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“eu sinto falta e de fato falta sinto falta faz sentido falta fatal faltam-me palavras faltam-me ânimo faltam-me falar de ti faltam-me nossas ideias e além da falta, a falta quem sabe faltem bikes que pedalem a lua ou faltem ciclistas que queiram pedalar até lá mas que não faltem-nos imaginação que não faltem-nos fôlego e empolgação o que agora impor... Falta se na falta de ter você faltou um pouco da minha alegria faltou um pouco do meu dia faltou-me um pouco de ti faltou-me ir até você faltou-me assoprar a brasa e deixar o fogo viver eis que faltou-me você, meu amigo irmão foi na falta do que fazer, que inventamos as nossas liberdades mas nada falta-me quando lembro-me de sorrir do que falamos e não faltou sobre o que falar não faltou amor, nem paz não faltou diálogos, nem “alô” não faltou discordar, nem concordar nao faltou ouvir, nem falar não faltou abraçar, nem olhar mas de falta, faltou-me.” EM MEMÓRIA DE JOSHUA R. LEHR, AMIGO COMPANHEIRO SONHADOR E PESSOA. Gustavo Alves Lara, Caloi 12 (@otaldegus) Músico Cicloativista Cosmopolita

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EDITORIAL APART WE FALL UNITED WE RISE Parte de construir uma cena reserva-se ao esforço de registrá-la. Em uma cidade como Curitiba em que se veem mais artistas que arte, onde temos tantas bicicletas, e ainda assim um número tão grande de acidentes fatais. Sentimos a necessidade de registrarmos nossa história, nós por nós mesmas/os. Movidas/os menos pela indignação de onde estão quem possa registrar a cena. E mais pela pergunta, o que nós podemos fazer para construir a cena? “Construir a história é narrá-la”, dizia H. Pirenne. Narremos então às histórias de alleycats, festas, shows, fixolimpíadas, coletivos, exposições, feiras e toda agenda contra-cultural que boa par-

Diego Prestes 20V

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Guilherme Costa 47x15

te de nós não apenas conhece como faz parte ativamente. Mas, quase sempre, sem nenhum registro além dos nossos celulares e algumas postagens nas redes sociais. Narremos as histórias de sobrevivência no trânsito, seja ao visitar um xaveco ou indo para o trabalho. Apenas nós sabemos a vitória de chegar em casa ileso após mais um dia de guerra. Marx dizia que os seres humanos produzem a sua própria história sem sabê-la. Nós sabemos. Mas não temos a ilusão de que ela será contada em algum lugar além da propaganda pra nos vender produtos, ou do filme holywoodiano estereotipando nossa cultura. Propomo-nos então

Heitor Oliveira 49x15

ao registro da nossa cena. A levantar e publicizar as demandas de quem está na rua todos os dias. Sejam eles de guerra, ou de glória. Ciclistas de Curitiba e do mundo, Uni-vos.

Capa: José Prendin Agradecimentos: Akio Nojima, Doug Oliveira, Gustavo Alves Lara (@otaldegus), Paulo Cesar Ferreira (@guumball_) e Pedro Klein. Contato: vmdl.zine@gmail.com vmdl.zine/ @hlbgfixedgear/

Roberto Lagarto 49x16

Victor Scaff 46x16


ÍNDICE 06 O MITO

09 CONHEÇA

ART ATTACK 10 17 ABRAosOLHOS FETICHISMO 22 28 CPCM 2017 EAGLE CRIT 33 40 CAIXAde FERRAMENTAS 5


O Mito

Fixêro

do

tradução: Roberto Lagarto fotos: Diego Prestes

Tradução livre de um texto do livro 42x12. The Cult of Fixed. Patrick Portter

Quem é O ‘Fixêro’? É a questão do momento que um monte de gente vai querer saber, tanto por questões nefastas, quanto benignas. Se quisermos acreditar nas definições nada amáveis da internet então o fixêro é um macho mimado de seus vinte e poucos anos com background influente, que nunca teve que crescer e gasta todo dinheiro do bolso em brinquedos legais e manias num esforço infinito pra parecer descolado. Cínicos dirão que o fixêro é um mito em processo de invenção pelas pessoas que querem vender coisas para crianças ricas: AS MARCAS! Mas vamos pegar um pouco mais leve porque a vida é muito curta pra ser tão cínico. Vamos assumir que as pessoas pedalam uma roda fixa porque é legal. Então, com certeza, estaremos mais perto da afirmação de que o/a fixera de verdade é alguém que gosta de bikes e de se divertir. Se isso for verdade podemos deduzir que o/a fixero/a não pedala apenas fixas. Uma olhada rápida pela cena vai reveler que a maior parte das pessoas que gosta de bicicleta, gosta de bicicleta. Alguns

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vão dizer que vieram pra Fixa a partir da BMX, tentando um jeito de envelhecer mais graciosamente. Alguns apenas tinham que tentar pelo passatempo. Seja qual for a rota, vários bicicleteiros vão simplesmente deixar sua Fixa na garagem junto com a Road, a Moutain bike, a BMX, a Clássica e a Tandem.

Isso trás uma questão interessante a tona. Se andar de fixa é como fumar maconha, então qual seria o equivalente ciclístico a usar heroína, crack ou cocaína? Cogumelos mágicos seria dar role de Penny Farthing?

O resultado final é que só existem dois tipos de pessoa que realmente precisam de uma ideia ‘fixa’ (desculpe) de quem Quanto aos e às jovens que são tão banais realmente é o/a fixêro/a. Essas pessoas e vendidos/as numa urgência desesperada são: Marketeiros e Haters. O resto de nós de ser “descolado/a” (sic). Eles e elas vêem consegue ficar bem feliz em existir num para o mundo das bicicletinhas com um gracioso estado em que a indentidade é coração impuro e devem ser destruídos um maravilhoso espectro de luz e sompelo Martelo de Thor pela sua impertinên- bras, um jogo para passar o tempo, mecia. Alternativamente esses jovens podem lhor que qualquer outro dogma inútil. apenas estar se divertindo também. Quem sabe? Talvez essa galera até tente outras Amen bikes também. A Cultura da Fixa tem nor- Então quem é O ou A fixêra? malmente sido comparada como uma porta de entrada para drogas mais pesadas. Às vezes é melhor não saber... 7


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Conheça seu

VIZINHO CICLISTA

Tratando de identidade dentro do ciclismo e de como a bicicleta acaba sendo parte do nosso dia a dia gostaria de apresentar o trabalho do youtuber, editor e também ciclista, Francis Cade texto: Heitor Oliveira fotos: arquivo pessoal

Cade em seus vídeos traz conteúdo de qualidade, não iremos vê-lo cortando coisas com uma faca quente por exemplo hahaha, há uma preocupação com a qualidade de imagem e som deixando a experiência audiovisual ainda mais interessante.

O que é mostrado no conteúdo é a sua rotina de treinos sozinho ou com a presença de alguns colegas, muitas vezes ao longo dos vídeos temos apenas Cade na frente da câmera, fazendo algum review de equipamento, trazendo alguma notícia ou então ele e mais alguém discutindo assuntos inerentes a bike

Tour de France e o Red Hook na edição de Londres e o Minet Crit mais recentemente, com olhos de espectador ou então como foi o caso da sequência de vídeos do RHC, entrevistando os atletas e perguntando sobre suas expectativas Além de compartilhar sua rotina as ve- para a corrida zes Cade cobre alguns eventos, como o Podemos muitas vezes nos identificar com as situações dos vídeos, os assuntos tratados são as vezes os mesmos que costumamos discutir em nossos círculos de amizade firmadas pela bike, outro motivo são as conversas francas que acontecem nos vídeos, a barreira que divide Cade o espectador é mínima. Se você é um consumidor de Instagram e Youtube com certeza vale o follow e inscrição. 9


Doug Oliveita @by.doug

Doug Oliveita @by.doug

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ART ATTACK


ART ATTACK

Doug Oliveita @by.doug

Doug Oliveira, cicloativista e fotografo. Conheรงa mais do seu trabalho: www.instagram.com/by.doug/

Pร GINA DUPLA CENTRAL O MIOLO DESTACAVEL

Doug Oliveita @by.doug

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Diego Prestes @diegozum

Diego Prestes @diegozum

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Confira mais fotos de Diego Prestes www.instagram.com/diegozum/

ART ATTACK


EAT SLEEP RIDE REPEAT

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Doug Oliveita @by.doug

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Abra os olhos para

o ciclista Brasil!

Brasil tem, em média, 32 ciclistas internados por dia devido a acidentes

texto: Guilherme Costa fotos: Doug Oliveira fonte: g1.globo.com Trinta e dois ciclistas são internados por dia no Brasil vítimas de acidentes. Muitas vezes nem a ciclovia é respeitada. A rede de ciclovias em todo o país cresceu muito nos últimos anos juntamente com a falta educação no trânsito. Os motoristas não respeitam ciclistas, não respeitam as marcações das ciclovias, muito menos as les que às regem.

ção grave. Pois bem, o Código de Trânsito Brasileiro diz que o motorista tem que ficar a um metro e meio de distância do ciclista em pistas ou em ciclofaixas. Mas tem motorista que nem cinco centimetros respeira, colocando em risco a vida dos ciclistas.

O último levantamento do Ministério da Saúde realizado em 2014 sobre acidentes de trânsito afirma que 1.357 ciAções de colar na traseira do ciclista ou clistas morreram em todo o país. No ano reduzir o espaço de condução aproximan- anterior em 2013, foram relatadas 1.348 do os bikers contra a calçada é uma infra- mortes. Mas e quando não há mortes?

Doug Oliveita @by.doug

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O gasto com ciclistas acidentados é alto. Em 2015, foram registrados 10.935 internações de ciclistas, acarretando em um custo de R$ 13,2 milhões ao Sistema Único de Saúde. No ano passado, em 2017, esse número aumentou, sendo registrado 11.741 internações com o custo aproximado de R$ 14,3 milhões. “Muitas vezes os motoristas acham que, então, a bicicleta não tem o direito de andar na rua, mas tem. Então, tem que ter uma

campanha educativa nesse sentido, ter ciclovia não impede ciclista de andar na rua”Raphael Dorneles, ONG Rodas da Paz. Sequer nas ciclovias os ciclistas conseguem pedalar direito. Em Curitiba, motoristas ignoram a faixa exclusiva. Caminhões, carros, motos e atletas de corrida usam o espaço a toda hora bloquando a real necessidade de ir e vir com segurança por parte dos ciclistas. Isso também acontece em São Paulo, Salvador e em

Estrutura cicloviária em cidades do Brasil 468km

São Paulo

450km

Rio de Janeiro

420km

Brasília 198km

Fortaleza

190,4km 103km

Rio Branco Belém

88,4km

Belo Horizonte

87,4km

Salvador

85,9km

Campo Grande

80,9km

Aracaju

67km

Vitória

47km

Porto Alegre

44,6km

Teresina

41,9km

Recife

41,6km

Florianópolis

41km

João Pessoa

40,7km

Cuiabá

39,9km

Manaus 6,9km Créditos: Rick Ribeiro | Regina Rocha Fontes: SP: CET (dez\2016); Prefeitura do Rio; DF: Semob (fev\2017); Belo Horizonte: BHTrans (jun\2016); Curitiba: Ippuc (set\2016); Porto Alegre: GPEM\EPTC (jan\2017); Belém: Semob (ago2016); Prefeitura de Vitória; Fortaleza: SCSP (jan\2017); Aracaju: SMTT (dez\2015); Rio Branco: RBTrans (jan\2017); Recife: CTTU; João Pessoa: Semob; Teresina: Semplan; Campo Grane: Planurb (jul\2014); Salvador: Transalvaor; Manaus: Seminf; Prefeitura de Cuiabá: (dez\2016); Florianópolis (abr\2015)

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Muitas vezes os motoristas acham que, então, a bicicleta não tem o direito de andar na rua, mas tem. Então, tem que ter uma campanha educativa nesse sentido, ter ciclovia não impede ciclista de andar na rua Raphael Dorneles, ONG Rodas da Paz.

diversas cidades que proveem da malha como: acessibilidade das vias, sinalização, alternativa de locomoção. Chegamos manutenção e materias utilizados para ao ponto que em Brasília, os motoristas contrução por exemplo. transformaram o espaço das bicicletas em estacionamento. “O motorista no Brasil infelizmente ainda não está preparado para conviver com O especialista em trânsito David Du- ciclista nas vias. Ele desrespeita, ele não arte acredita que é preciso investir mais se coloca no lugar do ciclista. As nossas em ciclovias. Por mais que as principaos ciclovias e ciclofaixas ainda são, na sua capitais do País apresentem uma malha maioria, construídas de forma precária, o cicloviária, ainda é preciso uma atenção que representa muito risco para o ciclisnas caracteristicas de implatação tais ta”, disse o especialista. 19


Doug Oliveita @by.doug

E o que os governos estaduais estão fazendo sobre todo esse problema de acidentes vs mobilidade? Promessas... e aqui no Paraná? O estado já é referência quando o assunto é a quantidade de ciclovias. Um novo projeto está implantando novos espaços e reformando os que já existem para que numero de acidentes envolvendo ciclistas sejam reduzidos, e o direito de ir e vir seja respeitado por todos.O Detran do estado do Paraná, no periodo que vai de 2009 até 2014, afirma que sete acidentes envolvendo ciclistas acontecem diariamente no Paraná, de acordo com o Departamento de 20

Trânsito do Estado (Detran), três deles aconteceram em ciclofaixas. A estimativa apresentada foi divulgada no primeiro semestre de 2017, considera os números registrados pelas Polícias Rodoviárias Estadual e Federal, da Polícia Militar e também das prefeituras. Conforme o levantamento do Detran, cerca de 74 ciclistas morrem por ano no estado. Além disso, a média é de 2.119 feridos a cada ano. E você, pedala de que lado? Da estatistica para fazer parte dos números ou em prol do direito de ir e vir?


MAO.INC Boné de ciclismo.

+

OLD STYLE

PARA SEU DIA-A-DIA MUITAS NOVIDADES EM 2018

@MAO.INC

APOIANDO O CICLISMO SEMPRE.

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Fetichismo da

BICICLETA

texto: Roberto Lagarto imgens: Victor Scaff

Fetiche e idolatria são formas como os Durante a década de 1950 o carro esseres humanos se relacionam com as teve diretamente ligado à venda de um imagens e com suas coisas. Se desenvol- modelo de vida, o modelo do bem-estar vo uma relação erótica com um objeto, social. Em conjunto com uma forte mopodemos supor que tenho uma relação ral religiosa vendiam o modelo da família fetichista e, o objeto, meu fetiche. Por nuclear com um carro na garagem. Era o outro lado, se desenvolvo uma relação auge do pacto fordista, da linha de prode adoração, dizemos que temos uma re- dução em massa, do boom da indústria lação idólatra, e o objeto, por conseguin- de carro. Essa pequena caixa de metal te, sendo Deus. O fetiche e a idolatria ambulante se torna a única possibilidaseriam, portanto, formas como os seres de de sair da caixa de concreto privada humanos relacionam valores subjetivos e chegar à caixa de concreto na qual sua como libido, adoração, identidade, etc. a força-de-trabalho é vendida para pagar objetos ou imagens. Tornando-os assim as duas caixas anteriores. Ou mesmo, objetivos. Começamos a acreditar terem acesso às outras possíveis caixas de uma valor intrínseco, e não um valor que atri- vida cada vez mais setorizada. buímos. O fetiche e a idolatria resolvem, ainda que Sendo as...o carro passa a funcionar não superficialsim, o carapenas como um meio rápido de mente, nosro passa a sa libido, ou funcionar locomoção, mas como um padrão de necessidade não apenas vida, um status social. de divindacomo um de ou memeio rápitafísica, e até mesmo nossa identidade do de locomoção, mas como um padrão na vida moderna. Fetiche seria então a de vida, um status social. Ele difere o ser relação de atribuir aos objetos à venda humano comum, do ser humano mediano um valor sobrenatural. Imputando-lhes e sem carro. Ele constrói a identidade daum valor para além de seu preço (apesar quele que o compra. E partindo do prinde um preço maior sempre vir embutido). cípio de que construímos e moldamos o

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Estado, a política e as relações sociais, tais como somos moldados pelas mesmas: o fetiche do carro constrói, além da identidade dos indivíduos de uma década, toda uma política e uma forma de ver o mundo. Por isso desde a mais tenra infância somos ensinados a “olhar para os dois lados da rua”, parar, olhar, escutar antes de atravessar. Apesar de 100% dos acidentes de trânsito ter veículos automotores envolvidos, somos nós, pedestres e ciclistas quem devemos prezar pela nossa segurança. Nos EUA cunhou-se um termo para aqueles que ousavam vivenciar a cidade e a rua como se as mesmas fossem destinadas aos seres humanos, Jaywalking. Numa tradução porca e livre, algo como “atravessar como um caipira”. Construída por aqueles enfeitiçados pela ilusão da chegada do ponto A ao ponto B cada vez mais rápida, a cidade torna-se palco dos carros. Os lugares que precisamos ir se tornam cada vez mais distantes, os pontos de encontro se tornam estacionamentos. A ironia é que, quanto mais pessoas usando carros, mais a cidade se molda através desse modelo e mais esse modelo se torna imprescindível, único, ou comumente dito “a melhor opção”. O carro torna-se parte

de você como ser humano. O objeto constitui sua identidade e não mais sua personalidade molda os objetos. A necessidade de dirigir é vendida como a liberdade de dirigir. Mas que tipo de liberdade de escolha tenho quando não há opções? Para toda força de ação haverá uma força de reação na física e no ser humano. Nesse contexto a bicicleta surge como a grande salvadora nesse apocalipse motorizado. Desde o Plano das Bicicletas Brancas dos Provos às bicicletas do Itaú (sic), a bicicleta aparece como alternativa a esse plano de cidade e de vida. De Lance Armstrong à Albert Hofmann, existe um ar mítico relativo a bicicleta. Diz-se que os povos pré-colombianos utilizavam a roda apenas para brinquedos e jogos, ignorando seu uso em transportes. Os tibetanos por outro lado resumiam seu uso a instrumentos de oração, para Matteo Guarnaccia, a bicicleta seria a síntese perfeita das possíveis utilizações da roda: brinquedo, transporte e meditação. Do ponto de vista simbólico a bicicleta é um instrumento de iniciação. Em toda iniciação há marcas, sejam os joelhos e mãos raladas, ou as canelas com hematomas quando ainda estamos aprendendo a se equilibrar nesse estranho instrumento de locomoção. Contudo é radiante perceber 23


Enquanto de carro todo o contato com o mundo é feito através dessa TV gigante chamada para-brisa, que só passa o mesmo programa: engarrafamento.

o próprio corpo entrando no automático, dominando os movimentos que antes lhe eram estranhos e agora são sincronizados. Percebe-se que o equilíbrio vem antes do movimento, que da estaticidade. “Assim como andar e fazer amor, andar de bicicleta está programado em algum ponto de nossos genes: Uma vez que se aprendeu, é impossível esquecer”. Pedalar alivia ansiedade, depressão e stress através da produção de endorfina. Ativa a circulação sanguínea e gera melhoria expressiva na memória e em atividades psicomotoras. Além de diminuir o risco de ataque cardíaco e auxiliando na prevenção de doenças cardiovasculares, osteoporose e diabetes. Acredito ser redundante colocar todas as vantagens de pedalar em uma publicação para ciclistas. Sem falar em todas as possibilidades sociais da bicicleta.

percurso seja ainda mais longo. Somos menos velozes, mas chegamos antes! A bicicleta favorece o contato humano. Enquanto de carro todo o contato com o mundo é feito através dessa TV gigante chamada para-brisa, que só passa o mesmo programa: engarrafamento. A bicicleta surge como símbolo de mobilidade urbana, direito à cidade e um futuro menos poluído.

Todavia, assim como o capitalismo tem em si o germe de sua própria destruição e ainda está vivão. A bicicleta tem em si todas as possibilidades de uma cidade melhor, mas não a fará por si só. Por mais que a propaganda do político que anda de bike, ou da mais nova start-up ecológica e empoderadora digam o contrário, apenas pedalar uma bicicleta não fará a cidade, ou mundo melhor. Não se trata aqui de negar todos os benefícios de pedalar na cidade, ou de deixar seu carro em casa. Queremos mais, queremos o mundo Frente ao carro podemos elencar como como o Cidadão Kane. Não temos a iluvantagens da bicicleta o espaço urbano são de que uma relação de compra possa ocupado. Uma bicicleta ocupa cerca de ¼ transformar um mundo baseado na troca do espaço de um carro quando em movi- de mercadorias. Além de que nossas demento. Se estacionado, um carro ocupa o mandas não cabem na caixa registradora espaço de 10 bicicletas. Apesar do gran- das relações de compra e venda. de fetiche do carro ser chegar do ponto A ao B o mais rápido possível, transfor- Não é nova a estratégia de cooptação mando todo o caminho num borrão, o de qualquer ideia que possa minimamentrânsito do dia a dia faz com que o seu te colocar em cheque esse método de 24


pensar a vida em sociedade. Talvez essa capacidade orgânica de esvaziar todos os nossos sonhos, colocar numa embalagem bonita, dar um preço muito maior que o seu valor, seja o grande super-poder do capitalismo. Longe de querer discutir se esse é, ou não o melhor sistema para se viver em sociedade (não é!) queremos focar no fetiche. Essa capacidade de realizar nossos sonhos, vender ideologias e políticas públicas em forma de mercadoria. Como vimos anteriormente, essa realização é superficial e incompleta. Para que sonhemos com mais mercadorias, as mesmas satisfazem ainda menos nossos sonhos e assim compramos mais. Assim, por mais que andar de bicicleta possa constituir nossa identidade como indivíduos, melhorar nosso bem estar e gerar uma pequena mudança no dia a dia, a bicicleta é só um objeto. Um ser inanimado sem nenhuma capacidade sobre-humana. Assim como vestir uma camiseta com bordão de movimento social muda estruturalmente as bases da opressão tanto quanto compartilhar corrente nas redes sociais. Fazer alguma atividade física, por melhor que atue na sua auto-estima, e melhore a sua percepção do seu corpo, não faz com

que a sociedade acompanhe necessariamente essa percepção. O fato de comprar uma bicicleta não necessariamente te empodera. Empoderamento, essa palavra tão em voga, é mais que um estado de espírito. É literalmente ter poder. Poder político, poder de voz. Mas entre o apocalipse motorizado e nossos sonhos virando mercadorias há um mundo a ser construído. Não sejamos fatalistas inertes, nem ingênuas. A mudança social não será conquistada por algum tipo de mercadoria. O mercado não pode nos oferecer nada que fuja da lógica de compra. Quando reproduzimos essa lógica para 25


outros setores da nossa vida é quando fetichizamos as coisas. Quando acreditamos que o spray da VOLVO para iluminar ciclistas era o que faltava para acabarem os acidentes envolvendo ciclistas. E não as milhões de toneladas de caixas metálicas ocupando toda a cidade produzida por essa mesma empresa. É quando acreditamos que podemos comprar nossa liberdade, ou mesmo terceirizá-la para outrem “mais qualificado” para administrá-la. Assim funciona a democracia representativa (que representa a quem mesmo?). No entanto estamos vencendo, pois nossos discursos estão sendo ouvidos. Mas sem ingenuidade, estão ouvindo principalmente para nos reduzirem a um conceito e nos venderem de volta. A perversão disso tudo é, não há mudança estrutural, centenas de nós ainda morremos todos os dias, nossos meios de transporte e trabalho

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são reduzidos a um nicho, política cool, ou mais um produto que não precisamos sendo vendido a um dinheiro que não temos. Não trazemos soluções prontas, apenas angústias compartilhadas. Não pretendemos trazer fórmulas, ou soluções altamente vendáveis. Sabemos que se organizar como grupo, debater e publicizar nossas demandas, pressionar por políticas públicas e se aproximar dos movimentos sociais são algumas direções possíveis. Então podemos aceitar esse prazeroso estado de espírito que nos preenche rapidamente após uma compra consciente e darmos nosso dinheiro para as pessoas que acreditamos estar mudando o mundo por nós. Ou podemos construir juntos um mundo para além do esvaziamento das nossas demandas e super-ocupação do espaço público pelo transporte privado. Podemos aceitar a pecha de nicho. Podemos nos fechar em guetos com aquelas que pensam como nós (trazendo a ilusão de que o mundo está mudando). Ou podemos pensar juntas em alternativas para além dos binarismos das relações de compra e venda. Podemos comprar o que nos dizem ser empoderador. Ou podemos ultrapassar o véu da ingenuidade, buscarmos e lutarmos juntos pelo poder para todos e todas. E, por experiência, sabemos que se formos de bike, iremos muito mais rápido. Ou como dizemos aqui na editoria: Apart we fall, together we rise.


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CPCM 2017

ou Campeonato Paranaense de Ciclo Mensageiro!

texto: Akio Nojima fotos: Doug Oliveira

3 anos se passaram, Fixolimpiadas 2014 Porto Alegre. Entre amigos, bicicletas e muita cerveja, os corações aceleravam com ideias de um primeiro encontro mensageiro do Brasil! 8 de outubro 2017 - 11:30 da manhã a largada foi dada, 13 mensageiros largam em conjunto - clássica largada le mans - cada um tem sua reação a contagem regressiva, alguns calmos nem se movem, apenas observam atentamente o manifesto, outros correm o mais rápido em direção a bicicleta, as respostas são infinitas. 9 de outubro é o “dia mundial do ciclo mensageiro” (se interessar: https:// messmedia.org/10-9-day/). Dia perfeito para organizar o 1º Campeonato Paranaense de Ciclo Mensageiro, mas segunda improvavél, dia 08/10 domingo foi marcado, 1 mês antes criei o evento online para me comprometer com a organização. Acredito que foi decisivo para o evento sair da mente e tomar espaço nas ruas. 1993 Berlim recebe a primeira edição do CMWC (Campeonato Mundial de Ciclo Mensageiros), e desde essa data o evento vem ocorrendo anualmente em diversas 28

Dia mundial do Ciclo Mensageiro Campeonato Mundial de Ciclo Mensageiros


cidades ao redor do globo. (Mais infos: http:// messarchives.com/CMWC.html). Reunião anual da família mensageira do mundo todo! Seguindo o CMWC existem campeonatos menores/regionais de mensageria, como NACCC (North America Cycle Courier Championship), ECMC ( European Cycle Messenger Championship), ACMC (Australia Cycle Messenger Championship), CBMDF (Campeonato de Bici Mensageiros de D.F.), CNBC (Campeonato Nacional de Bicicmensajeros de Colombia) e agora do CPCM (Campeonato Paranaense de Ciclo Mensageiros).

A intenção maior é agregar cada dia mais gente no Campeonato e em toda a cultura que ele envolve, mas como a organização não era uma coisa muito clara na mente, a versão Paranaense foi a possibilidade de testar a dinâmica do evento numa versão menor, beta, preparadas para que todos os erros acontecessem, entender os acertos, e sempre melhorar. A internet, nossa grande amiga, disponibiliza vários materiais sobre o campeonato. Existe um manual colaborativo de como organizar um Campeonato de Mensageiros, 93 páginas de diversas pessoas que já organizaram um evento similar, dando suas dicas do que funcionou e o que não funcionou, instagram dos eventos que estavam ocorrendo no ano também foram de grande ajuda para aprender um pouco mais. Uma breve explicação do funcionamento da prova. Simular um dia de trabalho de um ciclo mensageiros (o que depois se tornou uma grande questão, como é o funcionamento da mensageria no Brasil e mundo afora?). No início da prova o competidor recebe uma folha chamada de manifesto, na qual se encontram diversas entregas (endereço de coleta e seu respectivo endereço de entrega). Ele deve completar todas as entregas para pegar o manifesto seguinte, cada entrega possui uma pontuação específica relacionada a distância/complexidade da entrega. Ao final da prova o competidor que tiver a maior pontuação leva o título de campeão. Nessa primeira edição do CPCM já foi testado diversos manifestos, 3 manifestos comuns (pontuação mais baixa, você tinha que completar obrigatoriamente todas as entregas do manifesto para pegar o próximo, a entrega não envolvia nenhum objeto, apenas assinaturas na coleta e entrega) e 3 manifestos especiais (pontuação 29


maior, horários específicos de coleta, tempo limite de entrega, e eram objetos a serem levados). Foram 9 checkpoints distribuídos no centro da cidade de Curitiba, o que nos leva a outra questão. Os campeonatos geralmente utilizam um percurso fechado para a prova, por questão de segurança e ser um circuito inédito (competidores de fora da cidade não ficam em desvantagem sobre os competidores da cidade sede). O CPCM por questões de facilidade teve a prova um circuito aberto, dentro das ruas da cidade, com transito, pedestres, sinaleiros …. (por isso os checkpoints foram liberados com antecedência da prova).

todos que se comprometeram a ajudar no evento estavam lá, preparados.

Foram 13 inscritos, 2 mulhere, 4 de fora do estado (POA e BNU). Foi fantástico ver pessoas que viajaram para participar do evento. Mostra que o interesse de um encontro mensageiro no Brasil já existe a tempo e ainda corre entre o pessoal! Fiquei na praça a prova toda, que terminava às 14:00 em ponto. Cada minuto de atraso acarretava num desconto de 5pts. Mensageria é pontual, estimar e conhecer seu tempo era fator crucial para a prova! Os competidores iam e vinham, entregando e coletando novos pacotes, suando e se divertindo. Eu queria muito estar na 08/10 - 9:00 da manhã - Pç. Nossa bicicleta com a cabeça louca de entregas, Senhora de Salette, toldo, algumas mas foi lindo ver a galera correndo para cadeiras e mesas, manifestos e fitas de todos os lados. Mensagens corriam no sinalização tomam forma no gramado da celular dos checkpoints, algumas dúvidas, praça, nada complexo nem exagerado. comentários, entregas especiais. O que ficava na mente era se todos os 1º (5) LINCOLN - 485 pts checkpoints estariam prontos as 11:30 2º (10) RODRIGO - 470 pts 3º (420) BARBARA - 445 pts quando a largada fosse dada. 10:00 os 4º (7) KKT - 440 pts amigos começam a chegar para retirar 4º (1206) JULI (BNU) - 440pts os números de inscrição e observar o 5º (67) RAFA - 405 pts mapa de Curitiba com a posição dos 6º (109) ISRAEL - 385 pts 7º (142) BETO - 305 pts checkpoints. Todo momento checando o 8º (31) JOÃO (POA) - 245 pts celular para ver a situação dos voluntários 8º (20) FOGAÇA (BNU) - 245 pts que estavam nos pontos pela cidade, 9º (0) SHELDON (BNU) - 225 pts tudo em ordem para a largada, o que deu 10º (12) XIMA - 170 pts 11º (13) CEZAR - 25 pts uma grande alegria no coração, ver como

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Colocação geral da prova em 2h30min de prova. A prova inicialmente tinha 2 categorias, locais e competidores de fora, divido em fem/masc (que se tornou um fator de discussão bem interessante após os resultados finais). É um jogo mental, muito mais mental que físico. A estratégia a ser empregada, sequência de coletas e entregas, avaliar bem os tempos de cada entrega e os tempos dos manifestos especiais. As pontuação similares foram

erradas, ou completamente amassados foram desconsiderados. O corpo e a mente perde sentido quando no frenesi da pedalada se instala. Alguns desses erros custaram a vitória ou empates no resultado final. Jogo de calma e paciência. 07/02 - um dia antes - Bazar do Czar e Alleytrotsky. Foi um sincronia de datas, quando estava elaborando a possibilidade de organizar o CPCM conversei com alguns amigos, já tinha a intenção de fazer um evento no dia anterior da prova, aquela de sempre jogar um pouco mais de lenha no fogo, aquecer as pernas para o próximo dia. Quando joguei a ideia para o Lagarto, tudo se resolveu na hora, já existia a intenção de organizar um alleycat nessa data, comemoração do centenário da Revolução Russa. As coisas sempre funcionam com troca de ideias e pensamentos positivos. Dai a coisa só foi crescendo, rolou o Bazar do Czar, marcas independentes da cidade e dos conhecidos! É muito legal ver que a cena abrange uma grande galera, e ver todos unidos é sempre o motivo de organizar os eventos!

construidas de formas muito distintas. Alguns competidores se focaram mais no manifesto especial, enquanto outros estavam focados no manifesto normal. E chegaram a pontuação muito parecidas. Contabilizar os pontos depois da prova 2017 foi um ano que quase não organizei foi demorado, recontagens para checar nenhum evento, ajudei em algumas os pontos foram efetuadas umas 3 corridas da galera que vem organizando vezes… Manifestos com assinaturas e movimentando a cidade, mas além

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disso foi um ano parado para mim, rolou o CPCM, que foi o gás total de evento, nunca tinha organizado algo tão “grande” e “complexo”. que envolvesse tanta gente, e que tivesse um nome ou uma força além da corrida. Era um marco, foi um marco, um primeiro suspiro da mensageria unida no Brasil?! Não sei haha, mas muita gente comentou e se interessou. O movimento foi feito. A largada foi dada. Foi um ano complexo que precisaria mais tempo para refletir e escrever sobre. Mas digo que esse evento deu muito calor no meu coração! 08/10 - 16:00 depois do término da prova rolou rango, cerveja, musica, e tudo que a mensageria pede. Enfim, 2018 tem Brasileiro, 2019 tem movimentação para um Latino Americano. Na sua cidade tem ruas e pessoas que andam de bike. E idéias na cabeça nunca faltam.

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Apoios do CPCM: - Katsukazan - Curitiba Messenger - Kosobo Co. - Cernunnos Bike Shop - YUF - Mao.Inc - Capish - Veganera - Marcel MEC bike - Anker Pedal Straps - Mobilibike - Viva la Vegan - Camomila Vulgar - Toni Rack’s - Radio Fantasma - lowlife - Öus Brasil - KuritBike Cicloturismo Urbano - Azazel Bikes - VeloClub Curitiba - BikeHandling - Casa 102 - Smelly Boyz - Eleven Messenger Bags - Hell Lane Fixed Crew - Rainbow Alleycat


eagle Eagle criterium Dia 9 de Dezembro de 2017 aconteceu o Eagle Criterium no Estacionamento de uma grande loja de departamentos que não quis anunciar na revista. A organização do evento ficou por conta do coletivo Rainbow Team em parceria com a Eagle Bikes, uma marca nacional de bicicletas fixas que tenta se estabelecer no mercado. No melhor clima faça-você-mesma o evento já gerava uma grande ansiedade, pois, dessa vez, contaria-se com apoio de uma marca grande e a identidade visual da corrida estava impecável.

Um final de semana de aprendizado.

texto: Roberto Lagarto fotos: Gumball

cional campeonato de subida em frente a pastelaria Juvevê. Uma pastelaria gordurenta, com cerveja relativamente barata e uma tiazinha ranzinza no caixa. E, o melhor, uma lomba pouco movimentada em frente. No melhor estilo x1 foram feitas chaves até o campeão final, o Holandês Voador, Geert Giullian Strijker, que levou 39,95 golpes de premiação das inscrições que não tinham valor fixo. (sem trocadilhos).

Sábado de manhã, chegou o grande dia. Agora a coisa passaria do amadorisNo dia anterior, como de costume na ci- mo entre amigos e veríamos uma grande dade sorriso, aconteceu o esquenta para corrida patrocinada por uma marca que a prova principal. O esquenta foi o tradi- deseja se estabelecer no mercado nacio33


nal. Curitiba, a cidade mais fria da história tando organizar uma prova com poucos da humanidade, corroborava pro aumen- recursos e uma outra na lojinha. to de expectativas e amanhecia com sol. Pelo menos era o que esperávamos. Algumas expectativas foram completamente frustradas, e com razão. Foram Logo pela manhã a primeira surpresa, o pessoas de mais de 5 cidades diferentes, local destinado ao evento aparentemente de longe, e nem tão longe assim que distinha sido levemente reformulado. O que puseram de seu tempo e dinheiro para seria um estacionamento inteiro, acabou vi- um evento que ficou aquém do ofertado. rando meio estacionamento. A correria pra varrer a pista, reformular o trajeto e colo- Mas superado, ou melhor resignado as car as (poucas) grades de contenção e fita frustrações, 43 manos e 16 minas tentapara delimitar a pista acabou atrasando a ram fazer o final de semana valer a pena

checagem das bikes, que acabou atrasando as inscrições, que atrasou as baterias de qualificação, e a partir daí parecia um efeito dominó numa grande cascata de desastres e imprevistos que mais parecia um episódio de desventuras em série. A marca que assinava o evento havia terceirizado a produção do mesmo ao Rainbow Team, e, ao que parece, devido a correria e dificuldades de se fazer um evento de grande porte, não houve uma reunião de instruções e demandas. Era claro, pra quem estava no evento, que pareciam haver duas equipes: Uma ten34

e se dispuseram a colocar ácido láctico em suas coxas e darem o seu melhor na competição. Talvez essa seja uma das coisas mais incríveis do ciclismo: Apesar de ser um esporte individual e competitivo é, depois do skate, o esporte com o maior senso de coletividade que conheço. Sendo seu maior inimigo você mesmo. E talvez seja essa a lição ser aprendida, se há alguma lição nessa sucessão de eventos aleatórios entre o nascimento e a morte. Nosso maior inimigo talvez seja nós mesmas, e nossa ambição maior que nossa capacidade. Ou como diria a gran-


de filósofa chamada mãe: o olho maior que a barriga. Logo no começo das provas pude perceber que algo estava estranho. Pelo microfone nosso amigo Ênio Satan berrava os retardatários que haviam sido ultrapassados. Demorou alguns segundos pra que eu entendesse, mas não havia a tradicional motinha a frente do primeiro lugar (ou recebendo uns berros da campeã da cat 2 feminina na fixolímpiadas 2016 de: PODE ACELERAR!). Isso deixava a prova ainda

ou o que você decidir chamar. Com um pouco de trabalho parte da pista conseguiu ser iluminada para as finais. Que finalmente (sem trocadilhos) iria acontecer. Algumas atletas decidiram não correr devido a pouca visibilidade da pista. Outros decidiram que “se é pra morrer, eu digo bora”. E assim a prova continuou ocorrendo com alguns voluntários que se dispuseram a por seus carros para (tentar) iluminar a pista. Algumas quedas, tanto

mais perigosa, em conjunto com as curvas fechadas feitas com fitas de sinalização.

de pessoas como de energia ocorreram. Felizmente nenhuma das atletas se feriu gravemente. Um destaque para Heloísa E apesar da cidade sorriso, contrariando Rosa, que caiu uma vez e tentou continuseu feitio, ter sorrido durante boa parte ar a prova, mas na segunda vez (e no mesda tarde e nos presenteado com um dos mo lugar) desistiu. Afinal, dois é bom, três únicos 4 dias de sol por ano que temos já é demais. E para o Guilherme Akio que por aqui, os atrasos ocorridos pelos im- em meio a queda, deu uma estrelinha, e previstos fizeram com que a prova se es- continuou correndo pra fora da pista afim tendesse até bem além do nosso querido de não engrossar ainda mais o angu que e sumido sol se pôr. Infelizmente a prova já estava fervendo. não havia sido pensada para ocorrer sem luz natural. Deixando o que já estava difí- Mas pra não dizer que não falei de flocil, ainda mais complicado. Aí dale amiza- res. A prova em si, naqueles momentos de, jeitinho brasileiro, heroísmo, burrice, em que a adrenalina bate, a garganta ras35


ga de gritar, as coxas queimam, a respiração pesa e tudo ao seu redor se emudece, foi insana. Em todos os sentidos da palavra. Apesar de perigosa Diego Mendes e Gustavo Matos travaram uma batalha épica digna de David e Golias. O Mendes é conhecido na cidade pelo seu foco e determinação. Daqueles tão determinados que sua concentração comumente é confundida com arrogância. Talvez por isso, ou por estar sofrendo pra fechar a passagem pra um magrelo de Sunburst enquanto pedalava uma linda Cinelli a galera ia ao delírio a cada ataque que o Gus realizava. No final, assim como no livro sagrado, venceu David, ou melhor Gus Matos, levando o terceiro lugar na cat1. E Mendes aplaudiu, porque o ciclismo é isso, feliz quando ganha, mais feliz ainda quando superamos limites. Os segundos e primeiros lugares ficaram com Fogaça e André Andrade, mais conhecido como Blumenau, ou sortudo-do-caralho, já que, além de levar um frameset pelo primeiro lugar, ganhou uma bike inteira novinha no sorteio que rolou entre participantes e expectadores. Na Cat 2 o pódio ficou com Marcelo Leitão, Thiago Ribas e Eduardo Rebelo em primeiro, segundo e terceiro lugares respectivamente. Outra coisa maravilhosa de se ver foi o grande número de meninas competindo. Dezesseis garotas se arriscaram e deram tudo de si. A Cat 2 ficou com a papa-tudo cicloativista e artista Maria Clara a.k.a. Cacaut que saiu engolindo todo mundo até sobrar apenas três competidoras e mantendo sua posição até o final da prova. Adri Masson e Maíra Kaline ficaram em segundo e terceiro respectivamente. Na Cat 1, representando a messageria Blumenauense Denise Delastra ficou com o primeiro lugar. Os segundos e terceiros lugares da cat 1 feminina ficaram 36

com Carla Fracchiolla e Erica Harumi. Após algumas quedas de energia, a aparelhagem da banda que iria tocar queimou. Fazendo com que os car-

roceiros bicicletistas da Taco Rat em débito com o público que ansiava por um bom stoned rock pra lavar a alma. Já diria o grande poeta da nossa geração, cada escolha é uma renúncia, e Curitiba, essa ingrata, já havia dado o sol. A sorte pra que tudo ocorresse bem, apesar do despreparo, ficou faltando. Após algumas confusões de onde estaria a colocação final das competidoras e competidores, ocorreu a prova de trick, e infelizmente a prova do rollo não ocorreu. Matheus Tide e Jessé Silva presentearam nossos olhos com algumas plasticidades um tanto quanto confusas de se entender na fixa e acabaram levando quase toda a premiação entre bar spins, fish’n’chips e trackstands.


Akio e Rafael Leal compareceram. Sendo este último o único a completar a prova. Eu não vi, estava muito cansado. Mas se está no Strava, aconteceu, né? Confira abaixo os relatos de dois dos nossos riders e suas visões como Espectador e Competidor respectivamente de como foi o evento. Curitiba cerca de 27ºC logo pela manhã, raro. O evento por mim e por tantas outras pessoas aconteceria.

...pontos altos do evento com certeza foi a grande quantidade de pessoas que se deslocaram de cidades vizinhas...

​ omei pra mim um pedaço da ansiedade T de colegas que iriam satisfazer suas posições sociais no seleto grupo de ciclistas, competindo, mas ao mesmo tempo me senti tranquilo, pois apenas assistiria e observaria de perto o grande espetáculo das bicicletinhas sem freio, tão estranhas aos olhos de clientes da Havan que estacionaram seus carros (o evento aconteceu em um estacionamento a céu aberto).

Ao final, os guerreiros e guerreiras que aguentaram bravamente lotaram a Rua São Franscisco a fim de aproveitar a promoção de chopp e batata promovida pelo bar Golden Era; Socializar entre os turistas e locais que compunham parte dos competidores, público e organização do evento; E trocar uma ideia, fazer um balanceamento, e, por que não, aprender um pouco com isso tudo? Reza a lenda que no outro dia aconteceu o “Fuga Sunrise” organizado pela marca local, Katszukazan, onde os incansáveis bicicleteiros se encontrariam às 4h20 da manhã e repetiriam um percurso de 11km por dez vezes, completando assim 110km antes do meio dia. Tiago Gotia, Guilherme

O cronograma do evento não seguiu o ritmo das atividades, e confesso que em certos momentos perdi noção do que estava acontecendo no momento, sol a pino e cerveja gelada na cabeça, o restante do pessoal também não se importava ou fingia não se importar. Alguns pontos altos do evento com certeza foi a grande quantidade de pessoas que se deslocaram de cidades vizinhas, ou nem tanto, para prestigiar, mostrando o quanto temos público e também o quanto temos que de certa maneira “agradar” esse pessoal. Estando fora da competição talvez seja um modo diferente de analisar o evento, sem a adrenalina, preocupação e até para alguns medo, de estar aguardando para entrar na pista, seja para estreiar ou para o momento de notoriedade em que tanto treinaram. Diego Prestes 37


Em corpo de quem participou do evento como competidor posso dizer que foi um tanto quanto frustrante, a divulgação, a arte, a clareza do cronograma, e os prêmios deram ao evento porte e credibilidade, atraindo atletas de vários níveis do ciclismo. Porém, contudo, todavia, tratava-se de um evento que tinha tudo pra ser interessante até acontecer. Cronograma atrasado, pista mal sinalizada, percurso muito curto, sem moto, fatores que foram se agravando conforme caía a noite. Nas voltas de reconhecimento alguns atletas estavam tendo uma série de dificuldades nas curvas, do pedal pegando no chão até a falta de técnica nas curvas. De certa forma a corrida em si não pareceu ser a dona da prioridade no dia, aparentemente foi “um pulo maior que as pernas” da organização que não conseguiu entregar tudo o que prometeu e tudo que nos fez esperar. Heitor Oliveira

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,,,não conseguiu entregar tudo o que prometeu e tudo que nos fez esperar.


E por último e não menos importante, o voluntariado, formado pelo pessoal do Rainbow Alleycat, pessoal que se esforçou o dia todo para poder da melhor forma possível contornar os imprevistos do evento gerados pela falta de organização que em partes deixava-os de mãos atadas

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texto: Marcos Paese desenhos: Victor Scaff Hoje ensinaremos a esticar sua corrente sem nenhum acessório alem da sua inseparável chave 15. Manutenção básica na sua bicicleta garante menos acidentes inesperados.

Primeiro soltaremos as duas porcas da roda traseira, sem tira-las totalmente.

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Essa posição evita se sujar (muito), e garante controle sobre a bike mesmo sem apoio.

Puxe a frente da roda contra o lado esquerdo do quadro (você poderá repetir daqui o movimento caso fique muito esticada).

Segurando a roda aperte a porca esquerda. Olhando por tras da bike, alinhe a roda ao quadro puxando ela para o lado direito.

Com o tempo você conhecerá melhor sua bike e qual o ponto ideal da sua corrente. Dificilmente algum fixero se recusará a te ajudar, nem precisa conhecer a criatura, mas cuidado uma hora ou outra você realmente estará sozinho então é bom apreder logo. E finalmente, só apertar a direita bem forte.

Sim, existem videos ensinando a usar bolinha de tênis ou garrafa pet

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vmdl.zine@gmail.com 42


ANUNCIE vamos trocar umas idĂŠias

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