Revista ZacatraZ nº 214

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No início do presente século era já notório que era imperativo proceder a alterações no Colégio, como aliás foi sendo sucessivamente alertado pelas sucessivas Direções da AAACM.

Entretanto, em 2007, ano em pela primeira vez tive um sucessor, o 591/2007, o meu filho Francisco, voltei uma vez mais a uma relação intensa com o Colégio.

Militar, lhe continuemos a disponibilizar a nossa colaboração, pois, nos dias de hoje, a afirmação de um caminho estratégico já não é possível de forma autónoma e solitária. Além disso parece evidente, que nenhuma Instituição se pode dar ao luxo de desperdiçar as inúmeras valências da comunidade de Antigos Alunos.

Camaradas

Sendo esta a última ocasião em que me é atribuída a honra de assinar o Editorial, na qualidade de Presidente da Direção dos Corpos Sociais eleitos para o triénio de 20162018, permitam-me partilhar convosco uma breve reflexão sobre os NOSSOS dois temas de referência: o Colégio e a Associação. Começo naturalmente pela Instituição: o Colégio Militar.

Quando ingressei no Colégio, para o então 3º Ano, no já distante Ano Letivo de 1973/1974, integrei um Batalhão Colegial a atingir o seu número máximo de alunos, perto das sete centenas. Como se impunha, o Geral, a Camarata e os Claustros, respiravam as caraterísticas próprias daqueles tempos. Antes do final desse Ano Letivo, ocorreu o 25 de Abril de 1974, que como é natural em qualquer período revolucionário, nos trouxe momentos que a todos marcaram profundamente.

Foi esse um período muito particular, desde logo pelas campanhas desenvolvidas por algumas forças, com linhas programáticas expressamente dedicadas ao fecho do Colégio, pelo menos no modelo que então o vivíamos.

Este período deu também azo a muitos episódios verdadeiramente demonstrativos do espírito colegial, desses relembro apenas a famosa Sessão de Esclarecimento, em que o Batalhão Colegial se mostrou mais esclarecido e adulto que aqueles que o pretendiam doutrinar.

Foram sem dúvida tempos complexos, mas como sempre ao longo da sua história, o “Colégio” soube encontrar o seu caminho e comemorou então o 175.º Aniversário e posteriormente o 200º Aniversário.

É, no entanto, de referenciar, que a sociedade portuguesa foi-se modificando profundamente, e como também é perfeitamente natural o Colégio evidenciou alguns efeitos dessas alterações.

EditorialEncontrei um Colégio muito diferente do meu, que num sinal preocupante, apresentava um Batalhão com um efetivo de metade daquele que tinha integrado no “meu tempo”.

Face a esses números, procurando mais efetivos e melhores notas, ensaiavam-se então medidas avulsas, como foi a entrada de externos (uma dezena nessa altura). Atenda-se que essa medida por não ter sido acompanhada adequadamente, se tornou meramente circunstancial e pontual, não permitindo grandes ilações.

Na década seguinte, prosseguindo como pai e no desempenho de funções na Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar, fui confrontado com o maior ciclo de profundas mudanças estruturais do Colégio Militar.

Num reduzidíssimo período temporal, sem qualquer preparação prévia, o Colégio Militar passou de estabelecimento militar de ensino frequentado exclusivamente por alunos do género masculino, em regime de internato, a estabelecimento militar de ensino, agora também com o 1º Ciclo, destinado a alunos de ambos os Géneros, permitindo a opção por regime de Internato ou Externato Sintetizando, o Colégio Militar como Instituição, com 216 anos, passou na sua história por períodos extremamente difíceis, julgo no entanto, que esta recente alteração foi sem dúvida a maior que o Colégio sofreu. Como se indicia nos parágrafos anteriores, todas estas vivencias permitiram-me uma convicção iniludível: o Colégio Militar teve sempre a resiliência e intuição necessárias á procura e adequada identificação do seu caminho, defendendo a matriz de princípios e valores que constituem o seu código genético. Estamos hoje no início de uma nova caminhada, pois, como tivemos o privilégio de constatar na visita de trabalho, realizada no passado dia 15 de Fevereiro, está em curso um processo de afirmação de um novo rumo, pretendendo-se que o Colégio reassuma o lugar que TODOS queremos para ele. Nesta perspetiva, torna-se imperativo que num voto de confiança à Direção do Colégio

Passando à Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, a NOSSA Associação.

Parece hoje indubitável, que foi procurando ampliar a ação e assegurar a eficácia que, há já mais de um século, se criou a nossa Associação.

Convictos, que será no modelo Associativo, que seremos mais uteis e eficazes, decidimos mobilizar a nossa comunidade para que, numa participação alargada e construtiva, se delineassem possíveis caminhos de resposta aos grandes desafios que atualmente se colocam à Associação.

Foi nesta perspetiva, que se organizaram as Jornadas de Trabalho subordinadas ao tema “O futuro da Nossa Associação”.

Tendo como essencial e incontornável para esta reflexão a situação do Prédio Militar da Antiga Formação, foi apresentada, como ponto prévio às Jornadas, a situação de todo o complexo do PM 34.

Finalmente, culminando o processo iniciado, foi assumido que face à qualidade das intervenções se tornava imperativo a sua divulgação para alargamento da reflexão e incentivo a novos contributos.

Camaradas

Estamos certos, que, face à particular exigência e transversalidade dos desafios que se apresentam, tanto ao Colégio Militar como à nossa Associação, temos que nos manter envolvidos, TODOS.

É imperativa a agregação dos Antigos Alunos em torno da sua Associação, procurando que esta se afirme e intervenha como o ente social representativo do universo dos Antigos Alunos.

É esse o meu apelo final.

Aos Antigos Alunos que integrarão os Corpos Sociais em breve eleitos, como Antigo Aluno deixo-vos o meu muito obrigado pela vossa disponibilidade.

A todos vós, o meu profundo obrigado, pelo privilégio e oportunidade de servir o nosso Colégio e a nossa Comunidade. Um forte Zacatraz

3 Editorial Revista “ZACATRAZ”

Ficha Técnica

CORPOS SOCIAIS DA ASSOCIAÇÃO PARA O TRIÉNIO 2016-2018

ASSEMBLEIA GERAL

Presidente

Raul Miguel Socorro Folques - 380/1952

Vice-Presidente José António Pina de Bastos e Silva - 67/1957

1º Secretário António Luís Henriques de Faria Fernandes 454/1970

2º Secretário Pedro Gonçalo Coelho Nunes de Melo - 51/1982

DIRECÇÃO

Presidente

José Eusébio Pereira Barata Cordeiro de Araújo - 591/1973

Vice-Presidente Artur Manuel de Spínola e Santos Pardal - 587/1961

Secretário João Eduardo Correia Barrento Sabbo - 17/1967

Tesoureiro Luís Manuel Borges de Albuquerque Nogueira - 323/1969

1º Vogal Francisco Eduardo Moreira da Silva Alves - 392/1954

2º Vogal Luis Manuel Marques Cóias- 190/1990

3º Vogal José Miguel Teixeira de Faria - 2/1969

4º Vogal José Maria Gouveia de Azevedo e Bourbon - 598/1971

5º Vogal João Pedro Mendes Carreiro Gomes - 390/1983

1º Vogal Suplente Gonçalo Miguel de Matos Gonçalves - 105/1984

2º Vogal Suplente Tiago Simões Baleizão - 200/1987

3º Vogal Suplente Manuel Soares Albergaria Felgueiras e Sousa - 498/2006

CONSELHO FISCAL

Presidente Manuel Ramos de Sousa Sebastião - 604/1961

1º Vogal Rui Joaquim Azevedo de Avelar - 25/1960

2º Vogal Eugénio de Campos Ferreira Fernandes - 180/1980

1º Vogal Suplente Rui Manuel Gomes Correia dos Santos – 225/1981

2º Vogal Suplente Bruno Miguel Fernandes Pires - 27/1995

Ficha Técnica

PUBLICAÇÃO TRIMESTRAL

Fundada em 1965 Nº 214 Janeiro/Março - 2019

FUNDADOR Carlos Vieira da Rocha (189/1929)

DIRECTOR

Nuno António Bravo Mira Vaz (277/1950) nunomira.vaz@aaacm.pt

CHEFE DE REDACÇÃO

Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957) luisfbarbosa@aaacm.pt

REDACÇÃO

Pedro Manuel do Vale Garrido da Silva (53/1961) Gonçalo Miguel de Matos Gonçalves (105/1984)

CAPA General Ramalho Eanes. Prémio Barretina.

ENTIDADE PROPRIETÁRIA E EDITOR Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar

MORADA DO PROPRIETÁRIO e SEDE DA REDACÇÃO Quartel da Formação - Largo da Luz 1600-498 Lisboa Tel. 217 122 306/8 Fax. 217 122 307

TIRAGEM - 1350 exemplares DEPÓSITO LEGAL Nº 79856/94

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Isenta de registo na Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC), ao abrigo do nº 1 da alínea a), do Artigo 12º do Decreto Regulamentar nº 8/99, de 9 de Junho.

Os artigos publicados são da responsabilidade dos seus autores. Esta publicação não segue o novo acordo ortográfico.

4 NA AAACM PODE ADQUIRIR 25€ 15€ 25€ 20€ 25€ -15€ -15€ -7,50€ 35€ 14,50€ 8€ 3€ 6€ 15€ 20€ 8€ 35€ 21€ 40€ 15€ 30€ NOVO

Curso de 1948/1955. Romagem dos 70 Anos de Entrada

Curso de 1958/1965 Romagem dos 60 Anos de Entrada

Curso de 1968/1975 Romagem dos 50 Anos de Entrada

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Sumário 69 Foi há 100 Anos A Monarquia do Norte 41 O Cavalo de Ferro Moçambicano 45 A Família Duarte Silva 25 Entrevista a Filipe Soares Franco
Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos
Prémios Barretina 2018
Ângelo Felgueiras Sócio Honorário da SGL
Antigos Alunos em Destaque
Almoço da Delegação do Algarve
Jantar de Natal em Braga
Jantar de Natal da Delegação do Norte
A Prisão
Homenagem a António Sérgio (2ªparte)
Homenagem a Myre Dores (47/1942)
Antigos Alunos nas Artes e nas Letras
Manuel de Azevedo Fortes
Coisas que não sabemos
Jornadas de Trabalho da AAACM
Histórias e Memórias
Retificações
que nos deixaram

Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

Jantar Anual da Associação

Novos Antigos Alunos Prémios

Barretina 2018

Este ano o jantar anual da Associação apresentou duas novidades: realizou-se no início de Dezembro, mais tarde do que o habitual, e teve lugar em Cascais, pela primeira vez fora de Lisboa. Não sendo possível continuar a utilizar, para o nosso maior evento social anual, o Hotel Pestana Palace, no alto de Alcântara, transferimo-nos para o Hotel Pestana de Cascais, cuja utilização nos foi facilitada, da mesma forma do que a do anterior hotel, pelo Tomaz Júlio Teixeira de Azevedo e Guimarães Metello (462/1958).

O evento teve lugar numa sexta-feira, dia 7 de Dezembro, que coincidiu com uma greve de comboios a nível nacional, o que deu origem à paralisação dos combóios da linha de Cascais. Face a esta situação, o tráfego automóvel de saída de Lisboa ao fim da tarde era muito superior ao normal, o que levou a grandes atrasos na chegada de muitos participantes no jantar ao local do mesmo. O encontro começou com aquilo que foi designado por um «wellcome drink» no grande átrio de entrada do hotel, que apesar de grande se tornou pequeno para acolher o elevado número de participantes no

jantar. Este início de encontro é sempre agradável, por dar ensejo a cada um para saltitar de grupo em grupo, revendo aqui e ali amigos que há muito não se viam, ou revendo outros, de presença mais assídua,

que aqui encontramos uma vez por ano. Dá para rapidamente nos inteirarmos do que é feito de cada um e para os mais velhos dá ainda para fazerem a sua «prova de vida» anual. Quando deixamos de ver,

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Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa
71/1957
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1 As fotografias inseridas neste texto são de autoria de Leonel Tomaz (Sócio Honorário). Prémio Barretina. Amigo do Colégio.

dois ou três anos seguidos, os mais assíduos, normalmente isso não é bom sinal.

O compasso de espera do «wellcome drink» foi aproveitado para se fazer, numa sala separada, uma primeira recepção informal aos Alunos finalistas que concluíram o seu curso no ano lectivo transacto e que foram mais tarde, naquela noite, formalmente integrados na comunidade dos Antigos Alunos. Foi, por assim dizer, uma sessão iniciática preparatória, em que lhes foram dirigidas palavras de boas vindas, em que lhes foram dados breves conselhos (coisa que a juventude não gosta muito de ouvir) e em que lhes foi muito sumariamente explicado o privilégio de se pertencer à comunidade dos Antigos Alunos do Colégio Militar e a grande responsabilidade que essa condição encerra. Tomaram parte neste acto os Presidentes dos diferentes

Novos

Jantar Anual da Associação

Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

órgãos da Associação, nomeadamente, da Direcção, da Mesa da Assembleia Geral, do Conselho Fiscal, do Conselho Supremo e do Conselho de Delegados, bem como o Director da revista ZacatraZ.

O jantar teve lugar numa grande tenda montada no jardim do hotel, para onde todos se dirigiram, esperando aí a chegada do nosso convidado da noite, o General Ramalho Eanes. Recebido o nosso convidado à porta do hotel, pelos já referidos Presidentes dos diferentes órgãos da Associação, foi o mesmo encaminhado para a citada tenda, onde iria decorrer o jantar, sendo aí recebido por uma espontânea ovação de todos os que o aguardavam e que lhe demonstraram, todos de pé, a honra e o prazer que a sua presença lhes proporcionava. Depois de todos terem tomado os seus lugares, o «mestre- de -cerimónias» de ser-

viço, João Pedro Mendes Carneiro Gomes (390/1983), subiu ao palco, agradeceu ao nosso anfitrião as facilidades proporcionadas e deu início ao evento, com a cerimónia de imposição das barretinas de lapela aos novos Antigos Alunos, tendo sido estes chamados ao palco em dois grupos de doze elementos cada. A cerimónia foi simples e expedita, os novos Antigos Alunos foram devidamente aplaudidos e os que estavam na assistência ficaram a conhecer a cara de mais esta mão cheia de novos elementos da nossa comunidade. Ficou ali reunido um grupo de Antigos Alunos com idades compreendidas entre os 18 e os 94 anos, sendo esta última a bonita idade do Antigo Aluno mais veterano presente, D. Agostinho de Sousa Coutinho (15/1934), sentado na mesa da presidência e que manteve connosco uma interessante conversa ao longo do jantar. É esta uma característica da nossa

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Imposição de barretinas de lapela aos novos Antigos Alunos.

Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

comunidade, não conhece barreiras de idade, como não conhece barreiras politicas, de credo ou de raça. Somos todos iguais, somos todos filhos do Colégio Militar e, como irmãos, tratamo-nos todos por tu, mantendo-se sempre o respeito mútuo. Concluída a recepção aos novos Antigos Alunos, foi a vez do Presidente da Direcção dirigir a palavra à Assembleia ali reunida, num discurso breve, mas assinalável, que é reproduzido mais adiante na presente revista.

Concluído o discurso do Presidente, foi a vez de saborearmos o jantar tipo «buffet» posto à nossa disposição e de confraternizarmos entre nós, em particular com os nossos parceiros de mesa, aproveitando ao máximo o convívio que a ocasião nos proporcionava. Na mesa da presidência, em que me encontrava, o nosso convidado General Ramalho Eanes manteve, durante o repasto, animada conversa com os Antigos Alunos que o ladeavam, Vasco Joaquim Rocha Vieira (127/1950) e Raúl Miguel Socorro Folques (380/1952), militares como ele e seus conhecidos de longa data, comunicando também com todos os restantes presentes, com demonstração de grande simpatia. Ousamos dizer, que aparentou

grande satisfação com o convívio que ali ocorreu, o que obviamente proporcionou também aos presentes na sua mesa, grande satisfação.

Terminado o repasto, chegou a vez do ponto alto da noite, ou seja, da distribuição dos prémios Barretina, que é sempre aguardada com elevada expectativa pela assistência. O «mestre-de-cerimónias» subiu então ao palco, para dar início a esta parte do programa.

O primeiro agraciado da noite foi o nosso convidado, General António dos Santos Ramalho Eanes. Antes de lhe ser atribuído o seu prémio foi exibido um pequeno filme de apresentação do homenageado, de autoria do Antigo Aluno António Carlos da Palma Estanislau (376/1964). Embora o nosso homenageado seja uma personalidade que não carece, em geral, de qualquer apresentação, considerou-se adequada a projecção do pequeno filme referido, quer para refrescar memórias, quer em atenção aos mais novos dos presentes, que ainda não eram nascidos, quando o General Ramalho Eanes cessou as suas funções de Presidente da República.

Ao General Ramalho Eanes foi atribuído o Prémio Barretina – Amigos do Colégio Militar. A leitura dos fundamentos da atribuição deste prémio ficou, neste caso particular, a cargo do signatário, na sua qualidade de Presidente do Conselho Supremo. Os referidos fundamentos da atribuição deste prémio, bem como dos restantes prémios, apresentam-se mais adiante, em artigo separado desta revista. O prémio foi entregue pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral, Raúl Miguel Socorro Folques (380/1952). Ao agradecer, o agraciado começou por fazer um pequeno improviso, lendo depois o texto que de seguida se reproduz.

Agradecimento de ANTÓNIO RAMALHO EANES

Jeanne de Vietinghoff escreveu um poema a que Yourcenar chamou o poema da sua vida, em que diz: “Para quê fazer da vida um dever se ela pode ser um sorriso?”.

Não creio que razão completa houvesse para tão sublime poema.

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O nosso convidado. General Ramalho Eanes agradecendo o prémio recebido.

A vida é, sempre, e para todos, um dever. Na verdade, é – deve ser -, também, sempre que possível, um sorriso.

Na vida do Homem, dever e sorriso devem ser compagináveis: se ao primeiro se não deve faltar, o segundo não se pode perder.

Para mim, dada a profissão que escolhi e a “circunstância” em que exerci (e era Ortega y Gasset que dizia: “Eu sou eu e a minha circunstância”) – e dada a política que tive de exercer e o tempo conturbado do seu exercício -, a vida foi, predominantemente, um dever.

Agora, já no anoitecer da vida, uma retrospecção pessoal me mostrou que muitos foram os sorrisos que não deveria ter perdido, e perdi. Em especial, os sorrisos dos meus pais, da minha mulher, dos meus filhos, dos meus amigos, das terras em que nasci e daquelas que frequentei.

Perante tal falha, pecados meus, até, entendi que atento deveria estar aos sorrisos, sobretudo, dos meus netos –ampliá-los, entendê-los se possível, usufruir deles e responder-lhes, para que, na vida deles, o sorriso não anulasse o dever, nem o dever anulasse o sorriso. Para tal conseguir, decidi passar mais tempo com eles, tempo que não ofereci aos meus filhos. Para conseguir tempo, neste pouco tempo que me resta, resolvi por termo a todas as obrigações sociais dispensáveis.

Estava nesta fase, com este propósito, quando a Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar me bateu à porta. Apesar do discurso elaborado e convincente do Coronel José Correia Araújo e do Dr. Luís Nogueira, entendi, para respeitar o propósito que estabelecera, não abrir excepções.

Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

Por preocupação de delicadeza, não declinei logo o convite. Contava fazê-lo mais tarde. Mas, ao reflectir, entendi ser meu dever, dever de coerência, aceitar. Primeiro, porque, enquanto Chefe Militar que fui, consciente fiquei de quanto as Forças Armadas devem ao Colégio Militar, escola de escol e liderança, fonte realizadora de vocações, que tantos oficiais excelentes proporcionou às Forças Armadas.

Segundo, porque, tendo eu, desde há muitos anos, reflectido sobre a importância do papel, responsável e competente, da Sociedade Civil – a importância do seu diálogo, exigente, com o poder político, bem como a importância da sua contribuição para o bem comum – era meu dever, através da recepção do prémio que me atribuíram, prestar simples e justa homenagem à Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar e, assim, também, a todos os que se “fizeram” homens no Colégio Militar.

Terceiro, porque entendo que, nos tempos difíceis de hoje, e certamente ainda mais difíceis amanhã, por motivo da globalização, do avanço da tecnologia de imprevisível evolução e efeito, é obrigação de cidadania, minha, lembrar – lembrar sempre –que, hoje, mais do que nunca, importa ter líderes autênticos, porque ter líderes é ter, em princípio, na sociedade, preocupações éticas para com os que se dirigem, em qualquer organização ou instituição que seja.

Ora, em meu entender, contribuir para que o Colégio Militar – que tantos filhos e tão ilustres em todos os domínios deu ao País – tenha um lugar de excelência na nossa memória colectiva é trabalho, nosso, que os antigos alunos do Colégio Militar podem, melhor do que ninguém, desempenhar.

Aceitei, pois, o vosso Prémio Barretina – Amigos do Colégio Militar como homenagem à vossa história colectiva e a vós, enquanto herdeiros do ensino do Colégio

Militar, da sua personalidade histórica, mas, também, da sua continuidade autêntica, distinta e distintiva.

A todos vós, antigos alunos do Colégio Militar, agradeço, e a todos desejo as maiores venturas.

No final da leitura do seu agradecimento o General Ramalho Eanes foi objecto de uma grande ovação. Este foi um dos momentos mais altos que vivemos ao longo da história da atribuição dos nossos Prémios Barretina, que já vai no décimo primeiro ano da sua existência.

O segundo agraciado da noite foi Luis Alberto Santos Pereira (214/1952), a quem foi atribuído um Prémio Barretina – Colégio Militar no Mundo, fruto da sua brilhante carreira de professor universitário e cientista, no domínio da hidráulica agrícola, com a qual granjeou

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Chegada do General Ramalho Eanes ao hotel.

Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

reconhecimento a nível mundial, o que o levou a desempenhar cargos científicos internacionais do maior relevo. O prémio foi-lhe entregue pelos delegados do seu curso no Conselho de Delegados da nossa Associação, José Mário Fidalgo dos Santos (253/1951) e Carlos Manuel Querido Baptista (303/1951).O homenageado agradeceu, referindo que, apesar da sua idade, ainda desenvolve alguma actividade a nível internacional e mencionando os laços de grande amizade desenvolvidos dentro do Colégio nos seus tempos de Aluno. De seguida apresentamos o discurso de agradecimento por si preparado.

Agradecimento de SANTOS PEREIRA

nha vida científica. O Prémio Barretina foca o Colégio, o que me foi acontecendo pela vida fora graças ao Colégio.

Muito obrigado a quem me propôs para o prémio, ao curso 52-59. Muito obrigado a quem o outorgou, à direção da nossa Associação.

Felizmente, já recebi muitos reconhecimentos públicos pela minha actividade de engenheiro, de professor, de investigador. Mas o Prémio Barretina é especial. Não foca algo em especial, nem a carreira, mesmo se tanto há pouco disseram sobre a mi-

O prémio chama-se Colégio Militar no Mundo. E tudo começou no Colégio com a oportunidade que a Marinha deu a um pequeno grupo para, nas férias do 6º para o 7º, embarcar na velha Sagres até Brest. Foi uma experiência fantástica, com uma bela tempestade à mistura. E tudo se reforçou no Colégio com a nossa viagem a Goa, Damão e Diu, e visitas a Malta, a Beirute - e ao vale de Beqaa e ao grandioso complexo de Baalbek, ao Cairo e às pirâmides, e a Roma e ao Vaticano, onde fomos recebidos pelo saudoso Papa João XXIII, que nos confidenciou ter sido sargento na primeira grande guerra. Voltei a quase todos estes lugares e sempre procurei na memória esses tempos e, sobretudo, os camaradas com quem vivi essas experiências.

A profissão, nomeadamente nas diversas vertentes de estudo acerca dos usos da água, levou-me a correr mundo atrás, ou à frente, de conferências, congressos e ensinos vários, mas sobretudo procurando perceber como os mundos e as gentes são diversos, diferentes e iguais. Esta procura e, sobretudo, o sucesso das relações que fui estabelecendo foram largamente alimentados pela ética com

que fui fazendo as relações com os outros. Assim corri mundo e fiz amigos por tanto sítio. A idade não me parou e ainda este ano voltei à China para apoio à investigação, e continuei a ensinar em Itália.

Essa ética aprendemos no Colégio e era parte da ideia forte de camaradagem. A ética do respeito pelos outros, a ética de ajudar quem nos pede apoio, a ética de fazer bem o que é nosso dever fazer, a ética como virtude militar e, essencialmente, como virtude de cidadão, o que no Colégio aprendemos a ser.

Do Colégio vem, agora, a lembrança e vivência da amizade, a outra grande componente da camaradagem. O meu curso é, como outros o serão também, um curso de amigos. Amizade entre camaradas, alicerçada nos variados desafios que se nos depararam, nas boas alegrias que vivemos, nas experiências que partilhámos nesses tempos de há sessenta e tal anos. Cada um foi para seu lado construir a sua vida. Mantivemos relações mais ou menos fortes e fomo-nos encontrando, agora mais frequentemente porque a idade não nos deixa esperar. Aqui estão alguns desses camaradas, naturalmente causadores da festa que aqui sinto e que dão sentido à palavra Barretina.

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Santos Pereira (214-1952) agradecendo o prémio recebido.

Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

O terceiro agraciado da noite foi António Manuel Adão da Fonseca (286/1957), a quem foi igualmente atribuído um Prémio Barretina – Colégio Militar no Mundo. Tal como o agraciado anterior, também este teve uma brilhante carreira como professor universitário, mas no domínio da engenharia civil, na especialidade de estruturas, à qual aliou uma actividade intensa e de grande mérito como projectista de pontes, viadutos e edifícios. Para que a assistência tivesse uma ideia das obras notáveis projectadas por Adão da Fonseca, foram apresentadas algumas imagens das mesmas, o que deu para a assistência entender porque é que nos meios da engenharia civil as pontes e viadutos são designadas por «obras de arte». O prémio foi-lhe entregue por dois elementos do seu curso, José António Pina de Bastos e Silva (67/1957), Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Geral da nossa Associação e Rui Manuel Campos de Almeida Mota (2/1957), delegado do seu curso no Conselho de Delegados da nossa Associação. O homenageado agradeceu, sublinhando, tal como o tinha feito o General Ramalho Eanes, que aquilo que os homens são resulta muito das circunstâncias que se lhes deparam ao longo da vida, para daí concluir, que aquilo que fez ao longo da sua vida profissional tinha resultado do facto de ter sido capaz de aproveitar a circunstância excepcional que lhe foi oferecido viver, a de ter sido Aluno do Colégio Militar.

O quarto prémio da noite não foi uma distinção individual, foi uma distinção colectiva, que há muito era devida à nossa Delegação do Norte. A Delegação fez-se representar pelo seu líder actual, Bruno Pinto Basto Soares Franco (281/1972), sendo o prémio entregue pelo Presidente da Direcção da nossa Associação, José Eusébio Pereira Barata Cordeiro de Araújo (591/1973). O Bruno Soares Franco, igualmente conhecido por «TOFA», agradeceu em nome da Delegação do Norte e manifestou também os seus sentimentos pessoais, na sua forma exuberante habitual, dizendo que, tal como

Adão da Fonseca, também ele reconhecia que a vida lhe tinha oferecido a circunstância excepcional de ter sido Aluno do Colégio Militar. Lembrou o inesquecível professor Dario e terminou recomendando a todos, para usarem permanentemente a Barretina na lapela, pois a mesma é um símbolo de mérito, é um grande facilitador em várias circunstâncias da vida e é um sinal exterior do orgulho que todos temos em ser Antigos Alunos do Colégio Militar.

O quinto prémio da noite foi de novo uma distinção colectiva, desta vez à Delegação do Algarve. Dado o líder da Delegação Joaquim Paleta Marreiros (413/1965), não poder estar presente, foi a mesma representada, e muito bem representada, por João Pedro Rodrigues Ferreira Quaresma (213/1965). O prémio foi atribuído pelo Vice-Presidente da Direcção da nossa Associação, Artur Manuel de Spínola e Santos Pardal (587/1961). O representante da nossa Delegação do Reino do Algarve de aquém mar, deu-nos algumas notícias relativas às iniciativas promovidas por aquela delegação, em que a vertente gastronómica é relevante, leu-nos um texto preparado por Joaquim Paleta de agradecimento pelo prémio concedido e acabou recordando-nos aquele magnifico texto de José Maria Sardinha Pereira Coelho (56/1889), que este intitulou «O Convívio» e que nunca é demais recordar, pelo que não resistimos a apresenta-lo aqui de novo.

«Tu lá que és? Um avançado? Um conservador? Um ateu? Um crente? Um desventurado? Um triunfador? Um vencido? Que importa. Estiveste no Colégio Militar? Viveste debaixo do mesmo tecto em que eu vivi? Há dez, há quinze ou há vinte anos? Comeste na mesma mesa? Dormiste na mesma camarata? Guardas no peito as recordações imorredouras daqueles anos de convivência? Lembras os recantos do «geral», o Sol que víamos pela janela, a ânsia de liberdade, a tristeza do entardecer, a conversa da camarata, a tortura da alvo-

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Adão da Fonseca (286/1957) agradecendo o prémio recebido. Leitura da fundamentação do Prémio Barretina - Amigo do Colégio. Delegado da Delegação do Norte, Soares Franco (281/1972) agradecendo o prémio. Representante da Delegação do Algarve, Ferreira Quaresma (213/1965) agradecendo o prémio.

Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

rada, o pavor das aulas, os companheiros de carteira, as nossas esperanças, as nossas ilusões, as alcunhas, o calão, a graça, a vida daquela colmeia, a bondade com que nos olhávamos, a simpatia que nos ligava, a alegria da nossa mocidade fresca e vigorosa? Foste educado naquela exemplaríssima casa de camaradagem? Eras o 30, o 26, o 34 ou o 14? És meu irmão! Estás ligado a mim por esse traço indestrutível da mesma saudade, tão forte, tão viva, tão doce, que eu ao escrever estas linhas tenho as lágrimas nos olhos…..»

O sexto prémio da noite foi o «Prémio Barretina -Associação- Amor ao Colégio», que foi atribuído a João Vasco de Sousa de Castro e Quadros (444/72), que foi Presidente, durante os anos de 2015 a 2018, da Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar. O prémio foi entregue pelo Presidente do Conselho de Delegados Nelson Manuel Machado Lourenço(377/1982) e por João Luis de Mascarenhas e Silva Shoerder Coimbra (54/1984), que também teve uma actividade muito relevante nos últimos anos na mesma Associação. O agraciado não agradeceu o prémio recebido, por considerar que distinções deste tipo não se agradecem, mas fez alguns comentários à distinção recebida, comentários esses que passamos a transcrever.

Comentários de CASTRO E QUADROS

Desde muito miúdo tenho por certo que “homenagens, condecorações prémios e distinções não se pedem, não se recusam, nem se agradecem”. Mas nunca ouvi que não possam ser comentados!

E por isso …, permitam-me, duas breves notas sobre a atribuição do Prémio Barretina ao 444/72.

Só a Amizade e a Camaradagem podem ter levado o proponente (ainda não consegui descobrir quem foi mas desconfio) a nomear-me para um prémio que “distingue Antigos Alunos … do Colégio Militar, cuja acção tenha contribuído de forma notável para a concretização da missão da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar”.

E também só a Camaradagem e Amizade podem ter levado os “elementos da Direção da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, presentes em reunião convocada para o efeito, ...” a deliberar unanimemente nesse sentido.

No campo do “Amor ao Colégio Militar”

colocarem-me em paralelo com um Gonçalo Matos (371/1949), com um António Marquilhas (67/1944) ou com o Manuel Rio de Carvalho (124/1945)que Deus os tenha – afigura-se-me, no mínimo, inadequado. Porque a minha actividade em prol do nosso Colégio foi casual, circunscrita no tempo e, em boa verdade, até egoísta, enquanto a deles foi permanente e altruísta.

Casual , pois fora o 444/2011 não ter querido vir para o Colégio Militar (ou a mãe dele não ter anuído a semelhante ideia) e o meu singelo contributo nunca teria acontecido.

Circunscrita no tempo pois, em boa verdade, iniciou-se em 2014 e concluiu-se em Julho passado.

Egoísta, pois era a educação do meu filho (onde, como podem imaginar, tenho bastantes interesses) que estava em causa.

Fica assim demonstrado que qualquer paralelismo do 444/72 com os oito Antigos Alunos até agora distinguidos com o prémio Barretina, Amor ao Colégio Militar é, no mínimo, descabido.

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Mesa da Presidência.

Quanto ao meu Amor ao Colégio Militar (que como bem sabem não nego) não é maior nem menor do que o de qualquer um aqui presente.

A única diferença é que eu tive a possibilidade de, fruto de circunstâncias várias (nomeadamente maior disponibilidade de tempo), o pôr em prática enquanto integrando a Direcção da Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar.

Enquanto Presidente da sua Direcção tentei ser o rosto de todos os Pais e Encarregados de Educação que, concordando com o Projeto Educativo do Colégio Militar, optaram por nele matricular os seus filhos e educandos.

Foi fácil? Não digo que tenha sido. Posso até assegurar-vos que em algumas ocasiões foi até bem difícil.

Mas foi seguramente uma óptima forma de eu conseguir devolver ao Colégio uma ínfima parte do que o Colégio me deu a mim e a todos os sete Quadros que por ele passaram (o primeiro deles, o 18/1885, meu bisavô paterno).

Contudo o apoio que sempre senti por parte de muitos – nomeadamente o da Direcção da Associação de Antigos Alunos do Colégio Militar, com quem mantivemos sempre um estreito alinhamento de pensamento e acção – foi o bastante para ultrapassar essas poucas situações. Neste campo, mesmo correndo o risco de ser injusto para tantos outros, uma palavra de sentido reconhecimento aos Antigos Alunos que, tal como eu, entenderam que o projecto Colégio Militar se adequava aos seus filhos e que me acompanharam e impulsionaram neste percurso.

Obrigado José Araújo (591/1973)

Obrigado Ângelo Felgueiras (498/1976)

Obrigado António Coutinho (249/1980)

Obrigado António Carvalho (153/1980)

Obrigado Sérgio Carvalho (300/1975)

Jantar Anual da Associação Novos Antigos Alunos - Prémios Barretina 2018

Obrigado João Coimbra (54/1984)

Este prémio também é vosso!

Uma palavra final à Direcção do Colégio. Meus caros camaradas e amigos 461/1972 e 1/1982. António e Rui. Por vezes não estivemos de acordo quanto aos meios.

Mas sempre estivemos – e julgo que sempre estaremos – de acordo quanto ao fim. Desde que esse fim seja o nosso Colégio. Obrigado pela paciência que tiveram comigo.

A todos, agradeço a atenção dispensada. Um Santo Natal!

A demonstração de notável humildade, que o texto lido encerra, calou fundo em toda a assistência e trouxe de novo, por momentos, aos nossos espíritos e ao nosso convívio, aqueles nossos três camaradas já desaparecidos, citados no seu texto, cujo amor ao Colégio era de facto admirável e de quem guardamos uma memória bem viva. Pode-se em rigor dizer, que estiveram ali de novo connosco.

O sétimo e último prémio da noite foi o «Prémio Barretina-Associação-Dedicação», que foi atribuído a Pedro Miguel Correia Valas Chagas (357/1977). O prémio foi atribuído pelo Director da revista ZacatraZ, Nuno António Bravo Mira Vaz (277/1950). O agraciado agradeceu o prémio recebido e introduziu um conceito novo no nosso universo, que foi o conceito dos «serviços mínimos» que o Antigo Aluno tem obrigação de prestar ao Colégio. Nesses «serviços mínimos» está incluída a comparência anual ao desfile do 3 de Março na Avenida da Liberdade, pelo que acabou por fazer um apelo geral, para que ninguém faltasse ao desfile do próximo 3 de Março, para aí incentivarmos e apoiarmos os actuais Alunos.

A sessão terminou da forma habitual com o nosso grito de Zacatraz, seguindo-se o Hino Nacional, por todos cantado com emoção.

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João Quadros (444/1972) agradecendo o prémio. Pedro Chagas (357/1977) agradecendo o prémio.

Jantar Anual da Associação

Palavras proferidas pelo Presidente da Direcção

(591/1973)

Camaradas

Mais uma vez, tenho a honra de institucionalmente poder dizer algumas palavras perante uma Sala que ilustra magnificamente a nossa Comunidade.

Aqui vimos a nossa Comunidade Colegial, nessa tão caraterística amplitude geracional que se estende do mais antigo presente, o 15/1934, Agostinho Sousa Coutinho, prestes a fazer 95 anos e a quem saúdo calorosamente, aos mais Novos Antigos Alunos agora entrados.

Todos unidos na vivência intemporal de uma camaradagem, assumida no usufruto responsável do TU colegial e no genuíno amor ao Nosso Colégio

Camaradas

Sendo este o evento principal da nossa Comunidade, considero que a palavra deve ser dada aos nossos distintos agraciados. Nessa perspetiva, apenas vou proferir algumas palavras ditadas pelas indeclináveis responsabilidades institucionais.

Começo, como não podia deixar de ser, por um momento de Agradecimento:

Ao nosso camarada Tomaz Metello, (462/1958), que com a sua grande generosidade continua a contribuir determinantemente para que tenhamos um evento com esta elevada qualidade;

Ao Nelson Lourenço (377/1982) e ao Luís Cóias (190/1990), pela organização do cerimonial referente à receção dos Novos Antigos Alunos;

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Jantar Anual da Associação Palavras do Presidente

Ao Pedro Gomes, o (390/1983) e ao Tiago Baleizão (200/1987), que de forma muito intensa organizaram este evento; Por fim aos nossos colaboradores Alina Nogueira, Leonel Tomás e Ana Carvalho, pelo seu genuíno e incondicional empenhamento.

Passo agora a um momento de Reconhecimento e Gratidão:

Ao nosso convidado General Antonio Ramalho Eanes, que hoje nos dará a honra de receber o “Premio Barretina Amigos do Colégio Militar”

General Antonio Ramalho Eanes, sendo certo que V. Ex.ª constitui uma referência universal, no que aos princípios e valores diz respeito, deve como tal ser referenciado às gerações mais novas como exemplo a seguir, em especial quando se pretende um projeto educativo alicerçado nesses princípios e valores, como é o caso do Projeto Educativo do Colégio Militar.

Aos Novos Antigos Alunos do Colégio Militar - Aqui representados pelo Curso Finalista de 2017/2018.

Quero aqui acentuar que como Novos Antigos Alunos, mereceis o nosso voto de camaradagem para a vida, relembrando que são estes laços comunitários que a todos nos unem um dos elementos inequivocamente sustentador do sucesso intemporal deste Projeto Educativo.

Por isso sublinho perante vós, que esta Barretina que hoje vos foi imposta na lapela determina a responsabilidade de pertencer a esta Comunidade.

Alunos Graduados do Batalhão Colegial do Colégio Militar - Aqui, representados por toda a estrutura de comando do Batalhão. Sois os principais responsáveis pela assimilação e afirmação diária dos valores caracterizadores do nosso projeto Educativo. Peço-vos que sobretudo com o vosso exemplo, demonstreis aos mais novos que o nosso Código de Honra é a referência que a todos vincula.

Comissão PM 34 - Foi cientes do cariz estratégico do Prédio Militar nº 34, que se recorreu à criação da Comissão PM 34, o vosso trabalho

tem sido profundo e notável, pelo que na pessoa do vosso coordenador, o Norton Brandão (400/1961) vos remeto o nosso obrigado.

Por fim, um momento para expressar publicamente um voto de confiança:

Na Direção do Colégio Militar - Aqui representada pelo seu Director, Coronel António Salgueiro (461/1972) e pelo Subdirector o Tenente-Coronel Rebordão de Brito (1/1980).

A colaboração que temos desenvolvido com a Direção do Colégio Militar, sempre a pedido desta e em salutar articulação com a Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar, procurou sempre preservar a matriz valorativa caracterizadora do Projeto Educativo do Colégio e garantir um trabalho na reafirmação do Colégio Militar como escola de Excelência.

Obrigado por nos terem dado a oportunidade de humildemente darmos a nossa colaboração.

Quanto ao vosso trabalho, aproveito mais uma vez, desta feita perante esta magnífica moldura colegial, para aqui deixar o nosso voto de profundo agradecimento e absoluta confiança no vosso inexcedível empenhamento para reafirmar o Colégio Militar como uma Escola de referência pelo Projeto Educativo único e diferenciador que a distingue.

CAMARADAS ANTIGOS ALUNOS DO COLÉGIO MILITAR

Camaradas

Uma nota final

Está a terminar o triénio de 2016-2018, para o qual foram eleitos os atuais Órgãos Sociais. Iremos nesta parte final do mandato procurar mobilizar a reflexão no seio da comunidade de Antigos Alunos, para que, numa participação esclarecida e construtiva, se estruturem possíveis caminhos para uma resposta adequada aos desafios colocados. Começaremos por refletir sobre o futuro da nossa Associação, nesse sentido no próximo

dia 26 de Janeiro, iremos desafiar a nossa comunidade para em Jornadas de Trabalho dedicadas à “AAACM”, a realizar no Teatro D. Luis Filipe, apresentar propostas quanto ao futuro pretendido para a nossa Associação.

Finalmente, mais para a frente, terá lugar a Conferência “Colégio Militar” que procurará induzir a reflexão propiciadora que nos aponte a Missão e o caminho a percorrer pelo Colégio Militar.

São manifestamente temas de partida: o papel do Colégio Militar no âmbito da Identidade e Defesa Nacionais; da Cooperação com os restantes países que integram a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa; do Apoio a militares e outros servidores do Estado deslocados em serviço e do contributo para o reforço de uma Cidadania ativa e responsável. Esta Conferência será certamente um contributo para a formulação de uma visão partilhada sobre o “Colégio Militar do Futuro” e consequente definição dos principais requisitos para o cumprimento do seu desígnio.

Pretendemos, com esta particular e humilde iniciativa afirmar linhas de clarificação da Missão do Colégio Militar, tendo presente as necessidades para o futuro e procurando recolocar esta Instituição de Ensino, de forma efetiva, ao serviço dos relevantes desígnios do nosso País.

Delineadas as linhas finais do mandato, não podemos terminar sem uma palavra de gratidão para com todos aqueles que connosco colaboraram e de forma extraordinariamente intensa nos ajudaram O nosso profundo obrigado Camaradas.

Por fim, acentuamos que para todos nós foi uma honra termos tido a oportunidade de servir o nosso Colégio e a nossa Comunidade. Perdoem-nos as nossas limitações. Em prol do nosso Colégio e da nossa Comunidade.

Um forte Zacatraz.

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Prémios Barretina 2018

Prémios Barretina 2018

Fundamentos da atribuição dos Prémios e apresentação dos Agraciados

A apresentação dos Agraciados e a leitura dos fundamentos da atribuição dos Prémios Barretina esteve a cargo de João Pedro Mendes Carreiro Gomes (390/1983). No caso particular do General António dos Santos Ramalho Eanes, a leitura dos fundamentos da atribuição do prémio foi feita por Luis Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957), na sua qualidade de Presidente do Conselho Supremo

General António dos Santos Ramalho Eanes

"PRÉMIO BARRETINA - AMIGOS DO COLÉGIO MILITAR"

• A concretização da missão do Colégio Militar.

• A afirmação da Instituição.

• O sucesso do seu Projeto Educativo.

A definição mais simples e objetiva, que conheço, da missão do nosso Colégio, é a constante do «Regulamento Interno do Real Collégio Militar», de 1901, da autoria de José Estevão de Morais Sarmento, figura insigne de militar e pedagogo, Director do Colégio naquele longínquo ano do início do século XX.

Estas qualidades, que o Colégio procura incutir nos seus alunos, encontram-se personificadas em V. Exª, como sobejamente o provou, ao longo da sua vida, como homem e como militar.

OPrémio Barretina-Amigos do Colégio Militar destina-se a distinguir personalidades que, não sendo Antigos Alunos, tenham contribuído de forma notável para:

Segundo ele, o objetivo do Colégio é «formar homens de carácter honrado e resoluto, inteligência lúcida e esclarecida e organismo forte e desembaraçado».

Constitui assim V. Exª um exemplo para todos nós e para os Alunos do Colégio em particular. O regulamento que atrás citei, indica, textualmente que «o exemplo dos superiores é o melhor de todos os processos educativos». V. Exª constitui, pois, para nós, uma referência moral nesta época tão carenciada destas referências, que para alguns são estranhas e até bastante incómodas.

V.Exª contribuiu de forma efetiva para a afirmação da nossa Instituição, quer no breve período

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em que esteve à frente dos destinos do Exército, quer mais tarde, como Presidente da República, nomeadamente quando prestigiou o nosso Colégio com a imposição no seu Estandarte Nacional das insígnias da Ordem de Santiago da Espada, destinada a distinguir o mérito literário, científico e artístico. Tal ocorreu em 3 de Março de 1978, aquando das comemorações do 175º aniversário do Colégio Militar. Não o esquecemos.

Finalmente, em 2013, o Projeto Educativo do Colégio Militar foi posto em causa, por um despacho imponderado do Ministro da Defesa daquela época, destinado a transformar, em apenas dois anos, com uma ligeireza irresponsável, esse Projeto Educativo, caldeado ao longo de 210 anos da sua existência, em algo que nos era estranho. O sucesso dessa transformação suscitava as maiores dúvidas, podendo inclusive pôr em causa a própria existência do Colégio.

Nessa situação, de importância crucial para o Colégio, V. Exª foi um dos subscritores da primeira hora, de carta dirigida ao então Presidente da República, solicitando o exercício da sua magistratura de influência, para que o referido despacho fosse imediatamente suspenso. Tal não veio a ocorrer.

Preenche assim V. Exª, ampla e integralmente, todos os pressupostos para a atribuição do Prémio Barretina – Amigos do Colégio.

É para a nossa Associação uma grande honra a aceitação deste prémio por parte de V. Exª.

Prémios Barretina 2018

Luis Alberto Santos Pereira (214/1952)

"PRÉMIO BARRETINA - COLÉGIO MILITAR NO MUNDO"

de Leuven, Institutos Politécnicos de Milão e de Turim, Instituto Hassan II de Rabat, Universidade de S. Paulo, Piracicaba, Brasil, Universidade Çukurova, Adana, Turquia, Universidade Pertanian, Kuala Lumpur, Malásia e Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, Brasil.

Luís Alberto Santos Pereira nasceu em Elvas em 1942, tendo entrado para o Colégio Militar em 1952, onde teve o número 214, concluindo o 7º ano em 1959.

Tem o Curso de Engenheiro Agrónomo e é Doutorado em Hidrologia pela Escola Politécnica Federal de Zurich, Suíça em 1977 e possui uma Pós-graduação em Hidrologia na Escola Politécnica Federal de Lausanne, Suíça.

É Professor Catedrático Jubilado do Instituto Superior de Agronomia, recentemente agraciado com o título de Professor Emérito da Universidade de Lisboa.

Recebeu ao longo da sua carreira inúmeras provas de reconhecimento público e diversos prémios atribuídos por entidades públicas de países tão diversos como o Japão, Egipto, Índia, Canadá e Estados Unidos da América, entre os quais se destaca o Outstanding Contribution Award, The XIV Memorial CIGR World Congress, Japão (2000), o Prémio de Investigação da National Academy of Sciences, USA (1983) e o Crawford Reid Memorial Award, conferido pela U.S. Irrigation Association (1992), em reconhecimento das actividades de âmbito internacional para a promoção de técnicas e práticas de rega apropriadas.

Tem colaborado em cursos e seminários de pós-graduação no estrangeiro, designadamente na Escola Politécnica Federal (EPF), Lausanne, Suíça, Instituto Agronómico Mediterrâneo (IAM), Bari, Itália, IHE, Delft, Holanda, Institut National Agronomique de Tunis, Tunisia, Universidade Católica

As suas atividades académicas incluem várias dezenas de participações como membro de comités e painéis de avaliação, reuniões científicas, conferências, conselhos técnicos, workshops, coordenação de grupos de trabalho, pareceres técnicos, etc. Tendo trabalhado em diversos projectos de irrigação em grande número de países do continente sul-americano, (Brasil, México, Equador), da Ásia (China, Índia) e Norte de África (Marrocos, Tunísia, Egipto), além de consultor científico de inúmeras organizações internacionais.

Fora da academia tem contribuído para o desenvolvimento do país, bem como de outros países em desenvolvimento, através dos seus projectos, pareceres e participações no Banco Mundial, UNESCO, Food and Agriculture Organization (FAO), International Commission on Irrigation and Drainage (lClD), North Atlantic Treaty Organization (NATO) ou European Commission (EC) e muitas outras Comissões ou Grupos de Experts estruturantes de vários investimentos e infra-estruturas nas áreas da rega, drenagem e gestão da água na agricultura.

Recebeu ao longo da sua carreira inúmeras provas de reconhecimento público e diversos prémios atribuídos por entidades públicas de inúmeros países.

Entre as distinções recebidas destacam-se a de Vice-Presidente Honorário da Comissão Internacional de Irrigação e Drenagem (CIID/ICID, New Delhi), em 1990, bem como a de Presidente da Comissão Internacional de Engenharia Rural (CIGR) e a de “Honorary Scientific Consultant” do National Center for Efficient Irrigation Engineering and Technology Research, Beijing, China, ambas em 2002.

É igualmente Membro da Academia de Engenharia de Lisboa e da Sociedade Científica da Universidade Católica Portuguesa, “Diplomate Member” da American Academy of Water Resources Engineers, Membro honorário da Associazione Italiana di Genio Rurale, Membro correspondente estrangeiro da “Accademia dei Georgofili”, Firenze, Itália.

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Prémios Barretina 2018

António Adão da Fonseca (286/1957) Delegação do Porto

"PRÉMIO BARRETINA - COLÉGIO MILITAR NO MUNDO"

of Civil Engineers no quadriénio 1998-2002, tendo feito aprovar por unanimidade o Código de Conduta Profissional dos Engenheiros Civis Europeus.

• Membro do Conselho Consultivo do Instituto Português do Património Arquitetónico, em 2004 e 2005.

• Membro do Conselho de Ética da Universidade do Porto entre 2010 e 2014.

"PRÉMIO BARRETINA - ASSOCIAÇÃO – DELEGAÇÃO REGIONAL"

António Adão da Fonseca frequentou o Colégio Militar com o número 286/1957 entre 1957 e 1964. Entrou para o 1º ano tendo sido sempre um excelente aluno.

No 7º ano foi graduado em Comandante da Escolta a Cavalo.

Tendo, ao longo dos anos em que frequentou o Colégio, recebido várias Medalhas de Aptidão Militar e Física, no último ano no Colégio foi distinguido com a Medalha de Ouro de Aptidão Militar e Física, com o 2º Prémio Pecuniário de Aptidão Militar e Física e com o Prémio Fernando Jorge Sequeira Garção.

PERCURSO PROFISSIONAL:

• Engenheiro Civil, pela FEUP (Universidade do Porto).

• Doutor em Engenharia de Estruturas pelo Imperial College, da Universidade de Londres.

• Professor Catedrático da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.

• Especialista em Estruturas pela Ordem dos Engenheiros.

• Membro Conselheiro da Ordem dos Engenheiros.

• Presidente Nacional do Colégio de Engenharia Civil da Ordem dos Engenheiros no triénio 1995-1998.

• Presidente do European Council

PROJECTOS MAIS RELEVANTES

O António Adão da Fonseca foi consultor, coordenador ou projetista de inúmeras pontes e estruturas especiais entre as quais destacamos:

• Ponte Infante Dom Henrique entre o Porto e Gaia

• Ponte Pedro e Inês sobre o rio Mondego

• Ponte sobre a ribeira da Carpinteira, na Covilhã

• Ponte GALP sobre a 2ª Circular, em Lisboa

• Empreendimento Waterfront, em Colombo - Sri Lanka

• Casa da Música, no Porto

• Edifício do Oceanário de Lisboa

• Escola de Economia e Gestão da Universidade Católica

• Cascais Shopping

• Via Catarina Shopping, no Porto

Tendo sido recentemente distinguido com o Excellence Award for Civil Engineering do Conselho Mundial dos Engenheiros Civis (WCCE –World Council of Civil Engineers) em reconhecimento pela relevância dos seus projetos para o bem-estar social e pela sua carreira de engenheiro civil em benefício da Sociedade, o Adão enche de orgulho os seus camaradas e honra o Colégio onde iniciou a sua educação.

Aatividade da Delegação da AAACM no Porto começa a ter expressão, como tal, a partir do período pós 25 de Abril, pela ação empenhada dos seguintes Antigos Alunos:

Rocha Pinto (195/1933) - Coronel, Arquiteto e que foi Governador Civil do Porto.

Posteriormente, assume a coordenação o Leuschner Fernandes (436/1933) - Liderou a AAACM no Porto durante muitos anos com grande amor ao CM que sempre dizia “…essa velha e honrada casa onde se formam almas de homens no corpo de jovens rapazes…” Instituiu os famosos Jantares de Natal na Messe da Batalha.

Depois largos anos, por volta de 2003, assume a coordenação o Ramos de Campos (319/1950) - Superintendente Chefe PSP Porto.

Em 2014, dando continuidade como Delegado da AAACM no Porto Bruno Pinto Basto Soares Franco (281/1970).

Desde então sistematizados em Base Digitaltodos os Ex-Alunos do Porto, Braga, Vila Real, Viana do Castelo, Ovar, Esposende, etc.

Com cursos de entrada que vão desde 1937 até 2016, num total de 172 Antigos Alunos.

Com eventos como os Jantares de Natal e 3 de Março no OCLTC Oporto Cricket Lawn Tennis Club.

Considera-se, pois, de referenciar a atuação desta Delegação com a atribuição do Prémio Barretina – Associação – Delegação Regional.

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Prémios Barretina 2018

Delegação do Algarve

"PRÉMIO BARRETINA - ASSOCIAÇÃO – DELEGAÇÃO REGIONAL"

João Vasco Sousa de Castro e Quadros

(444/1972)

"PRÉMIO BARRETINA - ASSOCIAÇÃO - AMOR AO COLÉGIO MILITAR"

-Presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Federação Portuguesa de Pentatlo Moderno

• Membro e Presidente do Comité de Esgrima do Conselho Internacional do Desporto Militar

• Desde 2014 é membro da Direção do Centro de Promoção Juvenil, Instituição Particular de Solidariedade Social.

Tendo presente que o Prémio Associação, que distingue Antigos Alunos ou Delegações da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, cuja ação tenha contribuído de forma notável para a concretização da missão da AAACM, considera-se, de referenciar a atuação da Delegação do Algarve com a atribuição do Prémio Barretina – Associação – Delegação Regional.

Destacando a “esforçada” atuação do nosso camarada Joaquim Paleta Marreiros, (413/1965), não nos vamos alongar mais e vamos passar a palavra ao nosso camarada João Pedro Quaresma, Buzz, (213/1965).

João Vasco Sousa de Castro e Quadros, frequenta o Colégio Militar de 1972 a 1979, ano em que conclui o ensino secundário e ingressa na Academia Militar.

Ao longo da sua carreira presta serviço em diversas Unidades, Estabelecimentos e Órgãos do Exército Português, designadamente na Escola Prática de Infantaria, no Regimento de Infantaria N.º 1, no Batalhão de Infantaria Mecanizado da Brigada Mecanizada, no Centro Militar de Educação Física e Desportos e na Repartição de Ligação com os Adidos Militares da Divisão de Informações Militares do Estado-Maior do Exército.

Por duas vezes exerce as funções de Ajudante de Campo do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e, no Gabinete do Ministro da Defesa Nacional.

Promovido a Coronel a 25 de Junho de 2007, assume no dia 4 de Setembro de 2009 o comando do Centro Militar de Educação Física e Desportos, cargo que exerce até passar à reserva, a seu pedido, no dia 4 de Outubro de 2011. Está na situação de reformado desde 4 de Outubro de 2016.

DE OUTROS CARGOS E FUNÇÕES QUE DESEMPENHOU DESTACAM-SE:

• Vogal da Direção, Director Técnico Nacional, Presidente do Conselho de Arbitragem e Vice-

• Desde Setembro de 2011, teve a responsabilidade de representar os Encarregados de Educação das turmas que o filho integrou,

• A partir de Outubro de 2014, passou a integrar a Direcção da Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar (APEEACM)

• Nos últimos três anos, desde Setembro de 2015 até Julho de 2018, assumiu a Presidência da Direcção da APEEACM, passando assim a ter a responsabilidade de representar os Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar;

Na sua folha de serviços constam treze louvores, dos quais três concedidos pelo Ministro da Defesa Nacional, um pelo Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, dois pelo Chefe do Estado-Maior do Exército, dois por outros Oficiais Generais e cinco por outras entidades militares, tendo sido agraciado com duas Medalhas de Serviços Distintos, grau prata, as Medalhas de Mérito Militar de 1ª e de 2ª Classe e as Medalhas de Comportamento Exemplar, Prata e Ouro.

É casado com a Alexandra Isabel Afra Marques Perdigão de Castro e Quadros e o casal tem três filhos.

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Prémios Barretina 2018

Pedro Miguel Correia Vala Chagas (357/1977)

"PRÉMIO BARRETINA - ASSOCIAÇÃO - DEDICAÇÃO"

ao presente, primeiro como Consultor Externo na área dos Canais Digitais e, seguidamente (Maio 2016) como Director Responsávelde Canais Digitais para Particulares.

cretário as Direcções de 2008-2010, 2011-2013 e 2014-2015.

É Delegado do seu Curso e membro da Comissão Coordenadora do Conselho de Delegados de Curso.

Pedro Miguel Correia Vala Chagas , é um executivo com percurso na Gestão de Empresas do sector das Tecnologias de Informação, com forte orientação para o negócio através do desenho e implementação de soluções, produtos e serviços a clientes, gestão de projectos e acompanhamento do “delivery”

Responsabilidades na definição estratégica, definição de processos e metodologias com foco na melhoria contínua, estruturação das Unidades de Negócio e respectivas equipas, visando o aumento da rentabilidade e da eficiência dos processos.

Destaque para a capacidade de integrar as novas tecnologias nos processos de trabalho (Redes Sociais Corporativas, Gestão do Conhecimento, dispositivos móveis, etc.), de uma forma prática, e maximizando a relação custo/benefício para as organizações.

Entre 2002 e Março 2014 desempenhou sucessivamente funções como Administrador/Executive Director e Chief Information Officer na Novabase, tendo em Abril de 2014 assumido funções no Banco Santander Totta até

A sua dedicação à causa da AAACM e do Colégio é bem conhecida, em particular junto dos camaradas da sua faixa etária e de todos quantos trabalharam com ele nas Direcções da AAACM em que participou, merecendo o respeito e a fama de elemento reflexivo e ponderado com profunda capacidade de análise das questões envolvendo o Colégio.

Desde 2005, e tendo em conta a difícil situação do Colégio decorrente do reduzido número de candidaturas que se verificavam na última década, o seu envolvimento com o Colégio e a Associação intensificou-se realizando diversas análises e relatórios relativos à situação interna do Colégio (nível escolar, admissões, etc.).

Tais análises envolveram, igualmente, projecções de algumas alterações estruturais necessárias com vista à ultrapassagem da situação que contribuiram para algumas das posições que a AAACM veio a assumir.

Na Associação iniciou a sua colaboração externa com a Direcção de 20052008 com contribuição activa e muito relevante com as pesquisas e sistematização da informação que realizou para a edição do Livro “Meninos da Luz –Quem é Quem” (2008) a quem são devidos boa parte dos dados publicados. Integrou sucessivamente como Se -

É conhecida a sua intensa divulgação das virtudes do Colégio através de artigos de opinião e do seu Blogue razão pela qual lhe é atribuído o “Prémio Barretina Dedicação”

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Ângelo Felgueiras Sócio Honorário da SGL

Ângelo Felgueiras Sócio Honorário da Sociedade de Geografia de Lisboa

O passado dia 27 de Novembro de 2018 foi um dia grande para a Sociedade de Geografia de Lisboa (SGL), para o Colégio Militar e para a Associação dos seus Antigos Alunos. Nesse dia memorável, desenrolou-se, na Sala Algarve, da Sociedade de Geografia de Lisboa, uma sessão de Homenagem a Ângelo Eduardo Manso Felgueiras e Sousa (498/1976), proclamado dias antes Sócio Honorário daquela notável Instituição. A sua admissão no número muitíssimo restrito de sócios honorários desta Sociedade, ficou a dever-se à sua extraordinária carreira de montanhista e explorador, culminada em Janeiro de 2018, por uma caminhada de 1.200 km, com a duração de 57 dias, que o levou a alcançar o Pólo Sul, meta mítica dos grandes exploradores. O Pólo Sul foi alcançado pela primeira vez, no início do século XX, por uma expedição norueguesa liderada por Amundsen, em competição com uma expedição britânica liderada pelo comandante Scott, que tendo também alcançado o Pólo, dias depois de Amundsen, acabou por morrer tragicamente na viagem de regresso, por esgotamento de mantimentos e exaustão física.

A Sala Algarve da Sociedade de Geografia de Lisboa, encheu-se naquele fim de tarde de 27 de Novembro, com familiares, amigos e admiradores de Ângelo Felgueiras, entre os quais se contava um numeroso grupo de Antigos Alunos do Colégio, que quiseram viver, em conjunto com ele, mais esta jornada da sua consagração pública, agora da iniciativa desta mais que secular e notável instituição, fundada em 1875, tendo como objectivo primeiro, vertido nos seus Estatutos, «O estudo e conhecimento da geografia nos seus diferentes ramos, princípios, relações e progressos». O Colégio Militar fez-se representar ao mais alto nível nesta sessão, por uma delegação de Alunos, chefiada pelo próprio Director do Colégio, Senhor Coronel António Emídio da Silva Salgueiro (461/1972).

Na mesa da presidência da sessão tomaram lugar, para além do homenageado, o Presidente da Sociedade de Geografia de Lisboa, Professor Catedrático Luis Aires-Barros, o Secretário-Geral da Sociedade, Senhor General João Carlos de Azevedo de Araújo Geraldes (245/1952) e o signa-

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Ângelo Felgueiras Sócio Honorário da SGL

tário, na sua qualidade de Presidente do Conselho Supremo da nossa Associação, como convidado da Presidência da Sociedade e encarregue de fazer a apresentação do homenageado.

A sessão foi aberta pelo Presidente da SGL, que começou por saudar o homenageado e que brevemente explicou, à numerosa assistência, a razão de ser da cerimónia a que dava início. Seguiu-se no uso da palavra o Secretário-Geral da SGL, que promoveu o acolhimento do homenageado e que fez uma apresentação sumária da SGL, tendo em consideração a presença na sala de muitas pessoas, que nunca tinham tido um contacto prévio com a mesma. Começou por lembrar a corrida a África das potências industriais da Europa, na segunda metade do século XIX, que constituiu o pano de fundo do contexto em que a Sociedade foi fundada, em 1875. Lembrou os fundadores da Sociedade, de entre os quais se destacava a figura de Luciano Cordeiro, que em 1884, já então reconhecido como um dos melhores conhecedores dos problemas da política africana do seu tempo,

integrou a delegação portuguesa à Conferência de Berlim, na qual foi definido um novo conceito de direito internacional para a África, baseado na ocupação territorial efectiva. Lembrou a instalação da SGL, em 1897, no 4º centenário do Descobrimento do Caminho Marítimo para a Índia, na sua actual sede. Referiu os Estatutos da SGL, em que está disposto que o Chefe do Estado é o Protector da Sociedade, e, como tal, o seu Presidente de Honra. Referiu as várias dependências da sede da SGL, de entre as quais se destaca a imponente «Sala Portugal», com os seus 50 metros de comprimento por 16 metros de largura, que ao longo dos anos foi usada como sala de honra, em que foram recebidos visitantes ilustres, tais como exploradores, imperadores, reis e presidentes de repúblicas, e que hoje em dia se destina ainda a grandes recepções, sessões solenes e a museu. Referiu finalmente os extraordinários acervos museológico, de cartografia e de biblioteca existentes, que constituem uma fonte importantíssima de informação, para consulta de estudiosos da História e da Geografia nas suas múl-

tiplas vertentes, prestando assim um serviço de valor inestimável à sociedade em geral, não só portuguesa, mas também de outros países. Concluída a apresentação do Secretário-Geral, foi a vez de o signatário fazer a apresentação do homenageado, à assistência interessada, que preenchia totalmente a sala. Apresentam-se de seguida as palavras proferidas nessa ocasião pelo signatário.

Recebi a incumbência de fazer a apresentação do homenageado desta sessão, Ângelo Eduardo Manso Felgueiras de Sousa, extraordinário montanhista e explorador dos tempos modernos, conhecido, no seu meio profissional e no seu vasto universo de amigos e admiradores, por Ângelo Felgueiras. Esta incumbência, representa para mim uma enorme honra, por a homenagem ser da iniciativa da Sociedade de Geografia de Lisboa, instituição prestigiadíssima a nível nacional e internacional, e constitui, por outro lado, um enorme prazer, dada a amizade que me une ao homenageado, resultante

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A mesa da presidencia da sessão com o homenageado. ©Fotos Leonel Tomaz

Ângelo Felgueiras Sócio Honorário da SGL

do facto de sermos ambos filhos da mesma casa mãe, o Colégio Militar.

Ângelo Felgueiras tem no seu currículo, de montanhista e explorador, não só a ascensão aos sete picos mais altos dos sete continentes, conhecidos no meio dos montanhistas pelos «Seven Summits», mas também caminhadas até aos Pólos Norte e Sul. Só um número muito limitado de homens realizou, até hoje, esta grande proeza, designada no meio dos exploradores por o «Grand Slam», por analogia com a designação dada pelos tenistas ao conjunto dos principais torneios de ténis dos diferentes continentes.

Ângelo Felgueiras não é um desportista profissional, pelo que teve de compatibilizar a realização do seu «Grand Slam» com a sua actividade profissional de piloto de linha aérea, desempenhada na TAP. Esta circunstância, explica o facto de ele ter necessitado de 20 anos para atingir o seu objectivo, período ao longo do qual manteve a sua capacidade física ao mais elevado nível, facto notabilíssimo, dado a primeira das expedições aqui consideradas ter sido feita quando já tinha ultrapassado os 30 anos de idade.

Tudo teve início em 1997, quando a convite de alguns amigos fez a ascensão do lendário pico das neves perpétuas do Kilimandjaro, a mais alta montanha do continente africano, que se eleva até aos 5.963m de altitude. A única preparação que para tal fez, foi a ascensão até ao topo da ilha do Pico, com os seus modestos 2.531m de altitude. Dada a escassa preparação e a utilização de algum equipamento que não seria o mais adequado, a ascensão foi algo penosa, mas deu-lhe ensinamentos para tudo o que viria a seguir. A segunda ascensão só viria a ocorrer sete anos mais tarde, em 2004, quando fez a ascensão do Aconcágua, situado na cordilheira dos Andes, na Argentina, o monte mais alto do hemisfério Sul, com o seu cume a atingir os 6.962m de altitude. Foi uma ascensão cuja dificuldade natural foi agravada pelo facto de ter apanhado uma forte tempestade de neve, o que obrigou a paragens não programadas. A tirada final, feita a partir dos 6.000 m, com um só companheiro, teve a duração de dez horas.

À América do Sul seguiu-se, em 2005, a Europa, com a ascensão ao monte Elbrus, na

Rússia, situado na cordilheira do Cáucaso, perto da fronteira com a Geórgia, que se eleva até aos 5.633m de altitude. Nesta expedição, que também teve as suas dificuldades técnicas, a principal dificuldade foi a barreira da língua, pois quase ninguém naquelas paragens entendia inglês.

Dois anos mais tarde, em 2007, foi a vez da ascensão ao monte Denali, no Alaska, que com os seus 6.195m de altitude, constitui o ponto mais alto da América do Norte. Esta ascensão foi um ponto de viragem na carreira de explorador de Ângelo Felgueiras. Foi a primeira viagem para a qual fez, no ano antecedente, uma preparação específica de grande rigor, numa escola de montanhismo local. Foi a primeira viagem para a qual conseguiu patrocínios. Foi a viagem em que tomou a decisão de fazer os «Seven Summits» e foi a viagem em que decidiu começar a «escalar por uma causa», angariando fundos para causas sociais. Esta foi ainda a expedição mais difícil para a sua família, pois durante um mês não teve quaisquer notícias suas.

No ano seguinte, em 2008, foi a vez da ascensão das Pirâmides de Carstensz, na Indo-

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O Presidente da SGL entrega ao homenageado o colar da Sociedade. ©Fotos Leonel Tomaz

Ângelo Felgueiras Sócio Honorário da SGL

nésia, na província de Papua, montanha que se ergue até aos 4.884m de altitude. A maior dificuldade que esta montanha apresentava era a escalada de uma parede em rocha, com 600m de altura, escalada que exigiu a Ângelo Felgueiras uma prolongada preparação específica, dado não ter experiência antecedente de alpinismo.

Da Oceânia passou para a Ásia, fazendo, em 2010, a ascensão do Evereste, a montanha mais alta do mundo, situada na cordilheira dos Himalaias, na fronteira entre o Tibete e o Nepal, com o seu cume a 8.848 m de altitude. A subida ao Evereste foi antecedida, um ano antes, pela subida à montanha vizinha de Cho Oyu, com os seus 8.201m de altitude, que serviu como ensaio geral para a grande expedição. Em 2010 levou a família consigo para o Nepal, onde fizeram em conjunto um «trekking» de 130 Km, após o que a família volta a Portugal e Ângelo Felgueiras, com os seus companheiros de expedição, parte para a grande conquista. É retido um dia por uma grande tempestade de vento, no designado Campo 4, a 8.000 m de altitude, após o que em plena noite, às 20H45, inicia a escalada

final, que o levaria ao cume, às 7H45 da manhã do dia 17 de Maio. Nas palavras de Ângelo Felgueiras «subir ao Evereste é uma viagem fantástica a um pico único. Merece tudo o que já se escreveu e todo o magnetismo que lhe está associado».

No ano seguinte, em 2011, foi a vez de subir ao monte Vinson, com o seu cume a 4.897 m de altitude, na Antárctida, a 1.200 km do pólo Sul.Com esta ascensão completava Ângelo Felgueiras a ascensão dos «Seven Summits». Dada a latitude do lugar e as suas condições climatéricas próprias, também esta expedição requereu uma preparação específica, que foi feita numa escola de preparação para expedições polares, na fronteira dos EUA com o Canadá, com temperaturas da ordem dos 40 graus negativos, onde foi aprender ski de fundo, a rebocar trenós com cargas até 150 kg. A caminhada e a ascensão foram penosas, mas gratificantes. O atingir do cume, nas palavras de Ângelo Felgueiras «Foi uma sensação gloriosa, uma emoção fortíssima. A concretização de dois sonhos, terminar de subir as sete montanhas mais al-

tas dos sete continentes e ir à Antárctida.» Escalados os «Seven Summits», seguiram-se as caminhadas até aos Pólos, que Ângelo Felgueiras designa por «escaladas de montanhas horizontais».

A caminhada até ao Pólo Norte foi efectuada em 2013. Os expedicionários foram colocados de avião a 120 km do Pólo, tendo-se seguido a caminhada, rebocando trenós de 50 kg, até aos 90 graus de latitude Norte, sempre sob a acção de temperaturas da ordem dos 30 graus negativos e de ventos inclementes.

A caminhada até ao Pólo Sul será descrita, melhor do que ninguém, por quem a viveu, o nosso homenageado de hoje.

Antes de terminar, não posso deixar de citar um facto verdadeiramente notável, revelador do fortíssimo apego de Ângelo Felgueiras ao Colégio Militar, onde foi educado. No final das ascensões aos «Seven Summits», bem como nas chegadas aos Pólos, o nosso homenageado de hoje fez-se sempre fotografar, tendo colocada na cabe-

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Ângelo Felgueiras entrega à SGL os skis que usou na expedição ao Polo Sul. ©Fotos Leonel Tomaz

Ângelo Felgueiras Sócio Honorário da SGL

ça a Barretina do Colégio Militar, facto que muito surpreendeu os seus companheiros de expedição, desconhecedores da mística muito especial, que se cria naqueles que foram educados neste nosso Colégio. Se atentarmos no facto de em expedições deste tipo as cargas a transportar deverem ser reduzidas aos mínimos de peso e volume, teremos uma ideia do fortíssimo significado da nossa Barretina para Ângelo Felgueiras.

Termino, lembrando a forte ligação entre o Colégio Militar, os seus Antigos Alunos e esta venerável Casa que hoje nos acolhe. No número dos 63 Sócios Fundadores da Sociedade de Geografia de Lisboa, contam-se oito Antigos Alunos do Colégio, de entre os quais sobressai a figura de José Estevão de Morais Sarmento, ilustre militar e pedagogo. Luciano Cordeiro, um dos Sócios Fundadores e primeiro Secretário Perpétuo desta Sociedade, foi professor de Literatura e de Filosofia do então Real Colégio Militar. O General Francisco Maria da Cunha, quarto presidente da Sociedade de Geografia de Lisboa, era Antigo Aluno do Colégio Militar. Foram distinguidos ao longo dos anos pela Sociedade de Geografia numerosos Antigos Alunos do Colégio Militar, podendo-se de entre eles destacar, desde figuras nacionais do século XIX, como José Anchieta, Pinheiro Chagas, Henrique de Carvalho, Eduardo Galhardo e Serpa Pinto, entre outros, até a figuras nacionais dos nossos dias, como o General Vasco Rocha Vieira. O Colégio Militar e os seus Antigos Alunos não esquecem, que em 2003, quando o Colégio festejou o seu bicentenário, a Sociedade de Geografia de Lisboa, já então presidida pelo seu actual Presidente, Senhor Professor Doutor Luis Aires Barros, promoveu uma sessão de homenagem ao Colégio Militar, que muito nos honrou.

Quis ainda o destino, que houvesse mais uma ligação entre o mundo do nosso homenageado de hoje e a Sociedade de Geografia de Lisboa. Ângelo Felgueiras é piloto de linha aérea, tendo iniciado a sua carrei-

ra, como oficial miliciano piloto-aviador, na Força Aérea Portuguesa. Acontece que nesta Sala Algarve, onde agora nos encontramos, decorreu, na noite de 10 de Maio de 1917, a entrega das primeiras licenças de pilotagem atribuídas em Portugal. Foram atribuídas aos oficiais que concluíram com sucesso o 1º curso de pilotagem da Escola de Aeronáutica Militar, de Vila Nova da Rainha. A licença nº1 foi atribuída ao Tenente da Armada Azeredo de Vasconcelos, desaparecido no mar, no ano seguinte, em 1918, em missão de guerra, na busca de um submarino alemão. A licença nº 2 foi atribuída ao Tenente de Engenharia Sarmento

de Beires, que protagonizou, em 1924, a primeira ligação aérea Lisboa-Macau e em 1927, a primeira travessia aérea nocturna do Atlântico Sul. Eram ambos Antigos Alunos do Colégio Militar.

Senhor Presidente da Sociedade de Geografia de Lisboa, termino agradecendo a V.Exª a grande honra que para mim representou, o facto de me ter sido dado o uso da palavra nesta notável Instituição, nesta cerimónia de tão grande significado para esta Sociedade e para todos os que temos hoje o privilégio de nela participar. Muito obrigado.”

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O Engenheiro Fernando Pinto, antigo Presidente da TAP, saudando Ângelo Felgueiras. ©Fotos Leonel Tomaz

Felgueiras

Feita a apresentação do homenageado, foi a vez de o Presidente e de o Secretário-Geral da SGL imporem a Ângelo Felgueiras o Colar da Sociedade de Geografia de Lisboa, que constitui a sua insígnia social. A imposição do Colar foi acompanhada pela entrega do Diploma de Sócio Honorário. Este momento de homenagem e reconhecimento foi um dos pontos altos da sessão, que foi sublinhado por um forte aplauso da assistência, que assim quis expressar ao homenageado toda a sua admiração. Foi um momento marcante.

Ostentando já o Colar recebido, Ângelo Felgueiras usou então da palavra, tendo feito uma apresentação, acompanhada pela projecção de interessantíssimos slides e pequenos filmes, relativa às suas duas expedições mais recentes, as caminhadas até aos Pólos Norte e Sul. A apresentação, feita de forma muito viva e cativante, prendeu a assistência durante largos minutos, em que se sentiu transportada para os Pólos, a acompanhar as viagens feitas pelo homenageado. Ficou-se com a noção do rigor com que têm de ser planeadas e preparadas expedições deste tipo, da capacidade física que é exigida aos participantes nas mesmas e da vontade férrea que é necessária para se vencerem, sem desfalecimentos, todas as dificuldades, previstas ou imprevistas, que surgem ao longo das mesmas.

Terminada a sua alocução, Ângelo Felgueiras procedeu à entrega, à Sociedade de Geografia, nas pessoas do seu Presidente e do seu Secretário-Geral, como prova do seu reconhecimento pela honra com que foi distinguido, do par de skis com que fez a sua expedição ao Pólo Sul.

Na sequência desta entrega e com a anuência da Presidência da SGL, Ângelo Felgueiras procedeu à entrega à Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, na pessoa do seu Presidente da

Direcção, José Eusébio Pereira Barata Cordeiro de Araújo (591/1973), da barretina que o acompanhou ao longo das suas expedições e com que se fez fotografar ao atingir os «Seven Summits» e os Pólos Norte e Sul. A entrega da barretina foi acompanhada pela entrega do «piaulet» usado nas suas ascensões aos «Seven Summits» . O Presidente da nossa Associação fez questão de se fazer acompanhar, no acto de recepção dos artigos acima referidos, pelos filhos de Ângelo Felgueiras, ambos Antigos Alunos do Colégio e de um Aluno componente da representação do Colégio

Militar presente na sala. Este Aluno sublinhou o final do acto da recepção dos artigos referidos com um vibrante grito de Zacatraz, em que foi acompanhado pelos numerosos Antigos Alunos que se encontravam na assistência.

Foi sem dúvida uma jornada memorável e de grande elevação, em que as histórias da Sociedade de Geografia de Lisboa e do Colégio Militar, através dos seus Antigos Alunos, mais uma vez se sobrepuseram e fundiram, resultando daí honra para as duas Instituições.

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Ângelo Felgueiras agradecendo os aplausos da assistência. ©Fotos Leonel Tomaz
Ângelo
Sócio Honorário da SGL

Entrevista a Filipe Soares Franco

Entrevista a 62/1963 Filipe Soares Franco

Filipe Pinto Basto Soares Franco (62/1963), tem quatro filhos, é licenciado em gestão de empresas, com um vasto currículo de administração. Foi Presidente da Assembleia Municipal de Cascais, ocupou cargos federativos no desporto e foi, entre outros, Presidente do Estoril Praia, Presidente do Conselho de Administração da OPWAY, da Associação Nacional de Empreiteiros de Obras Públicas e do Sporting Clube de Portugal.

Candidato a Presidente da Direcção da nossa Associação.

Gostava de começar por te pôr algumas questões relacionadas com a tua passagem

pelo Colégio e a tua vida profissional. Porque foste para o Colégio?

Não sei porque fui para o Colégio: não tenho tradições com ligação militar nos dois lados da minha Família (Pinto Basto e Soares Franco), com uma única excepção: o meu Avô Anselmo Ferreira Pinto Basto (AA250/1906) que julgo que teve influência junto dos meus Pais, no sentido de, como éramos muitos (já éramos 4 filhos) nos encaminhar para uma instituição de excelência que era o Colégio Militar.

Foi assim que o meu irmão Miguel, entrou em 1962 com a sorte de ter herdado o número do meu Avô, o 250.

As coisas correram bem no 1º ano do meu irmão, a experiência satisfez o meu Pai, e no ano seguinte entrei eu (62/1963), seguindo-se, ainda, os meus irmãos Luís (510/1967) e Bruno (281/1970).

Não encontro outra explicação para que os meus Pais – foi uma decisão dos dois – me pusessem no Colégio.

Como foste como aluno, e como encaras mais de 50 anos após entrares para o Colégio, o período que lá viveste?

Fui um aluno regular, mais virado para a aptidão militar e física, fui mais um despor-

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Entrevista a Filipe Soares Franco

tista do que esforçado pela parte literária. O Colégio pelo seu sistema de ensino “obrigava” a que os alunos estudassem: tínhamos bons professores, estudos diários antes e depois das aulas, e, por muito que não quiséssemos, éramos obrigados a estudar, pelo menos a estudar os mínimos, se bem que eu preferisse as actividades desportivas à parte literária... aliás só comecei, verdadeiramente, a preocupar-me com os estudos no dia em que entrei na Faculdade.

E em que é que te marcou teres sido aluno do Colégio?

Começou por me marcar logo de início nos primeiros tempos de adaptação ao Colégio. Vindo de uma família não militar, que tinha bastante conforto na vida... e entrar numa instituição militar, com a disciplina militar, que cultivava o rigor, num meio austero, com a frugalidade que caracterizava o Colégio, foi um choque violento para um miúdo de dez anos, pelo que a minha adaptação ao Colégio não foi propriamente das mais fáceis, uma vez que vim de um mundo de facilidade para um mundo de exigência, não um mundo de dificuldade, mas frugal e exigente, o que provocou em mim um sentimento de desconforto e até de menor felicidade. Mas a situação rapidamente foi ultrapassada, até porque num total de 6 anos (chumbei um ano por doença) passar um ano ou ano e meio de dificuldades, fazendo uma retrospectiva não é muito tempo; e, passando o resto do tempo construindo uma amizade com o Curso e com os cursos logo acima e abaixo e também com os próprios Graduados, fica o sentimento de gratidão pelo que o Colégio me proporcionou de amizades construídas, prática e sentimento da camaradagem, solidariedade, entreajuda...

Não fui Graduado por ter saído no fim do 5º ano, mas houve Graduados que me marcaram (de alguns lembro-me dos números) o Pedro Silvério Marques (32) na 1ª, o João Cordeiro (304) que foi meu comandante

de Secção, de ti (9) e do 4 que foram dois alunos de excelência que tiveram Medalha de Mérito de Ouro – um que foi Comandante de Batalhão e o outro Comandante da 4ª – lembro-me do Tribolet (230) que foi Comandante de Batalhão, de um Comandante de Pelotão que tive na 3ª, de cujo número não me lembro, era um tipo de Elvas, que nunca mais soube dele e que foi excepcional porque era de uma humanidade fantástica sem deixar de mantar o espírito e o rigor militares..., e recordo com saudade esse tempo...

Lembras-te de alguns acontecimentos de que guardas memória?

Lembro-me, como já referi, que tive 2 graduados que foram referências no Colégio –tu e o 4 – do Tribolet, do 97 Duarte Pio de Bragança que entrou para o 5º ano e foi 1 estrela do Comando e de coisas engraçadas como nunca ter conseguido entrar para o Orfeão, porque o Carioca, o Maestro Jaime da Silva, sempre me chumbou o que não me incomodava nada, porque enquanto os outros estavam a treinar no Orfeão eu tinha mais tempo livre para jogar futebol; lembro-me de um Servente que foi uma referência no Colégio – o Moca – de uma Roupeira que nunca mais esquecerei – a Lisete –, de um professor de Fisico-Química que era o “Semita”, e de um personagem que era o capitão Mário Lemos, que tinha, salvo erro, um Toyota Corola quase sempre esmurrado, benfiquista ferrenho, que frequentemente estava de Oficial de Dia ao domingo e quando o Benfica ganhava celebrava da mesma maneira que quando perdia, isto é afogando a alegria e as mágoas o que lhe dava uma muito má disposição quando nos apresentávamos ao domingo para entrar no Colégio...

Lembro-me obviamente do Dario que foi um grande professor de ginástica e meu treinador de futebol de 5 e depois de voleibol, que sabia que eu gostava dos jogos com bola (pratiquei e representei o Colégio

nessas duas modalidades) mas não gostava de correr, e um dia, num daqueles muitos crosses que se organizavam nos intervalos da tarde, me prometeu um prémio se me classificasse bem: fiquei em 5º lugar e o prémio foi ... ser nomeado para participar numa prova de cross da Mocidade Portuguesa, pelo que fiquei ainda a gostar me-

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Entrevista a Filipe Soares Franco

nos daquelas corridas...

E houve dois acontecimentos marcantes da minha vida no Colégio.

Uma foi quando morreu o Director do Colégio, o General Luís Deslandes, em que fiz Guarda de Honra nas cerimónias fúnebres e outra foi quando um dia o meu irmão e eu fomos chamados ao Director, então o Brigadeiro Reymão Nogueira, que nos mandou fardar com a farda de saída, para irmos ao enterro do meu Avô; não esqueço a forma comovente e carinhosa, mas, simultaneamente, dentro das normas militares como nos disse o que se passava e nos tratou.

Como ocorreu a tua transição para a Faculdade após a saída do Colégio?

Saí no 5º ano, tendo sido um aluno mediano, para fazer o 6º e 7º anos no liceu

de S. João do Estoril uma vez que queria ir para Económicas, e “descobri” que estes dois últimos anos se podiam fazer por “cadeiras”; na altura a minha paixão era o Ténis, e como havia uns “buracos” nos horários das aulas, aproveitava para ir jogar, até que um dia um amigo com quem jogava me disse que sendo possível fazer por “cadeiras” dava para montar “um esquema de um ano sabático” o que teve como consequência que fiz aqueles dois anos em três, tendo ficado o 3º ano quase todo... a jogar ténis. Até fiquei no último ano com uma boa média – 16 – o que me permitiu dispensar do exame de admissão à Faculdade e preparei-me para ter umas férias de ouro: 4 meses de férias!

Não tive: o meu Pai, que percebeu o “esquema”, oito dias depois de ter acabado os exames, chamou-me ao seu escritório, apresentou-me um bilhete de avião para ir trabalhar para Luanda numa empresa que era da família porque já tinha tido o “ano sabático”: o tal ano em que só tive duas disciplinas do 7º para fazer.

Mas as coisas acabaram por correr de forma diferente: o Director Geral da empresa era um primo nosso, jovem, que me proporcionou 4 meses de “férias fantásticas” em Luanda. Desses tempos fiquei, para o resto da vida, com um profundo sentimento por Angola.

Só me dediquei, verdadeiramente, aos estudos em Évora, no Instituto Superior Social de Gestão (misto de Economia e Gestão financiado pela Fundação Eugénio de Almeida) gerido por Jesuítas, onde vivi tempos fantásticos numa “república” em que éramos 7, até 1974/75, tendo o Instituto praticamente fechado com a revolução. Daí transitei para a Universidade Católica em Lisboa onde, fui um aluno médio e acabei o curso de Gestão. Durante este período continuei a dedicar boa parte dos meus tempos

livres à minha paixão: o ténis.

Como foi a tua vida profissional, e que influência teve o Colégio na tua vida profissional e mais tarde associativa?

Tive uma vida profissional muito interessante, mas que começou de forma difícil. No último ano da U. Católica, fiz o estágio na TOFA (o meu Pai era Administrador Delegado da TOFA) e daí a alcunha que os meus irmãos tivemos no Colégio: os “TOFA”; seguiu-se o final do Curso, casei-me 2 ou 3 meses depois e quando voltei da lua de mel, fiquei a saber que o lugar na TOFA era para o meu irmão Miguel e não para mim... isto é, ao fim de três semanas de casado estava desempregado.

Consegui então entrar para a Arthur Andersen, como estagiário, o que não me entusiasmou muito, e através de relações familiares foi-me dada a possibilidade de ir para a E. Pinto Basto no Porto. O ordenado era o mesmo, mas não chegava para pagar uma renda de casa e viver, e acabei por ir parar à Vista Alegre, em Lisboa com o mesmo ordenado da Arthur Andersen, onde fui assessor da Electro-Cerâmica (participada da Vista Alegre). Passados uns anos voltei à Vista Alegre como Adjunto do Director Comercial, a quem sucedi terminando como seu Administrador até 1991.

O espirito do Colégio foi fundamental. Primeiro “a farda” que significa e nos põe todos iguais: sempre tive enorme facilidade em tratar as pessoas como parceiros, em linguagem militar como “camaradas”, e em seguida o rigor e a disciplina seja no horário (era sempre o primeiro a entrar e o último a sair), seja na relação com os inferiores e os superiores, impondo sermos assertivos no nosso comportamento e tendo o foco no que era o melhor para a organização em que estamos. Para além disso, o Colégio ensinou-me, através da sua vivência num contexto mui-

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Entrevista a Filipe Soares Franco

to diferente, que uma empresa vive com a concorrência, com outras organizações e com os seus empregados e donos, tendo a camaradagem, solidariedade, disciplina e rigor e, de forma genérica, os seus princípios e valores sido fundamentais na minha conduta profissional.

Não tenho qualquer dúvida de que foi este conjunto de valores do Colégio que me fez chegar a algumas situações de topo, nomeadamente a ANEOP (Associação Nacional dos Empreiteiros de Obras Públicas) que que reunia as 20/25 maiores empresas de construção civil, a Tecnovia, a OPCA e depois a OPWAY uma das 5 maiores empresas de construção civil, empresas de que fui Presidente.

Mas mais do que isso, a formação do Colégio fez com que antes de entrar no sector da construção civil, tivesse tido a capacidade de liderar empresas em Portugal de áreas diferentes: a Terra Azul (uma filial da Ciments Français),a AMERITECH, uma tecnológica de Chicago, a GIL y CARVAJAL (a maior corretora de seguros de Espanha) que constituíram uma boa escola, com grande exigência de

bom senso, para a liderança das organizações portuguesas que se seguiram.

Outro aspecto importante daquilo que o Colégio me ensinou foi que, não obstante sermos todos iguais, nas organizações uns têm que dirigir e comandar outros, e que é necessário respeitar e fazer respeitar as hierarquias sem confundir que a discussão dos assuntos deve ser aberta e democrática, mas a decisão não é: a decisão é de quem tem a responsabilidade de a tomar, e que no momento da decisão quem decide está sozinho, tendo os outros que a respeitar ou não... e quem não respeitar ... está fora.

Falemos da Associação (AAACM) e do Colégio.

Desde quando és sócio? Foste “Prémio Barretina – Notoriedade” em 2008...

Sou sócio desde que o dia em que deixei de ser aluno do Colégio e sempre tive um enorme orgulho em usar a Barretina, e sei, perfeitamente que quando recebi o Prémio Barretina foi pela visibilidade que tive

como Presidente do Sporting usando sempre na lapela a Barretina e só em ocasiões excepcionais, o emblema do Sporting. A Barretina na minha lapela significava, para quem a via, que os valores da Barretina eram os valores que eu quera incutir que o Sporting tivesse, não é que não os tivesse já, mas teria que os manter,...e simbolizava os valores com que queria dirigir o Clube. Aproveito para referir que nunca tive nenhum problema no Sporting por ter usado a Barretina e que foi um símbolo respeitado no Clube; hoje, não sei como estão hoje os protocolos que existiam entre o Sporting e o Colégio, mas se necessário estou disponível para intervir e defender o interesse do Colégio nesta área.

Mas a minha dedicação ao Colégio não tem a ver com o Prémio Barretina, mas com o facto de sentir que devo devolver ao Colégio aquilo que o Colégio me deu para a minha formação e que me tem servido ao longo da vida.

O Colégio é, de facto, uma escola de excelência. Nem todos têm acesso a ser alunos do Colégio, mas seria bom que todos soubessem o que o Colégio deu até hoje à sociedade, contributo que continua através dos seus Antigos Alunos que com maior ou menor visibilidade se encontram em funções relevantes em diversas áreas da economia, ciências, artes, administração, etc.

E é com tristeza que sinto que nos últimos anos não lhe é reconhecido esse contributo.

Qual pensas que deve ser o papel da Associação no futuro imediato e a mais prazo?

A Associação tem um papel difícil a desempenhar no presente e no futuro no que respeita ao Colégio.

Sem se imiscuir na sua gestão interna, mas mantendo uma atitude de proximidade e disponibilidade para apoiar na medida em que for solicitada, tal apoio ocorre numa

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Entrevista a Filipe Soares Franco

instituição que passou recentemente e passa por uma grande transformação de adaptação aos tempos modernos.

O Colégio é hoje completamente diferente do que era no meu tempo de aluno, com internos e externos, misto e com um Primeiro Ciclo e um Corpo de Alunos a enquadrar esta complexidade.

Por outro lado, a Associação para lá de dever manter-se aproximada da Direcção do Colégio, lida e tem relações – algumas esporádicas mas não menos importantes – com outras instituições: o Comando do Exército, a Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar (APEEACM), o Ministério da Educação (embora indirectamente), o Ministério da Defesa (MDN), no quadro também do espaço que lhe está concessionado, áreas em que toda a nossa actividade tem que ser muito cautelosa e com muito bom senso.

Por último, e não menos importante, é a nossa relação com a Associação das Antigas Alunas do Instituto de Odivelas (AAAIO) nossa parceira no espaço que ocupamos onde desempenha uma actividade muitíssimo meritória e solidária e cuja proximidade simbolizará a tradicional relação “Meninos da Luz – Meninas de Odivelas”

No plano interno, uma das tarefas importantes a que na Associação teremos de fazer face, é a inclusão dos Antigos Alunos que foram externos e das raparigas como Antigos Alunos de pleno direito e com as mesmas obrigações dos actuais, no espírito que tem norteado a Associação.

Ainda na relação com os alunos do Colégio, e em particular com os finalistas, especial atenção terá que lhes ser dedicada na transição que é a saída do Colégio para a vida de estudantes universitários, desde logo apoiando-os em termos de orientação profissional e na sua integração na nossa rede

de Antigos Alunos valorizando a sua importância e fazendo-os dela participar. Outro vector muito importante é o desenvolvimento da nossa rede de Antigos Alunos no sentido da sua participação na área que é o objecto principal da Associação e esteve na sua origem: a Solidariedade que, num conceito alargado, para lá das acções de apoio financeiro que têm sido praticadas, incluirá a prestação de serviços probono entre nós nas diferentes competências e especialidades de cada um (Um por Todos, Todos por Um!); é neste sector indispensável uma grande campanha para a actualização dos registos dos Antigos Alunos (Quem é Quem) e criar um meio expedito de encontro entre os necessitados e aqueles que os possam apoiar.

Mas este tipo de tarefas será tanto mais eficiente quanto maior for o número de Antigos Alunos envolvidos pelo que é indispensável fazermos uma grande campanha de recrutamento de novos sócios; sei, pelo que me tem sido dito, que se trata de uma área difícil que tem tido resultados fracos, mas, através quer da actividade da Direcção quer do apoio que espero ter do Conselho de Delegados de Curso que tem uma maior proximidade com os Cursos, iremos investir fortemente nesta área.

Tenho bem consciência do enorme mérito da Direcção que agora termina o mandato, pela sua enorme dedicação no apoio ao Colégio e pelo que fez na ligação com os Antigos Alunos, e se me refiro a intensificar as áreas de actuação que referi, tal significa o meu desejo de que a nova Direcção prossiga o trabalho da anterior mas indo ainda mais além.

Porque és candidato a Presidente da Direcção da Associação? Quais as linhas mestras de acção que propões?

Nunca imaginei candidatar-me a Presidente da Direcção da AAACM, uma vez que saí do Colégio no 5º ano e nunca fui um aluno de referência; a maior e melhor referência

que tive foi ter-me sido atribuído em 2008, pelos meu pares, um Prémio Barretina o que muito me orgulhou.

Fui desafiado para esta função na sequência de, nos últimos tempos, ter publicamente evocado a minha condição de Antigos Alunos para fundamentar posições públicas que decorriam dos princípios e valores do Colégio Militar.

Recebi essa abordagem como um elogio, e após demorada ponderação decidi, aos 66 anos, numa óptica de serviço cívico, tentar entregar ao Colégio através da colaboração na AAACM aquilo que o Colégio me proporcionou e a que já me referi.

Não sou militar, mas respeito a hierarquia militar, e espero que a minha experiência associativa me permita cimentar e desenvolver o espírito de colaboração entre os Antigos Alunos a que já me referi.

Tenho, no entanto, a consciência de que, tendo estado longe da AAACM e do Colégio nos últimos anos, terei necessidade de ouvir muito, de observar e de ser muito ajudado pelos camaradas que venham a integrar a Direcção e os Orgãos Sociais e sermos todos solidários nesta campanha que vai durar três anos.

Estou neste momento (Janeiro de 2019) em contactos com Antigos Alunos com competências e experiências da esfera do Colégio e da AAACM, que generosamente se querem envolver na próxima Direcção da AAACM e que têm vindo a participar e contribuir para as linhas mestras do nosso programa, mas não tenho, ainda, um programa para o triénio, programa que, no seu detalhe, terá que ser por todos construído e aprovado.

À data da publicação desta entrevista, prevista para sair no primeiro número da ZacatraZ do corrente ano, teremos, naturalmente, um programa que será apresentado na Assembleia Geral Anual de Março que será,

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Entrevista a Filipe Soares Franco

igualmente, uma Assembleia eleitoral.

Mudemos de tema: o Colégio.

Como vês o Colégio de hoje? Constatas grandes diferenças relativamente ao teu tempo? E como imaginas o Colégio dentro de 20 anos e qual a sua missão?

O Colégio é hoje muito diferente do meu Colégio de há 50 anos. É curioso que foi publicado num jornal dinamarquês, em 1991, um interessante artigo sobre o Colégio com o título “Uma escola severa”; teria hoje cabimento e possível, na nossa sociedade, o Colégio ser caracterizado desta forma?

Em 1991, eu – e penso que ninguém –nunca imaginaria que o Colégio fosse hoje misto, existisse uma instrução primária, alunos externos e os internos lá dormissem apenas 4 noites por semana.

Tudo resulta das mutações da sociedade nos últimos anos, e não consigo imaginar como será o Colégio dentro de 20 anos.

Espero que continue a adaptar-se à evolução dos tempos, admito que num relativo curto prazo venha a ter uma Comandante de Batalhão (porque não?), o que vai demonstrar como felizmente foi feita a integração das Alunas que vieram do Instituto de Odivelas, bem como as novos Alunas que entraram directamente para o Colégio, em que os Alunos e em particular os Graduados tiveram um papel fundamental, compensando toda a precipitação, descuidado e erros do poder político na forma imponderada como impuseram uma reforma tão profunda no Colégio.

Já o mesmo não direi quanto à possibilidade de um Comandante de Batalhão ou mesmo Graduados possam ser Alunos que tenham sido externos ao longo de todo o curso: atendendo às funções

e objetivos da função de Graduado, não me parece justo para o próprio e também para os outros, que, nestas circunstâncias, um aluno que não tenha vivido o Geral e a Camarata possa desempenhar funções de liderança do seu Curso ou mesmo de alunos mais novos.

Não sei como evoluirão as Forças Armadas, nem como evoluirá a relação do Comando do Exército com o Colégio, mas espero que as entidades militares respeitem e se orgulham da História do Colégio, e contribuam para que continue a ser uma escola de referência... porque todos os princípios que estão na sua génese, e que ao longo de dois séculos têm dado prova da sua valência na educação dos alunos, se mantêm válidos em qualquer sociedade... o Colégio é uma escola onde se educa e não apenas onde se ensinam as matérias das disciplinas liceais, como acontece em qualquer outra escola pública ou privada... em que a Camaradagem, a Solidariedade, são valores universais e o seu Código de Honra exalta o respeito pela Bandeira e o amor à Pátria.

Em suma o Colégio Militar tem um Projeto Educativo com uma matriz formativa integral e distinta, que podemos facilmente sintetizar no nosso lema e na nossa divisa: SERVIR e UM POR TODOS TODOS POR UM.

Já se falou de internacionalização do Colégio (CPLP). O que pensas sobre isto? Sob que formas?

Confesso que não tenho ainda ideias arrumadas sobre este tema.

Internacionalizar implica perceber a língua para perceber o Direito, perceber a sociedade onde nos vamos inserir, os seus valores, etc., perceber o regime político. Numa primeira abordagem, diria que a questão poderia ser vista em três ver-

tentes: o Colégio receber alunos destes Países, o Colégio colaborar na criação de Colégio Militares nestes Países ou desenvolver-se um sistema de intercambio entre alunos dos Colégio Militares (este sistema extravasando o âmbito da CPLP).

No que respeita ao Colégio receber alunos desses Países, o sistema já ocorre, pois, o Colégio atualmente já tem alunos provindos da CPLP. No entanto, julgo que deveriam ser pensados incentivos ou bolsas a bons alunos desses Países, pois o Colégio tem ótimas condições para esse acolhimento.

Quanto à colaboração na criação de Colégios Militares nestes Países, o que também já foi ensaiado, tanto pelo Exército Português como pela AAACM, considero que a nossa experiência e eventualmente a do Brasil, que tem um modelo distinto do nosso, mas abrangendo um país enorme, poderiam traduzir-se numa assessoria muito útil.

Por fim, julgo que o sistema de intercâmbio entre Alunos dos Colégio Militares, como disse este sistema extravasando o âmbito da CPLP, poderia ser também muito útil na criação de uma rede entre Colégios Militares no Mundo.

Permite-me ainda uma nota suplementar neste âmbito: o Colégio nunca foi um colégio Lisboeta, sempre teve uma abrangência Nacional. Por isso considero que, face às condições únicas do Colégio, seria muito oportuno incrementar esse pendor, desenvolvendo bolsas de apoio a alunos que se destaquem, pelo seu mérito académico ou desportivo provenientes de todo o território nacional.

Entrevista conduzida por Martiniano Nunes Gonçalves (9/1958).

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Antigos Alunos em Destaque

Antigos Alunos em Destaque

OEduardo Lourenço participou em Novembro de 2018 na “Everest Trail Race 2018” onde, sendo o único concorrente português na prova, obteve um fantástico 17º lugar entre os concorrentes masculinos.

A prova teve lugar no Nepal nos picos mais altos do Mundo ao longo de 160 quilómetros, em seis etapas consecutivas num desnível acumulado de 29.000 metros com 15.000 metros a subir e descidas, que no dizer do Eduardo Lourenço são “demolidoras” , acrescentando que o que fez “está ao alcance de qualquer gajo do Colégio que meta na cabeça fazê-lo” ...!!!

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Carlos Eduardo Ramos dos Santos Lourenço (23/1978) “Everest Trail Race 2018”

Antigos Alunos em Destaque

Filipe Manuel Cavaco Bismarck

(187/1987)

Presidente da Associação Nacional dos Jovens Advogados Portugueses

Filipe Bismarck é o novo presidente da Associação Nacional dos Jovens Advogados Portugueses (ANJAP) nas eleições que elegeram o líder da Associação para o próximo triénio. A lista de Bismarck venceu também as eleições para a Direção Regional de Coimbra, onde concorriam duas listas, “Os nossos principais objectivos são os de defender os interesses específicos dos jovens advogados, ser uma mais-valia na afirmação profissional dos jovens advogados, criar benefícios para os associados, contribuir para o bom nome e imagem da ANJAP e representar a Associação de forma digna”, disse ao Jornal Económico.

Para alcançar os objectivo o novo presidente da ANJAP pretende, entre outras medidas, “desenvolver actividades que permitam colocar em debate dificuldades da jovem advocacia, realizar acções de sensibilização junto das mais variadas entidades na defesa dos interesses dos jovens advogados e apresentar propostas e comunicados sobre temas que digam respeito à advocacia e à justiça”.

Licenciado em Direito na Universidade Católica, tem um mestrado Forense na vertente Direito Civil & Direito Empresarial. Este advogado da Teixeira Duarte passou pelas sociedades Neville De Rougemont LLP e Vieira Fonseca & Associados – Sociedade de Advogados. Foi ainda secretário-geral da European Law Students’ Association e é autor da tese intitulada “A introdução das acções sem valor nominal no direito português”.

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Filipe Menezes Romero (122/2004) Jovem empreendedor em TIC o Presidente João Lourenço lança apelo aos jovens:
Marco
TENHAM A AMBIÇÃO DE CRIAR APLICATIVOS PARA CONCORRER COM OS DE OUTRAS PARAGENS.

OChefe de Estado e do Executivo, João Lourenço, encorajou os mais jovens a desenvolver aplicativos que possam competir a nível global, antecipando o lançamento de incentivos nesta área.

As pequenas empresas “startups” (firmas novas, normalmente de base tecnológica) serão estimuladas, abrindo desde modo uma oportunidade aos jovens que queiram entrar no mercado das tecnologias de informação”, garantiu o Presidente da República, de Angola falando na abertura do Fórum Angotic 2018.

Apologista de um maior investimento na TIC (tecnologias de informação e comunicação), João Lourenço reconheceu a necessidade de se desenvolver no país “um amplo programa de formação de quadros, de engenheiros, programadores e técnicos de software”.

O Presidente da República destacou o contributo dos jovens neste domínio, exortando-os a terem “a ambição de criar e desenvolver aplicativos para concorrer com os de outras paragens que vendem para os grandes fabricantes de computadores, tablets e telemóveis”.

Pedro Miguel Vieira Dias (399/1982)

CEO - Premium Minds

Antigos Alunos em Destaque

A PREMIUM MINDS É A 14ª “MELHOR EMPRESA PARA TRABALHAR” EM PORTUGAL!

O prémio que é anualmente atribuído pela Revista EXAME a 100 empresas, classificou em 2018 a Premium Minds em 14º lugar no ranking nacional.

O prémio da Exame, entregue na AESE, em Lisboa, é o que tem mais empresas a con-

correr e é o prémio que é mais apetecível e reconhecido no mercado, pelo que se trata de um justo reconhecimento pela qualidade do trabalho desenvolvido pelo Pedro Dias na relação com os seus colaboradores.

O Pedro Dias, estudou Engenharia e Gestão Industrial no Instituto Superior Técnico e fundou em 2002 a Premium Minds (PME Excelência desde 2013) de que é CEO.

Com um percurso profissional iniciado em 2000 como Gestor de Projectos na Novabase, foi simultaneamente, co-fundador da Limetree Moments for Life em 2012, co-fundador da ADD IT Minds em 2013 e partner da InnovationCast em 2015. A Premium Minds, agora premiada, já ao longo da sua carreira foi alvo de outras distinções: Excelência no Trabalho 2015: TOP 10 –Diário Económico, Melhores Empresas para Trabalhar 2015 – Revista Exame, Índice da Excelência 2016: TOP 10 –Revista Human Resources Portugal e Empresa Feliz 2016: TOP 10 – Happiness Works.

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Rodrigo Manuel Anaia Ferreira Fernandes (204/2008)

Em 13 de Novembro de 2018 o Núcleo de Alunos de Engenharia Naval do Instituto Superior Técnico (NAEN), (único curso de Engenharia Naval em Portugal), de que o Rodrigo Fernandes é o Presidente, foi um dos 9 premiados no âmbito do programa “CA2ECTecnico” patrocinado pelo Técnico (IST), BPI, Banco Santander e Caixa Geral dos Depósitos, com o projecto “VI Conferência de Engenharia Naval” .

A Conferência de Engenharia Naval é um evento anual em que participam alunos, professores e empresas de todo o Mundo, das áreas da Engenharia Naval e do Sector Marítimo.

Trata-se do Concurso de Apoios às Actividades Extra-Curriculares dos Núcleos de Estudantes do Ensino Técnico, edição 2018/19, em que ficou demonstrado “ o porquê de tantas vezes se evocar o talento e o empenho quando se fala dos Núcleos de Estudantes do Técnico.”

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Presidente do Núcleo de Alunos de Engenharia Naval - Instituto Superior Técnico
Legenda.

Antigos Alunos em Destaque

Sérgio Joaquim Raposo Filipe (389/1982)

Sérgio Filipe integra a equipa do Laboratório do Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier da NOVA vencedora do Prémio Pfizer 2018 na categoria de investigação básica com um estudo sobre a divisão celular nas bactérias e a resistência a antibióticos, intitulado “Peptidoglycan synthesis drives FtsZ treadmilling-independent step of cytokinesis” publicado na revista Nature em fevereiro de 2018.

Sérgio Filipe licenciou-se em 1995 em Química Aplicada, no ramo de Biotecnologia, pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (NOVA). Após terminar a licenciatura, mudou-se para Nova Iorque onde, durante 5 anos, foi estudante de doutoramento na Universidade Rockefeller, onde estudou como as bactérias pneumococos resistem a antibióticos como a penicilina, um antibiótico beta-lactâmico.

Após a defesa da sua tese de doutoramento em 2001, no Instituto de Tecnologia Química e Biológica daNOVA (ITQB-NOVA), passou três anos no laboratório do Prof. David Sherratt, no Departamento de Bioquímica da Universidade de Oxford, onde estudou biologia celular bacteriana. Em 2005 voltou para Portugal, como responsável por um grupo de investigação que estuda a composição e o metabolismo da superfície celular bacteriana e tenta perceber qual o seu papel na patogénese bacteriana e no modo como as bactérias modificam a sua interação com o organismo infectado. Desde 2015, é Professor Auxiliar do Departamento de Ciências da Vida da Faculdade de Ciências da NOVA e tem lecionado, entre outras, unidades curriculares de Biologia Molecular aos estudantes desta faculdade.

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Equipa do ITQB NOVA vencedora do Prémio Pfizer na categoria de “Investigação Básica” na cerimónia de entrega dos Prémios.

Antigos Alunos em Destaque

Virgílio Jorge Rodrigues Ribeiro do

Amaral (309/1976)

Psicólogo Clínico, doutorado e investigador em Ciências Humanas

Autor do livro “Sense of the 74th April Revolution: content and discursive strategies”.

(ISBN 978-613-9-81410-7) EDIÇÃO: LAP LAMBERT ACADEMIC PUBLISHING (1/6/2018)

(Sentido da Revolução de Abril de 74: Estratégias de conteúdo e discursiva)

Seguindo as abordagens discursivas nas ciências sociais, em especial na psicologia social, dois grandes incidentes críticos na Revolução Portuguesa de 1974 são, neste ensaio, analisados. Ao estudar a retórica política dos dois grandes partidos da esquerda – o partido socialista e o partido comunista português – o autor tenta resolver as linhas divisórias no espectro esquerdo na época, enquanto reflecte sobre a situação actual, em que uma aliança política permite que um governo socialista minoritário governe o país apoiado pelos restantes partidos da esquerda.

Trata-se de uma obra muito interessante pelo facto de versar uma época da História de Portugal recente, difícil pela falta do distanciamento que só o tempo permite, ter uma abordagem científica dos factos, e ser escrita em inglês e publicada numa editora com prestígio científico internacional, o que lhe confere um largo alcance.

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Almoço

da Delegação

do Algarve

Almoço da Delegação do Algarve

Os Antigos Alunos das terras do Sul de Portugal, ou melhor dizendo, do Reino do Algarve de Aquém-mar, não perdem uma ocasião para uma boa confraternização, acompanhada de uma jornada gastronómica, regada com vinhos da região, para melhor se poderem abstrair das preocupações do dia-a-dia, ficando assim com os espíritos mais libertos para poderem, com mais nitidez, recordar episódios pitorescos da sua vivência colegial. O último almoço convívio que organizaram foi no passado dia 17 de Novembro

de 2018, apresentando-se, para testemunhar o facto, uma foto de conjunto, em que um dos participantes se apresenta em pose curiosa, justificada por causas desconhecidas.

Para que os nomes dos participantes fiquem registados para a posteridade, são os mesmos seguidamente apresentados:

Francisco José da Silva Antunes (422/1955), Carlos Manuel Caramês Mendez (42/1959), José Eduardo Pereira Dores Costa (299/1959), António Car-

los da Cruz Cordeiro (175/1960), Joaquim Arnaldo Maltez Cardeira da Silva (133/1961), Luis Alexandre de Oliveira Mateus de Magalhães (146/1961), José Fernando da Cruz Cordeiro (27/1963), Artur José de Oliveira Mateus de Magalhães (294/1963), António Carlos da Palma Estanislau (376/1964), Miguel Maria Sanches de Miranda Mourão (550/1964), José Manuel Machado dos Santos (200/1965), João Pedro Roda Ferreira Quaresma (213/1965), Joaquim Paleta Marreiros (413/1965), José Alberto de Barros Lopes Coelho Casquilho (322/1966), José Carlos Pereira de Matos Duque (123/1968), António Manuel Freitas Soares de Almeida Pires (426/1969) e Pedro Jorge Cabral Rodrigues (173/1972).

Como se pode observar na foto, alguns dos Antigos Alunos fizeram-se acompanhar pelas respectivas mulheres, havendo ainda um participante nitidamente mais jovem, o actual Aluno do 2º ano 123/2017, Duque , que já anda na Escolta e que no final da função lançou um vibrante Zacatraz, que foi secundado por todos os presentes.

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Jantar de Natal em Braga

Jantar de Natal em Braga

No número anterior da ZacatraZ noticiámos uma reunião gastronómica de um grupo de Antigos Alunos residentes em Braga e arredores, que gostam de se reunir em torno de umas quantas garrafas de vinhos de qualidade superior, para de forma metódica, conscienciosa e imparcial, se poderem pronunciar acerca dos respectivos méritos. Não sabemos se publicam ou não o resultado das suas apreciações. Dado o grande líder deste grupo ser o Nuno Canelhas, que reparte a sua vida entre o Brasil e Portugal e que este ano decidiu pas-

sar o Natal no Brasil, o grupo não teve outra solução, que não a de promover um jantar de Natal antecipado. A celebração deu-se a 23 de Novembro e da mesma apresentamos uma foto e um texto descritivo, que nos foram enviados pelo seu mentor.

Na foto, da esquerda para a direita: António Adão da Fonseca (286/57), José António Lameiras (281/63), Pedro Alves Monteiro (111/79), António Monteiro Afonso (479/64), Pedro Mota Cardoso (375/70), José Moura Borges (74/62), Jorge Silva Duarte

(ex-153/51), Herlander Marques (260/69), Nuno Canelhas (591/59), Manuel Castro e Lemos (423/63), Carlos Pimenta Machado (83/63), Henrique Gonçalves Vaz (603/61), António Lobato de Faria (373/60), que foi “cortado” pelo “fotógrafo amador” e empregado do restaurante !!

“ Ontem realizou-se mais um (animado) jantar de confraternização de ex-alunos do CM, organizado por mim, no restaurante “NECA MAGALHÃES”, em Guimarães.

Este jantar foi já o de Natal deste nosso grupo em virtude de eu embarcar para o Brasil (onde também resido) no Domingo, 26Nov, aonde vou estar cerca de 6 meses. Como já te disse antes, este grupo engloba ex-alunos do Porto, de Guimarães, de Braga (núcleo inicial), Barcelos e Viana do Castelo. Cada um leva uma garrafa de vinho, que todos provamos e...”dissertamos” sobre o mesmo!

Agradeço/agradecemos a publicação do evento com a foto na revista ZACATRAZ. Desde já ..OBRIGADO

Saudações Colegiais Abraço”

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Nuno Canelhas (591/59)

Jantar de Natal da Delegação do Norte

Jantar de Natal da Delegação do Norte

JANTAR DE NATAL 2018. DELEGAÇÃO DO NORTE.

O jantar de Natal de 2018, da Delegação do Norte da nossa Associação, teve lugar, como já vem sendo habitual, no Porto. Este ano o jantar realizou-se no dia 21 de Dezembro, que calhou na sexta-feira, que antecedia o fim-de-semana alargado em que se incluíam a véspera de Natal e o dia de Natal. Este facto, por si só, já dava para recear dificuldades no trânsito, no trajecto Lisboa – Porto, para os sulistas (ou «mouros» segundo os nortenhos) que em representação da Associação sempre marcam presença neste evento anual. A somar ao receio de haver um tráfego anormalmente elevado, havia ainda o receio de haver dificuldades acrescidas resultantes das manifestações que os «gillets jaunes» , em versão portuguesa, tinham prometido para esse dia, em que se incluíam as ocupações das praças das portagens das auto-estradas. Face a esta situação, a delegação sulista decidiu partir de Lisboa mais cedo do que o habitual, não tendo porém visto nem rasto dos «gillets jaunes» , que primaram pela ausência.

A chegada ao Porto deu-se assim com antecedência sobre o horário previsto,

antecedência essa que foi providencial, pois que, chegados ao Porto e distraídos na conversa, falhámos a saída para o nosso local de destino, tendo andado às voltas até acertarmos com o mesmo, percorrendo itinerários alternativos sinuosos, que alguns populares solícitos nos foram indicando. Como os ditos populares eram todos do sexo masculino, ficámos um pouco desiludidos, por não termos tido o ensejo de interpelar uma senhora, começando por lhe dizer «Oh Santinha» . Fica para uma próxima oportunidade.

Este ano a delegação sulista foi reduzida. Incluia o signatário, que se foi apresentar como novo Presidente do Conselho Supremo, o Presidente da Direcção José Eusébio Pereira Barata Cordeiro Araújo (591/1953) e o anterior Presidente do Conselho Supremo, Martiniano Nunes Gonçalves (9/1958), que acabado de chegar a Lisboa vindo de Paris, não resistiu à tentação de participar em mais uma jornada de confraternização com os camaradas nortenhos.

O evento foi organizado com a eficiência habitual, pelo chefe da Delegação do Norte, Bruno Pinto Basto Soares Franco (281/1970), o «TOFA», que nos

recebeu com a sua amabilidade proverbial e que continua a manifestar um entusiasmo enorme por tudo aquilo que ao Colégio diz respeito.

O jantar decorreu, à semelhança dos anos anteriores, no Oporto Cricket and Lawn Tennis Club, onde as instalações e o ambiente são magníficos para este tipo de eventos. No ano passado não houve «amarelo» na ementa, por não se ter conseguido que o cozinheiro acertasse com a confecção desta iguaria da culinária colegial. Este ano, não sabemos que diligências terão sido empreendidas, mas o facto é que o «amarelo» voltou à mesa e com um sabor e uma consistência que foram do agrado geral. A anteceder o «amarelo» , saiu o tradicional caldo verde e aí o êxito é garantido, não há como a gente do Norte para fazer um bom caldo verde, com uma ou mais rodelas de um delicioso chouriço. Só a vergonha me impediu de repetir o caldo verde.

Para além do organizador e dos sulistas anteriormente referidos, estiveram presentes os Antigos Alunos seguintes:

Luís Augusto Nunes de Almeida Bandeira (236/1945), António Rui Prazeres de Castilho (147/1948), José António Campos

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Jantar de Natal da Delegação do Norte

Resende Santos (23/1949), José Alberto da Costa Matos (96/1950), José Manuel Simões Ramos de Campos (319/1950), Jorge Manuel Morais Silva Duarte (153/ 1951), Luís Manuel Ferraz Pinto de Oliveira (138/1954), Francisco Xavier de Barros Cardosos de Menezes (6/1956), Jorge de Sousa da VeigaTorres (317/1956), António Manuel Adão da Fonseca (286/1957), Afonso Henriques Mendes de Araújo (31/1958), António Norton de Matos Carmo Pereira (522/1959), Albino Manuel Pereira de Sousa Bortelho (342/1961), José João Ponce Centeno Castanho (562/1961), Luís Miguel Moreira de Almeida Santos (607/1962), José António Marques Salgado Lameiras (281/1963), José Manuel Duarte Presa Fernandes (403/1963), Manuel Maria de Castro e Lemos (423/1963), Domingos Gonzalez Magalhães (596/1963), Joaquim Miguel Ramos Carvalheiro (177/1964), António José Monteiro Afonso (479/1964), António Ramos Pinto Teodosio (266/1965), António José Mesquita da Cruz (329/ 1965), António Cabral da Campos Felino (577/1965), Paulo Manuel Fernandes Lobo Fernandes (487/1966), Gualter Manuel da Mota Santos (299/1969), Herlander José Resende Marques (260/1969), João Manuel Trindade Coelho de Sousa Teles (355/1969), João Manuel Sanches Roma Moreira Lobo (572/1969), José Manuel Queimada da Silva Soares (82/1970), Bruno Pinto Basto Soares Franco (281/1970), António Jaime Tavares Coutinho Lanhoso (176/1971), Agenor Guerreiro Ranhada Rolo (199/1974), Boanerges Fernando Macedo Lobato Faria (258/1974), José Eduardo da Costa Silva Pereira (391/1974), Pedro de Paula Santos Alves Monteiro (111/1979), António Carlos Pires Martins (85/1982), João José Pacheco de Almeida Tété (383/1984), Nelson José Cordeiro Cajão (496/1984), Marcos Faceira Teixeira (232/1985), Amândio Emanuel Lopes Ribeiro (368/1993), Francisco José Castro Martins (409/1993), Luís Filipe Pinto Leite (384/1994), Carlos Alberto Oliveira Pacheco (63/2001).

No final do jantar houve discursos, em que os oradores procuraram ser todos breves, para não castigarem os ouvintes. Começou por falar o anfitrião, com um improviso que foi mais uma ode do seu amor ao Colégio, tendo terminado com a apresentação de alguns Antigos Alunos que conseguiu localizar no Porto e arredores e que pela primeira vez tomaram parte nestes convívios. Cada um fez a sua própria apresentação sumária e ficámos a saber, com satisfação, que as hostes nortenhas estão a ser reforçadas. Seguiu-se no uso da palavra o nosso Presidente da Direcção, que estando a terminar o seu mandato tomou parte, nesta qualidade, pela última vez nestes convívios. Cremos que nos próximos anos continuará a rumar ao Porto. Não será capaz de resistir à tentação. No final falou o signatário, que se apresentou nas suas novas funções, que manifestou o seu grande prazer em participar nestes convívios nortenhos e que manifestou a sua grande satisfação por ali encontrar sempre o seu primeiro comandante de pelotão no Colégio, Jorge Manuel Morais da Silva Duarte (153/1951), mais conhecido nos seus tempos colegiais por “Faustino”, que se celebrizou como jogador de grande categoria da equipe de futebol colegial, seguindo as pegadas de seu pai que foi um jogador de nomeada na «Briosa» , quando a equipe coimbrã se batia “taco a taco” com os clubes grandes do futebol nacional.Com a emoção do momento, esqueceu-se o signatário do mais importante, que teria sido felicitar a Delegação do Norte pelos prémios Barretina recentemente recebidos, tanto o Prémio atribuído à própria Delegação, como o prémio atribuído a um dos seus membros, António Manuel Adão da Fonseca (286/1957), engenheiro civil, professor catedrático e projectista de grande mérito, de quem a comunidade colegial muito se orgulha.

Ao longo dos anos as notícias dos jantares de Natal da Delegação nortenha eram sempre acompanhadas por uma foto do evento tirada pelo saudosíssimo Gonçalo Salema Leal de Matos (371/1949), que por um dia desempenhava as funções de fotógrafo. O ano passado, na sua ausência, ninguém se lembrou de tirar uma foto e este ano a cena repetiu-se. Que falta nos faz o Gonçalo! Esteve em pensamento connosco.

Parabéns ao «TOFA» por mais esta bela jornada de convívio e camaradagem colegiais.

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Luis Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957)

O Cavalo de Ferro Moçambicano

O Cavalo de Ferro Moçambicano

Num recente número da Zacatraz falei da minha permanência no norte de Moçambique, na área da Serra de Mecula, e do conhecimento que travei com o “Almirante do Lugenda”.

Mas, como é que eu cheguei àquelas paragens, como fui parar à “Guerra do Lugenda”?

Eu conto.

Saí do Colégio em Julho de 1956, entrei para o Técnico, formei-me em Julho de 1963, fiz um estágio durante o Verão e “entrei para a tropa” no início de Outubro seguinte, para fazer a recruta na Escola Prática de Engenharia, em Tancos. Como vinha do Colégio, fora dispensado dos dois primeiros meses (Agosto e Setembro) e fiquei entre os primeiros do curso, o que se por um lado deu origem a que fosse colocado perto de casa, no Serviço de Fortificações e Obras Militares, no Campo de Santa Clara, desempenhando funções de estudos e projectos, a minha vocação profissional, por outro lado ocasionou que fosse dos últimos a ser mobilizado, o que só aconteceu depois de

mais de um ano de serviço em Lisboa! Mas fiquei satisfeito com a mobilização que me calhou: ia para Moçambique, em rendição individual, devia apresentar-me em Lourenço Marques, onde até tinha a residir o meu irmão, evidente apoio logístico para mim e para a Necas - sim já era casado e até já nos tinha nascido, em Novembro, o Manel. Claro que era chato ter que partir, mas tinha que ser e o destino parecia o melhor possível.

“Então até breve, quando chegar instalo-me e escrevo a combinar a vossa ida, etc” . Embarquei como passageiro de 1ª classe no Infante Dom Henrique, boa viagem, Madeira, Luanda, Lobito, Capetown, cheguei a Lourenço Marques, fui-me apresentar ao Quartel General. “Alferes Paula? Sim, sim, estávamos à sua espera; foi colocado no Batalhão de Engenharia de Nampula!”; “Nampula? Como é?” Disseram-me e lá escrevi à Necas “... dizem que é uma cidade jeitosa, razoável clima, vive-se bem, quando lá chegar instalo-me e escrevo a combinar a vossa ida, etc” . Parti para o norte a bordo do paquete Império, cheguei a Nampula, fui-me apresentar no Batalhão de En -

genharia de Nampula. “Alferes Paula? Sim, sim, estávamos à sua espera; foi colocado na Companhia de Engenharia de Vila Cabral!”. “Vila Cabral? Como é?” Disseram-me e lá escrevi à Necas “... dizem que é uma cidadezinha jeitozinha, pequenina, bom clima, não se vive mal de todo, vê-se o Lago Niassa lá ao longe, quando lá chegar instalo-me e escrevo a combinar a vossa ida, etc”. Parti de avião, cheguei a Vila Cabral, fui-me apresentar na Companhia de Engenharia 521. “Alferes Paula? Sim, sim, estávamos à sua espera; foi colocado a comandar o Destacamento do Lugenda, para construir a ponte”. “Lugenda? Onde é? Como é?” Disseram-me e lá escrevi à Necas “esquece, até qualquer dia, beijinhos!”.

Fiquei quatro ou cinco dias em Vila Cabral (hoje chama-se Lichinga) e num dia que creio que foi para aí 18 de Fevereiro de 1965, 5ª feira, meti-me num camião com um soldado condutor e lá partimos a caminho do Lugenda, viagem de mais de 600 km. Já calculava mas perguntei ao condutor: ”temos viagem para dois dias, não é?”; “sim, quando Deus quer vai ser só dois dia!”. O camião era gran -

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José Alberto Alves de Paula 62/1948

O Cavalo de Ferro Moçambicano

de, uma Mercedes e ia carregado com coisas para o Destacamento. Alguma comida (secos e conservas), 40 ou 50 sacos de cimento, alguns bidões de gasóleo, umas estruturas para montar o acampamento, moldes, uma betoneira e ferramentas para a obra, etc. Saímos de manhã cedo, pela hora de almoço chegámos a uma povoação pequena chamada Mandimba, onde estava uma secção comandada por um furriel que nos recebeu com amizade e providenciou uma galinha para o almoço.

Depois continuámos e pela tarde chegamos a Nova Freixo, povoação que hoje retomou o antigo nome de Cuamba. Era uma terra com interesse estratégico, não longe da fronteira com o Malawi, cruzamento das estradas que ligavam para Nampula, para Marrupa, para Vila Cabral e para sul para o Gurué, a Zambézia e, no limite, para Tete. Estava lá a sede de um batalhão, a respectiva CCS (Companhia de Comando e Serviços) onde fui pedir assistência. Vão para o Lugenda? Isso não é para lá de Marrupa? Podem cá dormir, claro. E jantem connosco.

Havia no aquartelamento uma sala que era messe de oficiais, fui para lá. Um ou dois capitães, quatro ou cinco alferes, todos na sala à espera do jantar. Gente simpática. Iam bebericando uma Laurentina ou um “whisky saloio” (brandy Borges ou Constantino com água gaseificada). Eu sentia-me um pouco inibido. Tinha acabado de chegar da “Metrópole” , o que merecia vários nomes, entre eles “maçarico” e outra coisas; mas ali no norte de Moçambique o termo técnico apropriado era “checa-checa” . E eu sentia-me absolutamente checa-checa. Eles todos já com mais de um ano de mato, adaptados, o camuflado coçado e desbotado, um ou outro remendo; eu parecia acabado de sair duma montra da Rua dos Fanqueiros:

camuflado novo, impecável, cores originais, ainda a cheirar a roupa passada a ferro, boina a condizer, e por aí fora. Percebi que para não me dar demasiado ao gozo era vital não dar nas vistas, não fazer demasiado figura de “acabadinho de chegar”. Por isso, fui-me deixando estar sossegado, apenas uma ou outra troca de impressões com o alferes que estava mais perto, à espera do tal jantar. Mas, a certa altura, um dos outros alferes vira-se para o empregado e diz-lhe: ”eh pá, então?, diz lá ao cozinheiro que já são sete e dez, o que é que ele está à espera?”. Estranhei a pressa, mas mantive-me prudentemente calado. O mal foi que, passados uns cinco minutos, o capitão, já fazendo voz grossa, atirou “ então pá, esse jantar vem ou não vem?”. A curiosidade começou a ultrapassar a prudência; estava perto de mim, a ler um livro, o tal alferes que até tinha cara de compreensivo, perguntei-lhe: “porquê esta pressa?”; “é que o comboio chega às oito!” explicou laconicamente, regressando ao livro que estava a folhear e considerando, certamente, mais que suficiente a explicação. Ele terá pensado que era

suficiente mas a mim não me pareceu, não me dei por satisfeito e insisti: ”e quem é que vem no comboio?” . Olhou para mim, agora com ar muito menos compreensivo, um profundo desprezo, fez-me sentir super checa-checa, falou-me já com aquele ar simpático com que um finalista de Coimbra fala a um caloiro que lhe despejou a sopa na capa e atirou “quem vem no comboio? É o comboio!” . E aparentou considerar o assunto encerrado, voltou ao livro. Mas eu era mesmo checa-checa e parece que não estava nos meus melhores dias, “ah, sim, e quantos comboios é que há por dia?” Nem para mim olhou, apenas rosnou: ”segundas e quintas!” Aí calei-me mesmo de vez.

Chegou a comida. Parecia que toda a gente estava a comer com calma e dignidade, embora, no subconsciente eu pressentisse que algo estava para acontecer. Não sabia o quê, mas havia qualquer coisa no ar. Uma ameaça latente, sentia-se, respirava-se. E, de repente,... aconteceu !!! Ouviu-se um silvo, um apito de comboio lá ao longe e como se lhes tivessem espetado um alfine -

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Norte de Moçambique. Nova Freixo (Cuamba).

O Cavalo de Ferro Moçambicano

te no rabo, todos saltaram da mesa a correr para a rua, onde estavam dois jeeps. Eu, imóvel, checa-checa, sem saber o que fazer. “vens ou não vens?” berrou-me o alferes tipo finalista de Coimbra. E eu fui, claro. Não se pode dizer que entrássemos nos jeeps, antes atiramo-nos para dentro dos jeeps que imediatamente arrancaram a toda a mecha em direcção à estação. No caminho para a estação tínhamos que atravessar a linha férrea, numa passagem de nível; o comboio já vinha acolá e os tipos a acelerarem, a acelerarem; não se pode dizer que tivesse sido mesmo uma tangente, mas ao passarmos sobre a linha o farol da locomotiva já nos iluminava. Perguntei ao tipo que estava ao meu lado: “ouve lá, e se o Jeep da frente tem um percalço, como é?” ; “sei lá, nunca aconteceu!” ; “estes gajos estarão todos a gozar comigo?” perguntei-me. E lembrei-me, sem querer, daquele veterano que uns

dias antes me dissera que “ao fim de uns meses no mato a malta fica “meio apanhada pelo clima” ”? Não, não era a gozar comigo, aquilo era mesmo assim, uma espécie de prova desportiva, com regras claras: tinha que se estar sentado calmamente a jantar até ouvir aquele apito que o comboio dava sempre que entrava naquela curva lá ao fundo, a avisar a estação de que estava a chegar; só nessa altura se podiam levantar da mesa, correr para os jeeps e atravessar a passagem de nível antes do comboio,..... que não me pareceu que estivesse a mais de 100 metros !!!

Chegámos à estação e, logo a seguir chegou o comboio. Era evidente: segundas e quintas eram mesmo “dias de São Comboio” : comboio que tinha uma carruagem restaurante; que vinha de Nacala, donde trazia camarões; que passara em Nampula, donde trazia café e bolos da Pastelaria; e que trazia

os jornais e que ..... era possível e obrigatório derrotar na luta pela passagem de nível! Calculo que quem não acelerasse a fundo e deixasse o comboio passar seria, no mínimo, maricas. Mas, se calhar, nunca aconteceu. Era quinta feira, de São Comboio; também entrei na carruagem restaurante e analisei todo o detalhe: além dos camarões, da cerveja, do café e dos bolos, o comboio trazia jornais da Metrópole, deviam ser o Notícias e o Popular (eram do sábado ou domingo anteriores, mas eram de Lisboa); trazia o Notícias de Lourenço Marques (de segunda ou terça feira); e, maravilha, trazia a Bola e o Mundo Desportivo (que eram de sexta feira ou sábado anteriores), em que vinham as considerações e previsões dos jornalistas sobre quem jogaria e como poderiam decorrer os jogos que se iriam disputar no domingo, ....... cujos resultados já todos sabiam porque lá em Nova

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“Cavalo de ferro” análogo aos do Oeste americano.

O Cavalo de Ferro Moçambicano

Freixo se ouviam os relatos, nas ondas curtas da Emissora Nacional !!! Mas ler o Mundo Desportivo era especial! Tão especial que, sentado numa das mesas a tomar o café e a comer o bolo de creme vi, incrédulo, dois dos alferes, com um prato de camarões e duas cervejas à frente, engalfinhados a discutir acaloradamente as tais previsões feitas na sexta feira anterior, sobre o tal jogo de domingo, cujo relato eles tinham estado a ouvir!!!! (“Onde é que eu vim parar?”)

Passou uma meia hora. Apareceu um funcionário que informou: ” os comboio vais pártii. Os sinhô qui nô és passagêro, favô di saííí.” Obedecemos; pagámos as despesas e saímos. Ficamos todos no cais. Uma corneta, um apito, “pááátiiida”, uns sopros de vapor, o comboio estremeceu, rangeu, uns entrechoques das carruagens e o monstro pôs-se em movimento. Ficamos todos no cais a olhar o comboio que se afastava. Cada um com os seus pensamentos e as suas nostalgias. Eu olhava aquela luz vermelha que se afastava e via que chegara ao faroeste dos filmes. Em vez de “cobóis” e cavalos, alferes e jeeps; em vez de peles vermelhas, peles morenas; mas lá es -

tava, rei da pradaria, “o cavalo de ferro” , vago mensageiro do mundo que eu deixara havia poucos dias. Eu olhava aquela luz vermelha que se afastava e sentia que era eu que cada vez me afastava mais da civilização; e constatava que o tal veterano devia ter mais que razão: ao fim de uns meses no mato a malta fica (mesmo!) “(completamente!) apanhada pelo clima” ! “Como estarei daqui a uns meses?” conjecturei algo pessimista.

No dia seguinte metemo-nos no camião e seguimos viagem em direcção a Marrupa. A meio caminho era Maúa, onde estava instalada uma companhia que fazia parte do Batalhão de Artilharia sediado em Marrupa. Fui ter com o capitão e perguntei-lhe se nos poderia facilitar almoço. Disse logo que sim.

Enquanto almoçávamos interessou-se pela minha função. “Para o Lugenda? Construir uma ponte? É giro. E o que levam no camião?” ; “Umas máquinas, estruturas, ferramentas, uns sacos de cimento (“CIMENTO???”) , sim, uns bidões de gasóleo (“GASÓLEO???”), sim” . E eu, olhando para o capitão não pude deixar de me lembrar daquelas fitas de bonecos animados em que, quando

alguém fala de dinheiro se vêem os olhos do vilão a rolarem como as giratórias das “slot machines” , cheias de cifrões; os olhos do capitão pareciam o mesmo, só que, em vez de cifrões, o que se via a rolar eram sacos de cimento e bidões de gasóleo! Cheguei a recear o que iria encontrar no camião. Chegando lá perguntei ao motorista: “tudo bem com a carga?”; “sim, meu alferes, quer dizer, quase tudo; só se rasgaram uns cinco ou seis sacos de cimento e havia um bidão de gasóleo que estava furado, a pingar; mas o nosso capitão já mandou uns soldados ajudar a descarregar o material danificado!!!” “Gajo porreiro!” , pensei!

Pelo fim da tarde chegamos a Marrupa, onde estava o comando do Batalhão de Artilharia e a CCS. Apresentei-me ao comandante que, por ser o comandante de toda a tropa entre Marrupa e Mecula, durante os meses seguintes iria ser a autoridade militar a quem eu, directamente, deveria reportar. Recorde-se que o meu comandante de companhia, em Vila Cabral, estava a mais de 600 km de distância e o comando do meu batalhão, em Nampula, a cerca de 700 km. Gostei de conhecer o comandante que, além de me agradar à primeira vista (boa opinião que confirmaria nos meses seguintes) tinha um nome impressionante: Ten. Coronel Napoleão Pitta Meira de Amorim ! Já era noite, não era prudente prosseguir. Dormimos em Marrupa e no dia seguinte arrancámos cedo e chegámos ao destino: o Destacamento de Engenharia do Lugenda , onde iria passar um ano e um dia a tentar começar a construir uma ponte com mais de 400 m de extensão. Não conseguimos tudo mas, vá lá, dadas as circunstâncias, fizemos bastante!

E conheci o Almirante.

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Podia ser Nova Freixo.

A Família Duarte Silva

Há pedidos a que não se pode fugir e o que o Nuno Mira Vaz me fez é seguramente um deles. Respondo afirmativamente não tanto para relembrar os que me precederam e os que me sucederam, mas sobretudo para realçar as características únicas de uma Instituição que atrai para as suas fileiras famílias inteiras ao longo dos tempos, no nosso caso por mais de um século.

Comecemos então pelo primeiro, o meu pai, que viria a ser Director do Colégio Militar em 1948 e 1949 e a quem por pouco escapei, por ter entrado em 1950. A sua entrada ocorreu em 1901 com o número 59, número este que viria a ser uma espécie de ex-libris da familia: sucederam-lhe em 1936 com o mesmo número o meu irmão Alexandre (comandante da segunda em 1943), eu próprio em 1950 (duas estrelas da terceira em 1957) e um sobrinho-neto, o Anthony Duarte Silva Lupi Hart, em 2010. O segundo foi o meu irmão Joaquim Miguel, o 8/1934, Porta-Bandeira em 1940, que seguiu a carreira militar na arma de O

A Família Duarte Silva

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General Duarte Silva com os seus netos colegiais.

A Família Duarte Silva

cavalaria com êxitos assinaláveis tanto no domínio dos cavalos – quatro vezes cavaleiro olímpico, tendo-se classificado em 4.º lugar por equipas no concurso completo em Helsínquia (1952) e no 5.º lugar individual na prova de obstáculos, com a égua Jeune France, em Tóquio (1964) –, como no das armas (inúmeras condecorações e o posto de general.

Acerca deste meu irmão dezassete anos mais velho do que eu, não resisto a contar uma história, bem conhecida da minha família e dos que comigo mais de perto conviviam e que reflete o seu carácter marcial, ao que me dizem, comprovado por muitos que com ele serviram nas fileiras. Corria o ano de 1956, o meu pai era à data

2ª Geração

Comandante Militar de Moçambique e eu fora entregue aos cuidados do meu irmão, meu padrinho, que eu respeitava-temia na sua qualidade de tutor. Aconteceu que eu, aluno sofrível, tive um deslize a Matemática que me valeu um “MAU”, imediatamente reportado ao meu tutor.

Ora estava eu gozando as delícias duma digestão de submarinos no geral da quarta quando sou chamado à sala de oficiais onde me esperava o capitão Duarte Silva, expressamente chegado de Torres Novas. Tremendo, apresentei-me na dita «sala dos cães» onde me esperava, hirto, o meu irmão devidamente fardado, exibindo aquele ar frio e um reflexo no olhar que não auguravam nada de bom.

Sem saber como lhe havia de falar, avancei um hesitante passo para lhe dar um beijo, imediatamente correspondido com uma ordem ríspida: SENTIDO !!! O abraço fraternal transformou-se na dita posição em que ouvi as palavras ásperas do “tutor” que após breves e inesquecíveis momentos me despediu com um: pode retirar-se! Este era o meu querido irmão com quem tanto convivi aqui e em Angola e de quem tenho tantas saudades como aliás do outro, o 59/1936, que fez a sua vida em Moçambique, donde veio em 1978 para não mais voltar.

Seguiram-se na ordem de entrada eu próprio em 1950 e uma série de sobrinhos e sobrinhos-netos como segue:

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Joaquim Miguel de Matos Fernandes Duarte Silva (8/1934) Ajudante do Cmdt. do Batalhão em 1940 General do Exército António Fernandes Duarte Silva (59/1950) Cmdt. de Secção da 3.ª Companhia em 1957 Engenheiro civil Alexandre de Matos Fernandes Duarte Silva (59/1936) Cmdt. da 2.ª Companhia em 1942 Engenheiro electrotécnico
3ª Geração
Duarte
(1/1963) Furriel Gestor de empresas
Francisco Honorato
Silva Sepúlveda
agrónomo
José Joaquim Duarte Silva Lupi (9/1965)
Engenheiro
Calça e Pina Duarte Silva (4/1965)
do Cmdt. do Batalhão em 1972 Médico
Calça e Pina Duarte Silva (8/1964) Cmdt. da Escolta a cavalo em 1971 Médico
Alexandre Silva Pereira Duarte Silva (19/1965
) Arquitecto António
Ajudante
Joaquim

Luis Samuel Duarte Silva Lupi (29/1966)

Cmdt. da Escolta a cavalo em 1973

Médico veterinário

Miguel de Mira Duarte Silva (25/1967)

Advogado

Miguel Duarte Siva Lupi (14/1968)

Cerra-fila da Escolta a cavalo em 1974

Eng. Técnico Agrário, Gestor de Empresas

4ª Geração

José Maria Duarte Silva Ferreira Lima (119/1994)

Cmdt. de Secção da 1.ª Companhia em 2002

Gestor de empresas

Tiago Duarte Silva Lupi (20/1997)

Anthony Duarte Silva Lupi Hart (59/2010)

A Família Duarte Silva

Miguel Calça e Pina Duarte Silva (20/1970)

Cmdt. da Escolta a cavalo em 1976

Gestor de empresas

António Duarte Siva Lupi (9 de 1972)

Gestor agrícola

Empresário

Estudante

Quatro gerações de “Duarte Silva”, 16 Meninos da Luz - que venham mais!

Quanto aos meus dois filhos, ainda os inscrevi, mas não tiveram vaga, que nos idos de 1977 a preferência de entrada para filhos de civis, mesmo netos de um antigo Director, eram escassas. Foi pena. Teriam gozado uma experiência inesquecível como o pai deles gozou e teriam aumentado a sua família com tantos quantos o pai aumentou.

Não que não o tenham feito a sua, mas como diz o povo, não era a mesma coisa!

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A Família Duarte Silva

Joaquim Plácido Duarte Silva (59/1901) Director do Colégio Militar Nota biográfica

Nasceu em Borba em 4 de Junho de 1891. Ingressou no Colégio Militar em 1901, onde recebeu o número 59.

Concluído o seu curso no Colégio Militar, ingressou em 1907 na Universidade de Coimbra, onde fez os preparatórios

para o ingresso na Escola do Exército. Ingressou na Escola do Exército em 1910. Terminou o seu curso de oficial de Artilharia em 1913, sendo promovido a Alferes ainda nesse ano.

Em 1914 integrou as tropas da 1ª expedição enviada para Moçambique durante a

1ª Guerra Mundial. Em 1915 regressou à metrópole, sendo promovido a Tenente. Em 1917 tomou parte no golpe militar que leva Sidónio Pais ao poder.

Em 1918, já como Capitão, partiu para França, em rendição individual, indo integrar o 3º Grupo de Baterias de Artilharia do Corpo Expedicionário Português (CEP). Em 1919 regressou a Portugal.

Em 1919 foi colocado no Regimento de Artilharia nº1 em Évora, onde se manteve 29 anos. Promovido a Major em 1922, a Tenente – Coronel em 1935 e a Coronel em 1942, tendo passado a comandante do Regimento. Em 1948, já como Coronel Tirocinado, foi nomeado Director do Colégio Militar, sendo de seguida promovido a Brigadeiro. Durante o período da sua Direcção, em 1949, foi inaugurado o edifício do ginásio.

No final de 1949 deixou o Colégio Militar para assumir as funções de Comandante da 4ª Região Militar, em Évora, vindo a ser promovido a General, nessas funções, em Janeiro de 1952.

Em 1954 foi nomeado Comandante Militar de Moçambique, tendo terminado a sua carreira militar em 1956, passando à reserva por ter atingido o limite de idade no posto.

Era possuidor de numerosas condecorações individuais, das quais se destacam a grã-cruz da Ordem Militar de Avis, Mérito Militar de 1ª classe, Oficial da Legião de Honra de França e a grã-cruz de Mérito Militar de Espanha. Era possuidor de duas condecorações colectivas atribuídas às unidades em que serviu durante a 1ª Guerra Mundial: Cruz de Guerra de 1ª classe (Moçambique) e Ordem da Torre Espada do Valor, Lealdade e Mérito (França).

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Director do Colégio Militar 1948/1949 Brigadeiro Joaquim Plácido Duarte Silva (59/1901).

A Prisão

No artigo intitulado «Justiça e (In)disciplina», publicado na ZacatraZ nº 212, de Julho/Setembro de 2018, referi largamente o uso e o abuso que era dado no Colégio à pena de prisão, ao longo do século XIX. Referi que essa pena podia revestir várias modalidades, as quais revelavam alguma imaginação, ou até um pouco de sadismo, por parte daqueles que conceberam os regulamentos colegiais naqueles tempos. Recordo que, segundo o regulamento disciplinar do Colégio de 1855, os Alunos mais velhos podiam chegar a ser punidos com o que então se designava por «prisão militar». Neste tipo de pena, o Aluno tinha por leito «uma barra de pau, com enxergão e travesseiro de munição, sem roupa branca e apenas com os cobertores necessários». A «prisão militar» podia ainda ser agravada, dando-se ao punido « pão de munição e uma só comida em cada vinte e quatro horas, em dias alternados, não podendo este agravamento durar mais de cinco dias». O(s) autor(es) do regulamento revelavam assim alguma prudência, evitando que o Aluno punido acabasse por fenecer, por subalimentação.

Como foi referido, a prisão foi usada com muita frequência até ao final do século XIX,

altura em que Morais Sarmento assume a Direcção do Colégio, em 1898. O que Morais Sarmento foi encontrar no Colégio deixou-o revoltado, levando-o a afirmar em discurso então proferido «Não é tão excessivo o espaço de que o Colégio dispõe, para que um pavimento inteiro de uma das suas alas possa continuar a ser exclusivamente destinado a prisões solidamente aferrolhadas», para logo de seguida expor a forma totalmente diversa como desejava abordar a questão da disciplina, dizendo «As penas de ordem moral, que têm como elemento constitutivo o conselho e o estimulo paternais, serão as que passam a formar o sistema repressivo normal; e lisonjeia-me a ideia que bastarão para chamar ao cumprimento do dever os raros alunos que dele se desmandarem». Morais Sarmento introduziu profundas alterações no Colégio, plasmadas no Regulamento de 1901, de sua autoria. Nesse regulamento, um verdadeiro modelo de pedagogia, continuava porém a estar prevista a pena de prisão, que passou então a designar-se por reclusão. Quando frequentei o Colégio, na segunda metade da década de 50 e início da década de 60 do século passado, o regulamento que estava em vigor era o regulamento de 1944,

que os Alunos de então desconheciam completamente. Nenhum de nós alguma vez o tinha lido. No entanto, os castigos aí previstos eram-nos familiares, dada a profusão com que eram aplicados. O castigo mais corrente era as privações de saída aos fins-de-semana, que facilmente faziam com que um Aluno passasse três ou quatro semanas enclausurado dentro do Colégio. Para os Alunos vindos da província ou de África, que na altura eram numerosos, esta punição não tinha qualquer efeito prático. Enclausurados já eles estavam, chegando a sair do Colégio somente durante os períodos de férias. Havia alguns que tinham mais sorte, pois eram informalmente «adoptados» pelos pais de algum companheiro e saiam com eles para passar os fins-de-semana em suas casas. A solidariedade colegial também era praticada pelos pais. Entrei para o 3º ano do Colégio, em 1957, e não me lembro de alguém ter sido punido com pena de prisão nesse ano. Se foi essa a realidade, foi um facto notável, pois havia na altura uns quantos «excêntricos», que terão sido suficientemente espertos e habilidosos para escapar à prisão. Face a esta situação, não imaginava eu na altura onde se situaria a prisão. Haveria talvez um espaço a isso destinado, mas que es-

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Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa
71/1957 A Prisão

taria em desuso e que eu desconhecia. Acordei para a existência da prisão, que na gíria colegial daquele tempo era designada por «choça», penso que no ano seguinte, num dia em que o Batalhão todo foi convocado para um treino para uma cerimónia. O treino realizou-se no local habitual das cerimónias, nos claustros, onde entrámos a marchar, vindos do Pátio da Infia, sob o olhar atento e severo do Subdirector da altura, que nos incitava a marchar com «panache», como na época se dizia, embora já se tivesse passado século e meio sobre as invasões francesas. Enquanto alguns correspondiam ao incitamento, havia outros que nem tanto o faziam, devido ao quadro mental depressivo em que se encontravam, resultante do facto de lhes ter sido subtraída a sempre apetecida hora de recreio, substituída por uma sessão de Infia. O treino lá ia seguindo da forma habitual com o Comandante de Batalhão a dar as vozes, a que a malta correspondia com um manejo de armas mais ou menos esforçado, até que o olhar atento do Subdirector cai sobre o Aluno X, que estaria ostensivamente a esforçar-se abaixo dos mínimos expectáveis. Este Aluno X, como se verá de seguida, era de um tipo muito especial: inteligente, corajoso e frontal como poucos e também rebelde como poucos. O Subdirector, que em serviço não era homem para graças, interpelou de imediato o Aluno em causa, perguntando-lhe:

- Sr. X. Está a fazer um frete?

Ainda a pergunta pairava no ar, quando se ouve, distintamente, no silêncio dos claustros, a resposta imediata à mesma:

- Estou sim, meu Tenente-Coronel.

Suponho que todo o Batalhão terá então pensado como eu, «temos o caldo entornado».

O Subdirector mandou o Aluno X sair de imediato da formatura e presumo que apresentar-se no seu gabinete após conclu-

são do treino. Tal como seria de esperar o Aluno X, já terá passado essa noite na «choça», onde se manteve por alguns dias, sem que no entanto o facto o tivesse aparentemente afectado. Passou a ser mais conhecido do que já o era no Batalhão e passou a ser olhado com admiração pela malta mais nova, «aquele é que chegou para o Sub». Foi preciso activar então a prisão, usando-se para tal um pequeno quarto que existia no piso intermédio do edifício dos claustros, na sua ala Leste, do lado do Pátio dos Fâmulos, para o qual dava a janela do mesmo quarto. Foi necessário dotar a janela de grades, o que foi feito de forma expedita pelo carpinteiro, que pregou na moldura da janela umas quantas ripas na posição vertical, que, à boa maneira portuguesa, constituíam uma solução provisória, que passou a definitiva. Só conheço um testemunho fotográfico da existência desta «choça».

Como seria de esperar, fui encontra-lo na «História do Colégio Militar», da autoria do historiador colegial José Alberto da Costa Matos (96/1950). Com a sua licença reproduzimos essa foto neste artigo. Nos dias de hoje não é mais possível ver esta «choça», pois a ala Leste do edifício dos Claustros sofreu uma ampliação, para o lado do pátio dos fâmulos, na década de 60 do século passado, deixando de haver janelas de um andar intermédio. Lembro-me ainda de um episódio caricato que vivi na «choça», numa altura em que nesta se hospedava um cliente do meu curso. Este Aluno tinha decidido reencarnar, dentro do Colégio, a figura lendária de Arséne Lupin, famoso fora de lei francês, dos finais do século XIX, especialista em abrir tudo o que fossem fechaduras de portas e cofres forte, por mais complexas e sofisticadas que elas fossem. O nosso «Arséne Lupin» colegial foi constituindo, aos poucos, uma considerável colecção de chaves e gazuas. Com aquela ferramenta, poucas eram as portas no Colégio que ele não conseguia ultrapassar. Dizia-se até, que ele se introduzia no gabinete do Subdirector, de onde surripiava as participações nas quais

era o sujeito visado. Penso que este toque de mestre ainda hoje não está oficialmente confirmado e como ele não é do género de se gabar, penso que irá levar consigo o segredo para a tumba. Um dia, ou melhor, uma noite, as coisas não correram de feição ao nosso «Arsene Lupin», que foi apanhado nas suas deambulações por locais que teoricamente lhe eram vedados, o que acabou por o levar a ser cliente da «choça» por alguns dias. Condoído com a sua sorte, um desses dias, à hora do recreio, resolvi ir levar-lhe umas revistas que tinha conseguido arranjar. Lá me dirigi à «choça», que não tinha ninguém de guarda à mesma, bati à porta e disse lá para dentro que ia meter as revistas por baixo da porta. Estava eu agachado, a tentar introduzir as revistas, quando o «Arsene Lupin» me abre a porta calmamente e me convida a entrar. Pelos vistos, ninguém se tinha lembrado de lhe subtrair a sua panóplia de chaves e gazuas, às quais ele naturalmente continuou a dar uso. Desconheço se ele ainda hoje as guarda como recordação, ou como reserva para a resolução de qualquer eventual emergência. Depois do «Arsene Lupin» houve ainda no meu tempo outros utilizadores da «choça», incluindo um graduado que lá passou uns dias durante o período dos 5 estudos, antecedente do seu exame do sétimo ano. Tenho uma vaga ideia de ter havido uma tentativa, mal sucedida, de assalto à despensa, que terá levado o seu autor a um período de repouso forçado, de observação do Pátio dos Fâmulos através das ripas da janela. Este é um facto que eu só poderia comprovar através da consulta das ordens de serviço do Colégio. Finalmente, no meu 7º ano, houve dois alunos do 6º ano que foram também fazer umas estadias na «choça», o que acabou por dar origem ao que ficou conhecido como a greve da fome, que já tive oportunidade de descrever nas páginas de um número anterior desta nossa revista. Refiro que no meu tempo no Colégio a cama que se usava na «choça» era normal e a alimentação também não era sujeita a qualquer redução, o que já era um progres-

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A
Prisão

so assinalável em relação ao século XIX. Depois da minha saída do Colégio, foi publicado, em 1964, novo regulamento disciplinar, que no Artigo 40º, do Capítulo VI – PENAS DISCIPLINARES, rezava o seguinte: «As penas disciplinares aplicáveis aos alunos são, por ordem de gravidade, as seguintes:

1ª Admoestação.

2ª Corte de cabelo rente.

3ª Repreensão.

4ª Estudos suplementares.

5ª Privação de saída ou de férias até dez dias.

6ª Ordem de saída da aula ou instrução.

7ª Baixa de graduação.

8ª Reclusão até dez dias.

9ª Suspensão de frequência (mínima dez dias e máxima até final do ano).

10ª Expulsão. »

Como se pode observar, a pena de prisão continuava a ser prevista, agora com o nome de reclusão, desconhecendo eu se voltou a ser aplicada. Desconheço também, até quando a pena de prisão continuou a ser prevista no regulamento disciplinar. Se algum dos meus leitores tiver informação sobre esta matéria, que se che-

gue à frente e nos comunique o que sabe. Estranho na lista das penas de 1964 apresentada, a «Ordem de saída da aula ou instrução» na 6ª posição. A expulsão de uma aula não tinha em si nenhum problema, o aluno expulso até aproveitava para ir passear e apanhar sol. O pior era o que vinha a seguir, ou seja, uma participação do professor para a Direcção e a resultante pena de uns quantos fins-de-semana privado de saída. O legislador de 1964 devia estar distraído no dia em que compôs a lista. Para terminar, não resisto a informar que o citado regulamento de 1964 previa, em casos especiais, o recurso à força física para a imposição da disciplina. De facto, o Artigo 39º. do já citado Capitulo VI do mesmo regulamento rezava assim:

«A formação dos alunos do Colégio Militar é orientada no sentido de obter a mais perfeita disciplina através de meios suasórios, de educação do caracter e de noção de responsabilidade. São banidos os castigos corporais, que só em casos disciplinares de extrema urgência e gravidade poderão justificar-se.»

Esta disposição, naquele tempo, não era uma coisa especialmente de estranhar, pois era uma regra assente e aceite, que um oficial, quando dava uma ordem, tinha de se fazer obedecer, fosse como fosse, nem que para tal tivesse de recorrer a «meios extremos», deixando-se à imaginação de cada um o conceito de «meios extremos» Hoje em dia, ninguém se atreveria a escrever o Artigo 39º do regulamento de 1964. Se o fizesse, as mentes «politicamente correctas» encarregar-se-iam de o crucificar. No entanto, de vez em quando, em situações mais graves de indisciplina e também de falta de educação, continua a haver gente que está mesmo a «pedi-las», como se diz na gíria.

Recordo-me que no meu tempo no Colégio tive um oficial comandante de companhia, que volta e meia, recorria à pedagogia do «estaladão», fulminante, oportuno e certeiro. Que eu me recorde, não fez um inimigo com isso. Mas isso é outra história, para contar numa próxima oportunidade.

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Pátio dos Fâmulos. Janela da «choça» assinalada por seta.
A Prisão

Homenagem a António Sérgio

Homenagem a António Sérgio 178/1894 (2ª Parte)

Quando alguém como nós, Antigo Aluno do Colégio Militar, se propõe ler a obra de António Sérgio, especialmente a vasta e riquíssima obra dedicada à pedagogia, não consegue deixar de ver nela reflectida a sua própria vivência na escola que também foi a de Sérgio. Nessa obra estão presentes os mesmos valores éticos, morais e cívicos cultivados no Colégio Militar ao longo das gerações que passaram por aquela escola durante os seus 215 anos de existência.

Na Revista da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar ficou escrito que, para além da «família de António Sérgio, os locais onde decorreu a sua infância e os estabelecimentos de ensino em que fez os seus estudos influíram no seu temperamento e no seu carácter, marcando a sua formação científica e humanística…» 1. Também a sua obra, designadamente a “Educação Cívica”, que «preconizou o Governo democrático da escola pelos próprios estudantes» 2 […] talvez pudesse ter tido por base a sua própria experiencia como Aluno do Colégio Militar e o reconhecimento das características próprias da formação que ali recebeu.

Sendo certo que António Sérgio retirou o conceito de «self-government» de alguma tradição pedagógica anglo-saxónica, não é

impossível que também tenha constituído importante contributo para esta sua doutrina a própria experiência de Sérgio enquanto aluno do Colégio Militar. Com efeito, é de todos conhecido o facto de os alunos do último ano do Colégio serem graduados nas respectivas companhias ficando, a partir daí, responsáveis pelos alunos mais novos.

António Sérgio manteve sempre uma relação afectiva com o Colégio Militar, de tal modo que ao desligar-se da Marinha em 2015 considerou de imediato a possibilidade de vir a tornar-se professor do Colégio, tendo para isso realizado diversas diligências que infelizmente não se vieram a concretizar.

É também essa forte relação com o Colégio Militar que se nota na correspondência que manteve ao longo de vários meses com a sua noiva, com recurso a notas e a comentários em que utiliza claramente referências ao Colégio, quer no período em que procurava ser admitido como professor, quer noutras circunstâncias mais pessoais, como nos poderemos aperceber pelos exemplos que se apresentam abaixo.

Além das muitas referências de vária ordem à sua vida enquanto oficial da marinha, António Sérgio vai fazendo nessas cartas observações sobre o seu dia-a-dia, em que aparece amiúde a presença do Colégio Militar.

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Nessa correspondência, António Sérgio abria o coração para falar das suas angústias e desilusões, confessando que «passava então a primeira crise da minha vida.». Nessas alturas, a memória da adolescência trazia-lhe recordações que o levavam a lamentar que dos «amigos do Colégio Militar tinha-me separado inteiramente, porque nenhum viera para a marinha» 3

Estas recordações, tão caras a António Sérgio, levavam-no a lembrar numa carta que do «… Colégio e da Politécnica vinha acostumado a que os professores me enchessem de homenagens, impondo-me a admiração dos condiscípulos. Lembro-me ainda que depois do meu exame de matemática na Politécnica todos que tinham sido do Colégio me fizeram uma manifestação como uma glória para eles.»

Noutro passo confessa à noiva que «era no Colégio muito vivo, revolucionário, excêntrico; deixei lenda. Os oficiais repreendiam-me muito, e castigavam-me pouco por ser o estudante que fui. Era sublimemente idealista, ingénuo e puro, absolutamente alheio a todas as realidades da vida.»

Ainda noutra das cartas é revelada a sua ainda muito forte ligação á escola onde tinha sido educado – António Sérgio tinha por essa altura 26 anos – quando faz este estranho pedido a sua noiva: «Venha pois na sexta-feira, e lembre-se que vamos ficar depois muito tempo sem nos vermos. […] Adeus. Procure sempre as minhas cartas na pág. 178 dos livros (Meu antigo número do Colégio Militar)»

António Sérgio viveu a certa altura uma grande angústia, fruto da sua muito referida inaptidão como militar e a necessidade premente de auferir rendimentos suficientes que lhe permitissem casar. Uma das hipóteses que se lhe colocou foi concorrer a um lugar de professor do Colégio Militar, para o que terá feito diligências junto de funcionários do Colégio.

Este assunto é igualmente abordado numa carta à noiva, em que diz: «Parece-me que

me decido pela geografia e história. […] Tenho que falar a um homem que chega do Bussaco nesse dia, o qual só à noite me poderá dar umas informações de que careço com urgência. É um tal Senhor Fernandes, secretário do Colégio Militar.»

Noutra carta informa que irá falar com um conhecido sobre o concurso para professor: «a fim de ele me informar o que se passou no conselho escolar do Colégio Militar, que reunirá nesse dia.»

Ainda quanto ao concurso de professor, continua António Sérgio a dar notícias nas suas cartas. Desta vez trata-se da escolha das disciplinas a leccionar, em que Sérgio está indeciso, informando que «no Colégio o estudo da geografia, segundo ele me disse (tem lá um filho) está desorganizado completamente, sem decidirem entre a orientação moderna e a orientação antiga, que me impingiram em menino.»

Todas as possibilidades foram consideradas por António Sérgio para conseguir concretizar a colocação no Colégio Militar que lhe poderia aumentar os rendimentos com vista ao casamento. É isso mesmo que se entende neste texto de uma carta à sua jovem noiva: «Ainda bem que o teu Pai já gosta da ideia do Colégio [Militar]. Como tenho pouca esperança de ficar, receio que ele me passe a medir o valor pelo insucesso.» Não saíam do pensamento do autor as diligências para conseguir a sua colocação no Colégio: «Encontrei hoje pela primeira vez desde o Colégio um condiscípulo que me disse ser impossível que me preferissem outro, mas que eu fazia mal em me meter no professorado: achava que o meu destino era ser … “o Pierre Loti português”!!» 17

Como Antigo Aluno, António Sérgio continuava a ter uma relação próxima com o Colégio Militar, de tal forma que se decidiu a apresentar, numa carta dirigida à revista “O Colégio Militar”, uma proposta para que fosse criada uma associação de Antigos Alunos, aproveitando-se a «prática de camaradagem entre os alunos do Colégio Militar», reconhecendo que o facto de terem sido

Homenagem a António Sérgio

seus alunos «estabelece sempre entre dois homens (por muito grandes que possam ser as diferenças de idade e situação social) um laço de simpatia e de solidariedade, uma certa corrente de entendimento mútuo.». Acrescentava Sérgio que «essa solidariedade, creio eu, é uma reserva de força moral que tem sido sempre desaproveitada, e que poderia, com uma organização conveniente, prestar serviços grandes ao país. Organizassem-se os antigos alunos numa activa associação, com objectivos cívicos bem definidos, bem concretos, e algo belo se poderiam fazer.».

E a Associação criou-se, sempre com o «interesse e a simpatia de Sérgio», como mais tarde os ex-alunos seus contemporâneos tiveram oportunidade de reconhecer.

ANTÓNIO SÉRGIO PEDAGOGO

«A reflexão sobre as questões educacionais e pedagógicas tem desde cedo um lugar central na vida e na obra de António Sérgio»

António Sérgio não chegou a exercer quaisquer actividades docentes de forma permanente e oficial, a não ser por curtos períodos, embora a partir da sua demissão da Marinha de Guerra, tenha procurado concorrer a um lugar de professor de Geografia no Colégio Militar, o que acabou por não se concretizar porque, entretanto, o respectivo concurso foi anulado.

Mesmo não tendo experiência directa como professor, António Sérgio nunca deixou de se envolver em discussões teóricas sobre questões educacionais, o que o levou a frequentar na Universidade de Genebra na Suíça, o Institut Jean-Jacques Rousseau, cujas lições com o psicólogo e pedagogo Claparède, de quem ficou amigo, o levaram a tornar-se um intransigente defensor das correntes pedagógicas da escola activa.

Como defendia António Sérgio, apoiando-se na importância que os problemas educacionais tinham para si, seria através da educação que se deveria operar a transformação da sociedade portuguesa numa

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Homenagem a António Sérgio

verdadeira democracia, por oposição ao regime sócio-económico que vinha da primeira república.

Segundo Sérgio, uma ideia fundamental aplicada à educação cívica seria «o de habituar as crianças à acção municipal, à própria vida da cidade, à exerção dos seus futuros direitos de soberania, de self-government». Para isso era necessário que a escola «formasse um verdadeiro município, sob a assistência, o conselho, a colaboração discreta dos professores. Desta maneira a participação dos estudantes no governo da escola será bem maior…»

Este método de educação, a que Sérgio dedicou grande parte da sua tarefa como pedagogo, parte da «ideia de que se não pode adestrar uma criança para o dever social sem a fazer quinhoeira de uma vida de sociedade». Deve por isso ser a escola a fornecer-lhe «condições para genuínos actos sociais, aos que depois, adulto, encontrará. É necessário «que o aluno se habitue a cooperar pelo bem de uma comunidade e que a escola reproduza, o mais possível, a estrutura da vida social adulta.» Tal como foi sendo esclarecido por Sérgio, tendo o jovem de obedecer a uma «governação de que […] não participa, amolda um futuro cidadão que aguentará apati-

camente todas as bandalheiras, todos os abusos, todas as traficâncias dos políticos de profissão»

O objectivo do sistema defendido por António Sérgio seria portanto o de levar a «rapaziada (sic) às responsabilidades do civismo, à faculdade de legislar, à obediência das leis, votadas, a obrigar os outros a cumpri-las, a tomar parceria nos problemas judiciários, e à consciência dos seus deveres para com os outros cidadãos»

Desta forma, diz Sérgio, irá o «”município-escola” instalar os estudantes nas reais condições da existência social, para os fazer à benevolência, à generosidade, à honradez, à clara consciência dos deveres do cidadão; ao mesmo passo que se propõe desenvolver o altruísmo, almeja criar reformadores (personalidades que saiam da escola para a vida animadas a combater pela acção todos os maus costumes sociais e todas as formas de corrupção política)».

Irá servir também este sistema para «convencer os jovens de que a quem ataca um vício ou um delito o não devemos classificar como um “espião” ou um “denunciante”, mas como um membro leal da sociedade, executor do seu dever para com ela e corajoso defensor do seu bem-estar.»

Ao contrário da escola passiva, com o self-government os alunos passam a ser

«responsáveis pelo exemplo que dão aos camaradas – influxo mais fecundo que o do mestre, o desse exemplo, por serem as crianças mais influenciadas pelos condiscípulos que pelo mestre.»

Após a instalação do método do município-escola, «segue-se a vida, com as suas necessidades, suas adaptações, suas contingências, e o estabelecimento das regras não escritas mas vividas de uma comunidade que quanto mais reproduzir a realidade adulta mais será educativa.»

Num texto recente sobre o futuro do Colégio Militar, um ex-aluno exprimiu deste modo o que António Sérgio também entendia dever ser a escola: «Aquilo que eu, à falta de outro nome mais adequado, chamarei de “experiência precoce de cidadania”, decorre do facto de o Batalhão ser comandado pelos alunos mais velhos, o que induz o sentimento de “pertença ao grupo” e a interiorização das obrigações e dos direitos daí decorrentes.»

Finalmente, o Guia do Aluno estabelece com toda a clareza que o Aluno do Colégio Militar está integrado numa «cultura de cidadania capaz de fomentar os valores da dignidade da pessoa humana, da democracia, do exercício responsável da liberdade individual e da identidade nacional»

Tendo procedido a esta leitura do que foi o pensamento do pedagogo António Sérgio, podemos então agora enquadrar os valores e princípios do Colégio Militar, tal como estão expressos no seu Guia do Aluno, à luz do sistema educacional defendido pelo nosso autor:

VALORES E PRINCÍPIOS DO COLÉGIO MILITAR

«São vetores principais da educação no Colégio Militar, o culto e o desenvolvimento nos alunos do respeito pelos outros e os atributos da solidariedade, autoestima, autonomia, coragem, lealdade e responsabilidade que, aliados a uma boa preparação intelectual, física e moral, permitem

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afirmar-se como uma verdadeira escola de formação integral, com destaque para a plena consciência dos seus direitos e deveres, respeitadores da pessoa humana e do meio ambiente, defensores do património cultural e histórico da sua Pátria, intervenientes e participativos nas responsabilidades sociais que a cada cidadão compete.»

De igual modo, a partilha de responsabilidades no Colégio Militar entre o corpo docente e os alunos mais velhos, constitui para a comunidade escolar a concretização do sistema pedagógico proposto por Sérgio, em que os Graduados servem de exemplo aos seus camaradas mais novos.

GRADUADOS

«Desde a sua fundação, o Colégio Militar proporciona aos Alunos mais velhos uma experiência ímpar na sua formação, ao promover o seu desempenho como auxiliares e corresponsáveis pelo enquadramento e formação dos Alunos mais novos. Aos Alunos graduados são atribuídas funções e as inerentes responsabilidades, através da cadeia de comando. É um caso isolado no panorama do ensino em Portugal, que se tem afirmado ao longo de sucessivas gerações como uma componente fundamental e preciosa para a preparação de futuros cidadãos.» No final do curso, os alunos mais velhos pas-

Homenagem a António Sérgio

sam a exercer funções de graduados, o que faz deles «corresponsáveis no processo educativo dos alunos mais novos». Este irá tornar-se o seu grande desafio ao ter a «responsabilidade de enquadrar e de participar, de forma ativa, em todo o processo de integração e de formação dos alunos mais novos e, ao mesmo tempo, obter o sucesso escolar necessário à progressão académica num futuro próximo». É nas funções que os graduados passam a desempenhar, em paralelo com as suas actividades discentes, que «reside muita da especificidade e identidade do Colégio Militar, apresentando-se como um guia e um exemplo a seguir».

CÓDIGO DE HONRA

O Código de Honra do Aluno do Colégio Militar, constituído por dez valores ou princípios que devem nortear o comportamento dos alunos, permite destacar os três que melhor se aproximam do pensamento sergiano, como sejam:

Ser verdadeiro e leal, assumindo sempre a responsabilidade dos seus atos; Praticar a camaradagem sem denúncia nem cumplicidade; Ser modesto no êxito, digno na adversidade e confiante face às dificuldades.

DIVISA

Está concretizado na camaradagem, «materializada na divisa do Colégio Militar “Um por todos, todos por um” […] aceitar que os objetivos individuais devem ser secundarizados em função do interesse coletivo e ajudar coletivamente nas dificuldades de cada um sem, contudo, perder o sentido da identidade pessoal.»

Por tudo isto, é «neste estimulante e exigente ambiente que se aprende a estudar e a liderar, a respeitar e a ser respeitado, a assumir responsabilidades e a desenvolver o autocontrolo, qualidades estas que permitem, nas diferentes situações de vida, encarar os desafios com redobrado otimismo e confiança no futuro.».

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Homenagem a António Sérgio

Portugal comemora o cinquentenário da morte de António Sérgio através de Exposições, Palestras ou simples notícias.

É curioso notar que apesar de uma abordagem anunciada como global (que aparentemente se chama hoje de “Poligonal”), foi dado enfâse à vertente Política, não fosse Sérgio um politólogo e não fosse a política, aliás com demasiada frequência, o motor destas iniciativas.

A Revista da Associação, o Zacatraz, deu o devido destaque a essas Comemorações.

O que há a acrescentar é a emoção que senti quando, por dever de um dos meus ofícios, tive que ir à Sociedade Portuguesa de Autores e deparei com dois retratos do Escritor com a farda do Colégio.

Apeteceu-me chamar o Porteiro e dizer-lhe que eu tinha andado na mesma Escola e usado a mesma farda.

Para além desta natural emoção de orgulho, falta tirar a conclusão que o Colégio tem sabido cumprir a missão de preparar para a Vida inúmeros Cidadãos que o País depois homenageia das mais variadas formas.

E que é importante assegurar as condições necessárias para que continue a cumprir essa missão.

É que há quem ache que não.

Luís Miguel da Costa Alcide de Oliveira (163/1952)

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António Sérgio quando Aluno do Colégio Militar.

Homenagem a Myre Dores (47/1942)

Homenagem ao Colégio Militar e a professores e oficiais,

Do curso de 1948-1955. Homenagem a Myre Dores (47/1942).

Com este artigo na revista Zacatraz terminamos esta homenagem que fizemos coincidir com o 70.º aniversário da entrada do curso, no Colégio, que comemorámos em 2018. Tratou-se de um trabalho de equipa que se iniciou numa reunião, em Oeiras, à beira-mar, no verão de 2017, em que participaram, Abílio Pais Ramos (323/1948), António Hélder Sena e Silva (149/1948), António Pedro Bacelar Carrelhas (159/1947), Luís Mendes de Almeida (285/1948), Manuel Barão da Cunha (150/1948), Pedro do Canto Lagido (330/1947); e em que logo a seguir aderiram à ideia e deram o seu contributo, José Alberto Alves de Paula (62/1948), José Maria Corrêa de Sampaio (367/1949), Jorge Niblett do Passo (227/1947), Guilherme Câncio Martins (126/1948).

Para terminar esta homenagem nas páginas da Zacatraz queremos distinguir o nosso Comandante deBatalhão, no ano letivo 1948-1949, pelas relações de amizade que com ele estabelecemos, quer pelas suas qualidades pessoais, quer por representar para nós o modelo do sistema educativo do Colégio Militar, que era o José Maria Myre Dores (47/1942).

Também referiremos, neste artigo, alguns Antigos Alunos, do nosso curso,

ou a nós ligados, que já partiram desta vida e que tiveram ação relevante na realização dos almoços de confraternização de Antigos Alunos na Feitoria.

1 - TESTEMUNHO DO LUÍS MENDES DE ALMEIDA:

Retenho do Zé Maria Myre Dores uma agradável imagem de simplicidade e enorme simpatia. Na convivência muito próxima com o nosso curso, logo no ano da nossa entrada, instalado na 1ª Companhia, criou uma especial ligação connosco. Dizia que éramos o seu segundo curso. Convidava-me para as reuniões do seu, a que procurámos, muito agradados, de resto, retribuir, convidando-o para as do nosso. Sendo agnóstico, o que não escondia, tinha uma particular veneração pelo Papa Francisco. Era assunto «obrigatório» nos contactos pontuais, que procurámos manter. Ainda, a este propósito, recordo um seu desabafo, revelador da sua sensibilidade e delicadeza. Quando aceitou o convite para a nossa última reunião, no Colégio, em que infelizmente já não participou, pediu desculpa por não nos acompanhar na missa, na capela do Colégio. Explicou porquê. Em reuniões anteriores, não crendo, fez questão de nos acompanhar, juntando -

-se às nossas intensões. Mas desta vez, não se sentia capaz de subir as escadas para o piso da capela…

Outra faceta curiosa era o seu posicionamento na área política. Desvalorizava a habitual divisão esquerda-direita. Para ele o que verdadeiramente separava era os que se preocupavam, ou não, com os outros.

Somos, por vezes, confrontados com episódios, que, parecendo coincidências, não nos deixam de intrigar. Refiro isto a propósito do último convite, que lhe fiz. Marcámos, em 2015, uma reunião de regresso ao Colégio e, naturalmente convidámos o Zé Maria. Duas semanas antes da dita reunião, inexplicavelmente senti-me «forçado» a confirmar a sua presença. Telefonei e respondeu-me a habitual alegria, quase ofendido, por querer confirmar um convite já aceite. No dia seguinte, fui «esmagado» com a notícia que o José Maria Myre Dores, acometido de súbita doença, «partira» … Fica-nos a consolação que Ele e seu exemplo continuarão presentes.

2 - TESTEMUNHOS DE ANTÓNIO HÉLDER SENA E SILVA, MANUEL BARÃO DA CUNHA E PEDRO LAGIDO

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Homenagem a Myre Dores

(47/1942)

O António Helder Sena e Silva que nos últimos anos era o «logístico» dos almoços na Feitoria, várias vezes, também, «deu boleia» ao Zé Myre Dores e muitas vezes conversou com ele e testemunha a gentileza, simpatia e simplicidade dele, o seu amor ao Colégio, ao convívio com os Antigos Alunos e a retidão sobre os assuntos do País. O Pedro Lagido que muitas vezes acompanhava o «logístico», nas idas para a Feitoria, e também se encontrava com o Zé Maria com quem falava de muitos assuntos, como a sua grande experiência profissional em Angola, confirmando também Luís Mendes de Almeida, o interesse do Zé Maria pela ação renovadora do Papa Francisco e sobre este assunto também conversaram.

Manuel Barão da Cunha. que era membro da equipe redatorial da revista do Colégio, desse tempo, como já nos contou em artigo anterior da Zacatraz, retirou do seu arquivo pessoal o discurso

que o Zé Maria, como Comandante de Batalhão, em 1948, dirigiu aos «ratas» e que aqui transcrevemos:

«Ratas de 1948/49! São unicamente para vós as palavras que vou proferir. Palavras simples e sinceras, elas são o 1.º contacto entre “velhos” e novos alunos; espero que lhes darei a atenção que o seu significado vos deve merecer. Depois de deverdes experimentado terrível ansiedade de terdes passado as difíceis provas de inspeção médica e do exame mental, fostes considerados aptos a serdes alunos do Colégio Militar; e, por isso, estais hoje aqui, nestes velhos claustros, tomando parte pela 1.ª vez na formatura do Batalhão Colegial. Amanhã começareis uma vida diferente. Muito podereis brincar; muitas partidas podereis fazer uns aos outros e muito tempo despendereis a preencher os vossos calistos. Mas é preciso saber-se dividir o tempo; e não é só

para brincar que se é “Menino da Luz”. O Colégio Militar tem 145 anos. É já um “velhinho”, como vedes… Mas é um “velhinho” desempenado e altivo, ano a ano remoçado, que traçou um caminho, do qual nunca se desviou: o caminho de Bem Servir. E, por isso, ele pode rever-se num passado limpo e brilhante. Tem a sua história que, em breve, ireis aprender de cor; ostenta bem alto uma bandeira galardoada com as mais nobres condecorações; os seus filhos constituem o seu máximo orgulho e a sua única razão de existir; eles souberam dignificá-lo e sempre aqui voltam; muitos podeis ver hoje nos claustros para lhe render o preito da sua homenagem e da sua gratidão. Bem depressa ireis saber, também, os nomes dos seus filhos que mais se distinguiram e aos quais alguns de vós ireis pertencer, talvez, um dia.

Para que possais vingar facilmente, aqui encontrareis as melhores ajudas:

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Myre Dores (47/1942) (5º a partir da esquerda) com os seus ratas.

da parte da Exma Direção, que tem a preocupação constante de velar por todos nós e de nos guiar no bom caminho; dos vossos professores e oficiais, sempre bem-dispostos a ministrar-vos ensinamentos que vos tornarão, mais tarde, cidadãos úteis; e de todos nós, alunos mais velhos, que estamos prontos a enlaçar-vos na nossa camaradagem.

E agora, num abraço tradicional que vou dar a um de vós, quero que sintais bem os desejos que nos vão na alma de sermos para vós como irmãos, sempre prontos a ajudar-vos, a aconselhar-vos e a dar-vos o melhor exemplo: aquele que sempre nos habituámos a receber dos camaradas mais velhos.

Em nome de todos os alunos deste Colégio, envio-vos a nossa melhor saudação: sede bem-vindos ao Colégio Militar.»

O Manuel Barão da Cunha, durante vários anos, oferecia uma «sardinhada» , a ex-alunos e a outros amigos, na sua casa da Costa da Caparica, muita apreciadas, tendo convidado o Zé Maria, que não gostava de sardinhas e por isso comia carapaus, muitas conversas ocorreram, em que o Zé Maria demonstrava, naturalmente, o seu carácter e a sua sabedoria. Manuel Barão da Cunha sentiu-se muito tocado por uma frase do Zé Maria: «Não divido as pessoas como sendo de “direita” ou de “esquerda”, mas, sim, se estão atentas aos outros, ou não…»…

E o José Maria Myre Dores era uma pessoa atenta aos outros, como, felizmente, outros camaradas colegiais.

3- EM MEMÓRIA DOS QUE JÁ NOS DEIXARAM E MUITO CONTRIBUÍRAM PARA O CONVÍVIO DE ANTIGOS ALUNOS NA FEITORIA:

Homenagem a Myre Dores (47/1942)

Estes convívios iniciaram-se nos anos 1990 pela iniciativa do Luís Dias Antunes (221/1948), já falecido, mas depois ocorreu um interregno e recomeçaram em 2005, os Antigos Alunos que para tal contribuíram e já nos deixaram, são os seguintes: Carlos Mello e Mota (48/1945), José Francisco Pereira da Rosa (280/1949), Eduardo N. Ro -

drigues (278/1947), Tito Lívio Esteves Xavier (335/1947). Mais recentemente também nos deixou o António Francisco Marquilhas (67/1944). De todos expressamos a nossa saudade e homenagem sinceras que se adicionam à que já está em lápides na Feitoria.

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Descerramento dos azulejos com o nome de António Martins Marquilhas (67/1944).

Antigos Alunos

nas Artes e nas Letras

Antigos Alunos nas Artes e nas Letras

PIRES, Nuno Lemos, Cartas de Cabul.

O Afeganistão vivido por um Soldado Português, Parede, Tribuna da História, 2011

Cartas de Cabul são isso mesmo. Trinta e seis cartas enviadas entre Outubro de 2009 e Abril de 2010, para família e amigos, pelo Nuno Correia Barrento de Lemos Pires (345/1975), na altura tenente-coronel de Infantaria/Operações Especiais, Chefe de Estado-Maior da OMLT 1 portuguesa, em funções de apoio e assessoria à 111 Kabul Capital Division (KCD) afegã. 2 Vindas de um dos países mais intranquilos do mundo, as Cartas valem como «lições aprendidas» que iluminam um quadro complexo. Como o autor faz questão de explicar, neste tipo de cooperação, «o primeiro trabalho é entender, ouvir, relativizar e por fim adoptar a melhor solução» . E para entender, é preciso «ver com profundidade, ouvir com atenção e respeitar o outro».

O pano de fundo é a capital de um país onde o exercício dos direitos mais ele -

mentares, como votar ou ir à escola, pode exigir um acto de enorme coragem, como explicam, de uma forma muito impressiva, as Cartas: “(…) Medo da doença, medo do atendimento médico, medo de sair à rua, medo de receber as «cartas nocturnas» night letters dos talibãs. Medo de ser mais uma vítima de uma explosão. (…) E coragem. Coragem para sair à rua, coragem para pedinchar trabalho, coragem para fazer tarefas abaixo da dignidade, como trabalhar um dia inteiro por um dólar (…).”

Para garantirem aos habitantes da capital que as suas vidas podem mudar para melhor, de que condições dispunham, em Outubro de 2009, os soldados da KCD? O autor esclarece: “(…) nas casernas não há um cobertor para cada um, por vezes dormem três soldados na mesma cama para se protege -

rem do frio. Não há botas para todos ou meias… Paro aqui (…).”

De uma forma esquemática, pode dizer-se que a tarefa da OMLT portuguesa tinha duas vertentes principais: a acção de mentoria junto do comando da KCD e o apoio humanitário à população. As inúmeras actividades desenvolvidas nestes dois campos mereceram do autor descrições onde são visíveis o empenhamento no planeamento e na acção e, no final, o gratificante sentimento do dever cumprido.

A Carta n.º 9 leva-nos aos bastidores da primeira acção de apoio humanitário. Em Novembro de 2009, foi decidido apoiar cinco acampamentos de refugiados do Paquistão e do Irão. A International Security Assistance Force ( ISAF ) forneceu cerca de 50 conjuntos de mo -

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277/1950
Nuno
António Bravo Mira Vaz

Antigos Alunos nas Artes e nas Letras

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chilas, lápis e lanternas – o suficiente para apoiar uma pequena escola. Mas os militares portugueses, conscientes de que o mais importante da missão era ajudar a matar a fome e o frio, estavam decididos a fazer muito mais. Dirigiram então um pedido aos americanos que também apoiavam a Divisão. A resposta não só foi muito positiva como surpreendente, para gente habituada às burocracias lusitanas: podiam apoiar até 300 pessoas com um cabaz que incluía comida, cobertores e tendas; além disso, se fossem apresentados projectos estruturados, poderiam construir escolas, abrir poços, colocar pequenas pontes pedestres, ec.. No dia 24 de Novembro, fruto de contribuições diversas, 310 famílias receberam de mãos exclusivamente afegãs – era importante que as populações associassem o auxílio aos militares do país – o suficiente para as necessidade de um mês. Os militares portugueses tinham consciência de que esta ajuda era uma gota de água num oceano de miséria. Mas sabiam também que havia motivos para se sentirem orgulhosos.

Na Carta n.º 19 descreve-se a reacção da KCD a um «ataque coordenado complexo» , 3 perpetrado por quinze a vinte elementos contra o Palácio Presidencial – onde decorria a cerimónia de tomada de posse de novos ministros –, a zona ministerial da capital e um centro comercial. Para grande alegria dos «mentores» portugueses, o desempenho dos militares afegãos foi muito positivo. “(…) A reacção a este ataque ficou resolvida em menos de três horas, todos os insurgentes foram mortos ou capturados e as baixas entre o pessoal da Divisão foram mínimas (três ferido sem gravidade).

As coisas poderiam ter corrido melhor, mas, o que podemos afirmar com algum orgulho, é que se este ataque tivesse ocorrido há três meses a resposta não teria sido tão eficaz (...)”.

Como nos diz António Eduardo Queiróz Martins Barrento (40/1948) no Prefácio, há nas Cartas “(…) ensinamentos importantes que podem ser lidos e merecem a nossa reflexão: a globalização e intensidade da violência; o peso da população na resolução destes conflitos – quem não a tiver do seu lado não ganha a guerra; a importância dos outros vectores estratégicos para além da força; (…) a aptidão dos portugueses para desenvolver acções de elevado valor nestes conflitos (…)”.

Nuno Lemos Pires oferece-nos neste livro, com conhecimento de causa e com reconhecida capacidade estilistica, uma reflexão adulta e comprometida sobre a universalidade dos problemas num cenário de devastação, onde apesar de tudo é possível sentir-se orgulhoso pelo dever cumprido.

Há pois bons motivos para uma leitura atenta das Cartas de Cabul , tanto mais que elas contam com o benefício suplementar dos interessantíssimos Comentários de Armando Marques Guedes, professor de Ciência Política, Direito e Política Internacional na Universidade Nova de Lisboa e responsável pelo ensino de Geopolítica no Instituto Universitário Militar. Este antigo diplomata alia uma visão cosmopolita do mundo a uma erudição notável em matérias da sua especialidade.

Nuno Correia Barrento de Lemos Pires, Coronel Tirocinado de Infantaria/Operações Especiais, Doutorado em História, Defesa e Relações Internacionais pelo ISCTE-IUL, é Professor na Academia Militar e investigador do CEI do ISCTE-IUL.

Exerceu funções de comando, estado-maior e ensino em Unidades e Estabelecimentos das Forças Armadas. Esteve mais de 5 anos em serviço na NATO e participou em diversas missões internacionais, entre as quais se destacam: Moçambique, Angola, Paquistão e Afeganistão.

2 A Divisão tem por missão a reacção a incidentes, limpeza de itinerários, patrulhamento constante e prontidão permanente de uma Quick Reaction Force de escalão Companhia.

3 Caracterizado pela sequência de vários incidentes violentos devidamente coordenados, cujos efeitos se tornam exponenciais.

Tem 9 livros publicados e é autor de mais de 100 capítulos ou artigos em vários livros e publicações, nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola.

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Operational Mentor and Liaison Team.

Manuel de Azevedo Fortes. Engenheiro-Mor do Reino

ingresso na Universidade de Alcalá de Henares para cursar Filosofia. Matriculou-se, em seguida, no Colégio de Plessis, na Sorbonne, onde aperfeiçoou a sua formação matemática. Foi contratado como professor de Filosofia na Universidade de Sienna por três anos, após o que, regressou a Portugal, em 1695, onde D. Pedro II lhe deu a patente de Capitão e o nomeou professor da “Aula de Fortificação e Arquitectura Militar”, criada em 1647, durante a guerra da restauração, por Luiz Serrão Pimentel (1613 a 1679) notável cosmógrafo-mor do reyno, nomeado engenheiro-mor do reyno em 1671.

MANUEL DE AZEVEDO FORTES

1. O engenheiro-mor do reyno

1.1 Manuel de Azevedo Fortes nasceu em Lisboa, em 1660, e faleceu, também em Lisboa, em 1749. Iniciou a sua formação, muito jovem, no Colégio Imperial em Madrid, onde preparou o

Em 1719, Manuel de Azevedo Fortes foi nomeado, por D. João V, engenheiro-mor do reyno. Trabalhou com Manuel da Maia no projecto do aqueduto das Águas Livres, em Lisboa (1730-32). Também coordenou o projecto da remodelação de várias fortificações, nomeadamente, de Campo Maior, Estremoz, Elvas, Olivença e Zebreira.

No final do séc. XVII e princípio do séc. XVIII, foram fundadas várias escolas de

fortificação e arquitectura, em Portugal, nomeadamente, a “Academia de Fortificação” de Viana da Foz do Lima (1701), e no Brasil, nomeadamente a “Aula de Fortificação e Arquitectura” do Rio de Janeiro (1698), dirigidas por engenheiros militares escolhidos pelo engenheiro-mor. Foi com base nos dois grandes tratados portugueses “O Méthodo Lusitânico de Desenhar as Fortificações das Praças Regulares e Irregulares” de Luiz Serrão Pimentel (1680) e “O Engenheiro Português” de Azevedo Fortes (1720), fundados na escola de poliorcética francesa, de Sébastien de Vauban (1633-1707), que se introduziram as novas técnicas de fortificação, em muitas cidades portuguesas, em Portugal e no Brasil.

1.2 Em 1720, Manuel de Azevedo Fortes tornou-se membro fundador da Academia Real da História Portuguesa e escreveu a “Representação a Sua Majestade sobre a forma e direcção que devem ter os engenheiros, para melhor servirem n’este reino e suas conquistas” . Em 1722, publicou o “Tratado do modo mais fácil e o mais

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Manuel de Azevedo Fortes Manuel de Azevedo Fortes

Manuel de Azevedo Fortes

exacto de fazer as cartas geográficas, assim da terra como do mar, e tirar as plantas das praças, cidades e edifícios, com instrumentos e sem instrumentos” . Em 1728, publicou “O Engenheiro português. Tomo I, que compreende a geometria prática sobre o papel, e sobre o terreno: o uso dos instrumentos: o modo de desenhar e dar aguadas nas plantas militares: e no apêndice a trigonometria rectilínea” . Em 1729, publicou “O Engenheiro português. Tomo II, que compreende a fortificação regular e irregular, o ataque e defesa das praças: e no apêndice o uso das armas de guerra”. Em 1739, indo a Academia ao paço, em 22 de Outubro, foi encarregado da “Oração Académica, pronunciada na presença de Suas Majestades”. Finalmente, em 1744, publicou a “ Lógica racional, geométrica e analítica: obra utilíssima e absolutamente necessária para quem entrar em qualquer ciência e ainda para todos os homens, que em particular quiserem fazer uso do seu entendimento”. Sendo que os tratados sobre as Cartas Geográficas e sobre o Engenheiro Português são obras estruturantes no ensino da engenharia no séc. XVIII em Portugal, cuja leitura era obrigatória, eles são baseados em obras de autores franceses, de que Azevedo Fortes tomou conhecimento em França. A sua obra mais profunda e original, que o configura como um dos nossos mais destacados iluministas, é, no entanto, a “ Lógica racional, geométrica e analítica” , onde são abordadas, em três partes distintas, a Lógica Racional, a Geometria Euclidiana e a Álgebra. O primeiro parágrafo do “antelóquio” da “Lógica Racional” mostra claramente que o seu autor é um engenheiro:

“Há muitos anos que tenho reparado no pouco fruto que os estudantes tiram do ano que empregam no estudo da Lógica que ordinariamente se ensina nas

escolas; e falando eu com muitas pessoas doutas e de claro juízo, todas convieram que semelhante estudo mais servia para embaraçar e confundir as nossas ideias do que para aperfeiçoar as operações do nosso entendimento, que é o fim principal da lógica.”

No Capítulo III da “Lógica Racional”, intitulado “Da Oposição das Proposições”, Azevedo Fortes antecipa as futuras controvérsias sobre a natureza das probabilidades, entre a escola frequencista e a escola lógica. Com efeito, afirma, no artigo 28: “Todas as proposições se dividem, segundo a matéria de que se trata, em verdadeiras, em falsas e em prováveis ...”, tal como viria a defender John Maynard Keynes, no seu polémico “A Treatise on Probability”, publicado em 1920, em Cambridge. Com efeito, no primeiro capítulo do tratado (“The meaning of probability”), Keynes afirma “All propositions are true or false, but the knowledge we have of them depends on our circunstances; and while is often convenient to speak of propositions as certain or probable …”. Keynes, mais conhecido pelas suas teorias económicas, foi um brilhante matemático, fundador da escola “lógica” das probabilidades

2. Azevedo Fortes e a Arithmetica dizimal

2.1 Embora, no princípio do séc. XIX, já se usasse, em Portugal, com naturalidade, o actual sistema de notação decimal, apenas três quartos de século antes, o engenheiro-mor do reino Manuel de Azevedo Fortes, no seu manual “O Engenheiro Portuguez”, defendia a introdução de uma notação decimal rudimentar. No Livro I, Capítulo III – “Dos Caracteres, e da enumeração dos numeros Geometricos” – pode ler-se: “Deve-se observar que os numeros inteiros não são notados de nenhum signal; porém os numeros que significão as suas partes primeiras, ou primos levam uma risquinha por cima, os que significão as partes segundas, ou segundos levão duas risquinhas, as terceiras divizões tres risquinhas, &c. Os primos são partes decimas, os segundos centessimas, os terceiros milessimas, &c.” A título de exemplo, Segundo Azevedo Fortes, o número 1,25 deveria ser representado por 1 2’ 5’’ etc.

A notação decimal, já usada pelos muçulmanos, terá sido divulgada, na Europa, pelo engenheiro flamengo Simon Stevin no livro “De Thiende” (A Dízima), publicado em 1585. Stevin indicava o número de casas decimais no interior de um círculo, por exemplo, 1,25 era representado por 125 (2). Durante os séculos XVII e XVIII, foram usadas as mais variadas formas de representação da dízima, como uma separatrix vertical 1|25, uma notação individual do tipo 1 2(1) 5(2) etc. A introdução de uma vírgula como separatrix é devida a John Napier no seu livro “Rabdologiae Numerationes per Virgulas”, publicado em 1617. Ao longo dos anos, os ingleses foram-se fixando no uso de um ponto como separatrix, enquanto os continentais (alemães, espanhóis e franceses) adoptaram a vírgula.

2.2 Manuel de Azevedo Fortes aparenta possuir uma formação robusta, embora conservadora, neste domínio: os seus textos, do princípio do séc. XVIII, não deverão estar muito distantes dos conceitos matemáticos correntes na época. Azevedo Fortes foi um dos promotores da “Aritmética Decimal” em

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Simon Stevin (1548 a 1620)

Manuel de Azevedo Fortes

Portugal, como se depreende dos excertos do “Engenheiro Portuguez” seguidamente apresentados. Note-se que, nesta altura, a notação decimal já não era novidade na Europa: tanto Isaac Newton nos “Philosophiae Naturalis Principia Mathematica” (1687) como Christian Huyghens no “Discours de la Cause de la Pesanteur” (1690) usaram a notação decimal, com a vírgula como separatrix, a par da notação fraccionária convencional. No Livro I, dedicado à “Longemetria”, Azevedo Fortes, após explicar que o palmo tem oito polegadas, o pé tem doze polegadas, a vara cinco palmos etc., afirma: “desta divizão rezulta ordinariamente grande trabalho aos medidores a respeito dos quebrados (fracções), quando se multiplicão, ou dividem humas medidas por outras, e ficão as ditas operações sugeitas a varios erros, e para os evitar determino seguir nesta parte o methodo de Monsieur Boulanger, Lente de Mathematica de ElRey de França”. O “methodo de Monsieur Boulanger” não é mais que a representação decimal das unidades de comprimento: “mas nós para maior facilidade, e brevidade dividiremos essas medidas primeiramente em dez partes iguaes, que chamão primos ou primeiras devizões, e cada primo em dez partes, que chamão segundos [...]. Mas a divizão até segundos he suficiente para medir com bastante precizão toda a sorte de grandezas, sem que os restos possão causar prejuizo a ninguem [...]”.

Mais adiante, Azevedo Fortes continua: “Este modo de contar, e de dividir as especies de differentes medidas, de dez em dez se chama dizima ou Arithmetica dizimal. Estevino (Stevin) dizem ter sido o inventor; mas deve-se notar, que este modo de contar só he util na Geometria Practica, por quanto para o comercio he mais util de dividir o pé em doze polegadas, do que em dez, porque o numero dez tem só partes aliquotas (divisores) dous, e cinco, e assim se não póde expressar mais, que o meio, e o quinto em lugar, que o numero doze tem mais partes aliquotas, a saber, dous, tres, quatro, seis: e assim se pode expressar em

quebrados, o meio, o terço, o quarto, e o sexto, ou sexta parte do pé”.

3. O exercício de engenheiro

3.1 Na transição do séc. XV para o séc. XVI, o encarregado do projecto e construção das grandes obras era designado por mestre-de-obras e era obrigado a combinar conhecimentos de arquitectura, engenharia, escultura, pintura etc. O mestre-de-obras era responsável por todas as obras públicas, desde a construção de pontes e estruturas portuárias, à abertura de estradas, à construção de sistemas de fortificação e aos levantamentos topográficos necessários. Em Portugal, o título de engenheiro é introduzido no final do séc. XVI, no reinado de Filipe I. Grandes mestres de obras do início do séc. XVI são Diogo de Arruda (14??-1531), Francisco de Arruda (1???-1547) e Miguel de Arruda (1???-1563). Diogo de Arruda foi responsável pelo torreão Ocidental do Terreiro do Paço, pelas obras no Convento de Cristo de 1510 a 1513 (sala do capítulo, charola templária etc.). Em 1513, acompanhado pelo irmão Francisco de Arruda (responsável pela torre de Belém), trabalhou em fortificações do Norte de África (Azamor, Mazagão e Safim). Em 1521, foi nomeado mestre de obras da Comarca de Entre Tejo e Odiana (igreja matriz de Viana do Alentejo). Em 1525, foi nomeado mestre de obras dos Paços Reais (palácio real de Évora). Miguel de Arruda (filho de Francisco de Arruda) foi nomeado mestre das obras dos muros e fortificações do Reino, em 1548.

3.2 A formalização do ensino da engenharia aconteceu no reinado de Filipe I, em 1594, com a criação da “Aula do Risco do Paço da Ribeira”. Leonardo Torriani, natural de Cremona, que foi um dos primeiros responsáveis pela Aula, foi nomeado engenheiro-mor do reyno, em 1598. Leonardo, que finalizou a construção do forte de São Lourenço do Bugio e do forte de São Julião da Barra, ambos iniciados por Giovanni Vicenzo Casale, e do forte de São Filipe, em Setúbal, iniciado por FilippoTerzi, terá sido o primeiro engenheiro-mor do reyno.

Com a Restauração, em 1647, foi criada a “Aula de Fortificação e Arquitectura Militar”, cuja direcção foi entregue ao então cosmógrafo-mor Luiz Serrão Pimentel (1613-1679), que veio a ser nomeado en-

Oficial com exercício de engenheiro (1762) genheiro-mor do reyno em 1671. O curso da “Aula de Fortificação”, sediada na Ribeira das Naus, podia durar até cinco anos. O aluno, oficial do exército, tinha de ser aprovado em provas presididas pelo engenheiro-mor para poder usar o título de engenheiro, sendo a respectiva patente (capitão, por exemplo) seguida da distinção “com exercício de engenheiro”. Em 1707, ainda antes de Azevedo Fortes se tornar engenheiro-mor, a “Aula de Fortificação” foi substituída pela “Academia Militar da Corte”. Em 1790, foi criada a “Academia Real de Fortificação, Artilharia e Desenho”. O Real Corpo de Engenheiros (RCE), criado em 1793, foi o antepassado da Arma de Engenharia do Exército português.

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Coisas que não sabemos

Coisas que não sabemos

As coisas que não sabemos são tantas que só pensamos nelas se nos aparecer uma qualquer situação que coloque em evidência a nossa ignorância

relativamente a um qualquer tema.

É natural e não há que ficarmos envergonhados. Basta procurarmos a informação e passamos a sentirmo-nos melhor.

Antes de abordar convosco um desses temas – com que fui inesperadamente confrontado um destes dias – apresento-vos um mapa e faço-vos uma pergunta sobre ele.

Rotas marítimas do comércio do gelo natural, em 1856.

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António Rafael Passarinho Franco Preto
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Coisas que não sabemos

O que representam as rotas traçadas?

Se quiserem entreter-se um pouco, escrevam as hipóteses que vos venham à cabeça para verem se se aproximam minimamente da resposta. Arrisco-me, no entanto, a prever que passam longe da resposta. Quanto a mim, devo confessar imediatamente, que nem sabia da existência de tais rotas (pelo que me era impossível adivinhar do que se tratava).

São, nem mais nem menos, as rotas marítimas do comércio do ‘gelo natural’ (produzido pela natureza) em 1856

Do comércio de quê?!?

Do GELO.

Do gelo?!? Sim, do gelo! Com saída dos navios de Boston e da área norte do leste dos Estados Unidos.

Agora vou contar a história do que me aconteceu e fazer um resumo do que aprendi (para poder arquivar este tema para minha “memória futura”).

Estava a ver um DVD que tratava da vida dos habitantes em “Cranford”, uma pequena povoação fictícia e isolada do noroeste da Inglaterra em 1840 (isolamento que acontecia a todas as povoações onde o caminho de ferro ainda não chegava).

O médico local precisou de fazer baixar a temperatura duma doente febril em perigo de vida e pediu gelo (para fazer baixar fisicamente a temperatura do corpo da paciente).

Quando apareceram muitos quilogramas de gelo, eu dei comigo a pensar: Gelo!? No verão do início da década de 1840?! Numa povoação isolada do noroeste de Inglaterra?!

Como era evidente, não existiam soluções “simples” como a que aparece na imagem seguinte:

Também não existiam soluções como em 1948 (uns 100 anos depois), quando o meu pai me dava 2$50 para eu ir à fábrica de gelo que existia no Arco do Cego comprar 5 kgs de gelo para trazer para casa (30 minutos a pé, ida e volta) e fazermos ‘ice cream’ para o lanche de domingo. Usávamos uma máquina manual. A minha mãe fazia um litro de leite-creme que era colocado dentro de um cilindro oco de metal que estava fixo verticalmente no centro dum grande balde de madeira, com um eixo de rotação no seu centro e uma manivela que ia até ao exterior do balde de madeira, para fazer rodar o dito cilindro de metal. Colocavam-se bocados de gelo entre o cilindro e o balde (e sal para evitar que o gelo se derretesse) … e “vá de dar à manivela”, o que ia ficando cada vez mais difícil à medida que o leite-creme ia ganhando a consistência de “ice cream”. Se bem me lembro, em algo como meia hora (e com todos a colaborarem) podíamos deliciarmo-nos com “ice cream” ao lanche desse domingo!

Vi-me assim obrigado a ir estudar o assunto do gelo, do seu armazenamento e do seu comércio (e que é verdadeiramente a história deste artigo).

Até há uns dois séculos, o gelo era somente considerado simplesmente como uma das consequências naturais dos invernos.

Em 1805, dois irmãos abastados de Boston, USA – William e Frederic Tudor – mencionaram em jeito de brincadeira, durante um piquenique, que as bebidas frescas e os “ice creams” que eles saboreavam, deviam saber muito bem aos residentes nas Caraíbas.

O que podia ter sido simplesmente uma “conversa de ocasião”, levou Frederic Tudor a criar um mercado inexistente até esse momento: o mercado do gelo.

Frederic Tudor tinha a certeza de que, uma vez que as pessoas se habituassem a consumir, conservar e utilizar produtos “gelados”, nunca mais regressariam à situação anterior.

Mas o sucesso não foi fácil ou imediato. Teve que comprar – em sociedade com o irmão –o 1º navio para transportar 80 toneladas de gelo para vender à elite europeia residente na ilha francesa de Martinica, que tinha escolhido como centro de distribuição de gelo para as Caraíbas (porque nenhum dono de navio aceitou a ideia de transportar gelo). No entanto, não conseguiu ter sucesso, porque não conseguiu vender o gelo e o irmão desistiu da sociedade.

Mas Frederic Tudor continuou obcecado com a ideia de que o gelo o iria tornar milionário e continuou a insistir, desenvolvendo técnicas de marketing para criar o seu mercado.

Desde publicidade para convencer os potenciais clientes de que eles “necessitavam” de

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Frigorífico moderno. Frederic Tudor, ‘The Boston Ice King’

Coisas que não sabemos

gelo, passando por negociar com bares para oferecerem a certas horas, bebidas com gelo ao mesmo preço das bebidas à temperatura habitual ou mesmo a oferta de que “a 1ª bebida gelada é grátis” (tipo “happy hour”), ensinando restaurantes a produzir “ice creams” e convencendo os médicos em hospitais a que o gelo era o produto ideal para fazer baixar a febre dos seus doentes, fez de tudo um pouco.

Tendo Frederic Tudor como impulsionador, o mercado do gelo desenvolveu-se por todo o mundo. O comércio do gelo produzido pela natureza (o único que havia) revolucionou as indústrias da carne, vegetais e fruta, sendo determinante no crescimento extraordinário do comércio do peixe e na introdução dum enorme número de bebidas.

Durante as décadas de 1830 e 1840 as rotas do comércio e distribuição de gelo alcançaram a Inglaterra, a Índia (de longe o mais rentável mercado de Frederic Tudor), a América do Sul, a China e a Austrália.

As famílias mais abastadas começaram a ter as suas “Ice houses” (em subterrâneos ou à superfície) para terem gelo todo o ano e essa situação foi-se progressivamente desenvolvendo, cobrindo todas as povoações, por mais isoladas que estivessem (nomeadamente – e estou a recordar – “Cranford”, a tal povoação fictícia no noroeste de Inglaterra, que foi – para mim – o início de toda esta história).

Os blocos de gelo tinham a maior dimensão possível para conseguirem ser manuseados e transportados com os meios existentes (pois quanto maior fossem, menos “derretiam”, mas não nos esqueçamos de que um metro cúbico de gelo pesa uma tonelada!). Devido, pois, ao seu peso, a dimensão normal para esses blocos – cubos ou paralelepípedos – variava entre 40 a 50 cms e um máximo de 1 metro de aresta.

Os preços de venda ao consumidor eram extremamente variáveis e Frederic Tudor

baixava os preços até ao preço que lhe custava a ele a sua extração e distribuição, sempre que necessitava de destruir um concorrente. Vendia normalmente a preços entre 20 e 50 cêntimos do dólar por quilo, consoante os locais e as épocas (quando o produto lhe custava entre 2 e 3 cêntimos do dólar por quilo).

Em 1847, Frederic Tudor, “The Boston Ice King”, já distribuía, só nos Estados Unidos – em navios e/ou por comboio – 52.000 toneladas de gelo por ano para 28 cidades (para além de possuir uma grande parte do comércio mundial de gelo). Faleceu em 1864, verdadeiramente milionário.

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Transporte e distribuição de gelo

Coisas que não sabemos

No auge do comércio do gelo (nos finais do século XIX) o negócio do mercado do gelo empregava umas 90.000 pessoas nos Estados Unidos, valia 28 milhões de dólares (equivalente a uns 700 milhões de dólares actualmente) e usava armazéns de gelo com uma capacidade máxima de 250.000 toneladas cada um. O gelo tinha preços variáveis consoante a sua transparência:

O mais caro era o que era absolutamente transparente (era criado quando a água congelava sem qualquer neve misturada). Quando havia neve misturada, a consequência era uma certa opacidade que comercialmente lhe diminuía o valor (embora a sua capacidade de arrefecimento e qualidade fosse igual).

Como exemplo da sua expansão a nível mundial, a Noruega exportava um milhão de toneladas de gelo por ano, tendo criado um sem número de lagos artificiais para – aproveitando a “excelência” do seu clima – “produzir e extrair” gelo (o único mercado em que a matéria prima era gratuita, por ser dada pela natureza). A tentativa americana de exportar gelo para a Inglaterra só teve um sucesso muito limitado no tempo, durante os primeiros anos da década de 1840. Eric Lander formou a ‘Wenham Lake Ice Company’ e o seu ‘Wenham Ice’ foi comercializado com sucesso inicial pois conseguiu convencer aqueles que estão sempre dispostos a inovações, os chamados ‘early adopters’ (que são sempre um número reduzido face à dimensão do mercado global) que esse gelo tinha propriedades de arrefecimento e pureza que não estavam ao alcance do gelo inglês (extraordinário descaramento, direi eu!).

Neste caso a “aldrabice” não vingou pois deparou-se com uma barreira impossível de ultrapassar (para vulgarizar o uso do gelo em Inglaterra) e que estava fora dos planos e para além da “capacidade de persuasão” de Eric Lander:

Os Ingleses não aceitaram culturalmente a “evolução para bebidas geladas” tão a gosto dos americanos e muito menos para a cerveja! (An iced pint of beer!?! How awful!).

E sem possibilidade de expandir o seu mercado do gelo, terminou a aventura do ‘Wenham Ice’ em Inglaterra.

Regressemos a Frederic Tudor.

Criou o mercado do “gelo natural” e faleceu milionário em 1864 (e feliz por ter concretizado o seu sonho de visionário) quando o mercado por si criado ainda estava em crescimento e muito longe de começar a regredir ou mesmo desaparecer.

Não obstante a produção de gelo em fábricas ainda ser diminuta em 1880, começou progressivamente a crescer em volume à medida que o desenvolvimento tecnológico e industrial – da mecânica e da química – passou a ter a capacidade para produzir gelo a preços competitivos (e não era de somenos importância a possibilidade de localizar inúmeras fábricas de gelo em locais geograficamente estratégicos, evitando os custos da sua distribuição e garantindo o acesso rápido e barato dos clientes ao produto).

Nos anos que se seguiram à ‘WWI’ (19141918) o mercado do “gelo natural” entrou em colapso e tornou-se progressivamente insignificante.

O aparecimento dos frigoríficos domésticos durante os anos da década de 1930 nos Estados Unidos (e na Europa nos anos da década de 1950) foi o golpe de misericórdia no mercado do “gelo natural”

O consumo do “gelo natural” manteve-se apenas em algumas áreas remotas ainda durante alguns anos, mas o “gelo natural” passou a ser utilizado unicamente em festivais e competições artísticas de esculturas no gelo (em certas épocas do ano e em locais com o clima apropriado). Assim desapareceu um negócio que transformou para sempre a nossa maneira de

viver em muitos aspectos, deu trabalho a muitos milhares de pessoas durante dezenas de anos e gerou receitas de milhões: a extracção e distribuição mundial do gelo produzido pela natureza.

(Para “memória futura”)

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Estocolmo
Colorado 2009
2014

Foi há 100 Anos A Monarquia do Norte

A Monarquia do Norte Foi há cem Anos

A proclamação da República em Portugal, em 5 de Outubro de 1910, não foi bem aceite por toda a população, sobretudo no Norte e no interior do país, onde persistiam núcleos de adeptos da Monarquia que não se submetiam de boa vontade à nova situação. Com o passar do tempo, muitos descontentes acabaram por aderir ao novo regime político. Outros, porém, preferiram abandonar o país. Paiva Couceiro, um prestigiado e muito condecorado militar, pediu publicamente que fosse efectuado um plebiscito nacional sobre o regime desejado pelo povo. Quando o seu pedido foi recusado, entregou a espada e, em 1911, exilou-se na Galiza, onde planeou as «Incursões Monárquicas».

As actividades revolucionárias de Paiva Couceiro foram realizadas sem o beneplácito do próprio rei D. Manuel II, o qual emitiu um comunicado onde declarava não apoiar a reposição da Monarquia pela força das armas. Apesar disso, Paiva Couceiro obstinou-se na luta armada e as suas forças invadiram por duas vezes o território nacional, em 1911 e 1912. Em ambas as ocasiões, os revoltosos foram mal-sucedidos e o seu chefe condenado ao degredo pelo Tribunal Militar de Chaves, em 19 de Novembro de 1912. Amnistiado em

1915 por Pimenta de Castro, Paiva Couceiro voltou ao país. Mas o temperamento levou-o a reincidir nas acções destinadas a restaurar a Monarquia. Em 5 de Dezembro de 1917, a Junta Militar Revolucionária tomou o poder e, sob Sidónio Pais, o chefe designado, instalou-se um regime político que, ao cobrir um vasto leque de ideologias, inclusive a monárquica, acal-

mou os ímpetos revolucionários. Pouco tempo passado, porém, tornou-se evidente que a «República Nova» não iria permitir a restauração da Monarquia e os monárquicos mais resilientes reiniciaram as actividades revolucionárias.

Em 14 de Dezembro de 1918, o assassinato do Presidente da República, Sidónio

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277/1950
O Batalhão Académico reunido nas Janelas Verdes

Foi há 100 Anos A Monarquia do Norte

Pais, mergulhou Portugal numa onda de violência cívica. Os monárquicos mais irredutíveis, que apesar dos insucessos das incursões de 1911 e 1912 nunca haviam perdido a esperança na restauração da monarquia, e a quem o Presidente assassinado abrira perspectivas de protagonismo político, passaram de imediato à conspiração. E, da conspiração, aos actos.

Quatro dias depois, a Junta Militar do Norte, em representação de todos os Regimentos do Porto, apela ao estabelecimento de um Governo forte. Em Lisboa, apenas o Regimento de Artilharia de Queluz e os dois Regimentos de Cavalaria de Belém – Lanceiros 2 e Cavalaria 4 – declaram concordar com a proclamação. No dia

23, constitui-se no Porto uma Junta Governativa Militar com a missão de dirigir os negócios públicos do Norte do país. E não só. Ao chefe do Governo legítimo, Tamagnini Barbosa, que manifestou vontade de negociar, a Junta impôs como condição para continuar no lugar, que se livrasse de «qualquer influência partidária». O Governo foi efectivamente remodelado, mas os ânimos não se acalmaram.

Em 3 de Janeiro de 1919, o Governo nomeou o coronel republicano Ribeiro de Carvalho comandante da Divisão Militar de Vila Real com o objectivo de fazer frente às exigências da Junta Militar do Norte. Esta reagiu, enviando uma coluna militar contra a Divisão de Vila Real. No dia 6

ocorreu um breve e inconclusivo recontro entre as duas forças. O chefe do Governo, para evitar uma guerra civil que parecia cada vez mais provável, decidiu transmitir aos revoltosos um sinal de boa vontade, nomeando para alguns ministérios personalidades com afinidades monárquicas. Esta decisão revelou-se um passo em falso, pois os republicanos mais intransigentes, interpretando-a como uma cedência inaceitável, revoltaram-se por sua vez em defesa da «República Velha», com o apoio de guarnições militares de Abrantes, Santarém, Caldas da Rainha e Tomar. No dia 12 de Janeiro, em Lisboa, um grupo de revoltosos civis e militares que reclamavam a formação de um «Governo de concentração republicana», onde estivessem

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Proclamação da Monarquia em Viana do Castelo

Foi há 100 Anos

A Monarquia do Norte

representados os partidos da «República Velha», dirigiram-se ao castelo de S. Jorge para conseguir o apoio das Unidades militares ali concentradas, mas o respectivo comandante, tenente-coronel Schiappa de Azevedo, não pactuou e, após ligeira troca de tiros, os revoltosos desistiram dos seus intentos. Enquanto isso, no Arsenal da Marinha, uma coluna de 300 marinheiros e civis não teve melhor sorte. Na Covilhã, a revolta foi também rapidamente dominada por tropas das guarnições de Castelo Branco e da Guarda.

Se no Sul e no Centro do país os republicanos sidonistas estavam em maioria, no Norte predominavam os monárquicos. Em 14 de Janeiro, Aires de Ornelas, Lugar-Tenente de D. Manuel II, assegurou o apoio do rei à revolta monárquica 1. No dia 17, a Junta Central do Integralismo Lusitano enviou para o Porto algumas das suas principais figuras, e entre elas, Paiva Couceiro, António Sardinha e Luís de Almeida Braga. Na edição desse dia, o jornal monárquico Pátria ateava a fogueira: “(…) Salvemos Portugal porque ou o faremos agora ou nunca mais o poderemos conseguir (…)” ; e no dia seguinte reincidia na exaltação: “(…) temos a esperança de que não havemos de morrer sem ver tremular as brisas que nos vêm do mar nessa bandeira azul e branca que nasceu em Ourique (…)”.

O Quartel-General monárquico instalou-se no Hotel Universal do Porto e foi aí que Paiva Couceiro decidiu iniciar o golpe, sabendo que apenas parte da tropa aquartelada em Lisboa estava do seu lado. Apoiavam o golpe, na capital, Cavalaria 2 e 4, Infantaria 5 e 16 e Grupos de Baterias de Queluz. As restantes guarnições tinham-se mantido neutras.

Pela uma da tarde desse Domingo, dia 19 de Janeiro, concentraram-se no Monte Pedral os contingentes de Infantaria 6

e 18, de Cavalaria 9, de Artilharia 5 e 6, do Grupo de Metralhadoras, da Polícia e da Guarda Republicana, e ainda um Pelotão de Cavalaria 11 de Braga, para além de outras tropas. Pouco depois chegou Paiva Couceiro, envergando o uniforme de oficial de Artilharia e, montando a cavalo, dirigiu-se para o centro do quadrado formado pelas tropas. Daí dirigiu uma proclamação em louvor do Exército como a mais alta expressão da Pátria. Seguidamente, o alferes Calaínho de Azevedo, de Cavalaria 9, desfraldou a bandeira azul e branca do tempo da Monarquia e cantou-se o hino da Carta Constitucional. Por fim, Paiva Couceiro passou revista às tropas e estas desfilaram em continência A Junta Governativa do Reino, junto ao Governo Civil do Porto, ficou sob o seu comando.

As ruas do Porto encheram-se de populares em festa. Na Serra do Pilar, a Artilharia disparava salvas de tiros. Tropas desfilaram até ao Quartel-General, junto à Praça da Batalha. Por todo o Norte, com excepção de Chaves e Vila Real, hastearam-se bandeiras monárquicas e tocaram sinos, enquanto se queimavam

bandeiras republicanas. No conjunto do país, a situação era muito confusa, com manifestações monárquicas aqui e além, mas com fraca adesão militar. Os primeiros dias da «Monarquia do Norte» faziam lembrar, curiosamente, o que acontecera em 5 de Outubro de 1910, apenas de sinal contrário: fraca resistência institucional à iniciativa revolucionária e uma população sem preferência marcada por um regime ou por outro.

Em Lisboa, o panorama era diferente. Por um lado, o Governo republicano reagiu logo em 20 de Janeiro, um dia depois da proclamação monárquica, dando início a uma mobilização parcial das forças da 1ª e 4ª Divisões, e ordenando às 2ª, 5ª e 7ª Divisões que estabelecessem uma linha de cobertura ao longo do rio Mondego. Além disso, chamou os cidadãos republicanos «às armas» , incentivando-os a apresentarem-se no Campo Pequeno onde, no dia 22 de Janeiro, se constituíram Batalhões e foram distribuídas armas. Após um brevíssimo período de instrução, os Batalhões de Voluntários ficaram sob o comando de conhecidos oficiais re -

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Combatentes monárquicos da Monarquia do Norte. (Infopédia. Porto Editora, 2003-2012)

Foi há 100 Anos A Monarquia do Norte

publicanos, apoiados por um número significativo de sargentos e cabos. Foi criado, inclusivamente, um Batalhão Académico, constituído por alunos da Academia da capital, o qual participou nos combates de Monsanto. Foi igualmente criada uma Divisão Naval com todos os meios disponíveis da Marinha, a qual devia preparar-se para proteger um desembarque de tropas a Norte do território 3 . Por outro lado, foi só nesse mesmo dia 22 de Janeiro que os monárquicos de Lisboa deram alguns tímidos sinais de solidariedade para com os correligionários do Porto, quando cerca de setenta militares e civis, chefiados pelo capitão Júlio da Costa Pinto, se dirigiram a Monsanto, onde hastearam, na presença de Aires de Ornelas, a bandeira da Monarquia. Cercados no dia 24 por forças republicanas, apesar da grande desvantagem numérica, lutaram toda a tarde, chegando inclusivamente a bombardear diversos pontos da cidade, enquanto intimavam o Governo à rendição. A certa altura começaram a escassear os mantimentos, as munições e o material sanitário para tratamento dos feridos. Constrangidos a refugiarem-se no Forte de Monsanto, os monárquicos acabaram por capitular, vindo a ser humilhados e alvos de tortura às mãos dos vencedores 4

Resolvida a situação em Lisboa, as forças republicanas dirigiram-se para o Norte do país, começando por submeter toda a Beira e depois Régua e Albergaria, que dominaram após violentas refregas 5 . Um pouco por todo o lado, muitas Unidades militares que haviam manifestado simpatia pelo golpe monárquico, sabedoras da vitória republicana em Monsanto, passaram para o lado republicano. No Porto, com o passar dos dias, e à medida que chegavam notícias dos sucessos das colunas republicanas, a cada dia mais perto da capital do Norte, a população republi -

cana começou a manifestar apoio à República. Para culminar o desassossego, “(...) era publicada pelos monárquicos uma lei datada de 13 de Fevereiro de 1919, que muito desagradou à população. As notas do Banco de Portugal passavam a ter uma enorme desvalorização. A população devia entregar no Banco de Portugal as notas de 20, 50 e 100 mil réis e receberiam 10% desse valor em notas já sobretaxadas ou em notas mais pequenas, que perfizessem esses 10%. E se a monarquia fosse derrotada? Certamente que a população arriscava-se a perder grande parte das suas economias! Daí, esta avisada pela imprensa desde o dia 10 de Fevereiro, procedeu ao levantamento de grandes quantias de dinheiro. Este decreto foi talvez a chave para a resolução da guerra civil instalada no país, já que produziu um profundo descontentamento em toda a população. (…) Paiva Couceiro encontrava-se fora do Porto, a inspeccionar as tropas no Picoto e em Espinho. Aqui anunciaram-lhe a revolta republicana no Porto. Resolve marchar, com as tropas monárquicas para o Porto. Durante o trajecto, muitos populares avisaram os soldados da coluna monárquica, da revolta republicana, e estes rapidamente passam na quase sua maioria a apoiar o golpe. Na realidade nesse mesmo dia, a Guarda Real, antes Republicana, revoltou-se e restabeleceu no Porto a República, acabando de vez com a guerra civil e a aventura monárquica. As bandeiras republicanas, foram substituindo as monárquicas (…).” 6

Os ministros da Junta Governativa do Norte foram todos presos, julgados e condenados, assim como foram expulsos do Exército mais de 500 oficiais e condenados a penas diversas de prisão celular ou degredo os principais cabecilhas da restauração monárquica de 1919.

1A autenticidade deste apoio tem sido posta em causa até aos dias de hoje.

2Estas Divisões tinham sede nas seguintes cidades: a 1.ª em Lisboa, a 2.ª em Viseu, a 4.ª em Évora, a 5.ª em Coimbra e a 7.ª em Tomar. As forças em operações foram sendo reforçadas por unidades ad hoc enviadas por Lisboa, cabendo às Divisões organizarem-se de um modo coerente. Esta fase ficou pronta no dia 31 de Janeiro. (in http://academiaportuguesadahistoria.gov.pt/wp-content/uploads/2015/06/TEXTO-A.-P.-HIST.-1-TEXTO-ACAD.-PORT.-Hist%C3%B3ria.pdf:

3Esta acção acabou por ser considerada não exequível, e a Divisão cedeu o seu Batalhão de Marinha à 5ª Divisão.

4As hostilidades em Lisboa prolongaram-se por cinco dias e provocaram 39 mortos e 330 feridos. (in http:// academiaportuguesadahistoria.gov.pt/wp-content/ uploads/2015/06/TEXTO-A.-P.-HIST.-1-TEXTO-ACAD.-PORT.-Hist%C3%B3ria.pdf:

5No dia 23 de Janeiro, os monárquicos ocuparam Fornos de Algodres e começam a bombardear Juncais. Entretanto, a 2.ª Divisão, reforçada com tropas da 5.ª Divisão, ocupou Figueira de Castelo Rodrigo e Trancoso. No dia 24, as forças monárquicas instaladas em Juncais e em Mangualde, retiraram durante a noite para Viseu. As forças da 2ª Divisão ocuparam as posições dos monárquicos e instalaram o Q.G. em Mangualde. Ainda nesse dia, é restaurada a República em Viseu pelas forças republicanas na cidade, instalando-se em 26 de Janeiro o Q.G. da 2ª Divisão nessa localidade. As escaramuças por todo o litoral centro prolongaram-se até dia 13 de Fevereiro. Neste dia, se bem que ainda se tenha combatido em Angeja, a guerra civil terminou com a entrada dos exércitos republicanos no Porto. (in BATISTA, major TM Luís, Operações militares contra a monarquia do Norte em 1919, trabalho individual para o Instituto Universitário Militar).

6BATISTA, major TM Luís, Operações militares contra a monarquia do Norte em 1919, trabalho individual para o Instituto Universitário Militar.

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(Infopédia. Porto Editora, 2003-2012)

Foi há 100 Anos A Monarquia do Norte

A Monarquia do Norte e o Colégio Militar

Desde o início da história do nosso Colégio, mesmo antes deste se designar Colégio Militar, os seus Alunos sempre almejaram servir a Pátria de armas na mão, quando a sentiram em perigo, mesmo não tendo ainda idade que lhes permitisse fazê-lo legalmente. O primeiro registo que existe de Alunos a querer combater em tal situação, remonta a 1810, quando se deu a terceira invasão francesa, liderada por Massena. Três Alunos fugiram do Colégio, então situado na Feitoria, e foram-se apresentar ao Marechal Beresford, pedindo-lhe que os empregasse no serviço da Linha.

Sendo esta uma postura cultivada ao longo de gerações e gerações de Meninos da Luz e consubstanciada no ponto primeiro «Amar e Honrar a Pátria» do seu Código de Honra, muito estranho seria, que os acontecimentos correspondentes à implantação da Monarquia do Norte, não tivessem reflexos imediatos no Colégio. O que se passou então no Colégio, encontra-se descrito, de forma sucinta, na página 24 do nosso «Quem é Quem II», que passamos a transcrever:

«Nos fins de Janeiro, perante a situação, alguns alunos do 5º, 6º e 7º anos do Colégio Militar decidem oferecer-se como voluntários, constituindo uma companhia de seis dezenas de colegiais a integrar nas forças militares em operações de defesa da República, no Norte do país. O facto é comunicado pelo Director ao Ministro da Guerra, que embora entendendo o fervor patriótico dos jovens alunos procura esfriar o entusiasmo, mandando expedir uma nota dirigida ao Colégio Militar com o seguinte texto: «S. Exª o Ministro encarrega-me de dizer a V. Exª que autoriza os alunos desse Colégio que constam da

relação que acompanhou a nota confidencial nº 219, de 28 de Janeiro p.p., a alistarem-se como desejam, desde que apresentem a V.Exª a necessária autorização passada por escrito pelos respectivos pais» Só que o ministro não contou com a determinação, o espirito de camaradagem e o poder persuasivo dos alunos…….e estes apresentaram mesmo ao director autorizações escritas e autenticadas, pelo que, nos termos da determinação ministerial este viu-se na circunstância de os mandar apresentar com guia de marcha no Ministério da Guerra (Repartição de Operações) à medida que iam sendo recebidas as autorizações. Dezoito deles ainda seguiram a apresentar-se na Pampilhosa às Forças em Operações, só que o respectivo Comandante em Chefe ordenou a todos o regresso ao Colégio, no dia imediato. Entre 15 e 17 de Fevereiro já toda a gente havia regressado à Luz e retomado tranquilamente os seus estudos.»

NOTA FINAL

A nota dirigida pelo Ministro da Guerra ao Colégio Militar, é a nota nº211, de 4 de Fevereiro de 1919, da 4ª Repartição da 1ª Direcção Geral da Secretaria da Guerra, que se conserva no Arquivo Histórico do Colégio Militar.

Paiva Couceiro Biografia

Paiva Couceiro, enquanto Governador de Angola, com o príncipe D. Luís Filipe (Luanda 1907)

Henrique Mitchell de Paiva Cabral Couceiro nasceu em Lisboa no dia 30 de Dezembro de 1861.

Em 1889, com a patente de capitão de Artilharia, ofereceu-se para servir nas colónias africanas, onde estavam em curso acções destinadas a tornar efectiva a ocupação dos territórios, para dar satisfação ao articulado da Conferência de Berlim sobre a partição da África entre as potências coloniais europeias. Foi enviado em Setembro desse ano para Angola , onde assumiu funções de comandante do Esquadrão Irregular de Cavalaria da Humpata A 17 de Fevereiro de 1891, terminada a comissão de serviço onde deu mostras de enormes coragem e determinação, foi-lhe conferido o grau de grande-o -

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Foi há 100 Anos A Monarquia do Norte

ficial da Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito.

Regressado à Metrópole, como a vida de quartel não o satisfizesse, pediu licença para servir na Legião Estrangeira espanhola. Em 8 de Novembro de 1893 partiu para Melilla, a tempo de participar nos últimos combates da Guerra do Rif (1893–1894), onde se distinguiu por valentia, sendo condecorado com a medalha espanhola de Mérito Militar. No regresso a Lisboa, foi de novo colocado em Artilharia 1.

Ainda nesse ano, António Enes, recém-nomeado Comissário Régio em Moçambique, convidou-o para ser seu ajudante de campo. Paiva Couceiro desembarcou em Lourenço Marques a 18 de Janeiro de 1895, a tempo de participar nas campanhas militares contra Gungunhana, o mais importante chefe tribal do Sul de Moçambique. Notabilizou-se particularmente em dois combates: em Marracuene liderou a reacção que expulsou do quadrado defensivo português os insurrectos que aí haviam penetrado – uma acção que lhe valeu a elevação a cavaleiro da Ordem de São Bento de Avis; e em Magul, onde foi ferido. Neste combate, travado a 8 de Setembro de 1895, Couceiro portou-se por forma a merecer do comissário régio António Enes a seguinte declaração: “Há-de ver-se que a vitória de Magul perdeu o Gungunhana; a derrota perderia, provavelmente, o distrito de Lourenço Marques. Se não fora Paiva Couceiro, provavelmente, lamentaríamos ainda hoje tamanha desgraça.” 1

Concluídas as operações de pacificação e preso e deportado Gungunhana, Paiva Couceiro regressou a Lisboa em Dezembro de 1895, sendo “(…) proclamado Benemérito da Pátria , por decisão unânime das Cortes, como reconhe -

cimento pela apreensão de Gungunhana, e feito Comendador da Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito, com uma pensão anual de 500$000 réis, que de resto nunca recebeu durante a República. Foi o primeiro e provavelmente o único oficial Português a ser agraciado, até hoje, com três graus da Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito . Mas as honrarias não se ficaram por aí: foi nomeado ajudante-de-campo honorário do rei D. Carlos I (…). Era oficialmente um herói e um Benemérito da Pátria . (…) ” 2

Anos mais tarde, decidiu dedicar-se à política. Candidato pelo Partido Regenerador-Liberal nas eleições gerais de 19 de Agosto de 1906, foi eleito deputado às Cortes para a legislatura de 1906 e 1907. No Parlamento foi vogal da Comissão Parlamentar do Ultramar (1906), vogal da Comissão Parlamentar de Administração Públi -

ca (1906-1907) e vogal da Comissão Parlamentar da Guerra (1906-1907). Notabilizou-se ainda como administrador colonial em Angola – onde exerceu funções de Governador-Geral entre 24 de Maio de 1907 e 22 de Julho de 1909, realizando um vasto plano de obras de fomento e comandando as campanhas militares de p acificação no Cuamato e nos Dembos .

Regressado à Metrópole em Junho de 1909, recebeu o comando do Grupo de Artilharia a Cavalo de Queluz, mantendo-se afastado da vida pública até Julho de 1910, quando publicou no jornal O Correio da Manhã uma carta apelando à contra-revolução para salvar a Monarquia. Em 5 de Outubro de 1910 foi um dos poucos monárquicos decididos a defender a Monarquia de armas na mão, tendo ordenado à sua artilharia, instalada no Torel, que fizesse fogo sobre o acampamento republicano da Rotunda e o Parque Eduardo VII. Não conseguiu, contudo, evitar a implantação da República.

Em Maio de 1911, inconformado com a situação, Paiva Couceiro foi ao Ministério da Guerra demitir-se do Exército. Na ocasião entregou a espada, dizendo: «Entrego a minha demissão e saio do País para conspirar. Prendam-me se quiserem» . Ninguém ousou prendê-lo.

Foi para a Galiza, onde conspirou repetidamente contra a República, tendo inspirado as mal-sucedidas incursões monárquicas. A 4 de Outubro de 1911 as suas tropas entraram em Portugal, tomando Chaves e hasteando a bandeira azul e branca em Vinhais; três dias mais tarde, derrotadas pelas forças republicanas, as tropas monárquicas voltaram para a Galiza. A 6 de Julho de 1912 ocorreu nova incursão, sendo as

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Henrique Mitchell de Paiva Cabral Couceiro

Foi há 100 Anos A Monarquia do Norte

suas tropas de novo derrotadas, em Chaves, a 8 de Julho. Em Janeiro de 1919 a iniciativa monárquica é de início bem-sucedida, tendo Paiva Couceiro presidido fugazmente à chamada «Monarquia do Norte», entre 19 de Janeiro e 13 de Fevereiro de 1919.

A 23 de Fevereiro foi condenado a 25 anos de degredo, mas uma amnistia de Janeiro de 1924 permitiu-lhe voltar ao país. Em 1935 foi de novo exilado por ter criticado publicamente a política colonial do Estado Novo. Voltou ao país mas foi de novo exilado a 16 de Setembro de 1935, por seis meses, por ter criticado publicamente a política colonial do regime. Voltou a Lisboa em Janeiro de 1937 mas, como repetisse as críticas, foi condenado a dois anos de exílio. Em 1939 regressou definitivamente a Portugal, dedicando-se à escrita sobre questões coloniais e sobre o ressurgimento nacional. Morreu em 1944.

1 https://pt.wikipedia.org/wiki/Henrique_Mitchell_de_Paiva_Couceiro

2 https://pt.wikipedia.org/wiki/Henrique_Mitchell_de_Paiva_Couceiro

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Paiva Couceiro na Galiza em Junho de 1912

Curso de 1948/1955

Romagem dos 70 Anos de Entrada

Curso de 1948/1955

Romagem de 70 Anos de Entrada 16 Novembro 2018

Decorridos 70 anos de entrada do Colégio, estiveram presentes nesta romagem de saudade os seguintes Antigos Alunos:

Luís José Passanha Braamcamp Sobral (34/1948); António Eduardo Queiroz Martins Barrento (40/1948); José Alberto Alves de Paula (62/1948); Guilherme Luís Faria Câncio Martins (126/1948): António Rui Prazeres de Castilho (147/1948); Francisco Augusto Ortigão de Melo Sampaio (148/1948); António Hélder Monteiro da Sena e Silva (149/1948); João Diogo Weinstein (186/1950); José Manuel dos

Reis Moreira (200/1948); Victor Manuel Gervásio Marques (208/1948); Jorge Carlos Niblett do Passo (227/1947); José Alberto de Salis Amaral (231/1949); Luís Gonzaga de Castro Mendes de Almeida (285/1948); Fernando Manuel da Câmara Marques Moreira (317/1945); Abílio de Matos e Noronha Pais de Ramos (323/1948); António Maria de Almeida Bívar de Sousa (325/1948); Pedro do Canto Lagido (330/1947); João Augusto Serrinha Figueira (339/1947); Rui Armando de Sousa Carneiro (345/1948); Álvaro António Duarte Dinis Varanda (347/1948).

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©Fotos Leonel Tomaz Curso de 1948/1955 - 70 Anos de Entrada - 16 de Novembro de 2018

Curso de 1958/1965 Romagem dos 60 Anos de Entrada

Curso de 1958/1965

Romagem de 60 Anos de Entrada 9 Novembro 2018

Decorridos 60 anos de entrada do Colégio, estiveram presentes nesta romagem de saudade os seguintes Antigos Alunos:

José Luís Campos de Almeida Mota (4/1958); Martiniano Nunes Gonçalves (9/1958); António Augusto Mello Gomes Duque (12/1958); Fernando José Cortez Pinto Seixas (24/1957); Carlos Manuel Alves Martins (26/1957); Afonso Henrique Mendes de Araújo (31/1958); Carlos Manuel Caramês Mendez (42/1959); Luís Manuel de Almeida da Silva Carvalho (49/1958); Luís Fernando Tierno Nunes da Silva (65/1958); João Braga Abecasis (93/1960); João Manuel Ermida Corrêa (102/1959); António Manuel da Silva Gomes (104/1958); António Luciano Carrilho Roma Torres (114/1957); Luís Manuel Cecílio Gonçalves (122/1957); José António Graça Pereira de Almeida (144/1958); João do Passo Vicente Ribeiro (153/1958); Alberto Nuno Lara Ponces de Carvalho (162/1958); João Macedo Pinto Nu-

nes Correia (169/1957); António Joaquim Caldeira Carvalho (174/1958); José Filipe Carvalhosa Mendes de Almeida (178/1958); António Manuel Pereira de Figueiredo Cardoso (181/1956); João Virgílio Soeiro da Costa (196/1956); João Paulo de Castro e Silva Bessa (200/1957); Pedro Arantes Lopes de Mendonça (222/1958); José Carlos Margarido Lima Bacelar (241/1958); Arnaldo João Reis Maya (242/1957); Gumersindo Júlio da Silva Bastos (251/1958); Carlos Frederico Néu Dias Antunes (263/1960); Carlos Manuel de Almeida Cabral (287/1958); Manuel Dimas e Silva Cordeiro (310/1956): João José Ferreira Rodrigues Cancela (370/1958); Francisco Óscar Marques Barata Amaral Paes (389/1958); Rui Cardoso Telles Palhinha (418/1958); José Manuel da Costa de Souza Medeiros (442/1958); Manuel José Marcelly Coelho de Carvalho (443/1958); José Augusto Pereira Peres Brandão (446/1958); Pedro João Reis Matos Silva (449/1958); Orlando Ferreira Reis (455/1958); José Manuel Vaz

Tenreiro (456/19589); Tomaz Júlio Teixeira de Azevedo e Guimarães Metello (462/1958); Jorge Emanuel Soares Coelho Pote (464/1958); Carlos Manuel Palhão de Vasconcelos (467/1958); Carlos Manuel Pires Nobre Biscaya (469/1958); Mário Montenegro de Carvalho (471/1958); César Augusto Martins Portero (477/1958); Manuel Pedro Dias Santos (487/19589); Nuno Gonçalo Lynce de Faria (490/1958); Luís Filipe da Silva Rocha (493/1958); Manuel Bernardo Cid de Oliveira Peixeiro (498/1959); Isidro Alberto Silva Santos (531/1960)

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©Fotos Leonel Tomaz Curso de 1958/1965 - 60 Anos de Entrada - 9 de Novembro de 2018

Curso de 1968/1975 Romagem dos 50 Anos de Entrada

Curso de 1968/1975

Romagem de 50 Anos de Entrada 23 Novembro 2018

Decorridos 50 anos de entrada do Colégio, estiveram presentes nesta romagem de saudade os seguintes Antigos Alunos:

Rui Manuel Botelho do Amaral dos Santos Patrício (1/1968); Luís de Fragoso Campos e Menezes (15/1968); António Victor Reynaud da Fonseca Ribeiro (43/1968); Carlos Manuel Castelo Branco do Espírito Santo (50/1968); Luís Manuel da Fonseca Cordeiro (75/1967); Manuel Bernardo Dias Nunes (78/1967); Jorge Eduardo da Costa Salazar Braga (87/1968); José Carlos Pereira de Matos Duque (123/1968); Francisco Baptista Esteves Virtuoso (135/1968); Rui Manuel Costa Casqueiro de Sampaio (139/1968); Delfim da Fonseca Osório Nunes (141/1968); Rui Fernando Pimentel Valadas Calado (149/1968); Fernando César Ribeiro da Silva (168/1968); Fernando José Loureiro Ramires

Ramos (211/1968); Gualter Manuel da Mota Santos (229/1969); António Portugal Costa Gomes (315/1967); Manuel Augusto Soares Pinto Viana (360/1968); Rodrigo João Matos Frazão (382/1967); Abílio José Alves Martins Agostinho (400/1968); José António Alves Martins Agostinho (406/1968); Pedro Luís Carnecelha de Pezarat Correia (420/1968); José Manuel Rodrigues Salgueiro dos Santos (465/1968); Nuno Rolando Fernandes Tomaz Ferreira (496/1967); Carlos José Ferreira Paixão Soares (506/1967); José Augusto de Almeida Serôdio (533/1968); João Santos Gomes do Amaral (575/1968); José Carlos Teixeira Barata (597/1967); Nuno Maria Ferreira da Costa (602/1968); José António Madeira de Ataíde Banazol (631/1968); Pedro Eugénio de Sacadura Lima Orvalho (634/1968); Rui Manuel de Galveias Lizardo Neves (637/1968); José Carlos Godinho Sequeira (638/1968); Mário João Maria Rodri-

gues Mendes de Almeida Russo (641/1968); José Eduardo Ventura Contente (642/1968); Jorge Manuel Lourenço Marques Esgalhado (643/1968); Hugo Cristiano Campos de Lima Gonçalves Damásio (645/1968); Afonso José Leal Duarte de Oliveira (647/1968); Pedro Manuel de Azevedo e Silva Pedroso (654/1969); António Carlos de Matos Freitas (659/1969); João Ernesto Vela Bastos (665/1969).

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©Fotos Leonel Tomaz Curso de 1968/1975 - 50 Anos de Entrada - 23 de Novembro de 2018

Jornadas de Trabalho da AAACM

Jornadas de Trabalho da AAACM 26/01/2019

As Jornadas de Trabalho decorreram no sábado, dia 26 de Janeiro de 2019, da parte da tarde, no Teatro D. Luiz Filipe, no quartel da Formação. A anteceder as referidas jornadas de trabalho, durante a parte da manhã do referido dia 26 de Janeiro, foi facultada, a quem estivesse interessado, uma visita guiada ao P.M.34.

Tavares da Silva (116/1950) usando da palavra.

«O FUTURO DA NOSSA ASSOCIAÇÃO»

A actual Direcção da Associação de Antigos Alunos do Colégio Militar, que se encontra em fim de mandato, decidiu não terminar o mesmo, sem primeiro promover umas “Jornadas de Trabalho”, subordinadas ao tema “O Futuro da nossa Associação”. Considerou a Direcção cessante que era chegada a

hora de nos debruçarmos sobre este tema, por dois motivos fundamentais. O primeiro, resultante da maior disponibilidade que a Associação agora tem para se dedicar aos seus próprios problemas e o segundo pela acuidade de que agora se reveste a questão da utilização pela Associação do Prédio Militar nº 34 (P.M.34) (quartel da Formação), onde se encontra sediada.

A visita guiada ao P.M. 34 teve início no Teatro D. Luiz Filipe, onde o Presidente da nossa Associação deu as boas vindas aos presentes, indicou as linhas gerais da visita que iria ter lugar e apresentou a Antiga Aluna do Instituto de Odivelas, responsável pelo Lar de Idosos de Odivelas da Associação das Antigas Alunas do Instituto de Odivelas, também sediado no PM 34, que nos iria acompanhar durante a visita ao mesmo.

A visita incidiu sobre as partes do P.M. 34 que normalmente não estão acessíveis aos Antigos Alunos, que são a parte do antigo convento compreendida entre o Teatro e o Restaurante «Jardim da Luz», a fiada de construções, sem qualquer valor arquitectónico, existente ao longo do muro do lado Poente do P.M. 34 e o Lar de Idosos da Associação

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Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa 71/1957

Jornadas de Trabalho da AAACM

das Antigas Alunas do Instituto de Odivelas. No que se refere ao antigo convento, onde dantes estavam os alojamentos dos soldados, é evidente o estado de abandono do mesmo, estando uma pequena parte dele aproveitada com arrecadações da nossa Associação. Seja qual for o aproveitamento que for dado a esta parte do edifício do convento, o custo das obras inerentes a esse aproveitamento será muito elevado.

No que se refere às construções ao longo do lado Poente da propriedade, verificou-se que se tratava de antigas cavalariças abandonadas e de arrecadações maioritariamente devolutas. De acordo com a legislação municipal existente aplicável, estes edifícios, actualmente de um só piso, poderiam passar a ter dois pisos, o que implicaria a demolição dos existentes, que não estão preparados para receber um piso adicional.

Quanto ao Lar da Associação das Antigas Alunas de Odivelas, verificou-se ser o mesmo de elevada qualidade. Segundo informaram membros de antigas Direcções da nossa Associação, este Lar pode receber Antigos Alunos do Colégio Militar, até uma determinada quota do antecedente acordada. Já estiveram no Lar Antigos Alunos do Colégio, mas de momento não se encontra lá nenhum.

Na parte da tarde do dia 26, realizaram-se as jornadas programadas, entre as 15H00 e as 19H00. Foram recebidas 12 comunicações, havendo a acrescentar a inscrição de dois Antigos Alunos para falar, sem que tivessem apresentado previamente comunicações. Os Antigos Alunos inscritos para intervenções foram os seguintes:

Eduardo Martins Zúquete (20/1945). Manuel Tavares da Silva (116/1950).

José Fidalgo dos Santos (253/1951).

Carlos Querido Baptista (303/1951).

Francisco Silva Alves (392/1954).

João Paulo Bessa (200/1957)

Martiniano Nunes Gonçalves (9/1958).

José Bravo Ferreira (204/1959).

Filipe Soares Franco (62/1963).

João Barrento Sabbo (17/1967).

António Faria Menezes (568/1969).

Miguel Félix António (302/1972).

Marco Martinho da Silva (456/1983).

Tiago Simões Baleizão (200/1987).

A súmula das intervenções feitas é apresentada no artigo intitulado «O futuro da AAACM», apresentado de seguida na presente revista, da autoria de Luís Miguel Guerreiro Félix António (302/1972), que em boa hora decidiu dar uma ajuda à redacção da ZacatraZ.

No final das intervenções, foi feito um breve intervalo, para inscrições para um perío-

do de perguntas e respostas subsequente. Retomados os trabalhos seguiu-se uma troca de impressões sobre as intervenções feitas, verificando-se que houve mais comentários do que perguntas relativas às referidas intervenções.

Assinala-se que as Jornadas tiveram uma assistência muito satisfatória, de mais de sessenta associados, comprovativa do interesse da sua realização. As Jornadas decorreram com as intervenções a sucederem-se a bom ritmo, respeitando as apertadas regras estabelecidas relativas aos tempos de intervenção, o que permitiu que todos pudessem expor as suas ideias. As Jornadas foram gravadas e serão objecto de uma acta. As intervenções foram entregues escritas, estando disponíveis para consulta. Espera-se que estas Jornadas tenham acções subsequentes, para que a próxima Direcção da Associação possa tirar o melhor proveito possível das sugestões apresentadas, que forem seleccionadas para concretização futura.

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Faria Menezes (568/1969) usando da palavra. Aspecto da Assistência.

Jornadas de Trabalho da AAACM

O Futuro da AAACM

Sem prejuízo das diversas visões apresentadas nas Jornadas de Trabalho sobre o futuro da AAACM – nem sempre naturalmente coincidentes, penso que houve diversas ideias que podiam ser amadurecidas. Havendo uma nova Direção para o triénio 2019/2021 a ser eleita em Março, a ela caberá fazer essa avaliação, mas gostava de chamar a atenção para a pertinência ou oportunidade de muitas das sugestões formuladas nesse luminoso sábado, independentemente de nem todas, na minha apreciação, deverem ser consideradas prioritárias. Aqui deixo uma súmula muito resumida, do que retirei das intervenções efetuadas (é, pois, a minha leitura, e não propriamente uma ata da reunião…) esperando que os destaques abaixo sejam suficientemente apelativos para que todos procurem ler os seus conteúdos. O 20/1945, Eduardo Zúquete, aludiu à criação de uma biblioteca-museu – a instalar no espaço hoje devoluto entre o restaurante Jardim da Luz e o Teatro Dom Luiz Filipe – para preservação da memória do espaço colegial, libertando a Direcção do Colégio dessa preocupação e permitindo que esta se foque naquilo que considerou essencial: promover a melhoria no ranking escolar dos seus alunos.

O 116/1950, Manuel Tavares da Silva, optou por defender que o Colégio deveria deixar de ter a exclusiva tutela do Exército, apontando dois caminhos alternativos: transferência da dependência do Exército para o Estado-Maior-General das Forças Armadas, ou introduzir parcerias civis na gestão do Colégio, para as áreas pedagógica e económico-financeira, mantendo o Exército a gestão das

componentes relativas à atividade castrense.

O 253/1951, José Fidalgo dos Santos, apresentando um extenso catálogo de medidas, propugnou por uma procura de novas fontes de rendimento para a Associação, por uma exploração mais abrangente do espaço da antiga Formação, nele incluindo locais de confraternização para os Antigos Alunos e o estabelecimento ou reforço da ligação institucional da Associação a outras organizações.

O 303/1951, Carlos Querido Batista, sugeriu que fosse equacionada a instalação de um Lar para os Antigos Alunos na antiga Formação, considerando que, além do apoio social disponibilizado, no âmbito da função de solidariedade, constituiria uma fonte de rendimento adicional e uma razão forte para colar a presença da Associação ao espaço.

O 392/1954, Francisco Silva Alves, deixou algumas pistas para o debate, em particular, a captação como sócios dos Antigos Alunos mais novos e os problemas, bastante complexos, associados à utilização e gestão da sede da Associação, no contexto da cedência do espaço estabelecida com o Exército.

O 200/1957, João Paulo Bessa, centrou-se na importância do desenvolvimento de acções que criem actividades sustentadas no domínio da Actividade Física, do Exercício e do Desporto, aproveitando as infraestruturas desportivas do Colégio e aludiu à parceria entre a Associação e o Colégio para a formação de um clube desportivo que se chamará Clube Colégio Militar.

0 9/1958, Martiniano Nunes Gonçalves, referiu que a Associação tem, entre outros objeti-

vos principais, a solidariedade e a intervenção na sociedade para fomentar e desenvolver os princípios e valores transmitidos no Colégio, defendendo o reforço da primeira através de diversos instrumentos, propondo um alargado conjunto de iniciativas, com rentabilização do espaço da Formação, muitas delas afloradas também em outras intervenções. Já quanto à segunda linha da sua intervenção, defendeu o envolvimento de não Antigos Alunos que assimilaram os valores do Colégio e o estabelecimento de protocolos com instituições que possam ampliar o nosso espaço de visibilidade, como forma de contribuir para a essência e a existência da Associação. O 204/1959, José Bravo Ferreira, deixou-nos as suas reflexões sobre o enquadramento de uma associação como a nossa no contexto mais alargado da evolução da humanidade, aludindo ao tipo de educação necessário para os mais jovens e ao maior envolvimento da Associação nesta matéria.

O 17/1967, João Barrento Sabbo, propôs o lançamento de um inquérito a todos os Antigos Alunos, independentemente de serem ou não sócios da Associação, com o objetivo de conhecer os seus interesses e anseios em relação à comunidade colegial e, em particular, sobre a introdução de mecanismos de participação assentes nas tecnologias de informação e quotas com valor livre.

O 568/1969, António Faria Meneses, com o profundo conhecimento que tem do funcionamento do Exército, defendeu essencialmente uma Associação mais virada para os Antigos Alunos, através do reforço do vínculo

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Histórias e Memórias

dos cursos, o apoio solidário e de natureza social, cultural e desportiva, com a projecção duma imagem de competência e meritocracia na sociedade, sem descurar a sua função de apoio e defesa dos valores do Colégio.

O 302/1972, eu próprio, propugnei por um afastamento da aparente tendência de intromissão da Associação no Colégio, operando a transformação da Associação num Club, com espaço físico, eventualmente o antigo Quartel da Formação (atualmente designado de PM 34), por me parecer que tal poderia providenciar a resposta mais consentânea, àquilo que são as perspetivas e interesses dos Antigos Alunos do Colégio.

O 456/1983, Marco Martinho Silva, defendeu que a Associação funcionasse como uma placa de ligação entre os Antigos Alunos, dos seus projectos, necessidades e competências profissionais, com a criação de um portal e programa de gestão com capacidade para gerir todas as interligações. Neste âmbito, sugeriu que se estudasse a viabilidade de desenvolver, designadamente, serviços próprios de saúde e de segurança social.

O 200/1987, Tiago Simões Baleizão, com a sua experiência de mais de 10 anos na Direcção, em diversas funções, destacou que qualquer decisão sobre o presente e o futuro da Associação está condicionada pela sustentabilidade financeira, na qual as quotas dos sócios poderão ter que assumir um peso significativo. Frisou que a viabilidade de uma Associação dinâmica e interventiva requer um maior envolvimento e compromisso de um número mais alargado de Antigos Alunos, sendo crítico a angariação e motivação dos mesmos. Finalizando, o 62/1963, Filipe Soares Franco, apresentou as razões que o tinham levado a decidir candidatar-se à Presidência da Direcção da Associação para o próximo triénio, dizendo que estava na hora de retribuir o muito que o Colégio lhe havia dado. Referiu na sua intervenção algumas das principais linhas de atuação que tenciona seguir, no caso de vir a ser eleito na próxima Assembleia Geral.

Luís Miguel Guerreiro Félix António (302/1972)

Histórias e Memórias

1. FOI HÁ 60 ANOS

Foi há 60 anos, mais precisamente no dia 25 de Junho de 1959, que a Escolta a Cavalo do Colégio fez a sua apresentação pública, por ocasião da festa de encerramento do ano lectivo de 1958/1959, em que o Batalhão era comandado por Luis Filipe Ferreira Reis Thomaz (176/1952). Para comemorar este aniversário, foi decidido, por acordo entre a Direcção do Colégio e a Direcção da nossa Associação, fazer um número especial da revista ZacatraZ, relativo à Escolta a Cavalo, cuja publicação deve ocorrer ainda no 1º semestre do presente ano. Espera-se com este número especial dar um contributo importante para a história da Escolta a Cavalo, tirando partido do facto de muitos daqueles que pertenceram à Escolta nos primeiros anos da sua existência estarem ainda entre nós e perfeitamente lúcidos.

O ano de 1959 não foi um ano assinalável apenas pela criação da Escolta a Cavalo. Nesse ano fizeram-se duas viagens de grande significado. Os Alunos finalistas, por altura da Páscoa, fizeram uma viagem de fim de curso ao Estado Português da Índia e os Alunos do curso seguinte, durante o Verão, na transição do 6º para o 7º ano, fizeram uma viagem até ao Brasil, onde se foi visitar pela primeira vez, o Colégio Militar do Rio de Janeiro. Para a época foram duas viagens extraordinárias. A viagem

à Índia já foi recordada nas páginas da ZacatraZ, o que não nos impedirá de voltarmos a fazer-lhe uma nova referência. Quanto à viagem ao Brasil será a mesma recordada com mais pormenor.

Ainda há 60 anos, deu-se uma ocorrência inusitada, caída praticamente no esquecimento. Em plenas férias grandes, um conjunto de Alunos perfazendo o efectivo de uma companhia foi mandado apresentar-se no Colégio, com o objectivo de tomar parte numa grandiosa parada militar, de recepção ao Imperador Hailé Selassié, da Etiópia (das terras do Prestes João). A missão foi cumprida e irá ser também aqui recordada.

2. OH ELSA!

No ano lectivo de 1958/1959 inaugurou-se o actual edifício do internato, que na altura era conhecido no vocabulário colegial como o “Colégio Novo”. Esta nova situação fazia com que andássemos num vai e vem permanente, sempre debaixo de forma, entre o “Colégio Velho” e o “Colégio Novo”. Este vai e vem não se dava usando o actual troço de estrada que liga as duas grandes paradas existentes, designadas por paradas Serpa Pinto (a do Colégio Novo) e Marechal Teixeira Rebelo (a do Colégio Velho, entretanto todo renovado) dado essa estrada na altura não existir. Apenas no ano lectivo seguinte ao indicado, foi aí aberto um estradão de terra batida, subdividindo os campos despor-

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Histórias e Memórias

tivos existentes. Essa «Avenida» de terra batida foi de imediato baptizada pelos Alunos com a alcunha que tinha sido atribuída ao então Director, de acordo com a grande imaginação sempre demonstrada pelo pessoal.

Dada a inexistência da referida «Avenida», marchávamos nas deslocações entre os dois “Colégios”, saindo dos Claustros por um estreito corredor que dava acesso ao Pátio dos Fâmulos, seguindo daí para o Jardim da Enferma, que era percorrido em toda a sua extensão, para passarmos depois pelos tanques do remo, que na altura estavam abandonados, e entrarmos na parada do “Colégio Novo”. No curto trajecto entre o Pátio dos Fâmulos e o Jardim da Enferma, passávamos entre o Pavilhão da Química e um conjunto de pequenas casas, onde habitavam alguns dos servidores do Colégio, entre eles um sargento, pai de uma menina famosa pela sua beleza, de seu nome Elsa, que a maior parte de nós nunca conseguiu ver.

O facto de sabermos que ali, tão perto de nós, morava uma menina bonita e que, ainda para mais, não se deixava ver, era motivo suficiente para pôr as nossas mentes juvenis, enclausuradas por vezes semanas seguidas no Colégio, a trabalhar

a elevada rotação. Essa elevada rotação produzia energia, que tinha de ter algum escape. O escape surgiu de imediato. Uma noite, quando íamos para o Colégio Novo, para o jantar, alguém viu a luz acesa numa janela da casa da menina, não conseguiu conter-se e soltou um sonoro brado «OH ELSA!». Foi o princípio do fim. A partir daí não havia turma que passasse a marchar por baixo das janelas da casa do sargento, que não soltasse o seu grito «OH ELSA!», o que punha os chefes de turma altamente nervosos, não fosse estar por ali algum oficial ou um graduado, que caísse em cima deles, por permitirem pessoal aos gritos nas suas turmas debaixo de forma. Com chefes de turma mais nervosos ou menos nervosos, o que é facto é que a situação perdurou até se ter passado a usar a «Avenida». Mesmo depois disso, quando algum Aluno isolado passava por aquele local mágico, não resistia a homenagear a menina com o grito da praxe. Imagino que a vida da família da menina tenha sido difícil durante aqueles tempos, só tendo descanso durante os períodos de férias. Terá servido de consolo à menina, a ideia de ter umas centenas de rapazes a homenageá-la em permanência.

Enfim, teria sido mais uma historieta colegial inofensiva, para cair no esqueci-

mento, não fosse ter-se dado um episódio extraordinário, largos anos mais tarde, quando um Aluno daquele tempo foi colocado como comandante numa dada Unidade militar. Como é norma em tais circunstâncias, teve de tomar rapidamente contacto com a vivência, a operação e os eventuais problemas da Unidade agora sob o seu comando, reunindo para tal com os oficiais responsáveis pelos diferentes órgãos da mesma. No final de uma dessas reuniões, o oficial «entrevistado» diz-lhe que sabia que ele era Antigo Aluno do Colégio Militar. O comandante confirmou, mas ao mesmo tempo estranhou aquela observação. Como resposta, o oficial faz esta espantosa apresentação «Eu sou irmão da Elsa». Ele sabia obviamente que esta apresentação valia mais do que um currículo de 20 páginas. A prova disso, é que o seu comandante até hoje não esqueceu o episódio.

OH ELSA!

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Retificações

Rectificações Zacatraz 213

Recebemos de Gonçalo Figueiredo de Barros (440/1967) uma mensagem, dirigida ao Director da ZacatraZ, com o texto que passamos a transcrever:

“Caro Nuno Mira Vaz,

Acabei de ler com o maior interesse o último número da Revista da Associação, de 2018. Agradeço a amabilidade da publicação, nas páginas 34 e 35, de um simpático artigo sobre o livro de meu Pai, Rui Manuel Figueiredo de Barros (62/1936) intitulado “Encontro com a minha Memória”, escrito fundamen-

A primeira, de pormenor, prende-se com a sua profissão: o meu Pai é Geólogo e não Engenheiro Geógrafo.

A segunda, de fundo, trata-se da autoria do livro que é exclusiva de meu Pai. Na verdade, diversamente do que é referido, ao contrário do livro “Para lá do Colégio Militar”, não fui co-autor. Desta vez, apenas assumi um papel meramente instrumental na revisão e ordenação dos capítulos.

Grato pelo interesse e atenção manifestados, desejo-te com amizade um Bom 2019

PS: Constatei da leitura do artigo sobre a Família Abrantes da Silva , págs 53-55, que, lamentavel e involuntariamente, omitimos a sua referência no mencionado livro “Para lá do Colégio Militar”. A todos, mas muito especialmente aos visados peço que transmitas as nossas desculpas e a promessa de reparação do lapso em eventual futura edição.

NOTA: Agradecemos ao Gonçalo Figueiredo de Barros as observações apresentadas, que permitem a rectificação de lapsos involuntariamente cometidos.

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©Foto Sérgio Garcia
(326/1985) ANTIGO ALUNO USA A BARRETINA

Os que nos deixaram

Gualdino Leite da Silva Matos (392/1926)

1974 e era Engenheiro Mecânico em Portugal, reconhecido pela Ordem dos Engenheiros da qual era membro efetivo.

Foi agraciado com várias condecorações nacionais e estrangeiras.

dignidade, progredindo serenamente na vida com a intenção clara e firme de ultrapassar todos os obstáculos com que se foi confrontando.

Faleceu no passado dia 11 de Janeiro.

Nasceu em Fafe a 19 de Setembro de 1914. Depois de ter feito os estudos primários em Guimarães, os secundários no Colégio Militar em Lisboa e os preparatórios militares na Universidade do Porto, completou o Curso de Artilharia na Escola do Exército em 1940. Frequentou a Universidade de Lisboa em preparação para o Curso de Engenharia de Material e Armamento na Escola Politécnica de Exército em Madrid, que completou em 1953.

Prestou serviço na Escola Prática de Artilharia, no Grupo de Artilharia Contra Aeronaves nº2, na Fábrica Militar de Braço de Prata (de que foi Diretor), na Escola do Exército (de que foi Professor), na Escola Prática do Serviço de Material (de que foi Comandante) e na Direção de Serviço de Material (de que foi Diretor).

Foi-lhe concedido o Título de Doutor Engenheiro de Armamento em Espanha em

Foi fundador e 1º Presidente da Assembleia Geral da Sociedade Portuguesa de Relações Públicas, foi um dos cinco membros da Comissão Luso-Brasileira da Sociedade de Geografia de Lisboa, publicou 32 artigos sobre Energia Nuclear e Energias Renováveis aquando da campanha para instalação de uma central nuclear em Portugal.

Colaborou nas Revistas Ultramar, Revista Militar e Revista dos Antigos Alunos do Colégio Militar.

Amigo da aventura, tirou o brevet de aviador em Moçambique, dedicou-se à filatelia e à pintura clássica, óleo sobre tela, tendo participado em várias exposições coletivas e realizado exposições individuais.

Casou em 1945, em Moçambique, com Maria Manuela Pery de Lind Limpo de Lacerda, teve 4 filhos, Luís Pedro (Técnico de Informática), Maria Isabel (Licenciada em Sociologia e em Ciências Sociais), João Filipe (Professor Universitário) e Manuel Carlos (Arquiteto). Teve 6 netos e 7 bisnetos. Fiel aos seus princípios, teve sempre presente o dever de missão cumprida com

Os filhos guardam com muito carinho o exemplo que nos deixa.

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Major-General Engenheiro Nasceu a 19 de Setembro de 1914 Faleceu a 11 de Janeiro de 2019 Os que nos deixaram

Os que nos deixaram

António Lobato de Faria de Oliveira Guimarães (65/1932)

Pediu-nos, muito simpaticamente, o Exmo Senhor Coronel de Cavalaria João Ribeiro Mateus, que lhe enviássemos umas palavras por ocasião do falecimento do nosso querido Pai, António Lobato de Faria de Oliveira Guimarães.

Embora filho de médico, entrou no Colégio Militar em 1932, ficando com o número 65. Por aí estudavam, à época, um irmão de sua Mãe, Francisco Maria de Lemos Lobato de Faria (205/1929-34) bem como um primo direito, Vasco Lobato de Faria Roncon (233/2633), que o tratavam, como todos na Família, pelo “petit-nom” de Ticas. Todos no Colégio assim o trataram também. E Ticas ficou para toda a vida!

O mais engraçado é que, segundo o que sabemos, a partir daí, todos os alunos 65 passaram a ser chamados de Ticas!

Amigo dos seus amigos, da sua Família, Marido, Pai, Avô e Bisavô extremoso, deixa-nos grandes exemplos e uma grande saudade.

O “Ticas” como geralmente era conhecido nas sociedades dos ex-alunos do Colégio Militar e da “sua” arma de Cavalaria, nasceu na Fortaleza de São Sebastião, na Ilha de Moçambique a 8 de Junho de 1921. Entrou para o Colégio Militar no ano lectivo de 1932, tendo ali terminado o curso em 1938. No ano lectivo seguinte foi admitido à Escola do Exército. Acabado o curso de Cavalaria, casou em 27 de Março de 1948 com a Senhora D. Rogéria Duran Moura Pinheiro na casa da Família (hoje Hotel Rural da Poupa) em Rosmaninhal, aldeia do concelho de Idanha-a-Nova.

Em Agosto de 1954, tendo eu sido promovido a alferes e colocado no Regimento de Cavalaria nº 8, em Castelo Branco, tenho o primeiro contacto com o então capitão Guimarães e outros oficiais, na sua maioria Antigos Alunos do Colégio Militar, o que iria facilitar a minha adaptação às realidades de oficial do Quadro Permanente, em muitas vertentes não ensinadas na Escola e que iria agora aprender na “tarimba” do dia-a-dia. Uma delas foi como desembaraçar-me a elaborar um “auto de averiguações” para que fora nomeado. Valeu-me nessa situação o empenho expontâneo do capitão Guimarães, para quem essa ciência se lhe tornara familiar nas diligências que já fizera em unidades da GNR. Para mim, foi um inestimável e paciente professor. Ainda recentemente, descobri algumas “chocas” redigidas pelo seu punho e que guardei, reverentemente, durante anos.

Por esse tempo recordo as suas duas filhas e um rapazinho que, anos depois, iria também entrar para o Colégio Militar (onde teve o número 376/60-64) infelizmente cêdo desaparecido.

Os anos passaram e o destino quis que só viessemos a rencontra-nos em 1971, quando, no Regimento de Cavalaria de Estremoz, enquadrámos o Batalhão de Cavalaria nº 3846, com destino à Guiné (Ingoré), ele já Tenente-coronel, como comandante e eu, major, como 2º comandante.

Foram dois anos muito duros. Ele adoptara para lema da unidade a divisa “Mais e Melhor” e tudo fez para impulsiononar os seus comandados a envolverem-se activamente nesse ambicioso projecto e a focarem-se no objectivo principal das nossas tropas: a melhoria das condições de vida da população autóctene fixada na nossa zona de acção. Estou a lembra-me do dia semanal em que a nossa fronteira com o Senegal era aberta para que as populações vizinhas pudessem beneficiar dos cuidados dos médicos e enfermeiros do serviço de saúde do nosso batalhão. E eles vinham, confiadamente, às dezenas, sem descriminação, relativamente às populações nacionais.

Muito haveria a dizer do convivio tão próximo com o coronel Guimarães, durante esses delicados dois anos. Contudo, posso resumir, em poucas palavras, que ele cumpriu e fez cumprir a divisa “Mais e Melhor”, muitas vezes com dolorosos momentos de amargura, como a perda de alguns dos seus “rapazes-meninos” - como ele os referia.

Uma vez terminada a comissão, foi justamente reconhecido pelo Comando-Chefe da Guiné.

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Ana Maria e Maria Margarida Oliveira Guimarães Filhas

O Batalhão terminou a sua comissão em 14 de Março de 1973 e, anualmente, por altura dessa data (já lá vão 45 anos) voltamos a reunir-nos e recordar os bons e os maus momentos vividos naquela saga, sob o comando (humano) do coronel Oliveira Guimarães. Este ano, infelizmente já sem a sua presença física.

A sua carreira militar haveria de ser encerrada no Estabelecimento Militar de Ensino em que, de menino se fez homem: o Colégio Militar, desta vez como subdirector (de 26 de Dezembro de 1973 a 01 de Outubro de 1975) cargo que desempenhou com redobrado empenho, como seria reconhecido superiormente.

A lei da vida ia fazendo o seu curso. A companheira de toda a sua vida faleceria a 22 de Outubro de 2018 e, nove dias depois, a 31, aos 97 anos e sem a presença da companheira de 70 anos, o nosso “Ticas” partiu.

Paz às almas de ambos e que Deus os tenha reunido para outra forma conjunta de caminhada.

Os que nos deixaram

Henrique Duarte Casquilho Barbosa

(426/1933)

Nasceu em Lisboa em 27 de Novembro de 1922, filho de oficial do Exército, entrou para o Colégio Militar em 1933, vindo posteriormente a concluir a licenciatura em Medicina Veterinária na Escola Superior de Medicina Veterinária (hoje Faculdade de Medicina Veterinária) da Universidade Técnica de Lisboa. Ingressou nas Forças Armadas, no quadro permanente dos Oficiais Veterinários do Exército, tendo atingido o posto de Coronel em 1974.

Durante a sua vida como Oficial Veterinário serviu em várias unidades mili-

tares nomeadamente Regimento de Artilharia Ligeira de Viana do Castelo, Regimento de Cavalaria 5 em Aveiro, Escola Prática de Engenharia em Tancos, Governo Militar de Lisboa, Hospital Veterinário Militar, Colégio Militar e Academia Militar. Realizou duas comissões, na altura Região Militar de Angola, no norte de Angola em S. Salvador do Congo e em Cabinda acumulando as funções militares com funções oficiais estritamente de caracter civil nomeadamente nos Serviços Veterinários provinciais nas referidas regiões. Na última comissão, na cidade de Luanda, chefiou os serviços veterinários militares em toda a província de Angola.

Foram-lhe atribuídos vários louvores e condecorações.

Faleceu no dia 24 de Setembro de 2018, deixando viúva a sua esposa Srª Dª Maria Berta Moreira Gonçalves Ferreira Barbosa, e quatro filhos, um também Antigo Aluno do Colégio Militar Mário José Ferreira Barbosa (96/1965) e três filhas também Antigas Alunas do extinto Instituto de Odivelas.

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João Martins Ribeiro Mateus (169/44) Coronel Médico Veterinário Nasceu a 27 de Novembro de 1922 Faleceu a 24 de Setembro de 2018

Os que nos deixaram

Afonso José de Albuquerque de Campos Ferreira (103/1942)

Tati era a alcunha como entre nós era conhecido, bom amigo e camarada de uma bondade e generosidade imensas, sempre disponível e aliando a isso uma permanente ironia sempre viva e oportuna até nas alturas difíceis. Nunca se queixava dos «azares da vida» pois ainda que brincalhão possuía uma enorme força de vontade, tolerância, tenacidade e paciência ilimitada. Fazia-nos bem ouvir a suas breves e graciosas intervenções, gozando com tudo, na sua voz serena e um pouco gaga. Era um dom pessoal que nos transmitia com alegria e franqueza. Vou relembrá-lo, começando por tentar retratá-lo, algo ironicamente como era seu estilo (sem entrar em inúteis detalhes), inspirando-me no início do poema «O Melro» de Guerra Junqueiro! Aí vai, pois:

O «Tati»!? Eu conheci-o… Era loiro, bom, reinadio, Cruzou os mares portugueses. Gostava de cozinhar E por vezes, tantas vezes, Era um Ás a gracejar. Hoje está num outro Mar Sem fim, calmo, menos mau Que esta «vida» em que vivemos

Sem sabermos «navegar»! Já partiu, uns tempos antes Do António, o «Bacalhau»… Na ironia eram ases, E eram sempre capazes De pôr toda a Malta a rir… Eram humildes, Audazes, Companheiros a valer. Mas tiveram de partir. Nós cá ficámos decerto, Sem jamais os esquecer, Neste passageiro «Deserto»!

Arre, bolas!... Basta de poesia, entremos antes na prosa. Não me atrevo, nem pretendo contar a sua vida em pormenor. Apenas um facto simples, mas que tão bem caracteriza a sua grandeza de espírito. Ele era então comandante do navio Lobito da marinha mercante (toda a sua vida foi no mar, mas apenas sentindo a guerra, bem por dentro e por fora, mas sem nada querer descobrir ou conquistar, servindo apenas, com coragem e brio).

Fui, sem avisar ninguém, visitar o Lobito (estava atracado no cais). Ele tinha saído por questão de serviço. «O senhor Comandante teve se sair. Só volta mais logo», disse-me alguém que o substituía, creio que o imediato e que teve a amabilidade de me mostrar todo o navio por dentro. «Quem devo anunciar quando ele chegar?», inquiriu. Sorri e disse-lhe: «Diga-lhe apenas que esteve aqui o 15 para o abraçar». Mirou-me, meio aparvalhado. «Só isso? Não me pode dizer o nome?» «Não», volvi. «Diga-lhe só isto: esteve aqui o 15 para abraçar o 103»

Saí e fui para casa. À noite, depois do jantar, vi com minha Mulher um pouco de televisão. Era ainda cedo, tocou o telefone. Atendi. Era a sua voz um pouco gaga, mas firme e decidida: «Olha lá, estás a brincar comigo, só me deixaste o teu número e não o no-no-me. Sei bem que és o Roberto, ‘ma-ma-caco de uma figa’. (Macaco era a minha alcunha). Pois amanhã quero convidar-te para cá vires jan-jantar uma boa paella da Tére

com o dedo deste teu amigo Afonso, o 103. Traz contigo a Tayan» (era a minha Mulher, amiga como irmã da sua Tére –Teresa, espanhola de gema e que foi grande bailarina de flamenco).

Por aqui podemos bem ver a grande amizade que nos unia e a sua franca disponibilidade e camaradagem e também como o número e a alcunha eram títulos importantes (para toda a vida), quase que sagrados para nós.

Bons tempos que não voltam, mas nunca esquecerei, meu bom amigo Tati. Não te esqueceremos nunca, exemplar camarada; tal como ao nosso 67/Bacalhau Repousa também em Paz como tanto mereces. Nós, cá em baixo gritaremos por ti, como por ele, o velho Zacatraz sentido mas nunca de despedida ou adeus, um Zacatraz de Esperança e Alegria: Aleluia! Até sempre, Tati, até breve.

E acabo, como comecei (lá vem a ‘maldita’ ou bendita poesia…) com estas duas quadras, simples desabafo meu, cá bem de dentro, do coração, única realidade que sempre me venceu e tanto me enche de Beleza e Verdade:

Que a morte é parte da Vida, Só quem é cego é que não vê. A morte trato-a por tu, A Vida, Vossa Mercê!

Dizem: «Só a morte é certa» Fresta apenas da janela, Podes ter a porta aberta… Vida, és Luz, entras por ela!

Bem hajas, Tati. Estás connosco porque revives em nós.

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AFONSO ALBUQUERQUE CAMPOS FERREIRA (103/1942, O TATI) ©Foto Leonel Tomaz

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Revista ZacatraZ nº 214 by AAACM - Issuu