Processo Administrativo Fiscal Litigância Tributária no Contencioso Administrativo ​

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Introdução

PARTE I

Introdução ao Processo Administrativo Fiscal

1. Uma visão processual da atividade administrativa

1.1. A processualização da atividade administrativa

2.2. A teoria geral do processo e o processo administrativo fiscal

2. O Processo administrativo fiscal – Modelo e natureza da atuação administrativa

2.1. O modelo brasileiro de contencioso administrativo fiscal

2.2. A natureza e os limites do julgamento administrativo

2.3. A fase contenciosa do processo administrativo fiscal e a revisão de ofício

2.4. O controle exercido pela Administração sobre seus atos

2.5. As vantagens do processo administrativo fiscal

2.6. As Fontes do Processo Administrativo Fiscal

2.7. O Modelo de Processo do Novo CPC e o PAF

3. Princípios do processo administrativo fiscal

3.1. Princípio do informalismo

3.2. Princípio da verdade material

3.3. Princípio do devido processo legal

3.4. Princípios da ampla defesa e do contraditório

3.5. Outros princípios informadores do PAF

4. Processo administrativo e processo judicial

5. Uma Visão geral do processo de constituição e exigência de créditos tributários federais - Decreto n.o 70.235, de 06/03/1972, e legislação complementar

5.1. O processo atual de determinação e exigência de créditos tributários federais

5.1.1. Fase I - Ação fiscal (não-contenciosa – DRF, IRF, ALF)

5.1.2. Fase II - Julgamento de primeira instância (DRJ)

5.1.3. Fase III - Julgamento de segunda instância (CARF)

5.1.4. Fase IV - Julgamento de instância especial (CSRF)

5.2. A evolução do rito do Decreto n.º 70.235/1972 e a racionalização do processo administrativo fiscal

6. Recursos no processo administrativo fiscal

7. Outras espécies do gênero processo administrativo fiscal

7.1. Processo de reconhecimento de direito creditório (restituição, ressarcimento, reembolso e compensação de tributos federais)

7.1.1. Procedimento Ordinário

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Índice Geral

7.1.2. Procedimento Especial de Ressarcimento

7.1.2.1. Procedimento especial de ressarcimento de créditos do PIS, da Cofins e do IPI (Portaria MF n.º 348/2010)

7.1.2.2. Procedimento especial de ressarcimento de créditos do PIS e da Cofins (Portaria MF n.º 7/2011)

7.1.2.3. Procedimento especial de ressarcimento de créditos do PIS e da Cofins (Portaria MF n.º 348/2014)

7.1.2.4. Processo de ressarcimento em espécie e dedução de ofício do crédito presumido apurado com base em créditos decorrentes de diferenças temporárias oriundos de provisões para créditos de liquidação duvidosa (Instrução Normativa RFB n.º 1.457/2014)

7.2. Processo de consulta

7.2.1. Processo de consulta relativo à interpretação da legislação tributária e aduaneira e à classificação de serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio (Instrução Normativa RFB n.º 1.396/2013)

7.2.2. Processo de consulta sobre classificação fiscal de mercadorias (Instrução Normativa RFB n.o 1.464/2014)

7.2.3. Processo de consulta relativo ao Simples Nacional (Lei Complementar n.o 123, de 14/12/2006)

7.3. Processo de revisão de declarações apresentadas à RFB

7.4. Processo de solicitação de revisão do lançamento previamente à apresentação de impugnação - Revisão das DIRPF e DITR

7.5. Processo de arrolamento de bens e direitos

7.6. Processo de solicitação de propositura de medida cautelar fiscal

7.7. Processo de perdimento de mercadorias, veículos e moeda

7.7.1. Processo de aplicação da pena de perdimento de mercadoria e de veículo 7.7.2. Procedimento simplificado para declaração de abandono de mercadorias de procedência estrangeira

7.7.3. Processo de retenção e de perdimento de veículo transportador de mercadoria sujeita a pena de perdimento 7.7.4. Processo de perdimento de moeda

7.8. Processo de aplicação e de exigência de direitos antidumping e compensatórios

7.9. Processo de determinação e exigência das medidas de salvaguarda

7.10. Processo de determinação e exigência de direitos de natureza comercial

7.11. Processo de vistoria aduaneira

7.12. Processo de suspensão da imunidade e da isenção

7.13. Processo de fiscalização do Simples Nacional

7.14. Processo de exclusão do Simples Nacional

7.15. Processo de liquidação de termo de responsabilidade

7.16. Discussão administrativa da retificação de Documento de Arrecadação de Receitas Federais

7.17. Pedido de restituição de valor pago ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização (Fundaf)

7.18. Processo de reconhecimento do direito à redução de tributo incidente sobre o lucro da exploração na área da SUDENE

7.19. Processo de reconhecimento do direito à redução de tributo incidente sobre o lucro da exploração na área da SUDAM

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7.20. Pedido de revisão de ordem de emissão de incentivos fiscais – PERC

7.21. Processo de aplicação de sanções aos intervenientes nas operações de comércio exterior

8. A prova no processo administrativo fiscal

8.1. A Prova no processo administrativo fiscal e a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil e da Lei n.o 9.784/1999

8.2. Os contornos e o conteúdo da decisão administrativa

8.3. A prova e a lide no processo penal e a possibilidade de inovação em sede de contencioso administrativo

8.4. A Presunção de legitimidade dos atos administrativos e o ônus da prova

8.5. Os sistemas de valoração da prova e as fontes normativas vinculantes

8.6. As provas ilícitas

8.7. Os fatos que independem de prova

8.8. Indício, presunção legal e ficção legal – Distinção:

8.9. Preclusão Probatória X Verdade Material

8.10. Algumas regras sobre provas

9. As nulidades no processo administrativo fiscal

9.1. As mudanças no direito administrativo e o alcance do artigo 59 do Decreto n.o 70.235/1972

9.2. Hipóteses de nulidade

9.3. O locus das nulidades e os vícios mais comuns no PAF

9.4. Extensão da declaração de nulidade

10. Tempestividade, comunicação dos atos processuais e a contagem de prazos no processo administrativo fiscal

10.1 Distinção entre Preclusão, Perempção, Decadência e Prescrição 10.2. As formas de intimação e o momento de aperfeiçoamento das intimações 10.3. A contagem de prazos 10.4. A contagem do prazo no caso de pluralidade de sujeitos passivos

11. As súmulas dos antigos Conselhos de Contribuintes e do atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF

12. Principais atos legais reguladores do PAF

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Introdução

Este trabalho se destina a fornecer uma visão eminentemente prática do contencioso administrativo tributário, a partir daqui chamado de processo administrativo fiscal (PAF). Não é um exercício de rigor acadêmico e de caráter crítico, muito embora questões polêmicas ou objeto de divergências sejam analisadas de modo pontual. O objetivo é abordar o PAF à luz da evolução legal, doutrinária e jurisprudencial, mas sempre com os olhos voltados à atuação de quem opera nesta importante seara processual. É, neste sentido, uma compilação de informações temperada pela experiência do autor no exercício de suas atividades como julgador do contencioso administrativo fiscal federal, de advogado tributarista e de professor.

A razão principal para a produção deste trabalho é eminentemente prática, mas é preciso ressaltar a importância atual de se estudar e conhecer o PAF. É notória a progressiva importância da via administrativa para a solução de litígios envolvendo a Fazenda Nacional, estando hoje vencidas grande parte das desconfianças que sempre cercaram a atuação administrativa contenciosa. O aperfeiçoamento da legislação, a crescente imparcialidade dos julgamentos e a criação de unidades especializadas na solução de litígios tributários, são alguns dos fatores que contribuíram para o evidente incremento da confiança no sistema.

E é difícil imaginar a atuação de tantos quantos se dediquem à litigância tributária, sem um profundo conhecimento desta que é uma das duas importantes vias disponíveis no nosso processo tributário: a do processo administrativo fiscal.

Mas da mesma forma que o sistema ganhou credibilidade, há preocupações em relação à sua capacidade de dar cabo ao tamanho do desafio que lhe é posto: o aumento excessivo tanto dos estoques de processos quanto do tempo de julgamento, podem neutralizar aqueles ganhos, razão pela qual devem existir esforços no sentido do aperfeiçoamento contínuo do sistema. E tal aperfeiçoamento passa, necessariamente, pela ampliação do conhecimento de tantos quantos atuem no sistema ou façam dele seu objeto de estudo. Espera se, assim, que esta trabalho contribua de alguma forma para a difusão deste conhecimento.

Do ponto de vista da estrutura, são inseridos temas destinados a contextualizar o PAF e a fornecer uma visão de conjunto do ambiente jurídico no qual se insere. São abordados a processualização da atividade administrativa e o modelo brasileiro de contencioso administrativo fiscal, a natureza do julgamento administrativo, as fontes e os princípios informadores desta disciplina jurídica, as relações entre o processo administrativo e o processo judicial e as aplicações subsidiárias da Lei n.o 9.784/1999 e do Código de Processo Civil. Também é fornecida uma visão geral do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais, que é o principal dos ritos que compõem o universo do PAF e que está disciplinado nos Decretos n.o 70.235/1972 e n.º 7.574/2011. E são ainda identificados os outros tipos de processos administrativos

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existentes no âmbito tributário federal, com resumos de seus ritos ou indicação de suas fontes legais. Por fim, são também enfocados alguns temas específicos que demandam abordagem individualizada, como tais: as nulidades, os atos de comunicação, as provas e os recursos.

Algumas observações complementares são necessárias.

Primeiro, é preciso ressaltar que optou se neste trabalho por usar a expressão “processo administrativo fiscal”, ao invés das atualmente muito utilizadas “processo administrativo tributário” ou “processo tributário administrativo”, em razão de seu uso tão disseminado. Há um prejuízo em termos de especificidade, mas aqui se rende homenagem à tradição.

Segundo, ao longo do trabalho é utilizada a expressão "contencioso administrativo" para fazer referência à fase do processo administrativo fiscal (em qualquer de suas espécies) em que há litígio estabelecido em razão da insurgência do sujeito passivo quanto a algum ato praticado pela Administração Tributária e seus agentes, demandando, portanto, a atuação dos órgãos julgadores administrativos. Faz se esta observação com o fim de deixar claro que "contencioso administrativo" não tem, aqui, o significado que assume na esfera judicial, onde é sinônimo de litígios levados ao Poder Judiciário que se relacionam com matérias afetas ao Direito Administrativo.

No mais, é desejo do autor que o presente trabalho contribua tanto para a atuação daqueles que militam no processo administrativo fiscal, quanto para aqueles que buscam se familiarizar com esta importante via de tutela dos direitos da Fazenda Nacional e dos cidadãos.

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1.1. A processualização da atividade administrativa

Com o advento da Constituição Federal de 1988, poucas dúvidas remanescem quanto ao fato de que o processo administrativo teve suas feições sensivelmente modificadas. Com efeito, ao dispor, no inciso LV do artigo 5.º da nova Carta Magna, que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”, quis o constituinte, à evidência do que se pode inferir, estender aos atos emanados da Administração Pública, condicionantes que desde há muito já informam as manifestações do Poder Judiciário.

Ao dispositivo citado poderiam ser juntados outros preceitos constitucionais, como tal o insculpido no inciso LIV do artigo 5.º - “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” – e na alínea “a” do inciso XXXIV do mesmo artigo - que trata do direito do cidadão de peticionar junto aos Poderes Públicos “em defesa de direito ou contra ilegalidade ou abuso de poder” -, para fins de que reste ainda mais evidenciada a transformação porque passou o processo administrativo.

Dentro deste quadro, impõe se repensar a clássica formulação da doutrina pátria, que define como característica basilar da atividade administrativa a auto executoriedade de seus atos, para fins de reconhecer que a nova Carta Magna engendra uma verdadeira processualização desta atuação, tornando superada a idéia, vigente por décadas, de que há uma contraposição irredutível entre interesse público e interesse particular.

Nestes termos, espelha a Lei Maior a tendência deste início de século de atenuar a separação entre Estado e sociedade – como conformada no século passado - para dar lugar, usando se as palavras de Odete Medauar, a uma “progressiva aproximação entre Administração e cidadãos da sociedade civil, em que inúmeros grupos sociais colaboram na identificação do interesse público”. 1 Inverte-se a lógica, para fins de definir que os atos administrativos não são irrestritamente voltados à satisfação do interesse da própria Administração, ou mesmo do interesse público unilateralmente por esta formulado.

Uma das conseqüências mais veementes desta inovação constitucional foi a intensificação da produção legislativa voltada à criação de novas vias processuais administrativas, e à reformatação das já existentes. Muito embora seja verdade que nem todas estas superveniências legais tenham representado avanços, é inegável que delas resultou uma ampliação das possibilidades de participação do cidadão nos atos administrativos que abordem seus interesses em face do interesse de outro cidadão, ou de seu interesse diante do da própria Administração. No âmbito do processo administrativo, como gênero, existem hoje inúmeros procedimentos, de variada espécie que, distribuídos ao longo de toda a cadeia burocrática estatal, determinam a atuação concreta do Estado

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Odete Medauar, 1993, p. 32.

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1. Uma visão processual da atividade administrativa

administrador de forma previsível e transparente, sem prescindir da participação dos interessados nesta atuação.

De tal sorte, o cidadão tem hoje não apenas a garantia de acesso ao Poder Judiciário, nos casos em que um ato administrativo já formalizado afronte um direito seu, como também tem a possibilidade de, previamente à formalização deste ato, manifestar se, de modo concreto e producente, quanto ao seu conteúdo junto à Administração. Tal quadro representa uma importante medida de economia processual – pela possibilidade de que os atos permeados de vícios ou arbitrariedades sejam saneados ou extirpados antes de que se constituam formalmente, e não apenas depois, no âmbito do Poder Judiciário , mas, mais do que isso, constitui se em medida de resguardo das garantias individuais – dado que, assim, preserva se o direito do cidadão de não ver formulada contra si, pretensão em relação a qual não pôde opor suas razões, no âmbito do “devido processo legal”.

As mudanças operadas no Direito Administrativo, ao longo dos últimos anos, também contribuíram para a tendência à processualização da atividade administrativa. Tais mudanças resultaram na superação da visão compartimentada dos atos administrativos e na adoção da visão processual da atuação administrativa. Hoje, importa mais o conjunto dos atos que compõem a atuação administrativa, a dinâmica da relação entre Estado e cidadão, com foco no resultado concreto do processo e no equilíbrio final entre direitos e obrigações das partes que compõem a relação jurídica. Assim, um ato administrativo não terá sua regularidade apurada com base, tão-somente, em uma análise desvinculada do processo de que faz parte, mas em especial a partir dos efeitos concretos do conjunto de atos na órbita de interesses das partes (visão dinâmica do processo).

FIGURA 1: as mudanças no Direito Administrativo.

Estas mudanças no Direito Administrativo não se têm dado, entretanto, como mero resultado de uma evolução da processualística administrativa. Na verdade, é um movimento mais amplo, no âmbito do qual a unilateralidade e imperialidade das razões de Estado dão lugar à consensualidade e participação democrática nas decisões administrativas, com um inegável aumento da preocupação com a efetividade dos direitos fundamentais e com o incremento da legitimidade da atividade administrativa.

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UnilateralidadeeImperialidade das "RazõesdeEstado,, ConsensualidadeeParticipação DemocráticanasDecisões Administrativas ........................................................................•............................................................................. Incremento da preocupação com o cidadão e com a efetividade de seus direitos fundamentais Progressivalegitimaçãodaatividadeadministrativa

Um dos resultados destas mudanças operadas no Direito Administrativo, é aquilo que se pode chamar de “nova dimensão do processo administrativo”, no âmbito da qual a atuação administrativa, mesmo a vinculada à resolução de casos concretos, acaba se conformando como uma busca contínua de aperfeiçoamento das relações com os cidadãos, ou seja, mesmo na solução das situações específicas, o foco está na efetividade da formulação, implementação e aplicação das regras. No plano processual, a decisão que soluciona casos concretos visa não apenas estes casos concretos, mas a criação de normas de maior alcance, destinadas não apenas aos envolvidos na relação processual específica; ou seja, o foco é a criação de normas genéricas e abstratas, no sentido da indução a manifestações que sejam, num sentido mais amplo, indutoras de condutas e difusoras de uma forma de agir da Administração que seja previsível e consistente no tempo. 2

PosiçãoJurídicadestinadaà comporlitígiosemface desituaçõesgravosase específicas

Oenteprivadosedefende dosatosadministrativosdo Estado,quesolucionasituações concretas

Formaefetivaeconstantede relacionamentoentreocidadãoe aAdmin.Pública (formulação,implementaçãoeaplicação dasregras)

Meiodecriaçãodenormas genéricaseabstratas (destinadasnãosóaosenvolvidosnuma relaçãoprocessual)

FIGURA 2: a nova dimensão do processo administrativo.

A ampliação da participação do cidadão no curso da atividade administrativa tem tido, no entanto, alguns ônus. O principal deles, corolário da processualização, é o aumento de complexidade dos procedimentos. Com o acréscimo de novos intervenientes e com a necessidade de definição de suas responsabilidades, os ritos ganharam sofisticação, tornando imprescindível, em muitos casos, a defesa técnica, e inevitável, no mais das vezes, a superação dos limites de alguns dos princípios historicamente atribuídos pela doutrina ao procedimento administrativo, entre tais o do informalismo.

Esta é, aliás, outra revisão que acabará por ser feita. Em estrita consonância com as disposições constitucionais, não há mais como entender aplicáveis ao processo administrativo, todos os princípios que a doutrina lhe atribuiu há já algum tempo, no âmbito de uma realidade que já não existe.

Para limitar a discussão aqui ao referido princípio do informalismo, basta dizer que com a enfatização da peremptoriedade dos prazos e o efeito preclusivo dos atos praticados, com a intensificação do conteúdo formal e material das decisões e com a

2 Para uma ampla visão das novas formas de atuação da Administração Pública, bem como da crise de paradigmas administrativos e das mudanças operadas no Direito Administrativo nos últimos anos, ver Gustavo Binenbojm (2008, p. 9-48).

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··········································································-·········································································· Incremento
da preocupação com o cidadão e com a efetividade de seus direitos fundamentais Progressivalegitimaçãodaatividadeadministrativa

ampliação da complexidade dos procedimentos, não há como falar se mais em informalismo, ou mesmo, como defendem alguns doutrinadores, em formalismo moderado. Na prática, o formalismo acaba se impondo em face de que a crescente sofisticação de grande parte dos ritos e de seus efeitos práticos torna imprescindível, entre outras medidas, a defesa técnica e a minudente disposição das responsabilidades das partes e dos prazos a serem cumpridos.

Pode se exemplificar, primeiro, com a evolução experimentada pelo procedimento relativo à exigência de créditos tributários federais – o chamado processo administrativo fiscal. No período que se seguiu à promulgação da Constituição de 1988, inúmeros atos legais enrijeceram o rito, com a reafirmação da força preclusiva dos atos já realizados e com as restrições à apresentação de provas fora dos momentos determinados.

Da mesma forma, foram criadas, em 1993, unidades administrativas, internas à Administração Tributária, especializadas em julgamento, o que, se por um lado representou um avanço, dado que além de se ter criado um “duplo grau de jurisdição administrativa” – Delegacias de Julgamento e o atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais , deixaram os lançamentos fiscais de ser julgados pelas mesmas unidades que os formalizavam, por outro trouxe complexidade ao procedimento, sendo hoje difícil imaginar que ao rito posto possam ser associadas “informalidades” – que seriam prontamente argüidas como causas de nulidade – ou que ele possa ser enfrentado pelo cidadão comum sem o assessoramento de um especialista no assunto.

Outro exemplo tem se com o procedimento relativo à apuração de infrações contra a ordem econômica. O artigo 4.º da Lei n.º 12.529/2011 atribui ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, organismo responsável pelo julgamento administrativo dessas infrações, o status de órgão judicante com jurisdição em todo o território nacional. Muito embora não exista um entendimento pacífico quanto à extensão exata desta atribuição, representa ela, ao menos, um claro robustecimento da força da manifestação prolatada pelo ente administrativo, em evidente detrimento da atuação pretoriana.

Tais exemplos são suficientes para que reste evidenciado, então, que os procedimentos administrativos deixaram de ser meros impulsionadores da atividade regular do Estado, para, a partir da processualização de seu conteúdo, incorporarem ritos que se assemelham em muito à atuação do Poder Judiciário, pelas repercussões que podem ter sobre a esfera dos interesses de cidadãos e instituições.

É importante, porém, ter em conta de que não temos no Brasil um único processo administrativo fiscal. Como mais adiante se abordará, em sede administrativa não se tem um código de processo administrativo tributário, como se tem, na esfera judicial, um código de processo civil. Em razão disso, cada ente federativo acaba criando suas próprias regras, o que obriga aquele contribuinte que precisa litigar administrativamente em vários estados ou municípios, a se familiarizar com tais regras específicas. Aqui, a abordagem está centrada no processo administrativo da União, primeiro porque seria inviável abordar a multiplicidade de outros sistemas; e, segundo, porque nele se inspiram grande parte das regras dos demais entes federativos.

2.2. A teoria geral do processo e o processo administrativo fiscal

Quando se fala na relação litigiosa que se estabelece entre o cidadão e o Estado no âmbito do processo administrativo fiscal, com muita frequência vêm à tona a tormentosa

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questão: há "lide", no sentido que lhe dá a teoria geral do processo, nos litígios entre surgem estes dois entes? Em outras palavras, pode-se falar, adaptando-se as expressões de Carnelutti, em "pretensão do Estado resistida pelo cidadão", ou em "conflito de interesses entre o Estado e o contribuinte"? Do mesmo modo, pode se dizer que estão presentes, na seara processual administrativa, conceitos chave para a definição de uma relação processual, como tais os de "ação", jurisdição", "processo" e "defesa"?

Tais respostas não existem, ou ao menos ainda não ganharam suficiente consenso para serem tidas como objeto de assertivas cientificamente postas. As especificidades da relação processual jurídico tributário, no âmbito administrativo, não têm sido objeto de maiores preocupações no que se refere ao seu encaixe dentro de uma teoria geral do processo que pudesse vir a abarcar não apenas o litígio que se estabelece em sede judicial, mas também em sede administrativa.

A rigor, os estudiosos do Direito sequer têm conseguido dar tratamento uniforme e de conjunto para aquilo que poderia vir a ser chamado de "processo tributário". Tanto é assim que, o que hoje se tem por "processo tributário", nada mais é que um conjunto assistematizado de instrumentos processuais que buscam, nos limites de cada um destes instrumentos olhados de forma isolada, dar conta das inúmeras controvérsias que se estabelecem entre o cidadão e o Estado na esfera da relação jurídico tributária.

Não é por outra razão que se fala, hoje, em "crise do processo tributário". 3 Com efeito, a alta complexidade dos sistemas tributários (traduzida, por exemplo, em incidências tributárias de variada ordem, em excesso de normas e falta de inteligibilidade principiológica do sistema), unida às tensões típicas da relação tributária (sempre espremida em dicotomias do tipo "supremacia do interesse público X defesa dos direitos e garantias individuais" ou "informalidade e celeridade X devido processo legal"), possui um alto potencial para a geração de conflitos de distintas naturezas, dificultando muito a formulação de uma teoria geral que abarque, num só corpo, tamanha diversidade.

Isto explica, em parte, o distanciamento do processo tributário, de modo mais amplo, e do processo administrativo tributário, de modo mais estrito, da teoria geral do processo e dos institutos em torno dos quais se estrutura: ação, lide, processo, jurisdição e defesa.

Obviamente que em um trabalho como este não se pretende formular uma teoria geral do processo, e nem mesmo uma teoria geral do processo tributário, mas pode-se aqui correr o risco de indicar alguns elementos que sirvam para evidenciar, minimamente, a existência de alguns elos de ligação entre a relações processuais que se estabelecm em sede judicial e em sede administrativa.

Do ponto de vista da teoria geral do processo, em sua formulação clássica, é pressuposto para a instauração válida da relação processual, a existência de lide, ou seja, de um “conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida ” (Carnelutti). A partir daí, o detentor do direito cujo exercício encontra resistência, tem o direito de ação, 4 que é um direito público subjetivo de invocar a prestação jurisdicional, distinto do direito material e da demanda em sentido formal, e que, por óbvio, pressupõe a existência de lide. Proposta a ação, o Estado dirime o litígio por meio da jurisdição, que nada mais é que poder estatal

3 James Marins, 2016, p. 15 28.

4 Marcelo Abelha Rodrigues, 2008, p. 134-136.

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de resolver os litígios surgidos entre os particulares ou entre estes e o Estado. 5 A jurisdição, a sua vez, se exterioriza pelo processo, 6 instrumento por meio do qual os órgãos jurisdicionais atuam para pacificar as partes litigantes, eliminando os conflitos e fazendo aplicar o preceito jurídico pertinente. Por fim, não há processo sem o direito de defesa, 7 que é o reverso do direito de ação e que se constitui no direito do demandado de se contrapor ao pedido do autor da demanda (o direito de defesa exterioriza se concretamente por via dos princípios do contraditório e da ampla defesa e é um direito público subjetivo de se contrapor à prestação jurisdicional, distinto do direito material).

A Dinâmica Processual

FIGURA 3: a dinâmica processual e os elementos da teoria geral do processo.

Do ponto de vista destes elementos nuclerares da teoria geral do processo, é possível traçar alguns paralelos entre a tutela jurisdicional e a tutela administrativa tributária (figura 4). No âmbito tributário, há uma pretensão (o lançamento tributário, efetuado de acordo com o artigo 142 do Código Tributário Nacional), que pode encontrar resistência na insurgência do sujeito passivo, restando configurados o conflito de interesses e a contraposição de direitos que dão legitimidade ao exercício do direito de ação, com o consequente estabelecimento da relação processual na esfera da qual o litígio será dirimido com a devida garantia do direito de defesa (o que, em nossa ordem jurídica, se dá, tanto em sede judicial quanto em sede administrativa, por meio da adoção irrestrita dos princípios do contraditório e da ampla defesa).

5

Luiz Guilherme Marinoni, 2006, p. 89 e seguintes, e Marcelo Abelha Rodrigues, 2008, p. 67.

6 Luiz Guilherme Marinoni, 2006, p. 396, e Marcelo Abelha Rodrigues, 2008, p. 159-161.

7 Luiz Guilherme Marinoni, 2006, p. 307.

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Pro
LIDE A AÇÃO
vocaa JURISDIÇÃO queseexerceporviadeumcomplexodeatosquesedenomina PROCESSO noâmbitodoqual,emfacedoestadodecontradiçãorecíproca,insere-sea DEFESA

Tutelajurisdicional

Resistência(conflitodeAçãoProcesso Defesa(contraditórioeampladefesa)Prestação jurisdicional(exercíciodaJurisdição)

Tutelaadministrativatributária

Lançamento(ato unilateraldevontade art.142CIN)

Resistênciadosujeito passivo(conflitode interesses)

Contraposiçãode direitos

Deveserasseguradoao sujeitopassivoodireito dediscordarda exigência, com o intuito dedarsegurançae transparência à relação tributária

FIGURA 4: tutela jurisdicional e tutela administrativa tributária.

Não se pode dizer, assim, que na relação processual que se estabelece no âmbito do processo administrativo fiscal, estejam ausentes os elementos chave que permitiriam sua abordagem no plano da teoria geral do processo (figura 5):

(a) há lide, caracterizada pela resistência do sujeito passivo à pretensão formulada, em regra, de forma unilateral pelo Estado (o lançamento tributário);

(b) há exercício de direito de ação por parte do sujeito passivo, caracterizada pelo acionamento do contencioso administrativo fiscal;

(c) há jurisdição, na medida em que há autoridades administrativas especializadas em julgamento, que atuam de forma separada das autoridades fiscais responsáveis pela fiscalização, e que prolatam decisões que, embora não façam coisa julgada (em razão do princípio da unicidade de jurisdição), produzem decisões vinculantes e terminativas em relação à Fazenda Nacional (tais decisões vinculantes e terminativas se dão, em regra, quando o lançamento tributário é invalidado de forma parcial ou integral, bem como nos casos em que direitos creditórios são reconhecidos ao sujeito passivo). Tais circunstâncias permitem afirmar, portanto, a existência de uma Administração judicante; e isto não no sentido da relativização do princípio da unicidade de jurisdição, mas no da afirmação de que decisões dos órgãos julgadores administrativos podem, sim, dar solução final aos litígios tributários;

(d) há processo, na medida em que há ritos, formas e competências expressamente definidos em atos legais (como tal, em especial, o Decreto n.o 70.235/1972), com pouco ou nenhum espaço concedido à discricionariedade administrativa em sede contenciosa ou à relativização da rigidez procedimental (há prazos preclusivos para a apresentação de recursos e para a produção de provas, competências processuais indelegáveis etc.);

(e) e há, por fim, direito de defesa, e isto não apenas por conta de imposição constitucional (que, como já se viu, equiparou os processos administrativo e judicial no que se refere à subordinação aos princípios do contraditório e da ampla defesa), mas também porque os ritos procedimentais que compõem o processo administrativo fiscal, expressamente oportunizam ao sujeito passivo o exercício de seu direito de não apenas contestar a exigência contra ele formulada, como também de falar no processo, de saber de tudo quanto se vai produzindo no iter processual etc.

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Teoria Geral do Processo

Ação i Jurisdição j Processo j Defesa · · ·

Poder de iniciar O j j Conjunto de atos dos j Poder da parte de processo visando à j Poder do juiz de i três sujeitos vínculo i saber e de satisfação de uma j eliminar j jurídico que os j contraditar as pretens0~:;Jace de

Na Esfera do Processo A dministrativo Fiscal

-·-·-·-·-·-·-·-·-·-·

Administração judicante

...........................................................................

FIGURA 5: os elementos da teoria geral do processo na esfera do processo administrativo fiscal.

Por óbvio que existem distinções entre os processos judicial e administrativo, mas não são elas de ordem tal a macular o paralelismo acima traçado. De se ver:

(a) a relação triangular: no caso do processo administrativo, a tripartição do processo judicial (autor, réu e julgador) subsiste nas figuras da Administração ativa (a que fiscaliza e impõe a exigência resistida), o sujeito passivo (que contesta a imposição da Administração ativa) e a Administração judicante (que atua especificamente na atividade de julgamento, em órgãos separados dentro da Secretaria da Receita Federal do Brasil e do Ministério da Fazenda e dirime os litígios de forma independente);

(b) a eficácia das decisões: apesar de as decisões administrativas, mesmo quando proferidas em última instância, serem passíveis de anulação pelo Poder Judiciário, em virtude do princípio da inafastabilidade da apreciação pelo Judiciário (CF, art.5º, inciso XXXV), certo é que, em especial nos casos de decisões favoráveis ao sujeito passivo, tais decisões acabam dirimindo de forma definitiva os litígios;

(c) caráter expropriatório: as decisões administrativas não têm caráter expropriatório, como o podem ter as decisões judiciais (prolatadas, em regra, em sede de execução fiscal), mas tal caráter, especialmente nos casos de decisões administrativas favoráveis aos sujeitos passivos, deixam de ter razão de ser. De qualquer modo, a propositura da ação judicial que dá ensejo à expropriação de bens, demanda procedimentos administrativos prévios, como tal a geração da certidão de dívida ativa, que tem por detrás dela o conjunto de atos administrativos, contenciosos ou não, que dão validade ao crédito tributário a ser executado;

(d) formalidades processuais: muito embora seja usual a afirmação de que o processo judicial é formal e que o processo administrativo é informado pelo princípio do informalismo (o que significaria um certo desapego às formas rígidas no curso do processo), verdade é que hoje, no atual estágio de desenvolvimento do processo administrativo, tal distinção perdeu muito de seu vigor. É que com a drastificação dos ritos procedimentais administrativos e com a adoção de prazos preclusivos para a prática da maior parte dos atos processuais, não há mais informalismo no processo administrativo, e sim, quando muito, formalismo moderado (sobre isto é feita abordagem mais detalhada no item 3.1);

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Sujeito Passivo, em fa ce da pretensão (lançamento) da Administração ativa ....................................•.....................................
Ritos formas e Sujeito competê ncias Passiv o/ litigante : previamente contraditório e definidos ampla defesa

(e) condução do processo: apesar de no processo administrativo viger o princípio da oficialidade e no processo administrativo imperar o princípio da inércia da jurisdição, com isto significando que a ausência do autor, no processo, não encerra o processo administrativo, mas dá causa ao encerramento do processo judicial, certo é que tal distinção fica muito minorada no âmbito da fase contenciosa do processo administrativo fiscal. É que na fase contenciosa, a ausência do contribuinte, caracterizada, por exemplo, pela perda do prazo para contestar, tem como consequencia a declaração de definitividade da exigência tributária em sede administrativa. É certo que os procedimentos que se seguem a esta declaração de definitividade - especialmente vinculados à cobrança do crédito tributário - serão regularmente adotados pela Administração Fazendária, mas a fase de dirimição do litígio, em sede administrativa contenciosa, terá tido termo final;

(f) a busca da verdade: também é usual a afirmação de no processo judicial vige o princípio da verdade formal e de que no processo administrativo impera o princípio da verdade material. Também isto, porém, já não é mais bem assim. Com o crescente enrijecimento do processo administrativo – operado por disposições como a que prevê prazos preclusivos para a apresentação de provas , há hoje o reconhecimento de que a verdade material é um mito em qualquer seara, e que o julgador, seja o judicial ou seja o administrativo, na expressiva maioria das vezes acaba chegando apenas a um juízo de verossimilhança, a uma verdade parcial, portanto a uma verdade que é verdade a partir da realidade restrita dos autos que compõem fisicamente o processo (sobre isto é feita abordagem mais detalhada nos itens 3.2 e 8). Assim, esta distinção entre os processos judicial e administrativo, se existe, é mais de grau que de princípio informador. Assim, por fim, identificadas mais similaridades que diferenças entre os processos judicial e administrativo no plano da teoria geral do processo, pode se intentar a produção de um quadro no qual o curso dos dois processos aparecem lado a lado, como exposto na figura 6, a seguir (no quadro, o processo judicial é posto ao lado do processo administrativo de determinação e exigência de créditos tributários federais, previsto no Decreto n.o 70.235/1972).

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Elementos da TGP

PJ PAF

de OXQreÍCio do c:lifflto j TentativadeexercíciodedireitoFazendaefetuaolançamento

ResistênciaaoexercíciodoResistênciadosujeitopassivoà (conflitodeinteressesqualificadodireitoporoutroenteexigênciafiscalporumapretensãoresistida)

Ex:Qrefoio do c:lifflto de ação/ instauração do litígio (condiçõesdaação:interesse processual,legitimidadedaspartese possibilidadejurídicadopedido)

Petição inicial (comacitaçãoválida,completaa relaçãojurídicaprocessual)

Impugnação administrativa (instauraolitígioemsede administrativadefesaemsentido estrito)

Ex:Qrefoiodajurisdição j Julgamcmtooo 1.ª instância (Juiz) Julgamimtooo 1.ª instância ((DRJ) administraçãojudicanteoujuiz)

c:lifflto

FIGURA 6: os elementos da teoria geral do processo nas esferas do processo judicial e do processo administrativo fiscal.

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Tcmtativa
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Al)Qlação
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Ex:Qrefoiodo
de defesa
Reeurso Voluntário (contraditórioeampladefesa)
Ex:Qrefoio da jurisdição
Julgamimto de a.ª instância (TRF) Julgamcmto de a.ª instância (administraçãojudicanteoujuiz)(CARF)
Ex:Qrefoio do c:lifflto de defesa Reeurso &peei~ o.u.Roourso
Roourso &peeial (contraditórioeampladefesa)
Ex:Qrefoio da jurisdição j Julgamooto 001 instância ~pooial Julgamooto 001 instância ~pooial (administraçãojudicanteoujuiz) j (STJouSTF)(CSRF)

2. O Processo Administrativo Fiscal – Modelo e Natureza da Atuação Administrativa

2.1. O Modelo Brasileiro de Contencioso Administrativo Fiscal

O Brasil adota um modelo de processo administrativo fiscal peculiar, que não encontra desenho similar na cena internacional. A rigor, são muitos os sistemas de solução de litígios tributários encontrados no mundo. Na França, tem-se a tão decantada jurisdição administrativa (tribunais administrativos com decisões que fazem coisa julgada); na Espanha há uma ampla estrutura administrativa destinada à apreciação dos recursos dos contribuintes e, apesar de suas decisões, como no Brasil, não fazerem coisa julgada, há a exigência legal do prévio esgotamento da via administrativa para o acesso ao Poder Judiciário; no Chile, a opção, recente, foi a da instituição de tribunais especificamente tributários, não vinculados ao Poder Judiciário, com a atuação administrativa, em termos de apreciação de recursos dos contribuintes, limitada a escassos casos de menor relevância. Enfim, a variedade de modelos é muito grande e atende às peculiaridades das sociedades e das ordens jurídicas de cada país.

O modelo brasileiro é peculiar porque apesar de estar fundado num sofisticado rito procedimental de até três instâncias de julgamento colegiado, é uma alternativa colocada à disposição dos contribuintes que não traz qualquer limitação para a eventual pendenga judicial posterior. Em outras palavras, no Brasil o acesso às instâncias administrativas é uma faculdade no sentido mais amplo do termo, pois o uso de tal alternativa não resultará em uma decisão final acerca do litígio (pois a decisão administrativa não faz coisa julgada), e nem trará qualquer limitação tanto em termos do posterior acesso ao âmbito judicial quanto em termos da amplitude do que pode vir a ser discutido judicialmente (a discussão pode ser integralmente renovada, sem que o processo administrativo tenha qualquer efeito sobre os limites do litígio na esfera judicial).

As razões para a adoção de um sistema tão compartimentado parecem estar fundadas numa visão estrita do princípio da separação dos poderes, qual seja a de que a função do Legislativo é legislar, a função do Judiciário é julgar e a função do Executivo, por fim, é governar. Ocorre, porém, que o princípio evoluiu no sentido de incorporar a noção da interdependência das funções do Estado e, com isto, difundir a idéia de que para além da separação formal destas funções, deve imperar a independência harmônica, calcada não em funções privativas, mas em funções estatais precípuas. Em outras palavras, cada poder exercita as três funções jurídicas do Estado; uma obviamente em caráter predominante e as outras em caráter subsidiário.

Dentro deste novo quadro, não há mais razões que justifiquem a excessiva estanqueidade, hoje existente, no Brasil, entre os processos administrativo e judicial. Sim, porque não haveria qualquer prejuízo ao princípio da unicidade de jurisdição, caso fossem criados vínculos entre os dois processos no sentido de que os autos do processo administrativo fossem aproveitados no processo judicial e de que a discussão

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administrativa tivesse influência no que pudesse vir a ser discutido em sede judicial (em termos, por exemplo, de delimitação do litígio). Com isto, se poderia evitar o uso de dois aparelhos estatais para a repetição de atividades já realizadas ou mesmo a discussão do mesmo objeto por via de fundamentos de fato e de direito distintos nestas duas esferas.

De se lembrar que há muitos países, como a Espanha e a Alemanha, que impõem como condição para o acesso ao Poder Judiciário, o prévio esgotamento das vias administrativas, com isto condicionando a discussão nas duas esferas a limites, em geral, comuns. Não é lícita, por exemplo, a inovação irrestrita das alegações quando da passagem da via administrativa para via judicial. A produção, perante o Poder Judiciário, de novas provas acerca de alegações já previamente postas à apreciação administrativa, é possível; o que não é possível é inovar nas alegações (até porque, a contrário senso, isto tornaria inócua a exigência do prévio esgotamento das vias administrativas).

Por óbvio que a adoção de um tal sistema no Brasil, depende da efetiva profissionalização da atividade de julgamento administrativo, mas não se pode negar que a evolução do contencioso administrativo operada ao longo dos últimos anos (e que está melhor abordada no item 1), cria as condições para mudanças desta natureza.

São vários os efeitos indesejáveis da excessiva compartimentação entre as vias administrativa e judicial. Além da possibilidade do uso desvirtuado do sistema (por sua utilização meramente protelatória por parte de litigantes de má fé), ela impede que o processo administrativo fiscal seja tratado como parte do direito processual tributário. É certo que não existe, no Brasil, um código de processo tributário formalmente editado, mas não se pode dizer que já não existam princípios e normas que sirvam à peculiarização da relação processual de caráter jurídico tributário. Assim, a aludida compartimentação dificulta a abordagem do processo administrativo fiscal dentro de uma teoria geral do processo tributário, com todos os prejuízos inerentes à ausência de tratamento conciliado das duas esferas.

De outro lado, é de se lamentar o ainda hoje vigente distanciamento entre o direito material e o direito processual administrativo fiscal, fonte que é de boa parte das mazelas atualmente vivenciadas pelo processo administrativo fiscal em termos de sua efetividade e da agilidade na solução dos litígios.

De há muito se firmou a idéia de que o direito processual, apesar de ser um ramo autônomo do Direito, possui função instrumental em relação ao direito material; e instrumental não no sentido de secundário (como se intentou afirmar em um primeiro momento da chamada "fase instrumentalista" do direito processual), mas na acepção de um direito que serve à satisfação de pretensões jurídicas controversas ou resistidas. E é essa visão instrumentalista que vem informando, em grande parte, as constantes reformas dos códigos processuais judiciais brasileiros ao longo dos últimos anos. A busca pela efetividade do processo tem informado de forma contundente as reformas do nosso codex processual ao longo dos últimos anos, fazendo com que as antigas teses da separação entre direito processual e direito material perdessem campo e defensores. 8

8 Para uma visão detalhada do processo de aproximação entre Direito Processual e Direito Material, no sentido da busca pela efetividade da prestação jurisdicional, ver José Roberto dos Santos Bedaque (2001, p.9 23).

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Exemplos deste movimento de aproximação do direito processual e do direito material são a proliferação das medidas liminares, a intensificação das medidas cautelares, a superveniência das tutelas de urgência e a criação de ritos diferenciados definidos para determinados tipos de litígios. Todos estes remédios, à evidência, intentam a proteção provisória e/ou a efetividade de bens ou direitos que estão sendo discutidos judicialmente.

Esta diversificação do direito processual judicial, entretanto, ainda não chegou ao processo administrativo fiscal. Apesar dos progressivos aumentos do tempo de julgamento administrativo e do estoque de processos, o processo administrativo fiscal continua regido, basicamente, por um rito procedimental de até três instâncias colegiadas; ou seja, todos os litígios, independentemente da matéria sobre que versem ou dos valores envolvidos, passam pelo mesmo rito de cognição exauriente. O fato de haver alguns ritos específicos para algumas situações específicas, não infirma o dito, pois o rito do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais acaba sendo aplicado, a partir de determinada etapa da atuação administrativa, como base para a expressiva maior parte daqueles outros ritos.

Assim é que, para a discussão de litígios muito díspares em termos de valores ou de relevância da matéria, é adotado um rito longo que traz prejuízos tanto ao contribuinte, pela demora da manifestação administrativa, quanto à Fazenda Nacional, pela postergação da cobrança de créditos tributários. À evidência, tal quadro encontra base na adoção superestimada do princípio da isonomia, traduzida na idéia de que todos os contribuintes devem ter seus litígios apreciados pelas mesmas regras, independentemente de valor, matéria etc. Mas é preciso, porém, sopesar princípios de outra ordem, ou balanceá-los - como é, aliás, da própria natureza dos princípios. Assim, tão importante quanto o princípio da isonomia são os princípios da celeridade, do devido processo legal, da eficiência, do interesse público etc. E é igualmente importante pensar a dinâmica processual administrativa por meio de uma visão de conjunto dos litígios que a compõem a atuação administrativa, hierarquizando situações e formulando tratamentos processuais que sirvam à conformação efetivamente instrumental desta seara jurídica em relação ao direito material que dá fundo aos conflitos de interesses.

De se ressaltar, por fim, que a visão instrumental do processo traz efeitos em múltiplas etapas da conformação da norma; para o legislador, impõe a criação de normas processuais que atendam às características do direito material; e para o operador jurídico, demanda que, na interpretação da norma processual, seja ela entendida como meio de satisfação do direito material.

2.2. A Natureza e os Limites do Julgamento Administrativo

Quanto à questão da natureza do julgamento efetuado em sede administrativa, também há variações de país para país, de acordo, por óbvio, com o modelo de contencioso administrativo adotado. Entretanto, mesmo diante da definição quanto ao modelo, podem remanescer dúvidas acerca do que é o julgamento administrativo.

No Brasil, por exemplo, nem mesmo no âmbito da própria Administração Pública se encontra uma visão uniforme acerca do que seja o julgamento efetuado no âmbito, por exemplo, das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento – DRJ. A rigor, chega a surpreender que mesmo depois de transcorridos mais de vinte e cinco anos da criação destas unidades especializadas em julgamento dentro da Receita Federal do Brasil, ainda

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persistam dúvidas acerca de qual sejam o conteúdo e a extensão de suas atuações. E tais dúvidas, é de se ressaltar, são suscitadas em vários âmbitos: entre os próprios julgadores que compõem as turmas de julgamento das DRJ; na esfera de algumas coordenações gerais da RFB; e, igualmente, entre as unidades descentralizadas da RFB que atuam sob as superintendências regionais.

Mas também no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, há posições dissonantes acerca do tema, podendo se encontrar decisões que transitam com certa frequência entre uma e outra visão.

As razões para este estado de coisas são de variada ordem. A primeira delas é, para além de qualquer dúvida, a inexistência de disposição legal estabelecendo quais sejam os limites da atuação do julgador administrativo. Muito embora tais limites possam ser definidos a partir de uma interpretação sistemática das atuais normas processuais administrativas, certo é que na via administrativa não há uma disposição análoga a que se encontra no Código de Processo Civil – CPC acerca dos limites de atuação dos órgãos julgadores no processo judicial; com efeito, o artigo 141 do CPC estabelece, de forma expressa, que o juiz decide a lide nos limites em que foi proposta, sendo lhe defeso conhecer de questões não suscitadas. Não se quer aqui afirmar a similaridade irrestrita entre os contornos da atuação dos órgãos julgadores nas esferas administrativa e judicial, mas apenas enfatizar a inexistência, em sede administrativa, de disposição legal que defina, com a mesma clareza e literalidade do dispositivo do CPC, os limites do julgamento administrativo.

Outra razão se refere à excessiva proximidade institucional das DRJ em relação às demais unidades descentralizadas da RFB. Por certo, pouco contribui para a criação de uma cultura de “julgamento administrativo”, a excessiva fluidez dos limites institucionais que separam as DRJ das DRF, IRF, ALF etc. Tal excessiva fluidez se reflete – ou encontra justificativa - nas intensas e freqüentes trocas de pessoal entre estas unidades, na proximidade entre “quem investiga e lança” e “quem aprecia e julga” e na resistência ao acatamento de uma distinção bastante bem difundida na doutrina entre a Administração Ativa e a Administração Judicante. Com efeito, por vezes são chamados à discussão argumentos como o de que “julgadores” também são “autoridade fiscal” e que por possuírem, portanto, prerrogativas e deveres similares aos dos agentes públicos ligados à fiscalização, não estariam restritos a uma visão processual do litígio. O argumento, por óbvio, não leva em conta, ou ao menos minimiza muito a chamada imparcialidade orgânica, na medida em que não considera característica distintiva das DRJ a natureza especializada de sua atuação e faz tábula rasa de um importante corolário desta atuação especializada: os julgadores, apesar de poderem ser caracterizados genericamente de “autoridade fiscal”, não detêm, e aí de forma inequívoca, competência legal para efetuar o lançamento tributário (e tal delimitação subentende não apenas a prática do ato de lançamento em si, mas também daqueles outros que, por vias indiretas, se conformem como assemelhados àquele ato impositivo).

Na esfera do CARF, não está tão presente a proximidade institucional que vivenciam as DRJ, mas nele o julgamento administrativo acaba sofrendo os influxos de uma visão que privilegia a natureza de controle de legalidade em sentido amplo dos atos de ofício contestados, com isso aproximando a atuação judicante administrativa do conjunto de meios de autotutela da atuação administrativa a que se obriga o poder público.

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O resultado destas divergências é a proliferação de visões distintas acerca da natureza do julgamento administrativo de primeira instância. De um lado, há aqueles que vêem o julgamento administrativo como algo em tudo e por tudo assemelhado ao julgamento judicial, com os limites do litígio sendo determinados pelos motivos do ato impugnado e pela contestação do contribuinte e com todos os formalismos inerentes à disciplina processual; de outro lado, há alguns que adotam posição diametralmente oposta, defendendo que a contestação do contribuinte inaugura uma fase de ampla revisão da legalidade do lançamento, em nada limitada pelos motivos do ato contestado e pelos pedidos do contribuinte e sem apegos a formalidades processuais; e há, ainda, posições intermediárias, como, por exemplo, a que entende que a contestação do contribuinte define, em princípio, os limites do litígio a ser apreciado, mas que tal delimitação não exclui a análise, de ofício, de questões de direito aferíveis de plano (ou seja, ter se ia um meio termo entre um julgamento com feições judiciais e um ato administrativo de controle de legalidade).

É preciso, entretanto, dissipar divergências desta ordem. E isto porque a manutenção de posições díspares e extremadas acerca da natureza do julgamento administrativo traz implicações que não são meramente retóricas, mas repercussões práticas contundentes para a identidade da atuaçãojudicante administrativa e para a própria sobrevivência do contencioso administrativo na forma como está hoje estruturado. Diz se isto, porque a Administração Tributária vive hoje a realidade do tratamento massificado de dados, com grande incremento tanto da lavratura de atos de ofício (em especial por via eletrônica) quanto da litigiosidade tributária envolvendo tais atos, e se aos órgãos julgadores for atribuída a responsabilidade por tratar estes litígios a partir da ideia de que em sede contenciosa eles devem merecer toda a análise minudente que, por efeito da via sumária de fiscalização, deixou de ser efetuada antes da formalização daqueles atos de ofício, comprometida restará a capacidade de a primeira instância julgadora administrativa (e, igualmente, da segunda instância, por efeito reflexo) cumprir sua tarefa. No mesmo sentido, se aos órgãos julgadores for atribuída a responsabilidade por decidir os litígios sem se limitar à apreciação da regularidade dos motivos indicados no ato de ofício contestado (seja um lançamento de ofício ou um despacho decisório denegatório de direito creditório), se terá, na prática, um sistema inquisitório, no âmbito do qual aqueles contribuintes que recorrerem ao contencioso administrativo – e tão só os que recorrerem - terão não um julgamento de suas razões, mas uma extensão do procedimento fiscalizatório. E tal atribuição aos órgãos julgadores por certo ampliará, em muito, o tempo de julgamento dos feitos fiscais; mas mais grave do que a ampliação do prazo de julgamento, será a perda em termos da imparcialidade da atuação judicante.

O que se quer dizer com tudo isto é que é preciso definir com clareza o que é o julgamento administrativo e, neste sentido, apesar de não existir mesmo uma posição uniforme sobre a questão, a opção que parece mais se coadunar com a ordem vigente é aquela intermediária, dentre as anteriormente veiculadas. Com efeito, na medida em que o próprio Decreto n.o 70.235/1972 estabelece que "a impugnação da exigência instaura a fase litigiosa do procedimento" (artigo 14) e que "considerar se á não impugnada a matéria que não tenha sido expressamente contestada pelo impugnante" (artigo 17), há que se concluir que os motivos do ato contestado e a contestação da exigência fiscal delimitam, sim, o litígio a ser apreciado (dado que matéria não expressamente impugnada não instaura litígio), ficando afastada, em princípio, a possibilidade de a autoridade julgadora ir para além da petição

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que lhe foi encaminhada. Tal regra, entretanto, não afasta a possibilidade de a autoridade julgadora ampliar seu campo de análise nos casos específicos em que estiverem envolvidas questões de direito aferíveis de plano e que, em razão de sua função administrativa, tem a obrigação de levantar de ofício (por exemplo, não seria lícito a um julgador manter a exigência de Imposto de Renda Pessoa Jurídica de uma pessoa física, mesmo que a ilegalidade desta medida não tivesse sida argüida na impugnação do lançamento).

Outra disposição legal constante do Decreto n.o 70.235/1972 reafirma a importância da definição dos contornos do litígio para o julgamento administrativo. Trata se do inciso III do artigo 16. Na redação que lhe foi dada pelo ato que criou as DRJ, a Lei n.o 8.748/1993, foi estabelecida a obrigação do contribuinte de, na contestação do lançamento, delimitar o objeto do litígio por meio da indicação, na impugnação, dos “motivos de fato e de direito em que se fundamenta, os pontos de discordância e as razões que possuir”. Este comando legal, associado ao acima referido artigo 17 do mesmo Decreto ("considerar se á não impugnada a matéria que não tenha sido expressamente contestada pelo impugnante"), representam, na posição de Alberto Xavier, “inegáveis aflorações do princípio dispositivo, de índole subjetiva, no processo administrativo tributário. A nova redação do artigo 16, III do PAF, no sentido da obrigatoriedade de alegação expressa dos motivos, visou a coibir a tendência jurisprudencial do Conselho de Contribuintes, registrada no passado, no sentido de admitir a legalidade da chamada ‘negação geral’, ou seja, o recurso interruptivo, segundo a qual ‘a impugnação que não questiona item da autuação, de forma direta e objetiva, mas que termina pedindo o cancelamento do lançamento, ou equivalente, deve ser tomada como negação geral, no processo administrativo fiscal. Rejeitou se, assim, a visão objetivista, segundo a qual a causa de pedir seria a ilegalidade do ato administrativo em tese ou em abstrato, abrangedora da totalidade dos seus fundamentos possíveis [...]. Em matéria de causa de pedir a lei optou, pois, claramente pela teoria da substanciação, que requer a sua função individualizadora do objeto do processo, em contraste com a teoria da individualização, segundo a qual bastava ao autor indicar o pedido, com o que todas as possíveis causas de pedir podiam ser consideradas no processo ”.

Dentro deste quadro, na medida em que a lei estabelece ao contribuinte o poder de iniciativa processual e de delimitação do objeto do processo (este sob pena de preclusão acerca das questões não alegadas), por óbvio que se há de ter a contrapartida na atuação da Administração: se ao contribuinte não é lícito se valer da negação geral, também não é lícito à Administração Judicante ir para além dos motivos do ato administrativo contestado. Se o contribuinte tem de definir/especificar suas causas de pedir, não podem os órgãos julgadores administrativos produzir novos fundamentos para a manutenção do ato contestado.

É preciso ter em conta, aqui, aquilo que bem ressalta Alberto Xavier acerca do critério que se deve ter em conta na definição da natureza dos recursos administrativos. A partir da distinção entre o recurso do tipo reexame (no âmbito do qual o recurso tem por fim a plena reapreciação da questão decidida pelo órgão a quo, representando um julgamento ex novo do litígio – recurso renovatório) e o recurso do tipo revisão (no âmbito do qual o recurso tem por objeto exclusivo a apreciação do ato recorrido, limitando se à verificação da correção ou incorreção do ato impugnado – recurso eliminatório), destaca o doutrinador que a opção por um ou outro modelo está indissociavelmente ligada à extensão da competência da autoridade ad quem e aos limites dos poderes de cognição do órgão de julgamento. 9

9 Xavier, 2005, p.50 51.

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Assim, se a autoridade ad quem também possui poderes próprios para a prática do ato primário impugnado, o recurso deve ser modelado como reexame (já que não faria sentido que a autoridade ad quem se limitasse a apreciar o ato impugnado quando ela própria tem poderes para praticá lo); se, entretanto, a autoridade ad quem não tem poderes próprios para praticar o ato impugnado, em virtude de uma competência exclusiva ou reservada da autoridade a quo, deve limitar se a um pronunciamento sobre a regularidade do mesmo.

O que resulta desta distinção é que, na medida em que no contencioso administrativo brasileiro foi adotada a separação entre órgãos de lançamento (Administração Ativa) e órgãos de julgamento (Administração Judicante), não sendo dada a estes a competência para praticar os atos primários de que são exemplos o lançamento e o despacho denegatório do pleito repetitório, mas sim a de praticar o ato secundário de reapreciação daqueles atos primários, só podem os órgãos julgadores administrativos prolatar decisões na esfera das quais anulam ou confirmam, parcial ou integralmente, o ato contestado (modalidade de revisão), e jamais decisões nas quais substituem tal ato (modalidade reexame).

Esta distinção entre Administração Ativa e Administração Judicante é que define primordialmente o papel de cada órgão dentro da estrutura administrativa. O fato de as DRJ estarem vinculadas à RFB e o CARF compor a estrutura do Ministério da Economia, não autoriza a conclusão de que são duas instâncias de natureza distinta (passíveis de atuarem sob marcos normativos e contextos diferenciados). Obviamente, se tratam se órgãos submetidos a hierarquias distintas e, por conta disto, vinculados a controles administrativos igualmente diversos, mas o que prevalece em suas atividades fim é a natureza de revisão dos atos primários da Administração Tributária. Assim, o fato de as DRJ estarem subordinadas à RFB não as torna órgãos funcionalmente distintos do CARF.

Esta é, com efeito, a questão relevante. Na medida em que os atos secundários produzidos pelos órgãos que compõem a Administração Judicante (acórdãos), não substituem os atos primários praticados pela Administração Ativa (auto de infração, notificação de lançamento ou despacho decisório), limitando se a aferir a regularidade destes nos planos formal e material em face de contestação apresentada pelos contribuintes (impugnação, manifestação de inconformidade, recursos voluntário e especial), não há possibilidade jurídica de que ocorram duas situações que, apesar de distintas, possuem íntima conexão:

(a) primeiro, a prolação de decisões cujos fundamentos não estejam relacionados aos motivos do ato administrativo contestado e às alegações do contribuinte contra aqueles motivos (exceção feita às questões de direito prolatáveis de ofício); e

(b) segundo, a prolação de decisões citra, extra e ultra petita.

A razão pela qual não podem os órgãos julgadores prolatar decisões cujos fundamentos não estejam relacionados aos motivos do ato administrativo contestado e às alegações do contribuinte contra aqueles motivos, é a de que para decidir com base em outros fundamentos, estaria a autoridade julgadora deixando de julgar o ato contestado e, na prática, produzindo um novo ato primário, competência esta que, organicamente, não detém . Para que este ponto fique claro, é importante ressaltar que os fundamentos de fato e de direito compõem o núcleo de validade do ato administrativo, o que faz com que a alteração destes fundamentos, para fins de pretenso saneamento do ato de ofício ou a título de melhoria da

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instrução probatória (o que efetivamente não é, pois se trata de novo fundamento de fato), não possa ser feita sem que fique juridicamente caracterizada a prática de um novo ato administrativo. Uma coisa é aferir se os fundamentos de fato e de direito se sustentam ou não, parcial ou integralmente; outra, bastante distinta, é substituir tais fundamentos por outros.

Importa aqui ter em conta a distinção entre alegação acerca de um fato e prova do fato Tanto a autoridade fiscal que pratica o ato administrativo quanto o contribuinte que contesta tal ato, se utilizam de fundamentos de fato e de provas acerca da ocorrência destes fatos. Pois bem, da ocorrência de um determinado fato, podem decorrer várias alegações acerca dele. Neste contexto, a atuação do órgão julgador destinada a perquirir a efetiva ocorrência do fato especificamente alegado (pela autoridade fiscal ou pelo contribuinte), pode se estender à produção de novas provas em face da insuficiência dos elementos probatórios trazidos pelas partes. O que não pode o órgão julgador fazer é alterar o fundamento de fato, pois isto representaria ir para fora do litígio posto. Em outras palavras, pode o órgão julgador, por via do princípio da verdade material, demandar por novas provas acerca de um fato alegado; o que não pode é alterar o fato alegado – o fundamento de fato -, pois aí estaria, juridicamente, produzindo novo ato primário.

Outra conseqüência prática da referida distinção se refere à regra da proibição ou não da reformatio in pejus. Se os órgãos julgadores administrativos apenas anulam ou confirmam o ato primário, exercem cognição horizontalmente restrita, não podendo avançar para além dos motivos do ato impugnado e das alegações contra eles apresentadas pelo contribuinte; se, de outro lado, suas decisões substituem o ato primário, exercem cognição ampla, sendo os motivos do ato impugnado e as alegações do contribuinte meros pontos de partida do julgamento administrativo, pois aí o que estará em jogo é a legalidade objetiva, em sentido amplo, do ato administrativo. Na primeira hipótese, o agravamento da situação do recorrente é inadmissível; já na segunda, é uma decorrência natural da competência do órgão julgador. Ora, na medida em que, como acima visto, no contencioso administrativo brasileiro foi adotada a distinção entre órgãos de lançamento e órgãos de julgamento, conclui se que por aqui a regra é a da proibição da reformatio in pejus

É certo que o Decreto n.o 70.235/1972 traz, no parágrafo 3.o de seu artigo 18, a previsão da possibilidade de agravamento da exigência inicial em face dos resultados de exames posteriores, diligências e perícias. 10 Entretanto, tal disposição mereceu tratamento bastante mitigado quando de sua incorporação ao posteriormente editado Decreto n.o 7.574/2011 (ato que regulamenta os processos administrativos referentes a matérias administradas pela RFB). Com efeito, o artigo 41 deste Decreto estabelece que o referido agravamento só é cabível, em regra, nas hipóteses em que dos referidos exames posteriores resta constatada a existência de matéria que, apesar de não incluída no lançamento, assim não o foi não porque se trata de matéria nova, mas sim de matéria que foi devidamente trabalhada no procedimento fiscal e só não restou incluída na matéria

10 “Art. 18. [...] § 3.º. Quando, em exames posteriores, diligências ou perícias, realizados no curso do processo, forem verificadas incorreções, omissões ou inexatidões de que resultem agravamento da exigência inicial, inovação ou alteração da fundamentação legal da exigência, será lavrado auto de infração ou emitida notificação de lançamento complementar, devolvendo se, ao sujeito passivo, prazo para impugnação no concernente à matéria modificada.” (Redação dada pelo art. 1.º da Lei n.º 8.748/1993)

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tributável por erro material e/ou lapso manifesto da autoridade fiscal. 11 Ou seja, não se trata mais aqui de agravamento propriamente dito – já que não há inovação a fundamentar a ampliação da exigência inicial , mas de mera correção daquilo que se pode classificar de inexatidão material.

No que se refere à vedação à prolação de decisões citra , extra e ultra petita, tem ela especial aplicação nos processos de reconhecimento de direito creditório, que são inaugurados por iniciativa do contribuinte. Nas palavras de Marcos Vinicius Neder e Maria Tereza Martínez López, para estes processos, em regra, “a demanda é feita pelo impugnante, cabendo ao julgador decidir de acordo com os limites fixados no pedido. Incidem, nesse sentido, os princípios do dispositivo e o da correlação (ou congruência), sendo defeso ao julgador proferir decisão extra, citra e ultra petita [...]. Na verdade, a autoridade julgadora acolhe ou rejeita no todo ou em parte o pedido do interessado, podendo atuar tão somente negativamente em relação ao indeferimento do Delegado. Do contrário, o julgador se afastará da imparcialidade requerida ao exercício de sua função para se imiscuir na esfera de decisão do contribuinte, que pode desejar outra destinação aos eventuais créditos tributários excedentes”. E complementam, afirmando que “no momento da apresentação da manifestação de inconformidade pelo contribuinte, definem se a profundidade e a extensão da apreciação do julgador do órgão a quo sobre a decisão denegatória. Esta limitação é rigorosa nos processos iniciados a partir de pedido do interessado, pois a autoridade está limitada a julgar nos termos requeridos”. 12

As razões pelas quais se disse que há íntima conexão entre as duas vedações (“a prolação de decisões cujos fundamentos não estejam relacionados aos motivos do ato administrativo contestado e às alegações do contribuinte contra aqueles motivos” e “a prolação de decisões citra, extra e ultra petita”), se deve ao fato de que quando o órgão julgador se manifesta sobre as razões do contribuinte opostas ao ato administrativo contestado, deve fazê lo “dando ou não provimento ao recurso”. Se houver pronunciamento com base em motivos/fundamentos distintos (e sobre os quais o contribuinte, por óbvio, não se manifestou), levantados com o objetivo de manter o ato administrativo contestado, caracterizados estarão dois vícios importantes: primeiro, o julgamento extra petita, exteriorizado pela inovação de fundamentos em sede contenciosa; e, segundo, a reformatio in pejus, resultado ilógico da apreciação de um recurso que, ao final e ao cabo, foi apresentado pelo contribuinte com o objetivo de obtenção de uma decisão mais favorável (é difícil justificar, processualmente – e mesmo em sede de processo administrativo , a ideia de que a apresentação de um recurso administrativo pelo contribuinte pode, na prática, servir de oportunidade para que a Administração Tributária tenha renovada, por vias transversas e muitas vezes intempestivamente – dado o eventual

11 “Art. 41 Quando, em exames posteriores, diligências ou perícias realizados no curso do processo, forem verificadas incorreções, omissões ou inexatidões, de que resultem agravamento da exigência inicial, inovação ou alteração da fundamentação legal da exigência, será efetuado lançamento complementar por meio da lavratura de auto de infração complementar ou de emissão de notificação de lançamento complementar, específicos em relação à matéria modificada (Decreto no 70.235, de 1972, art. 18, § 3o, com a redação dada pela Lei no 8.748, de 1993, art. 1o). § 1o O lançamento complementar será formalizado nos casos: I - em que seja aferível, a partir da descrição dos fatos e dos demais documentos produzidos na ação fiscal, que o autuante, no momento da formalização da exigência: a) apurou incorretamente a base de cálculo do crédito tributário; ou b) não incluiu na determinação do crédito tributário matéria devidamente identificada; ou II - em que forem constatados fatos novos, subtraídos ao conhecimento da autoridade lançadora quando da ação fiscal e relacionados aos fatos geradores objeto da autuação, que impliquem agravamento da exigência inicial. [...]” (grifou-se)

12 Neder e López, 2010, p.440.

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decurso, à época do julgamento administrativo, dos prazos decadenciais que detinha para praticar determinados atos de ofício - a oportunidade de sanear seus atos ou de baseá-los em novos fundamentos).

Mas é importante ter em conta que a inviabilidade de julgamento com base em novos fundamentos não é irrestrita. Para além das já referidas questões de direito aferíveis de plano e, portanto, passíveis de serem levantadas de ofício, deve haver possibilidade de inovação naqueles casos em que determinadas razões, apesar de não terem sido levadas à condição de fundamentos do ato administrativo recorrido (em razão da adoção, pela autoridade fiscal, de uma questão prejudicial ou antecedente), restaram abordadas/veiculadas no processo, tendo sido objeto do procedimento fiscal preparatório do lançamento ou do despacho decisório. Nesta hipótese, o prévio conhecimento da matéria por parte do contribuinte e a já produção de provas em relação a ela, autoriza o julgador a levantá la como fundamento de sua decisão, ou mesmo de requerer diligências destinadas a complementar o quadro probatório acerca daquela matéria específica (já que em relação já há, ao menos, princípio de prova). Trata se, aqui, de ponderar a vedação à inovação em sede contenciosa (que existe com o fim de preservar o direito à ampla defesa e a imparcialidade do julgador), com a natureza específica da relação jurídico tributária (influenciada que é pelos princípios do interesse público, da indisponibilidade dos interesses em questão etc.). Mas é importante destacar a necessária referibilidade que deve haver entre o novo fundamento e a matéria já veiculada anteriormente no processo. Esta possibilidade de abordagem, em sede contenciosa, de matéria que, apesar de não levada a fundamento do ato de ofício contestado, foi veiculada no procedimento fiscal, é análoga à possibilidade, expressamente prevista nos parágrafos 1.o e 2.o do artigo 1.013 do CPC, de que no julgamento da apelação, o tribunal, ao conhecer da matéria impugnada, aprecie também “todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado ” e que “quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais”. Justifica se a exceção pelo respeito ao princípio da vedação à decisão surpresa 13 e pela circunstância de a matéria ter sido já trabalhada e conhecida pelas partes na fase pré-decisão.

Importa destacar, ao final deste item, decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Carf, que vêm reiteradamente adotando a ideia da impossibilidade de inovação em sede de julgamento administrativo:

Acórdão nº 2201004.036 (09/11/2017)

Ementa: INOVAÇÃO DA TESE DE DEFESA EM SEDE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. EXCEÇÃO Não se conhece das matérias em sede recursal, fundamentadas em teses totalmente distintas daquelas apresentadas na defesa em vista da flagrante violação ao princípio da dialeticidade e supressão de instância, restando inviável o conhecimento dessas matérias. Exceção àquelas matérias de ordem pública.

13 Como bem assinala Nelson Nery Junior (in “Princípios do Processo na Constituição Federal”, RT, 2010, p.225), ao tratar da inadmissibilidade da decisão surpresa, “a parte não pode ser surpreendida por decisão fundada em fatos e circunstâncias a respeito das quais não tenha tomado conhecimento [...], vale dizer, fatos que não esclareçam o porquê da decisão. Decorre diretamente da cláusula do devido processo legal, que integra o princípio do due process of law (CF 5.o, LIV), e do princípio do contraditório (CF 5.o, LV), a proteção das partes contra a decisão surpresa”.

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Acórdão n.° 107-09.433 (26/06/2008)

Ementa: IRPJ - LANÇAMENTO ORIGINÁRIO - INOVAÇÃO PELA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DE JULGAMENTO - IMPOSSIBILIDADE - A competência do órgão Julgador está circunscrita aos fundamentos do lançamento efetuado pela autoridade fiscal, sendo lhe defeso aperfeiçoá lo ou inová lo de qualquer forma, sob pena de transposição de sua competência legal. Não havendo a autoridade lançadora imputado ao contribuinte conduta dolosa, não poderia a DRJ assim proceder, sob pena de inovar o lançamento originário.

Acórdão n.° 195 0.150 ( 03/02/ 2009)

Ementa: INOVAÇÃO DO LANÇAMENTO PROCEDIDA POR DRJIMPOSSIBILIDADE - DECADÊNCIA - É defeso à autoridade julgadora atribuir se a condição de autoridade preparadora e lançadora inovando o lançamento e assumindo, concomitantemente, a postura de autoridade lançadora/julgadora, sobretudo quando já decaíra o direito de a Fazenda Pública rever ou celebrar o lançamento de oficio.

Acórdão n.º 340101.229 (03/02/2011)

Ementa: MATÉRIA ESTRANHA À LIDE. NÃO CONHECIMENTO. De não se conhecer do Recurso Voluntário na parte em que o mesmo trata de matérias estranhas à lide, não obstante, de forma equivocada, as mesmas tivessem constado da decisão recorrida. No caso, o Acórdão da DRJ incluiu dois fundamentos que não haviam sido suscitados no Despacho Decisório.

Acórdão n.o 205 01.453 (03/12/2008)

Ementa: CERCEAMENTO DE DEFESA. DECISÃO COM ANÁLISE DE ARGUMENTO QUE NÃO CONSTA NO LANÇAMENTO. A decisão de primeira instância deve analisar e enfrentar argumentos presentes no lançamento e no recurso. A inovação de motivação confunde o sujeito passivo, cerceando sua defesa.

Como se percebe, as decisões tratam de vetar a inovação, em dois sentidos distintos: tanto nos casos em que o órgão julgador inova nas razões de manutenção do ato administrativo contestado, quanto nos casos em que o contribuinte inova nas razões de contestação junto à segunda instância.

2.3. A Fase Contenciosa do Processo Administrativo Fiscal e a Revisão de Ofício

Sempre foi polêmica a questão da convivência entre as duas possibilidades de revisão dos lançamentos tributários: aquela resultante da apreciação de recurso administrativo proposto pelo sujeito passivo (inciso I do artigo 145 do CTN) e aquela associada à revisão de ofício pela autoridade administrativa (inciso III do artigo 145 do CTN). As questões que sempre se colocaram, eram, dentre outras, as seguintes: impugnado o lançamento, poderia ainda haver revisão de ofício? Se sim, em que termos ou com quais limites? Qual o limite temporal para a revisão de ofício, se é que há algum?

Tais questões restaram respondidas pela Administração Central da Secretaria da Receita Federal do Brasil - RFB, por meio do Parecer Normativo n.º 8, de 03/09/2014. Por tal ato administrativo, ficou firmada a possibilidade de revisão de ofício de lançamento ou despacho decisório já julgados pelo contencioso administrativo, diante da superveniência de novos elementos que pudessem alterar o quadro de fato ou de direito até então considerado.

No referido PN a Coordenação Geral de Tributação da RFB - Cosit tratou do assunto em três partes: a) revisão e retificação de ofício – de lançamento de ofício e de

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débito confessado em declaração, respectivamente , em prol do contribuinte, para fins de reduzir créditos tributários constituídos; b) revisão de ofício, em prol do contribuinte, de despacho decisório em sede de compensação tributária; e c) recorribilidade em sede de execução de julgado administrativo, no que toca à apuração de cálculos.

Nas conclusões do Parecer Normativo Cosit n.º 8/2014 (item 81) estão sumarizadas as orientações que passaram a ter efeito vinculante para a atuação da Administração Tributária.

De início, importa ressaltar a orientação de que a revisão de ofício pode ser feita a qualquer tempo, enquanto não extinto o crédito tributário. Mesmo que o crédito tributário tenha sido objeto de recurso apreciado pelo contencioso administrativo, a revisão poderá ser feita, desde que não se centre em questão especificamente analisada pelos órgãos julgadores. Se, porém, posteriormente vier a tona outra questão de fato ou de direito não especificamente abordada pelos órgãos julgadores, a revisão de ofício poderá ser regularmente efetuada a qualquer tempo.

Os demais pontos de destaque do Parecer Normativo Cosit n.º 8/2014 são os seguintes:

(a) revisão de ofício de lançamento regularmente notificado, para reduzir o crédito tributário: “pode ser efetuada pela autoridade administrativa local para crédito tributário não extinto e indevido, no caso de ocorrer uma das hipóteses previstas nos incisos I, VIII e IX do art. 149 do CTN, quais sejam: quando a lei assim o determine, aqui incluídos o vício de legalidade e as ofensas em matéria de ordem pública; erro de fato; fraude ou falta funcional; e vício formal especial, desde que a matéria não esteja submetida aos órgãos de julgamento administrativo ou já tenha sido objeto de apreciação destes”;

(b) retificação de ofício de débito confessado em declaração, para reduzir o saldo a pagar a ser encaminhado à PGFN para inscrição na Dívida Ativa: “pode ser efetuada pela autoridade administrativa local para crédito tributário não extinto e indevido, na hipótese da ocorrência de erro de fato no preenchimento da declaração”;

(c) revisão de ofício de despacho decisório que não homologou compensação: “pode ser efetuada pela autoridade administrativa local para crédito tributário não extinto e indevido, na hipótese de ocorrer erro de fato no preenchimento de declaração (na própria Dcomp ou em declarações que deram origem ao débito, como a DCTF e mesmo a DIPJ, quando o crédito utilizado na compensação se originar de saldo negativo de IRPJ ou de CSLL), desde que este não esteja submetido aos órgãos de julgamento administrativo ou já tenha sido objeto de apreciação destes”;

(d) competência para a revisão de ofício: “ compete à autoridade administrativa da unidade da RFB na qual foi formalizada a exigência fiscal proceder à revisão de ofício do lançamento, inclusive para as revisões relativas à tributação previdenciária”;

(e) instrumento formal para a realização da revisão de ofício: “o despacho decisório é o instrumento adequado para que a autoridade administrativa local efetue a revisão de ofício de lançamento regularmente notificado, a retificação de ofício de débito confessado em declaração, e a revisão de ofício de despacho decisório que decidiu sobre reconhecimento de direito creditório e compensação efetuada”.

Para além destas definições, o Parecer Normativo Cosit n.º 8/2014 formaliza alguns outros importantes entendimentos. Um de destacada importância é aquele que define, por

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assim dizer, o que seria a natureza da revisão de ofício. Diz o item “81.f” do PN que “ a revisão de ofício nas hipóteses aqui tratadas não se insere nas reclamações e recursos de que trata o art. 151, III, do CTN, regulados pelo Decreto nº 70.235, de 1972, tampouco a ela se aplica a possibilidade de qualquer recurso, uma vez que, ainda que possa ser originada de uma provocação do contribuinte, é procedimento unilateral da Administração, e não um processo para solução de litígios”. Ao mesmo tempo, porém, define que (item 81.g) “para os casos de reconhecimento de direito creditório e de homologação de compensação alterados em virtude de revisão de ofício do despacho decisório que tenha implicado prejuízo ao contribuinte, em atenção ao devido processo legal, deve ser concedido o prazo de trinta dias para o sujeito passivo apresentar manifestação de inconformidade e, sendo o caso, recurso voluntário, no rito processual do Decreto nº 70.235, de 1972, enquadrando se o débito objeto da compensação no disposto no inciso III do art. 151 do CTN”.

Em outras palavras, a revisão de ofício, em princípio, não abre a possibilidade de contestação administrativa do despacho decisório que a formalizou (o que parece estar justificado, na tessitura do PN, pelo fato de que tais revisões não se confundem com recursos administrativos e são feitas em benefício do sujeito passivo). Entretanto, quando há prejuízo ao sujeito passivo (o que só é permitido, dentre as hipóteses tratadas pelo PN, nos casos de processos de reconhecimento de direito creditório, nas hipóteses de despachos decisórios que tratam de indeferir, por novas razões, crédito anteriormente concedido pelos órgãos julgadores do contencioso administrativo), aberta fica a possibilidade de reiniciar a discussão na via contenciosa administrativa, mediante a apresentação de nova manifestação de inconformidade e, se for o caso, de novo recurso voluntário.

Esta possibilidade de a Administração Tributária prolatar novos despachos decisórios indeferindo o direito creditório por razões distintas das adotadas no despacho decisório originário, ocorre na oportunidade da execução das decisões do contencioso administrativo, como expõe o item “81.i” do PN:

[...] na execução de decisão de órgão julgador administrativo, observam se rigorosamente os limites materiais estabelecidos por este, inclusive quanto aos valores reivindicados pelo contribuinte, se sobre eles o órgão já houver se manifestado e declarado objetivamente no julgado; todavia, se no ato de execução do acórdão pela autoridade local houver discordância do contribuinte quanto aos valores apurados, e sobre os quais o órgão julgador não tenha se manifestado, devolvem-se os autos do processo às mesmas instâncias julgadoras, a fim de ser julgada a controvérsia quanto aos valores, sob o rito do Decreto nº 70.235, de 1972, não tendo que se falar em decurso do prazo de que trata o §5º do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996

Posteriormente, o item “81.i” do PN nº 8/2014 acabou revogado pelo Parecer Normativo Cosit nº 2, de 23/08/2016, e isso com o fim de restringir a possibilidade de prolação de um novo despacho decisório, a situações nas quais o despacho decisório originário tivesse indeferido o direito creditório por razões antecedentes à análise em si da existência desse direito. Em outras palavras, nos casos em que no despacho decisório originário o crédito não tiver sido reconhecido em face de uma questão prejudicial (como a prescrição, por exemplo), a eventual decisão do contencioso administrativo anulando es se despacho (pelo não acatamento da questão prejudicial) dá margem à prola ção de um novo despacho decisório por parte da autoridade fiscal responsável pela execução do acórdão, indeferindo novamente o direito creditório, mas agora em razão da constatação

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de que, afastadas as prejudiciais e analisado concretamente o mérito do pleito repetitório, não resta confirmada a existên cia do crédito.

Esta delimitação do alcance da revisão de ofício inicialmente estabe lecido pelo item “81.i” do PN nº 8/2014, está assim expresso de forma literal no item “16.b” do PN nº 2/2016:

[…]

b) exclusivamente no processo administrativo fiscal referente a reconheci mento de direito creditório em que ocorreu decisão de órgão julgador administrativo quanto à questão prejudicial, inclusive prescrição para alegar o direito creditório, incumbe à autoridade fiscal da unidade lo cal analisar demais questões de mérito ainda não apreciadas no con tencioso (matéria de fundo, inclusive quanto à existência e disponibi lidade do valor pleiteado), cuja decisão será passível de recurso sob o rito do Decreto nº 70.235, de 1972, não tendo que se falar em decurso do prazo de que trata o § 5º do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996;

[…]

Importa, portanto, ter em conta que em razão da delimitação posta pelo PN nº 2/2016, só pode haver um novo despacho decisório indeferindo direito creditório, nos casos em que o despacho originário não tiver ingressado na apuração concreta do crédito (pela referida adoção de uma questão prejudicial). Se, porém, o indeferimento inicial já tiver se dado por razões re ferentes ao mérito em si do crédito, aí não poderá a Administração Tributária prolatar novo despacho decisório, renovando as razões de indeferimento.

Bem, diante dessas possibilidades de revisão de ofício de lançamentos tributários e de despachos decisórios (postas pelos PNs nºs 8/2014 e 2/2016), questões que se pode colocar são, dentre outras, as seguintes: na medida em que está aberta a possibilidade de revisão de ofício e considerando‑se que tal revisão, no caso de lançamento de ofício, pode reduzir o crédito tributário lançado, mas não na proporção defendida pelo contribuinte, será que se sustenta a não oferta de recurso? A possibilidade de a Administração Tributária, no caso dos processos de reconhecimento de direito creditório, gerar novos despachos decisórios indeferindo os créditos pleiteados e concedidos pelos órgãos julgadores é desprovida de limites temporais?

Esta segunda questão, aliás, aparece respondida no PN nº 8/2014, no item “81.j”, nos seguintes termos:

[…] não ocorre preclusão administrativa para fins de aferir o valor corre to do crédito pleiteado pelo contribuinte, em fase de execução de julgado favorável a este, o qual não contenha manifestação sobre o aspecto quan titativo, quer seja por ser esta fase o momento processual oportuno, quer seja pelo princípio da indisponibilidade do interesse público

Discutível, porém, se a resposta é suficiente para se ter por afastada a homologação tácita prevista no art. 74 da Lei nº 9.430/1996. Ademais, a so lução do PN pode levar a solução administrativa acerca dos créditos pleitea dos em compensação para um lapso temporal sem fim: sim, pois na medida em que depois do despacho decisório originário (inicial) não há mais prazo para a homologação da compensação, poderá o sujeito passivo ficar com suasituação indefinida por prazo imprevisível.

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Importa ainda destacar o comando do item “81.h” do PN nº 8/2014, que trata da revisão de ofício no caso da existência de ação judicial. Como é sabido, a regra acerca da convivência simultânea entre processo administrati vo e processo judicial é a de que a opção pela via judicial implica na renúncia tácita à via administrativa (Parecer Normativo Cosit nº 7/2014). No que se refere à revisão de ofício, porém, a disciplina é outra: diz o PN nº 8/2014 que: “[…] a revisão de ofício não é obstada pela existência de ação judicial com o mesmo objeto. Todavia, advindo, decisão judicial transitada em julgado, so mente esta persistirá, em face da prevalência da coisa julgada e da jurisdição única”.

Por fim, cumpre ressaltar que a partir do quadro normativo trazido pelo PN nº 8/2014 e pelo PN nº 2/2016, as decisões do contencioso adminis‑ trativo são definitivas em relação às questões expressamente apreciadas pelos órgãos julgadores. Como a revisão de ofício pode ser efetuada a qualquer tempo desde que sejam trazidas novas questões de fato não apreciadas pelo contencioso, não se pode dizer que há uma posição final da Administração Tributária quanto aos atos administrativos contestados a partir do encerramento da fase contenciosa (apenas a extinção do crédito é que traz estabi ‑ lidade final para a situação jurídica). Salvo melhor juízo, a solução adotada pela Cosit induz à ideia de que se pode ter alguns fatos sendo apreciados pelo contencioso e outros pelas unidades da RFB que formalizaram o ato contesta do (o que se daria, por exemplo, nas situações em que o sujeito passivo alega alguns fatos na impugnação e alguns outros em pedido de revisão de ofício – este formalizado depois do prazo para impugnação). Na medida em que os fatos nem sempre são de fácil elucidação e considerando se que a Cosit não impõe limites aos fatos que podem servir à alegação da presença de vícios no caso de demanda por revisão de ofício, é de se projetar agora que nas duas esferas de apreciação – o contencioso e a atuação de ofício das unidades de fiscalização – se terá ou se poderá ter dirimição extensiva de matéria de fato.

De outro lado, o PN nº 8/2014 (mesmo com os temperamentos do PN nº 2/2016) criou um verdadeiro novo procedimento para o processamen to dos pedidos de reconhecimento de direito creditório. Agora, no ato de liquidação das decisões “definitivas” do contencioso administrativo favoráveis ao sujeito passivo, a autoridade fiscal poderá levantar outras matérias não apreciadas por esse contencioso, prolatando um novo despacho decisório in deferindo o direito creditório por conta de outras razões –de fato ou de direito – não originalmente levantadas no despacho decisório originário (desde, por óbvio, que em consonância com a delimitação já referida, posta no PN nº 2/2016); e quanto a este novo despacho decisório, o sujeito passivo poderá apresentar nova manifestação de inconformidade, que reacionará o conten cioso administrativo a partir da primeira instância. Por fim, o mesmo PN des taca que o novo despacho decisório pode ser prolatado a qualquer tempo, já que a partir do despacho decisório originário não correria mais o prazo para a homologação tácita previsto para os casos de compensação.

2.4. O Controle Exercido pela Administração sobre Seus Atos

No que se refere ao controle exercido pela Administração sobre os atos praticados por seus agentes, o artigo 53 da Lei n.º 9.784, de 21/01/1999 – a chamada “lei geral do processo administrativo” , comanda que: “A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos”. O preceito, à evidência, reproduz a regra do

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Direito Administrativo de que os atos administrativos podem ser revogados, por motivo de conveniência ou oportunidade, ou anulados, quando eivados de vício de legalidade.

No processo administrativo fiscal, porém, em face de os atos serem exercidos, em regra, por meio do poder vinculado, não cabe “revogação”, mas apenas “anulação” dos atos que compõem o iter processual.

2.5. As Vantagens do Processo Administrativo Fiscal

A existência de um sistema administrativo de contencioso fiscal traz várias vantagens tanto para o contribuinte quanto para a própria Administração Pública. Para o contribuinte, podem ser elencadas as seguintes:

(a) a simples opção pela via administrativa implica na suspensão da exigibilidade do crédito tributário (artigo 151, III, do Código Tributário Nacional). É de se lembrar que a simples interposição de uma ação judicial não tem o mesmo efeito; para que o contribuinte, nesta esfera, obtenha a suspensão da exigibilidade do crédito contestado, é necessário que lhe seja concedida uma medida liminar ou uma tutela antecipada, ou efetue o depósito do montante integral (artigo 151, II, IV e V, do CTN);

(b) na esfera administrativa não há o excessivo apego às formalidades processuais, típico do processo judicial. E uma das mais importantes exteriorizações deste desapego às formalidades é a desnecessidade de que, no contencioso administrativo, o contribuinte se faça representar por advogado;

(c) a gratuidade do processo administrativo (não existem as custas processuais e nem o ônus da sucumbência previstos no processo judicial);

(d) a esfera administrativa propicia ao contribuinte a apreciação de suas alegações por mais uma esfera estatal, ou seja, a própria Administração Pública, no âmbito da qual os órgãos julgadores são especializados em matéria tributária. É certo que os julgadores administrativos devem subordinação aos atos administrativos editados pela Administração Tributária, mas tal restrição não é de ordem tal a descaracterizar os benefícios da alternativa colocada ao contribuinte;

(e) por fim, o uso da via administrativa posterga, no tempo, o encaminhamento, por parte da Administração Tributária, da comunicação ao Ministério Público acerca da eventual prática de crime tributário por parte do sujeito passivo. É que a persecução penal só se dá após a decisão administrativa final, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal, com a adoção do entendimento hoje posto na Súmula Vinculante n.o 24, de 2009: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1.º, inciso I, da Lei n.º 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.

Do ponto de vista da Administração Tributária, o contencioso administrativo fiscal tem importância na medida em que lhe permite rever os atos praticados por seus agentes, com isso exercendo, por mais uma via, o devido controle sobre a legalidade dos atos administrativos. A importância desta atuação importa não apenas à busca pela regularidade legal dos lançamentos, mas também à tentativa de evitar que exigências fiscais indevidas acabem onerando a Fazenda Pública por conta de sua preservação no tempo. Interessa à Administração que atos irregulares sejam invalidados rapidamente, dado que a invalidação tardia pode representar, em face da decadência, a perda do direito

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de refazer a exigência, além do que a manutenção de atos irregulares pode demandar ações judiciais, no âmbito das quais os ônus para a Fazenda se ampliam.

Dentro deste quadro, a existência de sistemas administrativos de solução de litígios tributários traz grandes benefícios tanto para a Administração Pública quanto para os contribuintes. Não se trata de negar a importância das vias judiciais - até porque elas são uma imposição constitucional na maior parte das ordens constitucionais ao redor do mundo e ocupam um importante espaço na aferição da legalidade dos atos administrativos , mas é preciso reconhecer que a solução de litígios no âmbito administrativo serve tanto para o aperfeiçoamento da atividade e para a redução de custos da Administração Tributária, como para a facilitação da vida do contribuinte, que pode ver sua situação tributária resolvida sem a necessidade de dirigir se ao âmbito judicial.

Outros benefícios associados à existência de sistema administrativo de solução de litígios se referem à maior flexibilidade dos tribunais administrativos em relação à adequação de suas decisões às políticas públicas e à prescrição de condutas futuras tanto da própria Administração quanto dos contribuintes. É como bem ressalta Antonio Fonseca ao comparar a revisão judicial com a revisão administrativa:

A revisão judicial se realiza em resposta às questões trazidas ao exame da corte sem preocupação com os amplos objetivos de uma política previamente estabelecida. Os remédios buscados na revisão judicial visam corrigir ações ilegais, não prescrições para futura conduta da administração. A justiça administrativa tende a se orientar pelos princípios da economia (eficiência dos meios), velocidade nas decisões, capacidade de adaptação à variação de condições, flexibilidade nas tecnicidades formais, pouca aderência ou vinculação aos seus precedentes e formação eclética dos membros do colegiado. Ademais, a justiça administrativa combina prática com teoria, busca uma abordagem multidisciplinar e se submete a uma revisão interna e externa. Há uma crença de que esse formato é mais adequado à defesa do interesse público do que a rigidez do sistema judicial.

A diversidade de estrutura da justiça administrativa e do sistema judicial nem sempre é compreendida. Pelo contrário, às vezes é motivo de críticas. (...) O fato destacável é que o controle judicial continua insubstituível pela capacidade de as cortes contribuírem para manutenção dos altos padrões de administração pública que a agência deve perseguir. 14

Essa visão da atuação administrativa tendente à solução de litígios se concilia, em certa medida, com as mudanças operadas no Direito Administrativo nos últimos anos e que consubstanciam no que hoje se chama de "nova dimensão do processo administrativo", como já se fez referência no item 1.1 deste trabalho. Como lá se viu, a atuação administrativa, no que se refere à solução de casos concretos, acaba se conformando como uma busca contínua de aperfeiçoamento das relações com os cidadãos, o que faz com que, mesmo na solução de situações específicas, o foco esteja não apenas nestes casos concretos, mas na criação de normas de maior alcance, genéricas e abstratas, que sejam indutoras de condutas e difusoras de um modo de atuar da Administração que seja previsível e consistente no tempo.

Evidenciado resta, portanto, para além de suas vantagens, o locus diferenciado dos sistemas administrativos de solução de litígios.

14 Antonio Fonseca, 1998, p. 232-233.

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2.6. As Fontes do Processo Administrativo Fiscal

A definição das fontes do processo administrativo fiscal passa, necessariamente, pelos termos do inciso I do parágrafo único do artigo 2.o da Lei n.o 9.784/1999 (a lei geral do processo administrativo), assim postos: “Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: I - atuação conforme a lei e o Direito; [...]”. A referência do dispositivo legal à “lei” e ao “Direito”, induz à distinção entre a lei em sentido estrito e o Direito como acepção de ordem jurídica em sentido amplo. De tal sorte, a norma estabelece como fontes do processo administrativo não apenas a lei em espécie, mas também o conjunto de fontes que informam o Direito, como tais a jurisprudência, os princípios gerais de direito, outras espécies normativas etc.

Do ponto de vista das normas jurídicas que regulam o PAF, tem se normas específicas, que são aquelas que definem regras de estruturação dos órgãos de julgamento, de competência para realização dos atos processuais e que explicitam os direitos e deveres das partes. Neste nível, destacam se o Decreto n.o 70.235/1972 e o Decreto n.º 7.574/2011, que regulam o processo de determinação e exigência de créditos tributários federais e outras espécies de processo administrativo com afetação tributária, e ao lado deles, outros atos legais que regulam determinadas espécies de processo administrativo.

Importa ainda destacar o Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - RI do Carf, aprovado pela Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015 (alterada por várias Portarias posteriores, sendo a última delas a Portaria MF n.o 153/2018). O RI do Carf tem especial importância porque apenas nele está minudentemente detalhado o procedimento na esfera daquele órgão julgador de segunda instância e de instância especial.

Na esfera da primeira instância, a da atuação das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento - DRJ, o ato legal que complementa sua disciplina procedimental é a Portaria MF n.o 340, de 08/10/2020.

Num plano mais largo, há normas gerais que se aplicam ao conjunto de processos administrativos e, por extensão, ao PAF. É o caso, justamente da Lei n.o 9.784/1999, que trata de definir regras de relacionamento entre a Administração e os cidadãos, seus direitos e deveres. É certo que a Lei n.o 9.784/1999 tem aplicação subsidiária no PAF (como expressa seu artigo 69, “Os processos administrativos específicos continuarão a reger se por lei própria, aplicando se lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei ”), mas em alguns temas, dada a parca disciplina dos atos legais que disciplinam cada uma das espécies de processo administrativo fiscal, tal aplicação se torna muito frequente.

Por fim, importa destacar como fonte do PAF o Código de Processo Civil. Este diploma legal, apesar de aplicar se ao processo judicial tributário, comporta aquilo que se poderia chamar de o núcleo do direito processual pátrio, sendo recorrente, portanto, seu uso no processo administrativo diante de omissões na disciplina processual administrativa. E tal aplicação, por muito tempo adotada não na letra da lei, mas construída pela jurisprudência administrativa, se justificava em face de parecer bastante razoável que, diante de lacunas na Lei n.o 9.784/1999 e nos atos legais que disciplinam as várias espécies de processo administrativo, se buscasse no CPC o preenchimento da omissão legal. Com isso se privilegiava uma certa ordem de coerência da ordem processual nacional, o que trazia evidentes benefícios em termos de previsibilidade da

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atuação estatal e de compatibilização entre as esferas administrativa e judicial (subordinadas que estão, atualmente, por princípios constitucionais comuns).

Não obstante essa aplicação do codex processual à esfera administrativa por força de entendimento da jurisprudência administrativa, com a edição do novo CPC por meio da Lei n.o 13.105/2015, a questão ganhou status por via de expressa disposição legal. É que o artigo 15 da referida Lei determina que "Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente". Ou seja, nos casos de ausência de disposição específica na legislação administrativa, ou seja, diante de uma lacuna legal, cabe a aplicação supletiva do CPC ao PAF; já diante da insuficiência normativa na lrgislação administrativa, cabe a aplicação subsidiária do mesmo CPC.

Exemplos de aplicação subsidiária do CPC no PAF são muitos. Um dos principais envolve aquele que é um dos temas fundamentais do processo: a prova. Como as regras de direito probatório são extremamente rarefeitas na legislação administrativa, ao longo do tempo se consolidou o uso subsidiário das regras do CPC. E assim tem sido em relação a vários outros temas.

2.7. O Modelo de Processo do Novo CPC e o PAF

Apesar das inúmeras divergências relacionadas com a aplicabilidade do novo CPC (Lei n.o 13.105/2015) ao PAF, certo é que o processo administrativo não pode mais passar ao largo da disciplina do processo judicial. É que com a submissão do processo administrativo a princípios informadores do processo judicial, como é caso dos princípios do contraditório e da ampla defesa, não se pode mais deixar de reconhecer a existência de um novo modo de pensar o processo que não mais restringe seu alcance à atuação jurisdicional.

De um ponto de vista geral, pode se sumarizar as novidades consolidadas no novo CPC, a partir de um esquema bastante simples:

(a) parte se da "constitucionalização do processo", pela incorporação concreta, não meramente retórica, dos inúmeros princípios processuais postos na Constituição Federal, dentro do CPC;

(b) com isso, ganha papel central a adoção do "contraditório substancial", ou seja, a ampliação do debate pela oferta efetiva da possibilidade de as partes saberem do que no processo se passa e de terem ampliados seus meios de se manifestarem producentemente;

(c) associados ao contradório substancial aparecem o dever de "cooperação" (destinado à enfatização do protagonismo das partes e do juiz) e o princípio da "primazia do julgamento de mérito" (que visa o combate à jurisprudência defensiva e a consequente busca da decisão de mérito, que é o fim almejado para qualquer litígio;

(d) com a ênfase no contraditório substancial e na primazia do julgamento de mérito, tem se a possibilidade do "fortalecimento da fundamentação" das decisões judiciais, acentuado pela migração do livre convencimento motivado para o "livre convencimento fundamentado" (é preciso não apenas identificar o motivo, mas também sopesá lo em face de outros motivos);

(e) com decisões melhor fundamentadas e baseadas em debate ampliado, intenta se um dos objetivos primordiais do novo modelo: a "redução da taxa de reforma" das

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decisões, com todas as vantagens que isso traz em termos de segurança jurídica e previsibilidade;

(f) por fim, com decisões fundamentadas e com baixo índice de reforma, se pode pensar em ter provimentos jurisdicionais com vocação para servirem de substrato para um sistema que usa os precedentes como técnica decisória.

Q,oper-ação

Diante de um tal modelo, importantes condicionantes são postas para o processo administrativo. Para além da desejada coerência entre os diferentes sistemas processuais, é inegável a contribuição que o contraditório substancial, a primazia do julgamento de mérito, a fundamentação majorada e o sistema de precedentes trazem para o processo de gradual aperfeiçoamento da atuação judicante administrativa, em três planos distintos:

(a) no plano estratégico: pela influência do novo CPC na reformulação e/ou modernização do modelo de PAF que se tem (mudanças normativas);

(b) no plano operacional: pelo uso do novo CPC no PAF, em face da aplicação supletiva - diante de lacunas - e subsidiária - diante de insuficiências normativas (mudanças de mentalidade);

(c) no plano inter normativo: pelas mudanças sofridas por institutos, conceitos e categorias do processo civil, que interferem ou influenciam a atuação processuual administrativa (mudanças impostas).

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FIGURA 7: o modelo constitucional do processo no novo CPC. OONSlllUCJ(WAI 1:z,çlo DO PRDCEB90
Incorporação dos valores constitucionais
Contracitório &mstancial Ampliação do debate Protagonismodaspa1esedojuiz Primazia do jyJg. de mérito Comldeàjurisprudência defensiva Fortalecimento da fwulamentação Uvreconvencimentofundamentado Redução da taxa de reforma Pelo debae aprofundado Decisõescomosubstratodeumsistenm(Jleusaos premdentesmmotécnic:adedsória

3. Princípios do Processo Administrativo Fiscal

São muitos os princípios constantes da nossa ordem jurídica, que informam os processos administrativos, de forma geral, e o processo administrativo fiscal, especificamente. Em razão do caráter e dos limites do presente trabalho, não será feita aqui uma análise exaustiva de todos estes princípios, mas apenas indicados aqueles relacionados mais diretamente ao processo administrativo fiscal. Maiores digressões serão feitas apenas em relação a alguns princípios que apesar de comporem a base principiológica clássica do PAF, merecem, ao juízo do autor, reformulação ou ao menos uma melhor explicitação de seus conteúdos, como tais os princípios do informalismo, da verdade material, do contraditório e da ampla defesa e do devido processo legal.

3.1. Princípio do Informalismo

Muito embora a formulação principiológica clássica do processo administrativo –proposta muito antes da promulgação da atual Constituição Federal - estabeleça como um dos princípios informadores básicos deste campo do direito adjetivo o do informalismo, verdade é que tal formulação precisa ser repensada a partir do quadro que hoje se tem, especificamente no âmbito do processo administrativo fiscal.

Certo é que o informalismo manifesta se em vários aspectos do processo, mas também é certo que o elemento que, acima de qualquer outro, mais define o nível de formalidade/informalidade são as feições do rito procedimental. Assim, se no contencioso específico que se tem em mira o procedimento regrado é rígido, estabelecendo prazos preclusivos para a prática dos atos que o compõem in concreto e definindo minudentemente os ônus processuais entre as partes, não se pode dizer que tal procedimento seja informado pelo princípio da informalidade; pode até ser que o informalismo se manifeste em algumas questões secundárias, acessórias, mas princípio informador não será.

No caso do processo administrativo fiscal, tem se um rito procedimental pontilhado, entre outros aspectos, por: (a) prazos preclusivos para a apresentação dos recursos e para a produção de provas; (b) atribuições rígidas de competência entre os vários órgãos especificamente criados para a apreciação do litígio; (c) vedações expressas à apreciação do litígio em face de circunstâncias detalhadamente definidas (entre tais a existência de ação judicial com o mesmo objeto); enfim, permeado está o contencioso administrativo fiscal por circunstâncias que enrijecem muito seu procedimento.

Nestes termos, não se pode mais afirmar o informalismo como princípio informador do PAF; numa nova formulação principiológica, deve se partir, no mínimo, do “formalismo moderado” defendido pela eminente administrativista Odete Medauar. A circunstância de o processo administrativo fiscal não manifestar apego exacerbado às formas (como se depreende, por exemplo, do não estabelecimento de requisitos formais específicos para a apresentação de recursos – em termos de conteúdo ou legitimidade ad processum), não desnatura o fato de que seu procedimento é, sim, rígido, o que leva à

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conclusão de que, muito embora não expurgado do contencioso administrativo, não mais serve o informalismo irrestrito como princípio informador deste campo jurídico.

3.2. Princípio da Verdade Material

Grande parte da doutrina estabelece como um dos princípios básicos do processo administrativo o da “verdade material”; pela verdade material, ou substancial, não estaria adstrito o julgador a uma pré hierarquização do material probatório ou a uma limitação apriorística do alcance de sua atuação cognitiva. A distinção entre verdade material e verdade formal nasceu da contraposição entre processo penal e processo civil, escudando se na convicção de que neste último os interesses/bens em jogo seriam bem menos relevantes que naquele. Assim, justificada estaria um menor grau de segurança no processo civil, trocando-se a maior certeza pela maior celeridade; em outros termos, adota se a verdade formal, como conseqüência de um procedimento permeado por inúmeras formalidades para a colheita das provas, por inúmeras presunções legais definidas aprioristicamente pelo legislador, etc. Entretanto, tal distinção entre verdade material e verdade formal tem sido gradativamente eliminada pela doutrina pátria, como o evidencia o seguinte excerto:

Atualmente, a distinção entre verdade formal e substancial perdeu seu brilho. A doutrina moderna do direito processual vem sistematicamente rechaçando esta diferenciação, corretamente considerando que os interesses objeto da relação jurídica processual penal não têm particularidade nenhuma que autorize a inferência de que se deve aplicar a estes método de reconstrução dos fatos diverso daquele adotado pelo processo civil. Realmente, se o processo penal lida com a liberdade do indivíduo, não se pode esquecer que o processo civil labora também com interesses fundamentais da pessoa humana – como a família e a própria capacidade jurídica do indivíduo e os direitos metaindividuais – pelo que totalmente despropositada a distinção da cognição entre as áreas. [...] A idéia de verdade formal é, portanto, absolutamente inconsistente e, por esta mesma razão, foi (e tende a ser cada vez mais), paulatinamente, perdendo seu prestígio no seio do processo civil. A doutrina mais moderna nenhuma referência mais faz a este conceito, que não apresenta qualquer utilidade prática, sendo mero argumento retórico a sustentar a posição cômoda do juiz de inércia na reconstrução dos fatos e a freqüente dissonância do produto obtido no processo com a realidade fática. 15

A superação da dicotomia entre verdade formal e verdade material não leva, entretanto, à consagração desta última. Com efeito, a verdade absoluta ainda está no campo da utopia, do ideal, fazendo com que a busca do julgador seja antes pela verossimilhança, ou seja, por uma ordem de aproximação e probabilidade; a busca da verdade material demandaria tempo demais, e o resultado final, mesmo assim, continuaria a ser uma mera aproximação da verdade. Sem que se entre no campo dos novos paradigmas da verdade, certo é que se tem hoje a idéia de um processo necessariamente pontuado por alguns limites – temporais ou materiais – à cognição probatória, mas que supera a distinção entre verdade formal e verdade material, como meio de garantia de uma decisão produzida em tempo razoável.

No processo administrativo, impõe se a mesma superação. Com o crescente enrijecimento do procedimento – operado por disposições como a que prevê prazos preclusivos para a apresentação de provas , há que se reconhecer a superveniência de um formalismo moderado para o PAF, voltado ao reconhecimento de que, mesmo nesta

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15 Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhardt, 2000, p.37.

esfera, a verdade material é um mito, e que o julgador, na expressiva maioria das vezes, acaba chegando apenas a um juízo de verossimilhança; e este juízo de verossimilhança fica corroborado pela união, a estas limitações de ordem processual, das várias presunções de direito material embutidas na legislação tributária.

3.3. Princípio do Devido Processo Legal

O "devido processo legal" é um princípio fundamental da nossa ordem jurídica, abarcando outros princípios constitucionais, como tais os: da isonomia; do juiz natural; da inafastabilidade da jurisdição; da proibição da prova ilícita; da publicidade dos atos processuais; do duplo grau de jurisdição; e da motivação das decisões judiciais.

O ordenamento jurídico nacional não preceitua quaisquer óbices à plena adoção do princípio do "devido processo legal". Com efeito, tudo quanto serve à instauração do devido processo legal, está inserido com expressiva literalidade já mesmo na nossa Carta Constitucional. Assim é que, mesmo em sede administrativa, percebe se uma gradativa "processualização" das atividades que envolvam conflitos de interesses, tudo com o fim de que quaisquer gravames impostos ao cidadão, sejam formalizados por via de ritos procedimentais previamente definidos, nos quais o contraditório e a ampla defesa possam ser exercidos sem quaisquer limitações.

É Importante perceber que o devido processo legal existe tanto em sistemas da common law como em sistemas jurídicos de tradição romano germânicos, não tendo a ver, portanto, com as fontes por meio das quais o direito se manifesta (se por meio de leis escritas ou não escritas). O que importa ao devido processo legal é a concretização da ordem jurídica - seja lá qual for o modo de produção desta ordem jurídica, já que a legitimidade do processo legislativo importa a outra dimensão do ordenamento - por meio de procedimentos nos quais os litigantes saibam do que se defender, de como se defender e diante de quem se defender, sendo lhes oportunizados os direitos de saber de tudo quanto contra eles vai sendo produzido e de poder se manifestar de forma producente com relação a todos os atos que vão sendo formalizados no iter processual.

Por óbvio que em sede administrativo tributária, no Brasil, os agentes públicos atuam dentro de um, digamos assim, "microssistema" jurídico, em face de que devem subordinação estrita a atos administrativos regularmente editados e de que possuem competência limitada no que tange ao afastamento de atos legais tidos por ilegais ou inconstitucionais; tais limitações, entretanto, que decorrem também da própria ordem jurídica, não empanam necessariamente o princípio do devido processo legal na esfera do processo administrativo tributário, dado que, dentro deste "microssistema" jurídico, cujos contornos tanto os agentes públicos quanto os contribuintes têm ciência, são plenamente exercitáveis os princípios que dão conseqüência prática ao devido processo legal, quais sejam, em especial, os do contraditório e da ampla defesa.

Por fim, é preciso ter em conta duas dimensões distintas do princípio do devido processo legal, quais sejam: (a) devido processo adjetivo ou procedimental: caracteriza-se pela simples norma de respeito ao procedimento previamente regulado (acepção mais restrita adotada pela doutrina);

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(b) devido processo legal substantivo ou material: manifestação do devido processo legal na esfera material. Tutela o direito material do cidadão, inibindo que lei em sentido genérico ou ato administrativo ofendam os direitos do cidadão, como a vida, a liberdade e a propriedade.

Tal distinção foi bastante bem ressaltada pelo Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos: "Abrindo o debate, deixo expresso que a Constituição de 1988 consagra o devido processo legal nos seus dois aspectos, substantivo e processual, nos incisos LIV e LV, do art. 5º, respectivamente. (...) Due process of law, com conteúdo substantivosubstantive due process - constitui limite ao Legislativo, no sentido de que as leis devem ser elaboradas com justiça, devem ser dotadas de razoabilidade (reasonableness) e de racionalidade (rationality), devem guardar, segundo W. Holmes, um real e substancial nexo com o objetivo que se quer atingir. Paralelamente, due process of law, com caráter processual - procedural due process - garante às pessoas um procedimento judicial justo, com direito de defesa." (ADIn n.o 1.511-MC, voto do Ministro Carlos Velloso).

3.4. Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório

Não há, na lei, um conceito objetivo do que seja a ampla defesa, nem mesmo há uma definição de seu conteúdo mínimo. Partindo se, portanto, do comando constitucional que assegura o direito da ampla defesa, “com os meios e recursos a ela inerentes” (inciso LV do artigo 5.º), cumpre que se busque, na doutrina, a extensão de seus limites.

Para Alberto Xavier, o direito de ampla defesa é manifestação do devido processo legal, sendo seu significado prático o de que o poder jurídico público se faça nos termos de um processo justo e disciplinado em lei, no qual seja dado ao particular afetado, o direito de conhecer os fatos e o direito invocado pela autoridade, além do direito de ser ouvido pessoalmente e de apresentar provas, confrontando as posições que lhes são opostas. Assim se manifesta o jurista:

O direito de ampla defesa reveste, hoje, a natureza de um direito de audiência (audi alteram partem), nos termos do qual nenhum ato administrativo suscetível de produzir conseqüências desfavoráveis para o administrado poderá ser praticado de modo definitivo sem que a este tenha sido dada a oportunidade de apresentar as razões (fatos e provas) que achar convenientes à defesa dos seus interesses.

[...]

O direito de defesa ou direito de audiência é um direito de participação procedimental, que pressupõe a atribuição ao particular do estatuto jurídico de “parte” no procedimento administrativo, com vista à defesa de interesses próprios. 16

Celso Ribeiro Bastos, ao analisar o princípio da ampla defesa no âmbito do processo administrativo e judicial, declara que “de outra forma, nada obstante o fato de o procedimento administrativo disciplinar não ser guiado nos seus atos da mesma forma que o é o processo penal, algumas fases, contudo, são inafastáveis. Por exemplo, a ciência inicial da imputação ao acusado, a sua audiência e a produção de provas e contraprovas, dentre outras”. 17

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Alberto Xavier, 1997, p. 161-162.

17 Celso Ribeiro Bastos, 1989, p. 267-268.

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Já Nelson Nery Costa enfatiza que o direito de plena defesa não fica evidenciado pelo que ocorre durante o processo ou no processo, mas de um rito previamente estabelecido no qual as sanções legais e as condições para que a defesa seja ampla e justa estejam também antecipadamente definidas. O jurista afirma, ainda, a indissociabilidade entre o princípio da ampla defesa e o do contraditório, defendendo a inocuidade da defesa que não puder contraditar a acusação, estabelecendo o caráter dialético do processo, que caminha através de contradições a serem finalmente superadas pela atividade sintetizadora do juiz; não basta “o simples oferecimento de oportunidade para produção de provas, mas também a quantidade e a qualidade de defesa devem ser satisfatórias”. 18

Odete Medauar também enfatiza a vinculação entre ampla defesa e contraditório, para fins de declarar que não pode haver limitações à produção da defesa tendente a contradição das questões levantadas pela acusação. Assim, “a possibilidade de rebater acusações, alegações, argumentos, interpretações de fatos, interpretações jurídicas, para evitar sanções ou prejuízos, não pode ser restrita, no contexto em que se realiza”, estando esta visão sustentada pela própria expressão final do inciso LV do artigo 5.º da Constituição Federal de 1988 – “com os meios e recursos a ela inerentes” , que não se coaduna com qualquer interpretação restritiva do direito de defesa. 19

Dissecando o princípio da ampla defesa, a mesma jurista destaca algumas de suas características fundamentais, sem as quais o direito perde o sentido que lhe atribui o texto constitucional:

(a) caráter prévio da defesa ou sua anterioridade em relação ao ato decisório: defende a idéia de que a partir da nova Carta Magna, deve o direito de defesa ser permitido antes da efetivação do ato administrativo, apenas admitindo exceção nos casos que envolvem risco de vida e segurança da população, nos quais a gravidade da situação torna indispensável uma decisão imediata;

(b) desnecessidade de previsão do direito de defesa em lei ou demais normas: entende que o direito de defender se deriva da Constituição, que na alínea “a” do inciso XXXIV do artigo 5.º prevê o direito de petição, e no inciso LV consagra a ampla defesa como requisito inafastável de qualquer judicial ou administrativo. Assim, uma autoridade não se desobriga de permitir a defesa do cidadão, alegando a falta de previsão legal;

(c) possibilidade de opção pela autodefesa ou pela defesa técnica: não pode haver exigência de defesa técnica em todos os procedimentos administrativos, até porque isso obrigaria a instituição de defensoria dativa pelo poder público. Entende a jurista, no entanto, que a exigência poderia existir em casos específicos, especialmente nos casos em que os processos atingissem com gravidade os direitos e atividades do cidadão (exemplos: demissão, fechamento de estabelecimento comercial etc.);

(d) obrigatoriedade da informação geral: de todos os fatos e desdobramentos do feito administrativo devem ser cientificados os interessados. “Assim, o direito de ser notificado do início do processo, devendo constar do texto a indicação dos fatos e bases legais; o direito de ser cientificado, com antecedência, das medidas ou atos referentes à produção das provas; o direito de ser cientificado da juntada de documentos; o direito de acesso aos elementos do expediente (vista, cópia ou certidão)”;

18 Nelson Nery Costa, 1997, p.16 17.

19 Odete Medauar, 1993, p. 112.

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(e) possibilidade da produção de provas: devem as provas poderem ser solicitadas, produzidas e consideradas, não significando isto, no entanto, que seja permitido o uso abusivo das mesmas (exemplos: ouvida de 100 testemunhas, realização de provas irrelevantes etc.) ou a utilização de provas obtidas por meios ilícitos.

Para outro jurista, Marçal Justen Filho, “pouca utilidade teria um procedimento em que não fosse prevista a livre manifestação de todos os interessados, com direito a participação ativa e vedação a atuação unilateral de uma das partes. Enfim, o procedimento não consiste na observância formalística de um ritual. Não se compadece com o Estado Democrático a instituição de procedimento com perfil arbitrário ou prepotente”. 20 Para ele, são inerentes à ampla defesa:

(a) a transparência da atividade administrativa: da mesma forma que não pode haver apropriação pura e simples de bens dos particulares, também não pode haver decisões sem prévia audiência do acusado. Não há ampla defesa se o cidadão desconhece a acusação ou a pretensão estatal, posto que não é possível formular defesa para todas as pretensões possíveis e imagináveis;

(b) a instauração do contraditório: além de saber do que é acusado e em que termos isto é feito, deve ser permitido ao cidadão a apresentação de defesa prévia à decisão, a audiência a todos os eventos e a produção de provas adequadas à defesa;

(c) a imparcialidade do julgador: a disciplina do procedimento deve assegurar a imparcialidade do julgador e consagrar o dever de aplicar o direito objetivamente ao caso concreto, sendo inadmissíveis, por exemplo, os casos em que o agente que julga está hierarquicamente subordinado a quem é parte na relação jurídica estabelecida, ou então, em que o mesmo órgão formaliza a exigência contestada e julga sua procedência;

(d) a ilimitação da defesa: ampla defesa significa ilimitação de defesa, não podendo a lei ou normas administrativas vedar ao cidadão a invocação de determinado argumento ou a utilização de determinado elemento de prova em defesa de seu interesse. Só poderiam ser excluídos os argumentos incompatíveis com o sistema jurídico e os valores fundamentais, além daqueles elementos de prova obtidos ilicitamente;

(e) a motivação completa e minudente da decisão: a motivação das decisões associa-se à obrigatoriedade de consideração, por parte do julgador, de todas as provas apresentadas. Sem a indicação dos fundamentos de direito e de fato que dão respaldo à decisão, tornar se-ia inócuo o conjunto de garantias concedidas ao cidadão no âmbito do procedimento administrativo.

A partir de todas estas contribuições doutrinárias, já se pode elencar, então, um conjunto de requisitos que, se não presentes, comprometem a efetividade do princípio da ampla defesa. Tal elenco auxiliará a aferição, que posteriormente se fará, quanto à sua presença no âmbito do procedimento administrativo que aqui se discute. São eles: (a) existência de um rito previsto em lei: sem a definição das etapas que compõem o procedimento, perde ele nitidez e transparência, tornando difícil ao cidadão identificar suas possibilidades de participação no curso processual, como tais os meios recursais e as vias de contestatação dos atos produzidos; 20

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Marçal Justen Filho, 1998.

(b) previsão de comunicação dos atos processuais: de todos os atos processuais deve ser cientificado o cidadão, a fim de que possa, eficazmente, exercer seu direito de defesa. Este requisito inclui tanto o direito de saber qual a acusação e/ou exigência que lhe é imputada/formulada - e os fundamentos sobre os quais se embasa , como também o direito de ser informado de todos os desdobramentos do feito, para que possa em relação a eles manifestar se. Em outras palavras, tem o cidadão o direito à citação, por meio da qual saberá o que lhe é imputado, e em que termos esta imputação é formalizada, e à intimação dos atos praticados, por meio da qual ser lhe á dado conhecimento das provas juntadas ao processo, dos argumentos avocados pela parte contrária, das medidas adotadas pelo julgador, enfim, do curso do processo como um todo;

(c) instauração do contraditório: além de ser comunicado da acusação que lhe é imputada e dos atos que dão curso ao feito, deve o procedimento incluir medidas que permitam ao cidadão contestar o feito previamente à decisão, e que viabilizem a confrontação producente dos elementos de prova e argumentos apresentados pelas partes componentes da relação jurídica;

(d) ilimitação na apresentação de provas: possibilidade de o cidadão produzir todas as provas que julgar necessárias para sua defesa, podendo fazer uso tanto da autodefesa quanto da defesa técnica. Esta ilimitação só pode encontrar restrições no que se refere às provas ilícitas, vedadas pela Constituição Federal, e aos argumentos incompatíveis com o sistema jurídico e os valores fundamentais. De se ressaltar que na ilimitação das provas está incluída a sua devida consideração pelo julgador, sem o que o direito esvai se por via indireta;

(e) julgamento por julgador imparcial e motivação da decisão: o procedimento deve ser conduzido e decidido por julgador imparcial, que não esteja, por exemplo, subordinado ao órgão formulador da exigência discutida. Do mesmo modo, suas decisões devem ser necessariamente motivadas, com expressa referência às razões de fato e de direito que a condicionam;

(f) recorribilidade das decisões: deve haver a previsão de meio recursal destinado à revisão ou reforma da decisão inicial. Apesar de não estar previsto em qualquer disposição legal expressa, presta se o duplo grau de jurisdição não apenas à depuração do processo decisório – justificável diante da falibilidade humana -, como também à consideração da tendência natural do ser humano de não conformar se com decisões de única instância. Assim, a previsão, no âmbito administrativo, de um duplo grau de apreciação dos litígios, concorre para a efetividade do direito de defesa.

Da existência ou não destes requisitos em um dado procedimento, é que se pode aferir a sua atenção ao preceito constitucional da ampla defesa. A análise que a partir do próximo item se fará, tentará identificar não apenas a presença dos mesmos no âmbito do procedimento de apuração das infrações contra a ordem econômica, como também o grau em que eles estão explícita ou implicitamente incluídos.

3.5. Outros Princípios Informadores do PAF

(a) Oficialidade: compete à própria administração impulsionar o processo até a sua conclusão, diligenciando no sentido de reunir o conhecimento dos atos necessários ao seu deslinde. Contrapõe se ao princípio da inércia, aplicável ao processo civil e que procura preservar a neutralidade do julgador, que age apenas quando provocado pelas partes e no

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limite dos seus pedidos, sendo que a falta de iniciativa das partes enseja o encerramento do processo.

(b) Preclusão: é meio de garantia do avanço da relação processual. A impugnação do contribuinte estabelece os limites do litígio, não podendo haver inovação em sede de recurso voluntário. Entretanto, a jurisprudência administrativa tem relativizado o princípio da preclusão, admitindo a inovação em casos relacionados a apresentação de novas provas destinadas à comprovação de alegações já postas (não para alegações novas).

(c) Unidade de Jurisdição: é conseqüência da regra contida no artigo 5o, XXXV, da Constituição Federal de 1988, que concede exclusividade ao poder judiciário para prestação jurisdicional (“a lei não excluirá da apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça a direito”). Neste sentido, é regra limitadora do processo administrativo, por decorrência lógica, e dela se infere que as decisões administrativas não são definitivas e seu cumprimento depende de provimento judicial.

(d) Isonomia: previsto no artigo 5o, caput e inciso I, da Constituição Federal de 1988, que define que todos são iguais perante a lei. Em razão do princípio da isonomia, já decidiu o Primeiro Conselho de Contribuintes que "As regras rígidas para produção de prova, acrescidas aos arts. 16 e 17 do Decreto n.º 70.235/72 pela Lei n.º 9.532/97, com a conseqüente preclusão, aplicam se também à Fazenda Nacional, em atenção ao princípio da igualdade processual”. (1.º CC, Acórdão n.º 106-11.530, de 16/02/2001). Não obstante o princípio, têm sido acatados os privilégios processuais concedidos à Fazenda Pública, em razão da supremacia do interesse público.

(e) Inadmissibilidade de Provas Ilícitas: comanda o artigo 5o, LVI, da Constituição Federal de 1988 que: “São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Tal preceito está reproduzido no artigo 30 da Lei n.º 9.784/1999: “São inadmissíveis no processo administrativo as provas obtidas por meios ilícitos.” Assim, por exemplo, as provas obtidas mediante violação do domicílio ou do sigilo da correspondência ou das comunicações telefônicas são inválidas e devem ser desconsideradas no processo.

(f) Publicidade: segundo o artigo 5o, LX, da CF/1988: “A lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem ”. No âmbito do processo administrativo fiscal, a publicidade dos atos deve ser analisada de acordo com a norma constitucional, mas também sob o ângulo das regras que tratam do sigilo fiscal.

(g) Motivação das Decisões: é um princípio de direito administrativo que decorre do princípio da ampla defesa e exige que os atos decisórios sejam motivados, de forma a possibilitar concretamente o exercício do direito de defesa. Se consubstancia na apresentação dos motivos que determinaram uma determinada medida, que provocaram uma determinada solução, ou que possam justificar uma determinada pretensão.

(h) Celeridade: com a Emenda Constitucional nº 45/2004, foi acrescentado à Carta Magna o princípio que consta do artigo 5º, LXXVIII, da CF/1988: “A todos, no âmbito judicial ou administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

(i) Legalidade: também denominado legalidade objetiva, significa que o procedimento administrativo tributário deve seguir rigorosamente os ditames legais, ou seja, os atos

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devem ser praticados nos estritos e precisos termos da legislação tributária. Neste sentido, tem uma acepção mais restrita que a adotada no texto constitucional (art. 5.º, II).

(j) Segurança Jurídica: intenta preservar as relações jurídicas já estabelecidas, tendo como corolários o princípio da irretroatividade da lei, o respeito ao direito adquirido, à coisa julgada e ao ato jurídico perfeito.

(k) Proporcionalidade: segundo este princípio, o particular deve ficar preservado das intervenções estatais desnecessárias e excessivas. Em outras palavras, a Administração não deve onerar o cidadão mais intensamente que o imprescindível para a proteção do interesse público. Com base no princípio da proporcionalidade, já decidiu o Supremo Tribunal no sentido da ilegalidade da imposição de restrições à atividade de entes como condição para adimplemento tributário (ADIN n.º 1.922-9).

(l) Razoabilidade: o princípio da razoabilidade tem fundamento em análise valorativa, afastando condutas contrárias ao bom senso e se não houver relação entre a finalidade da norma e a conduta administrativa.

(m) Moralidade: completa o princípio da legalidade, dando a este um conteúdo axiológico, fazendo com que a conduta administrativa seja, além de legal, justa. A ampliação dos poderes discricionários e a circunstância de que os atos administrativos sujeitam se ao controle do Poder Judiciário apenas quanto a legalidade, justifica a adoção do princípio da moralidade.

(n) Eficiência: pela Emenda Constitucional n.º 19/1998, o princípio da eficiência foi incorporado aos princípios da Administração Pública constantes do artigo 37 da Constituição Federal de 1988. Relaciona se com os princípios da economia processual e da instrumentalidade das formas, e justifica o disposto no artigo 60 do Decreto n.º 70.235/1972: “Art. 60. As irregularidades, incorreções e omissões diferentes das referidas no artigo anterior não importarão em nulidade e serão sanadas quando resultarem em prejuízo para o sujeito passivo, salvo se este lhes houver dado causa, ou quando não influírem na solução do litígio”.

(o) Finalidade: em sede processual, se relaciona com a vedação à instauração de processos incertos, sem intenção identificável. No processo administrativo, deve ser atendida a sua dupla finalidade, resguardar os administrados e conduzir a uma atuação administrativa mais transparente.

(p) Interesse Público: ao contrário do interesse particular, se assenta em fato ou direito de proveito coletivo ou geral. O processo administrativo deve desenvolver se no sentido de preservar o interesse público. Mas, o que é interesse público? Buscando se uma tradução prática para o âmbito do processo administrativo fiscal, tem se que, no procedimento de ofício, por estar se diante de um procedimento mais afeito ao interesse da sociedade de apurar a eventual ocorrência de ilícito, justifica se a concessão de poderes fiscalizatórios discricionários ao agente público; já na fase contenciosa, o que importa mais é a defesa da ordem jurídica em sentido estrito, com o exercício pleno do contraditório e da ampla defesa, não havendo espaço para a discricionariedade do agente público.

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4. Processo administrativo e processo judicial

Em razão de imposições constitucionais e do próprio modelo de contencioso administrativo fiscal adotado no Brasil, há uma completa dissociação entre o processo judicial e o processo administrativo. O princípio da unicidade de jurisdição, previsto no artigo 5.o, XXXV, da Constituição Federal de 1988, concede exclusividade ao Poder Judiciário para a prestação jurisdicional (“a lei não excluirá da apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça a direito”), estabelecendo, deste modo, uma importante regra limitadora do processo administrativo, qual seja a de que as decisões administrativas não são definitivas e seu cumprimento depende de sua não invalidação por algum provimento judicial. Por conta disto, a matéria objeto do processo administrativo pode, a qualquer tempo (antes, durante ou depois do processo administrativo), ser levada à apreciação do Poder Judiciário.

Quando se afirma a dissociação entre processo administrativo e processo judicial, não se quer, igualmente, afirmar a falta de efeitos entre eles. Por óbvio que os provimentos judiciais sempre terão de ser cumpridos no âmbito administrativo, mas não há vínculos de outra ordem entre os dois processos para além deste. Como já se viu no item 2 o contencioso administrativo fiscal, no Brasil, é uma opção colocada à disposição do sujeito passivo, não lhe trazendo quaisquer limitações em relação a uma posterior demanda judicial. Da mesma forma, os atos praticados na fase litigiosa do processo administrativo fiscal e os autos que os contêm não criam qualquer vinculação ou limitação na esfera judicial, podendo lá ser simplesmente ignorados.

As relações que se estabelecem entre os processos administrativo e judicial resultam, quase todos, da mencionada supremacia do Poder Judiciário para a dicção do direito. É que não são poucos os casos em que no curso do processo administrativo fica constatada a existência de ações judiciais relacionadas, de forma direta ou indireta, com aquilo que está em discussão na esfera administrativa, e diante destas situações algumas soluções legais merecem menção.

De início, é preciso ressaltar que, ao contrário dos recursos administrativos, a mera propositura de ação judicial não serve à suspensão da exigibilidade do crédito tributário. É que de acordo com o artigo 151 do Código Tributário Nacional, as medidas judiciais que têm este efeito são "a concessão de medida liminar em mandado de segurança " (inciso IV) e a "a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial" (inciso V). Ou seja, para além de propor a ação judicial, para obter a suspensão da exigibilidade do crédito tributário o contribuinte precisa de um provimento judicial de natureza acautelatória dos tipos legalmente postos. De outro lado, o recurso à esfera administrativa tem este efeito imediato, ex vi do inciso III do mesmo artigo 151 do CTN.

Obtido algum dos provimentos judiciais listados no artigo 151 do CTN, aparece uma importante repercussão para a atuação da Administração Tributária, que vai para além da vedação à possibilidade de cobrar de forma imediata os créditos tributários que estão sendo discutidos judicialmente. Se refere ela à possibilidade de formalização do

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lançamento durante o período de vigência daqueles provimentos, ou seja, à possibilidade de a Administração Tributária lançar o crédito tributário, diante da existência de ação judicial preventiva no âmbito da qual houve a concessão de algum dos provimentos acautelatórios já citados. A questão importa porque, a teor dos artigos 150 e 173 do CTN, o prazo decadencial para a Fazenda Nacional efetuar o lançamento é de cinco anos.

Do ponto de vista estrito da legislação tributária, a questão restou resolvida pelo artigo 63 da Lei n.o 9.430/1996, que passou a disciplinar o chamado "lançamento para prevenir a decadência":

Art. 63. Na constituição de crédito tributário destinada a prevenir a decadência, relativo a tributo de competência da União, cuja exigibilidade houver sido suspensa na forma dos incisos IV e V do art. 151 da Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966, não caberá lançamento de multa de ofício.

§ 1.º O disposto neste artigo aplica se, exclusivamente, aos casos em que a suspensão da exigibilidade do débito tenha ocorrido antes do início de qualquer procedimento de ofício a ele relativo. [...]

Deste modo, a vigência de medida judicial que implique a suspensão da exigibilidade de crédito tributário não impede a instauração de procedimento fiscal e nem o lançamento de ofício contra o sujeito passivo favorecido pela decisão, inclusive em relação à matéria sobre que versar a ordem de suspensão. E se a medida judicial referir se à matéria objeto de processo fiscal, o curso deste não será suspenso exceto quanto aos atos executórios.

Outra importante questão relacionada com a coexistência de processos nas esferas administrativa e judicial se refere à impossibilidade de discussão concomitante de uma mesma matéria nestes dois âmbitos. Do ponto de vista legal, a propositura, pelo sujeito passivo, de ação judicial por qualquer modalidade processual, antes ou depois do lançamento de ofício, com o mesmo objeto do processo administrativo, importa renúncia às instâncias administrativas. Tal comando aparece expresso em vários atos legais, como tais o artigo 26 da Portaria MF n.º 341, de 12/07/2011, o artigo 38 da Lei n.º 6.830/1980, e o artigo 1.o do Decreto Lei n.o 1.373/1979. O próprio Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) já sumulou a questão, nos seguintes termos: "SÚMULA CARF N.o 1: Importa renúncia às instâncias administrativas a propositura pelo sujeito passivo de ação judicial por qualquer modalidade processual, antes ou depois do lançamento de ofício, com o mesmo objeto do processo administrativo, sendo cabível apenas a apreciação, pelo órgão de julgamento administrativo, de matéria distinta da constante do processo judicial". Assim, proposta ação judicial com o mesmo objeto discutido na via administrativa, o efeito imediato é a declaração da definitividade da exigência contestada na esfera administrativa.

No âmbito da Receita Federal, a disciplina específica da questão, depois ter sido definida por muitos anos pelo Ato Declaratório Normativo n.º 03, de 14/02/1996, está atualmente dada pelo Parecer Normativo Cosit n.º 7, de 22/08/2014, que assim dispõe em sua ementa:

Ementa: CONCOMITÂNCIA ENTRE PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL E PROCESSO JUDICIAL COM O MESMO OBJETO. PREVALÊNCIA DO PROCESSO JUDICIAL. RENÚNCIA ÀS INSTÂNCIAS ADMINISTRATIVAS. DESISTÊNCIA DO RECURSO ACASO INTERPOSTO.

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A propositura pelo contribuinte de ação judicial de qualquer espécie contra a Fazenda Pública com o mesmo objeto do processo administrativo fiscal implica renúncia às instâncias administrativas, ou desistência de eventual recurso de qualquer espécie interposto.

Quando contenha objeto mais abrangente do que o judicial, o processo administrativo fiscal deve ter seguimento em relação à parte que não esteja sendo discutida judicialmente. A decisão judicial transitada em julgado, ainda que posterior ao término do contencioso administrativo, prevalece sobre a decisão administrativa, mesmo quando aquela tenha sido desfavorável ao contribuinte e esta lhe tenha sido favorável.

A renúncia tácita às instâncias administrativas não impede que a Fazenda Pública dê prosseguimento normal a seus procedimentos, devendo proferir decisão formal, declaratória da definitividade da exigência discutida ou da decisão recorrida.

É irrelevante que o processo judicial tenha sido extinto sem resolução de mérito, na forma do art. 267 do CPC, pois a renúncia às instâncias administrativas, em decorrência da opção pela via judicial, é insuscetível de retratação. A definitividade da renúncia às instâncias administrativas independe de o recurso administrativo ter sido interposto antes ou após o ajuizamento da ação.

Dispositivos Legais: Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (CTN), art. 145, c/c art. 149, art. 151, incisos II, IV e V; Decreto lei nº 147, de 3 de fevereiro de 1967, art. 20, § 3º; Decreto nº70.235, de 6 de março de 1972, arts. 16, 28 e 62; Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (CPC), arts. 219, 267, 268, 269 e 301, § 2º; Decreto lei nº 1.737, de 20 de dezembro de 1979, art. 1º; Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, art. 38; Constituição Federal, art. 5º, inciso XXXV; Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, art. 53; Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, art. 22; Portaria CARF nº 52, de 21 de dezembro de 2010; Portaria MF nº 341, de 12 de julho de 2011, art. 26; art. 77 da IN RFB nº 1.300, de 20 de novembro de 2012.

Em sua parte conclusiva, o Parecer Normativo Cosit n.º 07/2014 assim determina:

a) a propositura pelo contribuinte de ação judicial de qualquer espécie contra a Fazenda Pública, em qualquer momento, com o mesmo objeto (mesma causa de pedir e mesmo pedido) ou objeto maior, implica renúncia às instâncias administrativas, ou desistência de eventual recurso de qualquer espécie interposto, exceto quando a adoção da via judicial tenha por escopo a correção de procedimentos adjetivos ou processuais da Administração Tributária, tais como questões sobre rito, prazo e competência; b) por conseguinte, quando diferentes os objetos do processo judicial e do processo administrativo, este terá prosseguimento normal no que concerne à matéria distinta;

c) a renúncia às instâncias administrativas abrange os processos de constituição de crédito tributário, de reconhecimento de direito creditório do contribuinte (restituição, ressarcimento e compensação), de aplicação de pena de perdimento e qualquer outro processo que envolva a aplicação da legislação tributária ou aduaneira; d) a decisão judicial transitada em julgado, seja esta anterior ou posterior ao término do contencioso administrativo, prevalece sobre a decisão administrativa, mesmo quando aquela tenha sido desfavorável ao contribuinte e esta lhe tenha sido favorável; e) a renúncia às instâncias administrativas não impede que a Fazenda Pública dê prosseguimento normal aos seus procedimentos, a despeito do ingresso do sujeito passivo em juízo; proferirá, assim, decisão formal, declaratória da definitividade da exigência discutida ou da decisão recorrida, e deixará de apreciar suas razões e de conhecer de eventual petição por ele apresentada, encaminhando o processo para a inscrição em DAU do débito, quando existente, salvo a ocorrência de hipótese que suspenda a exigibilidade do crédito tributário, nos termos dos incisos II, IV e V do art. 151 do CTN;

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f) o mesmo raciocínio se aplica, no que couber, aos processos administrativos em que não se discuta a exigibilidade do crédito tributário lançado de ofício, mas envolvam quaisquer outras matérias de interesse do sujeito passivo, que ele opte por submeter ao exame do Poder Judiciário (nestes casos, de igual modo, o curso do processo administrativo não será suspenso, ressalvada decisão judicial incidental determinando sua suspensão);

g) a competência para declarar a concomitância de instâncias e seus efeitos é da autoridade competente para decidir sobre a matéria na fase processual em que se encontra o processo administrativo, qualquer que seja o rito a que esteja submetido;

h) se, no ato da impugnação do lançamento, da manifestação de inconformidade ou da interposição de qualquer espécie de recurso, o interessado não informar que a matéria impugnada foi submetida à apreciação judicial, em desobediência ao disposto no inciso V do art. 16 do Decreto nº 70 235, de 1972, e ficar constatada a concomitância total ou parcial com processo judicial, deverá o Delegado ou o Inspetor Chefe da RFB negar o seguimento da impugnação ou da manifestação quanto ao objeto coincidente; i) é irrelevante, na espécie, que o processo judicial tenha sido extinto sem resolução de mérito, na forma do art. 267 do CPC, pois a renúncia às instâncias administrativas, em decorrência da opção pela via judicial, é definitiva, insuscetível de retratação;

j) a definitividade da renúncia às instâncias administrativas independe de o recurso administrativo ter sido interposto antes ou após o ajuizamento da ação; k) o disposto neste Parecer aplica se de igual modo a qualquer modalidade de processo administrativo no âmbito da RFB, ainda que sujeito a rito processual diverso do Decreto nº 70.235, de 1972; l) a configuração da concomitância entre as esferas administrativa e judicial não impede a aplicação do disposto no art. 19 da Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, c/c a Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 12 de fevereiro de 2014; m) ficam revogados o Parecer MF/SRF/COSIT/GAB nº 27, de 13 de fevereiro de 1996 e o ADN Cosit nº 3, de 14 de fevereiro de 1996.

Como se percebe, o curso do processo administrativo, quando houver matéria distinta da constante do processo judicial, terá prosseguimento em relação à matéria diferenciada, ou seja, só será caracterizada a renúncia às instâncias administrativas em relação à matéria especificamente levantada nas duas esferas.

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5. Uma visão geral do processo de constituição e exigência de créditos tributários federais - Decreto n.o 70.235, de 06/03/1972, e legislação complementar

Neste item, é traçada, primeiro, uma visão geral do processo de determinação de determionação e exigência de créditos tributários federais, na forma como atualmente regrado (item 5.1). Na seqüência, descreve se a evolução do rito procediomental ao longo do tempo, naquilo que se relaciona com a busca por maior racionalidade e celeridade da prestação judicante administrativa (item 5.2).

5.1. O processo atual de

determinação

e exigência de créditos tributários federais

Toda a atividade da autoridade fiscal tendente à fiscalização da regularidade tributária dos sujeitos passivos (pela "ação fiscal", também chamada de "procedimento de ofício") e à eventual formalização de créditos tributários (pelo "lançamento de ofício"), deve se submeter aos ditames da legislação processual administrativa, em especial o Decreto n.o 70.235/1972, que trata do "processo de constituição e exigência de créditos tributários federais". Este processo envolve uma "fase investigatória" (a "ação fiscal" ou "procedimento de ofício"), que pode levar à lavratura de um auto de infração ou de uma notificação de lançamento, se ficar constatada a prática de alguma infração à legislação tributária, e uma "fase contenciosa", na qual o sujeito passivo, inconformado com a autuação sofrida, pode contestá la junto ao chamado "contencioso administrativo fiscal federal", que envolve a apreciação dos recursos por até dois órgãos julgadores especializados - Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (DRJ) e Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) - e em até três instâncias

É importante ter em conta, porém, que muito embora o Decreto n.o 70.235/1972 regule o processo administrativo de constituição de créditos tributários federais, nem todas as peculiaridades processuais envolvidas com tal processo constam de seu texto; há inúmeras figuras jurídicas e dispositivos legais que foram adicionados por legislação complementar e que complementam o regramento do Decreto n.o 70.235/1972 e do Decreto n.º 7.574/2011. Neste trabalho, estas fontes complementares estão parcialmente referenciadas a seguir, na sumarização que é feita das várias etapas do contencioso administrativo (sumarização esta que é produzida com o fim de se dar uma visão geral, cronológica e didática do processo).

Nos subitens seguintes, o rito está exposto com o auxílio de fluxogramas esquemáticos, e com a divisão, para fins meramente didáticos, em quatro fases distintas: (a) FASE I - Ação Fiscal (Não-Contenciosa); (b) FASE II - Julgamento de Primeira Instância; (c) FASE III - Julgamento de Segunda Instância; e (d) FASE IV - Julgamento de Instância Especial.

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5.1.1. FASE I - Ação Fiscal (Não-Contenciosa, conduzida pelas unidades da Secretaria da Receita Federal do Brasil com atribuição para fiscalização: Delegacias da Receita Federal do Brasil, Inspetorias da Receita Federal do Brasil etc.)

(a) Abertura da ação fiscal: a abertura da ação fiscal demanda, em regra, a emissão prévia do Termo de Distribuição de Procedimento Fiscal e a lavratura do Termo de Início da Ação Fiscal (artigo 7.o do Decreto n.o 70.235/1972 e Portaria RFB n.o 6.478, de 29/12/2017). Apenas com a ciência ao sujeito passivo do Termo de Início da Ação Fiscal é que fica formalmente aberto o procedimento de ofício e afastada a espontaneidade do contribuinte. A autoridade competente para a condução do procedimento de ofício é o Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil (AFRFB).

É preciso ter em conta, porém, a existência de várias situações nas quais o TDPF deixa de ser necessário para fins de instrumentação prévia dos procedimentos de ofício; tais situações estão elencadas no artigo 10 da Portaria RFB n.o 6.478/2017 e dentre elas, destacam-se as associadas a procedimento fiscal:

- realizado no curso do despacho aduaneiro;

- relativo a revisão interna das declarações, escriturações, documentos fiscais e informações disponíveis nas bases da RFB, inclusive para aplicação de penalidade pela falta ou atraso na sua apresentação (procedimentos de malhas fiscais);

- de análise de restituição, reembolso, ressarcimento ou compensação efetuada ou de lançamento de multas isoladas decorrentes dessa análise, exceto quando houver necessidade de atuação do Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil em ação externa destinada a coletar informações ou outros elementos necessários à instrução ou conclusão do respectivo procedimento fiscal; e

- de análise de pedido de revisão de débitos e de processos envolvendo créditos tributários discutidos judicialmente, exceto quando houver necessidade de atuação do Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil em ação externa destinada a coletar informações ou outros elementos necessários à instrução ou conclusão do respectivo procedimento fiscal.

(b) Condução da ação fiscal, com a conclusão por via do lançamento de ofício (artigos 7.o a 13 do Decreto n.o 70.235/1972): concluída a ação fiscal e restando constatada a prática de alguma infração à legislação tributária, deve a exigência respectiva ser formalizada por meio de Auto de Infração ou Notificação de Lançamento (artigo 9.o). Apenas por meio de um destes instrumentos formais, lavrados com estrita observância dos requisitos que a lei lhes impõe (artigos 10 e 11) é que o lançamento se aperfeiçoa como tal; vícios de forma, em regra, anulam a exigência fiscal. Os Autos de Infração e as Notificações de Lançamento só produzem efeitos em relação ao contribuinte, depois de a este cientificados nos termos das regras de intimação previstas no artigo 23. Formalizado o lançamento, por meio da lavratura do Auto de Infração ou Notificação de Lançamento, ele só poderá ser modificado, ex vi do artigo 145 do Código Tributário Nacional, por meio de revisão de ofício (promovida pela própria unidade da RFB a qual pertence o AFRFB autuante, mas isto antes da apresentação da impugnação por parte do contribuinte) ou por meio de decisão de alguns dos órgãos de julgamento que operam na fase litigiosa do processo (DRJ e CARF), no âmbito da apreciação dos recursos apresentados pelo sujeito passivo (impugnação, recurso voluntário ou recurso especial) ou do recurso de ofício interposto pelo órgão julgador de primeira instância (DRJ).

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(c) Representação fiscal para fins penais (Portaria RFB n.º 1.750, de 12/11/2018 e Decreto n.o 2.730/1998): lavrado auto de infração ou notificação de lançamento, podem se apresentar circunstâncias que motivem a formalização, pela autoridade fiscal, da representação fiscal para fins penais. A Portaria RFB n.º 1.750/2018 disciplina, com base no permissivo constante do artigo 3.º do Decreto n.º 2.730/1998, os procedimentos a serem observados na comunicação ao Ministério Público Federal, de fatos que configurem crimes contra a ordem tributária; contra a Previdência Social; contra a Administração Pública Federal, em detrimento da Fazenda Nacional; contra Administração Pública Estrangeira; bem como crimes de contrabando ou descaminho, de falsidade de títulos, papéis e documentos públicos e de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores.

(d) Arrolamento de bens (artigos 64 e 64 A da Lei n.º 9.532/1997 e Instrução Normativa RFB n.º 1.565, de 11/05/2015): sempre que a autoridade fiscal lavrar auto de infração ou notificação de lançamento com o lançamento de créditos tributários relativos a tributos e contribuições administrados pela RFB, que excedam a trinta por cento do patrimônio conhecido do sujeito passivo e, simultaneamente, somem valor superior a R$ 2.000.000,00, deve formalizar o "arrolamento de bens para fins de garantia de crédito tributário". Importante ressaltar que apesar de o arrolamento de bens não representar a indisponibilidade de quaisquer bens, a falta de comunicação à Secretaria da Receita Federal do Brasil, por parte do sujeito passivo, da alienação de bens ou direitos arrolados, é causa suficiente para a propositura da medida cautelar fiscal prevista na Lei n.º 8.397/1992.

Proc,;,dim,mtocomDisp,msaEmissãodoTermode

.....•••••....,

FASE 1 d9TDPF(malhafiscal,Distribuiçãode infraç<i9saduaneirasetc.)ProcedimentoFiseal• TDPF Acão Fi sca l ) (Não con'te nci osa . Comintimaçãopróvia(com ous9mautorr9gularização)

FIGURA 8: Fase I do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais – Decreto n.o 70.235/1972.

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• 1

5.1.2. FASE II - Julgamento de Primeira Instância (Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento - DRJ)

(a) Impugnação do lançamento (artigos 14 a 17 do Decreto n.o 70.235/1972): cientificado do lançamento, o sujeito passivo pode pagar o crédito tributário lançado ou contestar o ato administrativo, no prazo de 30 dias, por meio de impugnação. Caso não conteste o lançamento e não efetue o pagamento, será lavrado Termo de Revelia e o processo permanecerá mais 30 dias na unidade de origem, para fins de cobrança amigável (artigo 21). Não pago neste novo prazo, o processo segue para a fase de inscrição do crédito em dívida ativa e para a cobrança executiva.

(b) Julgamento por parte das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (artigos 18 a 20, inciso I do artigo 25 e artigos 27 a 36 do Decreto n.o 70.235/1972; artigo 23 da Lei n.o 13.988/2020; Portaria MF n.º 340/2020): impugnado o lançamento no prazo legal de 30 dias, o processo é enviado para julgamento no âmbito das Delegacias de Julgamento. A partir, porém, da edição da Lei n o 13.988/2020 (especialmente seu artigo 23) e da Portaria MF n.º 340/2020, as DRJ passaram a ter um papel dúplice: em relação a alguns litígios passam a ser instância única (mesmo que composta por dois julgamentos internos) e em relação a outros continua a ser a primeira instância (com suas decisões sendo passíveis de recurso à segunda instância, o CARF). Assim, de acordo com os artigos 3.o e 4.o da Portaria MF n.º 340/2020, compete às DRJ apreciar, sempre por decisão colegiada: (b.1) em primeira instância, por suas turmas ordinárias ou especiais, a impugnação ou manifestação de inconformidade apresentada pelo sujeito passivo; e (b.2) em última instância, por suas câmaras recursais, os recursos contra as decisões de suas turmas ordinárias ou especiais, em relação ao contencioso administrativo fiscal de pequeno valor, assim considerado aquele cujo lançamento fiscal ou controvérsia não supere sessenta salários mínimos (esse limite se refere à parcela contestada e inclui o crédito tributário referente ao tributo e à multa de ofício aplicada, ao crédito tributário referente a penalidades aplicadas isoladamente, ao tributo projetado sobre prejuízos fiscais ou bases de cálculo negativas reduzidos ou cancelados de ofício, a quaisquer créditos ou incentivos fiscais reduzidos ou cancelados de ofício e ao direito creditório pleiteado).

(c) Recursos contra as decisões das Delegacias de Julgamento (sobre os recursos, ver item "Recursos no Processo Administrativo Fiscal"):

(c.1) Pedido de correção de inexatidões materiais: dirigido à própria DRJ e destinado à correção de erros materiais, lapsos manifestos (parágrafo 1.º do artigo 21 e artigo 39 da portaria ME n.º 340/2020).

(c.2) Recurso de ofício: sempre que a decisão da DRJ exonerar o sujeito passivo de parcela do crédito tributário superior a R$ 2.500.000,00 (principal + multa de ofício), deverá a própria DRJ, por meio do presidente da Turma julgadora, recorrer de ofício para o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (inciso I do artigo 34 do Decreto n.º 70.235/1972 e artigo 1.º da Portaria MF n.º 63 de 09/02/2017).

(c.3) Recurso voluntário: no caso de a decisão da DRJ ser parcial ou integralmente desfavorável ao sujeito passivo, pode este interpor recurso voluntário junto:

53

(c.3.1) às câmaras recursais das próprias DRJ, em relação ao contencioso administrativo fiscal de pequeno valor, assim considerado aquele cujo lançamento fiscal ou controvérsia não supere sessenta salários mínimos (artigos 3.o e 4 o da Portaria MF n.º 340/2020); ou (c.3.2) ao CARF (artigo 33 do Decreto n.º 70.235/1972, artigos 1.o e 7.o do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015 e (artigo 3.o da Portaria MF n.º 340/2020). (d) Como expressamente previsto no artigo 40 da da Portaria MF n.º 340/2020, não cabe pedido de reconsideração de qualquer decisão das DRJ.

Representação Fisca l para Fins Pe nais

------j h\atéria Não Impugnada (Apartação) 1 Pedido de Correção de Inexatidões Materiais

NOTIFICAÇÃO DE LANÇAMENTO IMPUGNAÇÃO

DECISÃO DA DRJ (Turmas Ordinárias)

AUTO DE INFRAÇÃO ou --

Lançamento PROCEDENTE EM PARTE 1 1

-, '

RECURSO VOtUMTÃRIO CARf (processo com crédito acima de 60 SM) .

i

Lançamento IMPROCEDENTE ' ' ' : ' ___,

Arrolamento de Bens 1------t (de Ofício) ............ ______!.__ ............ -- ------j ' ' Sem Impugnação ou ' ' ' ' ' ' Pagamento (Revelia) ' ' ' ' ' ---------* ------j ' Cobrança Amigável ' ' ' ' ' ' ' (crédito não impugnado) ' ' ' ' ' ' __________________ l _______________, ! Inscrição em Dívida Ativa e : ' ' : Execução Fiscal : ' ' ' L 1

. ...

FASE li

Jul gament o nas DRJ e i r a ou de d efinitiva ·nst ância)

(de p rim dúplice e 1 ...

RECURSO OE OFiCIO (exoneração de crédito aci ma de RS 2 milhÕes) .

FIGURA 9: Fase II do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais – Decreto n.o 70.235/1972.

54
-' ' ' ' ' ' '
r-
l
1 T Pedido
r __________ .i, __________ i : DECISÃO
+-
' Lançamento PROCEDENTE 1 ' !+' ' ' +-+ -, RECURSO VOLUNTÁRIO DRJ (processo com crédito até 60 SM)
DECISÃO DA DRJ (Câmaras Recursais)
de Correção de In exatidões Materi ais
: : ADMINISTRATIVA : : FINAL 1 1 ·-----------------------·

5.1.3. FASE III - Julgamento de Segunda Instância (CARF)

(a) Apresentação de recurso voluntário e apresentação de contrarrazões pelo Procurador da Fazenda Nacional (artigo 33 do Decreto n.º 70.235/1972 e artigos 1.o, 7.o e 48 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015): cientificado da decisão da DRJ que lhe foi parcial ou integralmente desfavorável, pode o sujeito passivo interpor recurso voluntário junto ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF (nesse caso, se nãso se tratar de contencioso administrativo fiscal de pequeno valor, assim considerado aquele cujo lançamento fiscal ou controvérsia não supere sessenta salários mínimos (artigo 3.o da Portaria MF n.º 340/2020). Apresentado o recurso voluntário, fica facultado ao Procurador da Fazenda Nacional apresentar contrarrazões (parágrafo 2.o do artigo 48 do Anexo II da Portaria MF n.o 343/2015).

(b) Interposição de recurso de ofício por parte da DRJ e apresentação de contrarrazões pelo Procurador da Fazenda Nacional (inciso I do artigo 34 do Decreto n.º 70.235/1972, artigo 2.º da Portaria MF n.º 63, de 09/02/2017 e artigo 48 do Anexo II da Portaria MF n.o 343/2015): no caso de a DRJ ter exonerado o sujeito passivo de parcela do crédito tributário superior a R$ 2.500.000,00 (principal + multa de ofício), deve a própria DRJ recorrer de ofício de sua decisão para o CARF. Proposto o recurso de ofício, fica facultado ao Procurador da Fazenda Nacional apresentar contrarrazões (parágrafo 2.o do artigo 48 do Anexo II da Portaria MF n.o 343/2015).

(c) Julgamento do recurso voluntário ou do recurso de ofício por parte das Seções do CARF (inciso II do artigo 25 e artigos 37 e 38 do Decreto n.o 70.235/1972; Portaria MF n.º 343, de 09/06/2015): apresentado recurso voluntário pelo sujeito passivo no prazo de 30 dias da ciência da decisão da DRJ e/ou interposto recurso de ofício pela própria DRJ, o processo é enviado para julgamento no âmbito do CARF, onde os recursos serão julgados por uma das Turmas que compõem cada uma das três Seções do CARF, segundo a competência material prevista no Regimento Interno do Órgão.

(d) Recursos contra a decisão das Turmas que compõem as Seções do CARF (sobre os recursos, ver item "Recursos no Processo Administrativo Fiscal"):

(d.1) embargos de declaração: dirigido à própria Turma da Seção do CARF que julgou o recurso, quando existir no acórdão prolatado obscuridade, dúvida ou contradição entre decisão e fundamentos, ou ainda quando for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar se a Turma (artigo 64, I, e 65 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015).

(d.2) pedido de correção de inexatidões materiais (embargos inominados): dirigido à própria Turma da Seção do CARF que julgou o recurso, e destinado à correção de erros materiais, lapsos manifestos. Importa perceber que, ao contrário do (artigo 66 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015).

(d.3) recurso especial: proposto, no prazo de 15 dias da ciência da decisão do CARF, nos termos a seguir explicitados (artigo 68 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015).

(d.4) agravo: proposto, no prazo de cinco dias, contra despacho do presidente da câmara recorrida, que negar seguimento, parcial ou total, ao recurso especial. A competência para apreciação do agravo é do presidente da CSRF (artigo 71 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015).

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FIGURA 10: Fase III do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais – Decreto n.o 70.235/1972.

5.1.4. FASE IV - Julgamento de Instância Especial (CSRF)

(a) Apresentação de recurso especial (inciso II do parágrafo 2.o do artigo 37 do Decreto n.º 70.235/1972, e artigos 67 a 71 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015): cientificados da decisão de Turma de uma das Seções do CARF, podem o sujeito passivo ou os Procuradores da Fazenda Nacional apresentar, no prazo de 15 dias, recurso especial dirigido à Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF. É requisito para a interposição do recurso especial, a existência de divergência de interpretação dada à lei por outras Turmas do CARF ou da própria CSRF. No caso do sujeito passivo, o recurso especial é destinado a contestar a decisão de Turma das Seções do CARF que não lhe foi favorável (o que ocorre com o não provimento de recurso voluntário ou com o provimento de recurso de ofício); já no caso dos Procuradores da Fazenda Nacional, o recurso especial é cabível nos casos de não provimento de recurso de ofício e provimento de recurso voluntário (b) Juízo de admissibilidade do recurso especial por parte do presidente da Câmara da Turma recorrida e apresentação de contrarrazões (artigos 68, 69 e 70 do Anexo II da Portaria MF n.º 343, de 09/06/2015): interposto o recurso especial, compete ao presidente da Câmara da Turma recorrida, em despacho fundamentado, admiti lo ou, caso não satisfeitos os pressupostos de sua admissibilidade, negar lhe seguimento. No caso de juízo positivo de admissibilidade, a outra parte – sujeito passivo ou o Procurador da Fazenda Nacional, conforme o caso – terá o prazo de 15 dias para apresentar contrarrazões. No caso do sujeito passivo, ainda lhe será possível, no mesmo prazo de 15 dias, apresentar recurso especial em relação à parte do acórdão que lhe foi desfavorável. No caso de juízo negativo de admissibilidade (parcial ou integral), a admissibilidade do recurso especial será submetida à apreciação do Presidente da CSRF, conforme item a seguir.

56
i EMBARGOS CONTRARRAZÕES
DE DECLARAÇÃO 1 l l EMBARGOS INOMINADOS H DECISÃO DO CARF (Corr. de erros materiais) (Turmas Ordinárias) 1 ....•.......•-~ . . • RECURSO DE OFÍCIO (exoneração de crédito acima de RS 2 milhões) ! RAZÕES DA PFN 1 FASE Julgamento Segunda lnstân 111 de eia . . . . . . . . . . ____________ i _____________r------------~------------- r------------*------------ r ___________ J ____________ ,. -, i Recurso de Ofí cio : PROVIDO ·--------___ T ___________ J Recurso Voluntário NÃO PROVIDO ·------------1------------· RECURSO ESPECIAL (Sujeito Passivo) 1 Recurso de Ofício NÃO PROVIDO ·-------------r------------l Recurso Voluntário i PROVIDO : ----------· .......••.•..... ........••.....• RECURSO ESPECIAL (PFN) 1 1
RECURSO VOLUNTÁRIO (processo com crédito acima de 60 SM)
DA PFN

(c) Juízo de admissibilidade do recurso especial por parte do presidente da Câmara Superior de Recursos Fiscais e apresentação de contrarrazões (artigos 69, 70 e 71 do Anexo II da Portaria MF n.º 343, de 09/06/2015): no caso de juízo negativo de admissibilidade (parcial ou integral) por parte do presidente da Câmara da Turma recorrida, a admissibilidade do recurso especial será submetida, independentemente de petição das partes, à apreciação do Presidente da CSRF, que se manifestará conclusivamente sobre a questão. No caso de juízo positivo de admissibilidade, a outra parte – sujeito passivo ou o Procurador da Fazenda Nacional, conforme o caso – terá o prazo de 15 dias para apresentar contrarrazões. No caso do sujeito passivo, ainda lhe será possível, no mesmo prazo de 15 dias, apresentar recurso especial em relação à parte do acórdão que lhe foi desfavorável. No caso de juízo negativo de admissibilidade, a decisão recorrida torna-se definitiva.

(d) Julgamento do recurso especial por parte das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais (artigos 37 a 41 do Decreto n.o 70.235/1972; Portaria MF n.º 343, de 09/06/2015): tendo sido acatada a admissibilidade do recurso especial, o litígio é então julgado em última instância por uma das Turmas da CSRF (os processos julgados pelas Turmas da Primeira Seção do CARF, são julgados pela Primeira Turma da CSRF, e assim por diante).

(e) Recursos contra a decisão da CSRF (sobre os recursos, ver item "Recursos no Processo Administrativo Fiscal"):

(e.1) embargos de declaração: dirigido à própria Turma da CSRF que julgou o recurso, quando existir no acórdão prolatado obscuridade, dúvida ou contradição entre decisão e fundamentos, ou ainda quando for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar se a Turma (artigo 65 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015).

(e.2) pedido de correção de inexatidões materiais: dirigido à própria Turma da CSRF que julgou o recurso, e destinado à correção de erros materiais, lapsos manifestos (artigo 66 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015).

(f) Edição de Súmula ou Resolução (artigos 72 e 76 do Anexo II da Portaria n.o 343, de 09/06/2015): havendo decisões reiteradas e uniformes do CARF, podem elas ser consubstanciadas em súmula de observância obrigatória por seus membros (tais súmulas podem ter efeito vinculante para toda a Administração Tributária Federal, caso o Ministro da Economia lhes atribua tal efeito); as súmulas são aprovadas pela CSRF. E cabe ao Pleno da CSRF a uniformização de decisões divergentes, em tese, das turmas da própria CSRF, por meio de resolução (as resoluções vinculam os demais órgãos julgadores do CARF).

(g) Decisão administrativa final (artigo 42 do Decreto n.o 70.235/1972): com a decisão administrativa final o crédito tributário é considerado como definitivamente constituído e passível de imediata cobrança (dada a extinção da causa suspensiva da exigibilidade prevista no inciso III do artigo 151 do CTN). São definitivas as decisões:

(d.1) de primeira instância, esgotado o prazo para recurso voluntário sem que este tenha sido interposto;

(d.2) de primeira instância na parte que não for objeto de recurso voluntário ou não estiver sujeita a recurso de ofício;

(d.3) de segunda instância, de que não caiba recurso ou, se cabível, quando decorrido o prazo sem a sua interposição;

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(c.4) de instância especial.

RECURSO ESPECIAL (Sujeit o Passi vo)

RECURSO ESPECIAL (SP parte desfavorável ) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

EMBARGOS INOMINADOS (Corr de erros mat eriais)

FASE IV

Julgamentoem InstânciaEspecial

RECURSO ESPECIAL (PFN)

: SIM JU ÍZO DE ADMISSIBILIDADE nte da Câmar a)

1 NÃO : , (Pr esi de

CONTRARRAZÕES

eito

esidente da CSRF)

Não acolhido

(Turmas/Pleno)

Ami gáve l (se : : houver crédi to mantido) : . . .,) ;:_

_

Inscrição em Dívida Ativa e Í : Execução Fiscal : ,

FIGURA 11: Fase IV do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais – Decreto n.o 70.235/1972.

5.2. A evolução do rito do Decreto n.º 70.235/1972 e a racionalização do processo administrativo fiscal

Ao longo dos anos, o contencioso administrativo tributário federal passou por várias mudanças destinadas a dar agilidade e imparcialidade ao julgamento administrativo. Com efeito, o procedimento previsto para o processo de determinação e exigência de créditos tributários federais, regulado pelo Decreto n.o 70.235/1972, sofreu alterações de variada ordem que serviram ao incremento do grau de concentração dos atos que o compõem e à agilização do julgamento de determinados litígios. As principais mudanças operadas foram:

(a) o estabelecimento de limites ao agravamento da exigência inicial em sede contenciosa (inicialmente em face da revogação do parágrafo único do artigo 15 e, mais recentemente, pelo artigo 41 do Decreto n.o 7.574/2011);

58
·············i·• · ~ • 1 -----------
.....
r .................. ,
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(Suj
Passi vo ou PFN) . . • J AGRAVO (Pr
. ,.. r Acolhido : :
: . 1 •................. ' ' DECISÃO DA CSRF • ,-+ . • • • • • ~" . . r----------· t ' L-• : DECISÃO : SÚMULA
RESOLUÇÃO (Pleno) : ADMINISTRATIVA 1 :_ ________ Fl ~AL ________ _J----------------------------:::~. -::::::~...., • • •--------------• • • : Cobr ança
________________
Í

(b) a determinação de que diligência e perícias sejam requeridas já na oportunidade da impugnação, sob pena de preclusão do direito de solicitá-las em momento posterior (inciso IV e parágrafo 1.o do artigo 16);

(c) a exigência, já na impugnação, de informação acerca da existência de ação judicial versando sobre a matéria impugnada (inciso V do artigo 16);

(d) a criação de limites temporais para a apresentação de provas (parágrafos 4.o e 5.o do artigo 16);

(e) a transformação do julgamento de primeira instância, que passou a ser de competência de órgãos colegiados (artigo 25, I, com a redação dada pelo artigo 64 da Medida Provisória n.º 2.113 30, de 26/04/2001 – atual Medida Provisória n.º 2.158 35, de 24/08/2001);

(f) a criação de novos meios e critérios de formalização das intimações – criação da intimação por meio eletrônico e ampliação do uso da intimação por edital (incisos e parágrafos do artigo 23);

(g) a criação de forma mais célere de aperfeiçoamento das intimações dos Procuradores da Fazenda Nacional acerca das decisões do CARF (parágrafos 8.o e 9.o do artigo 23);

(h) a possibilidade de as Seções do CARF criarem turmas especiais, localizadas nas cidades onde estão localizadas as Superintendências Regionais da RFB, destinadas ao julgamento de processos com valores reduzidos (parágrafo 5.o do artigo 25);

(i) a expressa vedação aos órgãos julgadores administrativos de afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade (caput do artigo 26-A);

(j) a possibilidade de afastamento, por parte dos órgãos julgadores, de tratado, acordo internacional, lei ou ato normativo já declarado inconstitucional por decisão plenária do STF ou que fundamente crédito tributário objeto de algumas hipóteses específicas (dispensa legal de constituição ou de ato declaratório do Procurador Geral da Fazenda Nacional, decisão, súmula da AGU e pareceres do Advogado Geral da União aprovados pelo Presidente da República) (parágrafo 6.o do artigo 26-A);

(k) estabelecimento de critérios de prioridade para o julgamento de processos de elevado valor e que contenham circunstâncias de crime contra a ordem tributária (caput do artigo 27);

(l) possibilidade de uso de laudos e pareceres técnicos exarados em outros processos administrativos mediante certidão de inteiro teor ou cópia fiel (parágrafo 3.o do artigo 30);

(m) extinção do recurso especial privativo da Procuradoria da Fazenda Nacional, que era cabível no caso de decisão não unânime, quando fosse contrária à lei ou à evidência da prova (esta possibilidade de recurso especial foi extinta em razão do veto presidencial ao inciso I da nova redação do parágrafo 2.º do artigo 37 do Decreto n.º 70.235/1972 intentada pelo projeto de lei de conversão que resultou na Lei n.o 11.941, de 27/05/2009);

(n) extinção do recurso voluntário dirigido à Câmara Superior de Recursos Fiscais –CSRF e interposto pelo sujeito passivo, no prazo de 30 dias, contra decisão que tenha dado

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provimento a recurso de ofício proposto pelas DRJ (esta espécie recursal foi extinta em razão da revogação do parágrafo 1.º do artigo 33 do Decreto n.º 70.235/1972, pelo inciso II do artigo 7.o da Medida Provisória n.º 46, de 29/06/2009, bem como pelo veto presidencial à nova redação do parágrafo 3.º do artigo 37 do Decreto n.º 70.235/1972 intentada pelo projeto de lei de conversão que resultou na Lei n.o 11.941, de 27/05/2009).

Mas mudanças também foram operadas por meio de alterações no Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF. Como o RI do CARF compõe legitimamente a ordem processual administrativa (a teor do artigo 37 do Decreto n.o 70.235/1972), tais mudanças podem ser agregadas àquelas acima listadas. Entretanto, antes de elencar tais alterações, importa fazer uma observação: como grande parte das alterações no RI do CARF se consubstanciam como importantes instrumentos do atual processo administrativo fiscal (como as súmulas administrativas, as resoluções e a possibilidade de adoção das decisões do STJ e SRF prolatadas na esfera do julgamento de recursos repetitivos), deveriam elas compor o próprio Decreto n.o 70.235/1972 (ou ato legal de mesma estatura), pois seus efeitos e importância extrapolam em muito os limites do julgamento que é feito no âmbito do CARF (tanto é assim que a inclusão destes instrumentos processuais apenas no RI do CARF, acabou impedindo que o recém-editado Regulamento do PAF - Decreto n.o 7.574/2011 -, as incluísse em seu texto, prejudicando uma visão íntegra do processo administrativo). Feita a observação, trata se a seguir de listar as referidas alterações incluídas no RI do CARF:

(a) extinção do recurso extraordinário no âmbito do CARF, que era dirigido ao Pleno da CSRF e interposto, no prazo de 15 dias, contra decisão de Turma da CSRF que desse à lei tributária interpretação divergente da que lhe tinha dado outra Turma ou o Pleno da CSRF (este recurso constava apenas do antigo Regimento Interno da Câmara Superior de Recursos Fiscais - CSRF – artigo 9.o do Anexo II da Portaria MF n.º 147/2007 -, e está hoje extinto, por não ter sido incluído no Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais aprovado pela Portaria MF n.o 256, de 22/06/2009, e nem no atual Regimento posto pela Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015);

(b) no caso de haver decisões reiteradas e uniformes do CARF, podem elas ser consubstanciadas em súmula de observância obrigatória por seus membros - tais súmulas, aprovadas pela CSRF, podem ter efeito vinculante para toda a Administração Tributária Federal, caso o Ministro da Fazenda lhes atribua tal efeito (artigo 72 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015);

(c) possibilidade de uniformização de decisões divergentes, em tese, das turmas da própria CSRF, por meio de resolução a ser aprovada pelo Pleno da CSRF - as resoluções vinculam os demais órgãos julgadores do CARF (artigo 76 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015);

(d) possibilidade de realização de sessão de julgamento não presencial, nos casos de recursos em processos de valor inferior a R$ 1.000.000,00 ou, independentemente do valor, quando forem objeto de súmula ou resolução do CARF ou de decisões do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça na sistemática dos artigos 543 B e 543 C da Lei n.o 5.869, de 11/01/1973 (antigo CPC) ou dos artigos 1.036 a 1.041 da Lei n.º 13.105, de 16/03/2015 (novo CPC) (parágrafo 2.o do artigo 53 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015, com a redação dada pela Portaria MF nº 152/2016);

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(e) obrigatoriedade de reprodução, pelos conselheiros no julgamento dos recursos no âmbito do CARF, das decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional, na sistemática prevista pelos artigos 543 B e 543 C da Lei n.o 5.869, de 11/01/1973 (antigo CPC) ou pelos artigos 1.036 a 1.041 da Lei n.º 13.105, de 16/03/2015 (novo CPC) (parágrafo 2.o do artigo 62 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015);

(f) com clara inspiração no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR previsto no novo CPC, houve a adição, no RI do Carf, de um procedimento especificamente dirigido ao julgamento de múltiplos recursos com fundamento em idêntica questão de direito. Diz o parágrafo 1.o do artigo 47 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015: "Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, será formado lote de recursos repetitivos e, dentre esses, definido como paradigma o recurso mais representativo da controvérsia ". (parágrafo 1.o do artigo 47 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015, com a redação dada pela Portaria MF nº 153/2018).

O que resulta deste conjunto de alterações é, atualmente, a existência de um rito procedimental altamente concentrado, sem separações expressas entre as fases ordinatória, instrutória e decisória (como o tem o processo judicial) e com um leque de possibilidades recursais bastante restrito. Do ponto de vista da inexistência de separação entre as fases ordinatória, instrutória e decisória, fica ela caracterizada pelo fato de que:

(a) à autoridade fiscal autuante (Administração Ativa) cumpre a obrigação de trazer ao auto de infração (ou ao despacho decisório) todas as razões de fato e de direito que fundamentam o ato impositivo, sendo lhe vedado, em regra, a participação na fase contenciosa sem demanda da autoridade julgadora - a extinção da chamada “oitiva” do autuante referenda o dito;

(b) ao contribuinte, cumpre a obrigação de, ao apresentar a impugnação (ou a manifestação de inconformidade), produzir no mesmo momento não apenas todas as alegações acerca do direito ou dos fatos que tiver contra o ato administrativo contestado, mas também trazer todas as provas que servem à comprovação de suas alegações – em regra, não vige no processo administrativo o pleito de reserva do direito de apresentar provas em momento posterior;

(c) no ato decisório, os órgãos julgadores, salvo alguma situações excepcionalíssimas, julgam todas as questões conjuntamente (incidentes processuais, questões preliminares e prejudiciais e o próprio mérito).

O que se tem, assim, é um sistema no qual o ato administrativo (auto de infração, notificação de lançamento ou despacho decisório) e o recurso do contribuinte (impugnação ou manifestação de inconformidade) já devem compor, conclusivamente, o universo sobre o qual o julgador administrativo efetuará sua cognição. Por óbvio que o julgador poderá demandar diligências para complementar o quadro probatório (porque não se convenceu da veracidade da versão de qualquer das partes), mas tal providência não serve para que sejam produzidas provas que deixaram de ser trazidas pelas partes em descumprimento ao ônus legal que lhes é imposto (ato administrativo desacompanhado das provas que atestam a imposição, é ato ao qual faltam requisitos de validade; contestação do contribuinte que enfrenta ato impositivo com base em meras alegações desprovidas de provas, não possui vigor para instaurar concretamente o litígio).

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Deste modo, repita se, é alto o grau de concentração do rito procedimental previsto no Decreto n.o 70.235/1972, não havendo previsão legal de incidentes processuais capazes de postergar, no plano estrito da ritualística, a prolação das decisões administrativas. Por exemplo, não há, no processo administrativo, decisões interlocutórias passíveis de merecerem contestação e solução ao longo do iter processual; todas as questões que poderiam ser tidas como incidentais, são resolvidas na decisão do órgão julgador.

Também evidencia a alta concentração do rito procedimental do Decreto n.o 70.235/1972, a existência, acima referida, de um leque limitado de recursos administrativos. A listagem das possibilidades recursais atuais bem evidencia isto:

(a) contra o ato primário formalizado pela Administração Ativa (auto de infração, notificação de lançamento ou despacho decisório), cabe impugnação ou manifestação de inconformidade;

(b) contra a decisão da DRJ que julga a impugnação ou a manifestação de inconformidade, cabe:

(b.1) recurso voluntário para uma das Seções do CARF; (b.2) recurso de ofício para uma das Seções do CARF, nos casos de desoneração de valor superior a R$ 2.500.000,00;

(c) contra a decisão da Seção do CARF que julga o recurso voluntário ou o recurso de ofício, cabe:

(c.1) recurso especial para a CSRF;

(c.2) embargos de declaração;

(d) contra o despacho que negar seguimento, total ou parcial, ao recurso especial, cabe agravo, dirigido ao Presidente da Câmara Superior de Recursos Fiscais - CSRF; e (e) complementarmente, tanto no âmbito das DRJ quanto do CARF cabe pedido de correção de inexatidões materiais nas suas decisões, mas tal figura processual não tem feições de recurso, pois não se destina à modificação do decisum.

Tal atual reduzido quadro recursal do processo administrativo resultou, em grande parte, das acima referidas mudanças operadas ao longo dos últimos anos, e que eliminaram: os pedidos de reconsideração, o recurso especial privativo da Procuradoria da Fazenda Nacional, o recurso voluntário dirigido à CSRF no caso de provimento a recurso de ofício e o recurso extraordinário ao Pleno da CSRF (também foram sendo gradativamente extirpadas as possibilidades, anteriormente veiculadas, de se ter recurso hierárquico dirigido ao Secretário da Receita Federal ou a avocatória ministerial).

Assim, repita se uma vez mais, tanto do ponto de vista da falta de separação formal entre as várias fases que compõem o processo decisório, como do ponto de vista das possibilidades recursais hoje existentes, há no processo administrativo regrado pelo Decreto n.o 70.235/1972 um alto grau de concentração procedimental, sendo limitadas as possibilidades de reformulações neste plano de abordagem. E dentro de um tal quadro, reformas na esfera do rito procedimental só são possíveis a partir da superação da ideia de que todos os litígios devem ser julgados por meio do procedimento de duas ou três instâncias, o que traz à tona a necessidade da diversificação procedimental, com a criação de ritos diferenciados para determinados tipos de litígio.

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Neste sentido, já houve tentativa anterior de criar julgamento em instância única, por meio do artigo 10 da Medida Provisória n.o 232, de 30/12/2004. 21 Por este dispositivo legal, depois revogado pela Medida Provisória n.o 243, de 31/03/2005, era atribuída competência às DRJ para julgar em instância única os processos relativos: (a) a penalidade por descumprimento de obrigação acessória; (b) a restituição, ressarcimento e compensação; (c) ao Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte – Simples; e (d) aos processos de exigência de crédito tributário de valor inferior a R$ 50.000,00 (assim considerado principal e multa de ofício). Esta tentativa acabou não vingando, mas é de se mencionar a recente criação, por meio da Lei n.o 13.988/2020, de um procedimento diversificado aplicável ao chamado contencioso administrativo fiscal de pequeno valor, assim considerado aquele cujo lançamento fiscal ou controvérsia não supere sessenta salários mínimos. Trata-se de uma diversificação procedimental tímida, mas que aponta para a possibilidade de incrementos futuros.

Importa ressaltare, ainda, que já houve também tentativa anterior de criar hipóteses diante das quais se teria a caracterização da não contestação do ato administrativo para além da hipótese única, incluída no artigo 17 do Decreto n.o 70.235/1972 (na redação dada pelo artigo 67 da Lei n.º 9.532/1997), de que “considerar se á não impugnada a matéria que não tenha sido expressamente contestada pelo impugnante”. A Medida Provisória n.º 75, de 24/10/2002, que acabou rejeitada pelo Congresso Nacional, buscou incluir, por seu artigo 5.o, um parágrafo único ao artigo 17 do Decreto n.o 70.235/1972, por meio do qual também se considerava não impugnada a matéria nos casos em que o recurso administrativo contivesse: (a) contestação de valores confessados pelo sujeito passivo; (b) pedido de dispensa de pagamento do crédito tributário, por eqüidade; (c) mera manifestação de inconformidade com a lei; (d) argüição de ilegalidade ou a inconstitucionalidade de disposição de lei, salvo na hipótese de que trata o inciso II do art. 19 da Lei n.º 10.522, de 19 de julho de 2002, que haja sido objeto de ato declaratório do Procurador Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda, bem assim da determinação a que se refere o § 4.º do artigo citado; e (e) discussão de matéria de mérito que tivesse o mesmo objeto submetido pelo impugnante a apreciação judicial.

21 A Medida Provisória n.o 232/2004 dava a seguinte redação ao artigo 25 do Decreto n.o 70.235/1972: “Art. 25. O julgamento de processo relativo a tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal compete: I - às Delegacias da Receita Federal de Julgamento, órgão de deliberação interna e natureza colegiada da Secretaria da Receita Federal: a) em instância única, quanto aos processos relativos a penalidade por descumprimento de obrigação acessória e a restituição, a ressarcimento, a compensação, a redução, a isenção, e a imunidade de tributos e contribuições, bem como ao Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte –Simples; e aos processos de exigência de crédito tributário de valor inferior a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), assim considerado principal e multa de ofício; b) em primeira instância, quanto aos demais processos; [...]”

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6. Recursos no Processo Administrativo Fiscal

Os recursos passíveis de utilização na esfera administrativa estão previstos tanto no Decreto n.º 70.235/1972, como no Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Anexo II da Portaria Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015) e na Lei n.º 9.784, de 29/01/1999. Como resumo, apresenta se a lista a seguir, na qual estão listados não apenas os recursos atualmente existentes, mas identificados, para fins de ilustração e contextualização no tempo, os recursos que acabaram extintos em razão, especialmente, da superveniência do Regimento Interno do novo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais e também da Lei n.o 11.941, de 27/05/2009:

(a) Impugnação, dirigida às Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento – DRJ e interposta pelo sujeito passivo, no prazo de 30 dias, contra auto de infração ou notificação de lançamento (artigo 14 do Decreto n.º 70.235/1972 e incisos I a III do artigo 277 do Anexo I da Portaria MF n.º 430, de 09/10/2017);

(b) Manifestação de Inconformidade, dirigida às DRJ e interposta pelo sujeito passivo, no prazo de 30 dias, “contra apreciações das autoridades competentes em geral, despachos decisórios das Delegacias da Receita Federal do Brasil – DRF ou das Inspetorias da Receita Federal do Brasil – IRF em processos relativos a restituição, compensação, ressarcimento, reembolso, imunidade, suspensão, isenção e redução de alíquotas de tributos, Pedido de Revisão de Ordem de Incentivos Fiscais (PERC), indeferimento de opção pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte (Simples) e pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), e exclusão do Simples e do Simples Nacional” (artigos 77 a 80 da Instrução Normativa RFB n.º 1.300, de 20/11/2012, e inciso IV do artigo 277 do Anexo I da Portaria MF n.º 430, de 09/10/2017);

(c) Recurso Voluntário, dirigido ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF e interposto pelo sujeito passivo, no prazo de 30 dias, contra decisão das DRJ que tenha declarado procedente, parcial ou totalmente, o lançamento formalizado por via de auto de infração ou notificação de lançamento (neste caso é proposto contra o não acatamento, parcial ou total, da impugnação), ou que tenha indeferido a solicitação nos casos de pedido de compensação, restituição ou ressarcimento de crédito tributário, ou de reconhecimento de direito à imunidade, à suspensão, à isenção e à redução de tributos e contribuições (nesta hipótese é proposto contra o não acolhimento, total ou parcial, da manifestação de inconformidade) (artigo 33 do Decreto n.º 70.235/1972 e artigos 1.o e 7.o do Anexo II da Portaria MF n.o 353, de 09/06/2015);

(d) Recurso de Ofício, dirigido ao CARF e interposto pelas DRJ contra decisões suas (prolatadas em face da apreciação de impugnação de lançamento de ofício), total ou parcialmente favoráveis ao sujeito passivo, que exonerarem este do pagamento de tributo e multa em valor total (lançamento principal e decorrentes) superior a R$ 2.500.000,00

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(inciso I do artigo 34 do Decreto n.º 70.235/1972 e artigo 1.º da Portaria MF n.º 63, de 09/02/2017);

(e) Recurso Voluntário (à CSRF), dirigido à Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF e interposto pelo sujeito passivo, no prazo de 30 dias, contra decisão que tenha dado provimento a recurso de ofício promovido pelas DRJ (ATENÇÃO: este recurso foi extinto em razão da revogação do parágrafo 1.º do artigo 33 do Decreto n.º 70.235/1972, pelo inciso II do artigo 7.o da Medida Provisória n.º 46, de 29/06/2009, bem como pelo veto presidencial à nova redação do parágrafo 3.º do artigo 37 do Decreto n.º 70.235/1972 intentada pelo projeto de lei de conversão que resultou na Lei n.o 11.941, de 27/05/2009);

(f) Recurso Especial, dirigido à CSRF e interposto, no prazo de 15 dias, contra:

1. decisão não unânime de Câmara do CARF quando for contrária à lei ou à evidência da prova - recurso privativo do Procurador da Fazenda Nacional (ATENÇÃO: esta possibilidade de recurso especial foi extinta em razão do veto presidencial ao inciso I da nova redação do parágrafo 2.º do artigo 37 do Decreto n.º 70.235/1972 intentada pelo projeto de lei de conversão que resultou na Lei n.o 11.941, de 27/05/2009);

2. decisão que der à lei tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra Câmara, turma de Câmara, turma especial (todas do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) ou a própria Câmara Superior de Recursos Fiscais (recurso manejável tanto pelo Procurador da Fazenda Nacional quanto pelo sujeito passivo) (inciso II do parágrafo 2.o do artigo 37 do Decreto n.º 70.235/1972, e artigos 67 a 71 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015); Observação: este recurso cabe tanto contra decisão que tenha apreciado recurso voluntário, quando de decisão que tenha dado ou negado provimento a recurso de ofício (parágrafo 14 do artigo 67 do Anexo II da Portaria MF n.o 353, de 09/06/2015);

(g) Recurso Extraordinário, dirigido ao Pleno da CSRF e interposto, no prazo de 15 dias, contra decisão de Turma da CSRF que der à lei tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra Turma ou o Pleno da CSRF (recurso manejável tanto pelo Procurador da Fazenda Nacional quanto pelo sujeito passivo) (ATENÇÃO: este recurso constava apenas do antigo Regimento Interno da Câmara Superior de Recursos Fiscais - CSRF –artigo 9.o do Anexo II da Portaria MF n.º 147/2007 , e está hoje extinto, por não ter sido incluído no anterior Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais aprovado pela Portaria MF n.o 256, de 22/06/2009, e nem no atual, aprovado pela Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015);

(h) Embargos de Declaração, dirigido contra as decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais e apresentado, no prazo de 5 dias, por conselheiro da Turma, pelo Procurador da Fazenda Nacional, pelo sujeito passivo, pela autoridade julgadora de primeira instância ou pela autoridade encarregada da execução do acórdão, quando existir no acórdão prolatado obscuridade, dúvida ou contradição entre decisão e fundamentos, ou ainda quando for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar se a Turma (artigo 65 do Anexo II da Portaria MF n.o 353, de 09/06/2015);

(i) Agravo, dirigido ao presidente da Câmara recorrida e interposto, no prazo de 5 dias, pelo Procurador da Fazenda Nacional ou pelo sujeito passivo, contra despacho que negar seguimento, total ou parcial, a recurso especial (artigo 71 do Anexo II da Portaria MF n.o 343, de 09/06/2015).

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(j) Pedido de Correção de Inexatidões Materiais, dirigido às DRJ e aos colegiados do CARF (onde é denominado de “embargos iniminados”) e proposto, conforme o caso, pela autoridade incumbida da execução do acórdão, pela autoridade julgadora de primeira instância, pelo Procurador da Fazenda Nacional, por Conselheiro ou pelo sujeito passivo, com o fim de sanear as inexatidões materiais devidas a lapso manifesto e os erros de escrita ou de cálculo existentes na decisão (artigo 39 da portaria ME n.º 340/2020, e artigo 66 do Anexo II da Portaria MF n.o 353, de 09/06/2015);

(k) Outros Recursos: a título ilustrativo, cabe ressaltar que além dos recursos acima listados (vinculados ao processo de determinação e exigência de créditos tributários), outros há, dispersos pela legislação tributária, que se destinam à contestação de atos administrativos específicos, como tais a “Solicitação de Revisão da Vedação/Exclusão à Opção pelo Simples – SRS” (dirigida à autoridade administrativa que excluiu o sujeito passivo do Simples, como previsto no item 2.3 da Norma de Execução Cotec/Cosit/Cosar/Cofis/Coana n.º 001, de 03/09/1998), o recurso interposto contra o ato de exclusão do sujeito passivo do Refis (parágrafo 2.º do artigo 5.º da Resolução CG/Refis n.º 09, de 12/01/2001, com a redação dada pelo artigo 1.º da Resolução CG/Refis n.º 20, de 27/09/2001), etc.;

(l) Recurso Hierárquico, dirigido, no prazo de 10 dias, às autoridades hierarquicamente superiores àquelas que praticaram os atos contestados, nos casos em que contra tais atos não estejam previstos os recursos constantes do processo administrativo fiscal (artigos 56 a 65 da Lei n.º 9.784, de 29/01/1999).

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7. Outras espécies de processo administrativo fiscal

O processo administrativo fiscal, enquanto gênero, possui várias espécies distintas, destinadas a contemplar a multiplicidade de relações que se dão no âmbito da interação entre a Administração Tributária e os contribuintes. Classificações destas espécies processuais podem ser feitas tendo se em conta diversos critérios distintivos. Há, por exemplo, processos cuja iniciativa inicial é do sujeito passivo (é o caso, em especial, dos processos de reconhecimento de direito creditório – restituição, ressarcimento, reembolso e compensação , e do processo de consulta), e outros que são de iniciativa da Administração Tributária (processo de determinação e exigência de créditos tributários –que envolve os procedimentos de fiscalização em âmbito tributário e aduaneiro , processo de perdimento de mercadorias, veículos e moda, processo de aplicação e exigência de direitos antidumping e compensatórios, de medidas de salvaguarda e de direitos de natureza comercial etc.).

Para além das classificações, entretanto, o que importa é que as várias espécies processuais existentes permitem o desenvolvimento transparente e previsível das relações entre sujeito passivo e Administração Tributária.

Do ponto de vista da Administração Tributária, regras procedimentais claras permitem o combate à arbitrariedade, facilitam o monitoramento e aperfeiçoamento das rotinas de trabalho e estabelecem um padrão de relacionamento com os cidadãos que serve ao incremento da credibilidade da instituição fazendária perante a sociedade (de se lembrar que a aceitação social da tributação depende, dentre outros fatores, do nível de confiança que a sociedade tem em sua Administração Tributária).

Do ponto de vista dos sujeitos passivos, o processo administrativo, em moldes similares aos do processo judicial, representa um meio de que dispõem para pleitear a manifestação do Estado quanto a um direito seu que foi, está ou será violado, ou ainda ao reconhecimento de um direito que necessita de tal assentimento para fins de que possa ser exercido. Na esfera administrativa, o pleito dirige-se ao Estado-Administrador; já em sede judicial, o pleito destina se ao Estado Juiz. Assim, os processos administrativos, via de regra, são os caminhos colocados à disposição de qualquer pessoa para o acesso à atuação direta e específica da Administração Pública.

No âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil, o gênero processo administrativo fiscal é composto não apenas pelo rito previsto no Decreto n.º 70.235/1972 (que disciplina, em especial, o processo administrativo de determinação e exigência dos créditos tributários da União), mas também por várias outras espécies dirigidas a pleitos/insurgências específicos. Dentre estas várias outras espécies, destacam se, por sua relevância e amplitude de aplicação, os abaixo indicados.

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7.1. Processo de Reconhecimento de Direito Creditório (Restituição, Ressarcimento, Reembolso e Compensação de Tributos Federais)

7.1.1. Procedimento Ordinário

Os processos de restituição, ressarcimento, reembolso e compensação, chamados genericamente de "processos de reconhecimento de direito creditório", estão disciplinados nos artigos 73 e 74 da Lei n.º 9.430, de 27/12/1996, e Instrução Normativa RFB n.º 1.717, de 17/07/2017 (com as alterações promovidas pelas Instruções Normativas RFB n.º 1.765/2017, 1.769/2017, 1.776/2017 e 1.810/2018). Por meio daqueles processos, o sujeito busca ver repetidos créditos contra a Fazenda Nacional gerados por meio de várias hipóteses previstas na legislação tributária, como tais: recolhimentos indevidos ou a maior (caracterizados como tal em razão de equívocos do sujeito passivo na apuração dos tributos devidos, bem como por decisão judicial que reconheceu ao sujeito passivo a irregularidade, total ou parcial, de uma determinada incidência tributária já objeto de anteriores apuração e adimplemento), créditos obtidos por meio de decisão judicial, créditos vinculados a valores não aproveitados no âmbito dos tributos não-cumulativos etc.

Dois aspectos servem à diferenciação entre as quatro espécies de repetição: os tipos de créditos contra Fazenda Nacional e a forma como tais créditos são aproveitados pelo sujeito passivo.

(a) restituição: se destina à devolução em dinheiro de valores recolhidos indevidamente ou a maior a título de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil;

(b) ressarcimento: à semelhança e do que ocorre com a restituição, se destina à devolução em dinheiro de créditos contra a Fazenda Nacional; entretanto, difere da restituição no que se refere ao tipo de crédito a ser devolvido: enquanto na restituição o que se devolve é “tributo” indevidamente adimplido, no caso do ressarcimento o que se devolve são créditos escriturais, gerados no âmbito dos tributos não cumulativos, que não puderam ser aproveitados quando da apuração do tributo devido ao final de um período de apuração, pela devida confrontação entre créditos e débitos gerados pelas entradas e saídas da atividade negocial (tal forma de apuração existe hoje, no âmbito federal, em relação ao Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, à Contribuição para o Programa de Integração Social – PIS e à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social –Cofins, estas duas últimas exações no caso de apuração pelo regime não cumulativo). De se ressaltar que, em regra, a forma ordinária e preferencial de utilização dos créditos escriturais a que aqui se faz referência é o “desconto” em relação ao montante de débitos gerados pela saída de produtos ou receita gerada; apenas depois de evidenciada impossibilidade de desconto, em razão da reiterada geração de créditos em montantes maiores que os débitos, é que a legislação de cada um daqueles tributos permite, sob as condições que especifica, o ressarcimento em dinheiro;

(c) reembolso: se destina à devolução em dinheiro de valores relativos às quotas de salário-família e salário-maternidade pagas pelas pessoas jurídicas;

(d) compensação: se destina à repetição do indébito tributário por meio da compensação dos créditos contra a Fazenda Nacional com débitos relativos a outros períodos de apuração. No caso da compensação, podem ser objeto de repetição não apenas valores relativos a recolhimentos indevidos efetuados a título de “tributos”, como também

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créditos escriturais que não puderam ser aproveitados no âmbito dos tributos apurados por regimes não-cumulativos (como já explicitado quando se falou do ressarcimento).

Há, ainda, algumas particularidades importantes quanto estes quatro tipos de processo.

Primeiro, enquanto nos três primeiros tipos (restituição, ressarcimento e reembolso), a devolução só se dará depois de ter havido decisão administrativa final acerca do pleito (o que poderá demandar muito tempo, em razão de que poderá haver manifestação de até três instâncias julgadoras, para além da apreciação inicial feita pela unidade da Receita Federal que jurisdiciona o domicílio tributário do sujeito passivo), no caso da compensação, em face de expressa disposição legal, a apresentação da Declaração de Compensação – DCOMP opera efeitos imediatos, extinguindo imediatamente os débitos tributários, mesmo que sob condição resolutória de ulterior homologação por parte da Receita Federal. Assim, a compensação se mostra como uma forma mais imediata de aproveitamento dos créditos contra a Fazenda Nacional.

Segundo, no caso da compensação, além de se ter uma forma mais célere de aproveitamento dos créditos contra a Fazenda Nacional, há ainda outra particularidade importante: caso a DCOMP não seja apreciada pela Receita Federal no prazo de cinco anos, a compensação será tida por homologada tacitamente, ou seja, o prazo corre contra a Administração Tributária. Já nos casos da restituição, do ressarcimento e do reembolso, não há prazo limite para a Administração Tributária decidir quanto aos pleitos, o que quer dizer que o prazo, em verdade, corre contra o sujeito passivo, que só verá seu direito reconhecido e passível de ser usufruído, depois de haver decisão administrativa final.

Do ponto de vista estritamente processual, há também algumas especificidades que precisam ser ressaltadas:

(a) rito procedimental do Decreto n.o 70.235/1972, com adaptações: apesar de se iniciarem com atos de iniciativa do sujeito passivo ("pedidos", no caso de restituição, ressarcimento e reembolso, e "declaração de compensação", no caso de compensação), a fase contenciosa destes processos segue, em linhas gerais, o rito do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais (abordado no item 5); a distinção principal está no fato de que enquanto nesse rito (o do Decreto n.o 70.235/1972) a fase inicial, não litigiosa, é composta pela ação fiscal e concluída com o lançamento tributário, nos processos de reconhecimento de direito creditório a fase inicial se inicia com o pleito do contribuinte e fica concluída com a prolação de Despacho Decisório, no qual o chefe da unidade que jurisdiciona o domicílio do sujeito passivo ou o local onde foi efetuado o despacho aduaneiro (Delegacia - DRF, Inspetoria - IRF ou Alfândega - ALF), se manifesta quanto à procedência ou não da repetição pretendida. Assim, o ato administrativo que, contestado, dá margem à inauguração da fase contenciosa é, no caso do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais, o lançamento tributário; já no caso do processo de reconhecimento de direito creditório, é o Despacho Decisório que indeferiu, parcial ou integralmente, os pedidos de restituição, ressarcimento e reembolso, ou que não homologou ou homologou apenas parcialmente, a compensação declarada; (b) inexistência de recurso de ofício: outra distinção importante entre o rito do processo de determinação e exigência de créditos tributários federais e o do processo de reconhecimento de direito creditório, é que nesse segundo, apesar das já referidas similaridades com aquele, não há recurso de ofício. Como já se viu no item 5, as Delegacias

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de Julgamento devem recorrer de ofício contra suas próprias decisões nos casos em que do julgamento de impugnação contra lançamento tributário resulte na exoneração de crédito tributário superior a R$ 2.500.000,00; já no caso de reconhecimento de direito creditório, não há limite de alçada, ou seja, em qualquer das fases de apreciação dos pleitos dos sujeitos passivos, a decisão é definitiva no que se refere à parcela do crédito concedida ao sujeito passivo;

(c) a compensação não declarada: no caso das compensações, o Despacho Decisório poderá homologar, homologar em parte ou não homologar tais compensações. Mas há ainda outra hipótese: a de que a compensação seja considerada como não declarada, em razão de o sujeito passivo ter utilizado, na Declaração de Compensação, créditos contra a Fazenda Nacional cujo uso, para fins de compensação, está expressamente vedado pela legislação tributária. Neste caso, com a compensação sendo considerada como não declarada, além de ela ser tida como sequer formalizada, o sujeito passivo perde o direito de recorrer aos órgãos julgadores que compõem o contencioso administrativo fiscal, restando lhe apenas a possibilidade do recurso hierárquico, previsto no artigo 59 da Lei n.o 9.784/1999, dirigido ao superior hierárquico da autoridade fiscal prolatora do Despacho Decisório (em regra, o Superintendente Regional da Receita Federal do Brasil). Na apreciação do recurso hierárquico, a questão a ser colocada à apreciação da autoridade competente será limitada, por óbvio, à regularidade da caracterização da compensação como não declarada. E a decisão, na medida em que limitada a esta questão, poderá ter um de dois efeitos: se houver a confirmação da decisão recorrida (da DRF, da IRF ou da ALF), a decisão será definitiva em sede administrativa; se, entretanto, houver a revisão da decisão recorrida, com a conseqüente afirmação de que a compensação não pode ser considerada como não declarada, será reaberto prazo para que o contribuinte apresente manifestação de inconformidade junto às Delegacias de Julgamento, passando o processo a seguir as fases ordinárias do contencioso administrativo.

Importa destacar que não há um rito espçecífico para o processo de reconhecimento de direito creditório. Na verdade, a base do processo de reconhecimento de direito creditório é o rito do Decreto n.o 70.235/1972, já detalhado no Item 5, sendo que grande parte dos desdobramentos processuais são muito similares.

Estão detalhadas, a seguir, as regras processuais principais relativas aos processos de restituição, ressarcimento, reembolso e compensação (os artigos indicados como base legal são da Instrução Normativa RFB n.º 1.717, de 17/07/2017):

7.1.1.1. Formalização dos pedidos

(a) Restituição

A restituição poderá ser efetuada (art. 7.º): (i) por requerimento do sujeito passivo ou da pessoa autorizada a requerer a quantia mediante utilização do Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação (PER/DCOMP) ou, na impossibilidade de sua utilização, através de requerimento formalizado por meio do formulário Pedido de Restituição ou de Ressarcimento, constante do Anexo I da IN RFB n.o 1.717/2017. (ii) mediante processamento eletrônico da Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF).

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(b) Ressarcimento

Os pedidos de ressarcimento de créditos do IPI, da COFINS e do PIS/PASEP serão efetuados mediante utilização do Programa PER/DCOMP ou, na impossibilidade de sua utilização, através de requerimento formalizado por meio do formulário Pedido de Restituição ou de Ressarcimento, constante do Anexo IV da IN RFB n.o 1.717/2017 (artigo 56).

(c) Reembolso

O pedido de reembolso de valores de quotas de salário família e salário maternidade será requerido por meio do programa PER/DCOMP ou, na impossibilidade de sua utilização, através de requerimento formalizado por meio do formulário Pedido de Reembolso de Quotas de Salário Família e de Salário Maternidade, constante do Anexo III da IN RFB n.o 1.717/2017 (artigo 64).

(d) Compensação

A compensação será efetuada pelo sujeito passivo mediante apresentação à RFB da Declaração de Compensação gerada a partir do programa PER/DCOMP ou, na impossibilidade de sua utilização, mediante a apresentação à RFB do formulário Declaração de Compensação, constante do Anexo III da IN RFB n.o 1.717/2017 (artigo 65, § 1.o).

7.1.1.2. Competência para apreciação dos pedidos (regras principais)

(a) A decisão sobre o pedido de restituição, sobre o pedido de ressarcimento e sobre o pedido de reembolso, caberá à DRF ou à Delegacia Especial da RFB que, à data do despacho decisório, tenha jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo (artigo 117).

(b) A restituição, o ressarcimento e o reembolso caberão à DRF ou à Delegacia Especial da RFB que, à data da restituição, do ressarcimento e do reembolso, tenha jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo (artigo 118).

(c) A decisão sobre a compensação caberá à DRF ou à Delegacia Especial da RFB que, à data do despacho decisório, tenha jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo (artigo 119).

(d) A compensação de ofício do crédito do sujeito passivo e a restituição ou o ressarcimento do saldo credor porventura remanescente da compensação caberão à DRF ou à Delegacia Especial da RFB que, à data da compensação, tenha jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo (artigo 119).

(e) A decisão sobre o pedido de restituição de crédito decorrente de cancelamento ou retificação de DI e a sua restituição caberão à unidade responsável pela retificação ou cancelamento da DI (artigo 121).

(f) A decisão sobre o pedido de restituição de crédito relativo a operação de comércio exterior que não seja decorrente de retificação ou cancelamento de DI e a sua restituição caberão à DRF, à Inspetoria da Receita Federal do Brasil (IRF) de Classe Especial ou à Alfândega da Receita Federal do Brasil (ALF) sob cuja jurisdição for efetuado o despacho aduaneiro da mercadoria (artigo 123).

(g) A decisão sobre o pedido de restituição e sobre o pedido de ressarcimento de crédito relativo ao IPI caberá à DRF ou à Delegacia Especial da RFB que, à data do despacho decisório, tenha jurisdição sobre o domicílio tributário do estabelecimento da pessoa jurídica que apurou os valores pleiteados (artigo 127).

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7.1.1.3. Discussão administrativa

(a) Recursos administrativos contra o indeferimento ou não-homologação:

Art. 135. É facultado ao sujeito passivo, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data da ciência da decisão que indeferiu seu pedido de restituição, pedido de ressarcimento ou pedido de reembolso ou, ainda, da data da ciência do despacho que não homologou a compensação por ele efetuada, apresentar manifestação de inconformidade contra o indeferimento do pedido ou a não homologação da compensação, nos termos do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972.

§ 1º A manifestação de inconformidade deverá atender aos requisitos de admissibilidade previstos no art. 16 do Decreto nº 70.235, de 1972.

§ 2º Ocorrendo manifestação de inconformidade contra a não homologação da compensação e impugnação da multa de ofício a que se refere o art. 74, os recursos deverão ser, quando possível, decididos simultaneamente.

§ 3º No caso de apresentação de manifestação de inconformidade contra a não homologação da compensação, fica suspensa a exigibilidade da multa de ofício de que trata o inciso I do § 1º do art. 74, ainda que não impugnada essa exigência.

§ 4º A competência para julgar manifestação de inconformidade é da Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento (DRJ), observada a competência material em razão da natureza do direito creditório em litígio.

§ 5º O disposto no caput aplica se à manifestação de inconformidade contra a decisão que considerar indevida a compensação de contribuições previdenciárias.

Art. 136. Da decisão que julgar improcedente a manifestação de inconformidade, caberá recurso ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), nos termos do Decreto nº 70.235, de 1972.

Parágrafo único. Não caberá recurso de ofício da decisão que considerar procedente manifestação de inconformidade em processos relativos a restituição, ressarcimento, reembolso ou compensação.

Art. 137. A manifestação de inconformidade contra a não homologação da compensação, bem como o recurso contra a decisão que julgou improcedente essa manifestação de inconformidade, enquadram se no disposto no inciso III do art. 151 do CTN relativamente ao débito objeto da compensação.

Art. 138. É facultado ao sujeito passivo apresentar recurso, nos termos do art. 56 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, contra a decisão que: I - indeferiu o pedido de habilitação de crédito decorrente de ação judicial; ou II - considerou não declarada a compensação.

§ 1º O recurso deve ser apresentado no prazo de 10 (dez) dias, contado da data da ciência da decisão recorrida, nos termos dos arts. 56 a 65 da Lei nº 9.784, de 1999.

§ 2º O recurso será apreciado por Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil.

§ 3º Na hipótese de não reconsideração da decisão, o Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil encaminhará o recurso ao titular da unidade.

Art. 139. Os recursos fundamentados no art. 56 da Lei nº 9.784, de 1999, contra decisões originadas em unidades locais, são decididos, em última instância, pelos titulares das Superintendências Regionais da Receita Federal do Brasil.

(b) Possibilidade de prolação de novo despacho decisório denegatório em sede de apuração dos cálculos referentes à decisão prolatada no contencioso administrativo (Parecer Normativo Cosit n.º 08, de 03/09/2014): apesar do disposto no artigo 42 do Decreto n.º 70.235/1972, dando conta das situações nas quais a decisão administrativa é definitiva, a Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal (Cosit) estabeleceu formalmente, através do Parecer Normativo Cosit n.º 08/2014, a possibilidade de revisão de ofício de despacho decisório já julgado pelo contencioso administrativo, diante da

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superveniência de novos elementos que possam alterar o quadro de fato ou de direito até então considerado. É o que dispõe o item 81 do referido PN: 81. [...]

f) a revisão de ofício nas hipóteses aqui tratadas não se insere nas reclamações e recursos de que trata o art. 151, III, do CTN, regulados pelo Decreto nº 70.235, de 1972, tampouco a ela se aplica a possibilidade de qualquer recurso, uma vez que, ainda que possa ser originada de uma provocação do contribuinte, é procedimento unilateral da Administração, e não um processo para solução de litígios;

g) todavia, para os casos de reconhecimento de direito creditório e de homologação de compensação alterados em virtude de revisão de ofício do despacho decisório que tenha implicado prejuízo ao contribuinte, em atenção ao devido processo legal, deve ser concedido o prazo de trinta dias para o sujeito passivo apresentar manifestação de inconformidade e, sendo o caso, recurso voluntário, no rito processual do Decreto nº 70.235, de 1972, enquadrando se o débito objeto da compensação no disposto no inciso III do art. 151 do CTN. h) a revisão de ofício não é obstada pela existência de ação judicial com o mesmo objeto. Todavia, advindo, decisão judicial transitada em julgado, somente esta persistirá, em face da prevalência da coisa julgada e da jurisdição única;

i) na execução de decisão de órgão julgador administrativo, observam se rigorosamente os limites materiais estabelecidos por este, inclusive quanto aos valores reivindicados pelo contribuinte, se sobre eles o órgão já houver se manifestado e declarado objetivamente no julgado; todavia, se no ato de execução do acórdão pela autoridade local houver discordância do contribuinte quanto aos valores apurados, e sobre os quais o órgão julgador não tenha se manifestado, devolvem se os autos do processo às mesmas instâncias julgadoras, a fim de ser julgada a controvérsia quanto aos valores, sob o rito do Decreto nº 70.235, de 1972, não tendo que se falar em decurso do prazo de que trata o §5º do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996;

j) não ocorre preclusão administrativa para fins de aferir o valor correto do crédito pleiteado pelo contribuinte, em fase de execução de julgado favorável a este, o qual não contenha manifestação sobre o aspecto quantitativo, quer seja por ser esta fase o momento processual oportuno, quer seja pelo princípio da indisponibilidade do interesse público; e [...]

Como se percebe, o PN 8/2014 criou um verdadeiro novo procedimento para o processamento dos pedidos de reconhecimento de direito creditório. Agora, no ato de liquidação das decisões “definitivas” do contencioso administrativo favoráveis ao sujeito passivo, os órgãos da RFB responsáveis pelos cálculos poderão levantar outras matérias não apreciadas por este contencioso, prolatando um novo despacho decisório indeferindo o direito creditório por conta de outras razões – de fato ou de direito – não originalmente levantadas no despacho decisório originário; e quanto a este novo despacho decisório, o sujeito passivo poderá apresentar nova manifestação de inconformidade, que reacionará o contencioso administrativo a partir da primeira instância (DRJ).

Por fim, o PN traz uma disposição polêmica, qual seja a de que o novo despacho decisório, no caso de compensação, pode ser prolatado a qualquer tempo (ou seja, independentemente do prazo do artigo 74 da Lei n.º 9.430/1996), já que a partir do despacho decisório originário não correria mais o prazo para a homologação tácita.

(c) Inexistência de recurso de ofício no caso de deferimento ou homologação:

Art. 136. [...] Parágrafo único. Não caberá recurso de ofício da decisão que considerar procedente manifestação de inconformidade em processos relativos a restituição, ressarcimento, reembolso ou compensação.

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7.1.2. Procedimento Especial de Ressarcimento

7.1.2.1. Procedimento Especial de Ressarcimento de Créditos do PIS, da Cofins e do IPI

Por meio da Portaria MF n.º 348, de 16/06/2010 (com as alterações das Portarias MF n.º 594, de 31/12/2010, n.º 260, de 24/05/2011, n.º 131, de 20/04/2012, e n.º 393, de 04/10/2016), foi criado um procedimento especial para o ressarcimento de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP, da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Tal procedimento se aplica para situações específicas listadas no ato legal.

Posteriormente à edição da Portaria MF n.º 348/2010, a RFB editou a Instrução Normativa RFB n.º 1.060, de 03/08/2010, destinada a disciplinar o procedimento especial em questão.

7.1.2.2. Procedimento Especial de Ressarcimento de Créditos do PIS e da Cofins

Por meio da Portaria MF n.º 7, de 14/01/2011, foi criado um novo procedimento especial para o ressarcimento de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS). Tais créditos são aqueles associados ao benefício previsto no parágrafo 8.º do artigo 14 da Lei n.º 11.033, de 21/12/2004.

7.1.2.3. Procedimento Especial de Ressarcimento de Créditos do PIS e da Cofins

Por meio da Portaria MF n.º 348, de 26/08/2014, foi criado um novo procedimento especial para o ressarcimento de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS). Tais créditos são aqueles previstos no artigo 31 da Lei nº 12.865, de 09/10/2013.

Posteriormente à edição da Portaria MF n.º 348/2014, a RFB editou a Instrução Normativa RFB n.º 1.497, de 07/10/2014, destinada a disciplinar o procedimento especial em questão.

7.1.2.4. Processo de ressarcimento em espécie e dedução de ofício do crédito presumido apurado com base em créditos decorrentes de diferenças temporárias oriundos de provisões para créditos de liquidação duvidosa

Na Instrução Normativa RFB n.º 1.457, de 10/03/2014, está disciplinado o processo de ressarcimento em espécie e dedução de ofício do crédito presumido apurado com base em créditos decorrentes de diferenças temporárias oriundos de provisões para créditos de liquidação duvidosa. Trata se de normas aplicáveis aos casos em que as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, exceto cooperativas de crédito e administradoras de consórcio, apuram crédito presumido a partir de provisões para créditos de liquidação duvidosa, em cada ano calendário, quando apresentam de forma cumulativa: (a) créditos decorrentes de diferenças temporárias oriundos de provisões para crédito de liquidação duvidosa, existentes no ano calendário anterior; e (b) prejuízo fiscal apurado no ano calendário anterior.

A competência para a prolação da decisão originária acerca do pedido de ressarcimento e da dedução de ofício, bem como os procedimentos aplicáveis, está dada pelos artigos 13 a 16 da IN RFB n.º 1.457/2014.

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A inconformidade do contribuinte quanto à decisão denegatória poderá ser objeto de recurso hierárquico, processado nos termos da Lei n.º 9.784/1999, na forma prevista no artigo 17 da IN RFB n.º 1.457/2014.

Nas disposições finais da IN RFB n.º 1.457/2014, há duas importantes referentes à legitimidade para o pedido de ressarcimento. No artigo 18, está expresso que “O crédito presumido de que trata esta Instrução Normativa não será apurado pelas instituições cuja liquidação extrajudicial ou falência tenha sido decretada antes de 1º de janeiro de 2014”. Já o artigo 19, determina que “No caso de sucessão empresarial, terá legitimidade para pleitear o resssarcimento a empresa sucessora ”.

Por fim, no artigo 20, a advertência de que a disciplina na IN “não se aplica ao ressarcimento em títulos da dívida pública mobiliária federal de que trata o art. 4º, § 1º, da Lei nº 12.838, de 9 de julho de 2013”.

7.2. Processo de consulta

Desde a edição da Instrução Normativa RFB n.º 1.396, de 16/09/2013, o processo de consulta está disciplinado em dois atos administrativos distintos. Anteriormente, a Instrução Normativa RFB n.º 740, de 02/05/2007, tratava tanto do “processo de consulta relativo à interpretação da legislação tributária e aduaneira e à classificação de serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio”, quanto do “processo de consulta sobre classificação fiscal de mercadorias “. Atualmente, a Instrução Normativa RFB n.º 1.396, de 16/09/2013 (com as alterações das Instruções Normativas RFB n.º 1.434, de 30/12/2013, n.º 1.567, de 05/06/2015, e n.º 1.689, de 20/02/2017) disciplina o primeiro daqueles referidos processos, cabendo à Instrução Normativa RFB n.º 1.464, de 08/05/2014 (com as alterações das Instruções Normativas RFB n.º 1.705, de 13/04/2017, e n.º 1.829, de 17/09/2018), o regramento do segundo.

Importa ressaltar que as soluções de consulta, atualmente, têm efeito vinculante no âmbito da RFB, já que respaldam o sujeito passivo que as aplicar, independentemente de ser o consulente (isso, por óbvio, desde que se enquadre na hipótese por elas abrangida, sem prejuízo de que a autoridade fiscal, em procedimento de fiscalização, verifique seu efetivo enquadramento). As disposições que estabelecem este efeito vinculante são o artigo 9.º da Instrução Normativa RFB n.º 1.396, de 16/09/2013 (com a redação dada pela Instrução Normativa RFB n.º 1.434, de 30/12/2013) e o artigo 15 da Instrução Normativa RFB n.o 1.464, de 08/05/2014.

Os dois processos estão descritos nos itens 7.2.1 e 7.2.2, a seguir, juntamente com o processo de consulta relativo ao Simples Nacional (item 7.2.3).

7.2.1. Processo de consulta relativo à interpretação da legislação tributária e aduaneira e à classificação de serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio

O processo de consulta está originalmente disciplinado nos artigos 46 a 53 do Decreto n.º 70.235/1972, mas foi bastante alterado pelos artigos 48 a 50 da Lei n.º 9.430/1996. Atualmente, a Instrução Normativa RFB n.º 1.396, de 16/09/2013, disciplina os procedimentos destinados à formalização da consulta.

É por meio da consulta que o sujeito passivo, ou entidade legitimada a representá lo, demanda manifestação formal da Administração Tributária acerca da aplicação da legislação tributária em relação a fato determinado. É instrumento destinado à elucidação

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do entendimento do órgão fazendário quanto ao tratamento tributário a ser dado a uma situação concreta, devidamente especificada, relativa ao consulente. Assim, havendo dúvidas quanto aos critérios de aplicação da legislação tributária, mostra se a consulta como meio eficiente de o sujeito passivo prevenir se quanto a interpretações divergentes adotadas pela Administração Tributária.

É importante ter em conta que, apesar do nome, a consulta não se destina à manifestação da Administração Tributária acerca de questões que não tenham a ver com situações concretas relativas ao tratamento tributário a ser dado ao sujeito passivo e/ou suas operações. Ou seja, a Administração Tributária não funciona como um órgão meramente consultivo.

Os efeitos legalmente atribuídos à consulta definem seu caráter preventivo. Com efeito, a consulta eficaz:

(a) impede a instauração de procedimento fiscal contra o sujeito passivo, em relação à matéria específica objeto da consulta (artigo 48 do Decreto n.º 70.235/1972);

(b) suspende o prazo para pagamento do tributo, exceto tributo retido na fonte ou auto lançado; a obrigação de apresentação de declarações e de cumprimento de outras obrigações acessórias não sofrem qualquer efeito em relação à apresentação da consulta (artigo 11 da Instrução Normativa RFB n.o 1.396/2013); e

(c) formulada antes do prazo legal para recolhimento de tributo, impede a aplicação de multa de mora e de juros de mora, relativamente à matéria consultada, a partir da data de sua protocolização até o trigésimo dia seguinte ao da ciência, pelo consulente, da Solução de Consulta (artigo 10 da Instrução Normativa RFB n.o 1.396/2013 e § 2.º do artigo 161 do Código Tributário Nacional).

A consulta eficaz é aquela formalizada com estrita subordinação aos requisitos legalmente postos no artigo 3.º da Instrução Normativa RFB n.o 1.396/2013. Do ponto de vista formal, a consulta eficaz tem solução por meio de um ato administrativo denominado de “Solução de Consulta”; já a consulta ineficaz é declarada como tal por meio de um “Despacho Decisório”.

A consulta ineficaz não produz quaisquer dos efeitos associados à consulta eficaz (não abertura de ação fiscal, suspensão do prazo de pagamento do tributo etc.); em outras palavras, a consulta ineficaz não produz quaisquer efeitos mesmo em relação ao período anterior à declaração formal da ineficácia por meio de Despacho Decisório.

É importante ressaltar que a consulta tributária nada tem a ver com a assistência técnica ou com a prestação de informações fornecidas pelas unidades da Receita Federal no âmbito, por exemplo, dos plantões fiscais. É que apenas por meio da solução da consulta, efetuada segundo o rito procedimental legalmente posto, tem o sujeito passivo um pronunciamento formal da Administração Tributária, com caráter vinculante não apenas para o próprio consulente, como também para os agentes públicos que compõem os quadros fazendários. A assistência técnica e a prestação de informações, por seu caráter não formal e genérico, se caracterizam como mera orientação, sem caráter vinculante para quem quer que seja.

A rigor, o rito procedimental das consultas é bastante simples, pois são elas solucionadas em instância única (Cosit, Coana ou SRRF, conforme o caso, como a seguir se verá). Há a previsão de um recurso especial, sem efeito suspensivo, mas este se destina

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apenas a resolver a divergência de conclusões entre soluções de consultas relativas à mesma matéria, fundada em idêntica norma jurídica.

Já se ressaltou que, com a solução da consulta, o sujeito passivo tem um pronunciamento formal da Administração Tributária que vincula não apenas ele próprio, como também os agentes públicos. Isto não quer dizer, entretanto, que esta norma concreta e individual não possa ser alterada; pode, sim, mas neste caso a nova orientação alcançará apenas os fatos geradores que ocorrerem após a sua publicação na Imprensa Oficial ou após a ciência do consulente (exceto se a nova orientação lhe for mais favorável, caso em que esta atingirá, também, o período abrangido pela solução anteriormente dada).

7.2.2. Processo de consulta sobre classificação fiscal de mercadorias

O processo de consulta tem sua matriz legal nos artigos 48 a 50 da Lei n.o 9.430/1996, mas o detalhamento do procedimento referente à consulta sobre classificação fiscal de mercadorias está posto na Instrução Normativa RFB n.o 1.464, de 08/05/2014 2014 (com as alterações das Instruções Normativas RFB n.º 1.705, de 13/04/2017, e n.º 1.829, de 17/09/2018).

7.2.3. Processo de consulta relativo ao Simples Nacional

Artigo 40 da Lei Complementar n.o 123, de 14/12/2006, e parágrafo 12 do artigo 3.o da Instrução Normativa RFB n.o 1.396, de 16/09/2013.

Lei Complementar n.o 123/2006

Art. 40. As consultas relativas ao Simples Nacional serão solucionadas pela Secretaria da Receita Federal, salvo quando se referirem a tributos e contribuições de competência estadual ou municipal, que serão solucionadas conforme a respectiva competência tributária, na forma disciplinada pelo Comitê Gestor.

Instrução Normativa RFB n.o 1.396/2013 Art. 31. O disposto nesta Instrução Normativa não se aplica às consultas relativas ao Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), quando a competência para solucioná las for dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, e ao Programa de Recuperação Fiscal (Refis).

7.3. Processo de revisão de declarações apresentadas à RFB

A RFB vem, ao longo do tempo, disciplinando por vários atos o processo de revisão das Declarações apresentadas pelos contribuintes, estabelecendo para este tipo de processo especificidades em relação ao rito previsto no Decreto n.º 70.235/1972. O ato que disciplina atualmente a matéria é a Instrução Normativa RFB n.º 958, de 15/07/2009 (com as alterações das Instruções Normativas RFB n.º 1.061, de 04/08/2010, n.º 1.635, de 06/05/2016, e n.º 1.703, de 31/03/2017), assim ementada: “Estabelece procedimentos para revisão das Declarações de Ajuste Anual do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (DIRPF) e das Declarações do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (DITR)”.

7.4.

Processo de Solicitação de Revisão do Lançamento Previamente à Apresentação de Impugnação - Revisão das DIRPF e DITR

A Instrução Normativa RFB n.º 958, de 15/07/2009, ao disciplinar os procedimentos de revisão das Declarações de Ajuste Anual do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (DIRPF) e das Declarações do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (DITR), estabeleceu a possibilidade de o sujeito passivo, no caso de lançamento efetuado sem

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prévia intimação para prestação de esclarecimentos e/ou documentos, apresentar junto à unidade da RFB que jurisdiciona seu domicílio tributário, no prazo de 30 dias, solicitação de retificação desse lançamento (e a análise da solicitação deverá ser feita por Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil daquela unidade ou de unidade definida em ato específico da RFB). Do indeferimento total ou parcial da solicitação de retificação do lançamento cabe, no prazo de 30 dias, impugnação dirigida às Delegacias de Julgamento, nos termos das regras postas no Decreto n.º 70.235/1972 (parágrafo 3.º do artigo 6.º).

7.5. Processo de Arrolamento de Bens e Direitos

O arrolamento de bens e direitos não é, propriamente, um processo, mas uma medida de preservação do crédito tributário lançado de ofício. Entretanto, aparece aqui classificado como espécie, em razão de que possui regras legalmente definidas para sua formalização e a previsão de recurso administrativo destinado à contestação do arrolamento efetivado.

Atualmente, os procedimentos para fins de arrolamento de bens e direitos estão disciplinados na Instrução Normativa RFB n.º 1.565, de 11/05/2015 (com as alterações da na Instrução Normativa RFB n.º 1.769, de 18/12/2017). E por meio de seu artigo 2.o, tem se que o arrolamento de bens e direitos deverá ser efetuado pela autoridade fiscal, sempre que a soma dos créditos tributários administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), de responsabilidade do sujeito passivo, exceder, simultaneamente, a 30% (trinta por cento) do seu patrimônio conhecido, e R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). Mas o artigo 17 faculta ao sujeito passivo a apresentação de recurso administrativo no processo de arrolamento de bens e direitos, no prazo de dez dias, contado da data da ciência da decisão recorrida, nos termos do art. 56 da Lei n º 9.784, de 29/01/1999). O recurso será apreciado pelo chefe da divisão, do serviço, da seção ou do núcleo competente para realizar as atividades de controle e cobrança do crédito tributário da unidade da RFB do domicílio tributário do sujeito passivo que, se não o acatar, o encaminhará ao titular da unidade da RFB do domicílio tributário do sujeito passivo Por fim, a decisão proferida pelo titular da unidade da RFB do domicílio tributário do sujeito passivo será definitiva na esfera administrativa.

7.6. Processo de Solicitação de Propositura de Medida Cautelar Fiscal

A exemplo do arrolamento de bens e direitos, também a propositura de medida cautelar fiscal não se constitui, propriamente, num processo autônomo. Porém, como a medida também merece regramento específico na legislação tributária, aparece aqui igualmente classificado como espécie processual.

A importância da medida cautelar está no fato de que, por meio dela, a Fazenda Pública pode obter a indisponibilização de bens do sujeito passivo.

Os procedimentos relacionados com a propositura de medida cautelar fiscal estão atualmente disciplinados por dois atos legais. Primeiro, a Lei n.º 8.397, de 06/01/1992, instituiu e disciplinou originariamente a medida cautelar fiscal. E, segundo, na Instrução Normativa RFB n.º 1.565, de 11/05/2015 (com as alterações da na Instrução Normativa RFB n.º 1.769, de 18/12/2017), ato este que disciplina, em seus artigos 15 e 16, o procedimento relativo aos pedidos de propositura de medida cautelar fiscal a serem efetuados pelas autoridades administrativas da Secretaria da Receita Federal do Brasil à Procuradoria da Fazenda Nacional.

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Importa ressaltar que a Instrução Normativa RFB n.º 1.565, de 11/05/2015, traz, no inciso VII de seu artigo 15, uma hipótese de propositura de medida cautelar fiscal bastante sumária: a da mera constatação de que o sujeito passivo que teve seus bens arrolados, modificou sua composição patrimonial (relativa aos bens arrolados), sem fazer a devida comunicação à autoridade fiscal.

7.7. Processo de Perdimento de Mercadorias, Veículos e Moeda

Os processos de perdimento de mercadorias, veículos e moeda estão disciplinados nos artigos 774 a 780 do Regulamento Aduaneiro - RA (Decreto n.º 6.759, de 05/02/2009), que reproduzem, em grande parte, dispositivos do Decreto Lei n o 1.455, de 07/04/1976, mas que incorporam alterações importantes trazidas pelo Decreto n.º 7.213/2010. A disciplina destes processos está a seguir sumarizada.

7.7.1. Processo de Aplicação da Pena de Perdimento de Mercadoria e de Veículo

As infrações a que se aplique a pena de perdimento são apuradas mediante processo conformado pelas seguintes regras:

(a) a peça inicial é o auto de infração acompanhado de termo de apreensão e, se for o caso, de termo de guarda fiscal (artigo 774, caput, do RA; artigo 27, caput, do Decreto Lei n.o 1.455, de 07/04/1976);

(b) feita a intimação, pessoal ou por edital, a não apresentação de impugnação no prazo de 20 dias, contados da data da ciência, implica revelia (artigo 774, § 1o, do RA; art. 27, § 1o, do Decreto-Lei no 1.455/1976,);

(c) a revelia do autuado, declarada pela autoridade preparadora, implica o envio do processo à autoridade competente, para imediata aplicação da pena de perdimento, ficando a mercadoria correspondente disponível para destinação, nos termos dos artigos 803 a 806 do RA;

(d) apresentada impugnação, a autoridade preparadora terá o prazo de 15 dias, contados da data do protocolo, para remessa do processo a julgamento (artigo 27, § 2o, do Decreto Lei no 1.455/1976); tal prazo poderá ser prorrogado quando houver necessidade de diligência ou perícia (artigo 27, § 3o, do Decreto Lei no 1.455/1976,).

(e) após o preparo, o processo, em razão do § 4o do artigo 27 do Decreto Lei no 1.455/1976, deveria ser submetido à decisão do Ministro de Estado da Fazenda, em instância única. Ocorre, porém, que tal competência foi delegada, pelo próprio Ministro da Fazenda, ao Secretário da Receita Federal, por meio da Portaria MF nº 304/1985 que, por sua vez, a subdelegou aos Inspetores das Alfândegas, Delegados e Inspetores da Receita Federal através da Portaria SRF nº 841/1993 (a delegação e subdelegação de competência foram feitas com base nos artigos 2.o, 11 e 12 do Decreto Lei nº 200, de 25/02/1967, dispositivos estes que foram regulamentados pelo Decreto nº 83.937/1979). O Ato Declaratório Normativo COSIT n.o 39, de 21/11/1995, firmou a questão em sede administrativa, nos seguintes termos:

O Coordenador Geral do Sistema de Tributação, no uso da atribuição que lhe confere o art. 147, item III, do Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal, aprovado pela Portaria MEFP nº 606, de 03 de outubro de 1992, e tendo em vista o disposto no art. 27, § 4º, do Decreto lei nº 1.455/76 e no art. 193 do RIPI aprovado pelo

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Decreto nº 87.981/82, bem como a subdelegação de competência constante da Portaria nº 841, de 29/07/93, do Senhor Secretário da Receita Federal, declara, em caráter normativo, às Superintendências”Regionais da Receita Federal e demais interessados, que os Delegados da Receita Federal e os Inspetores das Alfândegas e das Inspetorias da Receita Federal classes Especial e "A" são competentes para proferir, em instância única, decisões nos processos fiscais de perdimento de mercadorias, de que trata o art. 27 do Decreto lei nº 1.455/76, neles incluídos os relativos a cigarros nacionais destinados a exportação introduzidos clandestinamente no território nacional e encontrados no País, ficando, em conseqüência, afastada a interveniência dos Delegados da Receita Federal de Julgamento no curso dos referidos processos.

Assim, o processo de perdimento de mercadorias e veículos segue um rito com regras diferentes das definidas no Decreto n.o 70.235/1972, quais sejam: (a) intimação apenas por duas vias, a pessoal e a por edital (ao invés das quatro previstas no Decreto n.o 70.235/1972); (b) prazo para impugnação de 20 dias (ao invés do prazo de 30 dias); e (c) julgamento em instância única pelos Delegados e Inspetores da Receita Federal (ao invés do rito com até três instâncias julgadoras).

7.7.2. Procedimento Simplificado para Declaração de Abandono de Mercadorias de Procedência Estrangeira

Os parágrafos 5º a 7º do artigo 27 do Decreto-Lei nº 1.455, de 07/04/1976, incluídos pelo artigo 31 da Lei nº 12.058, de 13/10/2009, criaram um procedimento simplificado para a declaração de abandono de mercadorias de procedência estrangeira. Tal procedimento foi, a sua vez, regulamentado pela Portaria MF n.o 159, de 03/02/2010. É mais um rito, portanto, aplicável à área aduaneira. A disciplina simplificada, a teor do artigo 1.o da Portaria, é aplicável apenas às infrações mencionadas: (a) nos incisos II e III do artigo 23 do Decreto-Lei nº 1.455/1976, quando referentes a mercadorias de valor inferior a US$ 500,00; Art 23. Consideram se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias: [...] II - importadas e que forem consideradas abandonadas pelo decurso do prazo de permanência em recintos alfandegados nas seguintes condições: a) 90 (noventa) dias após a descarga, sem que tenha sido iniciado o seu despacho; ou b) 60 (sessenta) dias da data da interrupção do despacho por ação ou omissão do importador ou seu representante; ou c) 60 (sessenta) dias da data da notificação a que se refere o artigo 56 do Decreto Lei n.o 37, de 18 de novembro de 1966, nos casos previstos no artigo 55 do mesmo Decreto lei; ou d) 45 (quarenta e cinco) dias após esgotar se o prazo fixado para permanência em entreposto aduaneiro ou recinto alfandegado situado na zona secundária. III - trazidas do exterior como bagagem, acompanhada ou desacompanhada e que permanecerem nos recintos alfandegados por prazo superior a 45 (quarenta e cinco) dias, sem que o passageiro inicie a promoção, do seu desembaraço; [...]

(b) no inciso IX do artigo 105 do Decreto-Lei nº 37/1966.

Art.105 - Aplica se a pena de perda da mercadoria: [...] IX - estrangeira, encontrada ao abandono, desacompanhada de prova de pagamento dos tributos aduaneiros, salvo as do art. 58; [...]

Observação: as mercadorias excetuadas no artigo 105, quais sejam as indicadas no artigo 58 do Decreto Lei n.o 37/1966, são justamente aquelas importadas que

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acabam por ser consideradas abandonadas pelo decurso do prazo de permanência em recintos alfandegados e que já estão referidas no inciso II do artigo 23 do Decreto Lei n.o 1.455/1976 (acima transcrito).

Em resumo, o procedimento simplificado de que aqui se trata é aplicável no caso de mercadorias importadas que forem consideradas abandonadas. Mas há uma distinção: no caso de mercadorias abandonadas em recinto alfandegado, o procedimento só se aplica se tais mercadorias tiverem valor inferior a US$ 500,00; já no caso de mercadorias abandonadas encontradas em qualquer outro local, o procedimento simplificado é aplicável independentemente do valor das mercadorias.

7.7.3. Processo de Retenção e de Perdimento de Veículo Transportador de Mercadoria Sujeita a Pena de Perdimento

No artigo 75 da Lei nº 10.833/2003, está estabelecido o rito aplicável à retenção e ao perdimento de veículo transportador de mercadoria sujeita a pena de perdimento.

7.7.4. Processo de Perdimento de Moeda

O processo administrativo de apuração e de aplicação da pena de perdimento de moeda obedecerá ao rito do processo de perdimento de mercadorias e veículos (descrito no item 7.7.1). Da decisão proferida pela autoridade competente, não caberá recurso.

As moedas retidas antes de 27/08/2001 terão seu valor convertido em renda da União, exceto no caso em que o interessado tenha apresentado manifestação de inconformidade, hipótese em que serão adotados os procedimentos descritos no item 7.7.1 (artigo 89, §§ 1º a 6º, da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, e artigos 779 e 780 do Decreto nº 6.759/2009 - RA).

7.8. Processo de Aplicação e de Exigência de Direitos Antidumping e Compensatórios

Os direitos antidumping e compensatórios são figuras que pertencem, originariamente, ao domínio do direito do comércio internacional, e se destinam a neutralizar os efeitos do uso do dumping na cena internacional. Tais direitos são hoje amplamente utilizados ao redor do mundo, estando seus usos disciplinados em acordos específicos que compõem o marco legal da Organização Mundial do Comércio – OMC. Ou seja, sob determinadas condições estabelecidas nos Acordos da OMC sobre Antidumping e sobre Subsídios e Medidas Compensatórias, os direitos de que aqui se trata podem ser validamente impostos por quaisquer países.

Tem sido muito discutida a natureza tributária ou não dos direitos antidumping e compensatórios. Suas definições, e igualmente a de dumping, constam, porém, do artigo 784 do Regulamento Aduaneiro (Decreto n.º 6.759, de 05/02/2009):

(a) entende se por dumping, “a introdução de um bem no mercado doméstico, inclusive sob as modalidades de drawback, a preço de exportação inferior ao preço efetivamente praticado para o produto similar nas operações mercantis normais, que o destinem a consumo interno no país exportador”;

(b) direito antidumping é “o montante em dinheiro, igual ou inferior à margem de dumping apurada, com o fim exclusivo de neutralizar os efeitos danosos das importações

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objeto de dumping, calculado mediante a aplicação de alíquotas ad valorem ou específicas, ou pela conjugação de ambas”;

(c) direito compensatório é “o direito especial percebido com o fim de contrabalançar qualquer subsídio concedido direta ou indiretamente à fabricação, à produção ou à exportação de mercadoria”.

Tais definições são as que constam dos referidos Acordos da OMC (Acordos estes que foram internalizados no Brasil pelo Decreto no 1.355/1994).

As regras relativas à aplicação e exigência dos direitos antidumping e compensatórios estão previstas nos artigos 785 a 789 do Regulamento Aduaneiro (Decreto n.º 6.759, de 05/02/2009). Do ponto de vista procedimental, entretanto, importa em especial o artigo 788, no qual está firmada a competência da Secretaria da Receita Federal do Brasil para a cobrança e restituição daqueles direitos, bem como a aplicabilidade do rito procedimental ordinário previsto no Decreto n.o 70.235/1972 (abordado no item 5 deste trabalho).

7.9. Processo de Determinação e Exigência das Medidas de Salvaguarda

A exemplo dos direitos antidumping e compensatórios, as medidas de salvaguarda também são figuras que pertencem, originariamente, ao domínio do direito do comércio internacional, e se destinam a neutralizar os efeitos nocivos à indústria nacional, resultantes do aumento da importação de determinado(s) produto(s). Tais direitos também têm seus usos disciplinados em acordos específicos que compõem o marco legal da Organização Mundial do Comércio – OMC. Ou seja, sob determinadas condições estabelecidas no Acordo sobre Salvaguardas da OMC, os direitos de que aqui se trata podem ser validamente impostos por quaisquer países.

A definição das medidas de salvaguarda consta do artigo 770 do Regulamento Aduaneiro (Decreto n.º 6.759, de 05/02/2009): “entende se por: [...] medida de salvaguarda, a elevação no imposto de importação aplicada nos casos em que a importação de determinado produto aumente em condições e em quantidade, absoluta ou em relação à produção nacional, que causem ou ameacem causar prejuízo grave à indústria doméstica de bens similares ou diretamente concorrentes”.

Tal definição é a que constam do referido Acordo sobre Salvaguardas da OMC (Acordo este que foi internalizado no Brasil pelo Decreto no 1.355/1994).

As regras relativas à aplicação e exigência das medidas de salvaguarda estão previstas nos artigos 769 a 773 do Regulamento Aduaneiro (Decreto n.º 6.759, de 05/02/2009). Do ponto de vista procedimental, entretanto, importa em especial o artigo 769, no qual está firmado que a determinação e exigência destas medidas serão feitas mediante processo administrativo fiscal, na forma do Decreto n.o 70.235/1972; ou seja, está firmada a competência da Secretaria da Receita Federal do Brasil, bem como a aplicabilidade do rito procedimental ordinário previsto no Decreto n.o 70.235/1972 (abordado no item 5 deste trabalho).

7.10. Processo de Determinação e Exigência de Direitos de Natureza Comercial

A Lei n.º 12.270, de 24/06/2010 (resultante da conversão da Medida Provisória n.o 482/2010) trouxe uma nova espécie processual que deve ser conduzida com base no rito do Decreto 70.235/1972. Trata se do processo de exigência do gravame criado pela

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referida Lei, os denominados "direitos de natureza comercial". A figura foi criada com o fim de dar sustentação legal para a adoção das medidas retaliatórias autorizadas pela Organização Mundial do Comércio - OMC no âmbito de litígios comerciais nos quais o Brasil tenha sido vencedor naquele foro internacional; na verdade, o objetivo principal foi permitir a chamada "retaliação cruzada", ou seja, a retaliação sobre setor econômico distinto daquele objeto do litígio na OMC, o que é permitido à luz dos acordos que compõem a base normativa desta organização internacional (apesar de a Lei não fazer referência a isto, foi ela editada em razão do litígio sobre o algodão, em que eram litigantes o Brasil e os EUA, que foi vencido pelo Brasil e que como não teve a decisão cumprida espontaneamente pelos EUA, motivou a criação da possibilidade de retaliação sobre um dos setores econômicos mais sensíveis aos norte-americanos, a propriedade intelectual).

A figura dos "direitos de natureza comercial" é nova no direito brasileiro, como também o é no âmbito do direito do comércio internacional; é que ao contrário do que ocorre com os direitos antidumping e compensatórios e com as medidas de salvaguarda, que encontram sustentação em acordos específicos negociados no âmbito da Organização Mundial do Comércio – OMC (como se viu em itens anteriores), os direitos de natureza comercial não têm tal base jurídica, apesar de encontrarem fundamento nas medidas retaliatórias aprovadas por aquela organização internacional.

Apesar de seu ineditismo, os direitos de natureza comercial evidenciam uma indisfarçável afetação tributária, em face de algumas de suas características, como tais:

(a) se trata da "aplicação de percentual compensatório sobre o montante da remuneração dos titulares de direitos de propriedade intelectual" (item 4 da exposição de motivos da MP 482/2010 - EMI n.o 00450 - MRE/MF/MDIC e inciso VII do artigo 6.o da Lei n.º 12.270/2010);

(b) os prazos de decadência e prescrição são, em linhas gerais, iguais aos previstos no Código Tributário Nacional. Nos parágrafos 8.o e 9.o do artigo 7.o da Lei n.º 12.270/2010 estão definidos tanto o prazo para a Receita Federal efetuar o lançamento de ofício (prazo decadencial de cinco anos contados da remessa, do pagamento ou do crédito dos direitos), quanto o prazo para a cobrança judicial do crédito lançado (prazo prescricional de cinco anos, contados do inadimplemento da obrigação). Como se vê, tais prazos e disciplina são os definidos nos artigos 173 e 174 do Código Tributário Nacional para as incidências tributárias;

(c) suas formas de incidência, de cobrança e de discussão administrativa, a teor dos parágrafos do artigo 7.o da Lei, submetem se aos preceitos aplicáveis às imposições tributárias. Não adimplida espontaneamente a imposição, caberá lançamento de ofício por parte dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, com a imposição da penalidade e dos acréscimos legais aplicáveis a qualquer incidência tributária (multa de ofício de 75% sobre o valor inadimplido e juros de mora calculados com base na taxa SELIC). Além disso, como o parágrafo 8 o submete o procedimento fiscal aos ditames do Decreto n.o 70.235/1972, toda a discussão administrativa relacionada com a eventual discordância do sujeito passivo quanto ao lançamento de ofício que sofreu, será feita perante os órgãos julgadores que compõem o contencioso administrativo fiscal.

Do ponto de vista estrito das regras procedimentais, portanto, as regras aplicáveis ao processo de determinação e exigência de direitos de natureza comercial são:

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(a) a exigência de ofício de direitos de natureza comercial, bem como dos acréscimos moratórios e das penalidades, será formalizada em auto de infração lavrado por Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil, observado o disposto no Decreto n.o 70.235/1972 (artigo 7.o, § 8.o, da Lei n.º 12.270/2010);

(b) verificado o inadimplemento da obrigação, a Secretaria da Receita Federal do Brasil encaminhará o débito à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional - PGFN, para inscrição em Dívida Ativa da União e respectiva cobrança, observado o prazo de prescrição de cinco anos (artigo 7.o, § 9.o, da Lei n.º 12.270/2010);

(c) somente serão passíveis de ressarcimento os valores recolhidos a título de cobrança de direitos nos casos de pagamento indevido ou em valor maior que o devido, observados os procedimentos estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (artigo 7.o, § 10, da Lei n.º 12.270/2010).

7.11. Processo de Suspensão da Imunidade e da Isenção

Artigo 32 da Lei n.º 9.430, de 27/11/1996, e artigo 32 da Lei n.o 12.101, de 27/11/2009. Na Lei n.º 9.430/1996 está previsto aquele que se pode chamar de processo ordinário para a suspensão da imunidade e da isenção. Já na Lei n.º 12.101/2009, está definido o processo aplicável especificamente às contribuições sociais previstas nos artigos 22 e 23 da Lei no 8.212, de 24/07/1991.

7.12. Processo de Fiscalização do Simples Nacional

O artigo 33 da Lei Complementar n.o 123, de 14/12/2006 (com as alterações da Lei Complementar n.º 139, de 10/11/2011), trouxe uma importante inovação em matéria de disciplina das atividades de fiscalização tributária: criou uma competência comum para a fiscalização do Simples Nacional entre as Administrações Tributárias dos vários entes federados. Com efeito, como está disposto no caput do dispositivo legal: “a competência para fiscalizar o cumprimento das obrigações principais e acessórias relativas ao Simples Nacional e para verificar a ocorrência das hipóteses previstas no art. 29 desta Lei Complementar é da Secretaria da Receita Federal e das Secretarias de Fazenda ou de Finanças do Estado ou do Distrito Federal, segundo a localização do estabelecimento, e, tratando-se de prestação de serviços incluídos na competência tributária municipal, a competência será também do respectivo Município”. E no parágrafo 3.o do mesmo artigo 33 está expresso que “o valor não pago, apurado em procedimento de fiscalização, será exigido em lançamento de ofício pela autoridade competente que realizou a fiscalização”.

Ou seja, no caso do Simples Nacional, um sujeito passivo poderá ser fiscalizado por qualquer dos entes federados e, neste caso, se submeterá às regras de determinação e exigência de créditos tributários específicas do ente que a fiscalizar. De tal sorte, tem se que as fiscalizações efetuadas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil serão disciplinadas pelas regras do Decreto n.o 70.235/1972 (como também será disciplinada por este ato legal toda a fase contenciosa do procedimento). É o que se infere do artigo 39, que assim dispõe: “o contencioso administrativo relativo ao Simples Nacional será de competência do órgão julgador integrante da estrutura administrativa do ente federativo que efetuar o lançamento ou a exclusão de ofício, observados os dispositivos legais atinentes aos processos administrativos fiscais desse ente”.

7.13. Processo de Exclusão do Simples Nacional

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A manutenção do sujeito passivo no Simples Nacional depende de alguns requisitos postos nos artigos 28 a 32 da Lei Complementar n.o 123, de 14/12/2006. Não atendidos estes requisitos ou incorrendo o sujeito passivo numa das vedações legais à inclusão ou manutenção no regime simplificado de tributação, poderá ser excluído de ofício do mesmo. No § 5º do artigo 29 da LC, está expresso que “a competência para exclusão de ofício do Simples Nacional obedece ao disposto no art. 33, e o julgamento administrativo, ao disposto no art. 39, ambos desta Lei Complementar”.

O caput do artigo 33 da LC n.o 123/2006 determina que “a competência para fiscalizar o cumprimento das obrigações principais e acessórias relativas ao Simples Nacional e para verificar a ocorrência das hipóteses previstas no art. 29 desta Lei Complementar é da Secretaria da Receita Federal e das Secretarias de Fazenda ou de Finanças do Estado ou do Distrito Federal, segundo a localização do estabelecimento, e, tratando-se de prestação de serviços incluídos na competência tributária municipal, a competência será também do respectivo Município”. E no parágrafo 3.o do mesmo artigo 33 está expresso que “o valor não pago, apurado em procedimento de fiscalização, será exigido em lançamento de ofício pela autoridade competente que realizou a fiscalização”. Assim, no caso do Simples Nacional, um sujeito passivo poderá ser excluído de ofício do regime por qualquer dos entes federados e, neste caso, se submeterá às regras procedimentais do ente que praticar o ato. De tal sorte, tem se que as exclusões de ofício efetuadas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil serão disciplinadas pelas regras do Decreto n.o 70.235/1972 (como também será disciplinada por este ato legal toda a fase contenciosa do procedimento). É o que se infere do artigo 39, que assim dispõe: “o contencioso administrativo relativo ao Simples Nacional será de competência do órgão julgador integrante da estrutura administrativa do ente federativo que efetuar o lançamento ou a exclusão de ofício, observados os dispositivos legais atinentes aos processos administrativos fiscais desse ente”.

7.14. Discussão Administrativa da Retificação de Documento de Arrecadação de Receitas Federais

Assim dispõe a Solução de Consulta Interna COSIT n.º 19, de 18/06/2004:

O contribuinte tem o direito de apresentar, no prazo de dez dias, contado da ciência do indeferimento, recurso contra a decisão que indeferiu seu pedido de retificação de Documento de Arrecadação de Receitas Federais.

O recurso será dirigido à autoridade da Secretaria da Receita Federal que proferiu a decisão, a qual, se não a reconsiderar no prazo de cinco dias, encaminhá lo á à autoridade que lhe é hierarquicamente superior.

É competente para decidir sobre recurso contra o indeferimento do pedido de retificação de Documento de Arrecadação de Receitas Federais o titular da Delegacia da Receita Federal, Delegacia da Receita Federal de Administração Tributária, Delegacia Especial de Instituições Financeiras, Inspetoria da Receita Federal de Classe Especial “B”, Inspetoria da Receita Federal de Classe “A” ou Agência da Receita Federal de Classe “A” ou “B” ao qual estiver subordinada a autoridade administrativa que indeferiu o pedido do contribuinte.

7.15. Pedido de Restituição de Valor Pago ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização (Fundaf)

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As manifestações de inconformidade contra decisões proferidas pelas autoridades administrativas da RFB que indeferem pedidos de restituição de quantias referente ao Fundaf, são apreciadas pela instância revisional a que estão sujeitos os atos administrativos em geral praticados pelas referidas autoridades administrativas, nos termos do art. 56, § 1º, da Lei nº 9.784/1999, qual seja, pelo titular da Superintendência Regional da Receita Federal do Brasil da respectiva região fiscal.

Neste sentido a Solução de Consulta Interna COSIT n.º 09, de 30/04/2007:

[...] as DRJ não têm competência para apreciar manifestações de inconformidade contra decisões proferidas pelas autoridades administrativas da SRF que indeferem pedidos de restituição de quantias referente ao Fundaf, devendo essas manifestações serem apreciadas pela instância revisional a que estão sujeitos os atos administrativos em geral praticados pelas referidas autoridades administrativas, nos termos do art. 56, § 1º, da Lei nº 9.784, de 1999, qual seja, pelo titular da SRRF da respectiva região fiscal.

7.16.

Processo de Reconhecimento

do Direito à Redução de Tributo Incidente sobre o Lucro da Exploração na Área da SUDENE

Pelo Decreto n.o 4.213, de 26/04/2002, o direito à redução do imposto sobre a renda das pessoas jurídicas e adicionais não restituíveis incidentes sobre o lucro da exploração, na área de atuação da extinta Superintendência do Desenvolvimento do NordesteSUDENE, será reconhecido pela unidade da Secretaria da Receita Federal do Brasil a que estiver jurisdicionada a pessoa jurídica, instruído com o laudo expedido pelo Ministério da Integração Nacional. O procedimento de reconhecimento, inclusive no que se refere à sua fase litigiosa, está previsto no artigo 3.o do referido Decreto. De se ressaltar que se está aqui diante de um procedimento em que a decisão das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento, na apreciação da impugnação do sujeito passivo dirigida contra o despacho decisório que denegou total ou parcialmente o pedido, é definitiva em sede administrativa, ou seja, não há recurso para o Conselho Administrativo de recursos Fiscais – CARF.

7.17. Processo de Reconhecimento do Direito à Redução de Tributo Incidente sobre o Lucro da Exploração na Área da SUDAM

Pelo Decreto n.o 4.212, de 26/04/2002, o direito à redução do imposto sobre a renda das pessoas jurídicas e adicionais não restituíveis incidentes sobre o lucro da exploração, na área de atuação da extinta Superintendência do Desenvolvimento da AmazôniaSUDAM, será reconhecido pela unidade da Secretaria da Receita Federal do Brasil a que estiver jurisdicionada a pessoa jurídica, instruído com o laudo expedido pelo Ministério da Integração Nacional. O procedimento de reconhecimento, inclusive no que se refere à sua fase litigiosa, está previsto no artigo 3.o do referido Decreto. De se ressaltar que se está aqui diante de um procedimento em que a decisão das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento, na apreciação da impugnação do sujeito passivo dirigida contra o despacho decisório que denegou total ou parcialmente o pedido, é definitiva em sede administrativa, ou seja, não há recurso para o Conselho Administrativo de recursos Fiscais – CARF.

7.18. Pedido de Revisão de Ordem de Emissão de Incentivos Fiscais - PERC

Os contribuintes optantes pela apuração do Imposto sobre a Renda pelo lucro real, podem aplicar parte do imposto devido em investimentos regionais (Finor, Finam e

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Funres). Processada a declaração do imposto (DIPJ), e verificado o cumprimento de alguns requisitos legais, a Receita Federal emite um extrato das aplicações em incentivos fiscais que é enviado ao contribuinte e, simultaneamente, emite uma ordem de emissão dos certificados relativos aos investimos vinculados aos incentivos fiscais que é destinada ao ente gestor dos fundos de investimento.

Cientificado do extrato, o sujeito passivo pode constatar que o valor que havia destinado àqueles investimentos em sua DIPJ restou alterado pela Receita Federal. Nesta hipótese, caso o sujeito passivo discorde da alteração efetuada de ofício pela autoridade fiscal, pode apresentar "Pedido de Revisão de Ordem de Emissão de Incentivos FiscaisPERC", com o fim de que seja emitida ordem adicional de emissão de certificados de incentivos fiscais. Este pedido deve ser efetuado até o dia 30 de setembro do segundo ano subseqüente ao exercício financeiro a que corresponder a opção, nos termos do § 5º do art. 15 do Decreto Lei n.º 1.752/1979, e é dirigido ao chefe da unidade da Receita Federal com jurisdição sobre o domicílio do sujeito passivo.

Em relação ao prazo para apresentar o PERC, apesar de haver na jurisprudência administrativa uma tendência majoritária à adoção do entendimento de que vale o prazo do § 5º do art. 15 do Decreto-Lei n.º 1.752/1979 independentemente de o sujeito passivo ter recebido ou não o extrato legalmente previsto, há decisão da Câmara Superior de Recursos Fiscais em sentido contrário, nos seguintes termos:

PERC – PRAZO PARA APRESENTAÇÃO. Se o legislador estabeleceu que compete à Receita Federal expedir extrato à pessoa jurídica optante pelo incentivo, quando tal fato não ocorre, não se pode aplicar o prazo de que trata o § 5º do art. 15º do Decreto Lei nº 1.376, de 1974. Na ausência de disposição legal específica, por analogia, aplica se o disposto no art. 15 do Decreto nº 70.235/72, salvo se Administração Tributária não tiver concedido prazo maior. (CSRF, Acórdão n.o 105 - 133.461, agosto de 2009)

Do ponto de vista do rito procedimental, se o pedido for negado pela autoridade fiscal já mencionada, caberá manifestação de inconformidade a ser interposta, no prazo de 30 dias, perante as Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento e, a partir daí, os desdobramentos processuais seguem o rito do Decreto n.o 70.235/1972, em termos similares ao processo de reconhecimento de direito creditório contemplado no item 7.1.

7.19. Processo de aplicação de sanções aos intervenientes nas operações de comércio exterior

Por meio do artigo 76 da Lei n.º 10.833, de 29/12/2003 (com as alterações da Lei n.º 13.043/2014), foi criado o procedimento de aplicação de sanções aos intervenientes nas operações de comércio exterior (que são, segundo o parágrafo 2.º do referido artigo 76, “o importador, o exportador, o beneficiário de regime aduaneiro ou de procedimento simplificado, o despachante aduaneiro e seus ajudantes, o transportador, o agente de carga, o operador de transporte multimodal, o operador portuário, o depositário, o administrador de recinto alfandegado, o perito ou qualquer outra pessoa que tenha relação, direta ou indireta, com a operação de comércio exterior”). As sanções previstas para as condutas listadas nos incisos I a III do caput do atigo 76 são: advertência, suspensão, cancelamento ou cassação “do registro, licença, autorização, credenciamento ou habilitação para utilização de regime aduaneiro ou de procedimento simplificado, exercício de atividades relacionadas com o despacho aduaneiro, ou com a movimentação e armazenagem de mercadorias sob controle aduaneiro, e serviços conexos”.

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8. A Prova no Processo Administrativo Fiscal

8.1. A Prova no Processo Administrativo Fiscal e a Aplicação

Subsidiária do Código de Processo Civil e da Lei n.o 9.784/1999

Em relação ao tema "prova" há algumas peculiaridades que se precisa ter em conta. De início, é necessário considerar que a principal razão de ser da disciplina processual, com todas as prerrogativas e obrigações que ela traz, é a de compulsar os fatos. É a dubiedade acerca dos fatos que justifica, especialmente, a existência do processo como meio de solução de litígios. Não houvesse dúvida quanto aos fatos, bastaria ao julgador, sem atuação das partes, dizer o direito. De tal sorte, é a necessidade de manejo do direito probatório que justifica, em essência, o processo. E é aí que a nossa legislação processual administrativo tributária mostra suas principais deficiências. Com efeito, a disciplina da prova é muito pobre no Decreto n.o 70.235/1972, já que nele estão estabelecidos apenas o ônus do agente fiscal de provar a ocorrência do ilícito fiscal (caput do artigo 9.º) e o ônus do contribuinte de provar o que alega (inciso III do artigo 16).

Diante da parca disciplina da prova no Decreto n.o 70.235/1972 é que se disseminou amplamente, na prática do contencioso administrativo, a chamada aplicação subsidiária tanto do Código de Processo Civil quanto da Lei n.o 9.784/1999. Ocorre, porém, que o uso das disposições destes dois atos legais se tornou tão recorrente, que é possível dizer que se passou a ter, in casu, uma "subsidiariedade qualificada". Em outras palavras, a quase completa e surpreendente ausência de regras sobre prova na legislação do processo administrativo fiscal (surpreendente porque, como se viu, a prova é a essência e razão de ser principal do processo), tornou o recurso aos dispositivos do CPC e da Lei n.o 9.784/1999, por parte do julgador administrativo, uma imposição para o exercício de sua função.

As regras de direito probatório constantes do CPC são tidas como o núcleo do direito probatório brasileiro. Assim, na medida em que o texto constitucional passou a garantir o contraditório e a ampla defesa no processo administrativo, e considerando se que só há contraditório e ampla defesa com atividade probatória, só se poderia dar cumprimento à Constituição buscando tal disciplina naquele que é o diploma por excelência em matéria probatória na nossa ordem jurídica. E tal tem sido feito, com os devidos temperamentos exigidos para a mudança de contexto do direito privado para o direito público.

Do ponto de vista do que consta do CPC, percebe se que o direito processual brasileiro adotou, em termos de prova, um sistema bastante aberto, fundado em muito poucas restrições à atividade probatória. É o que se infere do artigo 332 do antigo CPC, que assim dispõe:

Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.

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No novo CPC, o artigo 369 praticamente reproduz o dispositivo acima, mas acresce a necessidade de que a prova a se produzida seja producente:

Art. 369. As partes têm direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

Como se vê, não há uma prévia hierarquização do valor probante dos meios de prova, podendo se dizer que, excetuado o uso das provas ilícitas (inciso LVI do artigo 5.º da Constituição Federal), pode-se provar qualquer situação de fato por qualquer via, ou seja, pode se demonstrar a veracidade de uma dada alegação tanto por meio de uma prova direta (por exemplo, um documento que, por si só, ateste a verdade dos fatos), quanto por meio de provas indiretas (indícios, presunções legais – absolutas ou relativas , ficções legais, etc.).

A falta de hierarquia entre os meios de prova também é característica do processo administrativo fiscal, havendo poucas exceções; a principal delas, entretanto, está no valor probante da escrituração do contribuinte (RIR/1999/“Art. 923. A escrituração mantida com observância das disposições legais faz prova a favor do contribuinte dos fatos nela registrados e comprovados por documentos hábeis, segundo sua natureza, ou assim definidos em preceitos legais”). Esta ampla abertura à produção de provas homenageia o princípio do livre convencimento do julgador, insculpido no artigo 131 do atual CPC e com poucas alterações no artigo 371 do novo CPC (e tal princípio também consta do Decreto n.º 70.235/1972, em seu artigo 29):

[antigo CPC] Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.

[novo CPC] Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.

Outro importante preceito do antigo CPC, e que definia outra regra fundamental para a compreensão do sistema adotado pelo legislador nacional era o constante do artigo 333, que trata do ônus da prova: Art. 333. O ônus da prova incumbe: I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. [...]

Este dispositivo está reproduzido, nos mesmos termos, no artigo 373 do novo CPC, e é a tradução do princípio de que o ônus da prova, em regra, cabe a quem dela se aproveita. E esta formulação também foi, com as devidas adaptações, trazida para o processo administrativo fiscal, posto que a obrigação de provar está expressamente atribuída tanto ao autor do procedimento, a autoridade fiscal (como disposto na parte final do caput do artigo 9.º do Decreto n.º 70.235/1972, os autos de infração e notificações de lançamento “deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito”), quanto ao contribuinte que contesta o lançamento (“Art. 16. A impugnação mencionará : [...] III - os motivos de fato e de direito em que se fundamenta, os pontos de discordância e as razões e provas que possuir.”)

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Importa ressaltar, porém, que algumas importantes inovações relacionadas com o ônus da prova estão sendo inseridas no direito processual pátrio, apesar de ainda não encontrarem tradução literal no processo administrativo. É o caso da adoção do chamado “ônus dinâmico da prova”, previsto nos parágrafos 1.º e 2.º do artigo 373 do novo CPC, e que se consubstancia na possibilidade de que o juiz atribua o ônus da prova à parte de estiver em melhores condições de suportar tal ônus:

Art. 373. [...]

§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.

§ 2o A decisão prevista no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.

O ônus dinâmico da prova, apesar de, como dito, não ter tradução literal na legislação processual administrativa, é de racionalidade indiscutível. Afinal, se a busca pela verdade é um ideal de primeira ordem no processo, razoável é que que se a busque por meio de quem tem melhores possibilidades de produzir os meios de obtê-la.

Mas para além do CPC, também a Lei n.o 9.784/1999 traz para a seara processual administrativa preceitos que são, em grande parte, tradução de regras do CPC ou da própria Constituição Federal. São dispositivos subsidiários, como se usa dizer, mas de aplicação muito mais efetiva do que muitas disposições específicas do PAF.

Importa fazer algumas considerações sobre esta questão da subsidiariedade dos dispositivos da Lei n.o 9.784/1999 em relação ao PAF. A Lei n.o 9.784/1999, apesar de não tratar especificamente do PAF, estabelece uma forma de atuação da Administração Pública que deve ser tão disseminada quanto possível. Por certo que procedimentos administrativos específicos devem ser regrados pela legislação específica que os regem (se houver), mas para além destas legislações específicas, a primeira fonte deve ser a lei geral do processo administrativo (com isso, buscar se ia dar, no âmbito do processo administrativo fiscal, um tratamento tão próximo quanto possível à forma geral de atuação processual da Administração Pública). Assim, melhor do que a expressão "subsidiária" para caracterizar a aplicação da Lei n.o 9.784/1999 em relação ao PAF, é a expressão "supletiva", ou seja, a expressão por meio da qual se estabelece o caráter suplementar do ato legal e que o coloca como um elemento de pronta aplicação ao PAF nos casos de lacunas normativas.

Deste modo, a Lei n.o 9.784/1999 não deveria ser referida como um ato legal a ser aplicado em situações excepcionais, mas sim como um ato que se coloca ao lado das regras específicas do PAF, só sendo afastada diante de disposições específicas da legislação processual administrativa fiscal. No caso da prova, dado que o Decreto n.o 70.235/1972 pouco fala sobre o assunto, dever se ia mesmo buscar na Lei n.o 9.784/1999 as disposições que dela constam e que são tradução, na esfera administrativa, de várias regras do CPC. Neste caso, não seria uma aplicação subsidiária - até porque o Decreto n.o 70.235/1972 pouco ou nada fala de prova -, mas uma verdadeira aplicação supletiva.

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Do ponto de vista de seu conteúdo, a Lei n.o 9.784/1999 traz duas importantes regras em matéria probatória em seus artigos 36 e 37:

Art. 36. Cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado, sem prejuízo do dever atribuído ao órgão competente para a instrução e do disposto no art. 37 desta Lei.

Art. 37. Quando o interessado declarar que fatos e dados estão registrados em documentos existentes na própria Administração responsável pelo processo ou em outro órgão administrativo, o órgão competente para a instrução proverá, de ofício, à obtenção dos documentos ou das respectivas cópias.

Há quem defenda uma pretensa incompatibilidade entre os dois dispositivos, já que enquanto o artigo 36 diz que cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado, o artigo 37 autorizaria o mesmo interessado a meramente alegar que dados estariam com a Administração Tributária para se eximir da responsabilidade atribuída pelo primeiro dispositivo. Não há, porém, tal incompatibilidade. É que não se pode ver atribuída ao contribuinte, no artigo 37, nenhuma prerrogativa desmesurada, pois nada há no texto que diga que basta a este contribuinte declarar que fatos e dados constam de documentos de registros da Administração, para que se veja desobrigado de apresentar tais dados e fatos. Por óbvio que o contribuinte deve identificar qual documento ou elemento de prova inclui os fatos e dados mencionados e como a Administração teve acesso a eles (se for o caso); não se pode fazer a leitura de que a lei estaria atribuindo à Administração a "obrigação de provar que não fez ou que não tem algo", coisa que, como se sabe, é outro dogma probatório da nossa ordem jurídica.

No âmbito tributário, a aplicabilidade do dispositivo é evidente nos casos, por exemplo, em que do contribuinte é exigida a apresentação de cópia de sua declaração de rendimentos e ele demanda pela mera juntada ao processo da cópia que a Administração já tem em seu poder. Deste modo, o artigo 37 não mexe com a repartição do ônus da prova e nem desobriga o contribuinte de provar suas alegações; ele meramente busca evitar que a Administração demande por documentos que ela própria já tem em razão do exercício regular de suas atividades precípuas. O que se pode dizer, inclusive, que em certa medida este artigo 37 se coaduna com a tendência de relativização das regras clássicas de repartição do ônus da prova trazidas pelo novo CPC, dentre tais a do “ônus dinâmico da prova” previsto no artigo 370 deste diploma legal.

Importa ressaltar, ainda, que o Regulamento do PAF, o Decreto n.o 7.574, de 29/09/2011, buscou consolidar disposições acerca da prova, dispersas em vários diplomas legais. E o fez nos artigos 24 a 29, abaixo reproduzidos. Entretanto, importa ressaltar que a compilação não pode ser tida por exaustiva, já que a prática do contencioso administrativo tem mostrado o manejo do conjunto das regras de direito probatório já acima referenciadas (algumas delas repetidas nos dispositivos do Decreto n.o 7.574/2011.

Art. 24. São hábeis para comprovar a verdade dos fatos todos os meios de prova admitidos em direito (Lei n o 5.869, de 11 de janeiro de 1973, art. 332).

Parágrafo único. São inadmissíveis no processo administrativo as provas obtidas por meios ilícitos (Lei n o 9.784, de 29 de janeiro de 1999, art. 30).

Art. 25. Os autos de infração ou as notificações de lançamento deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito (Decreto n o 70.235, de 1972, art. 9 o , com a redação dada pela Lei n o 11.941, de 2009, art. 25).

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Art. 26. A escrituração mantida com observância das disposições legais faz prova a favor do sujeito passivo dos fatos nela registrados e comprovados por documentos hábeis, segundo sua natureza, ou assim definidos em preceitos legais (Decreto Lei n o 1.598, de 26 de dezembro de 1977, art. 9 o , § 1 o ).

Parágrafo único. Cabe à autoridade fiscal a prova da inveracidade dos fatos registrados com observância do disposto no caput (Decreto Lei n o 1.598, de 1977, art. 9 o , § 2 o ).

Art. 27. O disposto no parágrafo único do art. 26 não se aplica aos casos em que a lei, por disposição especial, atribua ao sujeito passivo o ônus da prova de fatos registrados na sua escrituração (Decreto-Lei n o 1.598, de 1977, art. 9 o , § 3 o ).

Art. 28. Cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado, sem prejuízo do dever atribuído ao órgão competente para a instrução e sem prejuízo do disposto no art. 29 (Lei n o 9.784, de 1999, art. 36).

Art. 29. Quando o interessado declarar que fatos e dados estão registrados em documentos existentes na própria administração responsável pelo processo ou em outro órgão administrativo, o órgão competente para a instrução proverá, de ofício, à obtenção dos documentos ou das respectivas cópias (Lei n o 9.784, de 1999, art. 37).

Por fim, vale fazer menção ao fato de que o novo CPC traz várias outras disposições acerca de direito probatório que podem, sob determinadas ciscunstâncias, ser utilizadas subsidiariamente no processo administrativo, ou pelo menos inspirar a interpretação de normas processuais administrativas. Destaca-se, aqui, as seguintes:

(a) utilização de prova produzida em outro processo:

Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.

(b) a prerrogativa do juiz na definição do material probatório:

Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.

Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

(c) o direito da parte de não produzir prova contra si própria: Art. 379. Preservado o direito de não produzir prova contra si própria, incumbe à parte:

I – comparecer em juízo, respondendo ao que lhe for interrogado; II – colaborar com o juízo na realização de inspeção judicial que for considerada necessária;

III – praticar o ato que lhe for determinado.

(d) obrigação de terceiro de informar ou apresentar coisa ou documento:

Art. 380. Incumbe ao terceiro, em relação a qualquer causa: I - informar ao juiz os fatos e as circunstâncias de que tenha conhecimento; II - exibir coisa ou documento que esteja em seu poder. Parágrafo único. Poderá o juiz, em caso de descumprimento, determinar, além da imposição de multa, outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub rogatórias.

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8.2. Os contornos e o conteúdo da decisão administrativa

Com a decisão dos órgãos julgadores, há a dirimição do litígio posto à apreciação do contencioso administrativo. Trata se, portanto, de ato conclusivo da atuação contenciosa e, em assim sendo, seu conteúdo é de notável importância para a perfectibilização do contraditório. Diante deste quadro, o artigo 31 do Decreto n.º 70.235/1972 estabelece de forma expressa os elementos que devem compor a decisão administrativa:

Art. 31. A decisão conterá relatório resumido do processo, fundamentos legais, conclusão e ordem de intimação, devendo referir se, expressamente, a todos os autos de infração e notificações de lançamento objeto do processo, bem como às razões de defesa suscitadas pelo impugnante contra todas as exigências.

Tal exigência se coaduna com o ideário do direito processual pátrio, que enfatiza à exaustão a necessidade de fundamentação minudente das decisões. O artigo 131 do atual CPC, reproduzido com poucas alterações no artigo 371 do novo CPC, assim expressa:

Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.

Para além destes referenciais normativos, importa ter em conta a tendência crescente, dentro da evolução do nosso direito processual, de se enfatizar a necessidade imperiosa de que as decisões sejam minudentemente motivadas, fundamentadas. O artigo 489 do novo CPC, bem evidencia o dito:

Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

I o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

III o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demon strar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento

§ 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

§ 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa fé.

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Em outras palavras, seja lá qual for a técnica deciória adotada pelo julgador, a necessidade de minuciosa explicitação das razões de decidir é tendência inequívoca na atual fase de evolução do nosso direito processual; e isso, por óbvio, tem a ver com a ênfase dada pelo nosso novo codex processual à criação de um sistema de precedentes. Como os precedentes se formam a partir, em especial, dos fundamentos das decisões, e não de suas partes dispositivas, inegável a importância de decisões bem fundamentadas para o fomento do sistema.

8.3. A prova e a lide no processo penal e a possibilidade de inovação em sede de contencioso administrativo

Há quem defenda a aplicabilidade, ao processo administrativo fiscal, de determinadas diretrizes do processo penal, em face de uma pretensa aproximação destas duas searas jurídicas. Dentro deste contexto, se afirma que deveria ser levado em conta, para efeito de se determinar os limites da lide, a ideia de tipicidade penal, segundo a qual, para que o réu seja condenado, sua conduta deve se ajustar perfeitamente à descrição contida na lei penal; e, também, o de que no processo penal é sempre possível introduzir e apreciar outros fatos durante a instrução processual, ainda que não contidos na denúncia inicial. O objetivo de tais assertivas é o de defender a possibilidade de que, no processo administrativo, outras razões, que não aquelas utilizadas para a fundamentação do ato contestado, possam ser levantadas pelos órgãos julgadores para fins de manter incólume o referido ato contestado (ou seja, uma defesa da possibilidade de inovação nas razões de fundamentação, em sede contenciosa). Tal paralelo, porém, parece despropositado.

Primeiro, é preciso dissecar com mais clareza a assertiva de que no processo penal é sempre possível introduzir e apreciar outros fatos durante a instrução processual, ainda que não contidos na denúncia inicial. Na verdade, o que é possível fazer, na fase contenciosa do processo penal, é buscar novos elementos de prova destinados a evidenciar a efetiva ocorrência do fato típico definido na denúncia, mas não buscar outros fatos que eventualmente modifiquem a tipificação posta na denúncia. Este é o detalhe que precisa ser enfatizado: a verdade material, no processo penal, não está a serviço da busca de novos fatos típicos, mas da coleta de elementos que venham eventualmente firmar o convencimento acerca da efetiva ocorrência do fato típico definido como base da denúncia. Trata-se do princípio da correlação entre acusação e sentença, traduzida pelo caput do artigo 383 do Código de Processo Penal –CPP, que assim dispõe: “O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave”. É importante perceber que a possibilidade de nova definição jurídica não inclui a possibilidade de modificação do fato contida na denúncia, posto que a este fato está vinculado o julgador; em outras palavras, pode o juiz dar nova qualificação jurídica ao fato já constante da denúncia, mas não alterá lo, o que, ao final e ao cabo, nada mais é que a evidência concreta de que vigora, no processo penal, os princípios jura novit curia (livre dicção do direito) e narra mihi factum dabo tibi jus (narra-me o fato e te darei o direito).

Nas palavras de Guilherme de Souza Nucci, a correlação entre acusação e sentença “é a regra segundo a qual o fato imputado ao réu, na peça inicial acusatória, deve guardar perfeita correspondência com o fato reconhecido pelo juiz, na sentença, sob pena de grave violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, conseqüentemente, ao devido processo legal” (“Código de Processo Penal Comentado”, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p.721). No

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mesmo sentido, outro eminente processualista penal, Fernando Capez, que ao referir se ao princípio da correlação afirma que é ele “princípio garantidor do direito de defesa do acusado, cuja inobservância acarreta a nulidade da decisão. Por princípio da correlação entende se que deve haver uma correlação entre o fato descrito na denúncia ou queixa e o fato pelo qual o réu é condenado. O juiz não pode julgar o acusado extra petita, ultra petita ou citra petita; vale dizer, não pode desvincular se o magistrado da inicial acusatória julgando o réu por fato do qual ele não foi acusado” (“Curso de Processo Penal”, Editora Saraiva, 2011, p.516).

Mas é importante ter aqui presente a distinção feita pela doutrina, com base nas disposições constantes dos artigos 383 e 384 do CPC, entre a emendatio libelli e a mutatio libelli. A primeira figura se consubstancia naquela acima referida, qual seja a de que o juiz, sem modificar o fato que dá base à denúncia, pode alterar a definição jurídica daquele mesmo fato. Já a segunda figura consta do caput artigo 384: “Encerrada a instrução probatória, se entender nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo se a termo o aditamento, quando feito oralmente”. Neste caso, trata o CPP daquelas situações em que, em face da instrução probatória, surgem novos fatos dando conta da existência de novos crimes (fatos típicos); e aqui, a evidência do vigor do princípio da correlação entre denúncia e sentença é novamente enfatizada, pois a única forma destes novos fatos típicos adentrarem legitimamente no processo é por via de um aditamento da denúncia por parte de quem é o detentor do poder de fazê lo, o Ministério Público.

Deste modo, não é correto dizer que no processo penal é sempre possível introduzir e apreciar outros fatos durante a instrução processual, ainda que não contidos na denúncia inicial. Sim, é possível, mas não para mudar o fato descrito na denúncia como base da acusação (ou seja, para inovar os termos da acusação), mas apenas para tentar buscar outros elementos de prova que evidenciem a efetiva ocorrência do fato imputado ao acusado na denúncia. Se, entretanto, desta busca por outros elementos de prova resultar a constatação da ocorrência de outros fatos tipificados como crime, não poderá o juiz condenar o réu por tais crimes, a menos que o Ministério Público, detentor da ação pública, adite a denúncia, inaugurando, por assim dizer, algo que na prática se assemelha a um novo procedimento.

É importante, assim, ter clara a noção de que o que se busca no processo penal com a verdade material, nada mais é do que a convicção acerca da efetiva ocorrência, ou não, do fato imputado ao acusado na denúncia, e não a busca de outros fatos típicos ensejadores de condenação não incluídos na peça inaugural da ação penal.

Trazidos tais preceitos para o âmbito do processo administrativo fiscal, verifica se que eles mais afirmam do que infirmam a natureza do julgamento administrativo como uma atividade essencialmente vinculada aos motivos do ato administrativo contestado e às alegações do contribuinte. Demonstra se:

(a) se no âmbito do processo penal a denúncia é a peça acusatória inaugural da ação penal (artigo 24 do CPP), na esfera do processo administrativo fiscal são o lançamento e o despacho denegatório do direito creditório as peças contra as quais o contribuinte, com sua expressa insurgência (apresentação de impugnação ou manifestação de inconformidade), inaugura a fase contenciosa do procedimento administrativo (artigo 14 do Decreto n.o 70.235/1972);

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(b) da mesma forma que a denúncia deve conter a descrição do fato imputável ao acusado em todas as suas circunstâncias (artigo 41 do CPP), também o lançamento e a manifestação de inconformidade devem conter a descrição dos fatos, a disposição legal infringida e a penalidade aplicável (artigos 10 e 11 do Decreto n.o 70.235/1972);

(c) a partir daí, cabe ao réu, na ação penal, infirmar ou mesmo tão somente colocar em dúvida a acusação posta na denúncia, por meio de sua atuação probatória, enquanto que no processo administrativo fiscal deve o contribuinte demonstrar os motivos de fato e de direito que fundamentam sua contestação, devidamente acompanhados dos pontos de discordância e das provas que possuir (artigo 16 do Decreto n.o 70.235/1972);

(d) estabelecida a fase contenciosa nas duas esferas (penal e administrativa), cumpre ao juiz/julgador decidir nos limites do litígio posto, que na esfera penal fica marcado pelo princípio da correlação (artigo 383 do CPP) e na esfera administrativa pela determinação de que matéria não impugnada não instaura a fase litigiosa (artigos 14 e 17 do Decreto n.o 70.235/1972);

(e) tanto na esfera penal quanto na esfera administrativa vigoram os princípios jura novit curia e narra mihi factum dabo tibi jus, segundo os quais o julgamento fica estreitamente vinculado aos fatos postos na peça acusatória ou no lançamento ou ainda no despacho decisório, sendo permitida a requalificação jurídica de tais fatos (neste sentido, em sede administrativa, é reiterado e pacífico o entendimento de que erros na fundamentação jurídica do ato de ofício contestado podem ser sanados pela minudente descrição dos fatos ilícitos imputados ao contribuinte);

(f) é igualmente o mesmo o sentido da verdade material nas esferas penal e administrativa, qual seja o de que serve à busca de elementos de prova destinados a aferir a efetiva ocorrência, ou não, do fato utilizado como base para a denúncia, para o lançamento e para o indeferimento do direito creditório por meio de despacho decisório. Se da busca pela “verdade material” resultar a constatação de que existem outras condutas típicas (no caso do processo penal) ou de outros fundamentos de fato ou de direito para a manutenção do lançamento ou para a manutenção do indeferimento do direito creditório (no caso do processo administrativo fiscal), restará um único caminho: no âmbito penal, o aditamento da denúncia (mutatio libelli), e no âmbito administrativo, um novo lançamento (ou um lançamento complementar, nas hoje limitadas hipóteses do artigo 41 do Decreto n.o 7.574/2011 – o Regulamento do PAF) ou um novo despacho decisório. Em qualquer dos casos, como se vê, a inovação de fundamentos não é admitida, restando preservadas as prerrogativas específicas de cada ente da relação processual: na esfera penal, o Ministério Público denuncia e eventualmente adita a denúncia, enquanto o juiz julga; na esfera administrativa, a Administração Ativa lança ou indefere direito creditório originariamente e a Administração Judicante julga. Assim, como se percebe, não há, em essência, distinção entre o que faz o juiz no processo penal e o que deve fazer o julgador no processo administrativo, e isto em homenagem, antes de mais nada, à imparcialidade em sentido orgânico (ligada à distinção entre quem acusa/lança/indefere e quem julga o recurso do cidadão contra tais atos).

É importante ter em conta, ademais, que mesmo no processo penal, a busca pela verdade material tem seus limites. Primeiro, há tudo o que acima se disse acerca do que se busca na instrução probatória (elementos de prova que atestem, positiva ou negativamente, a ocorrência do fato que dá base à denúncia). Segundo, há aquilo que Fernando Capez destaca com clareza lapidar: “A constituição Federal de 1988 vedou ao juiz a

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prática de atos típicos de parte, procurando preservar a sua imparcialidade e necessária eqüidistância, prevendo distintamente as figuras do investigador, acusador e julgador (CF, arts. 129, caput, 144, §§ 1.o, IV, e § 4.o). [...] Assim, colocar o julgador na posição de parte, incumbindo lhe atribuições investigatórias e probatórias típicas de acusador, implica vulnerar sua imparcialidade e violar o due process of law” (“Curso de Processo Penal”, Editora Saraiva, 2011, p.74).

Demonstrado resta, assim, que as diferenças entre processo penal e processo administrativo, pelo menos no que se refere aos limites da atuação do juiz/julgador e da definição dos limites do litígio, é mais aparente que real. Na verdade, é por conta destes pontos de contato entre aos vários “tipos” de processo, que muitos doutrinadores afirmam a existência de uma Teoria Geral do Processo aplicável a todos eles, ou então de que eles se estruturam em torno de pilares comuns. Para exemplificar, vale o dito de outro não menos eminente penalista, Fernando da Costa Tourinho Filho: “não se pretende, enfim, estabelecer absoluta identidade entre ambos [processo civil e processo penal], mas apenas realçar que as pilastras são comuns, que muitos institutos são idênticos e que por isso se pode falar em uma Teoria Geral do Processo” (“Manual de Processo Penal”, Editora Saraiva, 2011, p. 53-54). O autor afirma isso depois de demonstrar que a principal diferença entre os processos civil e penal é dado por seus objetos: se a natureza da lide for extrapenal, a regulamentação normativa do processo é estabelecida pelo direito processual civil; se a natureza da lide for penal, tal regulamentação se dará pelo direito processual penal. Já no que se refere ao conceito de ação; à forma de atuação da jurisdição, à disciplina dos recursos e das exceções processuais, ao regramento das citações, notificações e intimações, ao conteúdo e extensão da sentença e à identidade estrutural da prova no campo civil e no penal, entende o autor que as similaridades são evidentes, servindo antes à reafirmação da referida Teoria Geral do Processo.

Com base nestas considerações é que se pode, a esta altura, fazer uma contestação mais ampla acerca da defesa da ideia de que ao processo administrativo fiscal se aplicaria com mais ênfase o processo penal do que o processo civil. Apesar de todas as considerações até aqui postas, destinadas a demonstrar que, ao final e ao cabo, a pretensa maior aproximação com o processo penal não ajuda a bem fundamentar a tese do alargamento do conceito de lide na esfera administrativa, há que se afirmar que tal aproximação não se justifica e que ao processo administrativo são aplicáveis, de forma subsidiária, os preceitos do processo civil. E isso por razões interligadas:

(a) em primeiro lugar, porque como bem afirma Fernando da Costa Tourinho, se a natureza da lide for extrapenal, a regulamentação normativa do processo é estabelecida pelo direito processual civil. Ora, na medida em que as imposições tributárias não se consubstanciam como matéria penal, estão elas, portanto, submetidas ao processo civil;

(b) em segundo lugar, mas de modo complementar ao acima dito, por uma razão pragmática: em que juízo são discutidas as questões tributárias em sede judicial, na esfera penal ou na esfera cível? A resposta é óbvia: na esfera do processo civil, por meio de ações tributárias próprias e impróprias (mandado de segurança, ação declaratória, ação anulatória de débito fiscal etc.);

(c) em terceiro lugar, porque de há muito se firmou o entendimento, mesmo em sede administrativa (as decisões das duas instâncias administrativas bem evidenciam isso), de que, em sede de processo administrativo fiscal, aplicam-se subsidiariamente as normas do processo civil.

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8.4. A Presunção de Legitimidade dos Atos Administrativos e o Ônus da Prova

De há muito firmou se o entendimento de que a presunção de legitimidade dos atos administrativos não serve como meio de supressão de lacunas probatórias. E tal entendimento, antes de ser resultado de qualquer formulação doutrinária ou jurisprudencial, nasce diretamente da lei, posto que, como se depreende da parte final do caput do artigo 9.º do Decreto n.º 70.235/1972, os autos de infração e notificações de lançamento “deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito”.

Justificada resta hoje a disposição legal, em razão de que, no âmbito de um procedimento obrigatoriamente informado por princípios como o do contraditório e o da ampla defesa, inadmissível torna se o desequilíbrio na repartição do ônus probatório. Certo é que as ações fiscais, por estarem submetidas ao princípio inquisitivo –circunstância, por vezes, indispensável aos procedimentos de caráter investigativo , podem até ser conduzidas unilateralmente por parte da autoridade fiscal; entretanto, os resultados desta conduta unilateral devem ficar devidamente consubstanciados por provas – nos termos do direito , sob pena de, em assim não sendo, restar comprometida a possibilidade concreta (e constitucionalmente assegurada pela Constituição Federal no inciso LV do artigo 5.º) de o contribuinte, na fase litigiosa do procedimento fiscal, contraditar os argumentos e meios utilizados pelo fisco para embasar o lançamento.

A presunção de legitimidade, assim, opera no sentido da atribuição de validade aos atos administrativos, caso não restem concreta e eficazmente invalidados pelo contribuinte (de se lembrar a inadmissibilidade da negação geral); nesta hipótese, a presunção atribui força tal ao ato que pode ele instrumentar as medidas seguintes na direção de sua execução forçada.

8.5. Os sistemas de valoração da prova e as fontes normativas vinculantes

De modo bastante esquemático, pode se dizer que há no mundo três grandes sistemas de valoração da prova: (a) o do livre convencimento judicial; (b) o da prova legal; e (c) o da íntima convicção. 22

No sistema do livre convencimento judicial, cabe ao juiz firmar suas convicções acerca dos fatos. O sistema ganhou força a partir da constatação das limitações das provas pré-estabelecidas, mas recebe críticas em face de que induziria ao chamado “ativismo judicial” (a criação de interpretações jurídicas que extrapolariam os limites postos nos textos legais), bem como de que abriria porta para a “arbitrariedade” (pela amplitude de ação dada ao juiz). Tais críticas são rebatidas com base nas afirmações de que o ativismo judicial seria bastante mitigado pelo princípio dispositivo, e de que a arbitrariedade encontraria resistência nos princípios do contraditório e da motivação.

No sistema da prova legal, as regras de valoração da prova são estabelecidas pela lei em caráter geral e abstrato, e não pelo juiz, em cada caso que julga, conformando se, assim, em vínculos normativos à formação do convencimento pessoal do juiz. O sistema seria, deste modo, um remédio contra a alegada ditadura do judiciário, constituindo se a partir do uso massivo de presunções legais, por exemplo.

22 Sobre a questão do convencimento do julgador, ver Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhardt, 2009, p. 81 96.

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No sistema da íntima convicção, a decisão do julgador é de foro íntimo, não demandando motivação expressa. Um exemplo de aplicação do sistema, no Brasil, é o tribunal do júri, no qual os jurados decidem sem que tenham de expor as razões de seu convencimento.

No Brasil, apesar de os três sistemas estarem incluídos na ordem jurídica, foi consagrado o livre convencimento judicial motivado, que está posto no artigo 131 do antigo CPC:

Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que Ihe formaram o convencimento.

Em sentido similar, mas não exatamente igual, o artigo 371 do novo CPC:

Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.

Em sede administrativa, o princípio do livre convencimento motivado está também positivado, como se pode inferir dos artigos 29 e 31 do Decreto n.º 70.235/1972:

Art. 29. Na apreciação da prova, a autoridade julgadora formará livrem ente sua convicção, podendo determinar as diligências que entender necessárias.

Art. 31. A decisão conterá relatório resumido do processo, fundamentos legais, conclusão e ordem de intimação, devendo referir se, expressamente, a todos os autos de infração e notificações de lançamento objeto do processo, bem como às razões de defesa suscitadas pelo impugnante contra todas as exigências.

Em relação a este quadro acerca do princípio do livre convencimento, não se pode deixar de fazer menção à tendência do nosso direito processual pátrio no sentido da superação do livre convencimento motivado, substituindo o pelo livre convencimento fundamentado, que aprece expresso em vários dispositivos do novo CPC. Pelo livre convencimento motivado, não bastaria ao juiz “explicar” sua decisão, mas também explicitar todos os critérios interpretativos adotados, esclarecendo as razões de suas opções exegéticas. Trata se de um adensamento da profundidade da decisão judicial, evidenciado, dentre outros no seguinte dispositivo do novo CPC, que trata de definir o que a decisão judicial deve conter, a fim de ser considerada como “fundamentada”: Art. 489. [...]

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; [...]

V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

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Se esta nova visão acerca do livre convencimento vai prosperar no processo judicial e, posteriormente, também no processo administrativo, só o tempo dirá.

De qualquer modo, retomando o status atual do assunto, tem-se que no PAF vige atualmente o livre convencimento motivado. Entretanto, há exceções a ele, como tais: os laudos emitidos por órgãos oficiais (art. 30 do Decreto n.º 70.235/1972) e as presunções e ficções legais (como exposto no item 8.6).

Também se conformam como exceções ao livre convencimento, no processo administrativo fiscal, as interpretações emanadas da Administração Tributária por meio de atos de caráter normativo (instruções normativas, portarias, atos declaratórios etc.). É que tais atos normativos, além de comporem a legislação tributária, ex vi do inciso I do artigo 100 do Código Tributário Nacional ("Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos: I - os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas; [...]"), vinculam a atuação dos agentes públicos.

Em relação às Delegacias de Julgamento, havia disposição expressa neste sentido, no artigo 7.º da Portaria MF n.º 341/2011: "Art. 7.º São deveres do julgador: [...] Vobservar o disposto no inciso III do art. 116 da Lei nº 8.112, de 1990, bem como o entendimento da RFB expresso em atos normativos". Porém, a Portaria ME n.o 340/2020, deu nova redação ao comando, estabelecendo como dever do julgador, no inciso V de seu artigo 17, “observar o disposto no inciso III do art. 116 da Lei nº 8.112, de 1990, e os demais atos vinculantes”. A diderença entre as duas disposições é evidente, muito embora ainda não se saiba como será interpretada posteriormente; é que, agora, a subordinação está associada à ordem jurídica como um todo, visivelmente mitigando a majorada subordinação aos atos emanados da RFB.

Seja lá qual for a posição que vier a ser adotada em relação a esta mudança legal, verdade é que, atualmente, há quem defenda não haver, na vinculação do julgador aos atos administrativos de caráter normativo, uma exceção ao princípio do livre convencimento, já que a lavratura de atos normativos destinados à interpretação e aplicação da legislação tributária é competência legalmente posta para a Receita Federal

Mas há, hoje, várias fontes vinculantes para os julgadores administrativos. E afora as críticas que eventualmente são feitas à adoção de entendimentos vinculantes, certo é que esses se associam ao movimento atual de busca pela valorização dos precedentes (movimento este claramente evidenciado, por exemplo, na concepção do novo Código de Processo Civil). Ademais, alguma uniformização nos entendimentos administrativos é desejável no sentido do aumento da previsibilidade da atuação administrativa.

O conjunto de fontes vinculantes para os julgadores administrativos são, atualmente, as seguintes:

(a) súmulas vinculantes do Supremo Tribunal Federal (artigo 103 A da Constituição Federal);

(b) súmulas vinculantes do CARF (artigo 75 do Regimento Interno do CARF): tais súmulas vinculam toda a Administração Tributária Federal;

(c) julgados do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal efetuados sob as sistemáticas dos artigos 543-B e 543- C do Código de Processo Civil: adotadas pelo CARF, automaticamente (artigo 62 A do Regimento Interno do

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CARF); já para as DRJ, só podem ser adotados depois de incluídos em nota explicativa da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (artigo 19, §§ 4.º, 5.º e 7.º, da Lei n.º 10.522/2002);

(d) matérias com jurisprudência consolidada incluídas em ato declaratório da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional aprovado pelo Ministro da Fazenda: adoção obrigatória nos julgados do CARF (artigo 19, II, da Lei n.º 10.522/2002) e das DRJ (artigo 19, II e § 4.º, da Lei n.º 10.522/2002);

(e) pareceres da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional aprovados pelo Ministro da Fazenda (artigo 42 da Lei Complementar n.º 73/1993): vinculantes para o CARF, para as DRJ e para todos os órgãos do Ministério da Fazenda;

(f) pareceres do Advogado-Geral da União aprovados pelo Presidente da República (artigo 40 da Lei Complementar n.º 73/1993): vinculantes para o CARF, para as DRJ e para todos os órgãos do Ministério da Fazenda;

(g) as súmulas da Advocacia Geral da União (artigo 43 da Lei Complementar n.º 73/1993), apesar de do ponto vista isolado do artigo 43 da LC 73/1993 parecerem vincular somente os órgãos jurídicos que compõem a própria estrutura da AGU (listados no artigo 2.º da LC 73/1993) e os órgãos jurídicos das autarquias e fundações públicas (artigo 17 da LC n.º 73/1993), acabam sendo atos vinculantes para os órgãos julgadores (das DRJ e CARF) em razão da interpretação conjugada com o artigo 26 A, parágrafo 6.º, inciso II, alínea “a” do Decreto n.º 70.235/1972.

(h) soluções de consultas internas – SCI, Notas Técnicas e Pareceres Normativos (artigo 7.º da Portaria RFB n.º 2.217, de 19/12/2014): atos resultantes de consultas internas formuladas pelos órgãos internos da Receita Federal e resolvidas pelos órgãos do sistema tributação da Receita Federal (divisões de tributação das Superintendências Regionais e Coordenação Geral de Tributação). Possuem efeito vinculante para todos os órgãos internos da Receita Federal a partir de suas publicações, respectivante, no site da própria Receita Federal, no Boletim de Serviço da RFB e no Diário Oficial da União;

(i) soluções de consultas (extermas) (artigo 9.º da Instrução Normativa RFB n.º 1.396/2013, com a redação dada pela Instrução Normativa RFB n.º 1.434/2013, e artigo 15 da Instrução Normativa RFB n.º 1.464/2014): são consultas formuladas por agentes externos e resolvidas pela Coordenação Geral de Tributação (Cosit) e pela Coordenação Geral de Administração Aduaneira (Coana) da Receita Federal. Tais consultas têm efeito vinculante no âmbito da RFB e respaldam qualquer sujeito passivo que as aplicar, independentemente de ser o consulente;

(j) atos administrativos de caráter normativo expedidos pela Administração Tributária – Receita Federal (artigo 7.º da Portaria MF n.º 341/2011): a vinculação a estes atos está expressa na legislação processual administrativa para as DRJ, mas não para o CARF. Em razão disso, o CARF, por vezes, se auto-atribui a não vinculação a tais atos normativos expedidos pela Receita Federal.

8.6. As Provas Ilícitas

Em nossa ordem jurídica, é vedado o uso de provas ilícitas. A vedação consta do inciso LVI do artigo 5.ºda Constituição Federal, assim expresso:

Art. 5.o [...] LVI - São inadmissíveis no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.

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Tal preceito foi reproduzido no artigo 30 da Lei n.º 9.784/1999, tornando a vedação aplicável aos processos administrativos em geral (se é que já não o era em face da disposição constitucional). O referido artigo 30 está assim redigido:

Art. 30. São inadmissíveis no processo administrativo as provas obtidas por meios ilícitos.

No mesmo sentido, a disciplina do novo CPC (Lei n.o 13.105/2015), ao determinar, em seu artigo 369, que "as partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, [...] para provar a verdade dos fatos".

O Regulamento do PAF, (Decreto n.o 7.574, de 29/09/2011) corrobou o preceito, ao incluí-lo de forma expressa em seu artigo 24:

Art. 24. São hábeis para comprovar a verdade dos fatos todos os meios de prova admitidos em direito (Lei n o 5.869, de 11 de janeiro de 1973, art. 332).

Parágrafo único. São inadmissíveis no processo administrativo as provas obtidas por meios ilícitos (Lei n o 9.784, de 29 de janeiro de 1999, art. 30).

A repulsa de nossa ordem jurídica ao uso da prova ilícita encontra justificativa na busca pela preservação do Estado de Direito, o que se dá, in casu, por via do respeito aos direitos fundamentais insculpidos na Constituição Federal. Neste sentido, encontra acolhida, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, a chamada “teoria dos frutos da árvore envenenada”, por meio da qual restam invalidadas não apenas as provas ilícitas em si, mas todas as demais colhidas em razão delas ou produzidas a partir de informações delas obtidas. Tal teoria já vem sendo até mesmo positivada, como se pode inferir do conteúdo do artigo 157 do Decreto Lei n.o 3.689, de 03/10/1941 – Código de Processo Penal (com a redação dada pela Lei n.o 11.690, de 09/06/2008):

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.

§ 1o São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.

§ 2o Considera se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.

§ 3o Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente.

Não obstante tal quadro, em decisão recente, o CARF acabou relativizando a vedação ao uso de provas ilícitas, se valendo para tanto do uso dos princípios da descoberta inevitável e da fonte independente. De se ver o conteúdo do Acórdão n.o 9303008.694:

ATOS PRATICADOS MEDIANTE FRAUDE. COMPROVAÇÃO. PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS. PRINCÍPIO DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. PRINCÍPIO DA DESCOBERTA INEVITÁVEL. PRINCÍPIO DA FONTE INDEPENDENTE. MITIGAÇÃO. POSSIBILIDADE. Não serão consideradas ilícitas as provas derivadas de provas ilícitas, quando ficar demonstrado que elas poderiam ser obtidas por uma fonte independente, bastando, para tanto, que se desse andamento aos trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação fiscal

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É cedo para se afirmar como se desdobrará – se é que haverá desdobramentos – o entendimento posto nessa decisão. O tema é importante porque relativiza algo que é muito caro à nossa ordem jurídica, fazendo o a partir de transplantação, para muitos de forma excessivamente descontextualizada, de teorias estrangeiras (mesmo que já usadas, em situaçoes específicas, no processo penal). O certo é, portanto, que também em relação a este assunto da vedação ao uso das provas ilícitas, há desenvolvimentos em curso.

8.7. Os Fatos que Independem de Prova

O artigo 334 do CPC (reproduzido no artigo 374 do novo CPC) comanda que “não dependem de prova: I – os fatos notórios; II – afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária; III – admitidos, no processo, como incontroversos; IV – em cujo favor, milita presunção legal de existência ou de veracidade”.

No âmbito do PAF, pode se dizer que as situações indicadas nos incisos I e IV são plenamente aplicáveis; já o mesmo não se pode dizer daquelas indicadas nos incisos II e III; é que em face de a matéria tributária estar regida pelo princípio da legalidade estrita –portanto, dentro dos limites do direito indisponível , não pode o julgador contentar se com o consenso entre as partes, posto que acima da falta de controvérsia entre os sujeitos da relação jurídica está a lei (assim, o fato de um contribuinte não contestar uma exigência ilegal não deve ser motivo para que o julgador a tenha como validada).

Deve-se dizer, entretanto, que a falta de controvérsia produz efeitos no que se refere especificamente à matéria estritamente de fato, o que se infere do artigo 17 do Decreto n.º 70.235/1972: “Considerar se á não impugnada a matéria que não tenha sido expressamente contestada pelo impugnante” (seria o caso de o contribuinte não contestar um levantamento de dados efetuado durante a ação fiscal; neste caso, ter se ia o levantamento como verdadeiro).

8.8. Indício, Presunção Legal e Ficção Legal – Distinção:

Uma classificação usual das provas é aquela que as divide em provas diretas e provas indiretas. E ambas podem ser regularmente manejadas no processo administrativo fiscal, justamente em face de que em matéria de prova, neste âmbito também se aplica a regra do direito probatório nacional de que é possível provar o que quer que seja, por via de qualquer meio de prova que não seja ilícito.

As provas diretas têm por objeto o próprio fato ou se referem ao próprio fato probando. São exemplos: notas fiscais, escrituras, certificado de transferência de veículos, livros contábeis e fiscais, guias do ICMS (GIAS), cópias de declarações apresentadas etc. Ocorre, porém, que nem sempre é possível a prova direta do fato alegado. Neste momento ganham relevo as provas indiretas.

As provas indiretas resultam de algum fato, de tal maneira relacionado com o fato principal que, de sua existência, chega se à certeza do fato principal. São exemplos, os indícios, presunções e ficções legais.

Mas o que diferencia os indícios, as presunções e as ficções legais?

O indício se refere, apenas, a um elemento, vestígio, fato ou dado conhecido que, por meio do raciocínio, pode sugerir a ocorrência do fato que se quer provar, mas que não pode ser utilizado como a única base para o lançamento, bem como não poderá ser o único

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elemento em que se fundamentará a livre convicção do julgador. O indício ganha robustez e capacidade para atestar a ocorrência de um fato, quando aparece associado a um quadro indiciário mais amplo (um conjunto de indícios), no âmbito do qual o fato alegado aparece como o único resultado plausível ou verossímil.

Já na presunção, toma se como sendo a verdade de todos os casos o que é a verdade da generalidade dos casos iguais, em virtude de uma lei de freqüência ou de resultados conhecidos, ou em decorrência da previsão lógica do desfecho. As presunções são amplamente utilizadas em matéria tributária, tanto as legais quanto as simples.

As presunções legais são classificadas em absolutas (juris et de jure) e relativas (juris tantum). As absolutas são as que não admitem prova em contrário; o fato descrito na lei é tido como verdade definitiva e absoluta, dispensando a produção de prova da sua realização. Já as relativas admitem que seja produzida prova em contrário (exemplos: caracterizam-se como hipóteses de omissão de receitas presumida, a existência de depósitos bancários sem comprovação da origem dos recursos e a constatação escritural da existência de passivo fictício).

O processo administrativo fiscal admite também o uso das presunções simples (não legalmente qualificadas), desde que estejam corroboradas por vários indícios convergentes. Como afirma Leonardo Sperb de Paola: “O uso de presunções simples pelo agente administrativo independe de expressa autorização legal. Isso não significa que sua atividade de vinculada transforme se em discricionária, pois continua presa à pesquisa, mesmo que indireta, dos fatos previstos no tipo tributário". 23

Por fim, há as ficções legais, que, ao contrário das presunções, não se baseiam no que ordinariamente acontece, mas naquilo que se sabe não ter acontecido; ou seja, com a ficção, a realidade é outra. Essa a razão primordial de, ao contrário do que ocorre com as presunções, só se admitir ficção legalmente qualificada. Como explica Antonio da Silva Cabral: “Enquanto na presunção se parte de um fato conhecido para se chegar a um fato desconhecido, mas real, na ficção já se sabe que o fato não existe, mas a lei o considera como se existisse”.

8.9. Preclusão Probatória X Verdade Material

A limitação à apresentação de novas provas depois de apresentada a impugnação (prevista nos parágrafos 4.o e 5.o do artigo 16 do Decreto n.o 70.235/1972), é fonte, atualmente, de grandes divergências no âmbito dos órgãos julgadores administrativos.

As discussões estão centradas sobre a possibilidade ou não da juntada de documentos e provas em momento posterior à impugnação, hipótese esta vedada pelos parágrafos 4.o e 5.o do artigo 16 do Decreto n.o 70.235/1972. Em linhas bem gerais, há uma corrente que defende a possibilidade da juntada de documentos e provas em momento posterior à impugnação, em razão dos princípios da ampla defesa, do contraditório e da verdade material, e igualmente em face da responsabilidade de os agentes públicos zelarem pela legalidade dos atos administrativos (em outras palavras, não seria admissível que um julgador, confrontado com um documento que atesta a invalidade do lançamento, não o levasse em conta em seu julgamento, pelo tão só fato de ter sido apresentado fora do prazo); e há outra corrente que não admite esta possibilidade, em razão tanto da existência

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23
Leonardo Sperb de Paola, 1997.

da restrição legal quanto do entendimento de que esta restrição não fere aqueles princípios.

Analisando de modo breve a divergência posta, há que se dizer, de início, que não há dúvidas de que o processo administrativo é informado pelos princípios do contraditório, da ampla defesa e da verdade material. Mas parece haver um certo exagero na afirmação de que a limitação temporal à produção de provas macula tais princípios.

Quanto ao princípio da ampla defesa, destina se ele a assegurar o exercício pleno da defesa, por meio, por exemplo, do duplo grau de cognição, do julgador imparcial, do direito de ser intimado dos atos processuais que vão sendo produzidos, da possibilidade íntegra de poder se manifestar de modo producente quanto a estes atos e, igualmente, da garantia à produção de provas. Ocorre, porém, que a garantia à produção de provas não precisa, e nem deve ser ilimitadamente estendida no tempo, posto que a falta de limitação colocaria em risco outros princípios constitucionais expressos ou implícitos, como tais o da duração razoável do processo, o da necessidade de estabilização das relações jurídicas, o da segurança jurídica etc. Deste modo, não há como vislumbrar na limitação temporal à produção de provas o alegado cerceamento do direito de defesa, já que nas regras do PAF há um momento certo definido para a apresentação destas provas, tanto quanto há previsão para o recebimento de provas depois da impugnação diante de situações excepcionais (em geral associadas à impossibilidade concreta de o contribuinte de apresentá-las tempestivamente).

No que se refere ao princípio do contraditório, também ele não resta maculado pela limitação temporal à produção de provas. Como é sabido, tal princípio está associado à necessidade de que as partes sejam ouvidas no processo, ou seja, às partes deve ser assegurado o direito de expor suas alegações e apresentar suas provas, de contraditar as alegações e provas da parte contrária, tudo com o fim de influenciar o convencimento do julgador. Deste modo, a existência de limitação temporal à produção de provas só representaria afronta ao princípio do contraditório, caso não houvesse possibilidade para tal produção ou caso a limitação fosse excessiva (prazo excessivamente pequeno). Em outras palavras, a afronta existiria se a limitação inviabilizasse, ou ao menos prejudicasse a instauração ampla do diálogo processual.

Quanto à verdade material, a incompatibilidade deste princípio com a limitação temporal à produção de provas é juridicamente discutível. É certo que no processo administrativo o julgador não pode se contentar apenas com a verdade formal, ou seja, aquela verdade que resulta das provas e alegações trazidas aos autos pelas partes. Ocorre, porém, que tal dever atribuído ao julgador, não pode ser estendido para além dos limites do rito procedimental. A rigor, a verdade material está associada ao poder do julgador de ir para além das versões de fato defendidas pelas partes com base nas provas que produziram tempestivamente. O julgador pode ir para além das provas trazidas tempestivamente, quando entender que elas não espelham a realidade dos fatos. Mas esta prerrogativa, que é do julgador, não deve ser base para o estabelecimento de uma prerrogativa das partes (tanto contribuinte quanto Fazenda Nacional) que extrapola, de forma injustificada os limites de restrições temporais legalmente postas (sim, pois as extrapolações justificadas podem servir, com base também na norma legal, para o acatamento da produção de provas depois da impugnação).

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De outro lado, trata se aqui, também, de compulsar outros princípios de igual monta, como os da razoável duração do processo e do duplo grau de jurisdição, corolário este da ampla defesa (é que a apresentação de provas apenas junto à segunda instância, por exemplo, suprimiria a manifestação da primeira instância, o que fere uma das próprias razões de ser do duplo grau), bem como o de tutelar o objetivo de que o processo não seja utilizado como meio de dilação injustificada do litígio (que é o que se pode ter com a eliminação da restrição temporal à produção de provas e a conseqüente possibilidade, muito concreta, de se ter a entrega de provas colocada como questão de oportunidade e conveniência para as partes).

Há outra objeção importante à limitação aqui tratada, qual seja a de que o julgador administrativo tem o dever legal de zelar pela legalidade do ato administrativo litigado e que, portanto, deveria considerar em seu juízo mesmo as provas trazidas depois da impugnação. Pois bem, há como conciliar esta objeção com a limitação temporal à produção de provas, sem que esta reste invalidade. E como seria esta conciliação? Seria da seguinte forma: diante de situações nas quais não se vislumbra prejuízo para o curso normal do processo e que envolvem a apresentação de um documento que, por si só, atesta de forma concludente e definitiva a invalidade do lançamento independentemente de cognição mais aprofundada e da realização de diligências para atestar sua veracidade ou conteúdo, poderia tal apresentação ser considerada válida quando efetuada a destempo. Entretanto, se as provas juntadas posteriormente à impugnação compõem se, como é o caso mais comum, de uma massa de documentos que apenas indiretamente atestam a versão da parte, demandando, por conta disto, desdobramentos processuais complementares para sua análise, e com isto atrasando de modo desmesurado o julgamento, só poderia ser acatada a juntada de tais provas fora do prazo legal, caso a parte demonstrasse a ocorrência de uma das circunstâncias excepcionais previstas no parágrafo 4.o do artigo 16 do Decreto n.o 70.235/1972. Com isso, preservados restariam tanto o dever do julgador quanto a integridade do rito procedimental (de se lembrar que o julgamento administrativo não pode ser usado para, na prática, se ter a reabertura da ação fiscal).

Em resumo, a existência de um rito procedimental se justifica pelo grau de transparência que a atuação administrativa adquire, bem como pela previsibilidade quanto aos meios de defesa que concede às partes. E a quebra, de forma genérica e injustificada, das formalidades inerentes à existência do rito procedimental, macula tais ganhos. No caso da limitação temporal à produção de provas, é preciso reconhecer que as excepcionalidades, e apenas elas, demandam relativização (como, aliás, a lei já o faz).

De qualquer modo, não obstante a posição acima, certo é, como já antes se disse, que a questão é objeto, hoje, de grandes divergências nos órgãos julgadores de primeira e segunda instância.

Importa, por fim, fazer menção a duas questões complementares.

Primeiro: o caput do artigo 38 da Lei n.o 9.784/1999 traz comando legal que tem servido como base para alegações de que a limitação à apresentação de novas provas depois de apresentada a impugnação (prevista nos parágrafos 4.o e 5.o do artigo 16 do Decreto n.o 70.235/1972), não teria base jurídica. Tal dispositivo assim determina:

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Art. 38. O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo.

§ 1o Os elementos probatórios deverão ser considerados na motivação do relatório e da decisão.

§ 2o Somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas propostas pelos interessados quando sejam ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias.

A alegação, entretanto, tem sido refutada com base na afirmação de que o artigo 69 da mesma Lei n.o 9.784/1999, expressamente determina que: “Os processos administrativos específicos continuarão a reger se por lei própria, aplicando se lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei”. Ou seja, como o Decreto n.o 70.235/1972 tem uma disposição específica sobre a matéria, o preceito da Lei n.o 9.784/1999 não teria aplicabilidade no PAF.

Segundo: no que se refere aos limites materiais da restrição à produção de provas, o acórdão abaixo transcrito exemplifica o teor da discussão sobre quais seriam tais limites materiais da restrição temporal à produção de provas prevista nos parágrafos 4.o e 5.o do artigo 16 do Decreto n.o 70.235/1972. Como se infere do teor do julgado, a referida restrição se limitaria à apresentação de “documentos”, olhados de modo restrito, e não a outros elementos que, apesar de destinados à atuação probatória, não se enquadrariam naquela acepção restrita, como é o caso de um parecer jurídico; na base do argumento posto no acórdão abaixo, está a assertiva de que o parágrafo 4.o do artigo 16 do Decreto n.o 70.235/1972 não fala em pareceres, enquanto o artigo 38 da Lei n.o 9.784/1999 o faz (assim, aqui se justificaria a aplicação subsidiária desta Lei).

CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA PELA RECUSA DE APRECIAÇÃO DO PARECER JURÍDICO APRESENTADO EM 11.01.2005, COMO COMPLEMENTAÇÃO DA DEFESA, ANTES DA REALIZAÇÃO DO JULGAMENTO. O referido parecer elaborado por jurista, especialista em direito tributário e em processo administrativo fiscal, foi ignorado sob a alegação de não atendimento às condições previstas no § 4º do art. 16 do Decreto 70.235/72 (PAF). Entretanto, tal norma disciplina tão somente a apreciação de prova documental no PAF, e evidentemente não abrange a hipótese de apresentação de parecer jurídico em complemento à impugnação. As interessadas citaram oportunamente a doutrina de Sérgio Ferraz e de A. A. Dallari para explicitar a natureza de um parecer jurídico. No caso, a disciplina adequada seria efetivamente a do art. 38 da LGPAF (Lei 9.784/99), utilizada subsidiariamente, já que o PAF (Decreto 70.235/72) é omisso quanto a isto. A norma evocada prevê que antes da decisão, na fase de instrução, pode se juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo. Portanto, a recusa de apreciação do parecer jurídico juntado aos autos na fase de instrução, antes da tomada de decisão, caracteriza cerceamento ao direito de defesa, eivando de nulidade absoluta a decisão recorrida. Enfatiza se que nesta situação a juntada do parecer não afetou de forma alguma o trâmite processual, não o prolongou, e não se justifica a recusa de conhecimento de matéria de defesa que necessariamente haveria de ser apreciada também em segunda instância, de forma que a omissão do julgador a quo também afronta o direito do contribuinte ao duplo grau de jurisdição. Houve claro cerceamento ao direito de ampla defesa. (Acórdão n.o 303 34.308, da 3ª Câmera do 3º Conselho de Contribuintes, proferido no recurso voluntário nº 134.737, em de 22/05/2007)

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8.10. Algumas Regras sobre Provas

Sem a pretensão de exaurir as numerosas determinações que ganham gênese nas normas que compõem o sistema de direito probatório brasileiro, importa ter em conta algumas questões importantes acerca das provas no âmbito específico do PAF:

(a) o processo é formalizado, entre outros fins, com o objetivo de espelhar com clareza, para o contribuinte e para tantos quantos se tornem competentes para a apreciação do eventual e posterior litígio, o conteúdo e o resultado do procedimento de ofício. A comprovação dos fatos investigados deve ser feita, portanto, de forma tal a tornar inteligível, para quem não esteve à frente do procedimento de ofício, a fundamentação de fato e de direito que dá base à exigência fiscal;

(b) a presunção de legitimidade ou a presunção de fé pública do agente fiscal não se destina a suprir lacunas probatórias;

(c) é ônus do agente fiscal e do contribuinte consubstanciar com provas os fatos e alegações apresentados;

(d) em regra, não se pode exigir a produção de prova negativa (como, por exemplo, a prova de que algo não foi feito);

(e) o direito probatório brasileiro consagra a possibilidade de uso da prova indiciária. Entretanto, no caso do uso das provas indiciárias (indiretas), é ônus do agente fiscal contextualizar os elementos de prova juntados, tratando de articulá los de forma tal a demonstrar a inequivocidade da conduta ilícita do contribuinte (se do cruzamento dos elementos de prova coletados não resultar como possível apenas aquele resultado afirmado pelo agente fiscal, desvigorado restará o cenário construído, o que, via de regra, demanda aprofundamento da investigação);

(f) provar significa contextualizar elementos relevantes, e não meramente coletar uma massa infinda de documentos não hierarquizados, não devidamente articulados no sentido da comprovação dos fatos alegados;

(g) em regra, o agente fiscal (tanto seja a autoridade lançadora quanto a autoridade julgadora) deve apresentar provas e refutar as provas apresentadas pelo contribuinte;

(h) no âmbito do processo (fisicamente falando) deve haver ordem e referibilidade na juntada das provas ao processo (identificação das fontes de informação). O processo não é um mero repositório de documentos, mas o locus no qual tais documentos, devidamente referenciados nos relatórios e termos de circunstanciação, compõem um quadro ordenado e lógico dos fatos alegados;

(i) seja qual for o método de auditoria utilizado, as conclusões, quando levadas ao processo, devem estar juridicamente traduzidas. Métodos de investigação são soluções sistêmicas destinadas à averiguação dos fatos; entretanto, depois da conclusão das investigações, tudo tem de ser traduzido de forma juridicamente clara e objetiva (de se lembrar que, atualmente, mesmo no âmbito formalista do processo civil, há um movimento no sentido do expurgo de tecnicalidades supérfluas – como tal o uso das expressões latinas , tudo com o fim de tornar o direito inteligível aos cidadãos);

(j) por fim, em relação à chamada “prova emprestada”, há que se dizer que são comuns os procedimentos de ofício que se baseiam em documentos coletados por outros

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órgãos tributantes (como as Fazendas Estaduais, por exemplo). A jurisprudência, porém, admite o empréstimo da prova, mas não das conclusões do outro órgão tributante. Assim, se houver caracterização de omissão de receitas no âmbito de um procedimento conduzido pela Secretaria Estadual da Fazenda, não poderá a Receita Federal ancorar se nessa conclusão para fins de exigir os tributos sob sua administração; poderá valer se dos elementos de prova coletados naquele outro procedimento, mas terá de construir todo o cenário elisivo no âmbito do seu próprio procedimento de ofício.

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9. As Nulidades no Processo Administrativo Fiscal

9.1. As Mudanças no Direito Administrativo e o Alcance do Artigo 59 do Decreto n.o 70.235/1972

As mudanças operadas no Direito Administrativo ao longo dos últimos anos, resultaram na superação da visão compartimentada dos atos administrativos (que é a que vigorava à época da edição do Decreto n.o 70.235/1972) e na adoção da visão processual da atuação administrativa. Hoje, ao Direito Administrativo interessam menos os atos administrativos vistos isoladamente e mais o conjunto dos atos que compõem uma dada atuação administrativa, a dinâmica da relação entre Estado e cidadão, com foco no resultado concreto do processo e no equilíbrio final entre direitos e obrigações das partes que compõem a relação jurídica. Assim, um ato administrativo não terá sua regularidade apurada com base, tão somente, em uma análise descolada do processo de que faz parte, mas em especial a partir dos efeitos concretos do conjunto de atos na órbita de interesses das partes (visão dinâmica do processo).

Dentro desta lógica, é necessário compatibilizar com tais mudanças as disposições do Decreto n.o 70.235/1972 que tratam das nulidades. Por exemplo, quando o inciso II do artigo 59 do Decreto n.o 70.235/1972 determina que "são nulos: [...] os despachos e decisões proferidos por autoridade incompetente ou com preterição do direito de defesa ", é necessário estender a todos os atos administrativos - e não apenas às decisões e despachos - a vedação à preterição do direito de defesa. É que hoje se sabe que há atos praticados durante a ação fiscal ou mesmo durante a fase contenciosa que, apesar de serem medidas de condução processual ou preparatória à atividade de lançamento ou decisória, demandam intimação ao contribuinte e abertura da possibilidade de falar nos autos. Alguns exemplos ilustram o dito:

(a) quando, numa ação fiscal tendente à descaracterização de alguma atividade negocial, a fiscalização deixa de ouvir o contribuinte em relação aos fatos que vão ensejando e fundamentando o lançamento, é cabível a alegação de cerceamento do direito de defesa. Da mesma forma, quando a fiscalização arbitra os lucros do contribuinte sem conceder lhe prazo razoável para apresentar ou recompor sua escrituração. Igualmente, nos casos em que os pedidos de informação ao contribuinte são demasiadamente exíguos, claramente insuficientes para o atendimento dos esclarecimentos solicitados. Por óbvio que os procedimentos de ofício são predominantemente informados pelo princípio inquisitório, mas há situações em que a atuação unilateral da autoridade fiscal não é suficiente para fundamentar, do ponto de vista fático, o lançamento;

(b) no caso da fase litigiosa, quando não é dada ciência ao contribuinte de elementos novos juntados aos autos (em razão, por exemplo, de diligências realizadas), o cerceamento do direito de defesa é evidente.

Com tais considerações não se quer dizer que ao contribuinte deva ser dada ciência de tudo o que ocorre no curso da ação fiscal (até porque há procedimentos que

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demandam segredo nas investigações), mas sim que naqueles casos em que está envolvida a atuação do contribuinte, lhe devem ser dadas oportunidades concretas de falar de modo producente no processo.

9.2. Hipóteses de nulidade

O caput do artigo 59 do Decreto n.º 70.235/1972 determina que: Art. 59. São nulos: I - os atos e termos lavrados por pessoa incompetente; II - os despachos e decisões proferidos por autoridade incompetente ou com preterição do direito de defesa.

Antônio da Silva Cabral (in “Processo administrativo Fiscal”, Ed. Saraiva, São Paulo, 1993, p. 525 526) critica a posição de tantos quantos defendem a idéia de que as hipóteses de nulidade em processo fiscal são apenas aquelas listadas nos incisos I e II do artigo 59 do Decreto n.º 70.235/1972. Utilizando se de distinção efetivada por De Plácido e Silva, defende a idéia de que os citados dispositivos representam hipóteses de nulidade expressa ou legal (que devem ser declaradas a qualquer tempo, independentemente de argüição, sendo os atos inquinados inaproveitáveis), sem negar que existam outras causas que provocam a nulidade absoluta ou a declaração de nulidade; seriam estas as nulidades relativas ou acidentais (que dependem de argüição, podendo os atos inquinados serem ratificados ou sanados) e as nulidades virtuais (que resultam da interpretação das leis). Seguindo esta linha, há que se ter presente a distinção entre nulidades processuais e nulidades de caráter material. As processuais referem-se especificamente à relação processual estabelecida em um dado processo, sem invadir a esfera do direito argüido; as de caráter material viciam o próprio direito, inviabilizando que qualquer relação processual se estabeleça a partir dele. Assim, declarada a nulidade por força de disposições processuais, extingue se a relação processual, mas o direito pode voltar a ser pleiteado, em outra ação, depois de sanada a irregularidade; já a nulidade do direito material significa a extinção do próprio direito, não podendo o mesmo voltar a ser pleiteado. Como exemplo, declarada a nulidade por ilegitimidade passiva, extingue se a relação processual, dado que estabelecida por quem não detém o direito subjetivo; mas o direito pode voltar a ser pleiteado por quem é parte legítima para tal. Por outra, declarada a nulidade por falta dos requisitos de validade de um contrato, viciado restará o próprio direito que emana da relação contratual, não podendo haver novo pleito em face dele.

De tais observações, infere se, então, que não são mesmo apenas os casos do artigo 59 do Decreto n.º 70.235/1972 que se conformam como hipóteses de nulidade, tanto quanto se conclui que não são todos os casos de nulidade que dão margem a novo lançamento por parte do fisco. Só são passíveis de novo lançamento as matérias constantes de processos que foram anulados por vícios processuais (ilegitimidade passiva, falta de ciência de procuradores, falta de intimação das partes, etc.); em relação aos processos que foram anulados por vícios materiais (erro de direito, decadência, etc.), o novo procedimento deve ser vedado.

A título exemplificativo, pode se listar outros casos de nulidade que, apesar de não incluídos nos incisos do artigo 59 do Decreto n.º 70.235/1972, decorrem, entre outros diplomas, do Código Tributário Nacional:

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(a) nulidade do lançamento por vício formal (art. 173 do CTN): haverá vício de forma sempre que, na formação ou na declaração da vontade traduzida no ato administrativo, foi preterida alguma formalidade essencial ou o ato efetivado não o tenha sido na forma legalmente prevista (exemplo: segundo exame, em relação a um mesmo exercício fiscal, sem ordem escrita da autoridade fiscal competente - ver Acórdão CSRF/01-0.538, de 23/05/1985);

(b) nulidade por ilegitimidade passiva (art. 142 do CTN): o erro na identificação do sujeito passivo torna nulo o lançamento (“o equívoco quanto à indicação do sujeito passivo acarreta a extinção do processo em qualquer instância em que venha a ser argüida” - Acórdão 1.º CC - n.º 101-71.342/80);

(c) nulidade de decisão do CARF que tenha sido proferida por julgador legalmente impedido: o artigo 80 do RI do CARF, aprovado pela Portaria MF n.º 256, de 22/09/2009, diz que se enquadra na hipótese de nulidade de que trata o inciso II do Decreto n° 70.235/1972, as decisões proferidas em desacordo com o artigo 42 do mesmo RI (este dispositivo trata dos casos de impedimento do julgador);

(d) nulidade de decisão do CARF que tenha afastado a aplicação de ato legal sob o fundamento de inconstitucionalidade: o artigo 80 do RI do CARF, aprovado pela Portaria MF n.º 256, de 22/09/2009, diz que se enquadra na hipótese de nulidade de que trata o inciso II do Decreto n° 70.235/1972, as decisões proferidas em desacordo com o artigo 62 do mesmo RI (este dispositivo trata da vedação ao afastamento da aplicação de dispositivo legal sob fundamento de inconstitucionalidade);

(e) nulidade por decadência (arts. 150, § 4.º, e 173, I, do CTN): exigências formalizadas depois do transcurso do prazo de decadência, autoriza a declaração de nulidade do feito fiscal;

(f) erro na invocação da norma infringida e discrepância entre fundamentos e conclusão: se o erro na indicação do enquadramento legal não representar mudança no critério jurídico do lançamento e a deficiência estiver suprida por farta e clara descrição dos fatos, permitindo ao contribuinte exercer seu direito de defesa, não há causa para a declaração de nulidade do lançamento assim afetuado. No entanto, havendo a referida mudança de critério jurídico ou prejudicada a defesa do contribuinte, anulável é o ato de lançamento.

9.4. O Locus das Nulidades e os Vícios Mais Comuns no PAF

Para fins de uma visão básica, mas sistematizada das nulidades no processo administrativo fiscal, identificam-se abaixo o lugar das nulidades e os vícios mais comuns encontrados.

(a) O lugar das nulidades:

(a.1) Vícios no curso do processo (no curso do procedimento de ofício e do julgamento administrativo): em regra, são causa de anulabilidade (não necessariamente invalidam o procedimento como um todo);

(a.2) Vícios no resultado (no auto de infração ou na notificação de lançamento, além das decisões dos órgãos julgadores): em regra, são causa de nulidade (em geral, invalidam o Auto de Infração ou a Notificação de Lançamento).

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(b) Vícios mais comuns no curso do processo:

- aquisição de provas por meios ilícitos; - falta de apreciação dos argumentos por parte da 1.ª instância; - falta de ciência acerca de provas obtidas por diligências; - prática de atos por agente incompetente (funcionalmente incompetente ou não incluído em Mandado de Procedimento Fiscal).

(c) Vícios mais comuns no resultado:

- ilegitimidade passiva; - decadência; - ilegalidade da exigência fiscal; - lavratura do Auto de Infração por agente incompetente. Cumpre ressaltar que os vícios associados aos atos de desenvolvimento do processo só terão repercussão sobre o processo como um todo ou sobre o resultado em si da ação fiscal, caso tenham importância tal para o procedimento que acabem por macular tudo quanto foi produzido. Entretanto, caso possam ser expurgados sem prejuízo de outros atos regularmente produzidos e que sejam suficientes, estes, para a fundamentação do feito fiscal, o procedimento como um todo poderá ser preservado. De outra parte, a declaração de nulidade de qualquer ato só se impõe no caso de associado a ele estar algum prejuízo concreto para as partes.

Importa ter em conta que vícios como a falta de apreciação de argumentos por parte da autoridade julgadora ou falta de ciência de atos processuais podem ser regularmente saneados: no primeiro caso, pela anulação da decisão e prolação de uma nova; no segundo caso, pela intimação da parte e reabertura do prazo para manifestação.

Por fim, cabe ressaltar, em suma, que dentro da visão acima posta, o que importa para a aferição do nível de contaminação de um determinado vício é o nível de prejuízo que ele traz para a relação processual ou para as partes que a compõem. Sem prejuízo, não há vício que demande saneamento ou mero expurgo; com prejuízo, é preciso avaliá lo para fins de que se decida acerca de sua saneabilidade ou não.

9.5. Extensão da Declaração de Nulidade

O artigo 59 do Decreto n.º 70.235/1972 tem três parágrafos, nos quais estão postos os limites e a extensão da declaração de nulidade dos atos que compõem o processo administrativo fiscal:

Art. 59. [...]

§ 1º A nulidade de qualquer ato só prejudica os posteriores que dele diretamente dependam ou sejam conseqüência.

§ 2º Na declaração de nulidade, a autoridade dirá os atos alcançados e determinará as providências necessárias ao prosseguimento ou solução do processo.

§ 3º Quando puder decidir do mérito a favor do sujeito passivo a quem aproveitaria a declaração de nulidade, a autoridade julgadora não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir lhe a falta.

Tais regras reproduzem regras similares constantes dos artigos 281 e 282 do novo CPC (Lei n.o 13.105/2015), e têm um claro objetivo de privilegiar a economia processual; sim, porque não há porque anular os atos que não tenham sido resultado, direto ou

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indireto, do ato declarado nulo. Por conta disto é os dispositivos comandam que a autoridade, ao declarar a nulidade, especifique todos os atos atingidos e determine as providências necessárias ao prosseguimento regular do processo.

A disposição do parágrafo 3º também visa a economia processual. Se a autoridade julgadora percebe que no mérito o lançamento é improcedente, não deve declarar a nulidade, pois se assim não for, a nulidade pode ser saneada e o lançamento, desde sempre irregular, voltará a ser efetuado e uma vez mais submetido a uma evidentemente inútil reapreciação administrativa.

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10. Tempestividade, Comunicação dos Atos Processuais e a Contagem de Prazos no Processo Administrativo Fiscal

Neste item do trabalho serão abordados três temas distintos, mas intimamente associados: a preclusão do direito de praticar os atos processuais, as formas de comunicação desses atos e os critérios de contagem dos prazos processuais.

10.1 Distinção entre Preclusão, Perempção, Decadência e Prescrição

É muito comum, em direito tributário e em direito processual tributário, haver dúvidas acerca das diferenças entre os institutos jurídicos criados, via de regra, para dar conseqüência prática à inércia de quem pode agir e não o faz (diz se "via de regra", porque como se verá a seguir, nem sempre é a inércia que traz como conseqüência a perda de prerrogativas de direito processual ou de direito material). Importa, assim, ter se em conta as distinções existentes entre as figuras da preclusão, perempção, decadência e prescrição.

(a) Preclusão: em princípio, a preclusão representa a perda da prerrogativa de direito processual, em razão da inércia do agente; ou seja, é a perda da faculdade de praticar ato processual. Ocorre, porém, que não é apenas a inércia que traz a preclusão. Assim, ganha relevo a distinção entre os quatro tipos de preclusão: a temporal, a lógica, a consumativa e a pro judicato

(a.1) Preclusão temporal: é aquela que decorre da perda do prazo previsto para contestar o ato administrativo. Assim, a impugnação apresentada depois do decurso do prazo de 30 dias previsto no artigo 15 do Decreto n.o 70.235/1972, não pode ser conhecida em face de já ter se conformado a preclusão do direito processual. E tal efeito pode se dar de forma parcial, que é o que se dá quando o sujeito passivo contesta apenas parcialmente o lançamento; aqui, com base no artigo 17 do Decreto n.o 70.235/1972, tem se que só se terá como impugnada a matéria expressamente contestada, restando a matéria não impugnada fora dos limites do litígio e, portanto, em relação a ela operando se a preclusão do direito do sujeito passivo de rediscuti la no processo.

(a.2) Preclusão lógica: ocorre quando o sujeito passivo pratica ato incompatível com a vontade de "recorrer". É o que ocorre quando o sujeito passivo apresenta impugnação, mas paga ou parcela o crédito tributário lançado.

(a.3) Preclusão consumativa: ocorre quando há a prática de um ato que exclui o recurso ou seu aditamento. Ou seja, é a perda da faculdade de praticar o ato processual em razão de já ter havido a oportunidade para tanto, isto é, de o ato já haver sido praticado e, portanto, não pode tornar a sê lo. Por exemplo, o prazo para impugnar o lançamento é de 30 dias; porém, se o sujeito passivo o faz no vigésimo dia, já exerceu seu direito, não podendo apresentar nova impugnação ou emendar a já apresentada.

(a.4) Preclusão pro judicato: decorre do fato de que o julgador não pode decidir acerca de questões já anteriormente decididas no processo, em relação às quais já se operou a preclusão. Esta regra encontra base, em especial, no artigo 507 do novo Código de Processo Civil ("Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão."), mas sua aplicação ao processo administrativo

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fiscal é conseqüência lógica do fato de que não é lícito ao sujeito passivo buscar rediscutir a matéria originalmente impugnada, por via de novas alegações. Obviamente que a preclusão pro judicato não impede que o julgador administrativo reaprecie questões já decididas, caso estejam envolvidas questões de direito aferíveis de plano (é uma prerrogativa do julgador administrativo, similar à do juízo judicial, na qual questões de ordem pública não são tidas como atingidas pela preclusão); mas isto só é possível, por óbvio, nos casos em que este julgador continue competente para falar no processo no momento em que constata a existência da questão de direito que justifica a reapreciação.

(b) Perempção: é uma figura típica do direito processual civil, representando a perda do direito de ação (não do próprio direito reclamado), em razão de o autor der causa, por três vezes seguidas, à extinção da ação por conta do abandono (parágrafo 3.o do artigo 486 do novo Código de Processo Civil). Tecnicamente, não há a figura da perempção no processo administrativo fiscal, já que em face das especificidades da relação processual estabelecida nesta esfera, não há possibilidade de o sujeito passivo abandonar um processo e repropor a apreciação numa nova demanda. É certo que o artigo 35 do Decreto n.o 70.235/1972 determina que "O recurso, mesmo perempto, será encaminhado ao órgão de segunda instância, que julgará a perempção ", mas neste caso, o que está aqui em jogo, propriamente, é a discussão quanto à preclusão ou não da prerrogativa processual do sujeito passivo.

(c) Decadência: não é instituto de direito processual, mas de direito material. Representa a perda do direito material em razão do decurso do tempo. A decadência importa a extinção de um direito em razão do seu não exercício durante o prazo previsto em lei. No âmbito tributário, a distinção entre decadência e prescrição, tão polêmica no direito civil, é facilitada no que se refere ao direito de a Fazenda Nacional exercitar suas prerrogativas: é de decadência o prazo para a constituição do crédito tributário (pelo lançamento), e é de prescrição o prazo para a cobrança do crédito devidamente constituído. A decadência deve ser levantada de ofício pelo julgador.

(d) Prescrição: representa a perda do direito de ação em razão do decurso do lapso temporal legalmente previsto para tanto. Não há, aqui, perda do direito material, mas perda do direito de propor a ação necessária para sua preservação. A prescrição, antes dependente de alegação da parte a quem aproveitava, hoje deve ser levantada de ofício, em sede administrativa, em face do artigo 53 da Lei n.o 11.941/2009 ("Art. 53. A prescrição dos créditos tributários pode ser reconhecida de ofício pela autoridade administrativa").

10.2. As Formas de Intimação e o Momento de Aperfeiçoamento das Intimações

No âmbito do processo administrativo fiscal a comunicação dos atos processuais é feita por meio de intimações. Intimação, segundo o artigo 234 do Código de Processo Civil, é "o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo, para que faça algo ou deixe de fazer alguma coisa”. Ou seja, é por meio das intimações que se dá a comunicação dos atos que vão sendo realizados no iter processual e se viabiliza, assim, a instauração do contraditório e o exercício da ampla defesa.

A importância das intimações no processo administrativo é difícil de ser minorada, pois os atos administrativos, em regra, só produzem efeitos em relação ao contribuinte depois de sua devida intimação. Por meio das intimações é que se dá comunicação oficial ao contribuinte de tudo quanto está sendo produzido no âmbito do processo, com isto legitimando a juntada de elementos de prova aos autos.

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No artigo 23 do Decreto n.o 70.235/1972 estão detalhados as formas de intimação passíveis de utilização no processo administrativo fiscal. São elas:

(a) pessoal, pelo autor do procedimento ou por agente do órgão preparador, na repartição ou fora dela, provada com a assinatura do sujeito passivo, seu mandatário ou preposto, ou, no caso de recusa, com declaração escrita de quem o intimar;

(b) por via postal ou por qualquer outro meio ou via, com prova de recebimento no domicílio tributário eleito pelo sujeito passivo;

(c) por meio eletrônico, com prova de recebimento, mediante envio ao domicílio tributário do sujeito passivo ou registro em meio magnético ou equivalente utilizado pelo sujeito passivo;

(d) por edital, quando resultar improfícuo um dos meios anteriores ou quando o sujeito passivo tiver sua inscrição declarada inapta perante o cadastro fiscal, publicado no endereço da administração tributária na Internet, em dependência, franqueada ao público, do órgão encarregado da intimação ou uma única vez, em órgão da imprensa oficial local.

Importante ressaltar que as três primeiras formas de intimação não estão sujeitas a ordem de preferência.

Também constam do dispositivo legal os critérios para a definição de quando se considera efetivada a intimação, informação esta de muita importância, dado que os prazos processuais são contados a partir do aperfeiçoamento da intimação. Considera se feita a intimação:

(a) se pessoal, na data da ciência do intimado ou da declaração de recusa lavrada pelo servidor responsável pela intimação;

(b) se por via postal, na data do recebimento ou, se omitida, 15 (quinze) dias após a data da expedição da intimação;

(c) se por meio eletrônico, 15 (quinze) dias contados da data registrada no comprovante de entrega no domicílio tributário do sujeito passivo; na data em que o sujeito passivo efetuar consulta no endereço eletrônico a ele atribuído pela administração tributária, se ocorrida antes do prazo previsto na hipótese anterior; ou na data registrada no meio magnético ou equivalente utilizado pelo sujeito passivo;

(d) se por edital, 15 (quinze) dias após a sua publicação.

Em face dos critérios estabelecidos no artigo 23 do Decreto n.º 70.235/1972, importa que se tenha clareza acerca de quando se considera efetuada a intimação em cada um dos casos previstos. São várias as situações que podem ocorrer concretamente: intimação pessoal, intimação postal com data de recebimento, intimação postal sem data de recebimento, intimação por alguma das três vias eletrônicas e intimação por edital. O cuidado que se deve ter tem a ver com as distintas finalidades dos artigos 5.º (que trata da contagem de prazos para a realização de atos processuais) e 23 (que trata da definição do mento em que se considera intimado o contribuinte). Analisa se a seguir cada situação: (a) intimação pessoal: intimação considera se efetuada na data da ciência, desde que feita em dia útil;

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(b) Intimação postal com data de recebimento: intimação considera se efetuada na data do recebimento, desde que feita em dia útil ;

(c) Intimação postal sem data de recebimento: intimação considera-se efetuada 15 dias após a data da expedição;

(d) Intimação por via eletrônica:

(d.1) intimação considera se efetuada 15 dias após a data registrada no comprovante de entrega no domicílio tributário do sujeito passivo;

(d.2) intimação considera se efetuada na data em que o sujeito passivo efetuar consulta no endereço eletrônico a ele atribuído pela administração tributária, se ocorrida antes do prazo previsto em (d.1);

(d.3) intimação considera-se efetuada na data registrada no meio magnético ou equivalente utilizado pelo sujeito passivo;

(e) Intimação por edital: intimação considera se efetuada 15 dias após a afixação ou publicação.

É importante ter em conta que a contagem dos 15 dias para determinação da data da ciência prevista nos itens (c), (d.1) e (e) acima deve ser iniciada no dia seguinte à data da expedição, registro ou publicação, independentemente de que o dia da semana seja útil ou não ou de que de trate de dia de expediente normal ou não. Neste sentido, é importante não confundir o critério de contagem do prazo de 15 dias previsto para o aperfeiçoamento da intimação, com o critério de contagem do prazo para a prática dos atos processuais (como é o caso do prazo para contestação dos atos administrativos) que será abordado no item 10.2, a seguir. Assim, por exemplo, se a intimação foi expedida no dia 05 de fevereiro, sexta feira, conta se inclusive o dia 06, sábado, recaindo o décimo quinto dia em um sábado, dia 20. O prazo para recurso, porém, não começará a contar já a partir do dia 21 (domingo), mas apenas a partir do dia 23 (terça feira), pois como se verá no já mencionado item 10.2, a jurisprudência administrativa já firmou entendimento de que quando a intimação é feita em dia não útil ou em dia em que não há expediente normal na repartição, considera se efetivada a intimação no primeiro dia útil seguinte, o qual, no caso aqui posto é o dia 22 (segunda-feira).

10.3. A Contagem de Prazos

No que se refere aos prazos, importa saber que o contencioso administrativo federal, ao contrário do que já ocorreu com os contenciosois administrativos de outros entes federativos, não adotou a forma de contagem trazida pelo novo CPC, que leva em conta apenas os dias úteis. Para o PAF federal, portanto, continua a valer o que está posto no artigo 5.o do Decreto n.o 70.235/1972 (nos mesmos termos em que consta do artigo 210 do Código Tributário Nacional):

Art. 5o Os prazos serão contínuos, excluindo se na sua contagem o dia de início e incluindo se o dia do vencimento.

Parágrafo único. Os prazos só se iniciam ou vencem no dia de expediente normal no órgão em que corra o processo ou deva ser praticado o ato.

A partir do dispositivo legal, acabam firmados alguns princípios para a contagem de prazos, quais sejam:

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(a) início e vencimento em dia de expediente normal: os prazos somente se iniciam ou se encerram em dia de expediente normal; considera-se normal, para esse efeito, o dia em que a repartição tenha funcionado em seu horário de expediente sem qualquer anormalidade que lhe reduza ou altere o período de funcionamento;

(a) continuidade: uma vez iniciada a contagem, nela incluem se os finais de semana e feriados, não apenas os dias úteis;

DIADE INÍCIODO PRAZO (diaemquese considera efetuadaa intimação)

DIADE INÍCIODA CONTAGEM

CONTAGEM SEM QUALQUERINTERRUPÇÃO

Sábados,domingos,feriados e diassem2aa6afeiracom expedientenormalnãosuspendemaexpediente contagemdoprazonormal

DIADO TÉRMINODO PRAZO 2aa6!feira ~normal

FIGURA 12: Continuidade dos prazos

(b) exclusão do dia de início (dies a quo): o dia de início será o dia em que se considera intimado o sujeito passivo, e esse dia sempre será desconsiderado na contagem do prazo;

6aFeiraSábadoDomino2aFeira3aFeira INTIMAÇÃOINÍCIODA EFETUADA

INÍCIODO PRAZO INTIMAÇÃO EFETUADA

INTIMAÇÃOPRAZO EFETUADA

DiadeDiasde expedienteexpediente normalnormal

FIGURA 13: regras para início do prazo e da contagem.

(c) inclusão do dia de vencimento (dies ad quem): o último dia para praticar o ato processual é aquele em que recair o termo final do prazo;

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IníciodoPrazo6•FeiraSábadoDomingo2•Feira INTIMAÇÃOINÍCIODA FIM

EFETUADACONTAGEMD

ÚLTIMO DIADO PRAZO ÚLTIMO DIADO PRAZO ÚLTIMO DIADO PRAZO DiadeDiade expedienteexpediente normalnormal

FIGURA 14: término dos prazos.

A jurisprudência dos antigos Conselhos de Contribuintes e da Câmara Superior de Recursos Fiscais (atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) acabou firmando entendimento, hoje pacificado, de que quando a intimação é feita em dia não útil (sábados, domingos ou feriados) ou em dia em que não há expediente normal na repartição (por eventos como greve, enchentes ou quaisquer outras eventualidades), considera-se efetivada a intimação no primeiro dia útil seguinte. Assim, se o sujeito passivo recebe a intimação por via postal no sábado, só será considerado intimado, para efeitos de contagem de prazo, na segunda feira. Como o dia de início (dia da intimação) é excluído da contagem, o prazo deve ser contado a partir da terça-feira.

De se ressaltar que as intimações em dias não úteis são bastante comuns. Exemplos são o recebimento da intimação via postal no sábado e as intimações pessoais feitas na área aduaneira nos finais de semana.

Se o termo final do prazo recair em dia que não seja de expediente normal, como por exemplo, um feriado, pela regra de que os prazos somente vencem em dia de expediente normal, este automaticamente fica prorrogado para o primeiro dia útil seguinte, e isto se houver expediente normal nesse dia.

Uma vez mais é importante ressaltar aqui a distinção que se deve fazer entre o critério de contagem do prazo de 15 dias previsto para o aperfeiçoamento da intimação (abordado no item 10.1), com o critério de contagem do prazo para a prática dos atos processuais aqui exposto. Como já abordado no item 10.1, a contagem do prazo de 15 dias para determinação da data da ciência nos casos de intimação por via postal, por meio eletrônico e por edital, deve ser iniciada no dia seguinte à data da expedição, registro ou publicação, independentemente de que o dia da semana seja útil ou não ou de que de trate de dia de expediente normal ou não. Já a data em que se considera efetuada a intimação (ou seja, a data resultante da contagem do prazo de 15 dias) não pode recair em dia não útil ou dia em que não haja expediente normal na repartição; se assim for, entretanto, a intimação se considera efetuada no primeiro dia útil seguinte e o prazo para a prática dos atos processuais respectivos começa a ser contado no dia imediatamente posterior (desde que este também seja dia de expediente normal), nos exatos termos da regra indicada de forma gráfica na figura 15.

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10.4. A contagem do prazo nos casos de pluralidade de sujeitos passivos

São hoje comuns os lançamentos nos quais acabam integrando o pólo passivo mais de um sujeito passivo (em razão das regras de atribuição de responsabilidade tributárias constantes do Código Tributário Nacional). Nestes casos, todos estes entes devem ser cientificados da autuação, com a oferta da possibilidade de impugnar sendo feita a cada um deles (Portaria RFB n.o 2.284, de 29/11/2010). Mas diante desta situação, qual é o termo inicial do prazo de 30 dias previsto para a apresentação da impugnação?

Pois bem, até a edição do Decreto n.º 7.574/2011 (Regulamento do PAF), não havia uma regra específica na legislação processual administrativa. Assim, duas opções se apresentavam: a primeira, era a adotada no processo civil brasileiro, segundo a qual no caso de multiplicidade de réus, o prazo para recorrer "da data de juntada aos autos do último aviso de recebimento ou mandado citatório cumprido" (artigo 241, III, do antigo Código de Processo Civil, e artigo 231, parágrafo 1.o, do novo CPC - Lei n.o 13.105/2015); já a segunda era a oriunda de uma interpretação mais literal do Decreto n.o 70.235/1972, e consiste em se ter prazos específicos para cada um dos impugnantes, contados a partir da ciência de cada um deles.

A favor do primeiro critério operava o argumento de que na ausência de disposição específica na legislação processual administrativa, estar se ia adotando o critério firmado naquele que é o diploma processual pátrio por excelência, o Código de Processo Civil (privilegiar-se-ia, assim, a unidade da ordem jurídica). Já a favor do segundo critério contavam algumas circunstâncias específicas vinculadas à atividade fiscal: por exemplo, como o lançamento tem prazo para ser formalizado (em razão do prazo decadencial), a dificuldade em intimar um dos sujeitos passivos poderia, no caso de procedimentos de ofício efetuados já no final do prazo decadencial, comprometer o aperfeiçoamento do lançamento dentro do prazo legal; também se alegava que para as unidades da RFB seria mais fácil controlar a entrega das impugnações contribuinte-a-contribuinte.

Afora as controvérsias, o artigo 56 do Regulamento do PAF veio dirimir a questão, nos seguintes termos: Art. 56. [...]

§ 3o No caso de pluralidade de sujeitos passivos, caracterizados na formalização da exigência, todos deverão ser cientificados do auto de infração ou da notificação de lançamento, com abertura de prazo para que cada um deles apresente impugnação.

§ 4o Na hipótese do § 3o, o prazo para impugnação é contado, para cada sujeito passivo, a partir da data em que cada um deles tiver sido cientificado do lançamento.

Atualmente, portanto, os prazos são contados individualmente.

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11. As súmulas dos antigos Conselhos de Contribuintes e do atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF

As súmulas do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais são, hoje, importantes fontes do processo administrativo fiscal. É que a teor do caput do artigo 72 do Anexo II da Portaria MF n.o 353, de 09/06/2015, são elas de observância obrigatória pelos membros do CARF. Ou seja, tais questões, quando levadas à segunda instância do contencioso administrativo fiscal federal, já terão entendimento vinculante para todo o CARF. Ademais, o Ministro de Estado da Fazenda poderá, em razão do artigo 75 do Anexo II da Portaria MF n.o 353, de 09/06/2015, atribuir às mesmas súmulas do CARF efeito vinculante em relação à toda administração tributária federal, tornando as obrigatórias, portanto, para todas as áreas que compõem a Receita Federal do Brasil. Tal amplo efeito vinculante, aliás, já foi firmado pelo Ministro da Fazenda (hoje Ministro da Economia) para algumas das súmulas do CARF abaixo transcritas (tais súmulas estão destacadas na listagem abaixo).

Também as súmulas aprovadas pelos antigos Primeiro, Segundo e Terceiro Conselhos de Contribuintes são de adoção obrigatória pelos membros do CARF, como disposto no parágrafo 4.o do artigo 72 do Anexo II da Portaria MF n.o 353, de 09/06/2015. Por esta razão, também estas súmulas, consolidadas que foram na Portaria CARF n.o 106/2009 (anexo II), aparecem listadas depois das súmulas do CARF.

Adverte se que estão listadas abaixo, apenas aquelas súmulas que tenham alguma relação, direta ou indireta, com o processo administrativo fiscal.

SÚMULAS DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS - CARF

Observação: as súmulas vinculantes para toda a administração tributária federal estão acompanhadas desta informação. As demais vinculam apenas os órgãos julgadores do CARF.

Súmula CARF n.o 1 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

Importa renúncia às instâncias administrativas a propositura pelo sujeito passivo de ação judicial por qualquer modalidade processual, antes ou depois do lançamento de ofício, com o mesmo objeto do processo administrativo, sendo cabível apenas a apreciação, pelo órgão de julgamento administrativo, de matéria distinta da constante do processo judicial.

Súmula CARF n.o 2: O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária.

Súmula CARF n.o 6 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

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É legítima a lavratura de auto de infração no local em que foi constatada a infração, ainda que fora do estabelecimento do contribuinte.

Súmula CARF n.o 7 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A ausência da indicação da data e da hora de lavratura do auto de infração não invalida o lançamento de ofício quando suprida pela data da ciência.

Súmula CARF n.o 8 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

O Auditor Fiscal da Receita Federal é competente para proceder ao exame da escrita fiscal da pessoa jurídica, não lhe sendo exigida a habilitação profissional de contador.

Súmula CARF n.o 9 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

É válida a ciência da notificação por via postal realizada no domicílio fiscal eleito pelo contribuinte, confirmada com a assinatura do recebedor da correspondência, ainda que este não seja o representante legal do destinatário.

Súmula CARF n.o 10 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010): O prazo decadencial para constituição do crédito tributário relativo ao lucro inflacionário diferido é contado do período de apuração de sua efetiva realização ou do período em que, em face da legislação, deveria ter sido realizado, ainda que em percentuais mínimos.

Súmula CARF n.o 11 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal.

Súmula CARF n.o 17 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010):

Não cabe a exigência de multa de ofício nos lançamentos efetuados para prevenir a decadência, quando a exigibilidade estiver suspensa na forma dos incisos IV ou V do art. 151 do CTN e a suspensão do débito tenha ocorrido antes do início de qualquer procedimento de ofício a ele relativo.

Súmula CARF n.º 14:

A simples apuração de omissão de receita ou de rendimentos, por si só, não autoriza a qualificação da multa de ofício, sendo necessária a comprovação do evidente intuito de fraude do sujeito passivo.

Súmula CARF n.° 17 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010):

Não cabe a exigência de multa de ofício nos lançamentos efetuados para prevenir a decadência, quando a exigibilidade estiver suspensa na forma dos incisos IV ou V do art. 151 do CTN e a suspensão do débito tenha ocorrido antes do início de qualquer procedimento de ofício a ele relativo.

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Súmula CARF n.o 21 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010):

É nula, por vício formal, a notificação de lançamento que não contenha a identificação da autoridade que a expediu.

Súmula CARF n.o 22 (súmula revisada conforme Ata da Sessão Extraordinária de 03/09/2018, DOU de 11/09/2018 - súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019): É nulo o ato declaratório de exclusão do Simples Federal, instituído pela Lei n.º 9.317, de 1996, que se limite a consignar a existência de pendências perante a Dívida Ativa da União ou do INSS, sem a indicação dos débitos inscritos cuja exigibilidade não esteja suspensa.

Súmula CARF n.o 23 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A autoridade administrativa pode rever o Valor da Terra Nua mínimo (VTNm) que vier a ser questionado pelo contribuinte do imposto sobre a propriedade territorial rural (ITR) relativo aos exercícios de 1994 a 1996, mediante a apresentação de laudo técnico de avaliação do imóvel, emitido por entidade de reconhecida capacidade técnica ou por profissional devidamente habilitado, que se reporte à época do fato gerador e demonstre, de forma inequívoca, a legitimidade da alteração pretendida, inclusive com a indicação das fontes pesquisadas.

Súmula CARF n.o 24 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Não compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil promover a restituição de obrigações da Eletrobrás nem sua compensação com débitos tributários.

Súmula CARF n.o 25 (súmula vinculante para toda a administração t ributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010):

A presunção legal de omissão de receita ou de rendimentos, por si só, não autoriza a qualificação da multa de ofício, sendo necessária a comprovação de uma das hipóteses dos arts. 71, 72 e 73 da Lei n° 4.502/64.

Súmula CARF n.o 26 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A presunção estabelecida no art. 42 da Lei N. o 9.430/96 dispensa o Fisco de comprovar o consumo da renda representada pelos depósitos bancários sem origem comprovada.

Súmula CARF n.o 27 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

É válido o lançamento formalizado por Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil de jurisdição diversa da do domicílio tributário do sujeito passivo.

Súmula CARF n.o 28 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010):

O CARF não é competente para se pronunciar sobre controvérsias referentes a Processo Administrativo de Representação Fiscal para Fins Penais.

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Súmula CARF n.o 29 (súmula revisada conforme Ata da Sessão Extraordinária de 03/09/2018, DOU de 11/09/2018 - súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019): Os co-titulares da conta bancária que apresentem declaração de rendimentos em separado devem ser intimados para comprovar a origem dos depósitos nela efetuados, na fase que precede à lavratura do auto de infração com base na presunção legal de omissão de receitas ou rendimentos, sob pena de exclusão, da base de cálculo do lançamento, dos valores referentes às contas conjuntas em relação às quais não se intimou todos os co titulares.

Súmula CARF n.o 30 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Na tributação da omissão de rendimentos ou receitas caracterizada por depósitos bancários com origem não comprovada, os depósitos de um mês não servem para comprovar a origem de depósitos havidos em meses subsequentes.

Súmula CARF n.o 31 (súmula revisada conforme Ata da Sessão Extraordinária de 03/09/2018, DOU de 11/09/2018 - súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019): Descabe a cobrança de multa de ofício isolada exigida sobre os valores de tributos recolhidos extemporaneamente, sem o acréscimo da multa de mora, antes do início do procedimento fiscal.

Súmula CARF n.o 32 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A titularidade dos depósitos bancários pertence às pessoas indicadas nos dados cadastrais, salvo quando comprovado com documentação hábil e idônea o uso da conta por terceiros.

Súmula CARF n.o 33 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A declaração entregue após o início do procedimento fiscal não produz quaisquer efeitos sobre o lançamento de ofício.

Súmula CARF n.o 34 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010): Nos lançamentos em que se apura omissão de receita ou rendimentos, decorrente de depósitos bancários de origem não comprovada, é cabível a qualificação da multa de ofício, quando constatada a movimentação de recursos em contas bancárias de interpostas pessoas.

Súmula CARF n.o 35 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010):

O art. 11, § 3º, da Lei N. o 9.311/96, com a redação dada pela Lei N. o 10.174/2001, que autoriza o uso de informações da CPMF para a constituição do crédito tributário de outros tributos, aplica se retroativamente.

Súmula CARF n.o 36 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010):

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A inobservância do limite legal de trinta por cento para compensação de prejuízos fiscais ou bases negativas da CSLL, quando comprovado pelo sujeito passivo que o tributo que deixou de ser pago em razão dessas compensações o foi em período posterior, caracteriza postergação do pagamento do IRPJ ou da CSLL, o que implica em excluir da exigência a parcela paga posteriormente.

Súmula CARF n.o 37 (súmula revisada conforme Ata da Sessão Extraordinária de 03/09/2018, DOU de 11/09/2018 - súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019): Para fins de deferimento do Pedido de Revisão de Ordem de Incentivos Fiscais (PERC), a exigência de comprovação de regularidade fiscal deve se ater aos débitos existentes até a data de entrega da declaração de Rendimentos da Pessoa Jurídica na qual se deu a opção pelo incentivo, admitindo se a prova da regularidade em qualquer momento do processo administrativo, independentemente da época em que tenha ocorrido a regularização, e inclusive mediante apresentação de certidão de regularidade posterior à data da opção.

Súmula CARF n.o 40 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A apresentação de recibo emitido por profissional para o qual haja Súmula Administrativa de Documentação Tributariamente Ineficaz, desacompanhado de elementos de prova da efetividade dos serviços e do correspondente pagamento, impede a dedução a título de despesas médicas e enseja a qualificação da multa de ofício.

Súmula CARF n.o 41 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A não apresentação do Ato Declaratório Ambiental (ADA) emitido pelo IBAMA, ou órgão conveniado, não pode motivar o lançamento de ofício relativo a fatos geradores ocorridos até o exercício de 2000.

Súmula CARF n.o 44 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 383, de 12/07/2010): Descabe a aplicação da multa por falta ou atraso na entrega da Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, quando o sócio ou titular de pessoa jurídica inapta não se enquadre nas demais hipóteses de obrigatoriedade de apresentação dessa declaração.

Súmula CARF n.o 46 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): O lançamento de ofício pode ser realizado sem prévia intimação ao sujeito passivo, nos casos em que o Fisco dispuser de elementos suficientes à constituição do crédito tributário.

Súmula CARF n.º 47 (Súmula revogada pela Portaria CARF n.o 72, de 17/10/2017): Cabível a imputação da multa de ofício à sucessora, por infração cometida pela sucedida, quando provado que as sociedades estavam sob controle comum ou pertenciam ao mesmo grupo econômico. (Revogada pela Portaria CARF n.o 72, de 17/10/2017)

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Súmula CARF n.º 48 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A suspensão da exigibilidade do crédito tributário por força de medida judicial não impede a lavratura de auto de infração.

Súmula CARF n.º 49 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): A denúncia espontânea (art. 138 do Código Tributário Nacional) não alcança a penalidade decorrente do atraso na entrega de declaração.

Súmula CARF n.º 50 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): É cabível a exigência de multa de ofício se a decisão judicial que suspendia a exigibilidade do crédito tributário perdeu os efeitos antes da lavratura do auto de infração.

Súmula CARF n.º 51 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): As multas previstas no Código de Defesa do Consumidor não se aplicam às relações de natureza tributária.

Súmula CARF n.º 52:

Os tributos objeto de compensação indevida formalizada em Pedido de Compensação ou Declaração de Compensação apresentada até 31/10/2003, quando não exigíveis a partir de DCTF, ensejam o lançamento de ofício.

Súmula CARF n.º 59 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A tributação do lucro na sistemática do lucro arbitrado não é invalidada pela apresentação, posterior ao lançamento, de livros e documentos imprescindíveis para a apuração do crédito tributário que, após regular intimação, deixaram de ser exibidos durante o procedimento fiscal.

Súmula CARF n.º 65: Inaplicável a responsabilidade pessoal do dirigente de órgão público pelo descumprimento de obrigações acessórias, no âmbito previdenciário, constatadas na pessoa jurídica de direito público que dirige.

Súmula CARF n.º 66 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Os Órgãos da Administração Pública não respondem solidariamente por créditos previdenciários das empresas contratadas para prestação de serviços de construção civil, reforma e acréscimo, desde que a empresa construtora tenha assumido a responsabilidade direta e total pela obra ou repasse o contrato integralmente.

Súmula CARF n.º 67 (súmula revisada conforme Ata da Sessão Extraordinária de 03/09/2018, DOU de 11/09/2018 - súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019):

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Em apuração de acréscimo patrimonial a descoberto a partir de fluxo de caixa que confronta origens e aplicações de recursos, os saques ou transferências bancárias, registrados em extratos bancários, quando não comprovada a destinação, efetividade da despesa, aplicação ou consumo, não podem lastrear lançamento fiscal.

Súmula CARF n.º 71 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Todos os arrolados como responsáveis tributários na autuação são parte legítima para impugnar e recorrer acerca da exigência do crédito tributário e do respectivo vínculo de responsabilidade.

Súmula CARF n.º 72 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Caracterizada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação, a contagem do prazo decadencial rege se pelo art. 173, inciso I, do CTN.

Súmula CARF n.º 73: Erro no preenchimento da declaração de ajuste do imposto de renda, causado por informações erradas, prestadas pela fonte pagadora, não autoriza o lançamento de multa de ofício.

Súmula CARF n.º 75 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A recuperação da espontaneidade do sujeito passivo em razão da inoperância da autoridade fiscal por prazo superior a sessenta dias aplica se retroativamente, alcançando os atos por ele praticados no decurso desse prazo.

Súmula CARF n.º 76 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Na determinação dos valores a serem lançados de ofício para cada tributo, após a exclusão do Simples, devem ser deduzidos eventuais recolhimentos da mesma natureza efetuados nessa sistemática, observando se os percentuais previstos em lei sobre o montante pago de forma unificada.

Súmula CARF n.º 77 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A possibilidade de discussão administrativa do Ato Declaratório Executivo (ADE) de exclusão do Simples não impede o lançamento de ofício dos créditos tributários devidos em face da exclusão.

Súmula CARF n.º 78 (súmula revisada conforme Ata da Sessão Extraordinária de 03/09/2018, DOU de 11/09/2018 - súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019):

A fixação do termo inicial da contagem do prazo decadencial, na hipótese de lançamento sobre lucros disponibilizados no exterior, deve levar em consideração a data em que se considera ocorrida a disponibilização, e não a data do auferimento dos lucros pela empresa sediada no exterior.

128

Súmula CARF n.º 81 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): É vedada a aplicação retroativa de lei que admite atividade anteriormente impeditiva ao ingresso na sistemática do Simples.

Súmula CARF n.º 82 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Após o encerramento do ano calendário, é incabível lançamento de ofício de IRPJ ou CSLL para exigir estimativas não recolhidas.

Súmula CARF n.º 86 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): É vedada a retificação da Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física que tenha por objeto a troca de forma de tributação dos rendimentos após o prazo previsto para a sua entrega.

Súmula CARF n.º 88 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A Relação de Co Responsáveis - CORESP”, o “Relatório de Representantes Legais –RepLeg” e a “Relação de Vínculos – VÍNCULOS”, anexos a auto de infração previdenciário lavrado unicamente contra pessoa jurídica, não atribuem responsabilidade tributária às pessoas ali indicadas nem comportam discussão no âmbito do contencioso administrativo fiscal federal, tendo finalidade meramente informativa.

Súmula CARF n.º 91 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

Ao pedido de restituição pleiteado administrativamente antes de 9 de junho de 2005, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, aplica se o prazo prescricional de 10 (dez) anos, contado do fato gerador.

Súmula CARF n.º 92:

A DIPJ, desde a sua instituição, não constitui confissão de dívida, nem instrumento hábil e suficiente para a exigência de crédito tributário nela informado.

Súmula CARF n.º 95 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

A presunção de omissão de receitas caracterizada pelo fornecimento de recursos de caixa à sociedade por administradores, sócios de sociedades de pessoas, ou pelo administrador da companhia, somente é elidida com a demonstração cumulativa da origem e da efetividade da entrega dos recursos.

Súmula CARF n.º 96:

A falta de apresentação de livros e documentos da escrituração não justifica, por si só, o agravamento da multa de oficio, quando essa omissão motivou o arbitramento dos lucros.

Súmula CARF n.º 97 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

129

O arbitramento do lucro em procedimento de ofício pode ser efetuado mediante a utilização de qualquer uma das alternativas de cálculo enumeradas no art. 51 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995, quando não conhecida a receita bruta.

Súmula CARF n.º 99: Para fins de aplicação da regra decadencial prevista no art. 150, § 4°, do CTN, para as contribuições previdenciárias, caracteriza pagamento antecipado o recolhimento, ainda que parcial, do valor considerado como devido pelo contribuinte na competência do fato gerador a que se referir a autuação, mesmo que não tenha sido incluída, na base de cálculo deste recolhimento, parcela relativa a rubrica especificamente exigida no auto de infração.

Súmula CARF n.º 100 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

O Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil tem competência para fiscalizar o cumprimento dos requisitos do regime de drawback na modalidade suspensão, aí compreendidos o lançamento do crédito tributário, sua exclusão em razão do reconhecimento de beneficio, e a verificação, a qualquer tempo, da regular observação, pela importadora, das condições fixadas na legislação pertinente.

Súmula CARF n.º 101(súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

Na hipótese de aplicação do art. 173, inciso I, do CTN, o termo inicial do prazo decadencial é o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado.

Súmula CARF n.º 102 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018):

É válida a decisão proferida por Delegacia da Receita Federal de Julgamento - DRJ de localidade diversa do domicílio fiscal do sujeito passivo.

Súmula CARF n.º 103: Para fins de conhecimento de recurso de ofício, aplica se o limite de alçada vigente na data de sua apreciação em segunda instância.

Súmula CARF n.º 104 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Lançamento de multa isolada por falta ou insuficiência de recolhimento de estimativa de IRPJ ou de CSLL submete se ao prazo decadencial previsto no art. 173, inciso I, do CTN.

Súmula CARF n.º 106 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria MF n.o 277, de 07/06/2018): Caracterizada a ocorrência de apropriação indébita de contribuições previdenciárias descontadas de segurados empregados e/ou contribuintes individuais, a contagem do prazo decadencial rege-se pelo art. 173, inciso I, do CTN.

Súmula CARF n.º 109 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

130

O órgão julgador administrativo não é competente para se pronunciar sobre controvérsias referentes a arrolamento de bens.

Súmula CARF n.º 110 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

No processo administrativo fiscal, é incabível a intimação dirigida ao endereço de advogado do sujeito passivo.

Súmula CARF n.º 111 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

O Mandado de Procedimento Fiscal supre a autorização, prevista no art. 906 do Decreto nº 3.000, de 1999, para reexame de período anteriormente fiscalizado.

Súmula CARF n.º 112 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

É nulo, por erro na identificação do sujeito passivo, o lançamento formalizado contra pessoa jurídica extinta por liquidação voluntária ocorrida e comunicada ao Fisco Federal antes da lavratura do auto de infração.

Súmula CARF n.º 113 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

A responsabilidade tributária do sucessor abrange, além dos tributos devidos pelo sucedido, as multas moratórias ou punitivas, desde que seu fato gerador tenha ocorrido até a data da sucessão, independentemente de esse crédito ser formalizado, por meio de lançamento de ofício, antes ou depois do evento sucessório.

Súmula CARF n.º 114 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

O Imposto de Renda incidente na fonte sobre pagamento a beneficiário não identificado, ou sem comprovação da operação ou da causa, submete-se ao prazo decadencial previsto no art. 173, I, do CTN.

Súmula CARF n.º 116 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

Para fins de contagem do prazo decadencial para a constituição de crédito tributário relativo a glosa de amortização de ágio na forma dos arts. 7º e 8º da Lei nº 9.532, de 1997, deve se levar em conta o período de sua repercussão na apuração do tributo em cobrança.

Súmula CARF n.º 120 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

131

Não é válida a intimação para comprovar a origem de depósitos bancários em cumprimento ao art. 42 da Lei nº 9.430, de 1996, quando dirigida ao espólio, relativamente aos fatos geradores ocorridos antes do falecimento do titular da conta bancária.

Súmula CARF n.º 123 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

Imposto de renda retido na fonte relativo a rendimentos sujeitos a ajuste anual caracteriza pagamento apto a atrair a aplicação da regra decadencial prevista no artigo 150, §4º, do Código Tributário Nacional.

Súmula CARF n.º 126 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019):

A denúncia espontânea não alcança as penalidades infligidas pelo descumprimento dos deveres instrumentais decorrentes da inobservância dos prazos fixados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil para prestação de informações à administração aduaneira, mesmo após o advento da nova redação do art. 102 do Decreto Lei nº 37, de 1966, dada pelo art. 40 da Lei nº 12.350, de 2010.

Súmula CARF n.º 129 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

Constatada irregularidade na representação processual, o sujeito passivo deve ser intimado a sanar o defeito antes da decisão acerca do conhecimento do recurso administrativo.

Súmula CARF n.º 130 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

A atribuição de responsabilidade a terceiros com fundamento no art. 135, inciso III, do CTN não exclui a pessoa jurídica do pólo passivo da obrigação tributária.

Súmula CARF n.º 132 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

No caso de lançamento de ofício sobre débito objeto de depósito judicial em montante parcial, a incidência de multa de ofício e de juros de mora atinge apenas o montante da dívida não abrangida pelo depósito.

Súmula CARF n.º 133:

A falta de atendimento a intimação para prestar esclarecimentos não justifica, por si só, o agravamento da multa de ofício, quando essa conduta motivou presunção de omissão de receitas ou de rendimentos.

Súmula CARF n.º 134 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

132

A simples existência, no contrato social, de atividade vedada ao Simples Federal não resulta na exclusão do contribuinte, sendo necessário que a fiscalização comprove a efetiva execução de tal atividade.

Súmula CARF n.º 135: A antecipação do recolhimento do IRPJ e da CSLL, por meio de estimativas mensais, caracteriza pagamento apto a atrair a aplicação da regra decadencial prevista no art. 150, §4º do CTN.

Súmula CARF n.º 138 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

Imposto de renda retido na fonte incidente sobre receitas auferidas por pessoa jurídica, sujeitas a apuração trimestral ou anual, caracteriza pagamento apto a atrair a aplicação da regra decadencial prevista no art. 150, §4º do CTN.

Súmula CARF n.º 140 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

Aplica se retroativamente o disposto no art. 11 da Lei nº 13.202, de 2015, no sentido de que os acordos e convenções internacionais celebrados pelo Governo da República Federativa do Brasil para evitar dupla tributação da renda abrangem a CSLL.

Súmula CARF n.º 143 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

A prova do imposto de renda retido na fonte deduzido pelo beneficiário na apuração do imposto de renda devido não se faz exclusivamente por meio do comprovante de retenção emitido em seu nome pela fonte pagadora dos rendimentos.

Súmula CARF n.º 144 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

A presunção legal de omissão de receitas com base na manutenção, no passivo, de obrigações cuja exigibilidade não seja comprovada (“passivo não comprovado”), caracteriza-se no momento do registro contábil do passivo, tributando se a irregularidade no período de apuração correspondente.

Súmula CARF n.º 145 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

A partir da 01/10/2002, a compensação de crédito de saldo negativo de IRPJ ou CSLL, ainda que com tributo de mesma espécie, deve ser promovida mediante apresentação de Declaração de Compensação - DCOMP.

Súmula CARF n.º 148 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

133

No caso de multa por descumprimento de obrigação acessória previdenciária, a aferição da decadência tem sempre como base o art. 173, I, do CTN, ainda que se verifique pagamento antecipado da obrigação principal correlata ou esta tenha sido fulminada pela decadência com base no art. 150, § 4º, do CTN.

Súmula CARF n.º 152 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

Os créditos relativos a tributos administrados pela Receita Federal do Brasil (RFB), reconhecidos por sentença judicial transitada em julgado que tenha permitido apenas a compensação com débitos de tributos da mesma espécie, podem ser compensados com débitos próprios relativos a quaisquer tributos administrados pela Receita Federal do Brasil, observada a legislação vigente por ocasião de sua realização.

Súmula CARF n.º 159 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 410, de 16/12/2020, DOU de 18/12/2020):

Não é necessária a realização de lançamento para glosa de ressarcimento de PIS/Pasep e Cofins não cumulativos, ainda que os ajustes se verifiquem na base de cálculo das contribuições.

Súmula CARF n.º 162 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

O direito ao contraditório e à ampla defesa somente se instaura com a apresentação de impugnação ao lançamento.

Súmula CARF n.º 163 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

O indeferimento fundamentado de requerimento de diligência ou perícia não configura cerceamento do direito de defesa, sendo facultado ao órgão julgador indeferir aquelas que considerar prescindíveis ou impraticáveis.

Súmula CARF n.º 164 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

A retificação de DCTF após a ciência do despacho decisório que indeferiu o pedido de restituição ou que não homologou a declaração de compensação é insuficiente para a comprovação do crédito, sendo indispensável a comprovação do erro em que se fundamenta a retificação.

Súmula CARF n.º 165 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

Não é nulo o lançamento de ofício referente a crédito tributário depositado judicialmente, realizado para fins de prevenção da decadência, com reconhecimento da suspensão de sua exigibilidade e sem a aplicação de penalidade ao sujeito passivo.

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Súmula CARF n.º 166 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

Inexiste vedação legal à aplicação de juros de mora na constituição de crédito tributário em face de entidade submetida ao regime de liquidação extrajudicial.

Súmula CARF n.º 167 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

O art. 76, inciso II, alínea "a" da Lei nº 4.502, de 1964, deve ser interpretado em conformidade com o art. 100, inciso II do CTN, e, inexistindo lei que atribua eficácia normativa a decisões proferidas no âmbito do processo administrativo fiscal federal, a observância destas pelo sujeito passivo não exclui a aplicação de penalidades.

Súmula CARF n.º 168 (aprovada pelo Pleno em sessão de 06/08/2021 – vigência em 16/08/2021):

Mesmo após a ciência do despacho decisório, a comprovação de inexatidão material no preenchimento da DCOMP permite retomar a análise do direito creditório.

Súmula CARF n.º 169 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

O art. 24 do decreto lei nº 4.657, de 1942 (LINDB), incluído pela lei nº 13.655, de 2018, não se aplica ao processo administrativo fiscal.

Súmula CARF n.º 170 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

A homologação tácita não se aplica a pedido de compensação de débito de um sujeito passivo com crédito de outro.

Súmula CARF n.º 171 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

Irregularidade na emissão, alteração ou prorrogação do MPF não acarreta a nulidade do lançamento.

Súmula CARF n.º 172 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

A pessoa indicada no lançamento na qualidade de contribuinte não possui legitimidade para questionar a responsabilidade imputada a terceiros pelo crédito tributário lançado.

Súmula CARF n.º 173 (aprovada pelo Pleno em sessão de 06/08/2021 – vigência em 16/08/2021):

A intimação por edital realizada a partir da vigência da Lei nº 11.196, de 2005, é válida quando houver demonstração de que foi improfícua a intimação por qualquer um dos

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meios ordinários (pessoal, postal ou eletrônico) ou quando, após a vigência da Medida Provisória nº 449, de 2008, convertida na Lei nº 11.941, de 2009, o sujeito passivo tiver sua inscrição declarada inapta perante o cadastro fiscal.

Súmula CARF n.º 174 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

Lançamento de multa por descumprimento de obrigação acessória submete se ao prazo decadencial previsto no art. 173, inciso I, do CTN.

Súmula CARF n.º 175 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

É possível a análise de indébito correspondente a tributos incidentes sobre o lucro sob a natureza de saldo negativo se o sujeito passivo demonstrar, mesmo depois do despacho decisório de não homologação, que errou ao preencher a Declaração de Compensação –DCOMP e informou como crédito pagamento indevido ou a maior de estimativa integrante daquele saldo negativo.

Súmula CARF n.º 177 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

Estimativas compensadas e confessadas mediante Declaração de Compensação (DCOMP) integram o saldo negativo de IRPJ ou CSLL ainda que não homologadas ou pendentes de homologação.

Súmula CARF n.º 180 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

Para fins de comprovação de despesas médicas, a apresentação de recibos não exclui a possibilidade de exigência de elementos comprobatórios adicionais.

Súmula CARF n.º 181 (aprovada pela 2.ª Turma da CSRF em sessão de 06/08/2021 –vigência em 16/08/2021):

No âmbito das contribuições previdenciárias, é incabível lançamento por descumprimento de obrigação acessória, relacionada à apresentação de informações e documentos exigidos, ainda que em meio digital, com fulcro no caput e parágrafos dos artigos 11 e 12, da Lei nº 8.218, de 1991.

Súmula CARF n.º 184 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

O prazo decadencial para aplicação de penalidade por infração aduaneira é de 5 (cinco) anos contados da data da infração, nos termos dos artigos 138 e 139, ambos do Decreto Lei n.º 37/66 e do artigo 753 do Decreto n.º 6.759/2009.

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Súmula CARF n.º 186 (súmula vinculante para toda a administração tributária federal, em razão da ordem ministerial constante da Portaria ME n.o 12.975, de 10/11/2021, DOU de 11/11/2021):

A retificação de informações tempestivamente prestadas não configura a infração descrita no artigo 107, inciso IV, alínea “e” do Decreto-Lei nº 37/66.

SÚMULAS DOS ANTIGOS CONSELHOS DE CONTRIBUINTES

Súmulas 1 do 1º e 2º CC: Importa renúncia às instâncias administrativas a propositura pelo sujeito passivo de ação judicial por qualquer modalidade processual, antes ou depois do lançamento de ofício, com o mesmo objeto do processo administrativo, sendo cabível apenas a apreciação, pelo órgão de julgamento administrativo, de matéria distinta da constante do processo judicial.

Súmulas 2 do 1º e 2º CC: O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária.

Súmulas 4 do 1º e 3º CC e 3 do 2º CC: A partir de 1º de abril de 1995, os juros moratórios incidentes sobre débitos tributários administrados pela Secretaria da Receita Federal são devidos, no período de inadimplência, à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC para títulos federais.

Súmulas 5 do 1º CC e 7 do 3º CC: São devidos juros de mora sobre o crédito tributário não integralmente pago no vencimento, ainda que suspensa sua exigibilidade, salvo quando existir depósito no montante integral.

Súmulas 6 do 1º CC e 4 do 2º CC: É legítima a lavratura de auto de infração no local em que foi constatada a infração, ainda que fora do estabelecimento do contribuinte.

Súmula 7 do 1º CC: A ausência da indicação da data e da hora de lavratura do auto de infração não invalida o lançamento de ofício quando suprida pela data da ciência.

Súmula 8 do 1º CC e 5 do 2º CC: O Auditor Fiscal da Receita Federal é competente para proceder ao exame da escrita fiscal da pessoa jurídica, não lhe sendo exigida a habilitação profissional de contador.

Súmula 9 do 1º CC e 6 do 2º CC:

É válida a ciência da notificação por via postal realizada no domicílio fiscal eleito pelo contribuinte, confirmada com a assinatura do recebedor da correspondência, ainda que este não seja o representante legal do destinatário.

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Súmula 10 do 1º CC: O prazo decadencial para constituição do crédito tributário relativo ao lucro inflacionário diferido é contado do período de apuração de sua efetiva realização ou do período em que, em face da legislação, deveria ter sido realizado, ainda que em percentuais mínimos.

Súmulas 11 do 1º CC e 7 do 2º CC: Não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal.

Súmula 12 do 1º CC: Constatada a omissão de rendimentos sujeitos à incidência do imposto de renda na declaração de ajuste anual, é legítima a constituição do crédito tributário na pessoa física do beneficiário, ainda que a fonte pagadora não tenha procedido à respectiva retenção.

Súmula 14 do 1º CC: A simples apuração de omissão de receita ou de rendimentos, por si só, não autoriza a qualificação da multa de ofício, sendo necessária a comprovação do evidente intuito de fraude do sujeito passivo.

Súmula 9 do 2º CC: Não cabe a exigência de multa de ofício nos lançamentos efetuados para prevenir a decadência, quando a exigibilidade estiver suspensa na forma dos incisos IV ou V do art. 151 do CTN e a suspensão do débito tenha ocorrido antes do início de qualquer procedimento de ofício a ele relativo.

Súmula 1 do 3º CC: É nula, por vício formal, a notificação de lançamento que não contenha a identificação da autoridade que a expediu.

Súmula 2 do 3º CC: É nulo o ato declaratório de exclusão do Simples que se limite a consignar a existência de pendências perante a Dívida Ativa da União ou do INSS, sem a indicação dos débitos inscritos cuja exigibilidade não esteja suspensa.

Súmula 3 do 3º CC: A autoridade administrativa pode rever o Valor da Terra Nua mínimo (VTNm) que vier a ser questionado pelo contribuinte do imposto sobre a propriedade territorial rural (ITR) relativo aos exercícios de 1994 a 1996, mediante a apresentação de laudo técnico de avaliação do imóvel, emitido por entidade de reconhecida capacidade técnica ou por profissional devidamente habilitado, que se reporte à época do fato gerador e demonstre, de forma inequívoca, a legitimidade da alteração pretendida, inclusive com a indicação das fontes pesquisadas.

Súmula 6 do 3º CC: Não compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil promover a restituição de obrigações da Eletrobrás nem sua compensação com débitos tributários.

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12. Principais

Atos Legais Reguladores do

PAF

O processo administrativo fiscal é regido por vasto arsenal legal. Pode se dizer que a regra, hoje, é a da processualização da atividade administrativa; poucas são as rotinas executadas ao desabrigo de estrito disciplinamento em atos legais. Os principais atos legais a disciplinar os ritos, rotinas, competências e jurisdições em sede do PAF são os seguintes:

Decreto n.º 70.235, de 06/03/1972: rege o processo administrativo de determinação e exigência dos créditos tributários da União (com alterações, em especial, da Lei n.º 8.748/1993, da Lei n.º 9.532/1997, da Medida Provisória n.º 2.158 35/2001 e da Lei n.º 11.941/2009).

Decreto n.º 7.574, de 06/03/1972: regulamenta o processo de determinação e exigência de créditos tributários da União, o processo de consulta sobre a aplicação da legislação tributária federal e outros processos que especifica, sobre matérias administradas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Lei n.º 9.784, de 29/01/1999: disciplina o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal (alterações trazidas pela Lei n.º 11.417, de 19/12/2006).

Portaria MF n.º 343, de 09/06/2015: aprova o Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF (alterações trazidas pelas Portarias MF n.o 39, de 12/02/2016, n.o 152, de 03/05/2016, n.o 169, de 10/05/2016, n.º 329, de 04/06/2017 e n.º 153, de 17/04/2018).

Instrução Normativa RFB n.º 1.396, de 16/09/2013: disciplina o processo de consulta acerca da interpretação da legislação tributária e aduaneira (alterações trazidas pelas Instruções Normativas RFB n.º 1.434, de 30/12/2013, n.º 1.567, de 05/06/2015, e n.º 1.689, de 20/02/2017).

Instrução Normativa RFB n.º 1.464, de 16/09/2013: disciplina o processo de consulta sobre classificação fiscal de mercadorias (alterações trazidas pelas Instruções Normativas RFB n.º 1.705, de 13/04/2017, e n.º 1.829, de 17/09/2018).

Portaria RFB n.º 6.478, de 29/12/2017: dispõe sobre o planejamento das atividades fiscais e estabelece normas para a execução de procedimentos fiscais relativos ao controle aduaneiro do comércio exterior e aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (disciplina o Termo de Distribuição de Procedimento Fiscal – TDPF, tendo revogado a Portaria RFB n.º 1.687, de 17/09/2014, que regulava originariamente a matéria).

Portaria ME n.º 284, de 27/07/2020: a prova o Regimento Interno da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil – RFB.

Lei n.o 11.457, de 16/03/2007: dispõe sobre a Administração Tributária Federal (unifica a SRF e a SRP, criando a Secretaria da Receita Federal do Brasil).

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Portaria ME n.º 340, de 08/10/2020: disciplina a constituição das Turmas e o funcionamento das Delegacias de Julgamento da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil – DRJs, e regulamenta o contencioso administrativo fiscal de pequeno valor

Portaria RFB n.º 999, de 19/07/2013: dispõe sobre critérios de prioridade para o julgamento de processos administrativos fiscais no âmbito das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (alterações trazidas pelas Portarias RFB n.º 1.892, de 30/12/2013, n.º 56, de 15/01/2014, e n.º 2.048, de 26/11/2014).

Portaria RFB n.º 4.086, de 28/07/2020: disciplina a competência por matéria das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (DRJ) e e define a atribuição para a identificação dos processos a serem distribuídos às DRJ.

Portaria RFB n.º 224, de 07/02/2019 (artigos 2.º-A e 2.º-B): dispõe sobre a competência para dirimir conflitos de competência ou de jurisdição entre unidades da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e relevação de penalidades (artigos 2.º-A e 2.º-B incluídos pela Portaria RFB n.º 841, de 08/05/2019) .

Portaria RFB n.º 1.936, de 06/12/2018: Dispõe sobre Consulta Interna, consulta à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, solução de conflitos de competência entre unidades descentralizadas, revisão de atos normativos elaborados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e sobre a realização de atividades em colaboração com a Coordenação Geral de Tributação pelas Divisões de Tributação das Superintendências Regionais da Receita Federal do Brasil e por Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (alterações trazidas pelas Portarias RFB n.º 2.132, de 27/12/2018, n.º 39, de 21/01/2019, n.º 1.234, de 16/07/2019, n.º 172, de 24/01/2020, e n.º 4.994, de 17/12/2020).

Portaria RFB n.º 2.724, de 27/09/2017: dispõe sobre a emissão de acórdãos sem ementas pelas Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (DRJ) resultantes de julgamento de processos administrativos fiscais que especificadispensa de elaboração de ementa nos acórdãos resultante de julgamento de processos fiscais que especifica

Portaria MF n.º 63, de 09/02/2017: estabelece limite para interposição de recurso de ofício pelas Turmas de Julgamento das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (DRJ).

Portaria RFB n.o 48, de 24/06/2021: dispõe sobre a formalização de processos relativos a tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil.

Instrução Normativa RFB n.º 1.717, de 17/07/2017 (retificada em 29/08/2017): estabelece normas sobre restituição, compensação, ressarcimento e reembolso, no âmbito da Secretaria da receita Federal do Brasil (alterações trazidas pelas Instruções Normativas RFB n.º 1.765, de 30/11/2017, n.º 1.769, de 18/12/2017, n.º 1.776, de 28/12/2017, n.º 1.810, de 13/06/2018, n.º 1.959, de 09/06/2020, e n.º 1.993, de 20/12/2020).

Portaria RFB n.º 1.750, de 12/11/2018: dispõe sobre representação fiscal para fins penais referente a crimes contra a ordem tributária, contra a Previdência Social, e de contrabando ou descaminho, sobre representação para fins penais referente a crimes contra a Administração Pública Federal, em detrimento da Fazenda Nacional ou contra administração pública estrangeira, de falsidade de títulos, papéis e documentos públicos e de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores, e sobre representação referente a atos de improbidade administrativa (revogou a Portaria RFB n.º 2.439, de 21/12/2010, que disciplinava anteriormente a matéria).

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Instrução Normativa RFB n.º 1.565, de 11/05/2015: estabelece procedimentos para o arrolamento de bens e direitos e propositura de medida cautelar fiscal (alterações trazidas pela Instrução Normativa RFB n.º 1.769, de 18/12/2017).

Lei Complementar n.º 105/2001: disciplina o acesso a informações sobre movimentação financeira e sigilo fiscal.

Lei Complementar n.º 104/2001: insere dispositivo no Código Tributário Nacional tratando da desconsideração de atos ou negócios jurídicos e traz exceções ao sigilo fiscal. Decreto n.o 3.724, de 10/01/2001: Regulamenta o art. 6o da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, relativamente à requisição, acesso e uso, pela Secretaria da Receita Federal, de informações referentes a operações e serviços das instituições financeiras e das entidades a elas equiparadas (alterações trazidas pelos Decretos n.o 6.104, de 30/04/2007, e n.º 8.303, de 04/09/2014).

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