Pietro Ubaldi - 04 - Ascese Mística

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Pietro Ubaldi

ASCESE MÍSTICA

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espiritual no seu ponto mais intenso e central, para onde convergem todos os impulsos, no momento mais notável de sua transformação, quando juntam-se e fundem-se todas as forças, coexistem todos os elementos e surge a última síntese, na qual o fenômeno se precipita em novos equilíbrios e se transmuda em novas orientações. Estamos no centro do drama. A vida é uma viagem, e eu sou um peregrino; serei sempre encontrado a caminhar. O meu último volume viveu e foi superado; minha alma não ficou saciada. Disse: ainda, ainda, quero subir ainda. E andei mais um ano, por um novo sulco, diferente do velho sulco traçado. Alinham-se assim os volumes, seguindo as etapas do meu cansaço. Caminho, caminho pela infinita estrada da vida. Como é grande a dor, como é espantoso o conhecimento e infinito o universo; parece que jamais conseguiremos chegar! E no fim está o abraço da morte irmã. Vai-se exausto de forças, carregado do pó da viagem, pesado de lama, de lágrimas e de sangue. Quanto trabalho para atravessar a vida! Em nenhum ponto se sabe como a alma pôde arrastar-se até lá. À espera do abraço da irmã morte, a dor chama e martela. O leitor não sabe quanto sofrimento humano condiciona certos triunfos do espírito. Estou frequentemente muito cansado. Sinto-me culpado e abatido. Esta minha pobre irmã carne chora abafada, já sem coragem para protestar. Pobrezinha! Ela sabe, porém, que o seu sacrifício era necessário para a afirmação de uma vida mais alta. Ofereceu-se e recua hoje, humanamente doente, sem um lamento. Pobre irmã, obrigado por teu pequeno heroísmo. Ela o compreendeu. Ensinei-lhe, dia a dia, que ela não podia ser um fim, mas apenas um meio. E ela disse ao meu espírito: “Vive tu, então, que vales mais”. Há tempos, pedi ao meu corpo que se oferecesse em holocausto, e ele me respondeu: “Toma-me”. E ele é agora tão distinto e afastado de mim, que o considero como uma outra criatura que amo, porque à sua imolação devo a verdadeira vida. É justo que o menor se sacrifique ao maior. A minha piedade deixa-o morrer tranquilamente. A dor bate, martela, consome e reedifica. É um martelar rítmico, lacerante, que fere e desperta as profundezas. Esse martelar arranca de minha alma gritos que são a sua voz, uma voz que conta, com lógica e calma, uma história trágica e estranha, profunda e sublime – a história de uma alma que conIgualmente, as edições de Vozes, de Durval de Morais, inclusive em São Francisco de Assis – Escritos e biografias – Crônicas do 1o Século Franciscano, Vozes – Cefepal, 1981 – assinalam o Cap. XXVI. (N. do T.) 30 As Noúres, Cap. IV – Os Grandes Inspirados. (N. do A.)


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