Perplexidade na universidade: vivências nos cursos de saúde

Page 175

174

VIVÊNCIAS

Lembro, como se fosse hoje, que, para espanto de todas aquelas pessoas, retiramos o Sr. Elias daquele “ninho saudável” e o trouxemos de maca, já ao entardecer do dia, para os procedimentos técnicos necessários. Ele agora estava carregado por médico, nutricionista, atendentes e o levávamos para um tratamento hospitalar digno de um cidadão. Sr. Elias foi internado e precisou urgentemente de transfusão de sangue, pois estava muito anêmico; mas em poucos dias, morreu longe dos seus e do seu sítio. Longe de carinho e cuidados dos vizinhos e familiares. Para que serviu tanto empenho nosso? Que aparatos técnicos e transfusão sanguínea foram mais importantes para justificar um morrer tão frio, distante e impessoal? Falo “se arrependimento matasse”, pois, no mínimo, me matou de vergonha de me ter traído. Agindo por uma prática de saúde “toda equipada” desvalorizava o cuidar humano que os serviços hospitalares, muitas vezes, não proporcionam. Eu era uma professora que desde meus primeiros dias na Universidade defendia que os alunos da área de saúde tivessem, desde o início e nos vários anos da sua formação universitária, um tempo curricular para prática e inserção nos serviços locais (hospitais, maternidades, centros de saúde, creches, escolas, organizações comunitárias) como o ensino ideal e uma melhor forma de praticar e aprender uma teoria mais colada às reais necessidades das pessoas. Eu brigava com os meus colegas professores (mesmo os da área de saúde pública) e os coordenadores de curso, pois eles defendiam que as disciplinas ditas básicas, como anatomia e histologia, fossem dadas nos primeiros anos de curso, seguidas das específicas, para só no final considerarem os alunos aptos aos estágios. Diferentemente dos colegas, desde cedo eu acreditava e presenciava que os alunos no final do curso, já preocupados em formatura e em arranjar emprego, não tinham mais disponibilidade para se capacitarem no sentir, ouvir e serem atentos ao cuidar da pes-


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.