PERDOAR O IMPERDOÁVEL
Você é capaz? Por Masataka Ota Vereador em São Paulo
No dia 30 de agosto de 2015, completaram-se 18 anos desde o cruel assassinato de meu filho Ives, com dois tiros no rosto. Perdoei seus algozes, os sequestradores, e ainda passei pela situação de receber um convite para ir à cerimônia de colação de grau deles, hoje advogados inscritos nos quadros da OAB. Daí surge a pergunta que me fizeram outro dia: você perdoou? O que é perdoar? Perdoar é esquecer? Não, jamais. Explico: perdoar é algo muito maior: é livrar-se do peso de carregar consigo algo que o consome dia-adia, mais do que aquilo que lhe infligiram como o pior dos males. Você não sabe e não entende o porquê, apenas sente que se livrou de uma tonelada nas costas. Talvez seja uma das mais poderosas experiências, única e intransferível, que um ser humano possa vivenciar. Na outra mão, alimentar-se do sentimento de vingança é, na verdade, deixar de viver a vida; melhor, é amarrá-la na existência do outro, objeto de sua vingança. Passei por isso e vi inúmeros outros homens e mulheres descreverem o mesmo sentimento. Perdi alguns anos de vida, e quase minha família, até chegar à conclusão de que estava prestes a me tornar o maior colecionador de perdas. Nós, brasileiros, somos um povo carente de heróis. Escolhemos um, de acordo com o momento e a conveniência. Somos movidos por ímpetos oportunistas. Passa a onda, passa o lampejo de mudar. Troca-se o herói e pronto! Retornam o conformismo e o oportunismo de transferir para outros a responsabilidade de mudar nosso amanhã. Esta aí, o porquê de sermos o eterno país do futuro. Tenho para mim que perdoar é um exercício de inteligência, da capacidade de se adaptar, de ser resiliente, enfim, de tocar a vida. Nunca disse que esqueci o que aconteceu comigo. Seria mentira. E, sinceramente, acredito que nós, brasileiros, já temos vivido muitas por tempo demais. Chegou a hora de perdoarmos o imperdoável e assumirmos a responsabilidade pela nossa história. Chega de viver de ilusão e dor. 22 l MENTECORPO&VIDA
Keiko Ota, agora como deputada federal e Masataka, como vereador, após a perda do filho, lutando para melhorar as leis do país
NOTA DO EDITOR DA REVISTA Este é “Caso Ives Ota”, como ficou conhecido. Trata-se do sequestro de um menino de oito anos e que foi morto, depois de reconhecer um dos criminosos, que era policial e fazia a segurança de uma loja da família na cidade de São Paulo- que trouxe para o país o conceito de lojas de variedades em preços populares, as famosas “ lojas de 1,99”. O fato se deu em 29 de agosto de 1997 e chocou o país.