Revista Raízes Jurídicas

Page 71

A conclusão a que chega provisoriamente Miguel Reale, que adiante se esboçará com a noção de “metafísica conjetural”, pressupôs uma questão levantada anteriormente, como dito, no livro Experiência e Cultura, dos anos setenta. Neste livro, Reale mostra suas bases filosóficas, em especial, a influência da fenomenologia das primeiras década do século passado. É em Husserl, Heidegger e Hartmann que Reale se sustenta para pensar a “experiência” como categoria filosófica. Miguel Reale acredita que a teoria do conhecimento se rompeu à medida que houve o desdobramento das ciências positivas. A singularização promovida pelo saber científico especializou o conhecimento sobre a mesma e única realidade, o que, por certo, provocou a perda da totalidade do saber. O empobrecimento cultural se atrelou inevitavelmente às visões reducionistas das ciências. O desconforto realeano se concentra no fato destas ciências, essencialmente gnoseológicas, terem reduzido a teoria do conhecimento à epistemologia, e, conseqüentemente, à leitura tecnicista e progressional do mundo. Por essa razão, o julsfilósofo vai em busca de uma teoria globalizante, capaz de cobrir possíveis experiências distintas, eis porque, uma espécie de “teoria geral da experiência”. Para construí-la, Reale demonstra na história da filosofia, que as teorias se concentraram no tempo em duas matrizes distintas e opostas: a) perspectiva ontológica, centrada no objeto; b) gnoseológica, centrada no sujeito, ou, como prefere Reale, transcendente e transcendental. Porém, todas acabam por se distanciar da realidade. A única maneira de compor a realidade teoricamente é através de uma “ontognoseologia”.3 À medida que concilia sujeito-objeto, a ontognoseologia evitar fugir a conceitos sem base exclusivamente empírica ou mesmo a construções teóricas eminentemente abstratas, como a ética. O conceito de “experiência estaria apto a abarcar todas as manifestações da vida humana, conciliando valores e ciência. Por isso, o seu conceito é multifário, e, inevitavelmente, comporta uma perspectiva dialética.4 Todavia, apesar de forte influência de Hegel em Reale, a sua compreensão da dialética dele se distancia, ao trabalhar com uma “dialética da complementariedade”, pois nenhum dos pólos se reúne ou se sintetiza (não há superação - Aufhebung). Trata-se de uma relação “implicação-polaridade 3

LOSANO, Mario. Storia contemporanea del diritto e sociologia giuridica. Milano: Franco Angeli, 1997, p. 71 e segs. 4 REALE, Miguel. Conjeturas da experiência jurídica. In Fontes e modelos do direito: para um novo paradigma hermenêutico, São Paulo, Saraiva, 1998, p. 131 a 162.

70 RAÍZES JURÍDICAS Curitiba, v. 6, n. 2 jul/dez 2010


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.