Edifícios modernistas em lisboa, 1925 1940

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EDIFÍCIOS MODERNISTAS CARACTERIZAÇÃO CONSTRUTIVA E PATOLOGIA

Vera Lúcia Nobre Higino

Dissertação para Obtenção do Grau de Mestre em Construção e Reabilitação

Orientadores Orientador: Professor Doutor João Paulo Janeiro Gomes Ferreira (IST) Co-orientador: Eng.º João Augusto da Silva Appleton

VERSÃO PROVISÓRIA Outubro 2013


RESUMO

Esta dissertação visa caracterizar os edifícios Modernistas de caráter habitacional urbano, construídos em Lisboa nas décadas 20 e 30 do séc. XX, considerando a sua singularidade no que diz respeito ao seu estilo arquitectónico Modernista e à tipologia construtiva hibrida, de transição para a introdução do betão armado na construção. O seu principal objectivo é contribuir para a compreensão da relação entre o estilo arquitectónico e a evolução das técnicas construtivas, e o reflexo deste processo na forma e características construtivas encontradas no parque edificado Lisboeta. O trabalho desenvolvido teve ainda por objectivo caracterizar o estado de degradação destes edifícios, identificando os elementos mais susceptível e respectivas causas. Para o efeito analisou-se um conjunto de 18 edifícios, distribuídos por 6 zonas da cidade. Identificaram-se dois tipos de edifícios referenciados ao estilo arquitectónico e respectivos períodos de construção: entre 1925 e 1930 – Modernismo das Art Déco, e as décadas de 30 e 40 – Modernismo Radical. Relativamente à degradação dos edifícios, verificou-se que a evolução na tipologia construtiva, com a introdução do betão armado em larga escala, se traduziu também numa alteração ao nível dos tipos de patologia mais incidentes e no tipo de elementos mais afectados. Conclui-se que, nos edifícios modernistas, a introdução do betão armado não levou a uma alteração substancial ao nível da estrutura espacial dos edifícios sendo sobretudo traduzida ao nível da composição das fachadas que, no Modernismo Radical, ganham maior tridimensionalidade através de elementos salientes, repetidos sobre principios tradicionais de simetria. Palavras-chave: Modernismo, Betão armado, habitação para rendimento, Patologia.

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ABSTRACT

The present thesis aims to define and distinguish urban Modernist housing buildings, build in Lisbon, in the early years of the 20th century, from 1920s to the 1930s, taking into account not only the unique identity of this buildings, regarding it’s architectonic modernist style but also it’s hybrid building methods, carrying over to the introduction of the reinforced concrete building system. It’s main goal is to reach a better understanding of the relation between the architectonic style and the the evolution of the construction techniques, the consequence of this process in the shape and building methods found in Lisbon’s building stock. The developed work target also to record the conservation conditions of this buildings, identifying it’s weakest elements and the corresponding causes. For that matter it was developed an analysis of 18 buildings, from 6 different parts of the city. Latter they were grouped in two distinct groups, regarding it’s architectonic style and it’s respective construction periods: between 1925 and 1930 – the Art Déco Modernism; and from the 1930s to the 1940s – the Radical Modernism. Regarding the buildings state of preservation, it was noted that along the construction evolution, specially with the introduction of the reinforced concrete at a larger scale, that it refleted a shift in the common pathologies found, and in the most affected elements. It was concluded that in the modernist buildings, the introduction of the reinforced concrete, did’t lead to a substantial change in the spacial structure of the buildings, being mainly responsible for the rich facades compositions, present mainly in the Radical Modernism, were the facades reach greater relevance, through repeated projecting elements, following traditional principles of symmetry. Keywords: Modernism, Reinforced Concrete, Housing Building, Pathology.

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AGRADECIMENTOS

Um agradecimento especial ao professor João Gomes Ferreira, pela disponibilidade, dedicação e entusiasmo demonstrados desde o início do trabalho. Ao Eng.º João Appleton pelo privilégio concedido em partilhar os seus conhecimentos. Á minha colega e amiga Elizabete Pino pelo companheirismo. À minha família, pelo apoio, dedicação e carinho. Ao João pelo entusiasmo e incentivo constante.

iii


INDICE RESUMO ........................................................................................................................................... i ABSTRACT ...................................................................................................................................... ii INDICE ............................................................................................................................................. iii LISTA DE FIGURAS ..................................................................................................................... viii LISTA DE TABELAS ...................................................................................................................... xii

1

INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 1

1.1

ENQUADRAMENTO ........................................................................................................... 1

1.2

OBJETIVOS ........................................................................................................................ 2

1.3

METODOLOGIA .................................................................................................................. 2

1.4

ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO DA DISSERTAÇÃO ...................................................... 2

2 2.1

2.2

3 3.1

ARQUITECTURA MODERNISTA............................................................................................ 4 CONTEXTO INTERNACIONAL .......................................................................................... 4 2.1.1

Composição arquitectonica de Grau Zero................................................................... 4

2.1.2

Arte e a técnica ........................................................................................................... 5

2.1.3

Art déco – forma e ornamento..................................................................................... 7

A ARQUITECTURA MODERNISTA EM LISBOA ............................................................... 8 2.2.1

Contexto histórico e politico: modelos urbanos e estratégias politicas ....................... 8

2.2.2

Contexto urbano.......................................................................................................... 8

2.2.3

A evolução estilística ................................................................................................. 10

2.2.4

Modernismo-classico uma contradição de termos. ................................................... 11

LEVANTAMENTO E IDENTIFICAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO ..................................... 12 RESULTADOS DO LEVANTAMENTO ............................................................................. 13 3.1.1

Zona 1 | Ocidental ..................................................................................................... 14

3.1.2

Zona 2 | Avenidas ..................................................................................................... 20

3.1.3

Zona 3 | São Sebastião e Benfica ............................................................................. 27

3.1.4

Zona 4 | Oriental ....................................................................................................... 30 iv


3.2

3.1.5

Zona 5 | Centro e litoral Este Oriental ....................................................................... 37

3.1.6

Zona 6 | Litoral Oeste ................................................................................................ 39

ENQUADRAMENTO LEGAL E REGULAMENTAR ......................................................... 41 3.2.1

Regulamento de salubridade das edificações urbanas (rseu) 1903 - dec. de 14 de

fevereiro de 1903 ................................................................................................................... 41 3.2.2

Decreto nº 15289, de 30 de março de 1928 e decreto nº 18738 de 9 de agosto de

1930

42

3.2.3

Regulamento geral da construção urbana para a cidade de lisboa 1930 – edital de 6

de dezembro de 1930 ............................................................................................................ 43

3.3 4 4.1

3.2.4

Regulamento para o emprego do beton armado 1918 – Dec. 4036 de 3 de Abril de

1918

44

3.2.5

Regulamento do Betão Armado (RBA) 1935 – Dec. 25948 de 16/10/1935 .............. 45

ANÁLISE DO LEVANTAMENTO ...................................................................................... 46 CARACTERIZAÇÃO DOS EDIFÍCIOS MODERNISTAS ...................................................... 47 CARACTERIZAÇÃO CONSTRUTIVA – EDIFÍCIOS MODERNISTAS CONSTRUÍDOS

ENTRE 1920 E 1935, FASE ART DÉCO. ...................................................................................... 47 4.1.1

Tipologia gaioleiro ..................................................................................................... 48

4.1.1.1

Estrutura ........................................................................................................... 49

4.1.1.2

Paredes ............................................................................................................ 50

4.1.1.3

Pavimentos....................................................................................................... 52

4.1.1.4

Cobertura ......................................................................................................... 54

4.1.1.5

Escadas de salvação ....................................................................................... 56

4.1.1.6

Vãos ................................................................................................................. 56

4.1.2

Tipologia mista .......................................................................................................... 60

4.1.2.1

Estrutura ........................................................................................................... 60

4.1.2.2

Paredes ............................................................................................................ 62

4.1.2.3

Pavimento ........................................................................................................ 65

4.1.2.4

Escada de salvação ......................................................................................... 66

4.1.2.5

Vãos ................................................................................................................. 66

4.1.2.6

Acabamentos e elementos decorativos............................................................ 66 v


4.2

CARACTERIZAÇÃO CONSTRUTIVA - EDIFÍCIOS MODERNISTAS CONSTRUÍDOS

ENTRE 1930 E 1940, FASE MODERNISMO RADICAL ................................................................ 71 4.2.1

4.3

Tipologia da primeira fase de Betão armado ............................................................ 72

4.2.1.1

Estrutura ........................................................................................................... 72

4.2.1.2

Cobertura ......................................................................................................... 75

4.2.1.3

Escadas de salvação ....................................................................................... 75

4.2.1.4

Vãos ................................................................................................................. 76

4.2.1.5

Acabamentos e elementos decorativos............................................................ 77

CARACTERIZAÇÃO FISICO/ESPACIAL – EDIFÍCIOS MODERNISTAS CONSTRUÍDOS

ENTRE 1920 E 1935, FASE ART DÉCO. ...................................................................................... 80

4.4

4.3.1

O lote......................................................................................................................... 80

4.3.2

O edifício ................................................................................................................... 82

4.3.3

O fogo ....................................................................................................................... 85

CARACTERIZAÇÃO FÍSICO/ ESPACIAL - EDIFÍCIOS MODERNISTAS CONSTRUÍDOS

ENTRE 1930 E 1940, FASE MODERNISMO RADICAL ................................................................ 91

5 5.1

5.2

5.3

4.4.1

O lote......................................................................................................................... 91

4.4.2

O edifício ................................................................................................................... 92

4.4.3

O fogo ....................................................................................................................... 98

PATOLOGIA DOS EDIFICIOS MODERNISTAS ................................................................. 102 CARACTERIZAÇÃO DO ESTADO DE DEGRADAÇÃO DOS EDIFÍCIOS .................... 102 5.1.1

Metodologia............................................................................................................. 102

5.1.2

Critérios ................................................................................................................... 103

LOCALIZAÇÃO RELATIVA DAS PRINCIPAIS ANOMALIAS NO EDIFÍCIO ................ 104 5.2.1

Envolvente construída ............................................................................................. 104

5.2.2

Interior do edifício.................................................................................................... 107

DEGRADAÇÃO DOS PRINCIPAIS ELEMENTOS FONTE DE MANUTENÇÃO ........... 110 5.3.1

Análise de resultados .............................................................................................. 110

5.3.2

Descrição e análise das principais anomalias e suas causas por efm.................... 113

5.3.2.1

Tipologia mista ............................................................................................... 113

5.3.2.2

Tipologia 1ª fase do betão armado................................................................. 118 vi


6

CONCLUSÕES E DESENVOLVIMENTOS FUTUROS ....................................................... 119

7

BIBLIOGRAFIA ............................................................................ Erro! Marcador não definido.

vii


LISTA DE FIGURAS

FIG. 1 PROJECTO DA AVENIDA DA LIBERDADE, 1879 (OCCIDENTE, 1881) ..................................................... 10 FIG. 2 LISBOA 1897 (GRAVURA. 436) .................................................................................................... 10 FIG. 3 ESTRUTURA DO PLANO ESQUEMATIZADO. (FERNANDES, 1980) ........................................................... 10 FIG. 4 ZONAMENTO DO MAPA DE LISBOA ................................................................................................. 13 FIG. 5 SUBZONA “CONJUNTO-RUA”: AV. PEDRO ÁLVARES CABRAL; R. NOVA DE SÃO MAMEDE/ SALITRE ........... 15 FIG. 6 SUBZONA RUA ARTILHARIA UM/ RODRIGO DA FONSECA/ CASTILHO ................................................... 16 FIG. 7 SUBZONA BAIRRO “MARIA AMÁLIA”.............................................................................................. 18 FIG. 8 SUBZONA “CONJUNTO-RUA”: RUA ALEXANDRE BRAGA; RUA ALMIRANTE BARROSO............................... 21 FIG. 9 SUBZONA QUARTEIRÃO, R. ROVISCO PAIS/ “CONJUNTO-RUA”, AV. DEFENSORES DE CHAVES .................. 22 FIG. 10 SUBZONA “CONJUNTO-RUA”, CAMPO PEQUENO/ AV. JOÃO XXI ..................................................... 23 FIG. 11 SUBZONA QUARTEIRÃO, AV. DE BERNA/ IGREJA N. SENHORA DE FÁTIMA / AV. DA REPUBLICA .............. 25 FIG. 12 SUBZONA BAIRRO AZUL ............................................................................................................. 28 FIG. 13 SUBZONA QUARTEIRÃO ESTRADA DE BENFICA/ R. D. ANTÓNIO GRANJO, SETE RIOS ............................. 29 FIG. 14 BAIRRO DAS COLÓNIAS 1921 ..................................................................................................... 30 FIG. 15 SUBZONA BAIRRO DAS COLÓNIAS / R. FORNO DO TIJOLO / R. DE ANGOLA .......................................... 31 FIG. 16 SUBZONA BAIRRO DAS COLÓNIAS / R. DE ANGOLA/ PENHA DE FRANÇA .............................................. 32 FIG. 17 SUBZONA BAIRRO DE ARROIOS.................................................................................................... 33 FIG. 18 SUBZONA BAIRRO DOS ATORES/ ALAMEDA/ ANTIGO BAIRRO DA G.N.R ............................................. 34 FIG. 19 SUBZONA BAIRRO LOPES/ ALTO DE SÃO JOÃO ............................................................................... 36 FIG. 20 SUBZONA MADREDEUS/ XABREGAS R. GUALDIM PAIS .................................................................... 37 FIG. 21 SUBZONA R. ARTUR LAMAS/ R. PINTO FERREIRA, JUNQUEIRA .......................................................... 39 FIG. 22EDIFICIO Nº 69 A 75 DA AVENIDA ELIAS GARCIA, ALÇADO TARDOZ. (LISBOA, OBRA Nº47994) ............... 47 FIG. 23EDIFICIO Nº 69 A 75 DA AVENIDA ELIAS GARCIA, ALÇADO PRINCIPAL. (LISBOA, OBRA Nº47994) ............ 47 FIG. 24 PORMENOR DAS COLUNAS E LAJE DA MARQUISE. (LISBOA, OBRA Nº3796) ......................................... 49 FIG. 25 PORMENOR DA FUNDAÇÃO DAS COLUNA. (LISBOA, OBRA Nº3796) ................................................... 49 FIG. 26 EDIFÍCIO Nº 69 A 75 DA AVENIDA ELIAS GARCIA; A) PAREDE DE FACHADA EM ALVENARIA MISTA; B) FORRO EM CANTARIA; C) INTERSEÇÃO DA PAREDE DIVISÓRIA NA PAREDE MESTRA DE PEDRA; D) PANOS DE PEITO EM TIJOLO MACIÇO; E) FACHADA PRINCIPAL. (FOTOS DO AUTOR) ............................................................... 51

FIG. 27 CORTE DE UM MASSAME SOBRE CAMADAS DE TERRA. (COSTA, 1930) ................................................ 52 FIG. 28 ASSENTAMENTO DE SOALHO COM SERRAFADO. (COSTA, 1930) ........................................................ 52 FIG. 29 RESPIRADORES DOS DEGRAUS DA ESCADA. ..................................................................................... 52 FIG. 30 RESPIRADORES NO FORRO DE CANTARIA. ....................................................................................... 52 FIG. 31 PORMENOR DE PAVIMENTO DE MADEIRA NO INTERIOR. (LISBOA, OBRA Nº39164) .............................. 53 FIG. 32 PORMENOR DE PAVIMENTO DE MADEIRA. ..................................................................................... 53 FIG. 33 PAVIMENTO EM ABOBADILHAS NA VARANDA TÉCNICA. (FOTO DO AUTOR) ........................................... 54

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FIG. 34 PAVIMENTO EM ABOBADILHAS NA VARANDA TÉCNICA. ..................................................................... 54 FIG. 35 CORTE DA COBERTURA DO EDIFÍCIO Nº 91 A 99 NA RUA FILIPE DA MATADE 1932-33. ......................... 54 FIG. 36 PORMENOR DE PLATIBANDA NA FACHADA PRINCIPAL. (LISBOA, OBRA Nº48013) .................................. 55 FIG. 37 PORMENORES DE ALGEROZ NA FACHADA PRINCIPAL. (LISBOA, OBRA Nº3796) ..................................... 55 FIG. 38 PORMENORES DE ALGEROZ NA FACHADA TARDOZ. (LISBOA, OBRA Nº3796) ........................................ 55 FIG. 39 PORMENOR DA “CLARABOIA DE ESTEIRA”. (COSTA, 1930) .............................................................. 55 FIG. 40 PORMENOR DO LANTERNIM. (COSTA, 1930) ................................................................................ 55 FIG. 41 CONJUNTO DE EDIFICIOS MODERNISTAS COM CLARABOIA. (FOTO DO AUTOR) ....................................... 55 FIG. 42 PORMENORES DA ESCADA DE SALVAÇÃO (LISBOA, OBRA Nº39164) ................................................... 56 FIG. 43 VERGA EM TIJOLO NA PAREDE EXTERIOR DO EDIFÍCIO Nº 69 A 75 DA AVENIDA ELIAS GARCIA. (FOTO DO AUTOR) ..................................................................................................................................... 57

FIG. 44 VERGA EM TIJOLO RESSALVADAS. (COSTA, 1930) ........................................................................... 57 FIG. 45 ELEMENTOS DE MADEIRA INTRODUZIDOS NA ALVENARIA, À SEMELHANÇA DE UM VÃO DE UMA PAREDE EM 4

GAIOLA. (FOTO DO AUTOR) .......................................................................................................... 57 4

FIG. 46 VERGA EM TIJOLO. (FOTO DO AUTOR) .......................................................................................... 57 FIG. 47 ALGUNS EXEMPLOS DE VÃOS EXTERIORES. (FOTOS DO AUTOR) ........................................................... 58 FIG. 48 MARQUISE EM FERRO E VIDRO SIMPLES. (FOTO DO AUTOR)............................................................... 59 FIG. 49 MARQUISE EM FERRO E VIDRO SIMPLES. (FOTO DO AUTOR)............................................................... 59 FIG. 50 EDIFÍCIO Nº 55 DA AVENIDA DA REPÚBLICA. (LISBOA, OBRA Nº39164) ............................................. 61 FIG. 51 E FIG. 52 EDIFICIO Nº 55 DA AVENIDA DA REPÚBLICA, COLUNAS NO PISO TÉRREO. (FOTO DO AUTOR) ....... 61 FIG. 53 PORMENOR DE CINTA DE BETÃO ARMADO. (LISBOA, OBRA Nº45306 ) ............................................... 62 FIG. 54 PORMENOR DE CINTA DE BETÃO ARMADO. (LISBOA, OBRA Nº45407 ) ............................................... 62 FIG. 55, FIG. 56, FIG. 57 EXEMPLOS DE PAREDES MESTRAS. (FOTOS DO AUTOR)............................................ 63 FIG. 58, FIG. 59, FIG. 60, EXEMPLOS DE PAREDES DIVISÓRIAS. (FOTOS DO AUTOR) ........................................ 63 FIG. 61, FIG. 62 PORMENORES DE LAJE EM BETÃO ARMADO. (LISBOA, OBRA Nº48567) ................................. 65 FIG. 63 PORMENOR DE ESCADA DE SERVIÇO. ............................................................................................ 66 FIG. 64 EXEMPLO DE ESCADA DE SERVIÇO................................................................................................. 66 FIG. 65 FIGURAS HUMANAS EM PEDRA. (FOTOS DO AUTOR)......................................................................... 67 FIG. 66 BASE DE VARANDA EM CONCHA. (FOTOS DO AUTOR) ....................................................................... 67 FIG. 67 MOSAICO CERÂMICO EM FACHADA. (FOTOS DO AUTOR) ................................................................... 67 FIG. 68 CIMALHA TRABALHADA COM MOTIVOS GEOMÉTRICOS. (FOTO DO AUTOR) ........................................... 68 FIG. 69 FRISOS E MOLDURAS A ENQUADRAR OS VÃOS. (FOTO DO AUTOR) ....................................................... 68 FIG. 70 ELEMENTO DECORATIVO. (FOTO DO AUTOR) .................................................................................. 68 FIG. 71 PORMENOR DE DESENHO DE FACHADA. (LISBOA, OBRA Nº48013) .................................................... 68 FIG. 72 COLUNATAS DE COROAMENTO. (FOTOS DO AUTOR)......................................................................... 68 FIG. 73 ELEMENTOS DECORATIVOS PIRAMIDAIS. (FOTOS DO AUTOR) ............................................................. 68 FIG. 74 PAINEL DECORATIVO DA AUTORIA DO ARTISTA JORGE BARRADAS ARREDORES DE LISBOA, AS SALOIAS. (ARQUITECTOS, 3 ABRIL 1938) ..................................................................................................... 68

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FIG. 75 REVESTIMENTO CERÂMICO ART DÉCO. (FERNANDES, 1979) ............................................................ 68 FIG. 76 TECTOS TRABALHADOS EM GESSO NO ÁTRIO DE ENTRADA, NO EDIFÍCIO Nº 131 DA RUA RODRIGO DA FONSECA. (FOTO DO AUTOR)......................................................................................................... 69 FIG. 77, FIG. 78 TECTOS TRABALHADOS EM GESSO EM COMPARTIMENTOS INTERIORES, NO EDIFÍCIO Nº 131 DA RUA RODRIGO DA FONSECA. (FOTOS DO AUTOR) ..................................................................................... 69 FIG. 79 PAVIMENTO EM MOSAICO HIDRÁULICO COM MOTIVOS GEOMÉTRICOS. (FOTO DO AUTOR) ...................... 70 FIG. 80 PAVIMENTO EM MOSAICO HIDRÁULICO COM MOTIVOS FLORAIS. (FOTO DO AUTOR) ............................... 70 FIG. 81 PAREDE ESTUCADA. (COSTA, 1930)............................................................................................. 70 FIG. 82 PAREDE ESTUCADA COM LAMBRIL DE AZULEJO. (COSTA, 1930) ......................................................... 70 FIG. 83 FACHADA PRINCIPAL, EDIFICIO Nº 25 DA AV. RESSANO GARCIA. (LISBOA, OBRA Nº48647) .................... 71 FIG. 84 FACHADA TARDOZ, EDIFICIO Nº 25 DA AV. RESSANO GARCIA. (LISBOA, OBRA Nº48647)....................... 71 FIG. 85 PLANTA DE FUNDAÇÕES (SAPATAS) DO EDIFICIO Nº74 DA RUA NOVA DE SÃO MAMEDE (LISBOA, OBRA Nº49904)................................................................................................................................. 72

FIG. 86 PLANTA DE FUNDAÇÕES (SAPATA GERAL) DO EDIFICIO Nº7 DA RUA ALEXANDRE BRAGA (LISBOA, OBRA Nº51126)................................................................................................................................. 72

FIG. 87 PLANTA DE FUNDAÇÕES (ESTACARIA) DO EDIFICIO Nº48 DA RUA ARTILHARIA UM. (LISBOA, OBRA Nº 52568) ............................................................................................................................................... 73 FIG. 88 SAPATA DE PILAR ISOLADO; FIG. 89 SAPATA DA PAREDE DE EMPENA; FIG. 90 PLATAFORMA DE FUNDAÇÃO. (LISBOA, OBRA Nº49904) ........................................................................................................... 73 FIG. 91, FIG. 92, FIG. 93 EXEMPLOS DE LAJES COM ARMADURA EM CRUZ, RECOLHIDAS IN SITU.......................... 74 FIG. 94 PORMENOR DE COBERTURA PLANA (LISBOA, OBRA Nº 52568). ........................................................ 75 FIG. 95 COBERTURA PLANA. (FOTO DO AUTOR) ......................................................................................... 75 FIG. 96 ESCADA DE SERVIÇO EM VOLUME FECHADO DE BETÃO ARMADO. (FOTO DO AUTOR) ............................... 76 FIG. 97 EDIFICIO NO BAIRRO D. AMÁLIA COM A ESCADA DE SERVIÇO EM BETÃO ARMADO. (FOTO DO AUTOR) ....... 76 FIG. 98 ESCADA DE SERVIÇO. (FERNANDES, 1979) .................................................................................... 76 FIG. 99 EDIFÍCIO COM VÃOS HORIZONTAIS EM CONSOLA. (FOTO DO AUTOR) ................................................... 76 FIG. 100 EDIFÍCIO COM BOW-WINDOWS. (FOTO DO AUTOR) ....................................................................... 76 FIG. 101 EDIFÍCIO COM VÃO VERTICAL DE ILUMINAÇÃO DAS ESCADAS. ........................................................... 76 FIG. 102; FIG. 103; FIG. 104; EXEMPLOS DE ALÇADOS TARDOZ. (FOTOS DO AUTOR) ....................................... 77 FIG. 105 PAINEL DECORATIVO. .............................................................................................................. 77 FIG. 106 FAIXAS HORIZONTAIS. .............................................................................................................. 77 FIG. 107 ELEMENTOS DECORATIVOS. ...................................................................................................... 77 FIG. 108, FIG. 109, FIG. 110 ACABAMENTOS INTERIORES DAS ÁREAS COMUNS DO PRÉDIO............................... 78 FIG. 111; FIG. 112; FIG. 113; EXEMPLOS DE PORTAS DE ENTRADA EM SERRALHARIA ....................................... 79 FIG. 114 IMPLANTAÇÃO DO EDIFÍCIO Nº55 DA AVENIDA DA RÉPUBLICA. ........................................................ 80 FIG. 115 IMPLANTAÇÃO DO EDIFÍCIO Nº21 DA RUA DAMASCENO MONTEIRO. ................................................ 80 FIG. 116 IMPLANTAÇÃO DO EDIFÍCIO Nº26 DA RUA VISCONDE DE SANTARÉM................................................. 80 FIG. 117 EDIFÍCIO Nº 27 DA AVENIDA ELIAS GARCIA.(FOTO DO AUTOR) ........................................................ 84

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FIG. 118 EDIFÍCIO Nº 12 DA AVENIDA BARBOSA DO BOCAGE. (FOTO DO AUTOR) ............................................ 84 FIG. 119 EDIFÍCIO Nº 173 DA AVENIDA ANTÓNIO AUGUSTO DE AGUIAR.(FOTO DO AUTOR) .............................. 85 FIG. 120 EDIFÍCIO Nº 1 DA RUA FIALHO DE ALMEIDA. (FOTO DO AUTOR) ....................................................... 85 FIG. 121 AVENIDA ELIAS GARCIA Nº69 ................................................................................................... 86 FIG. 122 AV. DA RÉPUBLICA Nº49.......................................................................................................... 86 FIG. 123 RUA VISCONDE DE SANTARÉM Nº26 .......................................................................................... 87 FIG. 124 AVENIDA RESSANO GARCIA Nº25 .............................................................................................. 87 FIG. 125 RUA ELIAS GARCIA Nº180 ....................................................................................................... 87 FIG. 126 RUA EDUARDO BRASÃO Nº2 E 4................................................................................................ 87 FIG. 127 RUA RODRIGO DA FONSECA Nº131 ........................................................................................... 88 FIG. 128 AVENIDA ALMIRANTE REIS Nº197 ............................................................................................. 88 FIG. 129 RUA ALEXANDRE BARGA Nº6 E 4 ............................................................................................... 89 FIG. 130 RUA DAMASCENO MONTEIRO Nº91 .......................................................................................... 89 FIG. 131 AVENIDA DA REPUBLICA Nº191 ................................................................................................ 89 FIG. 132 AVENIDA ELIAS GARCIA Nº63 ................................................................................................... 89 FIG. 133 RUA LOPES Nº91.................................................................................................................... 90 FIG. 134 IMPLANTAÇÃO DO EDIFÍCIO Nº50 DA RUA SAMPAIO E PINA. ........................................................... 92 FIG. 135 IMPLANTAÇÃO DO EDIFÍCIO Nº20 DA RUA FIALHO DE ALMEIDA. ...................................................... 92 FIG. 136; FIG. 137; EXEMPLOS DE SAGUÕES. (FOTOS DO AUTOR) ................................................................ 93 FIG. 138 EDIFICIO Nº 25 DA AVENIDA RESSANO GARCIA, 1919-1935. (LISBOA, OBRA Nº48647) .................... 94 FIG. 139 EDIFÍCIO Nº40 RUA OSCRA MONTEIRO TORRES. (FOTO E ESQUEMA DO AUTOR) ................................. 95 FIG. 140 EDIFÍCIO Nº14 RUA DE MACAU. (FOTO E ESQUEMA DO AUTOR) ...................................................... 95 FIG. 141 EDIFÍCIO Nº 27 AVENIDA DEFENSOR DE CHAVES. (FOTO E ESQUEMA DO AUTOR) ................................ 96 FIG. 142 EDIFÍCIO Nº179 DA RUA DO SALITRE. (FOTO E ESQUEMA DO AUTOR) ............................................... 97 FIG. 143 EDIFÍCIO Nº 9 RUA NOVA DE SÃO MAMEDE. (FOTO E ESQUEMA DO AUTOR) ...................................... 97 FIG. 144 EDIFÍCIO Nº8 RUA SOUSA VITERBO. (FOTO E ESQUEMA DO AUTOR) ................................................. 98 FIG. 145 EDIFÍCIO Nº 3 RUA EIFFEL. (FOTO E ESQUEMA DO AUTOR) ............................................................. 98 FIG. 146 RUA SAMPAIO E PINAº50 E 54 ................................................................................................. 99 FIG. 147 AVENIDA RESSANO GARCIA Nº5 .............................................................................................. 100 FIG. 148 RUA NOVA DE SÃO MAMEDE Nº74 ......................................................................................... 100 FIG. 149 RUA RODRIGO DA FONSECA Nº192 ......................................................................................... 100 FIG. 150 RUA MARQUÊS SUBSERRA Nº17 ............................................................................................. 100 FIG. 151 RUA ARTILHARIA UM, 48 ...................................................................................................... 101 FIG. 152 ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR E INVÓLUCRO DOS EDIFÍCIOS DE TIPOLOGIA MISTA. .................. 104 FIG. 153 ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR E INVÓLUCRO DOS EDIFÍCIOS DA 1ª FASE DO BETÃO ARMADO. .... 104 FIG. 154 PRINCIPAIS GRUPOS DE EFM AFECTADOS NO INVÓLUTRO DO EDIFÍCIO DO TIPO MISTO. ...................... 105 FIG. 155 PRINCIPAIS GRUPOS DE EFM AFECTADOS NO INVÓLUTRO DO EDIFÍCIO DO TIPO 1ª FASE DE BETÃO ARMADO. ............................................................................................................................................. 105

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FIG. 156 DIFERENTES ANOMALIAS REGISTADAS NO INVÓLUCRO DO EDIFÍCIO DO TIPO MISTO ............................ 106 FIG. 157 DIFERENTES ANOMALIAS REGISTADAS NO INVÓLUCRO DO EDIFÍCIO DO TIPO 1ª FASE DO BETÃO ARMADO 106 FIG. 158 DIFERENTES CAUSAS DAS ANOMALIAS REGISTADAS NO INVÓLUCRO DO EDIFÍCIO DO TIPO MISTO ........... 107 FIG. 159 DIFERENTES CAUSAS DAS ANOMALIAS REGISTADAS NO INVÓLUCRO DO EDIFÍCIO DO TIPO 1ª FASE DO BETÃO ARMADO ................................................................................................................................. 107

FIG. 160 PRINCIPAIS GRUPOS DE EFM AFECTADOS NO INTERIOR DO EDIFÍCIO DO TIPO MISTO........................... 108 FIG. 161 PRINCIPAIS GRUPOS DE EFM AFECTADOS NO INTERIOR DO EDIFÍCIO DO TIPO 1ª FASE DE BETÃO ARMADO. ............................................................................................................................................. 108 FIG. 162 DIFERENTES ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR DO EDIFÍCIO DO TIPO MISTO................................ 109 FIG. 163 DIFERENTES ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR ..................................................................... 109 FIG. 164 DIFERENTES CAUSAS DAS ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR DOS EDIFÍCIOS DO TIPO MISTO. ........... 109 FIG. 165 DIFERENTES CAUSAS DAS ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR DOS EDIFÍCIOS DA 1ª FASE DO BETÃO ARMADO. ................................................................................................................................ 109

FIG. 166 FREQUÊNCIA DE ANOMALIAS REGISTADAS NO INVÓLUCRO DO EDIFÍCIO. ........................................... 110 FIG. 167 FREQUÊNCIA DE ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR DO EDIFÍCIO. .............................................. 111 FIG. 168 FREQUÊNCIA DAS CAUSAS DE ANOMALIAS REGISTADAS NO INVÓLUCRO DO EDIFÍCIO. .......................... 111 FIG. 169 FREQUÊNCIA DAS CAUSAS DE ANOMALIAS REGISTADAS NO INTERIOR DO EDIFÍCIO. ............................. 112 FIG. 170 FREQUÊNCIA DE ANOMALIAS ENCONTRADAS EM CADA GRUPO EFM NO INVÓLUCRO DO EDIFÍCIO. ........ 112 FIG. 171 FREQUÊNCIA DE ANOMALIAS ENCONTRADAS EM CADA GRUPO EFM NO INTERIOR DO EDIFÍCIO............. 113 FIG. 172 DESCASQUE NO RECOBRIMENTO DE ARMADURAS DA LAJE, COM CORROSÃO ASSOCIADA NO INTERIOR.... 114 FIG. 173 FISSURAÇÃO NO ENCONTRO DA VIGA COM A ESTRUTURA DA MARQUISE........................................... 114 FIG. 174, FIG. 175, FIG. 176 CORROSÃO DE ESTRUTURAS METÁLICAS. (FOTOS DO AUTOR)............................. 114 FIG. 177, FIG. 178 COLAPSO DA ESTRUTURA METÁLICA DA MARQUISE. (LISBOA, OBRA Nº21100 ) .................. 115 FIG. 179, FIG. 180 DESCASQUE E ESCAMAÇÃO DO REVESTIMENTO DOS PARAMENTOS EXTERIORES. .................. 116 FIG. 181 DESCASQUE E ESCAMAÇÃO DO REVESTIMENTO DA PAREDE DE ALVENARIA DE TIJOLO. ......................... 116 FIG. 182 DESCASQUE E ESCAMAÇÃO DO REVESTIMENTO DA PAREDE DE ALVENARIA DE PEDRA. ......................... 116 FIG. 183 DESCASQUE E ESCAMAÇÃO DO REVESTIMENTO DE TECTOS NO ÚLTIMO PISO. (FOTO DO AUTOR) ........... 117 FIG. 184 ROTURA NA CANALIZAÇÃO. (FOTO DO AUTOR) ........................................................................... 117

LISTA DE TABELAS TABELA 1 ESPESSURA DAS PAREDES DE ALVENARIA SEGUNDO DISPOSIÇÕES DO ARTIGO Nº32 DO RGCU, 1930. (EXCLUINDO REBOCOS E REVESTIMENTOS) ........................................................................................ 64 TABELA 2 IDENTIFICAÇÃO DOS 12 EDIFÍCIOS EM ESTUDO ........................................................................... 102

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1

INTRODUÇÃO

Na presente dissertação pretende-se caracterizar construtivamente e analisar as principais patologias em edifícios habitacionais construídos em Lisboa nas décadas 20 e 30 do séc. XX enquadrados no estilo arquitetónico Modernista. O avançado estado de degradação identificado em muitos destes edifícios, associado ao seu valor arquitetónico pela exemplaridade no que à Art Déco, ao modernismo e às artes decorativas diz respeito, impõe a definição de metodologias e estratégias de intervenção capazes de salvaguardar o seu valor cultural, prolongando a sua vida útil. Pretende-se fornecer instrumentos de análise técnica, que permitam um conhecimento mais amplo da natureza construtiva destes edifícios, que potenciem intervenções integradas, compatíveis que respondam às exigências funcionais e culturais do património arquitetónico. Esta análise é essencialmente dirigida aos técnicos projetistas bem como entidades gestoras, proprietários e inquilinos intervenientes na vida útil destes edifícios.

1.1

ENQUADRAMENTO

Os edifícios de habitação coletiva, da cidade de Lisboa, muitos deles funcionando atualmente como escritórios, apresentam vários problemas de conservação e descaracterização do ponto de vista arquitetónico e construtivo, em função de intervenções realizadas sem o devido suporte informativo. Os edifícios Modernistas, objeto de estudo da presente dissertação (identificados no levantamento elaborado a pedido da Câmara Municipal de Lisboa desenvolvido em 1988, estudo classificativo que servirá de base à localização dos imóveis), apresentam face às deficientes condições técnico-económicas de origem e à falta de cuidados de manutenção e conservação uma acentuada degradação. Considera-se ainda existir por parte dos intervenientes alguma falta de informação quanto ao valor patrimonial arquitetónico e dificuldade na identificação dos elementos valorativos que caracterizam estes edifícios. Este desconhecimento resulta em práticas negligentes e irreversíveis, generalizadas no parque habitacional atual. Do ponto de vista arquitetónico as primeiras influências do movimento moderno, acompanham o período transitório da construção tipo “Gaioleiro” para a introdução do betão armado, material que viria a modernizar a construção e a renovar a expressão arquitetónica. A condição híbrida da construção neste período carece de análise e documentação técnicas que permita avaliar quais as melhores soluções de intervenção.

1


1.2

OBJETIVOS

Este trabalho tem como objetivo proporcionar uma melhor compreensão dos edifícios Modernistas, construídos com carácter habitacional, no que diz respeito á sua natureza construtiva, valor arquitetónico e estado de conservação, possibilitando a definição de formas de intervenção de reabilitação adequadas à sua génese. Pretende-se assim que a presente dissertação constitua um instrumento eficaz para melhorar a qualidade das intervenções, garantindo um melhor desempenho dos edifícios face às exigências funcionais dentro dos actuais padrões de habitabilidade, segurança e economia, mantendo o valor cultural do património arquitetónico construído.

1.3

METODOLOGIA

Para a realização dos objetivos propostos, procedeu-se á análise e compilação dos dados recolhidos nas seguintes fontes principais: a)

Pesquisa bibliográfica;

b)

Trabalho de campo tendo em vista a identificação, localização por zonas e caracterização dos edifícios modernistas na cidade de Lisboa;

c)

Preparação de fichas de inquérito / levantamento respeitantes aos 18 edifícios selecionados.

d)

Recolha de dados na Câmara Municipal de Lisboa referentes aos processos dos casos de estudo;

e)

Trabalho de campo, com visitas aos edifícios selecionados para efeitos de caracterização construtiva e levantamento de anomalias;

f)

Desenvolvimento de uma base de dados que permita registar os dados recolhidos nas fichas de inquérito / levantamento e tratá-los estatisticamente;

1.4

ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO DA DISSERTAÇÃO

A dissertação está organizada em cinco partes: 1.

Enquadramento histórico do objeto de estudo, com caracterização do estilo arquitetónico em que se insere, referenciado à situação internacional.

2


2.

Levantamento dos edifícios em estudo, através da análise de planos de urbanização, levantamentos topográficos da época e 1º Plano Diretor de Urbanização de Lisboa de 1959, para melhor caracterização da expansão urbana pós Plano das Avenidas Novas nas diferentes zonas/bairros da cidade de Lisboa; enquadramento do objeto de estudo face às normativas e regulamentação vigentes e sua consequência na prática da atividade de construção civil;

3.

Caracterização construtiva dos edifícios modernistas, dos seus elementos estruturais e não estruturais e suas técnicas de execução, assim como a caracterização espaçofuncional;

4.

Identificação e caracterização das principais patologias encontradas “in situ”, para cada Elemento Fonte de Manutenção afetado;

3


2 2.1

ARQUITECTURA MODERNISTA CONTEXTO INTERNACIONAL

O Movimento Moderno marcou a arquitectura que caracterizou mais significativa a produção do Séc. XX. Este Movimento procurou definir um modo único, racional e lógico, que pusesse fim à questão dos estilos que tinham dominado o debate oitocentista, assente numa espécie de revolução permanente à procura de critérios novos. A arquitectura vai querer responder com novas formas, estimuladas directamente por novas tecnologias e materiais, à transformação da vida moderna, esta desencadeada por um conjunto de factores: 1.

A industrialização como processo de aceleração do ritmo de vida, como geradora de novas formas de poder institucional e de novas formas de lutas de classes;

2.

A explosão demográfica que afectou milhões de deslocados empurrando-os em direcção a novas vidas, conduzindo a um rápido e catastrófico crescimento urbano;

3.

Os sistemas de comunicação de massas que envolvem indivíduos e sociedades, ao mesmo tempo que os movimentos sociais de massas lutam paradoxalmente por obter algum controle sobre as suas vidas;

4.

E finalmente um mercado de sentido capitalista mundial, flutuante em permanente expansão, que dirige e manipula pessoas e instituições.

A modernidade1 surge então no século XX como um conjunto de processos sociais que dão vida a esse turbilhão. A nossa civilização, moderna, burguesa e capitalista, iria buscar o seu fundamento não no passado, mas na mudança (Tostões, 2002). 2.1.1

COMPOSIÇÃO ARQUITECTONICA DE GRAU ZERO

“ O que significa é que, em certos períodos da história, quando o formalismo prevalece, quando os dogmas linguísticos não tomam em conta a evolução real, quando é necessário reconquistar o valor sem semântica das palavras a fim de combater o hábito das frases feitas, o Grau Zeno tornase um instrumento essencial para injectar sangue novo e vitalidade na linguagem exausta…o Grau Zero é um valor essencial e constante do movimento modernista ” (Zevi, 1982).

1

Palavra inventada por Baudelaire no seu célebre texto:“Le Peintre de la Vie Moderne” (1863), onde

pela primeira vez se utilizou o conceito de “la modernité”.

4


Duas características têm sido mantidas como definitivas do Movimento Moderno: a primeira é o funcionalismo, isto é uma espécie de intersecção dos factos em bruto da utilidade com as metodologias de desenho objectivas e os meios de produção estandardizadas. A segunda é a vanguarda integrando a tecnologia avançada. A “sinceridade” como dever moral exerceu uma influência directa sobre o modo de encarar a arte e a técnica. A forma passa a ser entendida como expressão da construção, revelando a verdade dos materiais e da estrutura, abre-se o campo ao materialismo, e com ele ao racionalismo e ao funcionalismo, e é também nesta medida que luta contra o ornamento puramente decorativo (Tostões, 2002). O movimento moderno começou com os engenheiros por um lado, e por outro o Grupo de Artes e Ofícios liderado por William Morris. Estes denunciaram a obsolescência de todos os tabus estilísticos do neo-Renascimento e do neo-Barroco. Não tentaram substituir os velhos estilos por um novo. Defenderam uma arquitectura livre de todo o tipo de leis, capaz de exprimir um conteúdo e funções sociais sem o filtro dos desenhos académicos. Na primeira década do séc. XX obras como a fábrica de turbinas AEG de Peter Behrens ao prédio da rua Franklin de Auguste Perret que fazem uma marcação europeia entre Berlim e Paris juntamente com as obras de Adolf Loos em Viena, às experimentações realizados no Novo Mundo com a escola de Chicago e o pioneirismo de Frank Lloyd Wright – vão marcar debate intenso nas primeiras décadas. 2.1.2

ARTE E A TÉCNICA

A apropriação arquitectónica dos avanços conduzidos pela engenharia no quadro das novas técnicas e sistemas estruturais foi o catalisador na construção da arquitectura moderna. Quando Auguste Perret (1874-1954) realiza a imagem de que a “arquitectura é a arte de fazer cantar o ponto de apoio” refere-se ao potencial estético das novas estruturas estimuladas pelo uso de novos materiais. O ferro seria o primeiro material artificial de construção, este material apresentava inúmeras potencialidades: A pré-fabricação de elementos realizada em fábrica, o que permitia uma rapidez e uma racionalidade da construção sem precedentes; a sua dimensão não era limitada pela forma; possibilitava um sistema de construção intrinsecamente aberto, isto é que não tinha que recorrer à composição, no sentido clássico. O desenvolvimento sequencial da arcada de ferro e vidro na cobertura de mercados, estações de caminhos de ferro, nos pavilhões de exposição ou nos grandes armazéns, engendrou tipologias construtivas destinadas a responder ao crescente processo de transformação social e económica 5


baseada no consumo, Contudo a sua aceitação no domínio dito clássico da arquitectura, incluindo o programa habitacional, contaria com resistência natural na medida em que destruía o sentido de perenidade e/ou monumentalidade de que a arquitectura era portadora (Tostões, 2002). Em 1900 o aço sucede ao ferro no Grand Palais (para albergar a exposição universal de Paris), mas tanto um como o outro eram frequentemente dissimulados por trás dos materiais julgados mais nobres. Havia no entanto a necessidade de encontrar um material que manifesta-se o vigor da “nova arquitectura”. O betão armado surge em meados do séc.XIX, constituindo-se como pedra artificial, fabricada através da mistura de brita, areia, cimento e água, vertido em cofragens previamente munidas de ferros dispostos de acordo com uma configuração ditada pela natureza das solicitações previstas. O betão resiste bem à compressão e mal à tração, de forma que as barras metálicas colocadas nos pontos sujeitos a este último esforço possam aliviar o betão, visto o ferro e o aço resistirem aos esforços de tensão. Trabalhando o betão e o aço em condições equivalentes, num único monólito (Segurado, 1930-40). Na sua significação comum o betão armado é simultaneamente material e técnica construtiva. A sua singularidade vem determinar consequências inovadoras na construção e arquitectura: É possível construir onde se quiser, desde que se disponha das matérias-primas suas constituintes; apresenta excelentes características de comportamento mecânico; rapidez de execução; plasticidade que permite formas ilimitadas e o seu uso nas mais variadas aplicações; resistência ao fogo e à água e durabilidade superior. A partir do início do século XX, a arquitectura começa a integrar o novo material nas fundações, lajes, pilares e terraços. Foi contudo necessário esperar pela década de 20 para assumir o betão armado como o material da modernidade, com uma qualidade estética própria. Aqui foi o material que liderou a evolução arquitectónica. Embora o emprego do betão date de meados do séc. XIX as suas primeiras aplicações não passaram de tentativas pouco importantes, como seja a construção de vasos, tanques etc., Em 1855 é apresentado na Exposição de Paris uma canoa de cimento armado da autoria de Lambot, esta aplicação teve retorno posteriormente, com o fim da primeira grande guerra, na indústria naval. Pode dizer-se contudo que a indústria do betão é de origem francesa impulsionado pelo trabalho dos construtores – empresários, François Hennebique (1842-1921), Coignet, Cottancin; e com especial desenvolvimento na Alemanha através do trabalho de Wayss, Freytag, assim o betão armado adquire o seu significado técnico e económico (Segurado, 1930-40). 6


Por esta altura clarificam-se dois sistemas concorrentes, diferentes na concepção estrutural e na área regional de influência: o sistema francês de Hennebique baseado na utilização hierarquizada do pilar; e o alemão de Wayss, Freytag focado na arquitectónica da laje, isto é, no desenvolvimento de cascas ou finas superfícies curvas. Denunciando dois tipos de raciocínio e duas modalidades de conceber uma obra de batão armado, o primeiro mais pragmático ou, se quisermos dizer “cartesiano”, definirá uma estética baseada na ossatura e no ângulo recto. O sistema alemão mais exigente e diversificado nos cálculos, vai favorecer a concepção de obras mais singulares, menos repetíveis, em que sistema de cascos expressionistas e coberturas curvas muito finas representam a via mais prodigiosa (Tostões, 2002). 2.1.3

ART DÉCO – FORMA E ORNAMENTO

O estilo Art Déco, designação que só surge nos anos 60, ou Estilo 1925 (em apropriação da designação da Exposição das Artes Decorativas e Industriais Modernas realizada em Paris naquela data), conhece, num contexto atual de crise, um renovado interesse mundial. Congregando, eclética e decorativamente, as heranças das vanguardas artísticas do começo do século e os Movimentos Decorativos Modernos: a Secessão Vienense, Arte Nova Austríaca dos anos 1890/1910; a Arte Nova belga fundada por, Victor Horta, Paul Hankar e Henry Van Velde2; e a associação de artes e ofícios Deutscher Werkbund com Henry Van Velde, Behrens e Walter Gropius como figuras centrais influenciadoras da nova geração alemã. Esgotadas as inovações do caminho proposto por Horta, a estrutura formal da linguagem do movimento germânico vai influenciar a arquitectura e artes decorativas da Europa Ocidental, nomeadamente a França. A valorização das potencialidades da Forma como valor da essência do objecto, vai dar um papel diferente às artes decorativas: o de evidenciar as relações volumétricas, estruturais, através da simplificação e geometrização do ornamento, através da planificação das superfícies construtivas. E aqui surge a preferência por materiais como o mosaico cerâmico, o vitral ou o próprio estuque, que permitem mais facilmente transformar os valores volumétricos em superfícies, em baixosrelevos, em cor ou em luz. O Art Déco foi o primeiro estilo global e universal, aspirando a constituir-se como Arte Total (inspiração de vida), a promessa estética de felicidade nele contida, antídoto contra o trauma da I 2

Henry Van Velde foi também fundador da Escola de artes e ofícios de Weimar, defensor do artista-artesão

versos industrialização, cede o seu lugar a Walter Gropius que a transformaria na Bauhaus, depois da primeira grande guerra.

7


Guerra Mundial, foi também paliativo contra a crise económica dos Anos 30, e o movimento perdurou até à II Guerra Mundial. Neste contexto, o verdadeiro presente não estava no nosso país: era um tempo vivido por outros, ingleses, franceses, alemães. E era justamente de Paris, então capital cultural da Europa, que chegavam até nós a criação e os ecos de um movimento de modernização. E é justamente nesse diálogo com a cultura europeia que se vai construir o processo da arquitectura modernista portuguesa.

2.2 2.2.1

A ARQUITECTURA MODERNISTA EM LISBOA CONTEXTO HISTÓRICO E POLITICO: MODELOS URBANOS E ESTRATÉGIAS POLITICAS

Embora em Portugal não tivesse havido uma verdadeira revolução industrial, sentiram-se em Lisboa, tardiamente, as consequências do movimento de industrialização. A chegada de população rural atraída para a cidade em busca de trabalho nas fábricas da periferia, encontra uma estrutura urbana que não estava preparada para acolher este crescimento demográfico. Esta necessidade de habitação para a classe operária encontrou resposta no sector privado, que a viu como uma possibilidade de rentabilizar os terrenos pouco valorizados e o investimento de pequenos capitais na construção de alojamentos precários. Neste contexto podem identificar-se quatro determinantes básicas que justificam o forte crescimento urbano de Lisboa durante o final do séc. XIX e início do séc. XX: são elas a salubridade, a habitação económica, a cultura, e a mobilidade urbana. O problema da insalubridade no século XIX estava associado á precariedade das edificações dos velhos núcleos urbanos e das suas infraestruturas, em bairros como Alfama, Mouraria, Castelo e Bairro Alto onde se concentravam as classes trabalhadoras. Era necessário uma revisão das tipologias das habitações, um novo sistema de saneamento e abastecimento de águas bem como um ordenamento urbano, com ruas largas e novos bairros, passeios arborizados e existência de manchas importantes de arvoredo e vegetação na cidade com a função de pulmões verdes que permitam a higienização da cidade. 2.2.2

CONTEXTO URBANO

A expansão da cidade do século XIX é protagonizada, pelo urbanismo progressista de Ressano Garcia. Os projectos das Avenidas concretizam o plano geral de melhoramentos da Capital, ordenado em 1864 pelo Ministério das Obras Públicas. Produzidos na Repartição Técnica da 8


Câmara Municipal, definem uma estrutura urbana flexível, traçada a partir do centro representativo da cidade, segundo os conceitos inglês e haussmanniano correntes na Europa. Os intervenientes neste espaço seriam, uma nova classe burguesa, construtores civis e promotores capitalistas, cujo objectivo era fundamentalmente o lucro. Aos primeiros interessava o palacete e a moradia, aos segundos o prédio de rendimento destinado ao negócio imobiliário. A grande extensão de área nova de terrenos habitáveis, que agora se abria, era proporcionalmente maior que o acréscimo da população e, por isso, tinha de estar aberta à vontade de todos os investidores, numa lógica de algum improviso (Buarque, 1995). O projecto de Ressano Garcia contemplava só o espaço público, nada especificava quanto aos regulamentos e normas da edificação face à rigorosa malha urbana das Avenidas Novas, só indicando que estes podiam ser constituídos por palacetes ou edifícios de arrendamento. A ligação que Ressano Garcia conseguiu, entre a Baixa e o Campo Grande, representa o primeiro eixo moderno de carácter claramente extra-urbano, que marca uma saída/ expansão para a cidade. Não se trata no entanto de um desenho homogéneo (figura 1,2 e 3), o plano apresenta-se perfeitamente dividido em três partes, cada uma definida por um sistema ortogonal próprio (Fernandes, 1980): 1. O conjunto Avenida – Parque e quarteirões periféricos, muito alongados e estreitos, separado do restante pelas Ruas de São José – Santa Marta e São Sebastião. 2. O conjunto das Picoas apresentando como eixo a Avenida Fontes Pereira de Melo, com quarteirões de menor dimensão e com a forma próxima do quadrado, separado também pela circunvalação – Avenida Duque de Ávila; 3. O conjunto da Avenida da Republica de quarteirões envolventes com dimensões rectangulares mais equilibradas e terminando no seu prolongamento «natural» que é o Campo Grande.

9


Fig. 1 Projecto da Avenida da Liberdade,

Fig. 2 Lisboa 1897 (Gravura.

Fig. 3 Estrutura do plano

1879 (Occidente, 1881)

436)

esquematizado. (Fernandes, 1980)

Provando a sua flexibilidade o plano teve a capacidade de modernização no decorrer dos anos seguintes com a introdução da saída para a auto-estrada ou o seu prolongamento para o lado oriental com a construção do Instituto Superior Técnico, a Alameda e a zona do Arco do Cego. Neste contexto a particularidade da modernidade urbana lisboeta era a coexistência de novas formas e práticas com formas e práticas antigas num mesmo espaço urbano, numa fusão visual de dois mundos, uma paisagem híbrida em que passado e presente, onde antigo regime e modernidade se distinguiam com dificuldade (Villaverde, 2006). 2.2.3

A EVOLUÇÃO ESTILÍSTICA

A chamada arquitectura Modernista desenvolveu-se em Portugal a partir de meados dos anos 20, com especial intensidade a partir dos anos de 1928-30, período assinalado pelo começo da estabilidade política e institucional gerada pelo Estado Novo. A introdução do estilo Art Déco, fez-se predominantemente por influência francesa. A pouco e pouco este estilo vai se tornando predominante, e em 1923 surge o primeiro Prémio Valmor3 a consagrá-lo, onde uma herança Arte Nova é reinventada por um plano de fachada muito rígido, decorado com motivos classizantes. É a partir dos modelos do ecletismo que uma evolução decorativa se processa, com tendência para a geometrização e simplificação das formas. Como resultado natural desta evolução assiste3

Edifício Avenida da República, 49 da autoria do Arq.º Pardal Monteiro. 10


se a uma planificação dos elementos decorativos nas superfícies da fachada, aspecto que ajudou a suavizar os volumes e a realçar as linhas rectas e texturas. Finalmente o verticalismo como expressão dominante das fachadas, conferido por grandes pilastras estilizadas, próximas dos modelos classizantes, respeitantes das «ordens». Introdução de cimalha onde sobressai a linha do frontão quebrado neo-romantico, ou elementos piramidais, coroando a fachada. A evolução do estilo caminha para maior coerência de linguagem, quanto mais geometrizadas forem todas as linhas e formas da fachada. A arquitectura mais racional e purista surge gradualmente como uma prática estilística diferenciada das art déco por conjugação de uma via mais tecnicista, resultante da introdução do betão armado nas construções e evidenciação das suas possibilidades volumétricas e estruturais. Caracteriza-se pela expressão purista e abstracta dos volumes e formas, recusando elementos decorativos. Esta prática afasta-se em definitivo de influências de raiz historicista ou classizante, de forma pioneira em Portugal, com uma imagem de renovação apelidada de «cubista» por espíritos mais tradicionalista e resistentes. É difícil estabelecer uma distinção clara entre a arquitectura das Art Déco e o modernismo radical 4,

enquadrados entre os anos 25 e 40. Em particular, podem considerar-se duas tendências

estilísticas, mais ou menos, coincidentes no tempo: o estilo Art Déco ou das artes decorativas e o Modernismo Radical. (Fernandes, 1993) 2.2.4

MODERNISMO-CLASSICO UMA CONTRADIÇÃO DE TERMOS.

A expressão arquitectónica dos anos 40 vai sofrer a imposição de um «Estilo Nacional» mais adequado aos princípios ideológicos do novo regime. Sob influência exterior dos regimes ditatoriais que se opunham à arte de vanguarda e impunham pela força os cânones oficiais. A tentativa de associação entre os signos «modernos» da arquitectura e a política de cariz totalitário vai culminar numa variante arquitectónica, historicista e monumentalista. Foi assim interrompida, por uma intervenção do poder político, uma evolução que se vinha processando.

4

Termo referido no texto do Arq. José Manuel Fernandes publicado na revista Arquitectura, nº132, Lisboa

de Março de 1979: «Para o estudo da arquitectura modernista em Portugal - III»

11


3

LEVANTAMENTO E IDENTIFICAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

Neste capítulo apresenta-se o levantamento realizado tendo em vista a identificação, localização e caracterização dos edifícios modernistas da cidade de Lisboa. Este levantamento diz respeito apenas aos edifícios construídos com carácter habitacional. Para além destes edifícios, o estilo Modernista está igualmente representado nos equipamentos construídos nos anos 30, que não serão analisados neste estudo, alguns dos quais promovendo a urbanização de vastas zonas da cidade e outros aparecendo para responder às exigências funcionais e culturais dos novos bairros. O levantamento dos edifícios modernistas foi realizado com base num anterior levantamento e classificação de Arquitectura Modernista na cidade de Lisboa, trabalho realizado para a Câmara Municipal de Lisboa pelos Arquitectos José Manuel Fernandes e Maria de Lurdes Janeiro. A partir deste documento de 1988 e com base na localização dos imóveis foram realizadas visitas pela cidade com o objectivo de conhecer o estado actual de conservação e preservação destes edifícios. Para melhor compreensão da expansão urbana deste estilo arquitetónico nas décadas 20 e 30 foi analisado o plano de urbanização de 1935, o levantamento topográfico realizado no segundo quartel do séc. XX para desenvolvimento do Plano Diretor de Urbanização de Lisboa de 1959 em confronto com o anterior levantamento de Silva Pinto de 1904-1911 e com o levantamento actual da cidade de Lisboa.

12


3.1

RESULTADOS DO LEVANTAMENTO

Fig. 4 Zonamento do mapa de Lisboa

Para o levantamento efetuado considerou-se a cidade de Lisboa dividida em seis zonas (Fig. 4), urbanisticamente mais homogéneas, de acordo com o levantamento de 1988. 1-

Zona Ocidental (centrada em São Mamede, Santa Isabel, Alto do Parque)

2-

Avenidas (centrada no eixo da Av. da Liberdade / Av. da República)

3-

S. Sebastião da Pedreira Benfica (Estrada de Benfica/ Laranjeiras)

4-

Zona Oriental (centrada na Av. Almirante Reis, desde a Graça ao Areeiro)

5-

Centro e Litoral Este (centrada em Madredeus/Xabregas)

6-

Litoral Oeste (centrada na Junqueira)

Dentro de cada uma destas zonas destacam-se subzonas. Estas subzonas correspondem a Bairros inteiros ou zonas geograficamente mais restritas, que foram designadas como ConjuntosRua. O resultado deste levantamento é apresentado através da identificação dos edifícios em planta, apresentando-se, para cada subzona, fotos das suas frentes edificadas mais significativas. A identificação dos edifícios em planta foi realizada sobre a planta da cidade apresentada por sectores (parcelas do levantamento topográfico, matriz utilizada desde o levantamento de Silva Pinto 1904-1911) à escala 1/4000.

13


Para melhor caracterização do estado de conservação do conjunto foram considerados quatro critérios classificativos para os edifícios, assinalados em planta de localização: 1-

Demolido (a cinza escuro no mapa)

2-

Apresenta mau estado de conservação (a vermelho no mapa)

3-

Apresenta algumas anomalias na fachada (a amarelo no mapa)

4-

Apresenta um bom estado de conservação (a cinza no mapa)

3.1.1

ZONA 1 | OCIDENTAL

SUBZONAS - “CONJUNTO-RUA”, AV. PEDRO ÁLVARES CABRAL - “CONJUNTO-RUA”, R. NOVA DE SÃO MAMEDE- SALITRE - R. ARTILHARIA UM/ RODRIGO DA FONSECA/ CASTILHO - 3 QUARTEIRÕES, BAIRRO “MARIA AMÁLIA”

Do lado ocidental da Avenida da Liberdade, o bairro Barata Salgueiro do final do séc. XIX articulava a nova artéria com os sítios antigos do Rato e de S. Mamede mas deixava o quarteirão da Rua do Salitre com a Rua Nova de São Mamede incompleto, só consolidado em meados dos anos 30 onde hoje encontramos uma ocupação de edifícios modernistas. Também a ligação traçada retilineamente entre o Rato e o Jardim da Estrela, a Avenida Pedro Alvares Cabral vai ficar caracterizada por duas frentes edificadas com o mesmo estilo. Por esta altura uma vasta zona a poente do Parque Eduardo VII seria urbanizada recorrendo às linhas do Modernismo, Rua Artilharia Um, Rua Rodrigo da Fonseca, Rua Castilho, o bairro “Maria Amália” com três quarteirões inteiramente preenchidos com edifícios modernistas que respeitavam o loteamento das novas zonas de extensão do plano das Avenidas Novas, com uma matriz geométrica, monotonamente repetida, deixando logradouros generosos no interior dos quarteirões, era quase exclusivamente nos bairros da alta burguesia que se aplicava este tipo de loteamento. O Modernismo aparece também em localizações pontuais nas áreas da Lapa, São Bento, e no eixo do Príncipe Real-São Marçal-Rato-Santa Isabel. Em Campo de Ourique também foram identificados prédios de habitação à volta do mercado, e um quarteirão inteiro Ruas Maria Pia e Correia Teles. Em Campolide há dois “conjuntos-rua” modernistas Rua Francisco Rodrigues Lobo, Rua D. Carlos Mascarenhas e Rua de Campolide. 14


Fig. 5 Subzona “Conjunto-Rua”: Av. Pedro Álvares Cabral; R. Nova de São Mamede/ Salitre

Localização

Av. Pedro Álvares Cabral 30

Av. Pedro Álvares Cabral 46

Av. P. Álvares Cabral 54

Ano

1935

1936

-

Autor

Arq. Cassiano Branco

Arq. Cassiano Branco

-

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Localização

R. Nova de São Mamede 7

R. Nova de São Mamede 15

R. do Salitre 179

Ano

1937/38

1934

1934

Autor

Arq. Cassiano Branco

Eng. Jacinto Robalo

Arq. Cassiano Branco

Estilo

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Modernismo Radical

15


Mapa 1 Zona 1 , Subzona H9|H10

Fig. 6 Subzona Rua Artilharia Um/ Rodrigo da Fonseca/ Castilho

Localização

Rua Artilharia Um 22

Rua Rodrigo da Fonseca 54/58

Ano

-

-

Autor

-

-

Estilo

Modernismo Radical

Artes Decorativas/ Modernismo Radical

16


Mapa 2 Zona 1, Subzona I9|I10

17


Fig. 7 Subzona Bairro “Maria Amália”

Localização

R. Marquês da Fronteira 153

R. Marquês da Fronteira 129

R. Rodrigo da Fonseca 107

Ano

-

-

1935

Autor

-

Arq. Cassiano Branco

Arq.º Tertuliano L.Marques

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Localização

R. D. Francisco Manuel de

Av. Joaquim A. A. Aguiar 64

R. Marquês de Subserra

Melo 28 Ano

-

-

-

Autor

-

Arq.º Ferreira da Costa

Arq.º Tertuliano L.Marques

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Modernismo Radical

18


Mapa 3 Zona 1 Sector H9|H10

19


3.1.2

ZONA 2 | AVENIDAS

SUBZONAS - “CONJUNTO-RUA”, RUA ALEXANDRE BRAGA - QUARTEIRÃO, R. ROVISCO PAIS - “CONJUNTO-RUA”, AV. DEFENSORES DE CHAVES - “CONJUNTO-RUA”, CAMPO PEQUENO/ AV. JOÃO XXI - QUARTEIRÃO, AV. DE BERNA/ IGREJA NOSSA SENHORA DE FÁTIMA / AV. DA REPUBLICA Esta área da cidade, muito representativa da arquitectura modernista, foi a zona de expansão da cidade na época. Não se identificou a presença dos ”bairros”, dado que a malha urbana reticulada das avenidas já estava “lançada” nos anos 20. Assim, a arquitectura modernista aparece aqui com um carácter pontual e fragmentado, preenchendo os espaços ainda vazios entre casas unifamiliares de encomenda burguesa e modestos prédios de rendimento erguidos por construtores civis. Apesar de Bairros como Estefânia e Picoas estarem consolidados antes mesmo do Plano das Avenidas Novas, aqui se encontram alguns núcleos residenciais de arquitectura modernista, como nas ruas Alexandre Braga/ Mindelo, ruas António Cândido/ Pinheiro Chagas e Ruas de Picoas/ Praia da Vitória. Em meados da década de trinta o desenvolvimento das Avenidas Novas e, em paralelo, a construção de dois equipamentos marcantes do modernismo em Lisboa da autoria do arquiteto Porfírio Pardal Monteiro, o Instituto Superior Técnico e a Igreja de Nossa Senhora de Fátima na Av. de Berna5 dão origem à urbanização de uma extensa zona da cidade onde se pode encontrar os maiores e mais significativos núcleos de habitação modernista: rua Elias Garcia, rua Poeta Mistral, Av. Barbosa du Bocage particularmente nos quarteirões que conduzem à Igreja de Fátima e Av. Berna; no Campo Pequeno a Rua Chaby Pinheiro, Av. João XXI, Rua Oscar Monteiro Torres/ Rua Augusto Gil; Avenida Defensores de Chaves e o quarteirão formado pelas Ruas Rovisco Pais/ Manuel da Maia/ Visconde de Santarém. 5

Prémio Valmor de 1938. Autor: Arq.º Pardal Monteiro com a colaboração do pintor José de Almada

Negreiros (vitrais) e do escultor Francisco Franco (estatuária sobre a entrada principal), Leopoldo de Almeida (imagens de Nª Sra. De Fátima e S. João Batista).

20


Fig. 8 Subzona “Conjunto-Rua”: Rua Alexandre Braga; Rua Almirante Barroso

Localização

R. Alexandre Braga 4/6

R. Alexandre Braga 1

Av. Casal Ribeiro 26

Ano

1933

-

1935-38

Autor

Arq. Cristino da Silva

-

Arq.º João Simões

Estilo

Modernismo Radical

Artes Decorativas/

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Mapa 4 Zona 2, Sector J11

21


Fig. 9 Subzona Quarteirão, R. Rovisco Pais/ “Conjunto-Rua”, Av. Defensores de Chaves

Localização

Avenida

Defensores

de

Av. Praia da Vitória 15, 17/19

Av. Rovisco Pais 2 -

Chaves, 27 Ano

1937

1935

Autor

Arq. Cassiano Branco

Arq.

Tertuliano

Lacerda

-

Marques Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Mapa 5 Zona 2, Sector H9|H10

22


Fig. 10 Subzona “Conjunto-Rua”, Campo Pequeno/ Av. João XXI

Localização

Campo Pequeno 42

Campo Pequeno 39

Av. Barbosa du Bocage 18

Ano

-

-

1930

Autor

-

-

Arq.º Norte Júnior

Estilo

Artes Decorativas

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Localização

Rua Eifel 9

Av. Oscar Monteiro Torres 40

Av. João XXI 58

Ano

1934-7

-

-

Autor

Arq.º Cassiano Branco

-

-

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Modernismo Radical

23


Mapa 6 Zona 2, Sector M10|M11

24


Fig. 11 Subzona Quarteirão, Av. de Berna/ Igreja N. Senhora de Fátima / Av. da Republica

Localização

Av. de Berna 31

Av. da Republica 55

Av. Elias Garcia 157

Ano

-

1929

-

Autor

-

Arq.º Norte Junior

-

Estilo

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Artes Decorativas

Localização

Av. de Berna 6/4

Av. Elias Garcia

Av. Barbosa Bocage 109

Ano

1934

-

-

Autor

Arq. Norte Junior/ Eng.º

-

-

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Eduardo Evangelista Estilo

Artes Decorativas

25


Mapa 7 Zona 2, Sector L10|M10

26


3.1.3

ZONA 3 | SÃO SEBASTIÃO E BENFICA

SUBZONAS - BAIRRO AZUL - QUARTEIRÃO ESTRADA DE BENFICA/ R. D. ANTÓNIO GRANJO, SETE RIOS - “CONJUNTO-RUA”, RUA FILIPE DA MATA, LARANJEIRAS

De 1930 a 1937 crescia o Bairro Azul6 o mais qualificado bairro modernista da cidade, a nordeste do Parque Eduardo VII. Destinado a inquilinos mais exigentes, é um conjunto arquitetónico homogéneo, com prédios de um programa burguês em gosto Art Déco que resulta de projetos de construtores e engenheiros civis, mas também de arquitetos como Norte Júnior, Carlos Ramos e Cassiano Branco. O ângulo estranho do plano do bairro resultava do desenho de Cristino da Silva para uma vasta urbanização inicial que, cerca de 1930, deveria ter sido o remate do prolongamento da Avenida da Liberdade. Contudo, o bairro ficou isolado, pois o restante projeto não se realizou, repetindo-se a vocação lisboeta para os tecidos incompletos e para a justaposição de bairros de origens diversas, característicos do início do Séc. XX. Seguem-se os núcleos da Estrada de Benfica – Rua António Granjo/António Martins/ Basílio Teles; o da Rua Filipe da Mata e de S. Domingos-Francisco Pereira de Sousa/ Cândido de Figueiredo/ Antonio Feijó; e o das ruas da Palma de Baixo /Laranjeiras.

6 Classificação do Bairro Azul como conjunto de interesse municipal em Junho de 2009.


Fig. 12 Subzona Bairro azul

Localização

Rua Ramalho Ortigão

Rua Fialho de Almeida 1

Av. A.A. Aguiar 173

Ano

-

1935

1933

Autor

-

Eng.º Ávila Amaral

Arq.º Norte Junior

Estilo

Artes Decorativas

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Mapa 8 Zona 3, Sector K9

28


Fig. 13 Subzona Quarteirão Estrada de Benfica/ R. D. António Granjo, Sete Rios

Localização

R. Basílio Teles 6

R. Filipe da Mata 124

Av. Barbosa Bocage 109

Ano

-

-

-

Autor

-

-

-

Estilo

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Artes Decorativas

Mapa 9 Zona 3, Sector L8|L9|M9

29


3.1.4

ZONA 4 | ORIENTAL

SUBZONAS - BAIRRO- BAIRRO DAS COLÓNIAS / R. FORNO DO TIJOLO / R. DE ANGOLA /PENHA DE FRANÇA

- BAIRRO DE ARROIOS - BAIRRO DOS ATORES/ ALAMEDA/ ANTIGO BAIRRO DA G.N.R - BAIRRO LOPES/ ALTO DE SÃO JOÃO

Esta foi a zona da cidade mais ativa em obras no início do séc. XX, sobre arruamentos já existentes ou à margem deles, com edificações pouco controladas promovidas pelos mestre-deobras “improvisados” que satisfaziam o mercado dos capitais atraídos pelo imobiliário. A Avenida dos Anjos (depois D. Amélia e Almirante Reis) concorria com o eixo das «Avenidas Novas» traçada ao longo do vale, com bairros mais pequeno-burgueses que se articularão com a Estefânia e com as Picoas e, do lado oriental, com a vivência antiga e operária da Graça, constituía a mais dinâmica saída da capital. Nos anos 20 a poente da Avenida Almirante Reis projetava-se os novos arruamentos do bairro das Colónias onde posteriormente iriam ser construídos quarteirões completos com edifícios de desenho modernista, na sua maioria sob a influência das artes decorativas mas também pontuadas com experiências do modernismo funcional/ racional: Ruas de Angola/ Forno do Tijolo/ Palmira/ Guiné, Ruas Moçambique/Maria até a Praça Novas Nações para onde convergiam a Rua Ilha de São Tome prolongamento da rua poeta Milton e as ruas ilha de Príncipe/Timor/ Cabo Verde urbanizando a então denominada Quinta do Leite (fig. 11 até ao encontro da Rua da Penha de França.

Fig. 14 Bairro das Colónias 1921


Na Rua Heróis da Quionga encontramos uma “vila” de expressão modernista rara em Lisboa. Nos anos 30, acima do Chile, já se esboçava o bairro dos Actores e o bairro de Arroios em torno do mercado. No alto da Alameda nasce um conjunto de habitação social, o Bairro “GNR”. Crescendo também pela Rua Morais Soares, e no Alto de São João, destaca-se o Bairro operário “Lopes” mais excêntrico e isolado que ocupou a Quinta dos Apóstolos. Fig. 15 Subzona Bairro das colónias / R. Forno do Tijolo / R. de Angola

Localização

Rua do Forno do Tijolo 32

R. Palmira 33, 35

R. de Macau 14

Ano

-

1936/1937

193?

Autor

-

Arq. Cassiano Branco

Arq. Cassiano Branco

Estilo

Artes Decorativas/Modernismo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Radical

Mapa 10 Zona 4, Sector I12

31


Fig. 16 Subzona Bairro das colónias / R. de Angola/ Penha de França

Localização

Rua de Moçambique 20

Rua Ilha de São Tomé 3/15

Rua de Macau 20

Ano

-

-

-

Autor

-

-

-

Estilo

Artes Decorativas

Modernismo Radical

Artes Decorativas

Mapa 11 Zona 4, Sector I12|J12

32


Fig. 17 Subzona Bairro de Arroios

Localização

Av. Almirante Reis 178

Av. Almirante Reis 197

Rua Carlos Mardel 59

Ano

-

1932-4

1934-5

Autor

-

-

Arq.º J. Albano Castro

Estilo

Artes Decorativas

Artes Decorativas

Modernismo Radical

Mapa 12 Zona, Sector J12|K12|L12

33


Fig. 18 Subzona Bairro dos Atores/ Alameda/ Antigo Bairro da G.N.R

Localização

Rua Garrido 67/73

Rua Abade Faria 52

Av. Almirante Reis

Ano

-

-

-

Autor

-

-

-

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Rua Abade Faria 40

Rua Barão Sabrosa 220

Rua Abade Faria 42

Ano

-

-

-

Autor

-

-

-

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Localização

34


Mapa 13 Zona 4, Sector L12|M12

35


Fig. 19 Subzona Bairro Lopes/ Alto de S達o Jo達o

Localiza巽達o

Rua David Lopes 13

Rua Sousa Viterbo 23/25/27

Rua Lopes 119

Ano

-

-

-

Autor

-

-

-

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Modernismo Radical

Mapa 14 Zona4, Sector I13|J13

36


3.1.5

ZONA 5 | CENTRO E LITORAL ESTE ORIENTAL

SUBZONAS - BAIRRO DAS AMÉRICAS RUA LEITE DE VASCONCELOS, RUA WASHINGTON - MADREDEUS/ XABREGAS R. GUALDIM PAIS

Nesta zona o predomínio residencial localiza-se na área mais a nascente, ligados a atividade industrial e portuária, em núcleos pontuais de qualidade média-baixa como a Rua Gualdim Pais mais significativamente na Vila Emília. Fig. 20 Subzona Madredeus/ Xabregas R. Gualdim Pais

Localização

Rua David Lopes 13

Rua Gauldim Pais 9/10

Ano

-

-

Autor

-

-

Estilo

Artes Decorativas

Artes Decorativas

37


Mapa 15 Zona 5, Sector M10|M11

38


3.1.6

ZONA 6 | LITORAL OESTE

SUBZONAS - R. ARTUR LAMAS/ R. PINTO FERREIRA, JUNQUEIRA

Nesta extensa faixa ribeirinha identifica-se como núcleos habitacionais mais significativos os das Ruas Artur Lamas/ Pinto Ferreira (Junqueira), os das ruas José Maria Rodrigues/ Indústria (Alto de S. Amaro), e os troços norte da Av. Infante Santo. Fig. 21 Subzona R. Artur Lamas/ R. Pinto Ferreira, Junqueira

Localização

Travessa Artur Lamas 19

Rua Alexandre O´Neil 8/10/12

Rua Artur Lamas 21

Ano

-

-

-

Autor

-

--

-

Estilo

Modernismo Radical

Modernismo Radial

Modernismo Radial

39


Mapa 16 Zona 6, Sector M10|M11

40


3.2

ENQUADRAMENTO LEGAL E REGULAMENTAR

O facto do anterior Plano das Avenidas Novas não enunciar princípios normativos quanto à construção e estética dos edifícios, marcou o edificado com definitiva efemeridade. Cada promotor construía para si mesmo, para venda ou arrendamento, podia optar entre prédio ou moradia, pela ocupação de toda a frente do lote ou não, pelo isolamento do edifício ou pela disposição em banda. Num tempo de arquitetura eclética, marcada por revivalismos vários, pelos exotismos e os ruralismos, esta excessiva liberdade resulta na ausência de qualidade e homogeneidade na arquitetura do conjunto urbano. (Silva, 2006) No entanto o processo de transformação urbana nas décadas de 20 a 40 irá acompanhar um período de progressos de ordem técnica e funcional na construção, com a publicação dos seguintes regulamentos: 1 3.2.1

REGULAMENTO DE SALUBRIDADE DAS EDIFICAÇÕES URBANAS (RSEU) 1903 DEC. DE 14 DE FEVEREIRO DE 1903

Refere as condições de Higiene a adoptar na construção dos edifícios desde a salubridade dos terrenos, incluindo as primeiras disposições gerais dedicadas à protecção contra incêndios, de onde se destaca: 

Fica determinada a altura das fachadas consoante a largura das ruas (novos arruamentos não devem ter largura inferior a 10m, nas cidades);

Acima da cornija e no plano de parede da fachada” só poderá ser construído um andar recolhido;

Ficam definidas as alturas mínimas do pé direito dos pisos começando com 3,25m ao nível do rés-do-chão decrescendo para 2,75m a partir do 4º andar. As caves com 3 m de pé direito mínimo e 2m acima do solo quando nenhuma das frentes está ao nível da rua;

Imposição da impermeabilização do piso térreo das edificações ou caixa-de-ar com altura mínima de 0,60m, bem como impermeabilização dos alicerces até 0,15m acima do solo;

A caixa de escada das edificações deve ter bomba para iluminar e ventilar o seu interior;

As janelas com 1/10 da superfície dos compartimentos com um mínimo de 0,8m2 nos quartos (quartos com mínimo de 25m3 por pessoa);

Saguões ou pátios interiores destinados a iluminar e arejar terão áreas mínimas de 9m2 quando servem área de cozinha ou 4m2 quando destinados a vestíbulos ou escadas;

Em cada domicílio deve haver pelo menos uma latrina e uma pia de despejo independentes uma da outra; 41


Depósitos de água isolados de qualquer contacto com latrina ou tubo de queda, tubo de ventilação ou de despejo;

Prescrição técnica e qualitativa do material das tubagens a aplicar nas edificações;

Obrigatoriedade de licença camarária para construção, reconstrução ou modificação de edificações;

Obrigatoriedade de licença de habitação concedida pela Camara antes da ocupação da edificação.

3.2.2

DECRETO Nº 15289, DE 30 DE MARÇO DE 1928 E DECRETO Nº 18738 DE 9 DE AGOSTO DE 1930

Procurando solucionar a recessão ligada ao sector da construção civil, garantir trabalho para os operários e contrariar a crise na habitação devido à reduzida oferta para um excesso de procura, o Estado promove a Reforma da contribuição predial. Esta acção é por vezes salientada como motor da retoma no sector da construção civil. A determinação da contribuição predial urbana previa: 

Isenção de contribuição predial urbana por dez anos aos prédios em construção ou a construir até 31 de Dezembro de 1930 segundo Decreto nº 15289, de 30 de Março de 1928), com prazo de conclusão prolongado por um ano em Decreto nº 18738 de 9 de Agosto de 1930.

Redução do sisa em 1% nas transacções de terrenos para construção ou de prédios de rendimento.

Destinado a promover e subsidiar apenas a iniciativa particular de construção de habitação e a redução das rendas, a receita do Fundo Nacional de Construção e Rendas Económicas vai permitir: 

A concessão de subsídios e créditos aos proprietários ou sociedades construtoras;

Diminuir os encargos do juro de operações de crédito destinado a construção de habitação;

Empréstimos destinados à conclusão de construções paradas;

A fixação livre do valor de renda pelos proprietários de prédios construídos desde a publicação deste decreto que não tenham usufruído do Fundo ou em fase de conclusão (As rendas serão afixadas pela comissão administrativa do Fundo);

A redução para metade das taxas de selo, emolumentos e outras despesas estabelecidas em leis regulamentos ou posturas municipais; 42


Estes benefícios eram concedidos sem prejuízo da isenção de contribuição predial. 3.2.3

REGULAMENTO GERAL DA CONSTRUÇÃO URBANA PARA A CIDADE DE LISBOA 1930 – EDITAL DE 6 DE DEZEMBRO DE 1930

Tendo em vista o disposto no art.59º do Dec. de 14 de Fevereiro de 1903 (RSEU), no Dec. nº 902, de 30 de Setembro de 1914 e do art.9º da Lei nº 1 670, 15 de Setembro de 1924 que obriga as Câmaras Municipais a adaptarem as disposições gerais em atenção às circunstâncias locais de cada município. Veio o referido diploma determinar um vasto e exigente conjunto de disposições das quais se destaca: 

É definida a divisão da cidade em três zonas, em que as normas de construção diminuem de exigência:

A 1ª zona, ou zona principal correspondente às grandes artérias e praças centrais; A 2ª zona, ou zona média, abrangendo o conjunto restante de mancha construída. A 3ª zona, ou zona exterior correspondendo a periferia da cidade; 

Regularização e responsabilização dos técnicos da construção civil: autores de projecto, construtores, directores de obra;

Os fornecedores de materiais de construção destinados a resistir a quaisquer esforços ficam sujeitos a apresentar os certificados oficiais passados no laboratório dos ensaios e Resistências dos materiais;

Ficam definidas as condições que os materiais devem satisfazer quando empregues na construção bem como as boas práticas da sua execução;

Todos os edifícios a construir na 1ª zona com mais de 4 pisos têm de ter para além da escada principal uma escada de serviço com acesso independente para a rua;

Instruções e regras a adoptar na construção dos travamentos dos edifícios em gaiola;

Definição de condições gerais para a construção de coberturas em terraço com placa em cimento armado;

Imposição de relação máxima de uma unidade entre a altura das fachadas e a largura da rua (regra dos 45º) para uma altura máxima de 21m (25m em edifício de gaveto);

Proibição, nos telhados dos prédios da 1ª zona, de janelas de trapeira visíveis da via pública.

As fachadas posteriores, visíveis da via publica deverão apresentar condições aceitáveis sob o ponto de vista estético-arquitectónico, com abolição dos saguões com algumas excepções;

43


De modo a receber ventilação e iluminação, todos os compartimentos devem ter pelo menos, um vão exterior á excepção de edifícios com menos de 300m2 de superfície coberta por pavimento, onde será permitido um compartimento interior iluminado com segunda luz;

Compartimento mínimo permitido é aquele onde se possa inscrever um círculo com 2m de diâmetro;

Os logradouros devem ter profundidade de ½ da altura da fachada tardoz (1/3 em quarteirões parcialmente ocupados), com área mínima de 30m2;

Os pátios interiores terão área mínima onde se possa inscrever um círculo com diâmetro igual a metade da altura da parede mais alta do pátio.

3.2.4

REGULAMENTO PARA O EMPREGO DO BETON ARMADO 1918 – DEC. 4036 DE 3 DE ABRIL DE 1918

Primeiras instruções e regras a adoptar nas construções em betão armado com prescrições de ordem técnica e administrativa, realizadas com base nas normas francesas de 1906 e nos desenvolvimentos posteriores, destaca-se: 

Indicações quanto à composição a adoptar num betão normal (dosagem tipo: 300 Kg de cimento; 400 litros de areia e 800 litros de brita);

A resistência era definida pelo valor médio dos resultados de ensaio à compressão simples, aos 28 dias, de cubos de 20cm de aresta o qual deveria ser superior a 120 Kg/cm2 (12MPa);

Refere-se o aço então disponível – aço liso de dureza natural com uma tensão última da rotura fsu de 3800 a 4600 Kg/cm2 (380 a 460MPa) e uma grande ductilidade, definida pela extensão após rotura εu superior a 22%. Para estes aços a tensão de cedência deveria também ser superior ou igual a fsu/2;

Indicações detalhadas relativas à execução da betonagem recorrendo à técnica de compactação por apiloamento;

Indicações detalhadas relativas à execução das armaduras: os recobrimentos mínimos Cmin não devem ser inferiores a 1.5 vezes o diâmetro do varão, inferiores a 1cm em lajes e a 2cm em vigas e pilares; é recomendado que estes valores sejam duplicados em construções junto ao mar ou para as dotar de boa resistência ao fogo; é referido que os varões, referenciados a polegadas, eram lisos devendo terminar em gancho, quando tracionados;

Obrigatoriedade na apresentação de Projeto a ser aprovado pelas repartições técnicas do Estado ou dos corpos administrativos, incluindo memória descritiva com cálculos justificativos e desenhos cotados com qualidade do material e dosagem de betão. 44


3.2.5

REGULAMENTO DO BETÃO ARMADO (RBA) 1935 – DEC. 25948 DE 16/10/1935

No seguimento de importantes progressos realizados na teoria e na prática do betão armado entre 1916 e 1925 essencialmente desenvolvidos na Alemanha, publicados no Regulamento de 1932 pela comissão Alemã do betão armado, é elaborado novo regulamento em Portugal com indicações gerais sobre a construção em betão armado e pormenores sobre normas de cálculo, os materiais componentes e a sua aplicação, das quais se destaca: 

Obrigatoriedade na apresentação de Projeto a ser aprovado pelas repartições técnicas do Estado ou dos corpos administrativos, incluindo memória descritiva com cálculos justificativos e desenhos cotados com qualidade do material e dosagem de betão.

Ficam definidas as características e proporções dos materiais componentes do betão armado: betão (dosagem tipo: 300 Kg de cimento; 400 litros de areia e 800 litros de brita) com resistência definida pelo valor médio dos resultados de ensaio à compressão simples, aos 28 dias, de cubos de 20cm de aresta o qual deveria ser superior a 180 Kg/cm2; Aço (liso de dureza natural) com uma tensão última da rotura fsu superior a 3700 Kg/cm2 e uma grande ductilidade, definida pela extensão após rotura εu superior a 24%, a tensão de cedência deveria também ser de 0.6 fsu;

Ficam estabelecidas as normas gerais de cálculo de elementos estruturais em betão armado: Lajes armadas numa direcção; Lajes armadas em cruz; Vigas rectangulares e em T; Suportes, pilares e colunas, em edifícios e pontes;

Definição das boas práticas de execução: dos moldes e cimbres; armaduras; Junção de varões tensos (varões de resistência do esforço transverso recomenda-se que, para além dos estribos, sejam levantados varões de 45º junto aos apoios, alguns dos quais associados à dispensa de varões requeridos pela resistência ao momento flector, hipótese de realizar a junção de varões por união roscada); preparação do betão; betonagem (técnica de compactação do betão por apiloamento ou vibração mecânica) e desmoldagem;

Obrigatoriedade de fiscalização das obras em betão armado por técnicos qualificados;

Obrigatoriedade da prática de ensaios e provas durantes a execução dos trabalhos para garantir a boa qualidade do material conforme caderno de encargos de projecto aprovado.

45


3.3

ANÁLISE DO LEVANTAMENTO

Nas décadas de 20 e 30 a cidade encontrava-se em expansão sob dois eixos distintos: zona ocidental e zona oriental. Na zona ocidental e Avenidas cumpria-se o plano das Avenidas Novas já numa última fase (conjunto da Av. da República e quarteirões envolventes e últimas resolução quanto à conclusão do Parque Eduardo VII); Na zona oriental o traçado da Avenida dos Anjos (Almirante Reis) vai permitir uma ocupação ao longo do vale até ao Areeiro. No final dos anos 30, é construído o Instituto Superior Técnico, desencadeando o prolongamento do plano das Avenidas para o lado oriental, este equipamento público vai promover o desenvolvimento da Alameda Dom Afonso Henriques, enquanto miradouro-jardim bem como a urbanização envolvente, e a zona do Arco do Cego, com tipologia inicial de bairro social. A expansão da cidade deixa de fazer-se em continuidade, aparecendo bairros periféricos isolados. Estes vão ocupar terrenos expropriados ou de antigas quintas suburbanas entretanto loteadas. Por outro lado as zonas mais consolidadas da cidade ainda dispõem de lotes vazios e quarteirões por urbanizar, com crescimento à base de loteamentos e arruamentos fechados com traseiras e logradouros. A reforma da contribuição predial de 1928 (Decreto nº 15289, de 30 de Março de 1928) vai promover a construção de novos núcleos urbanos com “prédios de rendimento”, uma nova modalidade que aliava a construção de prédios e a respetiva comercialização. Esta recente atividade empresarial vai impulsionar a construção civil depois da estagnação provocada pela crise económica e financeira do pós guerra que praticamente suspendeu a indústria da construção entre 1922 e 1926, fruto da acção conjugada do aumento dos preços dos materiais de construção e do desinteresse dos investidores. Na década de 30 a regulamentação da construção civil é revista, no sentido de disciplinar e modernizar a respetiva atividade, com a aprovação e execução do Regulamento Geral da Construção Urbana para a cidade de Lisboa (RGCU 1930). É neste contexto que surgem as primeiras influências do movimento moderno, no início de tendência mais decorativa, e um pouco mais tarde, mas desenvolvendo-se em paralelo, a fase racionalista do modernismo, tirando partido das novas técnicas construtivas como o betão armado introduzido na construção de edifícios de habitação conforme exigência regulamentar.

46


4

CARACTERIZAÇÃO DOS EDIFÍCIOS MODERNISTAS

Este capítulo de caracterização construtiva e física/espacial tem como base de estudo os 18 edifícios visitados, construídos em diferentes fases do Modernismo, e que actualmente apresentam diferentes estados de conservação. A partir da análise dos processos de obra destes edifícios no Arquivo Municipal de Lisboa, e do levantamento in situ, em conjunto com a bibliografia consultada foi possível conhecer o seu caráter construtivo. Nestes edifícios as suas fases estilísticas e as fases construtivas estão intimamente ligadas e em contínuo processo de evolução.

4.1

CARACTERIZAÇÃO

CONSTRUTIVA

EDIFÍCIOS

MODERNISTAS

CONSTRUÍDOS ENTRE 1920 E 1935, FASE ART DÉCO. “A acentuada crise económica e financeira do pós-guerra teve incidência directa na indústria da construção, que praticamente suspendeu a sua actividade entre 1922 e 1926, a época dos prédios de «areia e cal», dos desmoronamentos, dos «gaioleiros»” (Fernandes, 1979). Os edifícios modernistas, de influência Art Déco, surgem no final dos anos 20, no momento de inflexão da conjuntura de crise no sector da construção civil. Esta retoma está muitas vezes associada à publicação do Decreto n.°15 289, de 30 de Março de 1928, considerada a lei protectora da construção civil (Populi, 1946). Estes edifícios são caracterizados por fachadas predominantemente verticais com um completo vocabulário de elementos decorativos «clássico-geométricos» Art Déco, que dá continuidade à tradição de um estilo de decoração herdado da Arte Nova.

Fig. 22Edifício nº 69 a 75 da Avenida Elias Garcia,

Fig. 23Edifício nº 69 a 75 da Avenida Elias Garcia,

Alçado tardoz. (Lisboa, Obra nº47994)

Alçado principal. (Lisboa, Obra nº47994)

47


Os primeiros edifícios característicos desta fase eram de construção tipo gaioleiro, onde predominavam materiais como a alvenaria ordinária argamassada com cal e areia, a madeira e o ferro. A crise dos anos 20, e o aumento do preço dos materiais de construção, levou a uma adaptação do estilo assente na simplificação das fachadas e predominância de materiais pobres, como o estafe. Em 1930 com a publicação do RGCU (Regulamento Geral de Construção urbana para a cidade de Lisboa) e na sequência das suas disposições7, recomendando o emprego do betão armado nas edificações, inicia-se uma fase de integração da nova tecnologia construtiva, mantendo-se no entanto uma aplicação tradicional e ecléctica dos materiais. A esta condição hibrida da construção neste período chama-se tipologia mista. 4.1.1

TIPOLOGIA GAIOLEIRO

O tipo construtivo gaioleiro, ficou marcado pela perda do anterior rigor construtivo da gaiola pombalina. A denominação de gaioleiro pretende traduzir a simplificação dos sistemas construtivos e estruturais, do período que procedeu ao terramoto de 1755, através das seguintes alterações introduzidas: (Pinho, 2000) 

Aumento da altura dos edifícios que passaram a ter 5 ou 6 pisos elevados;

Deturpação da gaiola original, em que alguns elementos de solidarização horizontal das paredes-mestras se perderam, tornando deficiente a interligação tridimensional da estrutura do edifício;

Perda de resistência das divisórias interiores; Aumento da profundidade dos edifícios em planta, e consequente perda de salubridade na edificação, obrigando à introdução do saguão no programa da habitação e ou reentrâncias na fachada tardoz para arejamento e iluminação.

Introdução de pias de despejo nas cozinhas, provocando a degradação da estrutura de madeira dos pavimentos;

Mão-de-obra de inferior qualidade;

Materiais empregues de inferior qualidade.

A construção de edifícios “gaioleiros” teve uma larga expansão, urbanizando uma vasta área da cidade. No entanto o Modernismo, o estilo arquitectónico em estudo, vai surgir na fase de

7

“Os pavimentos das casa de banho, retretes, copas, cozinhas…das varandas…deverão ser sempre

construidos em materiais imputrescíveis e incombustíveis, de preferência o betão armado.” Citação extraída do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, art. 51º.

48


transição desta tipologia para técnicas construtivas mais actualizadas, esta condição transitória deve ser levada em conta no entendimento da caracterização que se segue. 4.1.1.1

ESTRUTURA

FUNDAÇÕES Os alicerces destes edifícios eram em caboucos preenchidos com alvenaria de pedra rija e argamassa de cal hidráulica e areia ou cimento e areia, até a profundidade de 1m (mínima de 0,5m) abaixo do piso da cave nas paredes exteriores e frontais, e restantes divisórias. A alvenaria dos alicerces elevar-se-á, pelo menos, 0,20m acima do solo natural. Com espessuras de 1m nas paredes-mestras, 0,70m nas empenas e 0,50m nas paredes interiores. As paredes eram assentes sobre as fundações no seu eixo, e elevam-se até ao nível do vigamento, que forma o piso do andar superior, e sempre assim até ao último andar do edifício. EM ELEVAÇÃO Os pilares eram construídos com tijolos maciços com secções menores do que aqueles que se construíam de alvenaria de pedra. Os pilares eram construídos, a 1 vez, 1 vez e meia, 2 vezes, de secção quadrada, rectangular, sextavada ou oitavada. As colunas e vigamentos em ferro fundido eram elementos verticais de suporte que permitiam vencer vãos maiores, sendo usados no rés-do-chão, e nas marquises para ampliação do espaço útil da habitação (Fig. 24 e 25). O ferro fundido, embora suporte mal os esforços de tracção e flexão, resiste muito ao esmagamento. Esta propriedade, associada à facilidade de se moldar, permitia obter colunas ocas em pequena secção (0,22m de diâmetro e 1 ¼ polegadas de espessura), capazes de suportar grandes esforços de compressão, que não seriam fáceis de fabricar em ferro forjado (Leitão, 1896).

Fig. 24 Pormenor das colunas e laje da marquise. (Lisboa,

Fig. 25 Pormenor da fundação das colunas.

Obra nº3796)

(Lisboa, Obra nº3796)

49


Os cunhais tanto podiam ser de alvenaria de pedra como de tijolo. Eram aplicados para melhorar o travamento das paredes, no entanto as alvenarias mistas tinham o inconveniente de dar origem a assentamentos diferenciais pois a quantidade de argamassa que liga as pedras era menor (Leitão, 1896). 4.1.1.2

PAREDES

PAREDES MESTRAS As fachadas eram em alvenaria ordinária de pedra rija ou branda, irregular (Fig.26 b), ou em alvenaria mista de pedra e tijolo (Fig.26 a). Tinham frequente aplicação, os calcários duros de Pero Pinheiro e os calcários brandos de Leiria, Alcobaça, Batalha, etc. O tijolo maciço era aplicado nos cunhais, nas paredes de peito, vergas e ombreiras dos vãos e nas cimalhas. O elemento de ligação era a argamassa ordinária de cal “cozida a matto” (preferível à cal cozida a carvão por ter menos impurezas) (Leitão, 1896) e areia, ao traço 1:2 ou 1:3. Nos pisos enterrados em contacto com a água era utilizada argamassa hidráulica, constituída vulgarmente por cal hidráulica e areia ao traço 1:3 ou cimento e areia ao traço 1:3. A espessura das paredes de fachada variava de piso para piso de 0,90 m a 1,00 m no piso térreo diminuindo até 0,50m no último piso. As paredes de empenas e saguões eram vulgarmente em alvenaria ordinária, ou em alvenaria de pedra rija até ao nível do 1º piso, e do 2º para cima em alvenaria de blocos de cimento ou tijolo maciço até ao guarda-fogo. A sua espessura variava entre 0,45m e 0,50m. PAREDES DIVISÓRIAS

As paredes de frontal eram em tijolo furado (dois furos), a uma vez conforme figura 05 c. As paredes da escada, que suportam cargas maiores também eram construídas em tijolo maciço, a uma vez. A dimensão do tijolo vulgar é (0,23 x 0,11 x 0,075m) e o seu assentamento é feito por fiada, sendo um tijolo ao comprido e dois atravessados, alternados em todo o comprimento da parede.

50


a)

b)

d)

e)

c)

Fig. 26 Edifício nº 69 a 75 da Avenida Elias Garcia; a) Parede de fachada em alvenaria mista; b) Forro em cantaria; c) Interseção da parede divisória na parede mestra de pedra; d) Panos de peito em tijolo maciço; e) Fachada principal. (fotos do autor)

Os tabiques eram formados por tábuas costaneiras, pregadas ao alto, fixas ao sobrado e ao tecto, com fasquiado de ambos os lados. As fasquias dos tabiques eram as mesmas que se empregavam nos tectos, com espessura de 0,015m ou 0,018m e a largura máxima de 0,02m. As secções das fasquias tinham forma trapezoidal eram assentes com a base mais estreita para dentro. O enchimento era com argamassa de cal e areia, ao traço de 1:2. Este enchimento, que era o reboco e que cobria em todo o paramento as fasquias, também se designava por pardo, por ser essa a cor da argamassa (Costa, 1930). A espessura deste tabique é de 0,06m ou pouco mais.

51


4.1.1.3

PAVIMENTOS

TÉRREO Os massames eram a base para os pavimentos hidráulicos (Fig.27). Eram de betão, alvenaria ou ciclópicos. Os massames de betão eram construídos em cascalho (pedra britada) e argamassa de cimento e areia. Os de alvenaria, de pedra e argamassa de cal e areia, e os ciclópicos, construídos com betão e grandes blocos de pedra irregular entremeados na massa. O massame era revestido a mosaico ou assentava-se o serrafado para aplicação de soalho (Fig.28) (Costa, 1930).

Fig. 27 Corte de um massame sobre camadas de

Fig. 28 Assentamento de soalho com serrafado.

terra. (Costa, 1930)

(Costa, 1930)

Quando os pavimentos térreos ou inferiores eram constituídos por vigamentos de madeira, deixava-se um espaço livre entre o terreno e o piso destinado a circulação do ar, designado por caixa-de-ar, com uma altura nunca inferior a 0,40m. O arejamento obtido pela caixa-de-ar, era bastante útil para a conservação dos vigamentos (Costa, 1930).

Fig. 29 Respiradores dos degraus da escada.

Fig. 30 Respiradores no forro de cantaria.

(foto do autor)

(foto do autor)

52


A ventilação era garantida através de aberturas nas paredes, designadas por respiradores, guarnecidos à face do paramento exterior com pequenas tampas de ferro encastradas ou esculpidas na cantaria, conforme figuras 29 e 30. 4.1.1.3.1

ELEVADOS

Os pavimentos em madeira, com estrutura constituída por vigas tarugadas, apoiadas nos frechais, com um mínimo de 0,20m de entrega conforme figuram 31 e 32. Estas vigas eram dispostas paralelamente, na direção do menor vão com espaçamento de 0,40m de eixo a eixo, e com secções variáveis consoante a largura dos vãos a vencer e a carga a suportar. Os frechais tinham de secção aproximadas 0,10x0,10m e 0,08x0,08m com distâncias entre eixos de 0,50m.

Fig. 31 Pormenor de pavimento de madeira no

Fig. 32 Pormenor de pavimento de madeira.

interior. (Lisboa, Obra nº39164)

(Lisboa, Obra nº48013)

O tratamento das madeiras aplicadas era realizado através de indutos, pinturas, ou óleo. Os indutos mais usados eram o alcatrão e o pez mineral (betume natural), aplicados a quente, para peças expostas à humidade ou em contacto com a parede como o topo das vigas e faces das samblagens. Os madeiramentos empregues eram em pinho bravo ou pinho marítimo, madeira resinosa muito abundante no país (Leitão, 1896). Os limpos eram em pinho ou casquinha, em tábuas de soalho à portuguesa ou à inglesa (aparelhadas de macho e fêmea), com largura que variava entre 0,20m e 0,22m. O pavimento das cozinhas, casas de banho, terraços e marquises também podia ser constituído por vigas I de 20cm de altura, com espaçamento de 0,40m a 0,50m de eixo a eixo e enchimento de tijolo colocados a uma e meia vez, ou tijoleira (fig.33 e 34). Sobre as abobadilhas era aplicado o mosaico de revestimento. 53


Fig. 33 Pavimento em abobadilhas na

Fig. 34 Pavimento em abobadilhas na varanda técnica9.

varanda técnica8. (Foto do autor)

(Foto do autor)

4.1.1.4

COBERTURA

Vulgarmente de duas águas com inclinação variável (35º e 45º), a cobertura era armada em asnas de madeira de pinho, revestida a telha cerâmica, tipo marselha. Os elementos que compõem a cobertura têm as seguintes secções aproximadas: vigamentos com 0,18mx0,18m, madres e fileiras 0,18mx0,08m ou 0,15mx0,10m não devendo exceder os 2,00m entre elas, o varedo com 0,10mx0,05m ou 0,14mx0,07m espaçadas 0,40m entre eixos entalha no frechal e contra frechal que tal como as escoras têm 0,16mx0,08m de secção, o ripado com 0,036mx0,024m ou 0,036mx0,048m.

a

c e

a

b

Fig. 35 Corte da cobertura do edifício nº 91 a 99 na Rua Filipe da Mata de 1932-33. (Lisboa, Obra nº45407 )

Na figura 35 está representado um tipo vulgar de asnas utilizado: a são as pernas, b a linha, c o pendural, que não se apoiava na linha, e onde as pernas se inserem nas extremidades superiores, e e as escoras, que evitam a flexão das pernas. O remate da cobertura no final do varedo era vulgarmente com platibanda no alçado principal e algeroz em zinco, à vista, no tardoz, conforme figuras 36, 37 e 38. 8

Extraído de levantamento in situ, no edifício nº 63 da Avenida Elias Garcia.

9

Extraído de levantamento in situ, no edifício nº 55 da Avenida da República.

54


Fig. 36 Pormenor de platibanda na

Fig. 37 Pormenores de algeroz

Fig. 38 Pormenores de

fachada principal. (Lisboa, Obra

na fachada principal. (Lisboa,

algeroz na fachada tardoz.

nº48013)

Obra nº3796)

(Lisboa, Obra nº3796)

A mansarda era utilizada quando se queria dar ao último piso um pé direito mais elevado. Quando a cércea estava no limite, recuava-se o ultimo piso para aproveitamento de mais um andar. Em geral a estrutura da mansarda era de madeira revestida a chapa lisa ou ondulada de zinco, ou de ferro galvanizado. As claraboias eram construídas entre as asnas da cobertura para iluminar e ventilar a caixa de escadas (Fig.39). Podiam ser construídas paralelamente as águas do telhado “claraboia de esteira”, ou em lanternim com 2 águas ou 4 águas (Costa, 1930).

Fig. 39 Pormenor da “claraboia de esteira”. (Costa, 1930)

Fig.

40

Pormenor

do

Fig. 41 Conjunto de edificios modernistas com claraboia. (foto do autor)

lanternim. (Costa, 1930)

55


Os caixilhos são em geral construídos em ferro e ficam elevados de 0,10m a 0,50m de altura com revestimento em zinco pelo exterior garantindo estanqueidade na cobertura. 4.1.1.5

ESCADAS DE SALVAÇÃO

A construção das escadas de salvação ou de serviço, para protecção contra incêndios, era feita através da ligação dos respectivos lanços, por cravação, à estrutura dos patins. O início do primeiro lanço é fixado a uma sapata de pedra (fig. 42).

Fig. 42 Pormenores da escada de salvação (Lisboa, Obra nº39164)

A estrutura dos lanços das escadas é obtida com colunas de ferro fundido ou de ferro laminado, sendo os tubos largos deste ferro os mais utilizados. Por vezes os patins junto das paredes para onde as escadas prestam serviço são sustentados por consolas (Costa, 1930). Os elementos de ferro eram impermeabilizados antes da pintura com “tinta de zarcão”, uma emulsão em óleo, de elevada toxidade, com propriedades anticorrosivas, empregada como proteção contra a ferrugem. 4.1.1.6

VÃOS

Os vãos exteriores, geralmente guarnecidos por cantaria, dividem-se em: Janela de peito, composto por peitoril assente no pano de peito, ombreiras numa única peça e verga ou padieira ressalvada através de arco em tijolo. Vão de sacada, composto por lancil, ombreiras em pedra e verga ou padieira ressalvada através de arco em tijolo, por vezes reforçada com perfis metálicos, conforme se pode ver nas figuras 43 e 44. 56


Fig. 43 Verga em tijolo na parede exterior do edifício nº

Fig. 44 Verga em tijolo ressalvadas. (Costa,

69 a 75 da Avenida Elias Garcia. 10 (foto do autor)

1930)

Embora não fosse utilizava a gaiola na construção das paredes, eram introduzidos na alvenaria elementos de madeira (prumos, vergas, pendurais e travadouras fixos aos frechais) que ficavam à face do paramento interior sobre os quais se pregavam diversos elementos, como os alizares, rodapés, etc., (figuras 45 e 46). Os caixilhos e portas interiores eram em madeira de casquinha pintada nas couceiras e travessas, as almofadas eram em pinho, “…todos os vãos previamente betumados e aparelhados, sendo nas madeiras os nós queimados a maçarico e impermeabilizados a verniz.”11

Fig. 45 Elementos de madeira introduzidos na

Fig. 46 Verga em tijolo.4 (foto do autor)

alvenaria, à semelhança de um vão de uma parede em gaiola.4 (foto do autor)

As pedras de piso de sacadas e as varandas encastradas na parede apoiavam-se em mísulas ou consolas de pedra, também designadas por cachorros quando têm ornamentação. As soleiras e peitoris dos vãos eram ligeiramente inclinados para o exterior para facilitar o escoamento da água da chuva. 10

Levantamento in situ ao Edifício nº 69 a 75 da Avenida Elias Garcia.

11

Excerto retirado da memória descritiva da Obra nº45407.

57


Fig. 47 Alguns exemplos de vãos exteriores. (fotos do autor)

O encerramento do espaço exterior das varandas, correspondia à tentativa de prolongamento da estrutura das cozinhas. A marquise ficava totalmente saliente do edifício com uma profundidade de 1,5m aproximadamente, conseguida através de um sistema de pilares e vigas metálicas de bordadura. As paredes de empena prolongam-se para além da parede da fachada posterior, o vão deixado entre as empenas era vencido com uma viga metálica com suporte a meio vão, dado por um pilar metálico (fig.48 e 49). Eram utilizados perfis muito variados, tubulares, cantoneiras, varões, barras, em ligação com superfícies de chapa e vidro. Esta solução não obsta a que surjam varandas técnicas no tardoz quando associado a outras áreas da casa. 58


Fig. 48 Marquise em ferro e vidro simples. (foto do autor)

Fig. 49 Marquise em ferro e vidro simples. (foto do autor)

59


4.1.2

TIPOLOGIA MISTA

A tipologia mista corresponde à transição do final da construção de edifícios tipo gaioleiro para o início da introdução do betão armado na construção. Este período caracteriza-se pelas estruturas mistas de alvenaria e betão, mantendo a madeira e o tradicional ferro nas traseiras. Para melhor compreensão da evolução do “gaioleiro” para a tipologia mista, serão aqui descritas as alterações introduzidas em cada elemento funcional das edificações, que se prendem essencialmente com as disposições do RGCU; regularização das espessuras das paredes; secções mínimas dos madeiramentos nos pavimentos elevados; a aplicação do betão em lajes das áreas de cozinha e instalações sanitárias; e em cintas pontuais sobre os vãos, apoiado em paredes resistentes. Algumas alterações aqui referidas provêm de exigências do serviço de fiscalização sobre construção de prédios da CML durante a execução da obra, localizados nos processos de obra dos edifícios em estudo. Deste modo os projectos anteriores eram progressivamente adaptados às novas disposições regulamentares. O betão armado (de primeira geração) é introduzido na construção residencial de forma fragmentada e experimentalista com alguma liberdade de cálculo e execução, permitida pelo Regulamento para emprego do betão armado de 1918, período que se estende até à entrada em vigor do Regulamento do Betão Armado (RBA, 1935). 4.1.2.1

ESTRUTURA

FUNDAÇÕES Se o terreno não era suficientemente firme, construía-se, no enchimento das fundações, uma sapata corrida de betão armado com 0,20m de espessura mínima, com varões de aço de 12mm formando uma malha de 0,12m, a 1m abaixo do terrapleno. Sobre esta, que varia na largura, crescia a parede com alvenaria de pedra e argamassa hidráulica, até à linha do ensoleiramento, no eixo das paredes exteriores e frontais ou com pilares intercalados na alvenaria12.

12

Em memória descritiva do projecto de licenciamento do Edificio nº 2 da Rua Eduardo Brasão, Lisboa,

Obra Nº48567.

60


Fig. 50 Edifício nº 55 da Avenida da República. (Lisboa, Obra nº39164)

EM ELEVAÇÃO As colunas e vigamentos de ferro fundido eram utilizados ao nível do piso térreo, permitindo vencer vãos maiores o que ampliava as áreas no espaço das lojas. Esta estrutura de ferro suportava os pisos e paredes divisórias superiores e a casa das máquinas dos elevadores. As ligações ao solo e ao vigamento eram feitas por parafusos, inferiormente por uma base quadrada fixa ao maciço de betão por meio de parafusos de chumbar ou chumbadouros embebidos no betão da sapata e ligados às suas armaduras (Segurado, 1930-40).

Fig. 51 e Fig. 52 Edificio nº 55 da Avenida da República, colunas no piso térreo. (foto do autor)

A introdução de cintas de betão armado em toda a volta do edifício era uma solução exigida pelo Regulamento Geral da construção urbana para a cidade de Lisboa (RGCU) para os edifícios com mais de dois pisos, cujos pavimentos não fossem de betão armado. Por vezes era exigida pelos técnicos da Câmara Municipal de Lisboa após inspecções regulares, durante a construção dos edifícios. 61


Estes lintéis contínuos em betão armado recebiam os frechais para assentamento dos pisos, tinham espessura variável e eram armados segundo cálculos estruturais apresentados em memória descritiva (fig. 53 e 54).

Fig. 53 Pormenor de cinta de betão armado.

Fig. 54 Pormenor de cinta de betão armado. (Lisboa,

(Lisboa, Obra nº45306 )

Obra nº45407 )

Quando não era empregue armação de madeira (gaiola) nas divisórias, eram construídas sobre as vergas das portas interiores, vigas de betão armado para ligação de todas as paredes interiores. Estas vigas ligavam-se nos topos às cintas de betão armado. 4.1.2.2

PAREDES

PAREDES-MESTRAS As paredes-mestras de fachada, em alvenaria ordinária ou mista (fig.55, 56, 57), diminuíam de espessura 0,10m em cada andar do edifício e, no último piso, não poderiam ter menos de 0,40m quando construídas de alvenaria13. EMPENAS E SAGUÃO A utilização de blocos de betão nas empenas começa a ser frequente, o seu peso/m3 é inferior à alvenaria ordinária, tornando vantajosa a sua utilização. A argamassa de assentamento dos blocos era de cimento e areia ao traço 1:2. As empenas também sofrem diminuição de espessura nos últimos andares, mas só de cerca de 0,05m.

13

Conforme Artº 32 da Secção II do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa,

1930.

62


Fig. 55, Fig. 56, Fig. 57 Exemplos de paredes mestras. (fotos do autor)

PAREDES DIVISÓRIAS As paredes de frontal eram em tijolo furado (dois furos) a uma vez (0,23m em tosco), apenas nos quatro últimos pisos (fig.58). As paredes em cave e nos primeiros pisos eram em tijolo maciço assim como as paredes da escada, que suportam cargas maiores. Estas paredes podiam ainda ser de ambos os tipos de tijolo, designadas frontais de tijolo misto (fig. 60). A utilização de blocos de cimento na construção de paredes divisórias com espessura de 0,20m passa a ser frequente.

Fig. 58, Fig. 59, Fig. 60, Exemplos de paredes divisórias. (fotos do autor)

Nos tabiques ou divisórias longitudinais reduzia-se a sua espessura para parede de meia vez de tijolo furado (0,11m em tosco), ilustrada na figura 59. As divisórias de maior simplicidade eram com tijolo a cutelo. Nos edifícios onde as paredes divisórias resistentes são em blocos de betão, temos os tabiques no mesmo material com redução da sua espessura para 0,15m, e 0,10m nos últimos pisos. 63


Os tabiques construídos em madeira quase que deixam de existir ficando limitados a aplicações em sótão, andares recolhidos ou mansardas ou quando as circunstâncias não permitam o emprego de outro material mais resistente e de maior duração.(RGCU, 1930) A argamassa de assentamento utilizada é vulgarmente de cimento e areia, ao traço 1:2 e 1:3 com espessura entre os tijolos que vai de 0,008 a 0,01m. É também, pontualmente, utilizada uma argamassa à base de cal “cozida a matto” e areia ao traço 1:2. Ambas são classificadas como argamassas ordinárias. Conforme referido anteriormente, as espessuras das paredes não são constantes, diminuindo de baixo para cima, à medida que se torna menor a carga que sobre elas actua. Com a entrada em vigor do RGCU de 1930, estas espessuras passam a ser regulamentares conforme tabela 01. Tabela 1 Espessura das paredes de alvenaria segundo disposições do artigo nº32 do RGCU, 1930. (excluindo rebocos e revestimentos) FRONTAIS E PAREDES DAS FACHADAS

EMPÊNAS E SAGUÃO

DIVISÓRIAS DE

PISO Alvenaria ordinária

Ultimo

Alvenaria tijolo furado

maciço

Alvenaria ordinária

Alvenaria tijolo furado

maciço

Blocos

Betão

Alvenaria

Blocos

Alvenaria

Blocos

cimento

armado

de tijolo

cimento

de tijolo

cimento

[m]

[vezes]*

[m]

[vezes]*

[m]

1/2

0,10

1/2

0,10 1/2

0,10

[vezes]*

[m]

[m]

[vezes]*

[m]

0,40

1 1/2

0,30

0,40

1 1/2

0,20

0,40

0,40

1 1/2

0,40

0,40

+ 1/2 (em cada piso)

4

2

Blocos cimento

[m]

5

3

1 1/2

+0,10

+0,10

(em

(de três

+ 1/2

cada piso)

(em

-

cada

1

piso)

+0,10 (em cada piso)

+0,05

-

+ 1/2

em três

(de

pisos)

(de dois

dois

em dois

em

pisos)

1

dois

+ 1/2

pisos)

0

(em cada piso)

Cave

TABIQUES

ESCADAS

> 0,60

-

-

> 0,60

-

-

> 0,60

-

0,15

+0,05 (em

+ 1/2

+0,05

(de dois em dois pisos)

(de dois em dois pisos)

-

-

cada piso)

-

* O tijolo a que se referem as disposições do artigo nº 32 do RGCU referidas nesta tabela é do tipo normal, maciço ou com dois furos, com as dimensões 0,23 x 0,11 x 0,075m.

64


4.1.2.3

PAVIMENTO

TÉRREO “O pavimento dos pisos do rés-do-chão e das caves era constituído com uma camada impermeabilizante, com 0,08 de espessura mínima ou caixa-de-ar, com uma altura nunca inferior a 0,60m, com aberturas nas paredes para comunicação com o exterior.” 14 A impermeabilização destes pavimentos era feita geralmente com produtos hidrófugos, a quente ou a frio. Estes produtos têm como base o alcatrão ou breu15, derivados da borra de gás, e dos betumes naturais. Estes produtos aplicam-se sobre os massames antes de se assentarem sobre eles os revestimentos superiores. Nos pavimentos hidráulicos, os revestimentos hidrófugos são aplicados para se evitarem as infiltrações de águas, de esgotos e outras de qualquer ordem. ELEVADOS Os pavimentos das áreas secas eram em madeira conforme se descreve na tipologia do gaioleiro, garantindo o cumprimento das considerações referidas no Regulamento Geral da Construção Urbana para a cidade de Lisboa quanto às secções mínimas dos madeiramentos a aplicar. Nos pavimentos das áreas húmidas (cozinhas, casas de banho) e varandas, generaliza-se a aplicação de laje de betão armada (Fig.61, 62) com espessura mínima 0,08m conforme disposições do Regulamento para o emprego de betão armado de 1918. Revestidas a mosaico hidráulico ou equivalente.

Fig. 61, Fig. 62 Pormenores de laje em betão armado. (Lisboa, Obra nº48567)

14 Conforme Artº 50 da Secção III do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930. 15

O breu é uma matéria resinosa, proveniente da decomposição da hulha (carvão betuminoso). O breu seco

é negro ou arruivado. (Costa, 1930)

65


4.1.2.4

ESCADA DE SALVAÇÃO

“Nos edifícios que tinham três pisos e mais de cem metros quadrados de área coberta por piso era exigido, para além da escada principal, uma escada de salvação, servindo todos os pisos em caso de incêndio.”16

Fig. 63 Pormenor de escada de serviço.

Fig. 64 Exemplo de escada de serviço.

(Lisboa, Obra nº48703)

(foto do autor)

4.1.2.5

VÃOS

Nas marquises verifica-se uma evolução das paredes de peito revestidas a chapa de ferro para paredes em betão armado acompanhando a laje, estucadas pelo interior e exterior, mantendo o envidraçado com caixilharia de ferro e vidro simples ou reforçado. 4.1.2.6

ACABAMENTOS E ELEMENTOS DECORATIVOS

FORROS Empregue como simples revestimento, a pedra de cantaria toma o nome de pedra de forro (fig. 06), com espessura de 0,08m a 0,10m, sendo convenientemente gateadas e chumbadas as pedras da alvenaria exterior. Os socos tinham, do lado exterior da parede, uma “sapata” de 0,02m a 0,03m.

16

Conforme Artº 177 do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930.

66


PILASTRA As pilastras, que são saliências verticais nos fustes das fachadas, são em algumas obras construídas de cantaria com pedras assentes conforme o forro com 0,15 a 0,20m espessura. Quando não são deste material, são construídos da própria alvenaria. ELEMENTOS DECORATIVOS 

Pedra era aplicada na fachada de vários modos: elementos figurativos em paineis; frisos e molduras de traçado geométrico formando quadros (Fig.69); figuras humanas de frente e de perfil (Fig.65); elementos florais e aquáticos (Fig.70).

Elementos piramidais, em alvenaria, eram aplicados no coroamento dos edifícios, colunatas e cúpulas em edifícios de esquina. (Fig.72 e 73).

Colunas de capitéis.

Vão com vergas e sobre - vergas fortemente realçadas, e base das varandas em “concha” (Fig. 66) ou em “escada” ou assentes em mísulas ou cachorros.

Cimalhas construídas em cantaria ou em alvenaria predominantemente de tijolo, com decoração de motivos geométricos e florais (Fig.68 e 73).

Painéis decorativos de azulejos, aplicados no átrio dos prédios, com desenhos nitidamente Art Déco ou motivos figurativos e florais (Fig. 74 e 75).

Mosaico cerâmico, normalmente na fachada, formando quadros ou frisos com motivos florais ou geométricos (Fig.67).

Fig. 65 Figuras humanas em

Fig. 66 Base de varanda em

Fig. 67 Mosaico cerâmico em

pedra. (fotos do autor)

concha. (fotos do autor)

fachada. (fotos do autor)

67


Fig. 68 Cimalha trabalhada

Fig. 69 Frisos e molduras a

Fig. 70 Elemento decorativo. (foto

com motivos geométricos. (foto

enquadrar os vãos. (foto do autor)

do autor)

do autor)

Fig. 71 Pormenor de desenho de

Fig. 72 Colunatas de coroamento.

Fig. 73 Elementos decorativos

fachada. (Lisboa, Obra nº48013)

(fotos do autor)

piramidais. (fotos do autor)

Fig. 74 Painel decorativo da autoria do artista Jorge

Fig. 75 Revestimento cerâmico Art Déco.

Barradas

(Fernandes, 1979)

Arredores

de

Lisboa,

As

Saloias.

(Arquitectos, 3 abril 1938)

TECTOS Os tectos são normalmente decorados a estuque num trabalho muito rico integrando formas tradicionais e motivos mais geométricos (fig. 76, 77 e 78), pressupondo a existência de estucadores especializados nos mais diversos temas. 68


Tectos em estuque sobre fasquiado O fasquiado era idealmente em casquinha mas mais frequente em pinho, disposto na perpendicular em relação ao vigamento, construído com fasquias trapezoidais de 0,015m ou 0,018m de espessura e 0,02m de Iargura máxima. As fasquias eram pregadas com a base mais estreita para cirna, para que o reboco não caísse, sendo estucado após o esboço (cal gorda e areia ao traço 1:2) estar seco.

Fig. 76 Tectos trabalhados em gesso no átrio de

Fig. 77, Fig. 78 Tectos trabalhados em gesso em

entrada, no edifício nº 131 da Rua Rodrigo da Fonseca.

compartimentos interiores, no edifício nº 131 da

(foto do autor)

Rua Rodrigo da Fonseca. (fotos do autor)

Tectos em estuque sobre estafe O estafe é um composto formado por gesso e estôpa ou sisal, utilizado na obtenção de volumetrias mais salientes e outros ornatos, por ser mais leve e maleável que o estuque ordinário. Também era aplicado em placas denominado gesso armado, com dimensões variadas e com espessura de 0,005m a 0,008m, com junta direita ou de macho e fêmea. Estas placas são providas de umas delgadas réguas de madeira para fixação aos vigamentos. Sobre as placas de estafe fazia-se o esboço e sobre este aplica-se o estuque (Segurado, 1929). PAVIMENTO O Mosaico hidráulico, com motivos geométricos ou florais, era um revestimento regularmente aplicado no átrio dos edifícios, e no interior das habitações nas áreas húmidas (Fig.79 e 80).

69


Fig. 79 Pavimento em mosaico hidráulico com

Fig. 80 Pavimento em mosaico hidráulico com

motivos geométricos. (foto do autor)

motivos florais. (foto do autor)

PINTURAS Os paramentos das paredes interiores ou exteriores eram cobertos com uma camada de emboço, chapado ou pardo, de argamassa de cal e areia ou de cimento e areia. Depois deste seco as paredes eram rebocadas vulgarmente com argamassas de cal gorda e areia ao traço 1:3 e aplicava-se o esboço á base de cal gorda e areia ao traço 1:2. Sobre a massa de esboçar aplicava-se o estuque, constituído por partes igual de cal em pasta e gesso, acabado a pintura com tinta de água. O acabamento em paredes exteriores era à base de tinta com óleo.

Fig. 81 Parede estucada. (Costa, 1930)

Fig. 82 Parede estucada com lambril de azulejo. (Costa, 1930)

A pintura dos edifícios obedecia às disposições camarárias; as cores mais frequentes são os cremes, ocres, azuis e verdes, em tonalidades sempre claras e acinzentadas (Fernandes, 1979). As paredes interiores eram estucadas para serem pintadas. Os trabalhos para esta pintura iniciavam-se pela aplicação de duas de mão de óleo de linhaça fervido sobre toda a superfície. Seguia-se uma de mão de tinta de aparelho à base de óleo de linhaça em toda a superfície. Depois do aparelho estar bem seco era tudo passado a lixa e, em seguida, enchia-se, com massa de óleo, as juntas, fendas, buracos e outros defeitos que a parede pudesse ter. Só depois de todo o paramento se encontrar completamente seco eram dadas três demãos de pintura com tinta de esmalte ou tinta de água (Costa, 1930). 70


4.2

CARACTERIZAÇÃO

CONSTRUTIVA

-

EDIFÍCIOS

MODERNISTAS

CONSTRUÍDOS ENTRE 1930 E 1940, FASE MODERNISMO RADICAL17 Na década de 30, mas desenvolvendo-se em paralelo com a influência das Art Déco, iniciou-se uma renovação de estilo e do processo construtivo que, a par do apoio à construção privada e normalização sugerida pelo novo regime politico (instauração do governo ditatorial nacional em 1926), conduziu a uma nova expressão arquitectónica. Esta fase racionalista do Movimento moderno é caracterizada por um estilo de simplificação formal e de geometrização, com acentuação de elementos horizontais maioritariamente onde o tratamento volumétrico da fachada e dos espaços desempenha um papel preponderante. Daqui resultaram formas, em geral, mais próximas de conceitos funcionais e mais afastadas de linguagens puramente decorativas. Esta evolução de estilo está directamente relacionada com a introdução definitiva do betão armado na construção. O surgimento, no mercado do cimento nacional, sensivelmente mais barato do que o importado, foi também um incremento para o desenvolvimento desta nova fase na construção civil (Populi, 1946). Assim, generaliza-se a aplicação do novo material nas edificações com uma explícita preocupação com a implementação de ideias higienistas e de segurança contra incêndios, descurando, no entanto, a resistência aos sismos dos edifícios (Fernandes, 1993).

Fig. 83 Fachada principal, edifício nº 25 da Av.

Fig. 84 Fachada tardoz, edifício nº 25 da Av.

Ressano Garcia. (Lisboa, Obra nº48647)

Ressano Garcia. (Lisboa, Obra nº48647)

17

Termo referido no texto do Arq. José Manuel Fernandes publicado na revista Arquitectura, nº132, Lisboa

de Março de 1979: «Para o estudo da arquitectura modernista em Portugal - III»

71


4.2.1

TIPOLOGIA DA PRIMEIRA FASE DE BETÃO ARMADO

Caracteriza-se pela aceitação crescente do novo processo construtivo e introdução gradual de estruturas reticuladas em betão armado. Na tipologia mista, o betão armado foi introduzido sob a forma de lajes, enquanto vai substituir a totalidade dos pavimentos em madeira e, finalmente, é aplicado em pilares e sistemas globais de pilar/viga/ laje. Este período tem início com a entrada em vigor do RBA em 1935 e prolonga-se até à sua rectificação ou actualização em 1943. 4.2.1.1

ESTRUTURA

FUNDAÇÕES O emprego de betão armado nos alicerces modificou por completo os processos de fundação e de consolidação do terreno, permitindo que o alicerce faça corpo com o edifício e forme um todo monolítico, de modo que os movimentos do solo, devido a qualquer causa, tenham repercussão directa muito inferior à que se dá nos edifícios e suas fundações feitas de alvenaria ordinária. Ao proporcionar melhor distribuição de carga sobre o solo, a utilização do betão aramado permitiu diminuir a profundidade das escavações e a espessura das paredes.

Fig. 85 Planta de fundações (sapatas) do edificio nº74

Fig. 86 Planta de fundações (sapata geral) do

da Rua Nova de São Mamede (Lisboa, Obra nº49904).

edificio nº7 da Rua Alexandre Braga (Lisboa, Obra nº51126).

72


Fig. 87 Planta de fundações (estacaria) do edificio nº48 da Rua Artilharia Um. (Lisboa, Obra nº 52568)

Identificam-se três casos gerais de fundações com utilização de betão armado: 

Sapatas de pilares isolados, (fig.85, 88);

Sapatas de paredes, (fig.89);

Sapatas gerais ou plataformas contínua de betão armado (ensoleiramento geral), (fig.86 e 90);

Estacaria, (fig.87).

Fig. 88 Sapata de pilar isolado; Fig. 89 Sapata da parede de empena; Fig. 90 Plataforma de fundação. (Lisboa, Obra nº49904)

73


Em qualquer dos casos encontra-se a solução de construção total em betão armado mas, mais frequentemente, o emprego deste sistema de construção restrito ao alicerce e estrutura pilar/viga, sendo o edifício também suportado por alvenaria ordinária de pedra ou tijolo. EM ELEVAÇÃO Os pilares de betão armado compunham-se de uma armadura longitudinal, formada por certo número de barras ou varões de ferro, ligados transversalmente por arames, anéis e cintas, e envolvidos completamente pelo betão. Também se empregam vigas de ferro ou aço laminado, em forma de I ou U, etc., simples ou armadas, embebidas do mesmo modo no betão, servindo o betão apenas para os revestir e proteger da corrosão pela humidade e proteger contra o fogo (Segurado, 1930-40). Nas vergas das janelas generaliza-se a aplicação cintas de betão armado corridas para travamento até às empenas, servindo simultaneamente de caixas para gelosias18. PAVIMENTOS Verifica-se alterações das técnicas construtivas apenas ao nível dos pavimentos elevados, em lajes de betão. Geralmente moldadas in situ, as lajes de betão eram vulgarmente armadas em cruz com 10cm de espessura, com um mínimo de 7cm exigido no RBA, também para as lajes armadas em uma só direcção. A disposição geral das lajes usadas em pisos variava conforme os apoios eram em vigas de ferro ou em vigas de betão armado, fazendo corpo com elas. “Lage de betão armado revestidas com uma camada de forma e cimento, nela assentam mosaicos de madeira.”19

Fig. 91, Fig. 92, Fig. 93 Exemplos de lajes com armadura em cruz, recolhidas in situ.

18

Conforme memória descritiva da Obra nº52568.

19

Excerto retirado da memória descritiva da obra nº52568

74


4.2.1.2

COBERTURA

A introdução do betão armado na construção contribuiu para o aparecimento da nova tipologia de cobertura – plana não acessível – a par das soluções tradicionais de cobertura inclinada. As placas de cobertura em betão armado com espessura não inferior a 0,10m e 1% de inclinação mínima(RGCU, 1930), eram revestidas com uma camada de betonilha com 0,02m a 0,03m de espessura, impermeabilizada com um betuminoso e só então era revestida a ladrilho ou tijoleira com as juntas bem tapadas de massa. “…lajes de betão armado revestidas com betuminoso…, revestidas com lajedo assente em taco de tijolo de forma a deixar uma camada de ar isoladora do calor.”20

Fig. 94 Pormenor de cobertura plana (Lisboa, Obra nº

Fig. 95 Cobertura plana. (foto do autor)

52568).

“ Quando uma das dimensões dos terraços seja maior que quinze metros deverão deixar-se juntas de dilatação com 0,005m…revestidas com qualquer produto compressível apropriado, por forma a não impedir as dilatações.”21 4.2.1.3

ESCADAS DE SALVAÇÃO

As escadas de serviço ou salvação também vão acompanhar a evolução técnica potenciada pelo emprego do novo material, passando de uma estrutura metálica, exterior ao edifício, para uma construção em betão armado onde se verifica uma integração gradual dos elementos do tardoz no conjunto do edifício. Em alguns casos optou-se por fechar o acesso vertical numa caixa prismática, como no nº 204 da Rua Rodrigo da Fonseca (Fig.96) ou no nº27 da Avenida Defensores de Chaves (fig.98).

20

Excerto retirado da memória descritiva da Obra nº52568.

21

Conforme Artº 69 do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930.

75


Fig. 96 Escada de serviço em

Fig. 97 Edificio no Bairro D. Amália

Fig. 98 Escada de serviço.

volume fechado de betão armado.

com a escada de serviço em betão

(Fernandes, 1979)

(foto do autor)

armado. (foto do autor)

4.2.1.4

VÃOS

Os vãos ganham uma horizontalidade que ao longo do tempo vai sendo mais assumida com caixas de fenestrações que se prolongam em consolas sobre o plano da fachada, construídos em lajes de betão e muretes de tijolo rebocado, ou varandas fechadas salientes com bow-windows (fig. 100) ou abertas com guardas metálicas salientes, conferindo tridimensionalidade à fachada.

Fig.

99

Edifício

com

vãos

horizontais em consola. (foto do autor)

Fig.

100

Edifício

com

windows. (foto do autor)

bow-

Fig. 101 Edifício com vão vertical

de

iluminação

das

escadas. (foto do autor)

Alguns edificios vão introduzir uma nova tipologia de vão que marca a caixa de escadas na fachada através de superficies de vidro em estrutura metálica (fig. 101). Os caixilhos dos vãos são em geral em madeira de casquinha, betumada e pintada a tinta de óleo. 76


As marquises passam a estar integradas na volumetria do edifício, mantendo o envidraçado com paredes de peito em tijolo ou betão armado, destacando-se do plano da fachada as escadas de serviço (fig. 102,103,104).

Fig. 102; Fig. 103; Fig. 104; Exemplos de alçados tardoz. (fotos do autor)

4.2.1.5

ACABAMENTOS E ELEMENTOS DECORATIVOS

Os elementos figurativos introduzidos na composição da fachada, eram em paineis de artes decorativas em baixo-relevo na fase de transição, ou desenhos totalmente abstractizantes mais coerentes com o modernismo radical (Fig. 105,107). Também são recorrentes as faixas de reboco salientes da fachada conforme figura 106.

Fig. 105 Painel decorativo.

Fig. 106 Faixas horizontais.

Fig. 107 Elementos decorativos.

ELEMENTOS EM PEDRA Muitas vezes em lugar de guarnecimentos de cantaria, aplicava-se guarnecimentos de betão ou outra massa, ou apenas fingidos com o reboco.

77


Os elementos em pedra são de uso muito reduzido, praticamente só utilizado no embasamento ou soco, ou no guarnecimento dos vãos. Encontra-se ainda, nos acessos às caixas de escada lambrins e silhares em mármore, nos exemplos mais luxuosos e de maior prestigio social, com corrimão em latão numa composição de primos verticais e horizontais de secção circular pontuados por argolas.

Fig. 108, Fig. 109, Fig. 110 Acabamentos interiores das áreas comuns do prédio

ELEMENTOS DE FERRO PINTADO As portas de entrada dos edificios ganham uma importância especial na composição decorativa da fachada. Num trabalho notável de serralharia estes elementos foram o suporte escolhido para imprimir as formas do estilo modernista radical (fig. 111,112 e 113) . As fachadas destes edificios destinguem-se também pelos perfis tubulares de secção circular que acompanham as varandas, apontamentos que conferem horizontalidade ao conjunto. TECTOS Ao nível dos tectos assiste-se a uma simplificação gradual das formas, diminuindo a sua importância como elemento decorativo. PAVIMENTOS Nos pavimentos recorre-se ao taco de madeira no interior, mantendo-se o mosaico hidráulico como revestimento preferencias para as áreas humidas. A pedra é pontualmente aplicada nas áreas comuns do prédio no hall de entrada do edifício.

78


Fig. 111; Fig. 112; Fig. 113; Exemplos de portas de entrada em serralharia

79


4.3

CARACTERIZAÇÃO

FISICO/ESPACIAL

EDIFÍCIOS

MODERNISTAS

CONSTRUÍDOS ENTRE 1920 E 1935, FASE ART DÉCO.

A partir da análise do objecto de estudo – Edifícios de estilo Art Déco, entre 1920 e 1935 - e análise da legislação em vigor neste período, podemos definir tipologias para o tipo de Lote, Edifício e para o tipo de fogo. 4.3.1

O LOTE

INSERÇÃO URBANA Estes edifícios vão ocupar terrenos expropriados em zona de expansão urbana ou lotes vazios em quarteirões por urbanizar na zona consolidada da cidade. A inserção urbana destes edifícios passa pela adaptação á geometria do lote disponível. Podem dividir-se em 2 tipologias: o palacete (tipologia não abrangida neste estudo) e o edifício de habitação, alguns deles classificados como Bens de Valor Patrimonial, como o caso de estudo no nº49 da Avenida da República do Arq.º Pardal Monteiro. Para melhor compreensão da caracterização físico-espacial destes edifícios é fundamental identificar o tipo de utilização mais representativa – Prédios de rendimento - de custos controlados e com o objecivo de rentabilização. Nos bairros mais económicos muitas vezes o mesmo construtor construía edifícios gémeos, por economia processual e de construção. LOCALIZAÇÃO DO LOTE O edifício implanta-se no limite do lote com a rua, alinhado com a frente edificada existente, mantendo o logradouro anexo a uma das fachadas. Fundamentalmente inseridos em quarteirão, podem distinguir-se dois tipos de lote: em correnteza ou de gaveto (fig.114).

Fig. 114 Implantação do

Fig. 115 Implantação do edifício nº21

Fig. 116 Implantação do edifício

edifício nº55 da Avenida da

da Rua Damasceno Monteiro.

nº26 da Rua Visconde de

República.

Santarém.

80


Maioritariamente a tipologia do lote é em correnteza (fig.115 e 116). Os edifícios implantados no gaveto distinguem-se dos outros por terem duas frentes de rua que lhe garantem mais iluminação e ventilação interior. A tipologia de lote isolado existe em casos muito pontuais, associado a edifícios implantados em zonas novas da cidade em processo de urbanização como o Campo Pequeno ou Avenida de Berna. Com a publicação do RGCU em 1930, a cidade é dividida em três zonas, em que as normas de construção diminuem de exigência: a 1ª zona, ou principal, correspondente às grandes artérias centrais, a 2ª zona, abrangendo o conjunto restante da mancha construída, e a 3ª zona, ou exterior, correspondendo à periferia pobre e degradada.

CONFIGURAÇÃO DA PLANTA Regra geral os edifícios apresentam uma configuração de planta em profundidade, aspecto fortemente caracterizador do tipo “gaioleiro”. A profundidade do edifício era calculada a partir da relação: dimensão da profundidade do logradouro era igual ou superior a metade da altura da fachada. A relação profundidade/frente do edifício vai condicionar a necessidade de saguão ou corredor lateral para iluminar e ventilar os compartimentos interiores. Quando a profundidade do edifício é superior a 17m aproximadamente (mais de um quarto interior), é necessário incluir o saguão no programa da habitação para iluminar e ventilar os compartimentos interiores. Os edifícios em correnteza têm uma configuração rectangular na sua grande maioria (com ou sem saguão) ou em L quando têm corredor lateral. Os edifícios em gaveto têm uma implantação em L, em V ou em U. Nos edifícios pós 1930, data da publicação do RGCU, observa-se uma redução da profundidade da habitação, devido ao condicionamento do uso do saguão, e diminuição do número de compartimentos interiores para apenas um, em habitações com menos de 300m2 de área útil 22 (RGCU, 1930).

22

Confrome Artº 119 do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930. 81


4.3.2

O EDIFÍCIO

ALTURA DA FACHADA/ Nº DE PISOS A altura destes edifícios varia por arruamento ou grupo de arruamentos, e é determinada pela largura da rua ou pela cércea definida para o arruamento pela CML. Com quatro a cinco pisos no contexto geral, existem alguns exemplos de uniformização de cérceas, essencialmente com 3 pisos, no Bairro Lopes, ou no Bairro Azul, onde a maioria dos edifícios em correnteza tem 5 pisos (quatro andares). No RSEU de 1903 eram definidas as alturas mínimas do pé direito dos pisos começando com : 

3,25m ao nível do rés-do-chão;

Decresce para 2,75m a partir do 4º andar;

As caves com 3 m de pé direito mínimo e 2m acima do solo quando nenhuma das frentes está ao nível da rua.

Em 1930, segundo o RGCU, a altura máxima regulamentar da fachada, é 21m, e 25m nos edifícios de gaveto, prevendo um andar torreão. No RGCU, eram exigidas as seguintes medidas de pè direito mínimo: 

3,25m ao nível do rés-do-chão e 1º andar;

Outros andares com 3m;

Lojas com 3,5m;

Caves com 3m;

Mansardas, sótãos ou águas furtadas com 2,75m.

Quando o edifício tem um piso em cave, o piso do rés-do-chão fica sobre-elevado da cota de soleira de modo a garantir luz e ventilação natural no piso inferior. NÚMERO DE FOGOS POR PISO Da relação entre frente do lote e a tipologia de distribuição distingue-se as seguintes tipologias: 

1 fogo por piso quando o lote é de correnteza com largura inferior a aproximadamente 16m;

fogos por piso, distribuição tradicional esquerdo-direito, quando a largura do lote é superior a aproximadamente 16m;

LOGRADOURO “…Espaço descoberto pertencente ao talhão do prédio e a este anexo. Quando o logradouro estiver situado entre a fachada ou frente do prédio e o alinhamento marginal do talhão, chama-se logradouro da frente; quando estiver situado entre a fachada do tardoz e o limite interior do talhão, 82


tem o nome de logradouro de fundo ou de tardoz e, finalmente logradouro lateral ou corredor lateral quando entre uma das fachadas laterais e o correspondente limite lateral do talhão.”23 Este logradouro anexo obedece às seguintes condições: os logradouros devem ter profundidade mínima de ½ da altura da fachada tardoz (1/3 em quarteirões parcialmente ocupados), com área mínima de 30m2.24 SAGUÃO O saguão, conforme anteriormente referido, surge na sequência da profundidade dos lotes, em geral na zona central do fogo, sendo um elemento característico dos edifícios “gaioleiros”. Está inevitavelmente condicionado pela área do fogo que vai definir o tipo, dimensão e número de saguões necessários. Os saguões ou pátios interiores destinados a iluminar e arejar terão áreas mínimas de 9m2 quando servem área de cozinha ou 4m2 quando destinados a vestíbulos ou escadas, estas eram as disposições do RSEU (1903). O saguão dos edifícios anteriores a 1930, era mais comprido e servia mais divisões, conforme se verifica na planta da Avenida da república Nº49. Com o RGCU apenas são permitidos saguões …”para iluminação e arejamento de cozinhas e de um quarto apenas por habitação…”25, com uma área mínima onde se possa inscrever um círculo com diâmetro igual a metade da altura das paredes do pátio (nunca inferior a 2,5m de diâmetro). INVÓLUCRO CONSTRUÍDO A fachada principal era o suporte de preferência para ensaios de estilização de elementos classizantes recorrendo a um desenho e temáticas renovadoras. Em traços gerais a volumetria era pouco acentuada, dominância de linhas verticais, ultrapassando a linha do telhado conferindo um efeito de monumentalidade, cenarização da fachada através de baixos relevos em gesso e reboco, vergas e sobre-vergas realçadas, procurando uma «arquitectura de ilusão». Através do levantamento na cidade26 e com base nos textos do Arq.º José Manuel Fernandes Para estudo da arquitectura modernista em Portugal - foi possível identificar e classificar estes edifícios por tipos de fachada:

Definição do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930 Conforme Artº171 do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930 25 Conforme Artº172 do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930. 26 Conforme Capitulo III 23 24

83


Tipo A Fachada muito planificada, vincada marcação vertical por meio de pilastras dividindo os diferentes corpos do edifício; varandas pouco salientes, com guardas de ferro; utilização do reboco como revestimento preferencialmente à pedra; cimalhas pouco vincadas, com coroamentos em pirâmide; cúpula semiesférica na esquina dos edifícios de gaveto, conforme o exemplo da figura 117. Tipo B Mais arcaizante com uso abundante de pedra como revestimento exterior; colunatas no ultimo piso, definindo uma varanda recuada, ou no terraço rematando a esquina; cimalha saliente, com utilização do frontão quebrado; aparecimento de balaustradas de pedra nas varandas, conforme figura 118.

Fig. 117 Edifício nº 27 da Avenida Elias Garcia.(Foto

Fig. 118 Edifício nº 12 da Avenida Barbosa do

do autor)

Bocage. (Foto do autor)

Tipo C Composição mais livre que as anteriores; superfícies lisas abundantemente e importância dos elementos decorativos, que surgem por contraste sobre estas superfícies; Afastamento formal de possíveis modelos classizantes; utilização sábia dos eixos de simetria (figura 119,120).

84


Fig. 119 Edifício nº 173 da Avenida

Fig. 120 Edifício nº 1 da Rua Fialho de Almeida. (Foto do autor)

António Augusto de Aguiar.(Foto do autor)

A oposição formal entre a fachada e as traseiras é característica destes edifícios, oposição técnica, decorativa e funcional: 

Métodos tradicionais de construção, em paredes de alvenaria portantes com descarga vertical de esforços, na fachada principal e, no tardoz, em toda a sua largura, uma estrutura saliente, metálica, em terraços ou marquises.

Fachada principal de desenho cuidado, enquanto que ao tardoz é dada uma importância secundária, meramente funcional.

4.3.3

O FOGO

FUNCIONALIDADE ESPACIAL A distribuição dos espaços, mantendo a configuração da planta em profundidade, não acusa mudanças significativas com a introdução das novas técnicas construtivas. Mantêm-se os saguões e os quartos sem ventilação, com corredor longo de distribuição, salas viradas sobre o alçado principal e áreas húmidas sobre o alçado tardoz. A área técnica no tardoz do edifício, em varanda ou marquise, passa a incluir no seu programa uma latrina e uma pia de despejo independentes uma da outra, conforme disposição do RSEU (1903) e RGCU (1930), situação que se mantém nos edifícios de construção mista. Quanto à funcionalidade espacial destes edifícios, é possível distinguir cinco tipologias: Tipo 1

85


Edifícios localizados em Zona 127, com frentes largas e um fogo por piso. O espaço da habitação é mais compartimentado e as áreas húmidas aparecem mais distribuídas no fogo, com a cozinha sempre ligada ao espaço técnico da varanda ou marquise. Lote mais profundo superior a 20m de empena, com saguão lateral que serve mais do que um quarto.

Fig. 121 Avenida Elias Garcia nº69

Fig. 122 Av. da Républica nº49

Projecto de 1917

Projecto de 1920

A LOTE 340m2

A. LOTE 600m2

AB 285m2

AB 485m2

14,50x21,05

15,45x31,40

Tipo 2 Edifícios pós 1930, com um único fogo por piso, organização dos espaços de serviço junto ao núcleo das escadas, encostados a uma das empenas, as salas e quartos ficam dispostas nos limites junto as fachadas. Com cinco compartimentos e uma cozinha (excluindo, despensa, pia de despejo e casa de banho).Esta tipologia é universal, aplicada nos edifícios de todas as Zonas da cidade.

27

Identificadas no Art.º119 do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa,

1930. 86


Fig. 123 Rua Visconde de Santarém nº26

Fig. 124 Avenida Ressano Garcia nº25

Proj. de 1934

Proj. de 1919-1935

A.Lote 185m2

A.Lote 180m2

Edificio “gaioleiro”

AB 135m2

AB 150m2

8,40X13,70

8,95x16,30

Fig. 125 Rua Elias Garcia nº180

Fig. 126 Rua Eduardo Brasão nº2 e 4

Proj. de 1934

Proj. de 1934

A.LOTE200m2

A.Lote 240m2 (cada)

AB 130m2

AB 165m2

8,30x16,15

9,50X17,25

87


Tipo 3 Edifícios pós 1930, com dois fogos por piso organizam os espaços de serviço junto ao núcleo das escadas, no cento da planta, as salas e quartos ficam dispostas nos limites junto as fachadas. Corresponde à duplicação da tipologia 2 em simetria. A sua configuração em planta aproxima-se da forma quadrangular. Com um mínimo de quatro compartimentos e uma cozinha (excluindo, despensa, pia de despejo e casa de banho). Esta tipologia é universal, aplicada nos edifícios de todas as Zonas da cidade, quando a largura do lote era superior a 16m.

Fig. 127 Rua Rodrigo da Fonseca nº131

Fig. 128 Avenida Almirante Reis nº197

Proj. 1935

Proj. 1932

A.Lote 415m2

Edificio “gaioleiro”

AB 320m2

A.LOTE450m2

17,25x18,12 (LXP)

AB 290m2 16,75x16,85

88


Fig. 129 Rua Alexandre Barga nº6 e 4

Fig. 130 Rua Damasceno Monteiro

Proj. de 1932

nº91

A.Lote 490m2 (cada)

Proj. de 1936

AB 270m2

A.Lote 335m2

18,55X14,4

AB 265m2 14,35x22

Tipo 4 Edifício de gaveto localizado em Zona 1, com alguma liberdade na organização dos espaços, contabiliza mais de sete compartimentos por fogo, excluindo cozinha, despensas, pia de despejo e casa de banho. O número de fogos por piso é definido pela largura do lote.

Fig. 131 Avenida da Republica nº191

Fig. 132 Avenida Elias Garcia nº63

Proj. de 1931

Proj. de 1929

A.Lote 510m2

A.Lote 340m2

AB 460m2

AB 315m2

25,40X20,20

25X13,65

Tipo 5 89


Edifícios localizados em Zona 2 e 3, com dois fogos por piso, e frente estreita (inferior a 10m). Organização dos espaços através de um eixo perpendicular á fachada onde se localizam as circulações e áreas de serviço. As escadas encostam á fachada principal com abertura vertical na fachada. Com três compartimentos por fogo e uma cozinha (excluindo, despensa retrete e casa de banho).

Fig. 133 Rua Lopes nº91 Projecto de 1934 Edifício “gaioleiro” A. Lote 240m2 AB 160m2 9,5x17,25

Conforme o RGCU (1930) “…nos edifícios destinados à habitação, 2/3, pelo menos, dos compartimentos, não poderão ter superfície inferior a nove metros quadrados, não se contando, para tal efeito, despensa, retrete, e casas de banho.” As cozinhas deverão ter a superfície mínima de: Oito metros quadrados na Zona 1; seis metros quadrados na Zona 2 e 3; Quatro metros quadrados nas casas económicas. A largura mínima dos corredores principais será: um metro e vinte centímetros na Zona 1; um metro para a Zona 2 e 3.28

28

Conforme Artº121 do Regulamento Geral da Edificação Urbana para a Cidade de Lisboa, 1930 90


4.4

CARACTERIZAÇÃO

FÍSICO/

ESPACIAL

-

EDIFÍCIOS

MODERNISTAS

CONSTRUÍDOS ENTRE 1930 E 1940, FASE MODERNISMO RADICAL A partir da análise do objecto de estudo – Edifícios de estilo Modernista radical, entre 1930 e 1940 - e análise da legislação em vigor neste período, podemos definir tipologias para o tipo de Lote, Edifício e para o tipo de fogo. 4.4.1

O LOTE

INSERÇÃO URBANA A inserção urbana destes edifícios, embora sujeita aos talhões que restam nos quarteirões, vêm colmatar os vazios urbanos na cidade, chegando mesmo a urbanizar ruas inteiras e zonas fora dos limites da zona consolidada, nas zonas de expansão. Ocupação segundo o lote tradicional, o que gera a continuação da mesma ocupação do espaço interior que era utilizada anteriormente: 

Adaptação à geometria do lote, por vezes muito irregular, tanto em superfície como em altimetria. Esta adaptação gera por vezes formas involuntárias.

Mantém-se inalterável a mesma relação urbana de fachada-rua e traseiras logradouro, ou seja o desenho urbanístico tradicional de rua.

Perpetuação da estrutura espacial convencional dos programas de habitação para rendimento.

Estes edifícios têm um carácter multifuncional, com introdução de comércio ao nível do piso térreo e habitação nos restantes pisos, situação que pontualmente acontecia na fase anterior.

LOCALIZAÇÃO DO LOTE A localização do lote é em quarteirão respondendo às premissas anteriormente referidas sem alterações significativas. A ocupação faz-se encostando a frente do edifício à rua, libertando as traseiras para o logradouro.

91


Fig. 134 Implantação do edifício nº50 da

Fig. 135 Implantação do edifício nº20 da Rua Fialho de

Rua Sampaio e Pina.

Almeida.

CONFIGURAÇÃO DA PLANTA O processo de limitação do uso do saguão veio alterar radicalmente a configuração do volume construído e o desenho das traseiras, já que a ocupação em profundidade continuava a ser necessária para as grandes áreas que as habitações caras exigiam. Nasceu então o "rabo de bacalhau", designação da gíria profissional para os corpos salientes que o novo regulamento preconizava, enquanto nos bairros mais modestos a exiguidade das áreas dos fogos dispensava qualquer artifício do género. Neste sentido o edifício de correnteza tem uma configuração rectangular (com ou sem saguão dependendo da sua área) ou em rabo de bacalhau29 (ex. Rua Artilharia Um, 48, conjunto de 8 edifícios). Os edifícios de gaveto não sofrem alterações face à tipologia anterior com uma implantação em L, em V, em U. 4.4.2

O EDIFÍCIO

ALTURA DA FACHADA/ Nº DE PISOS Nestes edifícios verifica-se a tendência para crescer em altura, dentro dos limites do lote, com o objectivo de aumentar o rendimento da área disponível. Aumento do número de pisos para 6 (5 andares) através de pisos recuados, com aproveitamento de sótão e aumento da cave para habitação de porteira. A altura máxima definida no RGCU (1930) de 21m mantém-se, visto o piso acrescentado ser recuado e a altura ser medida entre o pavimento do passeio e o topo da platibanda.

29

A tipologia "rabo de bacalhau" é definida por uma planta simétrica constituída pela sequência de duas

formas quadrangulares apresentando menor área a que se encontra voltada para o logradouro.

92


NÚMERO DE FOGOS POR PISO Da relação entre frente do lote e a tipologia de distribuição distingue-se as seguintes tipologias: 

1 fogo por piso quando o lote é de correnteza com largura inferior a 16m;

2 fogos por piso, distribuição tradicional esquerdo-direito quando a largura do lote é superior a 16m.

SAGUÃO A nova regulamentação pretende limitar a opção do saguão como solução corrente. No entanto, dada a profundidade dos lotes ainda é utilizado (figura 136, 137).

Fig. 136; Fig. 137; Exemplos de saguões. (fotos do autor)

INVÓLUCRO CONSTRUÍDO A introdução de novas técnicas construtivas não acompanhou desde logo o invólucro construído. Daí que, muitas vezes, só a fachada é que era moderna, demonstrando a adopção de um espírito de «fachadismo», resultante de um entendimento parcial – a forma – do que constitui uma proposta global. Exemplo claro desta tendência é o edifício nº 25 da Rua Ressano Garcia cuja fachada proposta inicialmente, ainda com desenho típico ao estilo Art Déco, foi rejeitada pela CML, nitidamente por uma questão de moda. O novo projecto proposto, da autoria do Arquitecto Cassiano Branco, apresentava um desenho de fachada mais inovador, mas sem qualquer alteração da organização espacial interior, foi aprovado e construído em 1935 (figura 138).

93


Fig. 138 Edificio nº 25 da Avenida Ressano Garcia, 1919-1935. (Lisboa, Obra nº48647)

Verifica-se a continuação da oposição formal entre a fachada principal e o tardoz, com evolução para uma solução de melhor integração das escadas de serviço e patins no desenho do conjunto. A introdução de novos sistemas construtivos, como o betão armado, vai trazer alterações ao involucro do edifício: 

Nova composição das fachadas mais volumétrica;

Aumento do número de varandas, com áreas maiores, na fachada principal;

Introdução de um novo sistema de cobertura, plana ou em terraço, a par da cobertura inclinada.

Escadas de serviço em betão armado, ou dentro de invólucro paralelepipédico.

Através do levantamento na cidade30 e com base nos textos do Arq.º José Manuel Fernandes Para estudo da arquitectura modernista em Portugal - foi possível identificar e classificar estes edifícios por tipos de fachada: Tipo A Com tratamento de fachadas baseado em elementos volumétricos contínuos (varandas salientes do plano da fachada que ligam a volumes paralelepipédicos salientes, criando um ritmo baseado na alternância de cheios e vazios (fig. 139, 140). Ausência de decoração dada a riqueza plástica do conjunto. Exemplo desta tipologia é a extensa frente construída nos anos 30 na Avenida João XXI

30

Conforme Capitulo III 94


Tipo B Com uma marcação das linhas de força verticais e horizontais na fachada, estes edificios eram construídos sobre principios tradicionais de simetria e norma (feita principalmente através de volumes rebocados, fenestrações continuas), despojado de elementos decorativos (fig.141). Nesta tipologia mais radicalizada insere-se exemplares unicos propostos pelo arquitecto Cassiano Branco com a particularidade de uma pormenorização diferenciadora.

Fig. 139 Edifício nº40 Rua Oscra Monteiro Torres. (foto e esquema do autor)

Fig. 140 Edifício nº14 Rua de Macau. (foto e esquema do autor)

95


Fig. 141 Edifício nº 27 Avenida Defensor de Chaves. (foto e esquema do autor)

Tipo C Caracterizado pelo preenchimento da superficie da fachada com volumes pontuais, habitualmente varandas (fig.142, 143). Tipo D Marcação da caixa de escadas na fachada (fig.144). Tipo E Com tratamento decorativo linear, definindo linhas horizontais paralelas (fig.145). Tipos F Aqueles que estão entre fases estilísticas diferentes: 

Formas de Art Déco enquadradas por uma volumetria geral modernista radical;

Fachada de carácter monumentalista e pesado, conseguido através de varandas continuas salientes,

marcada verticalmente por colunas cilindricas adossadas ou

ligeiramente salientes.

96


Fig. 142 Edifício nº179 da Rua do Salitre. (foto e esquema do autor)

Fig. 143 Edifício nº 9 Rua Nova de São Mamede. (foto e esquema do autor)

97


Fig. 144 Edifício nº8 Rua Sousa Viterbo. (foto e esquema do autor)

Fig. 145 Edifício nº 3 Rua Eiffel. (foto e esquema do autor) 4.4.3

O FOGO

FUNCIONALIDADE ESPACIAL A ocupação segundo o lote tradicional, gera a continuação da mesma ocupação do espaço interior que era utilizada anteriormente: 

fogos por piso, distribuição esquerdo-direito;

Configuração em planta aprofundada;

Uso de saguão;

Generalização do uso de elevadores, construídos na bomba de escada. 98


Generalização da introdução de habitação para a porteira “Os prédios de rendimento com mais de seis inquilinos e mais de seis compartimentos por habitação, situados na 1ª e 2ª Zonas de construção, deverão dispor de uma habitação destinada a porteiro, situada, quando possível, próximo da porta da entrada….” (RGCU, 1930) Quanto à funcionalidade espacial destes edifícios, é possível distinguir cinco tipologias: Tipo 1 Edifícios localizados em Zona 1 de construção, de frentes largas e grande profundidade de lote. Habitação com 300m2 de área bruta recurso a pátio interior.

Fig. 146 Rua Sampaio e Pinaº50 e 54 Proj. de 1936 AB 600m2 18,80X33,30

Tipo 2 e 3 Semelhantes às tipologias 2 e 3 descritas no período anterior.

99


Fig. 147 Avenida Ressano Garcia nº5

Fig. 148 Rua Nova de São Mamede nº74

Proj. de 1934

Proj. de 1936

A.Lote 245m2

A.Lote 530m2

AB 210m2

AB 360m2

9,90x20,55

16,80X17,10

Tipo 4 Edifícios de gaveto em L ou em V , localizados em Zona 1, com áreas generosas que conferem alguma liberdade na organização dos espaços, contabiliza mais de sete compartimentos por fogo, excluindo cozinha, despensas, retrete e casa de banho.

Fig. 149 Rua Rodrigo da Fonseca nº192

Fig. 150 Rua Marquês Subserra nº17

Proj. de 1936

Proj. de 1939

A.Lote 445m2

AB 270m2

AB 385m2

22,80x19,30

29,50x15,25

100


Tipo 5 Tipologia encontrada para dotar o interior das habitações de luz e ventilação natural evitando o saguão, conhecida por “rabo-de-bacalhau”. Nestes casos é frequente encontrar a escada exterior inserida na volumetria do edifício.

Fig. 151 Rua Artilharia Um, 48 Proj. de 1938 AB 285m2 17,15x21,80

101


5

PATOLOGIA DOS EDIFICIOS MODERNISTAS

5.1

CARACTERIZAÇÃO DO ESTADO DE DEGRADAÇÃO DOS EDIFÍCIOS

Salvo os edifícios que sofreram obras de conservação e reabilitação, o conjunto edificado objecto de estudo apresenta diversas patologias construtivas. Para análise e caracterização do estado de degradação dos edifícios Modernistas, serviu de base uma amostra de 12 edifícios habitacionais (tabela 2). A recolha de dados sobre estes edifícios foi possível a partir de visitas aos edifícios que permitiu através de registos, peças desenhadas e fotografias gerais e das anomalias caracterizar as principais patologias que afectam os elementos construtivos que constituem os edifícios. Tabela 2 Identificação dos 12 edifícios em estudo TIPOLOGIA

MISTO

1ª FASE DO B.A.

5.1.1

LOCALIZAÇÃO

ZONA

ANO DE PROJECTO/

(CAPITÚLO 3)

CONSTRUÇÃO

Rua Rodrigo da Fonseca, 131

1

1935/1936

Rua Alexandre Braga, 4/6

2

1932/1933

Avenida da Republica, 191

2

1931/1932

Avenida Elias Garcia, 63 a 67A

2

1929/1931

Rua Eduardo Brasão,2

4

1934/1935

Rua Damasceno Monteiro, 21d

4

1936/1937

Rua Lopes, 91

4

1934/1936

Rua Artilharia Um, 47/48

1

1938/1939

Rua Rodrigo da Fonseca, 192

1

1936/1937

Rua Rodrigo da Fonseca, 204

1

Rua Nova de São Mamede, 74

1

1936/1937

Rua Alexandre Braga, 9

2

1937/1938

METODOLOGIA

Os dados recolhidos referentes às anomalias identificadas e à análise preconizada estruturam-se em função do conceito de Elemento Fonte de Manutenção (EFM), ou elementos construtivos que podem desenvolver anomalias, dando origem a trabalhos de reabilitação ou manutenção. A listagem de EFM utilizada para estruturação da análise (apresentada na tabela 3, em anexo), foi a lista adoptada na dissertação de mestrado, “Caracterização construtiva e do estado de degradação das escolas do ensino secundário, caso de estudo: Escolas Industriais e Comerciais” (Pereira, 2012). A lista referida, desenquadrada do tema em estudo, sofreu adaptações com adição de alguns EFM que não estavam previstos. 102


Nas visitas efectuadas, as anomalias referenciadas também foram adaptadas da lista original presente na dissertação de mestrado supra mencionada, assim como as suas possíveis causas (apresentadas nas tabela 4 e 5, em anexo). 5.1.2

CRITÉRIOS

Para a execução da análise do estado de conservação dos edifícios em estudo, foram consideradas as tipologias mista e 1ª fase do betão armado, tendo sido excluída a tipologia gaioleiro. Este facto deve-se à reduzida representatividade desta tipologia no conjunto. Embora tivessem sido feitas visitas aos edifícios gaioleiros modernistas, localizados em: Avenida Elias Garcia, 69 a 75; Avenida da Republica, 49A-49D; Avenida Almirante Reis, 197 e 197A. Os registos recolhidos apenas estarão integrados no 3º capítulo para análise construtiva dos mesmos. Faz-se então uma análise global ao estado de degradação dos edifícios referidos na tabela 2, baseado na comparação entre os níveis de degradação do invólucro do edifício e do seu interior, na compreensão de como são afetados os elementos fonte de manutenção, comparando a influência que as anomalias principais têm sobre cada tipologia construtiva.

103


5.2

LOCALIZAÇÃO RELATIVA DAS PRINCIPAIS ANOMALIAS NO EDIFÍCIO

As anomalias registadas dividem-se, de forma diferenciada, no invólucro do edifício e no seu interior, quer na tipologia mista, ou na 1º fase do betão armado, conforme as figuras 152 e 153. Nos edifícios de tipologia mista é possível concluir que o interior do edifício apresenta maior percentagem de anomalias (65%) do que o invólucro exterior (35%), contrariamente ao verificado nos edifícios da 1ª fase do betão armado com maior incidência de anomalias no invólucro exterior (60%) do que no interior (40%).

30%

35% 48%

60% 10% 17%

EDIFICIO - ENVOLVENTE

EDIFICIO - ENVOLVENTE

ESPAÇOS COMUNS

ESPAÇOS COMUNS

FOGO

FOGO

Fig. 152 Anomalias registadas no interior e invólucro

Fig. 153 Anomalias registadas no interior e invólucro

dos edifícios de tipologia mista.

dos edifícios da 1ª fase do betão armado.

5.2.1

ENVOLVENTE CONSTRUÍDA

As figuras 154 e 155 ilustram a distribuição das anomalias do invólucro dos edifícios pelos EFM, em cada tipologia estrutural; Mista e 1ª fase de batão armado. Conforme a primeira figura, os grupos de EFM com maior número de ocorrências coincidem nos dois tipos de edifícios, são os revestimentos de paramentos com 25% de incidência na tipologia mista e 52% nos edifícios da 1ª fase do betão armado. Seguindo-se, nos edifícios tipo misto, as estruturas metálicas (18%), revestimentos de tectos (15%), elementos em betão e pinturas/ marcações/ acabamentos (8%),cantarias e serralharias (7%), revestimentos de coberturas inclinadas (5%), revestimentos de piso, coberturas em terraço e carpintarias com 2%, instalações de canalização e equipamentos (1%). Quanto aos edifícios da 1ª fase do betão armado no seguimento dos revestimentos de paramentos vêm os elementos em betão (15%), revestimentos de piso, revestimento de tectos, revestimentos de coberturas inclinadas e serralharias, equiparados com 6% de ocorrências registadas, as estruturas metálicas, carpintarias e pinturas/ marcações e acabamentos registam cada uma 3%. 104


2%

2% 1%

2%

3%

3%

3%

5% 25%

6%

7%

6%

7%

6% 52%

8%

6% 18%

8%

15% 15%

Revestimentos de paramentos

Estruturas metálias

Revestimentos de tectos

Elementos em betão

Pinturas/ marcações/ acabamentos

Cantarias

Serralharias

Revestimentos de coberturas inclinadas

Revestimentos de piso

Cobertura em terraço

Carpintarias

Instalações de canalização e equipamentos

Revestimentos de paramentos

Elementos em betão

Revestimentos de piso

Revestimentos de tectos

Revestimentos de coberturas inclinadas

Serralharias

Estruturas metálias

Carpintarias

Pinturas/ marcações/ acabamentos

Fig. 154 Principais grupos de EFM afectados no invólucro do edifício do tipo misto.

Fig. 155 Principais grupos de EFM afectados no invólucro do edifício do tipo 1ª fase de betão armado.

Quanto ao tipo de anomalias encontradas por EFM, no invólucro dos edifícios de cada tipologia, estão representadas nas figuras 156 e 157. Assim na tipologia mista destaca-se a corrosão (35%), descasque ou escamação (14%), colonização/ ataque biológico (13%), sujidade uniforme (10%), descoloração ou manchas (8%), elementos em falta (6%), sem funcionamento (3%), empolamento, fissuração, fractura de elementos, elemento solto e vegetação parasitária (2%). Na tipologia da 1ª fase do betão armado 20% são colonização biológica, 18% descasque ou escamação, 17% sujidade uniforme, 12% descoloração ou manchas, 9% empolamento e corrosão, 6% fissuração mapeada, 3% fissuração orientada, sujidade diferencial e eflorescências.

105


2%

2%

2% 2% 2%

3%

1%

3%

3%

3%

20%

6% 6% 35%

9% 8%

9%

17% 10%

12% 14%

13%

18%

Corrosão

Descasque ou escamação

Colonização / ataque biológico

Sujidade uniforme

Colonização / ataque biológico

Descasque ou escamação

Descoloração ou mancha

Elemento(s) em falta

Sujidade uniforme

Descoloração ou mancha

Sem funcionamento

Empolamento

Empolamento

Corrosão

Fissuração mapeada

Fissuração orientada

Fissuração mapeada

Fissuração orientada

Fractura / Elemento(s) partido(s)

Elemento(s) solto(s)

Sujidade diferencial

Eflorescências

Vegetação parasitária

Fig. 156 Diferentes anomalias registadas no

Fig. 157 Diferentes anomalias registadas no

invólucro do edifício do tipo misto

invólucro do edifício do tipo 1ª fase do betão armado

Quando identificadas as causas, verificamos que as anomalias registadas nos edifícios de tipologia mista, conforme ilustração 158 e 159, têm origem na falta de manutenção (C7b 26%), acabamento/ protecção inexistente ou deficiente (C4m 20%), exposição ao vento, chuva e poluição (C2b 12%), deficiente execução (C4h 7%), humidade infiltrada (C2d 7%), deficiente recobrimento (C1a 5%), efeitos Termo higrométricos (C2a 4%), reduzida resistência do reboco de argamassa de cal e areia (C4t 4%), deformação excessiva dos elementos estruturais (C1d 3%), corrosão por acção química (C2h 3%), perda de estanqueidade a agentes agressivos (C3c 3%), sobrecarga excessiva (C1e 1%), envelhecimento natural (C3a 1%), forma arquitectónica de elementos exteriores (C4c 1%), escorrimento de água associado a deficiências de drenagem e/ou ineficácia de pingadeiras (C4d 1%), falta de estanquidade a agentes agressivos exteriores (C4r 1%), dejectos de animais (C5a 1%). Quanto à tipologia da 1ª fase do betão armado, destacam-se as anomalias em EFM por exposição ao vento, chuva e poluição (C2b 24%), humidade infiltrada (C2d 20%), falta de manutenção (C7b 18%), escorrimento de água associado a deficiências de drenagem e/ou ineficácia de pingadeiras (C4d 7%), acabamento/protecção inexistente ou deficiente (C4m 7%), efeitos Termo higrométricos (C2a 4%), forma arquitectónica de elementos exteriores (C4c 4%), Retração das argamassas constituintes do reboco de argamassa de cimento e areia (C4w 4%), juntas de dilatação inexistentes ou deficientes (C1b 2%), desligamento (C1h 2%), eflorescências (C2f 2%), deficiente 106


execução (C4h 2%), insuficiência de isolamento térmico (Pontes térmicas) (C4s 2%), reduzida resistência do reboco de argamassa de cal e areia (C4t 2%). 3%

1%1%1% 1%1%1% 2%

3%

2%

2% 2% 2%

2%

3%

24%

4%

26%

4%

4%

4% 4%

5% 7%

7% 7%

20%

20%

7%

12%

18%

C7b

C4m

C2b

C4h

C2d

C1a

C2a

C4t

C1d

C2h

C3c

C1e

C3a

C4c

C4d

C4r

C5a

C2b

C2d

C7b

C4d

C4m

C2a

C4c

C4w

C1b

C1h

C2f

C4h

C4s

C4t

Fig. 158 Diferentes causas das anomalias registadas

Fig. 159 Diferentes causas das anomalias registadas

no invólucro do edifício do tipo misto

no invólucro do edifício do tipo 1ª fase do betão armado

5.2.2

INTERIOR DO EDIFÍCIO

De acordo com os dados das figuras 160 e 161, no interior dos edifícios repete-se a mais elevada incidência de anomalias no revestimento de paramentos com 32% nos edifícios de tipologia mista e 50% nos edifícios da 1ª fase do betão armado. Prosseguindo a análise da tipologia mista, regista-se nos revestimentos de tectos 24%, elementos em betão 10%, estruturas metálicas 10%, pinturas/ marcações/ acabamentos 7%, cantarias 6%, revestimentos de coberturas inclinadas 3%, serralharias 3%, instalações de canalização e equipamentos 3%, revestimento de escadas 1%, vidros e espelhos 1%. Da análise dos dados referentes à 1ª fase do betão armado, seguidos dos revestimentos de paramentos, regista-se 25% em pinturas/ marcações/ acabamentos, 17% em revestimentos de piso, 8% em serralharias. Quanto à frequência de anomalias no interior dos edifícios do tipo misto, destaca-se o descasque e escamação 30%, colonização / ataque biológico 17%, empolamento 10%, fissuração orientada 10%, fissuração mapeada 8%, corrosão 7%, eflorescências 5%, descoloração ou manchas 3%, fractura / elemento(s) partido(s) 3%, elemento(s) em falta 3%, lacuna em profundidade 2%, graffiti 2%.

107


As anomalias registadas no interior dos edifícios da 1ª fase do betão armado distribuem-se de acordo com os dados da figura 163, com maior ocorrência de colonização / ataque biológico 28%, descasque e escamação 18%, empolamento 18%, descoloração ou manchas 18%, corrosão 9%, elemento(s) solto(s) 9%.

3%

1% 1% 8%

3% 3%

7%

32% 17%

6%

50%

10%

25%

10% 24%

Revestimentos de paramentos

Revestimentos de tectos

Revestimentos de paramentos

Pinturas/ marcações/ acabamentos

Elementos em betão

Estruturas metálias

Revestimentos de piso

Serralharias

Pinturas/ marcações/ acabamentos

Cantarias

Revestimentos de coberturas inclinadas

Serralharias

Instalações de canalização e equipamentos

Revestimento de escadas

Vidros e espelhos

Fig. 160 Principais grupos de EFM afectados no

Fig. 161 Principais grupos de EFM afectados no

interior do edifício do tipo misto

interior do edifício do tipo 1ª fase de betão armado.

Resume-se na figura 164 e 165, respectivamente, as principais causas das anomalias em EFM nas duas tipologias em estudo, no interior dos edifícios. As anomalias atrás referidas, estão directamente relacionadas com a presença de água nos paramentos e estrutura do edifício. Na tipologia mista, destaca-se a humidade infiltrada (C2d 20%), deformação excessiva dos elementos estruturais (C1d 9%), entrada de água na cobertura (C6d 9%),efeitos Termo higrométricos (C2a 7%), humidade infiltrada por ascensão de água por capilaridade (C4v 7%), deficiente recobrimento (C1a 6%), deficiente execução (C4h 6%), rotura na canalização (C6b 6%), falta de manutenção (C7b 5%), criptoflurescências (C2g 4%), incêndio (C6e 4%), desligamento (C1h 2%), corrosão por acção quimica (C2h 2%), escorrimento de água associado a deficiências de drenagem e/ou ineficácia de pingadeiras (C4d 2%), acabamento/protecção inexistente ou deficiente (C4m 2%), mau manuseamento (C7a 2%), sobrecarga excessiva (C1e 1%), assentamentos diferenciais (C1f 1%), falta de estanquidade a agentes agressivos exteriores (C4r 1%), pintura pouco permeável ao vapor de água (C4u 1%), ataque de insectos xilófagos (C5b 1%).

108


2% 2%

3%

9%

3% 3% 9%

28%

30%

5%

7%

18%

8%

18%

10%

17% 18%

10%

Descasque ou escamação

Colonização / ataque biológico

Colonização / ataque biológico

Descasque ou escamação

Descoloração ou mancha Elemento(s) solto(s)

Empolamento

Fissuração orientada

Empolamento

Fissuração mapeada

Corrosão

Corrosão

Eflorescências

Descoloração ou mancha

Fractura / Elemento(s) partido(s)

Elemento(s) em falta

Lacuna em profundidade

Graffitti

Fig. 162 Diferentes anomalias registadas no interior

Fig. 163 Diferentes anomalias registadas no interior

do edifício do tipo misto

do edifício do tipo 1ª fase do betão armado

Nos edifícios da 1ª fase do betão armado, a humidade infiltrada (C2d 33%) mantem-se como causador do maior número de anomalias, seguido de humidade infiltrada por ascensão de água por capilaridade (C4v 20%), efeitos Termo higrométricos (C2a 13%), criptoflurescências (C2g 7%), escorrimento de água associado a deficiências de drenagem e/ou ineficácia de pingadeiras (C4d 7%), acabamento/ protecção inexistente ou deficiente (C4m 7%), rotura na canalização (C6b 7%), falta de manutenção (C7b 7%). 2%

7%

1%1%1% 1%1%

2%

7%

20%

2% 2% 7%

2%

33%

4% 4%

7%

9% 5%

6%

6% 9% 6% 13%

7%

6%

20%

7%

C2d

C1d

C6d

C2a

C4v

C1a

C4h

C6b

C7b

C2g

C1h

C2h

C4d

C4m

C7a

C1e

C1f

C4r

C4u

C5b

C6e C2d

C4v

C2a

C2g

C4d

C4m

C6b

C7b

Fig. 164 Diferentes causas das anomalias registadas

Fig. 165 Diferentes causas das anomalias registadas

no interior dos edifícios do tipo misto.

no interior dos edifícios da 1ª fase do betão armado.

109


5.3

DEGRADAÇÃO DOS PRINCIPAIS ELEMENTOS FONTE DE MANUTENÇÃO

5.3.1

ANÁLISE DE RESULTADOS

As 122 anomalias identificadas nos 7 edifícios da tipologia mista, encontram-se em 14 grupos de EFM (elemento fonte de manutenção). Já nos 5 edifícios da 1ª fase de betão armado registaramse 45 anomalias em 9 grupos de EFM (elemento fonte de manutenção). As figuras 166 e 167 comparam a frequência relativa de anomalias por edifico nas tipologias em análise, conclui-se que a tipologia mista é mais afectada e com incidência de mais tipos de anomalias distintos.

3,5

3

2,5

2

1,5 1ª Fase do Betão armado 1

Misto

0,5

0

Fig. 166 Frequência de anomalias registadas no invólucro do edifício.

A corrosão, enquanto anomalia registada no exterior, tem particular incidência na tipologia mista quando comparada com a 1ª fase do betão, a corrosão surge também como precedência de um conjunto representativo de anomalias identificadas como é o caso de elementos partidos, em falta ou sem funcionamento. Este fenómeno justifica-se pelo acabamento/protecção inexistente ou deficiente e falta de manutenção generalizada. No panorama geral, os edifícios Modernistas apresentam descasque e escamação, descoloração, colonização biológica e sujidade no involucro exterior, devido a humidade infiltrada e exposição à acção dos agentes climáticos, figura 167, enquadradas nas causas ambientais.

110


3

2,5

2

1,5

1ª Fase do Betão armado

1

Misto

0,5

0

Fig. 167 Frequência de anomalias registadas no interior do edifício.

Os edifícios da 1ª fase do betão armado não registam ocorrência de eflorescências e fissuração no interior, apenas com alguma representatividade em colonização biológica, empolamento e descoloração ou manchas, possivelmente associado à utilização de rebocos com argamassa de cimento e areia com menos ligante. No interior destaca-se o descasque ou escamação como anomalia de grande incidência nos edifícios mistos, no entanto sem expressão considerável na 1ª fase do betão armado. Esta situação deve-se á entrada de água acidental na cobertura assumindo-se como precedência de humidades infiltradas, deformação excessiva dos elementos estruturais, provocando fissuração, empolamentos e colonização biológica. Resta mencionar a humidade infiltrada por ascensão de água por capilaridade como causa representativa, associada a fenómenos como descoloração ou 7

manchas, empolamentos e eflorescências nos pisos inferiores. 6

5

4 1º Fase do betão armado Mistos

3

2

1

C1a C1b C1d C1e C1h C2a C2b C2d C2f C2h C3a C3c C4c C4d C4g C4h C4m C4r C4s C4t C4w C5a C7b

0

Fig. 168 Frequência das causas de anomalias registadas no invólucro do edifício.

111


3

2,5

2

1º Fase do betão armado

1,5

Mistos

1

0,5

0 C1a

C1d

C1e

C1f

C1h

C2a

C2d

C2g

C2h

C4d

C4h

C4m

C4r

C4u

C4v

C5b

C6b

C6d

C6e

C7a

C7b

C7C

Fig. 169 Frequência das causas de anomalias registadas no interior do edifício.

A partir da análise de resultados, apresentados nas figuras 170 e 171, identificamos diferenças consideráveis nos grupos de EFM mais afectados entre tipologias, esta situação está associada à evolução dos métodos construtivos e tipologia físico/ espacial dos edifícios, As estruturas metálicas tão afetadas nos edifícios mistos, têm pouca expressão no conjunto dos edifícios da 1ª fase de betão, tal pode ser explicado pela reduzida aplicação destes elementos, nesta última tipologia. O mesmo se passa nas cantarias que vão desaparecendo do universo construtivo dos edifícios na 1ª fase do betão armado.

4 3,5 3 2,5 2 1,5

1 0,5

1º Fase do betão armado Mistos

0

Fig. 170 Frequência de anomalias encontradas em cada grupo EFM no invólucro do edifício.

112


No interior dos edifícios também se registam diferenças acentuadas entre tipologias, figura 171. Nas ocorrências de anomalias em revestimentos de tectos, a tipologia mista apresenta valores muito elevados associados a alterações em elementos de madeira por acção da água ou em lajes de betão armado com deficiente execução. Estes fenómenos não foram encontrados nos edifícios da 1ª fase do betão armado, explicação mais uma vez associada à evolução tecnológica dos métodos construtivos.

2,5

2

1,5

1

0,5

1º Fase do betão armado Mistos

0

Fig. 171 Frequência de anomalias encontradas em cada grupo EFM no interior do edifício.

5.3.2 5.3.2.1

DESCRIÇÃO E ANÁLISE DAS PRINCIPAIS ANOMALIAS E SUAS CAUSAS POR EFM TIPOLOGIA MISTA

ELEMENTOS EM BETÃO Lajes e vigas de betão armado (8%) com descasque no recobrimento de armaduras em áreas limitadas, com armadura à vista e com corrosão em grandes áreas (fig. 172). Estas anomalias estão directamente relacionadas com o recobrimento insuficiente das armaduras originando a sua corrosão. Este fenómeno também esta relacionado com a composição do betão e a sua porosidade.

113


Fig. 172 Descasque no recobrimento de armaduras

Fig. 173 Fissuração no encontro da viga com a

da laje, com corrosão associada no interior.

estrutura da marquise.

Em casos pontuais foi registada a ocorrência de fissuração cuja localização, orientação e evolução indiciam problemas estruturais de desligamento de elementos constituintes do paramento e estrutura (fig.173). ESTRUTURAS METÁLICAS A corrosão de elementos metálicos estruturais (18%) ocorre principalmente na parte posterior destes edifícios, nas varandas técnicas, marquises e escadas, figs. 174, 175, 176, embora também se possa verificar noutros elementos ou partes do edifício. Esta anomalia tem como principal causa a inexistência de qualquer tipo de acabamento/ protecção que impeça a oxidação dos elementos metálicos. Esta situação está associada à falta de conservação e manutenção do edifício em geral, em que a estabilidade das partes do edifício com estrutura metálica é afetada, com corrosão generalizada indiciando risco de colapso total ou parcial nas traseiras de alguns edifícios, figs. 177 e 178. O principal problema deste tipo de anomalias é o de pôr directamente em risco a segurança dos utilizadores.

Fig. 174, Fig. 175, Fig. 176 Corrosão de estruturas metálicas. (fotos do autor)

114


Fig. 177, Fig. 178 Colapso da estrutura metálica da marquise. (Lisboa, Obra nº21100 )

REVESTIMENTOS DE PARAMENTOS Os revestimentos de reboco em paramentos no invólucro do edifício estão sujeitos à acção dos agentes climatéricos, especialmente a acção abrasiva do vento, transportando poeiras e areias que provocam o seu desgaste de forma contínua, bem como as variações de temperatura pelos movimentos estruturais que impõem, na alternância calor-frio. O descasque ou escamação nos revestimentos exteriores (14%) é muito comum nestes edifícios, e deve – se principalmente à acção da água, provocando a desagregação das paredes quando expostas ao vento e a chuva. As humidades infiltradas quando encontram fendas e vazios no reboco, criam uma rede de percursos preferenciais no interior dos elementos, normalmente através de juntas de argamassas entre as pedras ou os tijolos. Neste percurso que faz no interior da parede, transporta sais, que, depois de dissolvidos, cristalizam com a evaporação da água, atingindo a superfície da parede (Pinho, 2000). A cristalização destes sais provoca, sucessivamente, o entumecimento dos rebocos, o seu empolamento (10%) e fissuração (8%). Esta desagregação pode estar relacionada à baixa resistência mecânica dos rebocos com argamassa de cal e areia, associado a pinturas pouco permeáveis ao vapor de água.

115


Fig. 179, Fig. 180 Descasque e escamação do revestimento dos paramentos exteriores.

Este fenómeno (descasque ou escamação) também ocorre com frequência nas paredes interiores (30%), resultante da ascensão de água por capilaridade. Os sais transportados pela água, provenientes do solo ou dos elementos que constituem a alvenaria alteram a estrutura da parede, deixando esta mais rica em sais dissolvidos. Após evaporação, os sais depositados na superfície dão origens às eflorescências (3%), ou criptoflorescências quando depositados entre o reboco e o tosco da parede (Pinho, 2000). A repetição deste processo nos sucessivos ciclos de secagem e molhagem conduz ao empolamento e descasque do reboco existente como se pode ver nas figs. 178 e 179.

Fig. 181 Descasque e escamação do revestimento

Fig. 182 Descasque e escamação do revestimento

da parede de alvenaria de tijolo.

da parede de alvenaria de pedra.

A ocorrência de diversos tipos de humidade nos revestimentos de paramentos, combinado com a falta de ventilação e higroscopicidade inadequada dos revestimentos interiores (capacidade de absorver ou perder água conforme as condições ambientais, são factores favoráveis à ocorrência 116


de colonização biológica (17%). Esta susceptibilidade também se manifesta nos elementos de madeira, quando a humidade relativa é elevada (teor de água> 20%) em conjunto com acabamento/protecção inexistente ou deficiente e falta de manutenção. Outra patologia recorrente nestes edifícios é a alteração do aspecto do edifício, devido a sujidade acumulada nas superfícies, resultante da poeira transportada pelo vento e da poluição atmosférica em geral. REVESTIMENTOS DE TECTOS

O descasque do revestimento de tectos (24% conforme, figura 183), está associado ao humedecimento e aumento de secção dos elementos estruturais de madeira provocado por contacto acidental, regular, entre a água da chuva e a madeira. Fenómenos relacionados com a presença de água causada pela rotura de tubagens de águas e esgotos também têm expressão com registos de colonização biológica associada efeitos Termo hidrométricos, bem como empolamentos e descasque.

Fig. 183 Descasque e escamação do revestimento

Fig. 184 Rotura na canalização. (foto do autor)

de tectos no último piso. (foto do autor)

117


5.3.2.2

TIPOLOGIA 1ª FASE DO BETÃO ARMADO

ELEMENTOS EM BETÃO Os elementos salientes, projectados da envolvente do edifício apresentam pequenas partes em risco de queda, descasque e escamação, empoladas, com ataque biológico, em desagregação. Outra anomalia que afecta pontualmente os elementos de betão é o aparecimento de fissuração orientada (3%) são causas comuns as juntas de dilatação inexistentes, ou deficientes.

REVESTIMENTOS DE PARAMENTOS A colonização biológica e vegetação parasitária nas superfícies dos rebocos exteriores como se referiu no ponto 5.3.2.1, resulta na formação de bio filmes ou líquenes, capazes de produzir compostos orgânicos a partir de substâncias minerais, bastando-lhes uma fonte de energia (como a luz) + uma fonte de carbono inorgânico (como o dióxido de carbono) + água. Este processo traduz-se em manchas coloridas, incrustações e na presença de órgãos vegetativos e reprodutivo DESCASQUE OU ESCAMAÇÃO Revestimentos de paredes com sinais de eflorescências ou vestígios de ataque biológico (ex., presença de térmitas e bolores; desenvolvimento de vegetação parasitária como algas, líquenes e musgos) EMPOLAMENTOS DESCOLORAÇÃO OU MANCHAS

118


6

CONCLUSÕES E DESENVOLVIMENTOS FUTUROS

A presente dissertação caracteriza construtiva e espacialmente os edifícios objecto de estudo e analisa o seu estado de degradação. De seguida serão referidas as principais conclusões retiradas. Construtivamente o tempo de transição, entre 1920 e 1935, conhece reduzida actividade construtiva, com influência do estilo Art Déco. É marcado pela publicação do RGCU, diploma que sugere a aplicação do betão armado em pavimentos e exige a sua utilização na cintagem dos edifícios. No período iniciado em 1935, enquadrado no estilo Modernista Radical, o sistema de construção tradicional sofre progressivas alterações. Num primeiro momento verifica-se a substituição do ferro ou aço por betão armado em pilares, vigas, pavimentos húmidos ou varandas de serviço e escadas. Assim como a aplicação do betão armado na execução de corpos salientes e coberturas planas não acessíveis. Verifica-se no entanto que a evolução dos processos construtivos não se reflete nas soluções físico-espaciais adoptadas nos edifícios de habitação, em particular no que se refere à organização espacial do interior. Este facto é evidente nos edifícios construídos nas décadas de 30/40, em que a nova solução construtiva decorrente da aplicação do betão armado não é acompanhada por alterações na organização espacial do interior doméstico. Apesar da introdução do betão armado. na construção dos pavimentos potenciar uma maior liberdade na organização dos espaços no interior da habitação, tal possibilidade não foi significativamente aproveitada. Com efeito, não foi tirado partido da capacidade de aumento do vão estabelecido entre as várias divisões. Mantiveram-se tipologias habitacionais vinculadas ao período anterior. Por outro lado quando é analisado o estado de degradação dos edifícios verifica-se que há maior susceptibilidade dos elementos construtivos na tipologia mista com incidência de mais tipos de anomalias. Com especial destaque para a corrosão enquanto anomalia registada no exterior, associada a elementos metálicos. No panorama geral, os edifícios Modernistas apresentam descasque e escamação, descoloração, colonização biológica e sujidade no involucro exterior, devido a humidade infiltrada e exposição à acção dos agentes climáticos, enquadradas nas causas ambientais. 119


7

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