro dia de cada ano é sempre uma segunda feira)

• O ano é dividido em 4 trimestres, cada um com 91 dias(30+30+31), resultando num ano de 364 dias (distribuído por 52 semanas de 7 dias cada).

• Para neutralizar a discrepância entre

os 364 dias do calendário permanente e os 365,24 dias do calendário astronómico, é adicionada uma 53ª semana ao calendário permanente, no final de cada 5 ou 6 anos (para os anos mais próximos será em 2020, 2026, 2032, 2037, 2043, 2048 e 2054).

Esta semana adicional tem o mesmo efeito prático que o actual dia extra dos anos bissextos (e mantém-se assim cada data do ano no mesmo dia da semana, o que é fundamental para o

A Contagem do Tempo

NOTA FINAL:

Pessoalmente, vejo dois inconvenientes neste calendário permanente (depois de todo este trabalho de investigação, decidi terminar este artigo num tom risonho):

• Tenho uma amiga inglesa com quem jogo bridge na internet que me envia to-

dos os anos em Dezembro um calendário para o novo ano (lá tinha ela de procurar outra recordação).

• Se o dia 15 de Fevereiro (o meu dia de anos) calhasse a um sábado ou domingo, dava-me um jeitão do ‘caraças’ para reu-

calendário poder ser permanente). Se este calendário for legalizado por alguns países, poderá popularizar-se rapidamente se for incentivado pelas chamadas ‘redes sociais’ – que não frequento – e será assim possível abandonar um calendário como o actual (de 2ª qualidade) imposto por um papa, há uns 400 anos.

Eis um diagrama do calendário permanente proposto por Steve Hanke e Richard Henry.

nir a família. Agora, sempre a uma quarta-feira!? Não quero!

Espero que a leitura vos tenha sido agradável (e vou guardar o texto para minha ‘memória futura’).

E, obrigado ao ‘Joel’ !

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Calendário Permanente (Steve Hanke e Richard Henry).

Portugal e o Algarve

Portugal e o Algarve

1. Portugal continental resultou da expansão do território do condado portucalense, vagamente situado entre o rio Minho e o rio Douro e a Oeste das terras transmontanas, tendo a Norte a Galiza, a Leste Leão e a Sul os condados de Coimbra e de Viseu (que cedo foram integrados em Portugal) e os denominados mouros. Os senhores de Bragança, embora leoneses, escolheram uma união política com os grandes senhores do condado (senhores do Sousa, senhores da Maia, Senhores de Riba Douro etc.) apoiantes do jovem Afonso Henriques.

À morte de D. Afonso Henriques (1185), as terras do rei de Portugal estendiam-se com alguma segurança até ao Tejo e, a Sul do Tejo, à península de Setúbal, a Alcácer do Sal, Évora, Beja e a alguns castelos isolados.

Em 1189, D. Sancho I aproveitou a passagem em Lisboa de uma frota com cruzados do Norte da Europa para organizar uma expedição a Silves, a cidade mais importante do Algarve. A conquista de Silves, iniciada com a tomada de Alvor, seguida de um cerco de três meses, provocou a rendição dos castelos do barlavento Algarvio (Albufeira, Lagos, Messines, Monchique, Paderne, Portimão etc.), ficando nas mãos dos mouros apenas o sotavento (Faro, Tavira etc.). O domínio do território Algarvio levou D. Sancho I a adoptar o título de “Rei de Portugal, de Silves e dos Algarves”.

A reacção moura à queda de Silves foi tremenda. Em 1190, o califa Almóada de Marrocos Yacub al-Mansur (Almançor) desembarcou no Algarve com um enorme exército, montou cerco a Silves e, numa incursão fulminante, deixando Évora e Beja de lado, atravessou o Tejo, tomou Abrantes e Torres Novas, cercou Tomar, vigorosamente defendida pelo mestre provincial templário Gualdim Pais, destruiu Alcobaça, Leiria e devastou os arredores de Coimbra. Acabada a campanha de 1190, Almançor recolheu a Sevilha para voltar em 1191, tomar Silves, Beja, Alcácer, Palmela, Sesimbra, Almada e ameaçar Lisboa. Após esta segunda campanha, Almançor reforçou Alcácer, desmantelou Almada e Palmela e retirou-se para Marrocos. A reacção portuguesa iniciou-se no reinado

de D. Afonso II com a dificílima reconquista de Alcácer (1217), apoiada por tropas mouras de Badajoz e de Sevilha, que envolveu uma frota de cruzados e as hostes das Ordens do Templo, do Hospital e de Santiago. Mais tarde, D. Sancho II reconquistou o Alentejo (Elvas e Juromenha, em 1230) e entrou na margem esquerda do Guadiana (Moura e Serpa, em 1232). Seguiram-se, com o apoio da Ordem de Santiago, Mértola em 1238 e Aiamonte, Cacela e Tavira, em 1239. D. Afonso III, coroado rei em 1248, após a morte do irmão, lança (1249) a campanha final da reconquista do Algarve (Albufeira, Faro, Porches, Silves), também com o apoio da Ordem de Santiago, que avançou pela margem esquerda do Guadiana, conquistando Aroche e Aracena aos mouros.

Após a reconquista definitiva do Algarve, D. Afonso III passou a intitular-se “Rei de Portugal e dos Algarves”. Este título irá acompanhar todos os reis de Portugal até à implantação da república em 1910, quando o reino do Algarve foi anexado e transformado no distrito de Faro. Por outro lado, de acordo com as regras da heráldica, o escudo de D. Afonso III, não podia ser igual ao do pai (D. Afonso II) e do irmão (D. Sancho II), tinha que sofrer alterações. Assim, surgiu um novo escudo real com o acrescento de uma bordadura ver¬melha decorada com caste-

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Portugal e o Algarve

los dourados que, passados quase oito séculos, se mantém na bandeira portuguesa com alterações mínimas.

Quanto ao significado da bordadura vermelha “acastelada”, duas teorias se defrontam: i) a primeira sustenta que é o símbolo de Castela (um castelo em fundo vermelho) devido ao facto de a mãe de D. Afonso III ser uma infanta castelhana; ii) a segunda teoria defende que a bordadura vermelha “acastelada” representa o Algarve e os seus castelos. O número de castelos foi muito variável embora tenha sido fixado em sete no reinado de D. João II.

A realidade é que ambas as teorias podem ser conciliadas. Uma vez que o rei de Portugal e dos Algarves devia ter os Algarves representados no seu escudo, a orla vermelha “acastelada”, introduzida para satisfazer as regras da heráldica, terá também passado a simbolizar o reino dos Algarves e assim o acharam todos os reis de Portugal e dos Algarves até 1910.

2. A consolidação territorial de Portugal foi levada a cabo essencialmente contra os mouros, no âmbito da reconquista, mas também contra o vizinho reino de Leão. Os leoneses viam com maus olhos, não só a independência de Portugal, como também a sua expansão para Sul. Os primeiros anos da independência de Portugal foram marcados por frequentes conflitos militares com Leão. A delimitação das fronteiras com Castela e Leão só se tornou “definitiva” em 1297 com o tratado de Alcanizes, imposto, pela força das armas, pelo rei D. Diniz.

O reino de Leão, de que Castela era inicialmente um condado (até 931 AD), veio a unir-se com Castela e a ser progressivamente absorvido por este reino: a língua leonesa foi substituída pela castelhana sendo dela sobrevivente o dialecto mirandês, em Portugal. Tendo-se unido com Castela em 1037, Leão voltou a ser independente, entre 1157 e 1230, nos reinados de D.

Afonso Henriques, D. Sancho I, D. Afonso II e D. Sancho II. Durante este período foram frequentes os ataques leoneses a Portugal, muitas vezes em coordenação e mesmo em aliança com os Mouros.

O rei de Castela e Leão Afonso VII morreu em 1157 e deixou o reino de Leão ao seu filho Fernando II e o reino de Castela ao seu filho Sancho III. Os dois irmãos assinaram, em 1158, um pacto – o pacto de Sahágun

– onde se comprometeram a manter uma frente unida contra Portugal e onde o actual Alentejo e Algarve eram considerados áreas da futura reconquista leonesa, de acordo com as fronteiras dos antigos reinos Suevo e Visigodo de que Portugal e Leão eram sucessores. Trata-se de uma orientação geoestratégica que veio a ser seguida pelo reino de Leão enquanto independente. A expansão portuguesa para Sul do Tejo foi assim feita contra os mouros, mas

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Estátua de D. Afonso III

Portugal e o Algarve

também contra os leoneses. Quando, em 1169, na sequência das conquistas de Alcácer do Sal (1158), Évora (1159 e 1165) e Beja (1162), os portugueses cercaram Badajoz (1169), os leoneses acorreram em socorro dos mouros e aprisionaram D. Afonso Henriques. Para sua libertação, o rei foi obrigado a entregar as suas terras na Galiza (vinte e cinco castelos nas regiões de Límia e de Toronho).

Como exemplo da conflitualidade entre Portugal e Leão, refere-se a batalha de Ervas Tenras. Em 1199, o rei de Leão entrou por Trás-os-Montes e veio cercar Bragança, que resistiu. D. Sancho I acorreu em socorro de Bragança e o rei de Leão recuou com as suas forças para Ciudad Rodrigo. D. Sancho atravessou o Coa e atacou os leone-ses que derrotaram os portugueses. Retirando para Portugal, os portugueses tiveram que enfrentar novamente os leoneses em Ervas Tenras (concelho de Pinhel) tendo sido novamente derrotados, com baixas de peso.

O conflito militar com Leão, que invadiu Portugal por várias vezes, acalmou temporariamente com a sua reunião com Castela em 1230. Surgiu, no entanto, outro conflito no horizonte. O infante Afonso, futuro rei Afonso X o Sábio, de Castela e Leão, tomou o partido do rei D. Sancho II contra o irmão, o infante D. Afonso de Portugal. Logo em 1247, o infante castelhano entrou em Portugal, pela Guarda, para apoiar D. Sancho II, embora sem sucesso. Em 1248, o infante castelhano conquistou Sevilha aos mouros e recebeu a vassalagem do emir da taifa de Niebla, que na altura controlava o sotavento algarvio, e passou a intitular-se “Rei do Algarve” . Perante a conquista efectiva do Algarve por D. Afonso III, em 1249, o infante de Castela voltou a invadir Portugal pela Guarda, em 1250. D. Afonso III terá sido vencido e obrigado a reconhecer os direitos do infante castelhano ao Algarve,

embora deva ter procrastinado a entrega do território já que, em 1252, o agora rei de Castela e Leão, Afonso X, invadiu novamente Portugal tendo encontrado, no entanto, uma maior resistência. A paz, intermediada pelo Papa, foi regulada na conferência de Chaves (1253), onde D. Afonso III se comprometeu a casar com uma filha de Afonso X e, caso tivessem um filho varão, este herdaria do seu avô Afonso X o reino do Algarve que se juntaria à coroa de Portugal. Ainda em 1253, D. Afonso III casou com Dona Beatriz filha natural de Afonso X, embora o seu filho varão D. Diniz tenha nascido apenas em 1261.

O que se passou entre 1253 e 1261, não é bem conhecido: aparentemente, um conflito de baixa intensidade entre portugueses e castelhanos prosseguiu no Algarve enquanto Portugal reforçava as suas fortificações fronteiriças (Beja, por exemplo).

Em 1261, D. Afonso III desencadeou uma campanha militar para a reocupação de terras algarvias na posse dos castelhanos. O nascimento de D. Diniz (em Outubro de 1261) teve como consequência novas pazes (1263) em que se acordou que Afonso X ficava com os castelos de Tavira, Loulé, Faro, Paderne, Silves e Aljezur em terçarias, sob o comando de dois cavaleiros portugueses (João Peres de Aboim e o seu filho Pedro), como penhor de que D. Diniz enviaria 50 lanças (250 homens a cavalo) algarvias em ajuda do avô sempre que necessário.

Finalmente, em Fevereiro de 1267, Afonso X e D. Afonso III encontraram-se em Badajoz onde assinaram uma convenção de paz que entregou a posse definitiva dos castelos do Algarve ao rei de Portugal. Na convenção de Badajoz, Afonso X exigiu manter o título de rei do Algarve e deixá-lo aos seus descendentes.

A fixação da fronteira com Leão e Castela deve-se ao “rei poeta”. Com efeito, após

uma campanha militar excelentemente planeada e executada, o exército português conquistou as vilas (e castelos) do Sabugal, Alfaiates, Castelo Rodrigo, Vilar Maior, Castelo Bom, Almeida, Castelo Melhor, Monforte, Olivença, Campo Maior, Ouguela, Moura, Serpa, Mourão, Noudar e outros lugares. No tratado de Alcanizes (1297) foi consagrada a nova fronteira, que ainda se mantem, entre Portugal e Leão e Castela.

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O Batuque das Mulheres do Lugenda

O Batuque das Mulheres do Lugenda

“Um batuque? Aqui? No Lugenda?” perguntei admirado e, sem dúvida, um bocado preocupado. Preocupação que era, sentia-o, ampliada pela expressão sorridente do Sargento Teixeira que, tudo indicava, até parecia concordar coma a ideia.”

“Aqui? Um batuque?” repetia eu. E lembrei-me de cenas que tinha visto em filmes, por exemplo, nas “Minas de Salomão”, em que umas centenas de guerreiros negros, os corpos pintalgados de várias cores, com escudos coloridos e longas plumas policromas, dançavam freneticamente, ao som de tambores, marimbas e troncos ocos, agitando azagaias, apelando ao combate feroz, enevoando a tela com a poeira vermelha da terra africana que levantavam, num fantástico espectáculo hollywoodesco em technicolor e cinemascope; e tinha visto o “Chaimite”, com idêntico apelo ao combate, à mesma violência, embora com menos guerreiros e com tudo a preto e branco.

Ora, havendo em ambas as versões tanta incitação ao combate e à violência, não me agradava nada, definitivamente nada, a ideia de ver aquilo acontecer ali no Lugenda. Até porque, se desse para o torto,

como tinha acontecido nos filmes, com caveiras e esqueletos, até onde poderia chegar uma coisa daquelas? Depois de começar, como é que se controlava? Sim, sim, e se desse para o torto?

“Mas qual é a ideia do gajo?”, perguntei; “Talvez seja melhor o meu alferes falar com ele”, respondeu o sargento, ao mesmo tempo que me passava um papel para a mão. “Ele fez o pedido por escrito”, acrescentou, com cara de gozo.

Li o papel. Já o perdi, mas dizia, literalmente: “Dá licença, meu alferes; bom dia meu alferes; está a pedir emprestação de dinheiro cem escudo. Com licença meu alferes. (a assinatura era legível, caligrafia de primeira classe da instrução primária, mas já me não lembro)”. O papel na mão, olhei para o sargento, que continuava com a mesma cara e que acrescentou,: ”Ele quer cento e cinquenta escudos, mas diz que não sabe como se escreve! Podemos emprestar, ele tem crédito do que tem a

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“Um batuque? Aqui? No Lugenda?” E lembrei-me de cenas que tinha visto em filmes, com umas centenas de guerreiros negros.

O Batuque das Mulheres do Lugenda

receber do trabalho na obra. Fale com ele, meu alferes, está aí fora”. Saí e lá estava o homem, acompanhado pelo Mussa. (Esclarecimento: o Mussa era um local que trabalhava connosco e desempenhava papel de capataz. Já de certa idade, era respeitado por toda a gente, incluindo por nós. Falava razoavelmente português, servia de intérprete e transmitia as nossas indicações ao pessoal. Também desempenhava, na aldeia, funções religiosas; a maioria da população praticava ou tinha inclinação para o Islão e eu assisti duas ou três vezes à cerimónia: o Mussa descalçava-se e sentava-se num tapete, todos se descalçavam e sentavam à volta e ele pegava num exemplar já bastante desconforme do Corão e começava a ler. Todos escutavam religiosamente e, no fim aplaudiam ou faziam gestos de assentimento. Eu mantive-me respeitoso, a uma distância que ainda me permitisse observar a cena mas sem que participasse directamente nela nem exigisse que me descalçasse. O que me intrigava era que o Corão estava –era o que me parecia e tinha lógica - escrito em árabe e não me palpitava nada que o Mussa entendesse e soubesse ler árabe; e quanto aos ouvintes, muito menos! Avaliei que ele, ou sabia um trecho de cor e

o repetia sempre, ou que fazia de conta; mas o ambiente era solene e respeitoso, parecia que todos seguiam a leitura. Nunca tive a coragem - ou o descaramento – de lhe perguntar nada sobre isso ! ) Mas continuando, saí e lá estava o homem, acompanhado pelo Mussa. “Então você quer dinheiro emprestado?”, perguntei; “quer!”, disse; “cento e cinquenta escudos?” “quer”, repetiu. “E para que quer o dinheiro?”; “para fazer batuque.”; “e por que quer fazer batuque?” insisti; “já morreu meu pai!”, respondeu. Aí o furriel Dias, que era um gozão incorrigível, avançou para ele, braços abertos e envolveu-o efusivamente, exclamando: ”Eh pá, até que enfim!”. Acho que o homem não tinha aprendido o português até à parte das frases idiomáticas, pelo que ficou encantado com o abraço do Dias, mostrou-se até bastante comovido!

Era evidente a situação; o pai morrera, agora era ele o chefe de família, organizava uma cerimónia de posse, na forma de um batuque, achei que se justificava. E, francamente, com cento e cinquenta escudos não me pareceu que se conseguissem mobilizar hostes por aí além de perigosas. Emprestou-se o dinheiro ao homem. No dia aprazado, o sábado seguinte, fui assistir ao batuque e foi uma desilusão.

Aquilo não tinha nada que ver com o que se passava nos filmes, nem no Chaimite nem nas Minas de Salomão. Era muito mais parecido com aquelas festas da minha adolescência, os da minha geração lembram-se. A Mariazinha (nome fictício, claro, a protecção de dados...) fazia anos, convidava umas quantas amigas, convidava outros quantos amigos, ia tudo lá para casa; a Mãe fazia sandes de fiambre e queijo em pão de leite, havia croquetes, pastéis de bacalhau, salame de chocolate, pastelaria diversa e bolo de velas; bebia-se laranjada, limonada e “cup”... e havia baile. Por vezes era um “lanche ajantarado” prolongava-se para a noite, passavam a ser expectáveis os padrinhos, os tios e um arroz de frango. De qualquer forma o gira-discos girava, girava, debitando melodias e ritmos de Paul Mauriat, Xavier Cugat, passo-dobles e os Platters e toda a gente dançava alegremente. E era de bom tom, ficava sempre bem (estes rapazes do Colégio são muito educados!) convidar a Senhora da Casa para uma valsa. Eram mesmo giros aqueles bailes!

Ora o batuque do filho do defunto, contra os meus receios iniciais, fazia lembrar, só que muito, muito tosco e muito, muito mais pacato, as festas da Mariazinha. Lá estava uma mesa com umas galinhas assadas na brasa, dois ou três copos e um garrafão de vinho. O rádio de pilhas debitava o que o Rádio Club de Moçambique fornecia, quem sabe, talvez Paul Mauriat, Xavier Cugat, passo-dobles, e os Platters, entremeados com anúncios de insecticidas, detergentes e dentífricos. E o pessoal ia mordiscando e bebericando o que estava na mesa e balançava-se molemente. De vez em quando, um dos convidados saltava para o meio do terreiro e dançava mais freneticamente do que todos os outros e muito mais freneticamente do que o que a música justificava, e que tanto podia ser uma rumba mexicana como um “shelltox mata que se farta”. Qualquer que fosse a música a dança era sempre a mesma, mas

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“E se desse para o torto, como tinha acontecido nos filmes, com caveiras e esqueletos?”

O Batuque das Mulheres do Lugenda

a vivacidade, o empenho do convidado comoviam o anfitrião que se chegava ao pé dele, o cumprimentava e lhe passava algo para a mão. “O que é que ele lhe está a dar?” perguntei ao Mussa. “É uma quinhenta” respondeu. “Porquê?”; “Porque está a fazer muita vida no batuque”.

Para quem não sabe, uma quinhenta era o nome que se dava em Moçambique a uma moeda de cinquenta centavos, metade de um escudo. Era fácil perceber que a quinhenta, de muito pouco valor financeiro, devia ter um valor moral muito importante. Demonstrava reconhecimento pela homenagem.

Bem, no fim verifiquei que não tinha quaisquer razões para estar preocupado com o batuque do filho do defunto; e, diga-se, ainda menos razão para ficar entusiasmado!

Mas passado tempos soube que ia haver um batuque muito especial, lá na aldeia. Falava-se no “batuque das mulheres”. “Batuque de mulheres?” Aguçava a curiosidade e não podia ser mais pachorrento e chato do que o outro; “temos que ir ver isso”. Que não, que nós não podíamos assistir. “O que se passa Mussa? Não podemos assistir, porquê?;

“É batuque só para mulher, homem não pode”; “Só para mulher? Nunca ouvi falar, mas deve ser giro !!! Explica lá isso melhor, que batuque é esse?”

E ele explicou. Este batuque era celebração da primeira gravidez duma rapariga. Era num recinto vedado, só podiam assistir mulheres que já fossem mães, nem raparigas solteiras podiam. E quanto a homens, Deus os livrasse de se chegarem. Explicou-me que havia leoas de guarda e se as leoas apanhassem algum homem a espreitar, Deus tivesse pena dele, porque “as leoas não iam ter”. Leoas?!! Alguma coisa muito especial deveria ir acontecer que, certamente, valeria a pena ver. Mas, infelizmente, era proibido para nós. “Meu alferes, e se a gente fosse lá de mansinho, sem fazer ondas, como quem não quer a coisa, talvez nos deixassem entrar” sugeriu o Sargento Teixeira. “O pior são as leoas”, respondi; “mas está bem, não há-de ser nada, vamos lá tentar”; e lá fomos os dois, a armar em papo-seco, atravessando a povoação como quem passeia no jardim público, a assobiar para o ar, descontraidamente. Ao aproximarmo-nos do local vimos duas ou três raparigas, pareciam estar de guarda e ficaram a olhar para nós, sem saber bem o que fazer.

Apercebemo-nos de que o que se passava era que estávamos a ser avaliados por elas. Estavam ali para impedir que homens se aproximassem; mas aqueles dois bípedes descorados talvez não fossem bem homens no sentido local e tradicional do termo, talvez fossem uma excepção às regras. Ficaram expectantes, parecia que aguardavam quaisquer instruções e não nos impediram, de forma que lá fomos chegando à porta do recinto e espreitámos para o seu interior. Lá dentro, sentada no chão, encostada à parede duma palhota, estava uma miúda, evidentemente a festejada; bem arranjada, com trajes vistosos, próprios para uma homenagem, não nos pareceu ter mais que 14 ou 15 anos; perto uma mulher que parecia ser sua mãe; e ao lado uma outra, muito idosa, talvez avó ou, mais provavelmente, uma espécie de matriarca da aldeia. Ficamos à porta a ver o que acontecia enquanto todas as mulheres que lá estavam dividiam o olhar entre nós e a matriarca. Ao fim de dois ou três minutos esta fez um leve sorriso na nossa direcção, fez que sim com a cabeça, como quem lavra uma sentença de absolvição. Confirmava-se, não éramos homens propriamente ditos, podíamos entrar, fôramos admitidos! Não hesitámos, entrámos rápidos, encostámo-nos à vedação logo ao lado da porta e tornámo-nos o mais invisíveis que pudemos. E começou a festa. Tornou-se então evidente o porquê de tanto secretismo; se aquilo não era pornográfico, não sei bem o que seria!!! Digamos que o tema geral era do género “Ai gostaste? Pois agora aguenta!”. E cada uma das mulheres avançava para a miúda, com gestos obscenos, com cantorias que se percebia que eram impróprias para ouvidos de cavalheiros, e todas batiam palmas e se riam perdidamente. E quanto mais velha era a mulher, mais obscena parecia a cena!! Lembro-me duma, já velhota, que pendurou à frente dela um saco, dentro do saco dois cocos e por cima uma grande maçaroca de milho; e avançava para a miúda com gestos e meneios

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Os bailes da Mariazinha eram mesmo giros....como este tirado de um filme de adolescentes

O Batuque das Mulheres do Lugenda

escabrosos, fáceis de imaginar; e todas batiam palmas e riam e .... a miúda, que ou estava ou fingia que estava envergonhada, tapava a cara com as mãos ou com a capulana, mas a cada uma daquelas mulheres passava-lhe uma quinhenta

uma outra ia batendo de lado com o pilão, ela movia os ombros e a barriga e, com isso, fazia uma sonoridade variada, muito mais ao jeito dos guerreiros do Chaimite do que o batuque do filho do que já morreu!

uma “quinhenta” para a mão.

Entretanto, a meio disto tudo chegaram-nos aos ouvidos uns gritos lancinantes. O sargento e eu olhamos um para o outro preocupados e preparando-nos para qualquer eventualidade, mas a risota e as palmas das mulheres fizeram-nos perceber que aquilo fazia parte da festa. Era fácil entender o que se passava e que já tínhamos adivinhado pelas explicações do Mussa: um rapaz estava a espreitar, não fugira a tempo e fora apanhado pelas “leoas” , provavelmente aquelas que estavam à porta, que o sujeitavam a tratamento inspirado nas perguntas que se faziam à miúda: “ Ai gostas e achas graça? Pois agora aguenta!” . E sem ter que esperar vários meses, ali mesmo o faziam sofrer as dores do parto ....... da forma mais espremida e retorcida de que eram capazes!!!

O desgraçado berrava desalmadamente ...... e até a mim me doeu!!!

A festa continuou. Uma outra mulher, também já velha, instalou no meio do terreiro um daqueles troncos escavados, tipo almofariz, de que se serviam para apiloar o milho e fazer farinha, tirou a camisa e, em tronco nu, debruçou-se sobre o almofariz e, enquanto

Durou isto mais de meia hora, talvez três quartos. Em certa altura a coisa abrandou, a matriarca olhou para nós com simpatia mas com um ar que não deixava dúvidas: “gostámos muito da vossa companhia, mas agora é altura de saírem”. E nem hesitámos. Chegámos à porta, fizemos um gesto geral de despedida e de quem agradece terem-nos admitido, responderam-nos acenando com simpatia, lançámos um gesto de encorajamento para a miúda, que agradeceu sorridente, e saímos. Mal tínhamos posto os pés fora vimos dois rapazes que fugiam espavoridos, com três “leoas” no encalço; e percebemos que se fossem leoas a sério, tipo “Panthera leo fellidae”, eles não fugiam com mais pressa nem com mais pânico! Pudera, se calhar o outro já lhes tinha contado!!

Não sei se depois da nossa saída aconteceu mais alguma coisa; mas fiquei a pensar que aquilo sim, era um batuque a sério. Nunca ouvira falar da existência de batuques só para mulheres; mas, pelo que acabava de ver, havia e ainda bem que havia, era ainda mais original e espectacular que o das Minas de Salomão. E menos perigoso. Mas, infelizmente, fotografias nem pensar.

Correu mais algum tempo. Soube que ia haver uma cerimónia local, com batuque, mas que, não poderíamos ir. Tentámos tornear a dificuldade com o mesmo truque do “faz de conta que não é nada connosco” mas aí a proibição foi mesmo a sério. Soube que se tratava de uma iniciação, incluía a circuncisão dos rapazes e não sei bem do quê (embora calcule) em relação às raparigas. Uns e outros com doze ou treze anos. Corriam boatos do que se ia passar, de como se processava o acontecimento, de que era dada aos miúdos uma beberragem anestésica e outra coisa às miúdas, mas nada de informação fidedigna. Até o médico do

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“ A cachoeira era bonita de se ver ...”

O Batuque das Mulheres do Lugenda

batalhão de Marrupa (que por acaso era especialista em ginecologia, calculem) quis ir assistir, até por curiosidade profissional. Nada feito, ninguém era admitido além das pessoas que o protocolo previa, nem mesmo o médico. O que quer que fosse que ali se passava era mesmo reservado, ninguém queria falar do assunto, ninguém dava informações seguras; o médico estava lá comigo, tinha lá ido de propósito e perguntou ao Almirante e ao Mussa o que ia acontecer, o que se passava, como era. Fugiram á resposta, diziam que não sabiam nada. “Não sabem? Mas vocês certamente que também lá foram, vocês sabem, digam lá.”; “faz muito tempo, já não lembra”. “E as miúdas?”, perguntou o médico ; “não sei, só mulher é

....”

que sabe” e nada mais. O tempo foi passando, mais algum passou. Falaram-me de uma coisa que me despertou a atenção. Que a uns dez quilómetros a montante do nosso local, perto da confluência do rio Lugenda com um afluente, havia uma cachoeira, uns rápidos que corriam entre rochas grandes, bonitos, que valia a pena ver. E que, ainda por cima, havia aí uma pequena povoação onde havia homens que poderiam aceitar ir trabalhar para a obra, o que me daria bastante jeito, que eu estava com pouca mão-de-obra. Resolvemos ir lá, num domingo de manhã cedo, éramos uns seis ou sete. Fomos de Jeep até perto do local, havia um ribeiro, os últimos dois ou três quilómetros já

tinha que se ir a pé, quando estávamos a chegar começamos a ouvir a música do rádio de pilhas. O que será isto? Pois claro, eram os últimos ecos, o “fechar da tenda” de um batuque organizado por um tipo cujo pai já morreu!! Tinha durado toda a noite, estava a acabar.

Aderimos e acabou por ser um passeio muito proveitoso: a cachoeira do rio era, de facto, bonita de se ver; o chefe da aldeia prometeu – e cumpriu – que me mandava meia dúzia de homens para a obra; e no batuque do filho deste morto, entre o Xavier Cugat e o Omo Lava Mais Branco, ainda ganhei uma quinhenta !!!

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“ em primeiro plano, o rádio de pilha e.... ainda ganhei uma quinhenta

Allegro Perna Santa Marta, Colombia, para o Panamá

Depois de quatro dias e meio na cidade de Santa Marta, Colômbia, zarpámos às 12 horas do dia 20/01/2015 para o Panamá, mais propriamente para as ilhas de San Blas. À largada, o tempo estava muito desagradável, 25/30 nós de vento, com rajadas de 35 e ondas de 4/5 metros. Para quem anda a fazer turismo, que era o nosso caso, não é propriamente a situação ideal. Mas para os que arriscam fazer uma volta ao mundo, mesmo em

turismo, com milhares de milhas a percorrer, é impossível apanhar só bom tempo – todo o tempo é possível -. É com esta mentalidade que temos que encarar esta realidade, para não passarmos parte da viagem a barafustar com o “raio” da meteorologia, com a chuva que não nos larga, que nem dá para secar a roupa do corpo, com o vento e o mar que não se acalmam. Enfim, apesar da nossa má sorte, e por estranho que pareça – o mar tem destas

coisas - eu estava feliz com a sorte, de ter tido a sorte, pois poucos têm esta sorte:

- Estar a fazer a volta ao mundo –Queixando-se do mau tempo, a Manuela e o Luís Adão escreviam no seu “blogue”: ………… “Vento mantido entre 20 e 24 nós, com rajadas frequentes de 30+ nós. Mar muito desencontrado, com ondas altas, 4-5 metros. O barco a rolar de um lado para o outro todo o tempo, com saltos de cada vez que uma onda, ainda mais desencontrada e maior, o apanhava de lado. Uma não vamos esquecer - maior que as outras, pegou no barco que começou uma surfada muito grande mesmo, que nos manteve calados até ao seu fim. Quando vimos o anemómetro nem queríamos acreditar - 15,4 nós…quem pensa que o Mar das Caraíbas é tranquilo e bom para passeios, desengane-se. É dos mais mexidos que apanhámos até agora. As 280 milhas passaram-se neste carrocel…….. já à vista das Ilhas de San Blas……… …….Amanhã espera-nos um dia de praia e BBQ na ilha. É aproveitar o descanso,

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nº1
Foto
Mau tempo – Rui de Castilho

porque o Mar das Caraíbas cansou-nos, e ainda não acabou!

Publicada por Manuela Adão à(s) 19:31 “

No dia seguinte, mais para o fim da manhã, a natureza, que no meio do oceano fica reduzida apenas ao céu e ao mar, acalmou, possivelmente também ela cansada de correr, deixando-nos repousar e saborear

uma suculenta sopa feita pela Margarida. Depois de 280 milhas navegadas em dois dias de viagem, chegámos à ilha das Tartarugas, uma das 360 ilhas paradisíacas do arquipélago de San Blas. São ilhas lindíssimas, com areias brancas e um mar de águas transparentes, entre o azul claro e a turquesa. Possivelmente estas características vão manter-se por estas latitu-

A Viagem do Allegro

a suas comunidades aos turistas e instalam-nos em palhotas, partilhando com eles os seus usos e costumes. É uma experiência inesquecível que nós não tivemos na sua totalidade porque tínhamos o “Al-

legro” como hotel privativo. Os que vivem em cidades continentais, ditas civilizadas, onde o barulho, o frenesim e o movimento são inalteráveis e incessantes, quando chegam a estas ilhas, possivelmente jul-

des tropicais, mas para já é uma constante. Este arquipélago fica situado no chamado Mar do Caribe, a pouco mais de uma centena de milhas da costa oriental do Panamá. As ilhas são quase desertas, sendo habitadas por uma tribo autónoma que dá pelo nome de “Cunas”

Como há uma ausência total de estruturas hoteleiras, os habitantes locais abrem

gam que estão noutro mundo. Quem viaja num veleiro a seu belo prazer, pode escolher as ilhas que melhor lhe agradarem: as mais distantes, mais desertas, com mais ou menos coqueiros. Há para todos os gos-

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Foto nº2 Indígena “Cuna” Foto nº3 Ilha do arquipélago de San Blas.

A Viagem do Allegro

tos, difícil será escolher! Pertíssimo da ilha de Coco Bandeira, encontrámos uma ilha, melhor diria, uma língua de areia, apenas com dois coqueiros! Durante os cinco dias seguintes, visitámos várias ilhas do arquipélago de San Blas: Coco Bandeira, Cayos Chichime, Porvenir e Linton. Visitar não será a palavra mais adequada para este tipo de ilhas, já que nada há para visitar! É chegar no “bote”, desembarcar e contem-

plar a maravilha tropical que a Natureza nos oferece. Não é necessário estudar os melhores ângulos para tirar boas fotos, todos são bons. Por mais poeta que se seja, na difícil arte fotográfica, que é o meu caso, conseguem-se excelentes fotografias, mas a maioria documenta, apenas, com alguma aproximação, toda esta maravilhosa beleza. Durante estes dias, tivemos oportunidade de conviver

com as tripulações da frota de veleiros que connosco navegavam nas mesmas águas. A diversidade de países enriqueceu o contacto entre todos, pois a troca de experiências com pessoas de culturas diferentes foi uma vivência sensacional. Via rádio, VHF, foi possível marcar encontros para se organizarem grandes churrascos, jantares e “pores do sol” nestas maravilhosas praias.

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Foto nº5 Ilhas
Foto nº4 Ilhas do Arquipélago San Blas
do Arquipélago San Blas

Possivelmente a maioria escolheria ficar aqui neste paraíso pelo resto da vida, mas a viagem tinha que continuar, pois o propósito inicial, ou melhor, o da tripulação do “Allegro”, foi de fazer a Volta ao Mundo, e esse objetivo não mais poderia esquecer-se. Estas viagens, programadas com uma duração limitada, estão sujeitas a variadíssimas condicionantes, sendo a principal a meteorologia, de forma a minimizar os riscos provocados por tempestades, tão frequentes nestas zonas vizinhas a norte e a sul do equador. É do conhecimento geral de quem anda nestas ”andanças“ de travessias, que, por exemplo, só se deve largar das Canárias para as Caraíbas depois de 24/26 de novembro; para voltar é necessário estar já nas ilhas Virgens, rumo à Bermuda/Açores no fim de maio, princípio de junho. Fugindo destas datas, é possível haver alguns encontros com tufões! Estas rotas foram muito bem estudadas, descritas e editadas pelo navegador inglês Jimmy Cornell. Quem pretender programar uma viagem destas é aconselhável ler o seu vasto livro sobre rotas à volta do mundo, pois encontrará, certamente, uma resposta, uma solução mais segura e viável para o seu plano.

Ele esteve em Portugal aquando da Expo-

sição Mundial de Lisboa, em 1998, para organizar a viagem à volta do mundo, á vela, sob o signo “OS OCEANOS”. Desta vez fiquei com o coração apertado ao assistir á largada da frota, Tejo abaixo, com o Bugio no Horizonte - igual à imagem daquele MENINO, que todos as tardes, sentado no cais, via partir os barcos, sonhando pelo dia, aquele dia em que Deus lhe daria a Graça – dele partir também -. Passados alguns anos, muitos dias, porque a vida é composta de anos com muitos dias, eu passei no “Allegro”, e naquele mesmo cais pareceu-me ter visto a imagem desse mesmo “MENINO“, a dizer-me adeus!!!

As estadias nos locais de paragem, como portos de abrigo, cidades, ilhas etc. estão igualmente programadas com alguma folga para dar tempo às tripulações reporem energias, reabastecerem as embarcações e visitarem as respetivas paragens. Aproveitar tudo que é possível é um dos grandes segredos destas viagens, porque na sua programação, não está contemplado voltar atrás para ver ou rever o que faltou. O lema é: “Siga a Marinha” Deixando pela nossa popa San Blas, rumámos em direção à grande baía do Porto de Colon, tendo ficado na Marina de Shelter

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Bay. A singradura foi curta, 60 milhas que fizemos em sete horas. Navegámos quase toda a viagem com mar de pequena vaga e vento de 15 nós, pela alheta de estibordo. Um verdadeiro e cómodo passeio pela zona oeste do mar das Caraíbas, para contrariar as condições da “perna” anterior. No mar, situações iguais é para esquecer, mesmo com o apoio técnico que a área da meteorologia dispõe modernamente, o imprevisto deverá sempre fazer parte da lista do previsto. Até parece um paradoxo dizer: Está previsto o imprevisto!!!

A marina de Shelter Bay surpreendeu-me pela positiva, pois é um porto de abrigo moderno, com bons pontões, balneários espaçosos e limpos e uma boa piscina. Está apoiado por um ótimo restaurante, serviço de bar muito simpático, numa esplanada com vista para a a marina. Preparavam um excelente gin tónico, que fez as minhas delícias e de outros apreciadores, durante os variadíssimos, calmos e repousantes fins de tarde, que antecederam a tão esperada travessia do canal do Panamá. Nestas paragens tropicais em que o calor e a humidade são uma constante, o casamento destes dois ingredientes principais, gin + água tónica, tornam, a meu ver, uma bebida altamente refrescante e agradável.

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Foto nº6 Ilhas do Arquipélago San Blas

A Viagem do Allegro

Chegou mais um reforço para a tripulação do “Allegro”, a Teresa Gago, minha amiga desde 2000. Uma frota de cerca de trinta veleiros, incluindo o nosso navio escola, a barca “Sagres“, rumámos todos para o Brasil, para comemorar os 500 anos da sua descoberta. Velejadora, marinheira, é proprietária e Comandante de um veleiro de regata, o “Sorcerer”, um Bénéteau first 36.7. É vê-la com grande presença e determinação ao leme da sua embarcação, na maioria das competições no Tejo. Foi mais uma boa ajuda na travessia do canal e depois da Margarida e Ricardo terem saído na cidade do Panamá, na “perna” Panamá / Galápagos. Para completar o que já foi dito da Teresa -ela também é médica. O “Allegro”, neste momento, passou a ter três clínicos a bordo, virou hospital!!!. Pena foi que não tenha tido disponibilidade para uma estadia mais longa, pois a sua tranquila simpatia e o seu saber fizeram dela uma agradável e inestimável companhia. Gente nova a bordo traz uma alma nova ao restante grupo, um ar fresco de Portugal, novidades, fofocas e politiquices, para além de renovar a despensa. A Teresa chegou com uma mão cheia, isto é, com uma mala cheia de coisas ótimas e deliciosas de Portugal, que, só de as ver, faziam crescer água na boca a qualquer um, principalmente a quem já tinha saído das suas

terras há cerca de 129 dias. Eram farinheiras, bacalhau e os deliciosos “palmiers” do Careca do Restelo! Tudo isto deu lugar a receitas requintadas que a cozinha do “Allegro” sempre fez questão de apresentar.

No segundo dia, tivemos dois convidados para o jantar: o Jean e a Cristian do “A Plus II“, que trouxeram um bom vinho tinto da Argentina, mesmo a calhar com o “menu” do dia- alheiras com arroz de ervilhas, feito pela Margarida. Uma refeição bem portuguesa que os nossos amigos muito apreciaram, para além da mousse de chocolate que estava divina. É destes pequenos momentos, que em terra são banais, mas no mar, a bordo de um veleiro e longe das nossas casas, têm um sabor muito especial.

A estadia na marina de Shelter Bay, a aguardar luz verde para a passagem do canal, foi aproveitada para ver o que havia neste local, aliás de pouco interesse. Diz-me a experiência, que a melhor solução para visitar um local desconhecido é alugar um carro com motorista ou fazer um acordo com um taxista, pois na grande maioria dos casos, estes profissionais têm formação na área do turismo. São pessoas que conhecem a zona, por isso facilmente nos conduzem aos locais emblemáticos e atrativos, indicando-nos os restauran-

tes mais recomendáveis. De outra forma, mesmo com a ajuda de mapas e roteiros fornecidos pelos Gabinetes de Turismos, anda-se um pouco às cegas e acaba-se por não se ver metade das coisas e perder também as pequenas e interessantes histórias do dia-a-dia, que caracterizam, por vezes, uma terra. São normalmente informações de interesse social, político e mesmo histórico, com a vantagem de serem contadas por pessoas simples, mas com grande sabedoria popular e forte espírito critico.

Sendo assim, concordámos os quatro, o casal Margarida/Ricardo, a Teresa Gago e eu, alugar um carro com condutor e visitar o que o nosso motorista nos propusesse. Iniciámos a viagem pelo Forte de San Lorenzo, construção do tempo da colonização espanhola, sendo um monumento nacional e património da humanidade. Com todos estes títulos sumptuosos bem poderia o governo do Panamá cuidar melhor da sua conservação. Apesar das suas muralhas ainda estarem razoavelmente mantidas e os canhões originais preservados, o casario interior encontra-se totalmente em ruínas. Seria uma pena perder-se esta memória histórica do século XVII que se encontra muito perto do início do canal do Panamá e que pela sua situação dominante é um verdadeiro miradouro sobre o grande lago artificial, o Gatum.

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Foto nº7 Forte de San Lorenzo

Aproveitando o dia e dado que as distâncias eram pequenas, fomos conhecer as instalações do canal do Panamá do lado nascente, ou seja, junto ao Atlântico. Aí tivemos oportunidade de tomar conhecimento de alguns dados referentes à história do canal, bem como do seu funcionamento.

A construção foi iniciada pelos franceses em 1880 e terminada pelos americanos

em 1914. Quando foi inaugurada, terminou a longa e perigosa rota pelo Cabo Horne ou pelos estreitos de Drake e de Magalhães. Esta gigantesca obra de engenharia diminuiu brutalmente o tempo de viagem entre as duas costas americanas, reduzindo inevitavelmente o custo de transporte das mercadorias e, como é evidente, o preço final das mesmas. Com a ameaça feita pela Nicarágua, país

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vizinho da América Central, de construir um canal concorrente, o Panamá entre 2014/2016 lançou outro canal ao lado do primitivo, possibilitando à navegação uma via disponível para cada sentido, o que permitiu aumentar consideravelmente o tráfego total anual.

O projeto do canal de Panamá visou ligar dois oceanos: o Atlântico e o Pacífico, através de uma zona de território que perten-

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Foto nº8 Forte de San Lorenzo Foto nº9 Forte de San Lorenzo

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ce atualmente ao Panamá. A dificuldade deste projeto não era vencer o desnível dos dois oceanos, pois ele não é significativo; apenas o Pacifico é 50 centímetros mais alto que o Atlântico, independentemente das marés. O problema era vencer as diferenças de cota entre cada oceano e a zona intermédia que os separa. Para o caso do Atlântico são de 26 metros e para o Pacífico de 15.5 metros. O regime de marés do Pacífico é grande, andando na ordem dos cinco a sete metros. A solução foi encontrada e resolvida com a construção de três eclusas de cada lado, que conseguiram vencer estes desníveis. São comportas de pequena altura, mas com grande comprimento e largura, podendo receber navios de grande tonelagem como sejam os super-petroleiros e porta-contentores. O comprimento total do canal é de setenta e sete kms. Durante esta visita, contactámos com várias pessoas que ficaram admiradas por eu não estar muito impressionado com esta obra!

Eu expliquei-lhes que em Portugal, nomeadamente no rio Douro, existem cinco eclusas, entre a cidade do Porto e a fronteira com Espanha, possibilitando a este rio ser totalmente navegável, podendo ver-se eclusas com mais de 25 metros de altura. Ficaram todos de “boca aberta”!!! Como o nosso pequeno grupo era “gente” ligada ao mar, foi com curiosidade e ao mesmo tempo prazer que observámos os variadíssimos procedimentos referentes à navegação e segurança, em prática nesta zona do canal – eclusas, áreas de aproximação e de saída. Resumindo o processo, todos os navios, incluindo os veleiros, esperam na área de aproximação, devidamente balizada, que um piloto entre a bordo e tome o comando das operações de navegação, dando instruções à respetiva tripulação para a execução de todas as manobras necessárias com vista à entrada, passagem das eclusas e por fim à saída. Esta pequena viagem, mas repleta de metodologia e segurança, só termina

quando a embarcação está livre da última comporta e o piloto se despede e abandona o navio!!!

Na aproximação, os navios deslocam-se com a ajuda de rebocadores e dentro das eclusas, são rebocados por potentes máquinas de caminho de ferro, montadas em carris, paralelamente, e dos dois lados do canal. Primeiramente, são lançados de bordo, cabos a terra, da proa e da ré, a bombordo e estibordo, sendo amarrados às ditas máquinas. Todas estas manobras são feitas lentamente, com precisão e segurança. Estamos a falar de navios com cerca de 300 metros de comprimento e uma tonelagem gigantesca.

Como era domingo, o guia optou por nos mostrar o que seria um dia no mar para os habitantes de Colon. Realmente a praia, com toda a sua envolvência, é um espelho vivo daquilo que nos foi dado ver por toda a cidade de Colon.

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Foto nº10 Colon, Domingo de praia. Foto nº11 Colon, Domingo de praia.

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Ainda tivemos tempo para visitar a cidade de Colon e a zona franca. Segundo informação do nosso guia, apesar de Colon ser a segunda cidade do Panamá, é uma terra “fantasma”, não só pelo seu aspeto, mas também pela insegurança constante em

que se vive. Mesmo de dia não é aconselhável circular a pé, e até de carro parar por algum tempo. Os únicos edifícios que se encontram conservados e com um aspeto urbano são as igrejas. Com os cuidados que o guia nos indicou, parámos para

visitar uma igreja católica tendo sido recebidos pelo pároco, que quando soube que éramos portugueses, ficou satisfeitíssimo e agradecido pela nossa visita.

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Foto nº12 Colon, Domingo de praia. Foto nº13, 14 e 15 Cidade de Colon

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Com a participação de quase todas as tripulações que andavam na nossa viagem, foi organizada uma grande excursão a uma aldeia índia. Deslocámo-nos de autocarro até à margem de um rio e aí entrámos em várias pirogas que nos conduziram até à dita aldeia. A povoação não ficava perto, pois o percurso durou cerca de quarenta longos minutos, e digo longos, porque a comodidade de uma piroga, com bancos de “suma- pau”, não é a mesma de uma lancha de recreio. Informaram-nos que esta tribo é oriunda da Colômbia e que depois do conflito com o Panamá se fixou nas margens deste rio, há cinquenta anos, tendo uma população de cento e trinta e duas pessoas. A aldeia estava em festa com a nossa chegada e um pequeno conjunto de flautas e bombos tocavam músicas indígenas. São exímios tocadores de flauta que eles próprios fabricam com cana de bambu. À hora do almoço, foi servida uma refeição, confecionada pela cozinha local, que constou de peixe frito do rio, acompanhado de banana frita. A baixela não era de porcelana, mas verdadeiramente original e fabricada, na hora, pelo próprio pessoal da cozinha. Eram pequenas tigelas feitas de folhas de

bananeira, engenhosamente entrelaçadas em forma de ninho, enquadrando e completando o ambiente, tradicional da aldeia índia. As casas, incluindo a cozinha comunitária, são todas construídas em paliçadas com mais de dois metros de altura. Apenas uma enorme palhota, onde se encontrava exposto o artesanato, era uma construção térrea. Verificámos que o artesanato, na sua generalidade, é caracterizado pela riqueza e o garrido das suas cores, com predominância do amarelo e do vermelho em contraste com o branco. Podemos encontrar principalmente peças de cerâmica e em madeira, panos estampados, que fazem parte do vestuário das mulheres, máscaras e cestos.

Fazem também tatuagens, mas não gravadas como modernamente se veem por todo o lado, mas apenas pinturas na pele, empregando material e tintas de fabrico local.

Foi um dia bem passado, onde o contacto direto com uma civilização bem diferente da nossa, nos faz pensar, se não seria dispensável todo este esquema e aparato que envolve e espartilha todas as sociedades ditas civilizadas e modernas. Será que o elevado preço que se paga por este conforto tecnoló-

gico justifica uma vida de “corre-corre” constante e permanente destas populações? Ou seríamos mais felizes sem ter acesso à maioria destas comodidades, a troco de uma vida simples, mais virada para a Mãe Natureza, e para tudo aquilo, que de uma forma original ela nos proporciona?!

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Foto nº17 Uma aldeia de índios
Foto nº16 Uma aldeia de índios

A Viagem do Allegro

65 Foto nº18, 19, 20 e 21 Uma aldeia de índios

A Viagem do Allegro

CANAL DO PANAMÁ

Chegou o dia tão esperado para realizar a passagem do Canal do Panamá -3 de fevereiro de 2015. É uma data para ficar registada com letras grandes nas nossas agendas. Lembrando o velho dito do povo – “Modéstia à Parte” - nem todos os velejadores têm a sorte e o privilégio de passar este emblemático canal, num pequeno veleiro, no mesmo leito onde navegam os navios de maior tonelagem do mundo.

Largámos da marina às 16 horas e lançámos ferro no canal à espera da chegada do piloto. Apesar dos veleiros serem embarcações minúsculas em relação aos gigantescos navios que passam no canal, todos eles, por questões relacionadas com a segurança, têm que meter piloto. Assim, ajudámos à manobra de abordagem do barco dos pilotos e à entrada a bordo do “Allegro” da pessoa que, a partir daquele momento, passaria a ser o comandante e responsável por todas as manobras.

Levantámos ferro e entrámos na primeira eclusa com mais três veleiros. Os respetivos pilotos deram instruções para que os três

barcos ficassem amarrados de “abraço”, isto é, ligados lado a lado por cabos de proa, de popa e a meia nau. As duas embarcações que ficaram do lado de fora lançaram cabos a terra, sendo cada um manobrado pela mão de um operador que acompanha, a pé, a progressão das três embarcações. Estes mesmos cabos são afinados a bordo pelos tripulantes designados para o efeito, sendo todo o trabalho realizado em equipa, de modo a manter este conjunto de barcos no centro da eclusa. O veleiro que está no meio, normalmente é o maior, e com a ajuda do seu motor, faz deslocar todo o conjunto. Com a abertura e fecho das comportas, fomos passando de eclusa em eclusa, até à zona do lago Gatum, vencendo, como já foi dito, um desnível de vinte e seis metros. Chegámos pelas vinte horas e trinta minutos, amarrámos a uma boia de espera, o piloto despediu-se e saiu para o barco dos pilotos. Foi assim que a tripulação do “Allegro” e dos outros veleiros atravessou a primeira secção do canal do Panamá, com o tempo de quatro horas e meia.

No dia seguinte, pelas seis e trinta da manhã, ou melhor dizendo, da madrugada, entrou novo piloto para coordenar a nave-

gação do canal entre as eclusas do Atlântico e do Pacífico. É uma zona balizada até à chegada das eclusas. O desnível a vencer é mais pequeno, quinze metros, mas os procedimentos são iguais. A faina só termina quando o piloto se despede e abandona o “Allegro”.

Foi uma experiência fantástica, para nós tripulantes, através de uma obra gigantesca que, pelo engenho e saber do HOMEM abriu novos caminhos ao mundo e para o mundo. Saindo da zona das eclusas, continuámos pelo canal até entrar, finalmente, no Oceano Pacífico, passando pela grande Ponte das Américas, que liga precisamente as duas Américas, a do Norte e a do Sul. Com rumo à cidade do Panamá, ficámos instalados na marina do Flamengo.

Com grande pena da restante tripulação, o casal Margarida e o Ricardo terminaram a sua viagem. O “Allegro” ficou reduzido a quatro elementos:

A Manuela e o Luís Adão, a Teresa Gago e eu, que iremos até à próxima paragem, o arquipélago de Galápagos – “E SIGA A MARINHA“ -

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Foto nº22 Passagem do canal do
Panamá

A Viagem do Allegro

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Foto nº24, 25, 26 e 27 Passagem do canal do Panamá
Foto nº23 Passagem do canal do Panamá

Figueiredo Valente (352/1940)

Figueiredo Valente. Um exemplo.

Na sequência dos artigos publicados na revista Zacatraz, da AAACM, dirigida pelo Nuno António Bravo Mira Vaz (277/1950), de homenagem a mestres do curso de 1948/55 e outras referências, como o nosso primeiro comandante de batalhão, José Maria Myre Dores (47/1942) -, com o acordo do chefe de redação Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957) -, penso que seria importante divulgar outra grande referência colegial, o nosso camarada José Fernando Valles Figueiredo Valente (352/1940), que foi, também, diretor do nosso Colégio Militar e na altura em que o José está a preparar-se para ser submetido a mais uma intervenção cirúrgica… José Myre Dores dizia que não dividia as pessoas como sendo de «direita» ou «esquerda», mas, sim, se eram, ou não, «atentas aos outros». E o José Figueiredo Valente tem dado muitas provas de ser atento aos outros. Nasceu em 30 de Março de 1930. Entrou para o Colégio em 1940, com o n.º 352. Fez comissões em Angola e na Guiné, foi diretor do Colégio, vindo referido na História do Colégio Militar da autoria de José Alberto da Costa Matos (96/1950).

Conheci-o na Secção de Ação Psicológica da 2.ª Repartição do Estado-Maior do Exército, quando eu estava lá a estagiar para concluir o Curso do Estado-Maior do Exército. Felizmente, acabei para ir para o nosso Colégio, como professor… Entretanto, o Valente, após duas comissões em Angola, foi mobilizado para a Guiné, onde viveria experiências marcantes… Muitos anos passados, na quadra do Natal de 2015, num almoço de convívio organiza-

do pelo Núcleo da Liga dos Combatentes de Oeiras/Cascais, o José Valente ficou sentado perto de mim e do presidente do Núcleo, superintendente Isaías Teles, e deu-lhe um original de um livro que destinava a seus familiares. O presidente Isaías Teles pediu-me um parecer e eu sugeri que o livro fosse editado na coleção Fim do Império, que, então, coordenava, em regime de voluntariado. Em 18 de Outubro de 2016, após um bom trabalho de equipa com o autor, o livro de-

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Galeria Verney, José Valente (352/1940), gen. Chito Rodrigues (Liga dos Combatentes), José Banazol (631/1968), Pedro Dias Antunes (337/1972, filho do 221/1948), Manuel Barão da Cunha (150/1948) e capitão comando Mamudo Seidi, no lançamento do livro.
150/1948
Manuel Júlio Matias Barão da Cunha

signado Memórias de África foi lançado, na Livraria-Galeria Municipal Verney, em Oeiras, numa edição geminada de Âncora Editora com o livro Memórias do Oriente, de outro ex-aluno, o Luís Manuel Dias Antunes (221/1948), que fora instrutor no Colégio e, entretanto, falecido.

Foi uma tarde inesquecível, tendo participado os três filhos do general Valente, sendo um deles, também, Antigo Aluno, o José Pedro Galvão de Figueiredo Valente (124/67), assim como dois dos três «filhos do coração», guinéus.

Após o seu regresso da Guiné, vieram para Portugal, por seu intermédio, dois irmãos, de 5 e 10 anos, de etnia Balanta, um o atual Eng.º Roberto Sambé, vivendo o irmão Domingos Sambé na Alemanha. Anos mais tarde, acolheu e educou o filho de um deficiente das Forças Armadas, de etnia Fula, vítima de uma mina, numa ação em que acompanhava o Figueiredo Valente quando da sua Comissão na Guiné. Esse terceiro «filho de coração» é o capitão comando Mamudo Seidi, atualmente numa missão de paz da ONU na República Centro Africana.

Como diria o comandante norte-americano John Cann, «o modo português de fazer a guerra» E o nosso camarada general José Valente, após deixar o serviço militar, ainda trabalhou durante cerca de 10 anos, como voluntário, em duas instituições, uma de apoio a cegos e outra a pacientes de paralisia cerebral, e realizou um mandato como provedor da Misericórdia de Oeiras.

NOTA FINAL:

José Figueiredo Valente é sem dúvida um homem excepcional. Um militar que resolve adoptar como seus “filhos de coração” 3 miúdos na Guiné e os tráz para Portugal, tem um coração do tamanho do mundo. É o máximo do altruismo. É um Antigo Aluno que soube elevar ao mais alto nível a palavra SOLIDARIEDADE.

Figueiredo Valente (392/1940)

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Galeria Verney (18/10/2016), Eng.º Roberto Sambé e esposa, José Eduardo Valente, José Pedro Valente (124/1967), neta Sara, filha Maria do Rosário e genro, no lançamento do livro. Galeria Verney, Luís Mendes de Almeida (285/1948), Artur Pardal (587/1961) e José Valente (352/1940), no lançamento do livro. Galeria Verney, M. Barão da Cunha (150/1948), capitão Mamudo Seidi, esposa e filhos e reconhecem-se Lalande Vieira Pinto (382/1947), major Fernando Lacerda (pai de um ex-aluno), coronel Rui Marcelino e o recentemente falecido coronel Walter de Almeida, no lançamento do livro.

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Nuno Correia Barrento de Lemos Pires (345/1975)

OCoronel Tirocinado de Infantaria (Operações Especiais) Nuno

Correia Barrento de Lemos Pires (345/1975), foi empossado no dia 29 de Janeiro deste ano no cargo de Subdiretor-Geral de Política de Defesa Nacional pelo Ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho. No decurso da cerimónia, o Ministro afirmou que a nomeação «permitirá um olhar novo, dinâmico e crítico, características que considero valiosas neste século XXI, sobre todos os ve-

tores de desenvolvimento da política de Defesa Nacional».

Nuno Lemos Pires iniciou a carreira militar na Escola Prática de Infantaria.

Foi professor de História Militar e Relações Internacionais no Instituto de Altos Estudos Militares, Intelligence Officer no NATO, assistente militar do Comandante do NATO/Joint Command Lisbon, Chefe de Estado-Maior da Operational Mentor

and Liaison Team da Kabul Capital Division, Comandante do 2º Batalhão de Infantaria Mecanizado e Diretor de Formação da Escola das Armas.

É investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE, onde colabora também como professor convidado. É também professor convidado na Universidade Nova de Lisboa, no Instituto Universitário Militar e no Instituto de Defesa Nacional. Tem oito livros e mais de 100 artigos publicados.

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Subdirector Geral de Política de Defesa Nacional Tomada de posse.

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Pedro Miguel Correia Valas Chagas

(357/1977)

Pedro Miguel Correia Valas Chagas (357/1977) e os símbolos colegiais em LEGO

É conhecida a dedicação do Pedro Chagas, ao Colégio e à Associação em que participou em várias Direcções. Desde há cerca de 2 anos que vem manifestando, de forma pouco comum, a sua ligação emocional aos valores e símbolos colegiais através de um interessante processo de criação artística/lúdica de base racional (é engenheiro de formação...).

Resolvemos perguntar-lhe como tudo começou e como se faz.

Como te surgiu esta ideia de “brincares” com os LEGO em aplicações a temas colegiais?

A história dos modelos colegiais em LEGO começou em 2014, na preparação da reunião dos 30 Anos de Saída do meu curso, quando descobri que o meu sucessor, o 357/2014, estava no 1º Ciclo e tinha 8 anos. Como é que

eu ia encontrar uma lembrança que tivesse a ver com o Colégio, mas que fosse adequada à idade?

Foi assim que surgiu a “Barretina do 357” , um modelo em LEGO com 118 peças, que cumpriu os objectivos definidos: simplicidade na montagem e identificação imediata do tema representado, com a particularidade do ângulo de penacho, onde foram testadas várias configurações de peças até ser obtido o ângulo “certo”. O modelo foi complementado com um site com instruções (barretina-do-357.blogspot.com).

E depois disso?

Mais tarde, em 2017, ao montar o modelo oficial LEGO “Tower Bridge” , reparei que um dos arcos do edifício da ponte se adaptaria bem a uma representação dos Claustros. Comecei a fazer simulações no computador, primeiro com o objectivo de fazer um dos cantos, depois estendi para a zona da porta principal, e acabei com um modelo com 4554 peças, quase 5 kg de peso, e que mal cabe na prateleira para a qual foi pensado.

Em termos de detalhes deste modelo, gosto particularmente de as placas dos cursos terem a posição, a forma, a dimensão e a cor aproximadas, a porta principal abrir, e os candeeiros acenderem.

Este modelo demorou sensivelmente 4 meses a ser desenhado e outros 4 a comprar as peças e a montar, estando a montagem documentada por uma série de vídeos publicados no YouTube.

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Engenheiro de Formação. Modelista de paixão. O monumento aos 175 anos do Colégio (50 peças LEGO). A Barretina do 357 (118 peças LEGO). Os Claustros (4554 peças LEGO).

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Em 2018, ao montar outro modelo oficial da LEGO ( “United States Capitol Building” ), verifiquei que a cúpula podia adaptar-se à Cúpula dos Claustros, e por isso desenhei um modelo da Cúpula com 207 peças.

Em 2019 a “família” de modelos colegiais foi alargada com uma representação do Monumento dos 175 anos, um modelo pensado para captar a essência do monumento com um número mínimo de peças (apenas 50), tarefa facilitada pelo facto de o monumento,

devido à sua geometria, parecer ter sido desenhado por um fã de LEGO.

E como se passa tudo isto desde que decides fazer “uma destas obras de arte” até ao resultado final?

O processo de criação de qualquer modelo começa pelo desenho em computador. Existem diversas aplicações que permitem desenhar modelos virtuais, e a que eu utilizo é a Studio 2.0 (www.stud.io). Esta aplicação não tem custos, tem a lista de todas as peças da LEGO, e está ligada ao

site BrickLink (www.bricklink.com), que tem uma galeria com milhares de modelos criados por aderentes, o que permite obter inspiração e soluções para alguns problemas mais complexos, e tem também um “marketplace” com milhares de lojas virtuais que vendem peças (novas ou usadas) avulso. As peças também podem ser compradas no site da LEGO, mas a variedade de peças e cores disponíveis é muito limitada, e o preço é mais elevado.

Depois de construído o modelo, é possível pesquisar no “marketplace” a loja ou combinação de lojas que minimizem o custo total. Finalmente, o modelo é montado seguindo as instruções geradas a partir da aplicação utilizada para criar o modelo.

Todos os modelos colegiais criados estão publicados “para a posteridade” na Galeria do BrickLink, o que permite que qualquer pessoa possa descarregá-los, ver como estão construídos, montá-los, melhorá-los, etc.

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A Cúpula (207 peças LEGO).

Nelson Nuno Pita de Olim (311/1981)

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Aguerra é a grande escola dos cirurgiões, pelo volume de casos e pela falta de apoios nas cirurgias... é aí que os cirurgiões têm que ser gerais.

48 anos, pai de 2 filhas, Médico Cirurgião Geral, fez a especialidade no Hospital de Santa Cruz em Lisboa onde foi inspirado para a verdadeira “cirurgia geral” por cirurgiões que tinham feito a guerra colonial, seguindo-se uma especialização em “cirurgia de trauma” no norte de Israel na altura da 2ª intifada (2002), posto o que voltou a Portugal e fez concurso para especialista na Marinha onde passou cerca de 6 anos.

Saiu da Marinha para fazer “cirurgia de guerra”... sempre gostou da “emergência, porque é uma cirurgia que não permite prever e obriga a decisões rápidas”. Seguiram-se missões no Comité Internacional da Cruz Vermelha (Iémen, Sudão do Sul, Paquistão, ...) e um contrato como Cirurgião Adjunto do Cirurgião Chefe do Comité durante 3 anos, com base em Genève e cerca de metade do tempo em cirurgias em zonas de conflito armado (Sudão, Nigéria, Congo, Somália, Iémen, Irão, Iraque, Afeganistão, Líbano, Gaza, Arménia, Azerbeijão, Ucrânia).

Em 2017 é contratado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para com base

no Cairo ser “Consultor Regional para o Médio Oriente”, com a missão de standardizar as acções de “Equipas Médicas de Emergência” (EMT) cobrindo quase todos os países do Médio Oriente.

Em 2018 com o início dos protestos em Gaza, muda-se a convite da OMS para Jerusalém e Gaza como “coordenador de trauma” para Gaza.

Conta ainda a participação em missões humanitárias na Indonésia, Timor Leste, Sudão do Sul e Yémen.

Em complemento da formação académica participou em diversas acções de formação específicas em “trauma” em Portugal e no Estrangeiro (Royal College of Surgeons (London, UK), Rambam Medical Center (Haifa, Israel), International Comitee of the Red Cross (Geneva, Suiça), e outras no Canadá, Finlandia, Cambodja e Jordânia.

É autor de diversas publicações internacionais no âmbito da Emergência Médica em situações críticas de guerra.

Gostaria de voltar a Portugal onde se encontram as suas raízes, família e que “é um oásis de segurança que é difícil encontrar no Mundo” , mas, ... depois desta vida que tem tido e que o apaixona “é difícil encontrar no nosso país actividades desafiantes”.

“Estar a operar debaixo de fogo já é habitual... já não me preocupa muito”.

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Médico. Cirurgião de Guerra. Na Associação. Em acção. Cirurgião de Guerra.

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Pedro Augusto Lynce de Faria

(21/1954)

Em 29 de Janeiro do corrente ano, o 21 de 1954 – o Pedro Lynce, 3 estrelas da 1ª Companhia e Comandante da Escolta a Cavalo em 1959/60 - foi distinguido, em cerimónia no Palácio de Belém, como Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.

A Ordem do Infante D. Henrique destina-se a distinguir quem houver prestado serviços relevantes a Portugal, no País e no estrangeiro, assim como serviços na expansão da cultura portuguesa ou para conhecimento de Portugal, da sua História e dos seus valores.

Catorze anos antes, em 21 de Abril de 2005, o seu irmão e sucessor, o 21 de 1960 – o Vasco Lynce, Comandante da 4ª Companhia em 1965/66 - foi, igualmente, agraciado com a mesma distinção: grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.

Pedro Lynce é Engenheiro Agrónomo pelo Instituto Superior de Agronomia, onde foi Presidente da Associação de Estudantes, Professor Catedrático e Presidente do Conselho Directivo, do Conselho Científico e do Conselho Pedagógico, período durante o qual integrou o Senado Universitário e as Comissões de Avaliação das Universidades, sendo, posteriormente, Director Geral do Ensino Superior.

Como político, foi Secretário de Estado do Ensino Superior, Ministro da Ciência e do Ensino Superior, deputado pelo PSD a duas legislaturas e membro do Conselho Nacional de Educação.

Enquanto desportista, começou por representar o Colégio nos campeonatos da Mocidade Portuguesa nas modalidades de atletismo, andebol e futebol (guarda redes), tendo sido nesta última três vezes Campeão Nacional, e nas duas últimas, capitão de equipa.

Posteriormente, no rugby foi internacional em catorze jogos oficiais, capitaneando a equipa nacional em seis jogos. Como treinador obteve os títulos de campeão nacional em diversos escalões e de Campeão Ibérico Sénior; foi, ainda, seleccionador nacional de juniores, de esperanças e de seniores em competições oficiais.

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Engenheiro Agrónomo. Professor Catedrático. Antigo Governante. Capitão da Selecção Nacional de Rugby. Comandante da Escolta a Cavalo (1959/1960).

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Relativamente à distinção agora recebida diz que “Foi certamente o reconhecimento do mérito do trabalho desenvolvido ao longo da vida, que tem como um dos suportes os ensinamentos que o Colégio me proporcionou, colegas, professores e funcionários, que levou o Presidente da República a galardoar-me. Ele representará para mim sempre um prémio coletivo que tem por trás muita gente com quem fiz equipa. Bem hajam Todos!”

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DOIS “21”, IRMÃOS, ANTECESSOR E SUCESSOR, DOIS GRANDES-OFICIAIS DA ORDEM DO INFANTE D. HENRIQUE UM DENOMINADOR COMUM DOS DOIS “21”: O ENSINO, O SERVIÇO PÚBLICO E O DESPORTO.

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Vasco Paulo Lynce de Faria

(21/1960)

Professor de Matemática. Antigo Presidente do Comité Olímpico de Portugal. Antigo Governante.

Vasco Lynce, licenciado como Professor em Matemática e Ciências da Natureza, actual membro do Conselho Supremo da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar e ex-Presidente do Comité Olímpico de Portugal, é um nome incontornável enquanto Professor de Matemática do Colégio nas últimas décadas, (1982 - 2011), sendo reconhecida a sua dedicação aos alunos e os bons resultados alcançados.

Como governante foi Secretário de Estado do Desporto, tendo desempenhado em Empresas Públicas as funções de Presidente do Conselho de Administração da Sociedade Portugal Vela 2007, SA e da Sociedade Portugal 2004, SA, terminando a carreira pública em 2015 como Chefe de Gabinete do Ministro da Educação e Ciência.

Na Administração Pública têm, designadamente, relevo as funções de Presidente do Instituto Nacional do Desporto, dos Conselhos Nacionais Anti-Dopagem, e contra a Violência no Desporto, e de Presidente do Conselho Superior do

Desporto. No âmbito do Desporto, foi Presidente e Secretário Geral do Comité Olímpico de Portugal, Presidente da Assembleia Geral da Federação Portuguesa de Rugby, Chefe de Missão e Adjunto das Missões Olímpicas Portuguesas aos Jogos de Inverno (Canadá) e Seoul (Coreia do Sul).

No plano internacional foi Membro do Conselho de Administração da Agência Mundial Anti-Doping (WADA), em representação da União Europeia, da Comissão Academia Olímpica e Educação Olímpica do Comité Olímpico Internacional e da Comissão da Juventude da Associação dos Comités Nacionais Olímpicos da Europa.

É Membro Honorário do Comité Olímpico de Portugal e da Federação Portuguesa de Atletismo.

Praticou atletismo e integrou a equipa de futebol do Colégio como defesa central e jogou na equipa de futebol da Associação Académica de Coimbra.

Legenda.

Legenda.

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Mas, tal como os “5 irmãos Lynce” Antigos Alunos do Colégio, foi como jogador de rugby que se destacou, tendo sido 6 vezes internacional pela selecção, das quais 4 como capitão, e 25 como treinador (5 como treinador nacional e as restantes como treinador adjunto).

Vencedor de uma Taça de Portugal de rugby pela Associação Académica de Coimbra, Campeão nacional três vezes, das quais duas como capitão pelo CDUL, clube em que venceu uma Taça de Portugal.

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Antigos Alunos nas Artes e nas Letras

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O Conceito Multi-Domínio e as possíveis aplicações às Forças Armadas Portuguesas.

Colecção «ARES» 24. Instituto Universitário Militar.

Nuno Correia Barrento de Lemos Pires (345/1975).

PIRES, N., 2018, 1 O Conceito Multi-Domínio e as Possíveis Aplicações às Forças Armadas Portuguesas, colecção «ARES», 24. Lisboa, Instituto Universitário Militar

O conceito Multi-Domain Battle (MDB), que se pretende aplicável a todo o espectro da conflitualidade, foi concebido inicialmente pelo Exército e pelo Corpo de Marines dos E.U.A., tendo por objectivo a utilização coordenada de todos os recursos das unidades políticas nos conflitos armados. Alargado progressivamente aos outros Ramos das Forças Armadas americanas, encontra-se em fase de desenvolvimento, visando a sua efectiva aplicação num horizonte de 5 a 20 anos.

Não se trata, como explica o autor no Capítulo 1., de um mero upgrade de anteriores conceitos bem conhecidos, como o Air-Land Battle , o Unified Land Operations , o Air-Sea Battle ou o Marines Operational Concep t. Sendo, inegavelmente, seu sucessor, o Conceito Multi-Domínio visa impulsionar o desenvolvimento de cada Ramo individualmente e, ao mesmo tempo, potenciar a acção integrada num contexto em que as ameaças se revelam cada vez mais complexas. O MDB comporta cinco Domínios (Terrestre; Naval; Aéreo; Espaço e Ciberespaço) e duas dimensões transversais (Espectro Electromagnético e Espaço Cognitivo da Percepção Humana).

No Capítulo 2. averigua-se de que for-

ma o MDB se materializa em diferentes cenários estratégicos para enfatizar o seu ineditismo, patente na forma como trata em grau de igualdade os cinco Domínios e como atribui importância decisiva à percepção humana e à gestão das informações em todas as fases da sua aplicação. No que respeita à estratégia operacional, embora o MDB se aplique preferencialmente a cenários de paridade, também se revela apto para enfrentar contra-insurreições. No âmbito da estratégia estrutural, o MDB faz apelo a unidades autónomas, descentralizadas, mais pequenas e mais flexíveis. Finalmente, no âmbito da estratégia genética exige, para além de sistemas eficazes de comando e controlo, capacidades indiscutíveis no do -

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277/1950
Nuno António Bravo Mira Vaz

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mínio do ciberespaço e da percepção cognitiva.

No Capítulo 3., Nuno Lemos Pires passa da teoria à prática para se ocupar da aplicabilidade dos sistemas de forças e do levantamento das capacidades. Para o efeito, aborda um conjunto de questões nas áreas da Organização e Processos, Recursos Humanos e Tecnologia, concluindo que as Unidades de MDB, designadamente nos escalões Batalhão e Brigada, devem optar por organização modular, mais flexível que a actual e semi-independente, «por forma a conseguir um equilíbrio entre capacidades defensivas e ofensivas com a menor dependência possível de apoio, quer dos escalões superiores, quer dos sistemas de apoio logístico». Para que não restem dúvidas, o autor torna claro que, p. e., uma Unidade de apoio de fogos deve dispor de meios terra-ar, terra-terra, mar-terra e mar-ar, além de capacidades de ataque cibernético e electromagnético.

No último Capítulo, Nuno Lemos Pires analisa sucessivamente os diferentes níveis da estratégia para concluir pela adequabilidade do conceito MDB às Forças Armadas portuguesas e, em par-

ticular, ao Exército. No âmbito da estratégia operacional, os cenários previstos para o empenhamento das FFAA portuguesas (baixa, média e elevada intensidade), ao exigirem actuações de forma cooperativa e em ambiente conjunto, recomendam vivamente a aplicação do conceito MDB. No âmbito da estratégia estrutural, e de acordo com os compromissos internacionais assumidos por Portugal, os esforços em todos os domínios envolvidos no conceito MDB devem ser orientados para o escalão Batalhão ou Brigada, ou equivalente nas componentes naval e aérea. No âmbito da estratégia genética, Portugal deve acompanhar a evolução dos seus aliados, por forma a que todos os Ramos possam beneficiar, e não apenas o Exército, parecendo claro que o MDB em Portugal precisa de ter uma aplicação conjunta e, em alguns domínios, como o espaço e o ciberespaço, uma forma integrada.

O autor conclui sugerindo que se adapte , “(…) de forma realista e de acordo com o nível de ambição nacional, um conceito que se aplica a cenários de paridade, a guerras híbridas e a contrainsurgências. O MDB tem aplicações diretas em estruturas e organizações

mais flexíveis, modulares e com menor peso na sustentação logística, assente numa filosofia comando-missão que permitirá tirar o melhor partido de programas de I&D e de edificação de capacidades (…)”.

Nuno Lemos Pires traz-nos, desta vez, uma reflexão apontada ao futuro imediato, cuja concretização, tendo em conta os previsíveis desenvolvimentos no seio do sistema internacional, pode desempenhar um papel de relevo na segurança e defesa do nosso país.

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1Nuno Correia Barrento de Lemos Pires (…) já foi apresentado aos leitores da Zacatraz no n.º 214

Curso de 1952/1959 Romagem dos 60 Anos de Saída

Curso de 1952/1959

Romagem de 60 Anos de Saída 10 Maio 2019

Decorridos 60 anos de saída do Colégio, estiveram presentes nesta romagem de saudade os seguintes Antigos Alunos:

João Luís de Ayala Boaventura (17/1954), José Pedro Mendes Arnaut Monroy (27/1951), António Bento Formosinho Correia Leal (74/1951), José Castelo Glória Alves (90/1952), Francisco José Gomes de Sousa Lobo (95/1952), Luís Maria Teixeira da Mota (106/1952), João José da Silva Veiga (130/1952), Filipe Gabriel Barbeitos Gonçalves (131/1951), Luís Miguel da Costa Alcide de Oliveira (163/1952), Francisco Alberto Calhau de Carvalho Rosado (167/1952), Luís Filipe Ferreira Reis

Thomaz (176/1952), José Carlos Santos Corrêa Monteiro (184/1952), Mário José Rosas Leitão (193/1952), José Francisco Latino Tavares (197/1952), Manuel Nuno da Costa Estorninho (207/1952), Luís Alberto Santos Pereira (214/1952), José Manuel Castanho Paes (228/1952), Carlos Alberto Cardoso Machado Costa (230/1952), José Mário Fidalgo dos Santos (253/1951), João Francisco Guerreiro Santos (263/1951), Carlos Manuel Querido Batista (303/1951), Luís Filipe de Oliveira Baptista (336/1954), Francisco Eduardo Moreira da Silva Alves (392/1952), Manuel Maria de Barros Cardoso de Menezes (393/1951), Carlos Henrique Cameirão Leite da Cunha (394/1951), Agostinho Alberty Martins (398/1952).

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©Fotos Leonel Tomaz Curso de 1952/1959- 60 Anos de Saída - 10 de Maio de 2019

Curso de 1962/1969 Romagem dos 50 Anos de Saída

Curso de 1962/1969

Romagem de 50 Anos de Saída 15 Fevereiro de 2019

Decorridos 50 anos de saída do Colégio, estiveram presentes nesta romagem de saudade os seguintes Antigos Alunos:

Rui Manuel Amaral de Almeida (40/1962); Vitor Manuel de Melo Sousa Uva (58/1962); João Cancella de Abreu (64/1962); António José Carvalho de Paiva Morão (84/1963); José António Formosinho de Palhares Falcão (126/1961); Luís António de Noronha Carvalho da Silva (131/1961); João Bandeira de Sampaio e Pinho (143/1962); António Manuel Restani Graça Alves Moreira (206/1962); João Carlos Colaço Alegre Branco (238/1962); José António de Sequeira Carvalho Teixeira (279/1962); António Luís Maldonado Coutinho (285/1962); Manuel José Duarte Leite de Almeida (292/1962); Joaquim Manuel da Costa Ferro (309/1962); Nuno Miguel Dias Agrely

Rebelo (331/1962); Vasco Manuel Castro Coucello (335/1962); João Daniel Pablo da Trindade Ferreira (364/1992); José Maria Monteiro Freire Raposo (408/1962); João Eduardo M. Guimarães Leitão (411/1962); Luís Fernando Bernardes dos Reis (429/1962); Fernando José Saraiva Maia Henrique (492/1962); Manuel Paulo de Oliveira Ricou (512/1963); Fernando Rafael Pinto Coelho (564/1961); José Carlos Faria do Amaral (584/1961); José Manuel Granja Gomes da Silva (586/1961); Artur Manuel de Spínola e Santos Pardal (587/1961); Pedro Henrique LeCoq Navarro de Andrade Botelho (588/1961); João Manuel Gomes Pereira Carmona (589/1961); Eduardo Aires Monteiro Cortez das Neves (594/1962); Antônio José Teixeira Gonçalves (597/1961); José Manuel Cabanas Nunes Pantaleão (614/1962); Luís Filipe Magalhães de Aguiar (616/1962).

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©Fotos Leonel Tomaz Curso de 1962/1969- 50 Anos de Saída - 15 deFevereiro de 2019

Curso de 1986/1994

Romagem dos 25 Anos de Saída

Curso de 1986/1994

Romagem de 25 Anos de Saída 22 Fevereiro2019

Decorridos 25 anos sobre a sua saída do Colégio, estiveram presentes nesta romagem de saudade os seguintes Antigos Alunos:

Diogo Almeida e Brito Moreira Dores (44/1986), Nuno Caetano Lopes de Barros Poiares (56/1985), Carlos Daniel Fernandes da Silva (62/1986), Nuno Filipe de Almeida Borges Isaías (68/1986), Hugo Manuel dos Santos Roma (69/1986), João Miguel Nunes Ferreira (71/1986), Jorge Manuel Barroso Patrão (79/1986), Nuno Miguel Proença Fernandes (82/1985), Emanuel António Roque Ventura Gomes (122/1986), Rogério Miguel Madeira Gaspar (134/1986), Sérgio Dino Neves de Melo Cunha (148/1986), Guilherme Nuno Vasconcelos Beleza Vaz (151/1986), Manuel Mário de Araújo Pequito (159/1986), Dário Alexandre Nunes de Sá Guerreiro (207/1986), Bruno Miguel da Silva Couto Ferreira Quaresma

(214/1986), Rui Miguel da Fonseca Margarido (235/1986), Luís Gabriel Cardoso Dias de Pessoa Santos (236/1986), Nuno João Martins dos Santos Ribeiro (248/1986), Rui Pedro da Costa Conceição (252/1986), Luís Miguel Santos Pacheco (276/1986), Nuno André Lourenço de Carvalho Allen (281/1986), Pedro Manuel da Silva Marques (309/1986), José Nuno de Almeida Garcia Lopes de Oliveira (350/1986), Bruno Miguel Carrilho de Oliveira Dias (355/1986), Renato Miguel Barreiras Pereira (358/1986), Nuno Pedro Cristóvão Martins Mendonça (373/1986), Pedro Pinho Veloso (429/1986), Rodrigo Marrecas de Abreu (432/1986), José Luís dos Santos Costa e Sousa (486/1986), Alexandre Miguel Rebelo Teixeira Cardoso (492/1986), João Nunes Pereira David Pereira (494/1986), Pedro Miguel Gonçalves Afonso (503/1986), Diogo Rodrigues da Cruz (504/1986), Frederico Mendes Macias (505/1986), Miguel Ângelo Batista Reis Martins (508/1986).

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©Fotos Leonel Tomaz Curso de 1986/1994- 25 Anos de Saída - 22 de Fevereiro de 2019

Curso de 2001/2009

Romagem dos 10 Anos de Saída

Curso de 2001/2009

Romagem de 10 Anos de Saída 29 Março de 2019

Decorridos apenas 10 anos de saída, mas já cheios de saudades da Casa-Mãe, acorreram ao Colégio, para aí descerrarem uma placa «sui generis», que seguramente os irá distinguir de todos os outros cursos, os seguintes Antigos Alunos:

Bernardo José Bitoque de Albergaria (41/2001), Tiago César Ribeiro Monteiro (44/2002), David Andrew Pereira Inácio (67/2002), Alexandre Manuel Oliveira da Silva (82/2001), Lourenço Teixeira Beirão Reynaud Ribeiro (89/2001), André Vieira André Nogueira (97/2000), Tomás de Ayala Botto Fraústo da Silva (108/2001), João Pedro Nina Martins Rodrigues dos Santos (129/2001), Miguel Alexandre da Silva Piedade (134/2001), Francisco Miguel de Queiroga Marçal (170/2002), David Sabaté Mo-

reira (194/2001), Tomás Lourenço Oliveira Pegado (195/2001), Rúben Joel da Silva Martins (203/2001), André Alexandre Frias Abreu (211/2001), Ruben Márçio Pedro da Silva (251/2000), Ricardo Salgado Duarte (284/2001), Jorge Miguel Roque Amado (297/2001), Nuno O’Neill Mendes Esquivel Fernandes (306/2001), Diogo Miguel Falcão Milheiro (319/2001), José Guilherme Teixeira d`Aguiar Norton Brandão (325/2001), Henrique Gabriel Pedras Augusto Mendes (351/2001), David Jorge Barbas Peralta (368/2001), Hugo Filipe dos Santos Rodrigues (395/2003), Miguel Meneres Calheiros de Almeida Pereira (396/2001), Raphael Taboada Monteiro (410/2001), João Luis Fernandes Simões (453/2000), Francisco José Ribeiro Vara (456/2001) e Raúl António Correia Araújo (481/2003).

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©Fotos Leonel Tomaz Curso de 2001/2009- 10 Anos de Saída- 29 de Março de 2019

Os que nos deixaram

Rui Manuel Figueiredo de Barros

Geólogo

Nasceu a 30 de Março de 1924 Faleceu a 28 deFevereiro de 2019

Rui Manuel Figueiredo de Barros morreu ontem, com 94 anos, no Hospital da CUF, onde foi internado no passado sábado.

Nascido, em Luanda, no dia 30.03.1924, era filho de Maria da Glória da Matta e Silva Figueiredo de Barros e do Capitão Jorge Figueiredo de Barros, representante da Companhia de Diamantes de Angola e suas associadas. Destacou-se no Desporto, onde foi campeão de ténis de Angola, em 1942, representando, mais tarde, o CIF em diversos torneios.

Frequentou o Colégio Militar e as Faculdades de Ciências de Lisboa e do Porto, licenciando-se em Geologia. Ingressou, em 1953, na Junta de Energia Nuclear e especializou-se em Fotogeologia, no Institut Français du Pétrole, em Rueil-Malmaison.

Toda a sua vida profissional foi dedicada à geologia do urâneo, tendo passado grandes temporadas em África na prospecção de urâ-

neo, onde fez o levantamento fotogeológico de grandes extensões territoriais, sobretudo em Moçambique.

Foi Director da Junta de Energia Nuclear e representou Portugal na Agência Internacional de Energia Atómica.

Foi presidente , em 1947 e 1948, da Associação Académica da Faculdade de Ciências de Lisboa; sócio-fundador e primeiro presidente da Assembleia-Geral da Associação de Geólogos; membro da direcção da Associação de Auditores de Defesa Nacional; e presidente com mais mandatos da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar.

Publicou diversos trabalhos científicos na área da geologia; escreveu, em co-autoria com seu filho, o livro “Para Além do Colégio Militar – Uma Associação Centenária” e, aos 93 anos, o livro memorialista com o título “Encontro com a Minha Memória”. O Governo do Brasil distinguiu-o com a Medalha do Pacificador. Deixou viúva e 23 descendentes, dos quais 3 filhos, 8 netos e 12 bisnetos.

Comunicado da Família Lisboa, 1 de Março de 2019

Rui Figueiredo de Barros foi Director da Revista da nossa Associação entre 1975 e 1979, foi por duas vezes Presidente da Direcção da Associação, num primeiro mandato entre 1979 e 1983 e num segundo mandato entre 1994 e 1999, e era membro vitalício do Conselho Supremo da Associação, do qual foi Presidente com início do seu mandato em 2001. No decurso do seu primeiro mandato como Presidente da Direcção da Associação, dirigiu ao Chefe do Estado-Maior do Exército o pedido de cedência à nossa Associação do Quartel da Formação (Prédio Militar 34), para nele instalar a sua sede, pedido esse que foi atendido, proporcionando assim à Associação um espaço condigno para a sua sede.

Rui Figueiredo de Barros (62/1936), é o Antigo Aluno com mais anos de dedicação à nossa Associação.

Desempenhou funções relevantes e de enorme contributo nos Órgãos da Associação, iniciadas como Vice-Presidente da Direcção de 1975 a 1979, vindo a ser, por duas vezes, seu Presidente: de 1979 a 1983 e novamente entre 1993 a 1999.

Em 29/3/1996 foi eleito Membro do Conselho Supremo e seu Presidente em 3/10/2001, passando a Conselheiro Vitalício em 29/3/2006.

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Luis Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957)
Os que nos deixaram

Foi Director da Revista da Associação entre 1975 e 1979.

Algumas das suas palavras são o melhor retrato do Homem e do Menino da Luz que foi.

O seu testemunho na “ZacatraZ, nº 200 –Cinquentenário da Revista” enquanto antigo Presidente da Direcção, sob o título “Um Colégio com Alma, uma Associação com Corpo” inicia-se com a citação de Ramiro Guedes de Campos (42/1915):

“Tenho a certeza, meus senhores, a razão é só uma: o Colégio Militar não morre porque tem alma!...”,

ilustrando algumas das seguintes passagens a forma como Figueiredo de Barros sentiu o Colégio e a “sua” Associação:

... a Revista, desde a sua criação, constitui, sem dúvida, um forte elo de ligação entre os antigos alunos e entre eles e o nosso Colégio.

... o Real Colégio Militar nasceu, ele próprio, no início de uma das mais graves e dolorosas crises de soberania nacional: o despontar da Guerra Peninsular ...

De aí para diante, a história do Colégio entrecruza-se com a agitada História política, económica e social do País.

Os números que nos foram dados ao entrarmos pelo portão do Colégio transmitem-nos a herança dos nossos antecessores e projectam o futuro dos nossos sucessores. Têm corpos que somados dão sentido à nossa Associação que, por sua vez, só tem vida porque a alma que incorpora é a alma do Colégio Militar.

De igual modo, em “PARA LÁ DO COLÉGIO MILITAR, UMA ASSOCIAÇÃO CENTENÁRIA” – 2009 - livro de sua autoria em parceria com seu Filho Gonçalo Figueiredo de Barros (440/1967) - fica expressa a dimensão e a forma lúcida e abrangente com que sen-

te e vê o Colégio e a Associação, iniciando o texto com o Discurso que, na qualidade de Presidente do Conselho Supremo, tinha proferido na Abertura do Seminário “Colégio Militar/Bicentenário” em 2003:

“Uma Associação Centenária

Uma Associação, seja ela de que tipo for, só vive e só se justifica em si mesmo enquanto reflectir mobilidade.

As Associações que param são as que chegaram até onde podiam chegar. Não tinham ideal.

As que se movem, fazem-no porque a sua motivação vai além das realidades que as configuram. A tendência para o movimento, o estímulo para a renovação, é tanto maior quanto mais firme for o espírito que as suporta e anima.

Tudo isto para explicar que certas Associações, tal como certas Sociedades, caem no imobilismo; e que outras, melhor fundamentadas e mais animosas, persistem na sua evolução, actualizando-se constantemente sob o impulso firme das suas raízes, estas sim, imutáveis.

Assim é, como estas últimas, a Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, uma Associação centenária, representada por gerações e mais gerações que se repetem na sua devoção à Instituição que as formou. Cada qual, como cada um, com as suas características intrínsecas – quantas vezes bem distintas e controversas – mas sempre unida pelo mesmo espírito, o mesmo ideal, o mesmo sentimento de companheirismo e camaradagem. Toda, como um todo, orientada para o mesmo desígnio de zelar e perpetuar o Colégio que as educou no ideal da cidadania, evocando, como exemplo perene, aquele que, com o olhar posto muito para além do seu tempo, fundou o Colégio Militar – esta Escola única que, pelo seu conteúdo histórico e pelo impulso irresistível da sua mística, significa para cada

antigo aluno o desfolhar de uma saudade que se projecta na fundada esperança de que o Colégio, o mesmo Colégio de sempre, continue a ser a consagração do passado; a exaltação do presente; a certeza do futuro.

Procurando uma definição clara, a Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, assume-se, em plena consciência, como uma componente cívica que, na exacta medida dos seus princípios, pode e deve participar na vida de Portugal.

Por essa via revigora-se a prática do lema “Servir” que de forma tão genuína e séria foi transmitida a todos os que por ele passaram e que os mesmos, depois do investimento formativo recebido, retribuem com disponibilidade activa ao seu País.

A Associação existe e existe de forma muito concreta. Por isso, participa com disponibilidade total, não devendo nem querendo ir além do que, sendo justo e compatível, possa pretender ou que dela se pretenda –com a ressalva única de guardar a sua independência institucional e o seu permanente sentido crítico.”

Relembramos ainda o Homem que sempre por nós foi respeitado e a forma sempre simples, educada e elegante com que pautou a sua dedicação à nossa Associação e a todos os Antigos Alunos.

ADEUS CAMARADAS II

Em Fevereiro passado, fez precisamente 48 anos que partiu “um dos mais idosos membros do Conselho Supremo da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar. Retido há cerca de três anos em casa por grave enfermidade, ditava, praticamente privado de vista, as suas memórias que se

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iniciaram com a sua já distante passagem pelo Colégio Militar, pelo Colégio que como tantos outros, largamente contribuíra para lhe modelar o seu forte carácter”1

O seu número colegial era o 62 e o seu apelido Figueiredo de Barros. Jorge de nome próprio era pai de Rui Figueiredo de Barros, também ele 62 (de 1936), podendo aquela descrição assentar-se-lhe em tudo como uma luva. A diferença é que o meu avô Jorge morreu com 85 anos e o meu pai com 94 a um mês dos 95 anos, no dia 28 de Fevereiro deste ano.

Quando o meu avô morreu, em 1971, estava eu no antigo 4º ano do Colégio, e tenho bem gravado o artigo que, então, meu pai lhe dedicou no número 24 da Revista da AAACM que o homenageou, com o seu retrato na capa.

Nesse texto, intitulado “Adeus Camaradas!” meu pai, cumpriu a vontade de meu avô que já pressentia o seu fim que se desenhava. E, assim de forma simples e bela, rematou a série de capítulos de um artigo que por ele vinha sendo publicado na revista sob o título “Ratas – Ó Tempo volta para trás”.

Foi com essa mensagem de esperança, aqui transcrita, que Rui Figueiredo de Barros, o 62 de 1924, respeitou o desejo de seu pai. É com igual mensagem - quase meio século volvido e conhecendo a profunda dedicação de meu pai ao nosso Colégio e à Associação - que igualmente respeito o que sei ter sido a sua vontade e a sua despedida:

“Adeus a todos os camaradas moldados pelo Colégio e uma palavra de esperança para os actuais e futuros meninos da Luz”.

Eugénio Maximiliano de Sequeira Varejão

(188/1936)

Engenheiro Florestal

Nasceu a 26 de junho de 1926

Faleceu a 26 de Outubro de 2018

1Carlos Vieira da Rocha (189/1929), in revista da AAACM, nº24 de 1971, que homenageou Jorge Figueiredo de Barros (62/1896).

No passado dia 3 de Março, dia grande para o Colégio e para os seus Antigos Alunos, recebemos na Associação esta mensagem «Venho informar a AAACM, que o Antigo Aluno 188/1936, Eugénio Maximiliano de Sequeira Varejão, faleceu no dia 26/10/2018. Hoje 3 de Março, foi o dia escolhido para Vos dar a notícia....... um dia que para ele foi sempre de alegria e recordação. Os melhores cumprimentos. Maria Adelaide Sequeira Varejão Pinto». A Associação acusou de imediato a recepção da mensagem, apresentou os pêsames e solicitou o fornecimento de uma foto e de um resumo da vida do nosso camarada falecido, para publicação desta triste notícia no nosso site e na revista ZacatraZ.

A senhora D. Maria Adelaide, que se revelou ser sobrinha do falecido, enviou-nos o texto que passamos a transcrever: “Eugénio Maximiliano Ferreira de Sequeira Varejão, nasceu a 26/6/1926, em Vila Real. Aos 10 anos, por ser órfão de Oficial do Exército Português, ingressou no Colégio Militar: 188/1936.

Muito miúdo, muito longe da Família e da sua terra, fez do Colégio Militar a sua segunda casa, e dos seus superiores e camaradas, a sua segunda Família.

Esta postura perante a nova situação foi vivida

com intensidade tão séria e profunda, que, desde a irmã (que ia aos bailes tão lindos do Colégio) até nós, eu e meu irmão,sobrinhos que ele criou por serem órfãos ainda bebés, todos celebrávamos o 3 de Março ! Já fora do Colégio, mas ainda em Lisboa, licenciou-se em Engenharia Florestal- Silvicultura.

Trabalhou com uma paixão enorme, nas florestas de todo o País, tendo fixado a sua vida em Vila Real, onde foi Engenheiro Chefe da Administração e da Circunscrição Florestal.

O Marão,o Alvão e serras circundantes foram, florestadas por ele.

Nunca quis sair da sua terra, apesar das propostas que teve para sair do País.

Aposentou-se antes da idade legal para isso, e, junto com a Irmã, cuidou da Mãe até ao dia em esta faleceu. Ao mesmo tempo, “licenciou” os sobrinhos em Medicina.

Teve uma vida simples, mas mereceu, pelo seu valor como Homem e Profissional, o respeito de todos os que com ele lidaram durante a sua vida.

Em 26/10/2018, faleceu. Foi cremado conforme a sua vontade, e também conforme a sua vontade, levou na lapela a Barretina, do seu querido Colégio Militar.

Tocou-nos fundo o texto da Srª D.Maria Adelaide Varejão, pela imagem de simplicidade, de bondade e de altruísmo que nos deu deste camarada falecido. Muito obrigado.

À família enlutada, a quem o nosso falecido camarada, lá longe, em terras de Trás-os-Montes, transmitiu o seu amor ao Colégio, apresentamos de novo os nossos sentimentos.

86 Os que
nos deixaram
Muito obrigada Maria Adelaide Gonçalo de Medina Figueiredo de Barros (440/1967)

Joaquim Telo Simões Soares da Costa

(139/1943)

Médico cardiologista Nasceu a 25 de Setembro de 1933 Faleceu a 10 de Março de 2019

BISAVÔ (MATERNO)

– Daniel Simões Soares (41/1851)

AVÔ (MATERNO)

– Daniel Tello Simões Soares (179/1874);

AVÔ (PATERNO)

–-Raúl Alberto Soares da Costa (17/1900) (General)

PAI

– Joaquim Manuel Costa Júnior (389/1916).

Frequentou o nosso curso do primeiro ao último ano com sucesso. Ficou “crismado” de “Mula”, alcunha “herdada” do seu antecessor. No 7º ano, foi graduado comandante da 2ª companhia. Formou-se em medicina tendo trabalhado no HMP e no Hospital Militar de Luanda, como tenente-miliciano médico. Especializou-se em cardiologia. Aprovado Doutor em Medicina Interna por unanimidade com louvor e distinção. Ensinou alunos do 6º ano na cadeira de Clínica Médica, como Assistente e como Professor. Pertenceu também aos quadros do Hospital de Santa Maria, durante muitos anos.

Autor e coautor de 276 artigos científicos na Sociedade Portuguesa de Cardiologia, onde foi Presidente da Assembleia Geral e Membro do Conselho Científico. Editou o único Tratado de Cardiologia escrito por cardiologistas portugueses. Sócio titular da Sociedade Europeia de Cardiologia e da Sociedade Internacional de Cardiologia.

Para além da prática clínica da sua especialidade, tornou-se simultâneamente, médico cardiologista de todos os camaradas do curso do Colégio – e não só – que, com o andar dos anos o procuravam quando a “máquina” começava a ameaçar “gripar”. As consultas eram inevitavelmente demoradas, pois ele, animado com a presença dos seus velhos camaradas do Colégio Militar, prolongava-as com saudosas evocações dos tempos de “Menino da Luz”.

É citado elogiosamente no livro “História da Medicina Portuguesa do Século XX”, da autoria do Doutor Machado Macedo, ilustre cirurgião cardíaco.

O Joaquim Telo Soares da Costa casou em 29 de Agosto de 1968 com Teresa de Jesus Janeiro Borges que, pormenor interessante, havia sido sua aluna no curso de medicina. O casal teve dois filhos e três netos. Para toda a família Soares da Costa, vai o nosso abraço de sentidas condolências.

O Curso de 1943-1950

87 Os que
nos deixaram
OJoaquim Tello Simões Soares da Costa descendia de uma Família com grande tradição de Antigos Alunos do Colégio Militar e militares de carreira. Destacamos:

Os que nos deixaram

José Luis Guimarães dos Santos Bessa

(73/1955)

Após doença prolongada, faleceu o José Luis Guimarães dos Santos Bessa (73/1955), que estoicamente lutou contra essa doença que lhe afectou as cordas vocais, incapacitando-o, nos seus últimos dias de comunicar verbalmente com a família e os amigos. No seu funeral estiveram numerosos companheiros do seu curso do Colégio, que com ele tinham uma forte relação de amizade. No final da missa de corpo presente, proferi as seguintes palavras em que procurei retractar o espirito do falecido.

«Conheci o José Luis há mais de sessenta anos, quando entrei para o Colégio Militar. Eu fui o aluno nº71, o José Luis era o aluno nº 73. Dormíamos lado a lado na camarata. A proximidade não podia ser maior. No Colégio Militar procura-se formar homens de carácter. O José Luis foi um homem de carácter honrado e resoluto. No Colégio Militar cultiva-se a camaradagem. O José Luis foi um camarada exemplar. A isto aliava uma grande bondade e uma enorme simpatia. Foi um «verdadeiro Menino da Luz», que é o máximo que podem dizer uns dos outros os Antigos Alunos do Colégio Militar. Vamos sentir muito a tua falta. Descansa em paz José Luis.»

António José Ferreira Lourenço

(593/1961)

A VIDA (PROFISSIONAL) RESUMIDA

Nascido em 1951, na província do Bailundo (Angola), usou o número 593 no Colégio Militar, em Lisboa. Em 1968 regressa a Angola formando-se em Engenharia Eletrotécnica na cidade de Luanda e aí exercendo toda a sua atividade profissional. Contabilizam-se 37 anos de um profissionalismo ímpar, e de um imenso empenho e dedicação nos pormenores e pormaiores da arte laboral. Foi engenheiro eletrotécnico na Cabinda Golf entre setembro de 1975 e janeiro de 1980. Assume, depois, o cargo de chefe de departamento na Sonangol até agosto de 1982. Em dezembro de 1982 assume funções de chefe de departamento técnico na Standard Elétrica/Alcatel. De setembro de 1984 a junho de 1991 foi diretor técnico na Protecnica. E, em julho de 1991, inicia funções de diretor técnico na Tecnoserve, terminando aí a sua atividade profissional em 2012.

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Luis Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957) Engenheiro Electrotécnico Nasceu a 17 de Setembro de 1951 Faleceu a 3 Fevereiro de 2019 Retrato pintado por Luís Miguel da Costa Alcide de Oliveira (163/1952).

Miguel Jorge Vieira Branco Ló

(455/1972)

OLó era como um irmão, era da nossa criação, era uma pessoa impecável, amigo do seu amigo, era leal, às vezes um pouco enrezinado e a refilar, mas sempre bem disposto e com uma postura e carácter excelente, muito trabalhador, por vezes brincalhão, muito senhor do seu nariz e adorava futebol, era Benfiquista, gostava tanto de futebol que pôs a filha a jogar futebol e tirou um curso de treinador para treinar a filha, era um apaixonado por futebol e pelo Benfica.

Depois de saírmos do CM fomos para os Pupilos do Exército fazer o Ano Propedêutico, juntamente com mais cerca de 14 camaradas do CM, alguns ficámos na mesma turma porque fomos para Engenharia de Máquinas. Não foi fácil este ano por todos os motivos, mas passámos com boa nota, O Colégio deu-nos muita bagagem de estudo e conhecimento, permitindo nos Pupilos todos sobressairmos dos alunos dos Pupilos e dos outros vindos do exterior. Como queríamos seguir Engenharia civil, fomos juntamente com o “Orelhudo” Luís Costa 543, o “Miuinho” Rui Amaro 495 para o ISEL em Cabo Ruivo. Ficámos na mesma turma e o Ló fez o Curso até ao 4º semestre connosco, tendo depois ido para os EUA para Los

Angeles, estávamos em 1983/84. Falávamos muitas vezes por telefone, tendo o Ló passado 2 anos ido para Nova Iorque, trabalhar para a empresa American Bridge (AB), uma empresa especializada em construção, manutenção e ampliação de Pontes. Foi a Empresa que construiu a Ponte sobre o Tejo e quando foram realizados os trabalhos do comboio e ampliação para 3 faixas de rodagem da Ponte, o Ló esteve cá em Portugal cerca de 3 anos a trabalhar pela AB nos trabalhos da Ponte sobre o Tejo, tendo aí estado com ele diversas vezes a visitar as obras da Ponte, tendo-o ajudado com diversos contactos para fornecedores e sub-empreiteiros para a realização dos trabalhos que a Empresa necessitava fazer. Devo dizer que os trabalhos desenvolvidos pela AB na Ponte sobre o Tejo correram lindamente muito e em grande parte por força da acção e profissionalismo do Ló, que fez um excelente trabalho e teve um papel fundamental em todos os aspectos no sucesso da realização dos trabalhos por parte da AB. Já nessa altura o Ló levantava-se às 5H30, ia correr 1H, às vezes mais e depois estava a trabalhar às 7H00 da manhã, todos os dias, muitas vezes aos Domingos também e muitos dias ficava a trabalhar até tarde, 22H e mais, era conforme, porque a AB trabalhava por turnos, era ele que coordenava o pessoal e a programação dos trabalhos e quando havia problemas, lá estava o Ló para os resolver. O Ló sempre foi muito trabalhador e era uma pessoa que dormia pouco, 4-5h por noite, não dormia mais.

Acabados os trabalhos da Ponte voltou para os EUA, para Nova Iorque, estamos no ano 2000, o Ló depois comprou um belíssimo apartamento na 118th street, em Nova Iorque. Eu e uma série de ex-alunos do CM foram lá passar uns dias, outros semanas e mais gente amigos do Ló e também Família, enfim, o Ló abria a casa aos amigos e gostava de ter gente em sua casa, recebia lindamente e uma particularidade, nunca comia em casa, só as vezes ao pequeno almoço, de resto, nunca, os electrodomésticos da cozinha, nunca foram utilizados a primeira vez que fizemos um jantar em casa do Ló, fui Eu e o José Moutinho 407 com o Ló que estreámos a cozinha, o fogão, o micro-ondas a máquina de lavar louça.

Em Nova Iorque continuava a levantar-se muito cedo, às vezes âs 4H30, corria quase todos os dias no Central Parque 1-1H30 e entre as 6-7H da manhã estava a trabalhar nos escritórios da AB em Fort Lee, em New Jersey. Às vezes tinha de se deslocar a várias obras noutros estados dos EUA e noutros países, mas a base era em Nova Iorque.

O Ló, houve uma altura que vinha a Portugal duas vezes por Ano, uma no Verão e outra no Natal, normalmente uma semana de cada vez.

Lembro-me de muitas mais situações de almoços e jantares com ex-alunos do CM, jantares no Apartamento dos Lombos,em Carcavelos, de muitas outras boas situações que passámos juntos, o Ló era uma pessoa que era um elo de ligação com muita gente e tinha prazer em conviver com os amigos, tinha uma gargalhada característica e estava sempre pronto para ajudar os amigos, tinha uma forma de li-

89 Os que nos
deixaram

Os que nos deixaram

dar e actuar com as pessoas única e realmente só dele. É uma grande perda a sua morte prematura e ainda hoje ando meio zonzo com a sua morte, parece que me falta algo, sinto muito a sua falta e tenho muitas saudades dele.

Havemos de nos encontrar um dia destes, quando não sei, mas que nos vamos encontrar, no futuro, vamos.

Havia muitas mais situações para contar, mas o Grave, o Manel, o Pedro, o Xana, o Mota, também vão contar situações passadas juntamente com o Ló e histórias que passámos todos juntos, a memória do Ló estará sempre presente comigo e nunca o esquecerei.

Se precisarem de alguma coisa da minha parte, estou à disposição.

Évora , 6 de Março de 2019 Caros amigos

No dia da Missa do Miguel Ló, o Peixinho pediu-me para escrever algumas palavras sobre o Miguel, confesso que nesta altura, não é fácil para mim falar do Ló , foi uma das razões porque deixei passar algum tempo, estas palavras do Ben ajudaram.

Alguém disse um dia, e a propósito da amizade; que quem tem um amigo é uma pessoa com sorte, quem tem 2 amigos tem muita muita sorte, e quem julga ter 3 ou mais amigos, ou é estupido ou está iludido.

Quer se goste ou não, o nosso colégio tem esta capacidade de nos transformar , na maioria dos casos, em homens com muita muita sorte, eu pelo menos sinto-me assim. É verdade, as amizades que construímos no Colégio são para a vida.

de 2 amigos, e, sem dúvida, dois deles foram feitos no Colégio.

A vida tem destas coisas, e cada um de nós os três fez a vida em diferentes continentes. Apesar da distância, falávamos com alguma regularidade, O Manel Esparteiro colocava-nos com alguma frequência em conferência nos telemóveis para falar, e rir com algumas parvoíces que dizíamos, era como se voltássemos á adolescência e estivéssemos a falar na camarata.

Forte Abraço

Falar do Ló para mim, é falar de amizade, cumplicidade, companheirismo, camaradagem, proximidade (independentemente da física), entreajuda, entrega, inteligência, poder de observação, humor… etc, etc., podia encher uma folha!

Conheci o Ló no segundo ano do Colégio, e foi daquelas amizades, não me perguntem porquê, que parecia ter já começado numa outra vida.

Com o passar do tempo, fomos acompanhando de alguma forma as vidas um do outro, com períodos em que nos víamos mais e outros menos, mas sempre com a tal proximidade que só as verdadeiras amizades conseguem, e que nada têm a ver com a proximidade física.

Podíamos estar cinco ou seis anos sem nos vermos, quando nos encontrávamos a conversa fluía como se não nos víssemos há 1 ou 2 dias.

Mas voltando á minha estupidez, sou daqueles que quer acreditar que tem mais

Uma espécie de multinacional virtual onde o nosso Lózinho levava a América do Norte, o Manel a América do Sul e eu este nosso velho mundo. Os temas de conversa eram invariavelmente a politica, o desporto, e claro alguma miúda gira que estivesse a fazer furor em qualquer parte do planeta. A função do Ló era manter o Trump com juízo, o Manel controlava o Bolsonaro e eu ia informando das avarias do Costa e do Marcelo. No desporto, o Benfica, a Seleção, e os golos do “Marroquino”, era assim que o Ló se referia ao Ronaldo, eram temas obrigatórios, quanto ás miúdas, não vou contar para não ferir alguma suscetibilidade. Podem imaginar a galhofa que eram estas conversas.

Enfim, já tenho saudades do meu amigo, é certo que a vida continua, tem de continuar, mas a sensação de perda é grande e dolorosa, estou triste, muito triste.

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Duarte Miguel Wandschneider de Mesquita de Brito Caldeira (319/1972) Um abraço a todos João Pedro de Vasconcelos e Sá Grave (395/1971)
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