A Alteridade Digital no Processo de Criação em Arquitetura

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vinicius juliani pereira


UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO

Vinícius Juliani Pereira

A ALTERIDADE DIGITAL NO PROCESSO DE CRIAÇÃO EM ARQUITETURA

São Paulo 2016



Vinícius Juliani Pereira

A ALTERIDADE DIGITAL NO PROCESSO DE CRIAÇÃO EM ARQUITETURA

Monografia apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie para a obtenção do título de bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Orientador Arq. Ms. Luiz Alberto Fresl Backheuser

Banca Examinadora Arq. Dr. Eduardo Sampaio Nardelli Arq. Ms. Victor Calixto

São Paulo 2016



À Luiz, Marli, Ingrid e Bárbara À Olga e David À Nely e Antonio.



AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Ms. Luiz Alberto Fresl Backheuser pelo incentivo e confiança desde os primeiros dias de orientação. Ao grupo de pesquisa TPED – Teoria e Projeto na Era Digital, em especial ao Prof. Dr. Eduardo Sampaio Nardelli por me apresentar aos caminhos da tecnologia digital na prática de arquitetura. Aos colegas Aline Maria Franca Cruz Nogueira, Jaqueline Silva dos Santos e Rodolfo Rodrigo do Nascimento Biller, por cinco anos de aventuras dentro da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Às colegas Gabriela Meyer Torres e Jéssica Cavalcante Schüssel, por ensinarem a incrível arte de viver. Aos professores Alessandro José Castroviejo Ribeiro, Adhemar Carlos Pala, Carlos Alberto Coelho, Celso Moraes Franco, Daniela Cristina V. Getlinger, Gilda Collet Bruna, Guilherme Lemke Motta, José Luiz Tabith Júnior, Maria Teresa de Stockler e Breia, Paula Raquel da Rocha Jorge, Renato Carrieri Júnior, Ricardo Ruiz Martos, Roseli D’Elboux, Ruth Verde Zein, Sonia Prieto, Tacao Kageyama, Vólia Regina Costa Kato; por aulas inesquecíveis. À equipe do PortoFabLab e Ateliê Experimental (ECPS), Juliana Harrison Henno, Tiago Pessoa, Mayara Polizer, Nori Figueiredo e Rodrigo Lobo; por cada Paçoquita, conversas e planos, e por me reapresentarem a arte. Aos colegas Ana Paula Minomo, André Iwashita, Andressa Gildin Acherboim, Ariela Giuli, Beatriz ‘Pudim’ Mathias, Bruna Castro, Bruno Kenji Yassuda, Carolina Sabino, Danilo Di Polito, Debora Pereira, Denise Capalbo, Eduardo Luisi Paixão Campolon-


go, Erika Yumi Tamashiro, Ezequiel Shoeji Oguma, Fernanda C. Zotovici, Giovanna Leone, Grazielle Beranger, Isadora Riciopo, Juliana Trama, Lais Gerle Tonso, Larissa Bichuete Munhoz, Leonardo Gobbi Ferreira, Letícia Becker Savastano, Lucas Dybwad Fossa, Mariel Marques, Maurício Matias, Natalia Campilongo, Victor Alonso da Silva, Vinicius Bressan, Vinicius Quirino; por incentivarem minhas loucuras, embarcarem em conversas inspiradoras, e construírem um futuro brilhante para cada um. Aos meus pais, Luiz e Marli, por um intercâmbio chamado viagens de fim de ano, pelo meu primeiro dia de aula em que eles disseram “Nós vamos dar um jeito”, e por mostrar como ser forte. À minha irmã Ingrid, por ser a inspiração artística da minha vida, por receber meus livros, e por mostrar que apenas nós podemos fazer nosso futuro. À minha irmã Bárbara, por todos os resumos pré-vestibular, pelos esquadros na prova específica, e por mostrar como amar sua profissão. Obrigado.




Alteridade: “natureza ou condição do que é outro, do que é distinto. ” Criação: “atividade conceitual de formulação de uma ideia que pretende ser expressa de forma visual ou através de uma ação. ”



ÍNDICE

INTRODUÇÃO

1

CENÁRIO

3

A FERRAMENTA DO ARQUITETO

7

Processo de projeto sob o viés da ferramenta Primeira geração Segunda geração ARQUITETURAS DIGITAIS

27

Modelos de Design Formações topológicas Design paramétrico Design responsivo Design generativo Design evolutivo Design performativo Arquitetura Algorítmica Processo Digital x Estilo Universal EXERCÍCIO DE PROJETO

45

Vazio Urbano na Região Central da Cidade de São Paulo Script 01 Território e Contexto Ensaios de ocupação Script 02 Objeto Arquitetônico Projeto Considerações Finais CONCLUSÃO

73

BIBLIOGRAFIA

77


14 _ introdução


INTRODUÇÃO

O fazer da arquitetura sofreu mudanças consideráveis relacionadas ao emprego de ferramentas digitais de desenho, principalmente com a popularização dos computadores pessoais. Atualmente passamos por um período de transição, entendendo as reais capacidades de cada tecnologia e suas aplicações dentro da produção de arquitetura. O distanciamento entre o ensino da arte (filosófico e holístico) e o ensino da ciência e tecnologia (fundamentada na exatidão matemática), pode justificar

“Da arquitetura renascentista com a perspectiva e a visão antropocêntrica do mundo, atravessamos o projeto moderno, dominado pelo determinismo nas relações entre meios e fins, e agora nos vemos diante das complexidades da visão sistêmica e do paradigma digital. ” (NATIVIDADE, 2010)

Os textos que seguem buscam problematizar a inserção da computação no fazer de arquitetura. Partindo da análise da interferência das ferramentas disponíveis no processo criativo do arquiteto, pretende-se discutir o papel da máquina (computador) no processo de projeto. Pela primeira vez se faz possível questionar o tradicional modus operandi da arquitetura (CORREIA e GOMES, 2009).

1 _ introdução

a falta de entendimento de ambas as partes sobre a relação estreita que se pode estabelecer entre o processo de criação e a programação.


2 _ introdução


CENÁRIO

A sociedade tem se organizado de maneira inédita nas últimas décadas, remodelando-se frente às mudanças de comportamento geradas pela implantação de novas Tecnologias de Informação e Comunicação (NARDELLI, 2007). A computação se faz presente no cotidiano automatizado em que vivemos. A interação física entre humanos começa a perder espaço para a rápida interação digital em rede (VASSÃO, 2015). A relação entre homem e máquina é visível no dia-a-dia da pós-metrópole onde a grande maioria das pessoas carrega em seus bolsos minicomputadores chamados smartphones. A dependência pelo ciberespaço1 não parece poder ser freada assim como a globalização não pode ser desfeita (CHU, 2006). A complexidade presente no mundo supera a capacidade natural humana de processamento de informações. Existe um encurtamento de prazos, e as medidas são convertidas em unidades de tempo. A cidade complexa contemporânea “é o espaço da interação não local, das comunidades online, da telefonia celular como fato banalizado [...]” (VASSÃO, 2015). Percebemos o mundo a nossa volta através dos sistemas que temos acesso. Nossa percepção do exterior na chamada Era Digital não é natural e sim transmitida por uma sobreposição de códigos de máquinas que interferem no comportamento espacial humano (PICON in SYKES, 2013).

1  “[...] ambiente digital da tela do computador que estendido à rede de interconexões mundial de computadores” (LEVY apud NATIVIDADE, 2010). É o “espaço”, não físico, onde se encontram as informações compartilhadas em rede, uma espécie de realidade paralela digital, tão complexa e repleta de camadas como o mundo real propriamente dito.

3 _ cenário

Podemos indagar que, ao contrário do pensamento que classifica como ‘relações artificiais’ as comunica-


ções contemporâneas (redes sociais, mensagens instantâneas), as consideradas ‘verdadeiras interações’ também são artificiais. A comunicação humana não é natural, é estruturada em um sistema de código2 (FLUSSER, 2007), uma linguagem artificial (COATES, 2010) criada com o objetivo de transmitir informações, sejam mensagens, fatos históricos, ou até uma intencionalidade poética. O desenho técnico bidimensional, principal suporte para a realização da arquitetura desde os primórdios da profissão, é uma abstração geométrica em forma de código. Um código composto de símbolos que representam elementos arquitetônicos ou vistas que jamais poderão ser experimentadas por um usuário (PICON in SYKES, 2013). Dessa forma, não cabe argumentar que o advento do digital desmaterializa a arquitetura, já que o distanciamento entre concepção e construção é intrínseco à disciplina desde meados do séc. XV. A arquitetura é uma resposta construída das relações sociais, e, portanto, deve ser um produto baseado no contexto em que tais relações acontecem. A tecnologia é um produto cultural (LUCE, 2009), de uma cultura baseada em relações codificadas e rápidas.

4 _ cenário

Podemos identificar novas organizações de trabalho dentro de uma sociedade baseada no compartilhamento de informações. A dinâmica de um escritório de arquitetura passa a não centrar os esforços na geração de material gráfico e sim na difusão de conhecimento e habilidades (BURRY, 2011). A novidade está na estreita relação entre a ideação e materialização que encontramos no processo digital, capaz 2  “[...] um código é um sistema de símbolos. Seu objetivo é possibilitar a comunicação entre os homens. Como os símbolos são fenômenos que substituem (‘significam’) outros fenômenos, a comunicação é, portanto, uma substituição: ela substitui a vivencia daquilo a que se refere. ” (FLUSSER, 2007).


de desafiar as instancias tradicionais estabelecidas entre as disciplinas da construção civil (PICON in SYKES, 2013).

5 _ cenário

As arquiteturas pensadas pelas últimas gerações de profissionais já não são mais passíveis de representação no plano cartesiano de uma folha de papel. Está se desenvolvendo uma categoria inédita de objetos com alto nível de complexidade (NARDELLI, 2007) concebidos com o aporte de tecnologias digitais capazes de viabilizá-los.


6 _ a ferramenta do arquiteto


A FERRAMENTA DO ARQUITETO

“Architects build what they could draw.” (MITCHELL, 2001)

PROCESSO DE PROJETO SOB O VIÉS DA FERRAMENTA

Seria muito impreciso tentar fixar uma data ou período da adoção do desenho dentro da arte. Para a cultura ocidental, a arte como a entendemos hoje começa a ser desenvolvida a partir da antiguidade greco-romana. Entretanto, os impérios milenares do Oriente e os povos pré-colombianos na América Latina já apresentavam avanços relevantes quanto as técnicas, materiais e suporte para suas representações. Cada cultura desenvolveu suas características particulares dentro do campo do desenho, sendo a representação gráfica figurativa, ainda, a forma mais eficaz de transmitir uma informação. A arquitetura sempre esteve associada a noção de desenho, principalmente quando pensamos que a forma de um edifício não passa da transcrição mate-

7 _ a ferramenta do arquiteto

O desenho como forma de linguagem existe desde os primeiros homens, que registravam acontecimentos do seu dia-a-dia nas paredes de cavernas. O fato do desenho permear o desenvolvimento da raça humana estabelece uma ligação genética com a linguagem figurativa (BELLARDI, 2014). É uma forma de registro histórico e transmissão de informação antes da sistematização de qualquer idioma.


8 _ a ferramenta do arquiteto

rial de uma geometria tridimencional, que em algum momento anterior, foi idealizada graficamente a fim de transmitir as intenções de seu projetista aos responsáveis pela construção de fato. O papel do arquiteto esteve em constante transformação desde a era medieval. Sempre mais próximo a noção de representação gráfica dos edifícios do que a construção deles. As ferramentas da arquitetura são associadas àquelas destinadas à representação dos objetos arquitetônicos (NATIVIDADE, 2010), dessa forma, a evolução da arquitetura está intimamente relacionada ao desenvolvimento do desenho e seus suportes. Não existem indícios de que o desenho era utilizado como suporte para a criação dentro da arquitetura até o Renascimento. Antes, as decisões de projeto eram tomadas em função de um plano geral e tipologias estabelecidas por mestres construtores. É pos-

1. Épure da Torre Sul, encontrado na cripta da Catedral de Bourges. [Fonte: LUCE, Kristina M. Revolutions in parallel: The rise and fall of drawing in architectural design. University of Michigan, 2009]


sível identificar três tipos de desenho relacionados à construção durante o séc. XIII, na Idade Média: o épure – um gabarito em escala real gravado em pedra ou massa semelhante ao gesso [Figura 1]; o sketchbook – um rascunho reduzido em pequenos livros de desenho, onde eram retratados esquemas de construção [ Figura 2 e 3]; e o desenho de fachada – uma elevação que tinha como objetivo explicar a ornamentação e suas relações com o edifício (LUCE, 2009).

2 e 3. Páginas do Scketchbook de Villard d’Honnecourt [Fonte: LUCE, Kristina M. Revolutions in parallel: The rise and fall of drawing in architectural design. University of Michigan, 2009]

A posição do arquiteto-mestre de obras começa a sofrer as primeiras mudanças conceituais durante o Renascimento. Em seus escritos sobre arquitetura, Leon Battisti Alberti1 determina que fosse chamado de arquiteto “aquele que souber por meio de correta e maravilhosa Arte e Método, com o Pensamento e a Invenção conceber e, com a Execução, levar a cabo todas aquelas obras [...]”, elevando a função do arquiteto a uma posição mais teórica dentro do proces1  O paradigma albertiano (separação entre o ato de desenhar e o de construir): o trabalho do arquiteto ficou mais intelectualizado, mais teórico e criativo, no lugar da prática no canteiro.

9 _ a ferramenta do arquiteto

Uma forma eficaz de discernir a evolução do desenho do período Gótico à Renascença, é a adoção da tríade planta, corte e elevação (LUCE, 2009). A característica das construções dentro do estilo Gótico ainda era baseada em experiências medievais, onde o mestre construtor seguia gabaritos e tipologias bem-sucedidas de construção que serviam como modelos para assegurar a uniformidade da modulação e repetição de peças (NATIVIDADE, 2010). O mestre organizava os planos de construção sem possuir uma noção exata de como ou o que seria erguido ao final, colocando a “criação” do projeto como tarefa divina, e ele apenas um interlocutor entre a vontade de Deus e a construção, se isentando de grandes responsabilidades sobre o edifício (LUCE, 2009).


so de projeto (NATIVIDADE, 2010). Nesse período (Renascimento), acontecia uma separação entre o que seriam consideradas artes maiores e artes menores. O primeiro grupo seria formado por atividades tidas como eruditas e vinculadas ao pensar (música, literatura, etc.); enquanto as artes menores se referiam ao emprego da força mecânica humana (escultura, arquitetura, etc.). Uma possível interpretação que pode ser feita dos escritos de Alberti é que o mestre renascentista estava interessado em contribuir para que a profissão do arquiteto não fosse rechaçada como uma arte menor. Todavia, a introdução do paradigma albertiano foi fundamental para o desenvolvimento teórico da disciplina.

10 _ a ferramenta do arquiteto

Podemos estabelecer uma conexão entre as determinações sobre o uso da representação gráfica ortogonal do italiano Alberti (LUCE, 2009) com o resgate renascentista de conceitos estabelecidos na Antiguidade Clássica. No tratado greco-romano mais antigo de que se tem notícia, o arquiteto Vitrúvio já estabelece a forte ligação entre a arquitetura e o domínio da geometria, campo do conhecimento que acabara de ser conceituado.

“A representação do espaço em perspectiva criou novo instrumento mediador entre sujeito e realidade. Uma fração do espaço é capturada pela janela perspéctica e representada no plano através da sobreposição de diagonais às coordenadas cartesianas para ordenar objetos e posicioná-los estaticamente, congelados no tempo. Assim, o espaço é descrito cientificamente no campo da abstração matemática. Esse novo método de representa-lo é revestido de tecnologia. ” (NATIVIDADE, 2010).


A retomada e aprofundamento nos estudos sobre a geometria primitiva durante o Renascimento faz nascer as primeiras experiências em desenhos de perspectiva, culminando em um novo avanço técnico dentro do processo de criação e consequentemente, da construção. A adição do desenho em perspectiva à tríade ortogonal abrira um novo campo de experimentações formais dentro da concepção espacial das edificações. Com o desenvolvimento do desenho como forma de criação, as representações dos edifícios começam a tomar maior complexidade em relação ao fato de que agora se fazia necessário uma concepção completa do edifício, o que culminou na adoção da escala reduzida para que a representação coubesse nas mídias disponíveis no período (NATIVIDADE, 2010). A fragmentação de desenhos em função da escala pode ser vista como um avanço para a época, mas ao mesmo tempo, em função da representação de detalhes construtivos, a fragmentação isola determinadas áreas do projeto; as alterações realizadas em determinado ponto vão interferir no conjunto, e para

11 _ a ferramenta do arquiteto

4.Ilustração de ferramenta para construção de perspectivas, Albrecht Durer – 1525/ Fonte:<http:// www.imj.org.il/exhibitions/2011/EsterhazyCollection/EsterhazyCollection_German. html >


que as mudanças sejam notadas seria necessária uma atualização completa dos desenhos, onde, muitos pormenores seriam perdidos podendo até acarretar problemas construtivos – “[...]perda da noção do todo, desagregação das informações[...]” (NATIVIDADE, 2010).

12 _ a ferramenta do arquiteto

A representação gráfica dentro do projeto de arquitetura vai sendo aperfeiçoado e sistematizado ao passo em que novas teorias sobre geometria são estabelecidas, como a geometria descritiva ou mongeana (NATIVIDADE, 2010). O posicionamento albertiano do arquiteto distante da obra faz com que a linguagem gráfica arquitetônica ganhe um sistema de regras próprio, a fim de que os desenhos pudessem ser interpretados por qualquer profissional com treinamento adequado em desenho técnico.

5.Ferramentas analógicas de desenho técnico/ Fonte:<http://dic. academic.ru/dic.nsf/ brokgauz_efron/11351 8/%D0%A7%D0%B5%D 1%80%D1%87%D0%B5 %D0%BD%D0%B8%D0 %B5>

“Os métodos de projetar o espaço tridimensional numa superfície plana são estabelecidos por convenção; o uso da cor, a abstração, a simplificação do objeto representado, e a escolha de características reprodutíveis são todos baseados em convenção. É necessário aprender a linguagem convencional da pintura, a fim de “ver” uma imagem, assim como é impossível entender o que é dito sem saber a língua. Este aspecto convencional, tradicional de pintura cria em grande parte as condições para o próprio ato de nossa percepção visual. Como a tradição se acumula, a imagem pintada se torna um ideograma, uma fórmula, ao qual o objeto retratado está ligado por contiguidade. O reconhecimento passa a ser instantâneo. Já não se vê uma imagem” (JAKOBSON apud MITCHELL in NATIVIDADE, 2010).



A colocação da arquitetura como uma tarefa mais abstrata, afastada do canteiro de obras, permitiu que a disciplina caminhasse por um período mais especulativo (NATIVIDADE, 2010). É sabido que os neurotransmissores relacionados às mãos, existem em maior número no córtex cerebral do que os de qualquer outra parte do corpo (BELLARDI, 2014), portanto o desenho é encarado como um registro da concepção mental do arquiteto, uma rápida expressão gráfica das ideias.

14 _ a ferramenta do arquiteto

Desde a queda de um raio em 1564, que expôs um fragmento de grafite, em uma região rochosa na cidade de Borrowdale na Inglaterra, até a produção em larga escala de lápis em madeira por Kaspar Faber na Alemanha em 1761 (BELLARDI, 2014), os instrumentos de desenho passaram por pequenas evoluções e muitos aperfeiçoamentos. Muitas das ferramentas mecânicas de que se tem registro, eram suporte para a elaboração de formas geométricas perfeitas. Foi a partir de meados dos anos 1960, que, “[...]pela primeira vez em cinco séculos de domínio do paradigma albertiano[...]” (NATIVIDADE, 2010) a disciplina podia observar experimentações realmente disrruptivas. Os estudos de Peter Eisenman colocam em destaque operações formais bem definidas e descritas para a obtenção de resultados espaciais classificados como arquitetura. Apoiado em teorias de linguagem (sintaxe, gramáticas, etc.), ele define leis e princípios que estruturariam um novo processo de produção de sua arquitetura (MONEO, 2008). Mais nitidamente notada a partir dos anos 1980, a introdução do digital na prática da arquitetura é intensificada com a popularização dos computadores domésticos e a difusão da rede mundial de Internet em 1994, ampliando o status tecnológico do período (NATIVIDADE, 2010). As novas relações sociais

6.Museu Guggenheim de Bilbao, Frank Gehry Architects/ Fonte: <http://artreport.com/ discovering-francesco-clemente-at-the-bilbao-guggenheim/>


“Enquanto as máquinas de primeira e segunda gerações – as máquinas mecânicas e as de telecomunicações, respectivamente – funcionavam como extensões da capacidade física humana, os computadores – máquinas de terceira geração – são máquinas capazes de processar informações, podendo atuar como parceiros no ato de pensar. Assim, a história da tecnologia é a história do aumento das capacidades humanas [...]. ” (NATIVIDADE, 2010). 2  Apesar de o processo de criação de Frank Ghery ser baseado em esculturas e modelos em papel, a transcrição dessa abstração artística para o computador e posterior racionalização de peças para a construção requerem alta tecnologia.

15 _ a ferramenta do arquiteto

apontavam para novas demandas a serem solucionadas pelo arquiteto. Em 1997, o Museu Guggenheim de Bilbao, do escritório do arquiteto Frank Gehry, torna-se o primeiro edifício a ser viabilizado digitalmente2 (NATIVIDADE, 2010).


A arquitetura ampliou seus domínios do paisagismo a programação e inscrição de códigos de programação. A necessidade programática foi substituída pela experiência espacial do usuário: agora ele é personagem ativo. A arquitetura continuou a responder as necessidades da sociedade, com foco na pluralidade e multidisciplinaridade (VIDLER, 2005).

Primeira geração

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A primeira geração de arquitetos digitais3, com experimentações a partir dos anos 1960, estavam interessadas em propor uma arquitetura que funcionasse como sistema (NATIVIDADE, 2010). Obviamente, muito do que se propunha tinha relação com os avanços tecnológicos4 da época, extremamente ligados aos avanços mecânicos e desenvolvimento das telecomunicações.

7.Projeto de arena esportiva, Luigi Moretti / Fonte: <http://www.danieldavis.com/a-history-of-parametric/>

1939 – Luigi Moretti – Apesar de historicamente estar localizado antes dos experimentos da década de 1960, esse foi o primeiro registro oficial da experimentação projetual com múltiplos parâmetros. Um conjunto de projetos para estádios e arenas esportivas em que ele considerava aspectos econômicos da construção, associando a curvatura das arquibancadas para o melhor aproveitamento do ângulo de visão do espectador. Os primeiros estudos de Moretti não foram fruto de meios digitais e sim da aplicação analógica de algoritmos matemáticos na descrição de geometrias complexas (TEDESCHI, 2014). 3  Profissionais que utilizam ferramentas e processos digitais no desenvolvimento de projeto, propondo novas teorias e abordagens dentro do estudo de metodologias 4  Por tecnologia podemos entender como sendo o conjunto de “técnicas, conhecimentos, métodos, materiais, ferramentas, e processos usados para facilitar a solução de problemas. ” (NATIVIDADE, 2010).

8.Ivan Sutherland demonstrando o funcionamento do SketchPad / Fonte: <http:// w w w. d a n i e l d a v i s . com/thesis-ch1/>


1960 – Steve Coons e Larry Roberts – Desenvolvem um sistema primitivo semelhante a um algoritmo executável que construía perspectivas (NATIVIDADE, 2010);

9.Capela da Academia de Cadetes da Força Aérea dos EUA/ Fonte: <http://www. dequalized.com/ post/61210338378/ construction-on-the-us-air-force-academys>

1963 – Ivan Sutherland – Criou o Sketchpad, considerado o primeiro software CAD inventado. Possuía diversos avanços tecnológicos e conceituais como: interface gráfica pensada para o usuário; interação direta através de desenho com uma caneta stylus; interação através de uma programação de baixo nível de complexidade estabelecendo regras que controlariam as propriedades geométricas dos objetos; além da discussão do desenho digital aplicado às artes (NATIVIDADE, 2010); 1963 – SOM (Skidmore, Owen e Merrill), EUA – Capela da Academia de Cadetes da Força Aérea dos Estados Unidos, Arq. Walter Netsch e sistema de cálculo computacional Field Theory, baseado em geometria euclidiana (NATIVIDADE, 2010);

10.Estudos matemáticos de Lionel March para o plano urbano de Whitehall Fonte: http://www. nexusjournal.com/the- n e x u s - c o n fe r e n c e s / nexus-2002/135-n2002-march.html

1964 – Christopher Alexander – Publica Notes on the synthesis of form, livro que discute aplicações computacionais no processo da arquitetura. Com uma abordagem cientifica, Alexander buscava a identificação e a separação do problema em entidades menores, para que a complexidade tratada fosse melhor avaliada no momento de tomada de decisão dentro do projeto. Ele pretendia diminuir a “interpretação, intuição e arbitrariedade em favor da racionalidade na tomada de decisão” (NATIVIDADE, 2010). 1964 – Conferência “Architecture and the Computers”, Boston – Onde Walter Gropius discursa de forma caute-

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1963 – Arq. Bruce Graham e Eng. Fazlur Kahn, trabalham em um projeto de arranha céu que requeria uma infinidade de cálculos estruturais. Nesse momento o SOM adquire seu primeiro computador (NATIVIDADE, 2010);


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11.Descrição do funcionamento da interface da Flatwriter / Fonte: <http://unit23d.blogspot.com.br/2013/03/ p2-a r t-o f-inha bita tion-constructing. html>


losa em relação ao uso de ferramentas digitais.

“Parece que estamos sempre errados quando fechamos a porta muito cedo para sugerir novas potencialidades, sendo muitas vezes enganados pela nossa inércia natural e aversão à necessidade de transformar os nossos pensamentos. Não sendo familiar ao vasto novo campo de sistemas de computador, eu quero ser cauteloso. Ainda acredito, se olharmos para as máquinas como ferramentas potenciais para encurtar os nossos processos de trabalho, que elas poderiam nos ajudar a libertar o nosso poder criativo [...] O que não posso prever ainda é um método viável para o arquiteto ou designer media de usar essas ferramentas no momento em que elas são necessárias. A ênfase será, certamente, na formulação inteligente das perguntas a serem respondidas pelo computador. Será que vai ser necessário formar uma nova profissão dos assistentes de arquitetura para a finalidade de articular os problemas a serem resolvidos na linguagem adequada do computador?” (ROCHA apud NATIVIDADE, 2010).

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1965 – Cambridge Lionel March e Leslie Martin, Londres – Whitehall Plan, um plano urbano que estabelecia as formas geométricas e as relações de interação


entre cada uma delas, decodificando propriedades físicas de cada objeto arquitetônico para o processamento em um computador (NATIVIDADE, 2010); 1967 – Bruce Graham junto a IBM desenvolvem e implementam no SOM uma rotina CAD chamada BOP – Building Optimization Program, o que podemos considerar os primeiros passos para a formulação do sistema BIM – Building Information Modelling (NATIVIDADE, 2010); 1971 – Yona Friedman – Criou o conceito para a chamada Flatwriter, projeto que funcionaria como um sistema de combinações em que o usuário poderia customizar sua habitação, dentre as soluções e regras de combinações estabelecidas pelo arquiteto (NATIVIDADE, 2010)

20 _ a ferramenta do arquiteto

A partir da década de 1970, autores como Nicholas Negroponte, começam a estudar a aplicação da ferramenta digital não mais como um replicador da capacidade motora humana e sim como “assistentes inteligentes” (NATIVIDADE, 2010). Fica claro nesse momento que, para transcender a utilização do computador como mera ferramenta de simulação analógica, era necessário estudar como se estrutura o processo cognitivo do arquiteto no ato de projetar.

“Tal colega não pode ser o presságio de aposentadoria dos profissionais, mas sim um provocador da imaginação do arquiteto, apresentando alternativas de formas possíveis não visualizadas ou não visualizáveis pelo designer humano” (NEGROPONTE apud KOLAREVIC in NATIVIDADE, 2010).


De meados dos anos 1970 até o fim da década de 1980, “a crise do projeto moderno” também viria a atingir as pesquisas relacionadas à tecnologia (NATIVIDADE, 2010). O clima geral de insatisfação com as soluções modernas e a desconfiança na tecnologia que produzira grandes embates bélicos, fez com que os esforços na aplicação de ferramentas digitais na arquitetura hibernassem até a proliferação dos computadores pessoais no começo da década de 1990. Durante esse período, novas aplicações eram lançadas para os chamados PC – Personal Computer. É nessa época em que a primeira versão do software AutoCAD para sistema DOS era lançada. (NATIVIDADE, 2010).

A popularização dos sistemas CAD até o final daquela década, fez com que se tornasse quase como obrigatório o domínio dessa ferramenta a quem interessasse ingressar na profissão. Pela semelhança com o processo analógico – e muitas vezes colocada como “prancheta virtual” (TEDESCHI, 2014) – e pela eficiência na produção e alteração de desenhos, quando comparada ao processo de desenho técnico à mão, as ferramentas CAD conquistaram um enorme espaço dentro do fluxo de projeto em escritórios do mundo todo. Sendo responsável por muitas das insatisfações de profissionais não versados na utilização de um computador, essa ferramenta popularizou também uma visão engessada e, por vezes, rígida da máquina (computador). Obviamente, um sistema

21 _ a ferramenta do arquiteto

Ao passo que a jovem indústria de software abastecia os estúdios de animação com soluções em modelagem 3D, a arquitetura começava, aos poucos, a se apropriar dessas ferramentas que tanto mexiam com o imaginário artístico dos profissionais arquitetos na produção de imagens digitais e modelos virtuais. O ano de 1992 marcou o início da difusão de software de desenho assistido por computador: era lançada a versão 12 do AutoCAD (NATIVIDADE, 2010).


que se propõe simular o gestual humano na tela de uma máquina computacional dos anos 1990, seria extremamente mecânico – um processo braçal em que o cérebro quase não é utilizado (LAWSON apud NATIVIDADE, 2010).

Segunda geração Durante os anos 1990, uma nova geração de arquitetos estava interessada na exploração da ferramenta digital associada ao processo criativo (NATIVIDADE, 2010). O estudo e formalização de um processo de projeto ganha destaque no momento em que se aceita que as operações digitais de manipulação da forma não poderiam ser reproduzidas pela mão humana.

22 _ a ferramenta do arquiteto

Operações baseadas em geometrias associativas e o aprimoramento apresentado por softwares de modelagem 3D começam a desafiar a capacidade imaginativa dos arquitetos (NATIVIDADE, 2010). A experimentação dentro da arquitetura se torna uma prática comum com a introdução de recursos digitais dentro de todo desenvolvimento de um projeto (VIDLER, 2005). Os paradigmas são inspirados não mais pela origem clássica e erudita, e sim por sistemas observados na natureza e introduzidos por meios digitais (VIDLER, 2005). Podemos identificar três aspectos básicos da manipulação de desenho através de ferramentas digitais desenvolvidas nesse período: desenho de objetos não-euclidianos com novo repertório de linhas


NURBS5; formas descritas através da topologia6 e a manipulação de objetos pela parametrização7 (NATIVIDADE, 2010). O alto nível de abstração apresentado pelas novas ferramentas digitais estabelece certa liberdade em relação aos processos tradicionais. A facilidade e constância das experimentações não mais necessitam estar atreladas a uma situação real de projeto. A mudança da ferramenta analógica para a digital faz também com que paradigmas ligados ao espaço físico terrestre comecem a ser desafiados (NATIVIDADE, 2010). A nova dimensão digital da arquitetura é vivenciada no ambiente virtual, livre do plano bidimensional e das leis da Física (NATIVIDADE, 2010).

5  NURBS – Non-uniform Rational B-Splines: “uma curva nurb é aquela cuja influência do ponto de controle, isto é, a função básica associada à curvatura pode variar com a mudança de posição dos nós ao longo do segmento que vincula dois pontos de controle. O espaçamento entre os nós é desigual. ” (NATIVIDADE, 2010); 6  Uma extensão da geometria, estuda das propriedades dos objetos geométricos – superfícies, sólidos, etc. – que permanecem imutáveis quando o objeto é deformado. Estudo sobre as relações espaciais (NATIVIDADE, 2010). 7  “(...) que designa a descrição de elementos cuja variação de valor modifica a solução de um problema sem lhe modificar a natureza. (...). O modelo paramétrico é aquele no qual são estabelecidas relações de dependência entre partes do modelo. Quando um componente é alterado, todos aqueles dentro de sua teia de relações são alterados automaticamente. ” (NATIVIDADE, 2010).

23 _ a ferramenta do arquiteto

“Livres das limitações impostas pelas ferramentas tradicionais, as arquiteturas digitais sugerem novos meios de pensar a arquitetura, que ignorem as convenções de estilo ou estética em favor da experimentação contínua. ” (NATIVIDADE, 2010).


Um cenário ideal é organizado para receber uma intensa experimentação formal por diversos arquitetos, que desenvolvem não uma, mas diversas teorias de manipulação de objetos e massas para o amadurecimento da aplicação desse tipo de tecnologia na arquitetura. O caráter especulativo dessas arquiteturas dificultou sua materialização em um objeto construído, justificando a resistência por parte de outros profissionais e aceitar novas formas de se aplicar as ferramentas digitais. A baixa credibilidade alcançada no período foi encarada como uma nova “moda” dentro da arquitetura (NATIVIDADE, 2010) e não como uma nova forma de se projetar, de se pensar e produzir arquitetura.

24 _ a ferramenta do arquiteto

O surgimento de uma nova ferramenta em determinado campo deve inaugurar uma série de experimentos. O período de teste desse novo meio de produção só deve desacelerar no momento em que os resultados subverterem as limitações iniciais pensadas àquela ferramenta.

“[...] o potencial plural da adoção do computador como nova ferramenta na arquitetura tomou inúmeras trajetórias, cada uma delas com múltiplos desdobramentos que vão desde a concepção de objetos arquitetônicos, sua representação até a construção. [...]. Não há apenas uma direção senão muitas. ” (NATIVIDADE, 2010).


25 _ a ferramenta do arquiteto



ARQUITETURAS DIGITAIS

“(…) nor is it defined solely by the use of computing power in the search for higher efficiency and speed of production. The digital we refer to is defined by experimental projects and ideas, from a specific period of time, which engaged proactively in the creation and use of digital tools to reach otherwise inaccessible results.” (MIRKO in LYNN, 2013). As experimentações da chamada Segunda Geração de arquitetos digitais – Marcos Novak, Greg Lynn, Peter Eisenman (NATIVIDADE, 2010), Frank Gehry, Chuck Hobermanm e Shoei Yoh (LYNN, 2013) – pretendiam fazer uso da máquina não como mera ferramenta, mas como um novo meio criativo completamente integrado ao processo de concepção da arquitetura (LYNN, 2013).

Modelos de Design Formação topológica Variedade de formas complexas. Formas convencionais e estáticas substituídas por modelagem 3D dinâmica de topologias (OXMAN, 2006). Novas ter-

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As chamadas, por diversos autores, arquiteturas digitais, são projetos e edificações concebidas, produzidas e construídas com o suporte das tecnologias digitais. O novo processo de desenvolvimento da arquitetura se apoia um uma nova base conceitual “orientada por novas abordagens sobre fluidez, dinâmica, conectividade e dobras nos espaços” (NATIVIDADE, 2010).


minologias são desenvolvidas, como as Hipersuperfícies – uma superfície com continuidade em redes. A dimensão não é apenas material, uma ligação entre o ambiente onde a arquitetura está localizada. Interconexões entre o interno e externo, construído e não construído, real e digital (NATIVIDADE, 2010).

Design associativo Na modelagem paramétrica se estabelece uma relação associativa entre entidades (geometria associativa); essas relações são definidas através de parâmetros1 facilmente manipuláveis, criando um alto grau de variações para os resultados obtidos (OXMAN, 2006). Greg Lynn desenvolve a ideia de smooth architecture – uma arquitetura formalmente contínua, que apresenta conceitos como maleabilidade e suavidade. As alterações e complexidade formal são obtidas através de operações como morphing (hibridição dinâmica), blurring (movimento e velocidade) e folding (dobra). “As formas adquirem aspecto de folha de borracha onde as curvas e superfícies deslizam continuamente entre paredes, tetos e pisos. ” (NATIVIDADE, 2010).

12.Mobius House Study, Stephen Perrella e Rebecca Carpenter, 1998 / Fonte: <http://architettura.it/extended/19981201/ep02en_03. htm>.

13.Greg Lynn, Embryological House, 1998-9 / Fonte: <http:// ivc.lib.rochester.edu/tasting-space/>

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Design responsivo Se apropria de conceitos da indústria cinematográfica para a criação de espaços dinâmicos capazes de reagir a estímulos físicos ou digitais (OXMAN, 2006). Como Marcos Novak apresenta com a noção de transarchitecture e arquitetura líquida, não se trata de discutir a automação das edificações, mas a criação de espaços e elementos arquitetônicos capazes de responder a estímulos dos usuários ou condições ambientais de seu contexto. Um continuum entre a ar1  São constituídos de valores, variáveis; servem para guardar informações para serem manipuladas posteriormente de acordo com a necessidade (WOODBURY, 2010).

14.Estudo com fractais, Syntopia/Fonte:http://blog.hvidtfeldts.net/


quitetura materializada e a arquitetura que só pode ser experimentada no âmbito virtual, no ciberespaço (NATIVIDADE, 2010).

16.dECOi Architects, instalação Hyposurface, 2011/ Fonte: <https://www.fespa. com/news/industry-news/ hyposurface-adds-dynamic-dimension-to-digital-out-of-home.html>

Design generativo Prover mecanismos computacionais para a formalização de processos capazes de apresentar e analisar conjuntos (OXMAN, 2006). Os sistemas generativos devem funcionar sob o estabelecimento de regras básicas de interação entre as entidades envolvidas no processo – por exemplo, gramáticas formais de organização (shape-grammar, fractals). Sistemas generativos são paramétricos.

Design evolutivo

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15..Marcos Novak, transarquitetura e arquitetura líquida/ Fonte:<http://enricolainarchitecture.blogspot.com. br/2012/06/transarchitecture-alla-ricerca-della.html>


Um sistema baseado em um algoritmo de busca, utilizado para a otimização de processos. O melhor resultado, ou seja, a melhor resposta encontrada de acordo com os parâmetros estabelecidos é apresentada. John Frazer foi um dos primeiros a propor a uma simulação digital do processo de “evolução natural” baseada num processo primitivo de análise genética2 – obtenção de forma a partir da análise e assimilação de gerações obtidas do cruzamento de pares (CALIXTO e CELANI, 2015). “[...] forma poderia ser explicada por regras generativas. ” (NATIVIDADE, 2010). É possível desenvolver um sistema generativo através de um sistema evolutivo.

Design performativo

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O processo de design apoiado em análises de performance consiste na simulação da aplicação de forças externas à edificação para a manipulação formal do objeto arquitetônico (OXMAN, 2006). “O principal argumento em defesa dos modelos baseados em desempenho é que estes conferem ‘utilidade’ à forma ou mesmo ‘justifica’ certas decisões formais que podem parecer despropositadas. ” (NATIVIDADE, 2012).

2  Algoritmo Genético: de acordo com Terzidis (2006): “[...] simula o comportamento e adaptação de uma população de soluções possíveis dentro de um sistema de gerações, onde elas são testadas [...] até que se encontre a solução mais adequada para a questão colocada. “

17..Qatar Education City Convention Centre, Arata Isozaki / Fonte:< http://www.archdaily. com/425521/qatar-national-convention-centre-arata-isozaki>

18.D-Tower, Q.S. Serafijn e Lars Spuybroek (NOX-Architekten) – performativo muda de cor de acordo com o humor dos habitantes informado pela internet / Fonte: <http://thecityfixbrasil.com/2015/09/14/ dados-abertos-e-emocoes-conheca-a-d-tower>

19.London City Hall, Foster + Partners – solução energética integrada a racionalização/ Fonte: <http://www.fosterandpartners.com/projects/city-hall/>


Arquitetura Algorítmica

“The designer who wants to be completely in control of the results must be in control of the process. To be in control of the process, the designer must be in control of the tools. The tools are computation, therefore a designer who wants to be in control must also be scripter (or suffer the consequence of the unseen influence of using other people’s tools).” (AISH apud BURRY, 2011)

Ainda existem muitas críticas em cima do uso do computador para a concepção do design. Muito se deve ao modo como ele foi primeiramente apresentado para os usuários (BURRY, 2011), como uma caixa preta3, com funções pré-definidas e restritivas, fican3  “[...] um conjunto de objetos que são encapsulados, tornados

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Desde meados dos anos 1960, antes do surgimento das primeiras interfaces comerciais de desenho digital, vem se discutindo qual deve ser o envolvimento do computador dentro da produção arquitetônica. A busca pela informatização de um processo com foco no alto nível produtivo possível de se alcançar, seguido do desenvolvimento da computação gráfica e de softwares de modelagem 3D, fizeram crescer o número de profissionais que defendem a inserção da tecnologia na disciplina. Entretanto, até pouco tempo, nem mesmo os arquitetos que se auto proclamavam verdadeiros exploradores digitais, tinham clara as reais implicações da computação dentro do processo de projeto.


do para trás do ato criativo que conecta o cérebro à mão no momento do design. Como afirma Picon no prefácio da publicação Algorithm Architecture, de Kostas Terzidis, grande parte dos designers encaram o ambiente digital como um compilado de softwares que possibilitam a produção de formas extravagantes e o controle das mesmas sem interesse algum em entender o processo de obtenção e racionalização da criação. Já a outra porção de profissionais afirmam que será inevitável incorporar a linguagem de programação no processo de desenvolvimento de projeto, a fim de se estabelecer um verdadeiro uso criativo da computação. A maneira dominante de utilização do computador é a informatização4, onde o designer não se apropria do poder de processamento da máquina. A arquitetura algorítmica se apresenta como uma alternativa entre a dicotomia computação5/informatização. O processo de projeto baseado em scripting6 (BURRY, 2011) tem como princípio a elaboração de um conjunto lógico de regras que ultrapassem as limitações uma coleção fechada de entidades [...] simplificação da complexidade [daquele objeto] [...] uma redução [...]. ” (VASSÃO, 2015).

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4  Informatização (computerization): automatização, mecanização e conversão. Envolve a digitalização de entidades ou processos pré-concebidos, pré-determinados e bem definidos. Entidades e processos já concebidos na mente do designer são digitalizados e manipulados em um computador (TERZIDIS, 2006); 5  Computação (computation): procedimento de cálculo, determinar algo por métodos matemáticos ou lógicos. Sobre a exploração do indeterminado, vago, não claro e por descobrir. De natureza exploratória, tem a intenção de simular ou ser uma extensão do intelecto humano. Racionalização, raciocínio lógico, algoritmo, dedução, indução, exploração e estimativa. Envolve a resolução de problemas, estruturas mentais, cognição, simulação, “inteligência regrada” (TERZIDIS, 2006); 6  Programação de baixo nível de complexidade. Capacidade que alguns softwares têm em permitir que o usuário adapte, customize ou reconfigure completamente as funções do software em questão (BURRY, 2011), de acordo com suas necessidades projetuwais.


impostas por softwares comerciais. A organização de uma ferramenta específica, para um problema específico. Mark Burry apresenta em seu livro, Scripting Cultures, uma interpretação do desenvolvimento do digital dentro da arquitetura. Segundo ele, os primeiros estudos relacionados ao uso desse tipo de ferramenta estão em disciplinas técnicas que permeiam a criação em arquitetura. Agora podemos ser testemunhas do uso do digital nas primeiras etapas de concepção, nas etapas que tanto são preenchidas com poéticas autorais, e que no passado chegaram a ser “obra divina” (LUCE, 2009).

Toda linguagem, seja ela natural ou artificial, possui duas componentes de organização (COATES, 2010): um conjunto léxico de símbolos – um alfabeto ou sistema de sinais -; e uma forma de combinar esses símbolos, a sintaxe. O computador é baseado em uma linguagem artificial, assim como qualquer sistema de códigos desenvolvido pelo homem (por exemplo, código morse). Como linguagem, ela é passível de ser entendida pelo homem depois de treinamento apropriado (COATES, 2010). 7  “[...] Algoritmos podem ser aplicados tanto como estratégias para resolver problemas conhecidos quanto na busca por possíveis soluções para problemas parcialmente conhecidos através de composições randômicas.” (NATIVIDADE, 2010)

33 _ arquiteturas digitais

Os algoritmos7 são expressões linguísticas de um problema. Uma descrição sintática com especificidades gramaticais que devem ser seguidas a fim de formular expressões funcionais. A articulação linguística de um algoritmo não serve apenas para descrever as etapas de sua solução, mas para comunicar essas etapas a um outro agente responsável pelo processamento de dados que compõe a expressão: o computador.


Dessa forma, a aplicação de script (algoritmo) na arquitetura envolve a combinação de expressões e informações transmitidas em valores numéricos, onde a lógica da matemática consegue estabelecer abstrações e relações espaciais (BURRY, 2011). A intenção inicial do arquiteto é transmitida ao algoritmo de forma racional, em uma linguagem especifica dentro da programação. Esse desejo é o input que deve permear as soluções apresentadas pelo código. A informação (bit) pode ser comparado ao “tijolo” da arquitetura digital. As necessidades programáticas e as características do contexto são transmitidas em forma de dados (data) para a máquina (CHU, 2006).

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A inerência matemática e as relações sintáticas existente entre sequências numéricas presentes em um algoritmo podem parecer extremamente deterministas e limitadores dentro do processo criativo. Entretanto, os limites impostos por esse novo método estão ligados a capacidade humana de apreensão desse novo ambiente, assim como a inserção de uma nova ferramenta manual dentro de uma marcenaria vai exigir de seus artesões muito tempo para experimentação e erro, até que se atinja seu domínio – e mesmo assim, sempre escaparão do sistema cognitivo humano formas de aplicação daquela ferramenta, considerando os limites de processamento e análise combinatória presentes no cérebro humano.

“Após aprendermos um código, tendemos a esquecer a sua artificialidade: depois que se aprende o código dos gestos, pode-se esquecer que o anuir com a cabeça significa apenas aquele ‘sim’ que se serve desse código. Os códigos (e os símbolos que os constituem) tornam-se uma espécie de segunda natureza [...]. ” (FLUSSER, 2007).


Karl Chu (2006) cita uma afirmação de Stephen Wolfram em que ele indaga “[...] todos os processos, sejam produzidos pelo esforço humano, ou ocorridos espontaneamente na natureza, podem ser vistos como computações”. Com isso ele inaugura a concepção de que determinados processos encontrados na natureza podem ser rastreado, analisado, e replicado por uma máquina (CHU, 2006). Entretanto, podemos afirmar que, questões ligadas a sensibilidade, instinto e intuição, não são passíveis de simulação em código. Scripting não é um nome interessante de uma ferramenta, é um jeito de pensar um problema. Introduzindo o processamento digital na concepção de projeto, ele possibilita alargar as limitações intelectuais humanas – uma extensão da mente (TERZIDIS, 2006), um sistema artificial com um poder de processamento de informação algumas vezes maior do que o cérebro humano.

As estratégias contidas em um algoritmo são descritas por um humano para serem testadas por um computador. Ele responde de forma exata aos estímulos aplicados e descritos. Ao contrário do processo de desenho analógico (mão, lápis e papel), o projeto assistido por computador possui uma estrutura lógica inerente ao seu suporte (NATIVIDADE, 2010). O

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“By liberating the user of a computer from material concerns associated with labor, skill, or complexity or from emotional factor such as compassion, fatigue, or boredom computers can be utilized as tireless vehicle that allow humans to realize, overcome, and ultimately surpass their own physical and mental limitations.” (TERZIDIS, 2006).


computador é o único além da mente humana capaz de representar informações simbolicamente (CARRARA; KALAY; NOVEMBRI apud NATIVIDADE, 2010). De acordo com o senso comum praticado entre arquitetos e designers, todo o processo criativo envolvendo concepção e intenções são praticados pela mente humana, e que o computador é uma mera ferramenta de organização e apresentação da criação. Em uma análise racional sobre o processo de criação, podemos descreve-lo como uma sucessão de etapas e rigoroso raciocínio (KVAN apud BURRY, 2011), representando nada mais que um pensamento algorítmico. Em um cenário ideal, estabelecida a sinergia entre homem e máquina, cada uma das partes poderia contribuir com seus pontos fortes dentro do processo de exploração, tentativas e descobertas dentro do design – a sensibilidade humana e a capacidade de processamento digital. A computação não deve ser encarada apenas como uma simulação de etapas analógicas da criação, mas como uma entidade paralela ao programador, um parceiro (otherness8) no processo de criação, um complemento a mente humana9 (TERZIDIS, 2006). Um segundo olhar (COATES, 2010), mais racional e analítico, livre de intenções ou pré-conceitos ligados à sua própria existência, com-

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8  Alteridade, aquilo que é distinto. Allo: o outro, estrangeiro, que possui sua própria lógica e essa talvez não seja compreendida pelos que estão de fora desse sistema próprio. 9  Computador como uma extensão das capacidades humanas. Não deve ser encarado como uma ferramenta pois possui capacidades cognitivas inexistentes em equipamentos mecânicos tradicionais. É uma extensão da mente e não da força. Ele altera as noções pré-estabelecidas de sensações o que causa uma reinterpretação do ambiente em que nos colocamos. As interações podem extrapolar o âmbito da percepção mental à interação física, através da realidade aumentada (PICON in SYKES, 2013). O comportamento espacial humano se remodela em função do teclado, mouse, joystick e tela sensível ao toque.


para e apresenta soluções de acordo com as informações que lhe são dispostas, um interlocutor que surge quando a compreensão humana é ultrapassada pela questão a ser resolvida. Existem alguns problemas de projeto cuja complexidade, o nível de incertezas, ambiguidade e grande número de soluções possíveis, requerem uma sinergia entre a mente humana e a computação (TERZIDIS, 2006). Nesse momento é que a utilização da cultura do scripting se justifica (BURRY, 2011). Ao contrário do que acreditam, e da simples automação de processos através de códigos (informatização), o uso de algoritmos no processo de projeto pode apresentar implicações que talvez nunca tivessem ocorrido pela mente humana. Características de vida artificial e de inteligência artificial10 podem representar o grau de autonomia (HENNO, 2016) que um sistema computacional, paralelo ao pensamento humano, pode apresentar dentro do processo de criação.

10  A vida artificial (AL – artificial life) se refere a capacidade de máquinas obterem características naturais extremamente complexas – um sistema que se mantém “true to natural life” ((LANGTON apud WHITELAW in HENNO, 2016). A AL está apoiada em conceitos da genética e emergência, que se refere ao “processo pelo qual os simples componentes de um nível inferior interagem produzindo resultados complexos e sofisticados, próximos ao que encontramos na matéria viva. ” (HENNO, 2016). Já a inteligência artificial (AI – artificial intelligence) é limitada a reproduções pré-programadas de respostas a estímulos orientados, onde o sistema deve apresentar uma organização baseada em regras locais previamente definidas. Ao contrário da vida artificial, possui baixo grau de autonomia, no momento em que “[...] não possui [...] relação com o método pelo qual a inteligência é formada nos sistemas naturais. ” (HENNO, 2016).

37 _ arquiteturas digitais

Na arquitetura, é comum o uso de linguagem de programação nos primeiros estágios de concepção de uma obra, onde é necessário analisar todas as possibilidades de maneira a selecionar a que lhe parece mais adequada. A capacidade inerente de análise combinatória do computador mostra o porque ele é empregado nessa etapa de projeto. Com o desenvol-


vimento do projeto, outros processos podem tomar destaque, como o BIM ou a programação com foco na automação de elementos arquitetônicos (arquitetura responsiva).

38 _ arquiteturas digitais

O que torna a lógica do algoritmo tão problemática para alguns arquitetos é que ela desafia o caráter artístico-autoral praticado na arquitetura nos últimos anos. Desafia a intuição (BURRY, 2011). A arquitetura desenvolvida a partir de um algoritmo pode não ter um autor específico – autor aqui entendido como artista, que no fazer da arte, emprega suas crenças e vontades críticas, arte como um registro da experiência do fazer de arte. Presenciamos mudanças na organização de trabalho dentro da disciplina. Algoritmos com maior grau de liberdade podem gerar resultados não imaginados pelo indivíduo que gerou suas primeiras linhas de código. A autonomia é concedida pelo próprio programador ao criar um meta-algoritmo11, abrindo implicações no processo de criação no momento em que o processamento de um algoritmo adquiri a capacidade de criar (TERZIDIS, 2006). O pensamento humano aparenta ser livre e infinito, mas suas limitações estão ligadas ao poder de compreensão de cada indivíduo, e seu discernimento é pautado em suas experiências e vivências. Em outras palavras, o discernimento humano segue regras sociais, naturais e holísticas, barreiras criadas pelo intelecto humano para cercar o que é conhecido do que não é, do inimaginável, do incrível e mágico inesperado. Muitas decisões de projeto baseadas na chamada intuição, podem se apresentar arbitrárias e obscuras (NATIVIDADE, 2010). O computador “[...] rompe com o imediatismo do gesto humano [...]” (PI11  Algoritmos que tem como código fonte sua simples multiplicação, ou, em casos de algoritmos com maior autonomia, escrever outros algoritmos com pequenas modificações (mutações).


CON in SYKES, 2013). Fazer uso da informatização no processo de projeto pode significar estar refém de um software comercial, refém da linguagem predominante naquela interface genérica. O designer assume uma posição de distanciamento em relação a aplicação de sua ferramenta. Tratamos aqui de assumir o controle de seus instrumentos, e se possível, desenvolve-los sozinho (NATIVIDADE, 2012). Ao contrário das ferramentas tradicionais de desenho, com as quais o arquiteto estabelece uma relação física, na computação, o arquiteto deve estabelecer uma relação intelectual com o algoritmo por conta de sua natureza abstrata. Ficar refém de um software significa perder o controle do potencial criativo, já que agora são os programas que limitam nossos pensamentos, engessando nossas escolhas. Dominar a constituição primária do software (algoritmos) significa uma emancipação digital em um mundo que se tornou “[...] codificado pela imaginação tecnológica. ” (FLUSSER, 2007).

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“[…] you have to distinguish between writing a program that helps you to test your theory [design] or analyze your results, and writing a program that is your theory [design].” (MINSKY apud COATES, 2010)


Processo Digital x Estilo Universal

“There is a global convergence in recent avant-garde architecture that justifies the enunciation of a new style: parametricism.” (SCHUMACHER, 2009). Em uma publicação para o periódigo Architectural Design – AD, o arquiteto e hoje responsável pelo escritório Zaha Hadid Architects, Patrik Schumacher, descreveu o que ele chamara de parametricismo: “o novo grande estilo depois do modernismo” (SCHUMACHER, 2009). Esse suposto “estilo” seria apoiado em técnicas de animação e simulação formal, aliada a modelagem paramétrica e scripting.

40 _ arquiteturas digitais

Schumacher apresenta o conceito de parametricismo como a defesa de uma aplicação extensiva de parametria em todas as escalas de projeto, do urbano ao de interiores; em uma busca constante pela diferenciação visual a partir da ordenação estética da complexidade (SCHUMACHER, 2009). Muito da complexidade tratada por Schumacher é referente aos grandes problemas urbanos que enfrentamos após anos de sobreposição de projetos e dinâmicas político-imobiliárias nas grandes metrópoles. A utilização de software para produção arquitetônica pode nos guiar por um período de experimentação e descoberta de respostas para questões deixadas de lado ou criadas pela emergência dessas dinâmicas urbanas. Entretanto, como identifica Anthony Vidler (2005) em seu texto O Campo Ampliado da Arquitetura, é necessária grande cautela na introdução de novas tecnologias na criação de arquitetura, para


que não se tornem novos dogmas sob a “estética do software” (VIDLER in SYKES, 2013). Por estilo temos a preconcepção de uma aparência, uma estética definida a ser alcançada (LEACH in POOLE e SHVARTZERG, 2015). Um pensamento que considera um mundo estanque e homogêneo, incompatível com a situação atual, em que as interações sociais são ditadas por uma cultura de massas em constante transformação, onde não são fixadas identidades e símbolos capazes de culminar em uma vontade estilística compartilhada no âmbito global. A libertação formal e material disponibilizada pelas experimentações digitais na arquitetura podem trabalhar contra a responsabilidade social do arquiteto. A aplicação de tais processos com finalidades plásticas pode seduzir o projetista e anular a dimensão do usuário; podemos estar criando uma arquitetura para arquitetos (CORREIA e GOMES, 2009). Se pretendemos elaborar uma solução para um problema complexo como a cidade contemporânea, devemos ter clareza de que essa solução possivelmente vai apresentar o mesmo grau de complexidade do problema que a criou (VASSÃO, 2015). A expressão formal das arquiteturas digitais é a expressão da “mistura complexa entre estabilidades e instabilidades que caracterizam a realidade contemporânea” (PICON apud NATIVIDADE, 2012). Devemos entender que a parametrização tratada por Schumacher não é nova, a parametria é condição sine-qua-non à arquitetura (BURRY, 2011) – se a parametrização é a manipulação de variáveis associadas, o que o arquiteto sempre fez se não ajustar parâmetros geométricos em uma busca formal dentro do processo de criação desde os primeiros edifícios construídos? Focar a discussão do digital em um estilo, na aparên-

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20.One North Masterplan, Singapura, Zaha Hadid Architects 2001-2003 / Fonte: < http://www.patrikschumacher. com/Texts/Parametricism%20-%20A%20New%20Global%20 Style%20for%20Architecture%20and%20Urban%20Design.html>


42 _ arquiteturas digitais

“(…) we went to all this effort in order to solve real social, environmental and technical problems where we believed a computer could significantly assist. But now that there is massive computer power and software cheaply available, most scripting has become nothing more than an onanistic self-indulgence in a cozy graphics environment. Endless repetition and variation on elaborate geometrical schema with no apparent social, environmental and technical purpose whatsoever.” (FRAZER apud BURRY, 2011). cia das edificações, significa destacar a ferramenta – o famoso “qual software você usou? ”. Se o destaque for unicamente a ferramenta e não o entendimento do processo de concepção, corremos o risco de adentrar a um “tecno-racionalismo” (NATIVIDADE, 2012), onde escolheremos estratégias construtivas já catalogadas – sectioning, tessellating, folding, contouring, forming (IWAMOTO, 2009) –, e a suposta liberdade exploratória trazida pela cultura do scripting seria sufocada. Neil Leach (2015) coloca em cheque o termo “digital design”, ao elucidar o fato de que a palavra “digital” se refere a um processo e não um produto (TERZIDIS, 2006). Desse modo podemos entender que as chamadas “arquiteturas digitais”, são tão arquitetura como as obtidas por métodos tradicionais, entre-


21 e 22.Phillips Pavilion, Le Corbusier e Iannis Xenakis, para World Expositon, Bruxelas, Belgica -1958 / Fonte: <http:// archiveofaffinities.tumblr. com/post/23063718929/ le-corbusier-and-iannis-xenakis-philips-pavilion>; < h t t p s : // b r. p i n t e re s t . c o m / pin/366691594635164740/>

tanto sua complexidade é obtida por meio da aplicação de ferramentas digitais.

43 _ arquiteturas digitais

“There is no such thing as digital architecture.” (LEACH in POOLE e SHVARTZERG, 2015)



EXERCÍCIO DE PROJETO

Vazio Urbano na Região Central da Cidade de São Paulo A produção da cidade de São Paulo, assim como qualquer outra metrópole contemporânea, apresenta diversos tempo sobrepostos. Um crescimento progressivo, desordenado, espraiado e espontâneo, criou uma megacidade extremamente orgânica e de aparência caótica.

A produção arquitetônica racionalista e cartesiana não considera necessidades humanas reais, dinâmicas econômicas do mercado e a intervenção em um contexto existente. Ela trabalha com a vontade de um usuário passivo ideal; por não entender o mercado, ela acaba por sendo ditado por ele; e prega a negação da história para a produção de edifícios-objeto isolados de seu lugar. A integração das tecnologias digitais voltadas para a produção arquitetônica pode apresentar resultados

45 _ exercício de projeto

A arquitetura pensada em uma cidade consolidada antes do séc. XXI é baseada em uma geometria euclidiana, mas a forma com que ela (arquitetura) produziu a cidade – levando em conta necessidades de fluxo e vontades imobiliárias – é extremamente complexa e passível de transposição para disciplinas que foram afastadas da construção civil, como a biologia, a ciência e a arte.


imediatos a problemas complexos que a metrópole contemporânea apresenta. A capacidade da arquitetura digital de se adaptar a diferentes pressões impostas pelo contexto, torna a sua metodologia bastante apta na proposição de soluções para a ocupação de áreas tidas como resíduos da expansão acelerada e desordenada da cidade de São Paulo.

Script 01 A primeira estratégia genérica de ocupação de vazios é baseada em parâmetros estabelecidos pela legislação de gestão urbana, sendo eles Taxa de Ocupação, Coeficiente de Aproveitamento, recuos e gabarito de altura.

46 _ exercício de projeto

É necessário selecionar o terreno desejado para iniciar a simulação de ocupação. Ocorrerá a extrusão total do lote levando em consideração o gabarito máximo pré-estabelecido. O volume resultante da extrusão será dividido por meio de manipulação de listas, onde poderemos alterar os recuos de acordo com a Taxa de Ocupação (TO) do lote – o volume total está associado aos recuos de modo que ele é atualizado sempre que alguma modificação é feita nas dimensões da projeção do edifício. Avançando no script, podemos analisar a Taxa de Ocupação alcançada até o momento, e utilizar esse valor para o cálculo do número de pavimentos máximo de pavimentos que o projeto pode apresentar – nesse momento é necessário considerar o Coeficiente de Aproveitamento (CA) do lote para encontrar a área total edificável. Com o número de pavimentos definido, podemos configurar a altura base do pavimento para a visualização final do estudo de ocupação, em que são apresentados todos os pavimentos seguindo os parâmetros definidos ao decorrer do script. A simulação ocorre


de forma espontânea de acordo com os parâmetros de ocupação desejados pelo projetista.

Território e Contexto

47 _ exercício de projeto

Partindo da delimitação do perímetro do Centro Expandido da Cidade de São Paulo – um território macro onde podemos encontrar grande número de equipamentos públicos, oferta de transporte público, e instrumentos que tornam essa região alvo de disputas urbanas relacionadas ao mercado imobiliá-


rio. Vazios urbanos e a subutilização de lotes é um problema grave dentro desse perímetro, ainda mais levando em consideração conceitos de cidade compacta e o número de pessoas que se deslocam das zonas periféricas da capital paulista para dentro desse perímetro todos os dias para trabalhar, estudar, ou conviver socialmente.

48 _ exercício de projeto

A Zona de Máxima Proteção ao Pedestre (ZMPP), é uma operação criada pela Companhia de Engenharia e Tráfego (CET) como uma tentativa de priorizar e zelar pela segurança do pedestre dentro dessa região. Compreendido entre os distritos de República, Santa Cecília, Consolação e Bela Vista; a ZMPP busca a instalação de mais semáforos com tempo para pedestre (não só para o controle do transito), e até a pedestrialização de algumas ruas dentro do Centro Histórico, bem como rebaixamento de guias (Acessibilidade) e remoção de bancas de jornais ou outros


obstáculos à fruição peatonal.

49 _ exercício de projeto

Durante o mapeamento de vazios (realizado com o apoio de programas de monitoramento por satélite, ortofotos e cartas gráficas antigas), foi identificado uma tendência de esvaziamento de um “anel” secundário central, para além do perímetro do Centro Velho + Centro Novo (onde a densidade é alta e uso diversificado). Nesse perímetro podemos destacar as grandes avenidas como uma barreira física para a real consolidação desses territórios, segmentando caminhos e passagens para o pedestre, barrando o desenvolvimento de uma determinada morfologia urbana baseada na ocupação máxima do lote e não subutilização dele. Analisando os lotes identificados, ficou clara a vontade de trabalhar os interstícios desse anel secundário através dos miolos de quadra. Nesse aspecto, o território que chamou atenção pela grande oferta de serviços/equipamentos/mobilidade,


foi a República. Tratando da patologia urbana dos vazios centrais, o projeto apresentado tem como partido a integração de um conjunto de vazios em uma mesma quadra, criando uma fruição pública e um afastamento entre edifícios. Utilizando o conceito apresentado por Christian de Portzamparc, open block, foi ensaiada uma ocupação fragmentada e acumulada no perímetro da quadra, liberando espaços de convivência no miolo da quadra, como um refúgio no centro de São Paulo. A quadra utilizada para o desenvolvimento do exercício está locada ao lado da Praça Franklin Roosevelt, fim da Rua Augusta e início da Rua da Consolação. É uma quadra bastante densa e verticalizada, possui usos dos mais diversos, indo de habitação até associações cristãs, academias, bares, torres comerciais, etc.; mas o que chama a atenção é o grande nú-

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50 _ exercício de projeto

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POLÍCIA MILITAR CPA/M -I 7º BPM/M 3º CIA

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MINISTÉRIO DA SAÚDE DE SÃO PAULO

PRAÇA GENERAL CRAVEIRO LOPES

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mero de estacionamentos. Uma quantidade absurda levando em conta a localização privilegiada do ponto de vista da mobilidade urbana, e pela tendência de grandes cidades do mundo em retirar o automóvel dos grandes centros. O carro é apenas uma alternativa de transporte individual que leva o usuário até o centro, uma vez no centro, esse usuário não utiliza o veículo para suas tarefas, ele utiliza o transporte público, ou o mais comum, anda a pé. A valorização do pedestre através de bons desenhos de passeio público e a facilidade de cruzar quadras como atalhos (fruição pública) foram priorizadas nesse exercício de projeto. No passado, o território escolhido abrigava o primeiro velódromo de São Paulo, e em seguida o primeiro campo de futebol (no centro do velódromo).

Ensaios de ocupação

Esse primeiro ensaio de ocupação, onde foi possível

51 _ exercício de projeto

Velódromo Paulista e primeiro Campo de Futebol da Cidade de São Paulo/ Fonte: http:// limpinhoecheiroso.com/2015/09/14/a-historia-da-bicicleta-em-sao-paulo/

A partir de uma dinâmica de script (programação), foi simulado em ambiente digital a ocupação de cada um dos terrenos que compõe o miolo de quadra. Essa simulação é baseada em parâmetros estabelecidos pela legislação de gestão urbana, sendo eles Taxa de Ocupação, Coeficiente de Aproveitamento, recuos e gabarito de altura. O resultado é apresentado na forma de 7 edificações, sendo duas pré-existências e 5 edifícios novos.


52 _ exercĂ­cio de projeto


gerar a volumetria e pavimentos de todos os novos edifícios, foi baseado em estratégias pré-definidas. A junção de modelos de quadra foi extremamente importante para que se fosse alcançado o resultado final da ocupação. Entradas que instigam o pedestre a partir de conceitos de paisagem velada, onde elementos da paisagem se sobrepõe a fim de criar quebra na expectativa no momento do passeio. Outra questão na ocupação da quadra era o grande número de empenas cegas. Quanto a isso, a diretriz tomada foi a implantação prévia dos edifícios justamente acompanhando as empenas – levando em consideração o pensamento de que uma empena na cidade está à espera de outro.

Em um segundo momento, aplicando novamente estratégias de script, fora analisado graficamente a projeção de radiação solar nas faces do volume edificável, e os resultados obtidos se tornam inputs para a continuidade das proposições projetuais. Por se tratar do miolo de quadra em um território bastante verticalizado, existe um grande índice de sombreamento que norteou a distribuição de programas junto à análise de dinâmicas das ruas do entorno – quais eram mais movimentadas, barulhentas e quais eram menos. Utilizando o plugin Ladybug+Honeybee dentro da interface Grasshopper temos a possibilidade de explorar análises ambientais de forma associativa. O estudo apresentado analisa graficamente a projeção de radiação solar nas faces do volume edificável, e os resultados obtidos se tornam inputs para a continui-

53 _ exercício de projeto

Script 02


dade das proposições projetuais.

Objeto Arquitetônico Projeto

54 _ exercício de projeto

O primeiro projeto que trato está localizado no que hoje é um estacionamento no início da Rua da Consolação. Um lote estreito, mas, assim como os outros estacionamentos da quadra, bastante comprido. A primeira diretriz foi de implantação de um edifício com salas comerciais, principalmente pela predominância de usos nessa região da Rua da Consolação. Entretanto, em um segundo momento, fora decidido


alterar o uso para a colocação de apartamentos residenciais. A forma do edifício suportou a alteração do programa, de modo que foram realizadas apenas pequenas adequações em planta. O segundo edifício que trato também está na Rua da Consolação, na continuação da mesma calçada que o primeiro. Em comparação com o primeiro projeto, ele possui lote mais estreito e alongado, o que fez tornar seu uso corporativo. Uma laje comercial bastante ampla onde na porção posterior do prédio estão locados copa e sanitários.

O quarto edifício também é residencial. Com dois apartamentos por andar, sua face mais larga está orientada à Norte. Seu térreo possui uma espécie de lembrança histórica desse território: uma Escola de Ciclistas – exatamente nessa quadra, foi onde instalaram o primeiro velódromo de bicicletas de São Paulo. A valorização da bicicleta como alternativa de transporte pessoal é identificada na presença de bicicletários em todas as entras da quadra e térreo dos edifícios. A ligação com a bicicleta leva em conta a implantação massiva de ciclovias na cidade. O próximo edifício está associado à optimização da insolação. Com a utilização de um algoritmo genético – baseado na avaliação de gerações e cruzamento de pares – foi possível manipular a curvatura da fachada Leste em que se pretendia uma maximização do ganho de radiação. O prédio ganha um volume com

55 _ exercício de projeto

O terceiro edifício é residencial e de alto padrão. Apartamentos amplos e com aberturas arquitetônicas Leste-Oeste. Algo interessante sobre o projeto é a presença de dois pavimentos térreos: um primeiro em cota mais baixa, com um espaço comercial (sugiro um café), e o segundo, na cota mais alta – mesma da praça interna – com o acesso para os apartamentos. Na cobertura existem dois apartamentos duplex com terraço dedicado.


dupla curvatura e um conjunto de varandas na face norte. A princípio, essa edificação foi considerada com uso residencial. Com a manipulação volumétrica, houve um prolongamento de alguns pavimentos, o que dificultaria a iluminação de alguns cômodos dos apartamentos. Foi tomada a decisão da conversão em lajes corporativas, o que também se tratou apenas de uma adequação de planta.

56 _ exercício de projeto

O sexto edifício é uma pré-existência. Uma garagem vertical com um sistema de 6 elevadores de carga para a distribuição de veículos para os 36 pavimen-


57 _ exercício de projeto

tos. A decisão tomada aqui foi a de converter o uso do edifício em residencial, criando 5 tipologias: 4 apartamentos por andar; 3 apartamentos por andar; 2 apartamentos por andar; e 1 apartamento por andar. A diversidade de tamanhos criaria uma ocupação múltipla no sentido de alcançar classes sociais diferentes, necessidades diferentes de seus moradores. Como a garagem também possuía dois pavimentos no subsolo, fora criada uma galeria de arte, com espaço expositivo externo. Os últimos pavimentos foram convertidos em mirante e bar. Para


alcançar um pé direito confortável para habitações, os andares foram unidos de modo que o apartamento alcançasse pé direito duplo – isso permitiu que as tipologias menores portassem um mezanino.

58 _ exercício de projeto

Outro script foi aplicado para a elaboração dos elementos de fachada do edifício 6. A partir de um grid de pontos extraídos de uma série, foi aplicado um pattern de tijolos cerâmicos. Fora criada uma variação de alturas entre os tijolos a fim de que um efeito de movimento fosse alcançado na fachada, com a composição de vários módulos. A variação de altura foi baseada na estratégia de linhas atratoras. O projeto prevê que esses elementos sejam usinados em uma fresadora de grande formato diretamente em argila. O sétimo e último prédio também é uma pré-existência de edifício garagem. Esse possui uma característica muito interessante: é composto de uma rampa única no seu interior, onde os carros são estacionados em 45 graus, guiados por uma parede estrutural de concreto em “zig-zag”. A decisão aqui foi dividir o volume retangular ao meio, no sentido longitudinal. Dessa forma, a rampa existente em uma das laterais pode ser mantida como núcleo central de circulação. A outra porção do prédio foi convertida em pavimentos planos para atender ao programa pretendido, uma Escola de Arte e Tecnologia. A escola possui um grande conjunto de laboratórios e ateliês que se concentram nessa porção com lajes planas, onde o acesso é feito pelo patamar intermediário das rampas (ver diagrama). Uma nova porção foi adicionada


ao edifício, uma nova ala que recobre a porção do lote de entrada da quadra na rua Martins Fontes. Essa nova ala abriga a biblioteca, salas de aula convencionais e laboratórios de computação.

Como comentado anteriormente, a cidade é uma sobreposição de tempos e fatos, uma colagem de planos e projetos urbanos, que compõe um todo complexo e não uniforme. Essa é a temática central de discussão do exercício projetual referente. O projeto defende um posicionamento em que o diferente não seja tido como ruim, mas como parte importante na elaboração da cidade complexa. A intenção foi criar unidade entre os projetos, a partir das soluções práticas e espaciais. Nesse sentido, podemos perceber que a uniformização estética de um conjunto de edifícios não possui interação com a busca por pluralidade na Cidade de São Paulo. Permite a permeabilidade do diferente, construção do diálogo entre diversas naturezas. A simulação da cidade real e não mais um projeto icônico. Trata-se aqui de ocupar os interstícios de um território encerrado, denso e construído. Ocupar uma cidade sem espaços de forma humana.

59 _ exercício de projeto

CONSIDERAÇÃO FINAL


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Geografia Da Cor: A cores presentes no território urbano do exercício de projeto.


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72 _ conclusĂŁo


CONCLUSÃO

É dever do arquiteto saber articular as pressões sobre sua proposta. Usar as informações acerca de seu problema para compor sua arquitetura. Se apropriar da cultura de massas e agregar sua interpretação de artífice, não empregando um estilo próprio e único, mas adequando sua proposta a dinâmica singular de um contexto complexo. Se faz necessária uma contextualização temporal dentro da crítica à arquitetura. Os conceitos apresentados pela exploração dos meios digitais (o virtual, o efêmero, a continuidade, a materialidade, e a ubiquidade) não devem ser analisados sob a luz de uma arquitetura tradicional, ainda baseada nem convenções técnicas de desenho à mão.

Retomando a ideia apresentada por Terzidis (2006), em um cenário ideal de parceria com a entidade máquina, o homem seria responsável, justamente, por todos os processos não computáveis que envolvem a criação. A exemplo disso, Verônica Natividade (2010) nos mostra que Cristopher Alexander se convence de que durante o processo de projeto há algo chamado “inspiração”, que não pode ser explicado ou decodificado. A mesma “inspiração” que fazia com que Mark Burry (2011) negasse qualquer entidade que repre-

73 _ conclusão

Tenta-se, por muito tempo, tratar as variáveis que envolvem um problema de projeto, de forma empírica, como abstrações – isso anula a veracidade das decisões de projeto em prol da busca por uma vontade estética pré-concebida por referências culturais. Se o projeto está blindado por um processo denso de análises assistidas por algoritmos, estaremos justificando decisões de projeto com fatos reais do contexto. A crítica será mais profunda no sentido que ela entende o processo digital, e, portanto, fomenta a discussão sobre decisões concretas e não holísticas.


sentasse uma ameaça a essa etapa na concepção. Pode-se chegar a discutir a coautoria da máquina no momento em que o homem concede maior autonomia ao sistema. Tratando da questão apresentada através dos meta-algoritmos, a perda da autoria humana sobre os códigos gerados por meio de alterações inesperadas (mutações), não significa a perda de autoria sobre um projeto, mas significa que as decisões não foram fruto apenas de realizações humanas. A cultura do compartilhamento online foi extremamente importante para a difusão de técnicas de scripting, e muitos dos códigos que estruturamos em um processo desse tipo, é, na verdade, uma junção de diversos conjuntos de algoritmos, em que entendemos o fluxo de informação e a manipulação dela em cada componente do script. Ao passo que isso significa um grande avanço no âmbito da open culture1, a cópia de scripts pode resultar na clonagem de soluções de design (BURRY, 2011).

74 _ conclusão

A arquitetura, assim como outros campos do conhecimento, já não se basta. Vivemos um período em que a construção está aprendendo e aceitando interagir com outras formas de conhecimento e de arte, ampliando seu campo de atuação (VIDLER in SYKES, 2013). O arquiteto nunca antes foi capaz de acompanhar de perto cada passo e detalhe de seu projeto, sempre recorrendo as disciplinas técnicas competentes, as quais ele apenas deveria supervisionar. As dinâmicas digitais só fazem aumentar as pressões que envolvem a queda das questões autorais na profissão e o posicionamento do arquiteto como diretor criativo (BURRY, 2011).

1  Apoiada no desenvolvimento de software livre, a prática da open culture culmina no compartilhamento de informações e coisas (objetos) através de redes online de comunicação. Uma forma de tornar livre o acesso ao conhecimento.


75 _ conclusão

“I would like to think that in the next 10 years we will have succeeded, and we will have a new conceptual environment for creative thinking and without need for scripting, if all we have achieved is to replace drawing with typing the we have achieved nothing!” (FRAZER apud BURRY, 2011).


76 _ bibliografia


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