Purgatório- em Prosa

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lia, deixando que, sem governo, ela se rebele como uma fera indomável e selvagem. Como teu pai, ávido por dominar outras terras, tens permitido que o jardim do império seja esquecido. Vem ver os Montecchi e Cappelletti, os Monaldo e Filippeschi, arruinados e temerosos do seu destino. Vem, ó cruel, vem ver o sofrimento de teus nobres. Vem para a tua Roma que chora, viúva e só, e que dia e noite chama: “Ó César meu, por que me abandonaste?” Mas vem ver como a gente se ama! E, se não tens piedade de nós, vem para te envergonhares de tua fama. É lícito pensar, ó sumo Jove, que foste na Terra por nós crucificado, que teus justos olhos não mais nos olham? Ou é parte de um grande plano que preparas para o nosso bem e que somos incapazes de compreender? Todas as cidades da Itália estão dominadas por tiranos. Mas tu, Florença minha, deves ficar contente com esta digressão que não te toca. Muitos têm a justiça no coração; pensam antes de julgar, mas a tua gente abre a boca sem pensar. Muitos recusam altos cargos, discretamente, mas o teu povo solícito responde, sem ser chamado: “Eu me submeto!”. Mas alegra-te! Tu que és rica, sábia e que vives em paz! Tua ordem e justiça são incomparáveis. No meio de novembro as leis criadas em outubro já eram. Quantas vezes mudaste lei, moeda, ofícios, costumes e governo, Ó Florença? Se recordas bem e buscas a luz, te verás semelhante àquela enferma que não consegue descansar no seu leito macio, mas sobre si rola para fugir da dor que sente.

Purgatório 19


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