Perplexidade na universidade: vivências nos cursos de saúde

Page 234

REFLEXÕES

233

flexão sobre os sentidos de seu processo de formação. “Vamos seguindo os passos freneticamente, cambaleando e nos condicionando. Ficamos muito confusos em muitos momentos e nos perdemos de nossos objetivos”. Tal inquietação é indicada metaforicamente por Raphael Guimarães. Revendo seu processo de formação universitária, considera que os estudantes de seu curso “foram tratados feito limões: foram selecionados, colhidos, cortados, espremidos, até ver que suco davam. . .”. E, como relata Edney Vasconcelos, após o idílio altruísta dos primeiros períodos do curso de medicina, com o passar dos anos, parece que nos vamos “aprisionando” na grade curricular, nas provas estritamente teóricas, no pensamento cartesiano de separação do ser humano em partes para se entender o todo, nos diagnósticos, nos exames complementares e nos tratamentos. Desvaloriza-se o doente pela eloqüência da doença e, com isso, todos perdem. Muitas vezes, dominamos tecnicamente toda a informação científica de tal patologia, e isto é preciso, mas não “tocamos” nos pacientes, e ainda reclamamos que eles não aderem aos nossos tratamentos. Para muitos estudantes, notadamente os das classes populares, o ritmo de trabalho desgastante se deve em grande parte às limitações de caráter econômico, pois, como enfatiza Ana Guilhermina, “estudar não é para pobre”, uma vez que “não basta gostar de estudar, é preciso ter dinheiro”. Mas, além disso, todos geralmente são submetidos a ritmos e processos de aprendizagem que supervalorizam a memorização de fórmulas, a competição entre estudantes e profissionais, a sujeição hierárquica, ao mesmo tempo em que o paciente, visto como objeto, é esquecido e desatendido.1 Neste sentido, Lia Frota se pergunta por que, ao realizar seus estágios, 1

Os depoimentos de André Pereira e de Christiane Igarashi manifestam um desabafo em que se evidencia o dilema em que os estudantes se encontram entre, de um lado, a preocupação com o estudo, provas e notas e, de outro, a atenção para com as pessoas dos pacientes com que se relacionam.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.