Krishnamurti - Seleta - Conceitos Preliminares - 2 parte

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KRISHNAMURTI

SELETA CONCEITOS PRELIMINARES 2ยบ PARTE UNIVERSALISMO


ÍNDICE

1.

EXPERIMENTAÇÃO DIVINA; INSONDÁVEL PELA MENTE, CRENÇA

2.

ALMA, SENTIMENTO, INTELECTO, VIDA, DESEJO, TEMPORAL

3.

O “EU”; NATUREZA PSICOLÓGICA, ATIVIDADES ABRANGIDAS

4.

CONSCIÊNCIA, UNIDADE, EGO, SUPEREGO, CONFORME O AUTOR

5.

CONSCIENTE, SUBCONSCIENTE, INCONSCIENTE, CAMADAS

6.

INCONSCIENTE COLETIVO; CONSCIÊNCIA DA HUMANIDADE

7.

ESPÍRITO-MENTE, ATEMPORAL, VIDA, AMOR, VONTADE (ETERNA)

8.

INTELIGÊNCIA, DISCERNIMENTO, PERCEBIMENTO, CONCEITOS

9.

SENTIMENTO, SENSAÇÃO, DISTINÇÃO; SENSIBILIDADE

10.

AMOR; NÃO É EMOÇÃO, PRAZER, SENTIMENTALISMO

11.

FRATERNIDADE, BENEVOLÊNCIA, COMPAIXÃO, PERDÃO

12.

CHAMA SEM FUMAÇA, VIRTUDES (AMOR), PAIXÃO SEM CAUSA

13. PENSAMENTO, SENTIMENTO, AÇÃO; HARMONIA, AÇÃO INTEGRADA 14.

INTUIÇÃO (INSIGHT); VERDADEIRA, FALSA, IMPULSO

15.

PROGRESSO; RELATIVO NA ALMA, NÃO OCORRE NO ESPÍRITO

16.

ORDEM, DESORDEM DO PENSAMENTO; FATORES, EFEITOS

17.

FRAGMENTAÇÃO DA CONSCIÊNCIA; DESVIOS, NEUROSES

18.

VISÃO GLOBAL, HOLÍSTICA, DA CONSCIÊNCIA, DA VIDA


1. EXPERIMENTAÇÃO DIVINA; INSONDÁVEL PELA MENTE, CRENÇA

Pergunta: Como posso experimentar Deus em mim? Krishnamurti: Que entendemos por experiência? (…) Quando é que dizemos: “Tive uma experiência?” Dizemo-lo apenas quando reconhecemos a experiência, isto é, quando existe um experimentador separado da experiência. Isso significa que o nosso experimentar é um processo de reconhecimento e acumulação. (…) (Por que não te Satisfaz a Vida?, pág. 34) Só posso experimentar quando há o reconhecimento da experiência, e reconhecimento é recordação, memória; e a memória é, obviamente, o centro do “eu”. Isto é, todo processo de reconhecimento e de acumulação de experiência é o “eu”, e o “eu” diz, então: “tive uma experiência”. (…) (Idem, pág.34) Ora, o interrogante indaga: “Como posso experimentar Deus em mim?” Deus, a Realidade, (…) é coisa suscetível de experimentar-se, de reconhecer-se, de modo que se possa dizer: “Tive uma experiência de Deus”? Evidentemente, Deus é o desconhecido; Deus não pode ser conhecido. No momento em que o conheceis, já não é Deus; é algo autoprojetado, reconhecido, isto é, memória. É por isso que o crente nunca poderá conhecer Deus; e visto que a maioria de vós crê em Deus, jamais conhecereis a Deus, porque vossa própria crença volo impede. (…) (Idem, pág. 34-35) A crença é o resultado do conhecido. Podeis crer no desconhecido, mas tal crença nasceu do conhecido, é parte do conhecido, que é memória. (…) Por essa maneira, a memória cria o desconhecido, e passa a crer nele como um meio de experimentar o desconhecido. (Idem, pág. 35) Para que o desconhecido venha à existência, a mente precisa estar completamente vazia; não pode haver o experimentar da realidade, porque o experimentador é o “eu”, com todas as suas lembranças acumuladas, tanto conscientes como inconscientes. O “eu” (…) diz: “Estou experimentando”; mas aquilo que ele pode experimentar é apenas a sua própria projeção. O “eu” não pode experimentar o desconhecido; (…). (Idem, pág. 35-36)


Só uma mente livre pode conhecer “o que é” - essa coisa indescritível, que não pode ser expressa em palavras. (…) Descrevê-la significa cultivo da memória; significa verbalizá-la, situá-la no tempo; e o que é do tempo nunca pode ser o atemporal (Idem, pág. 36) O que importa, pois, não é o que credes ou o que descredes, mas, sim, o compreender o processo integral, o conteúdo total de vós mesmos; (…). Quando a mente está de todo tranqüila, quieta, sem senso de aceitação ou rejeição, (…) acumulação, quando existe esse estado de tranqüilidade, no qual o experimentador não existe - só então sentimos aquilo a que podemos chamar Deus (…) e há, nesse momento, um estado de criação, que não é expressão do “eu”. (Idem, pág. 36) (…) O passado é sempre o conhecido e o pensamento que está baseado no passado só pode criar o conhecido. Por conseguinte, pensar na Verdade é estar preso nas redes da ignorância. (…) A Verdade é um estado no qual deixou de existir a chamada atividade do pensamento. O pensar, como sabemos, é o resultado do processo do tempo, do passado, (…) da autoexpansão, (…) do mover-se do conhecido para o conhecido. (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 263-264) O que é conhecido não é Real. Nosso pensamento está ocupado numa constante busca de segurança, de certeza. A inteligência que promove a expansão do “ego” busca , por força de sua própria natureza, um refúgio, seja pela negação seja pela afirmação. Como pode a mente que está em busca de certeza, de estímulo, de animação, pensar naquilo que não tem limites? (…) (Idem, pág. 264) Pelo pensamento não se pode conceber o imensurável, porque o pensamento tem sempre medida. O sublime não está encerrado na estrutura do pensamento e da razão, nem tampouco é produto da emoção e do sentimento. A negação do pensamento é ação, (…) é amor. Se estais em busca do sublime, não o achareis; ele deverá vir a vós se tiverdes boa sorte e essa “boa sorte” é a janela aberta de vosso coração, e não do pensamento. (A Outra Margem do Caminho, pág. 56) Percebendo-se, pois, essa extraordinária complexidade, não acreditais necessário investigar se é possível chegarmos àquela revolução, (…) transformação interior, sem nenhuma interferência da mente? (…) Pode a mente transformar se? Sei que há momentos em que ela percebe a Realidade, que se manifesta sem ter sido chamada nem solicitada. Nesses momentos, a mente é o Real. (…) (Poder e Realização, pág. 71)


(…) Quando o “eu” já não está lutando, consciente ou inconscientemente, para tornar-se algo, quando o “eu” está de todo inconsciente de si mesmo, nesse momento se verifica aquele estado de devoção, (…) de Realidade. Nesse momento, a mente é o Real, é Deus. (Idem, pág. 71) Pode-se, pois, descobrir o que é criação, ou Deus (…)? (…) A criação liberta a mente da mediocridade (…). E, se é este o estado que procuro, necessito de visão muito clara, (…) significa que ela, a mente, deve achar-se totalmente tranqüila, para descobrir. Porque o estado criador não pode ser chamado; ele tem de vir por si. Deus não pode ser chamado; ele deve vir. Mas não virá se a mente não for livre. (…) (Idem, pág. 39-40) (…) Assim, Deus, ou a Verdade, (…) é uma coisa que vem à existência momento a momento, e que só acontece num estado de liberdade e espontaneidade, (…). Deus não é coisa da mente, não se manifesta por meio de autoprojeções; só vem quando há virtude, que é liberdade. Virtude é ver diretamente o fato como ele é, e o ver o fato é um estado de felicidade. Só quando a mente transborda de felicidade, quando está tranqüila, sem nenhum movimento próprio, (…) projeção do pensamento, consciente ou inconsciente só então desponta na existência o eterno. (Que Estamos Buscando?, 1ª ed., pág. 184) Agora, que é a realidade, (…) Deus? Deus não é a palavra, a palavra não é a coisa. Para conhecer aquilo que é imensurável, que não é do tempo, a mente deve estar livre do tempo, (…) de todo pensamento, (…) de todas as idéias relativas a Deus. Que sabeis de Deus ou da Verdade? Nada sabeis (…). Só conheceis palavras, experiências alheias, ou alguns momentos de experiências, um tanto vagas, de vós mesmos. (…) (Que Estamos Buscando?, 1ª ed., pág. 183) (…) O desconhecido não é algo que possa ser “experimentando” pela mente; só o silêncio pode ser “experimentado”, e nada mais (…). Se a mente “experimentar” qualquer coisa, menos o silêncio, está ela apenas projetando os seus próprios desejos, e essa mente não está silenciosa; (…) (Idem, pág. 184) (…) Assim, pois, para se encontrar o que é real, o que é Deus, (…) deve haver liberdade - precisamos estar livres do temor, (…) do desejo de segurança interior, (…) do medo ao desconhecido. E só então (…) estaremos aptos a “experimentar” o desconhecido, (…) e sabermos se existe Deus. Mas, se o homem que crê em Deus ou (…) não crê em Deus se atém a essa conclusão, fica (…) cativo da ilusão. Só posso conhecer aquela “coisa”, (…) compreendêla, experimentá-la diretamente, quando não sou egocêntrico, (…) não estou condicionado pela crença, pelo temor, pela avidez, pela inveja, etc. (Nós Somos o Problema, pág. 38-39)


O pensamento pode colocar-se, e com efeito se coloca, em níveis diferentes: o estúpido e o profundo, o nobre e o gentil e o ignóbil; mas isto é sempre pensamento (…). O Deus do pensamento é sempre um Deus da mente, da palavra. O pensar em Deus não é Deus, e sim mera reação da memória. (…) (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 168) A mente que desejar achar-se num estado em que possa manifestar se o novo - seja Deus, seja a Verdade, (…) essa mente, sem dúvida, deve cessar de adquirir, de acumular, deve pôr de parte todo o seu saber (…) (A Renovação da Mente, pág. 24) A Realidade, ou Deus, (…) não se alcança por meio de conflito. Pelo contrário, é imprescindível a extinção do “eu”, do centro de acumulação, (…). (Idem, pág. 25) O abandono da personalidade, do “eu”, não se dá por ato de vontade; a travessia para a outra margem não é uma atividade dirigida para um fim ou ganho. A Realidade apresenta se na plenitude do silêncio e da sabedoria. Não podeis chamar a Realidade, ela deverá vir por si mesma; não podeis escolher a Realidade, ela é que deverá escolher-vos. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 84-85) Dizeis, porventura, que desejais modificar-vos, mas alguma coisa há que impede a transformação. Explicações não alteram coisa alguma. Dizer que o “ego” é um obstáculo, é simples explicação, (…). Desejais que eu descreva a maneira de vencer os obstáculos; mas precisamos achar um meio de saltar a barreira; se possível, precisamos lançar-nos à corrente, ousadamente, aventurosamente, em vez de ficarmos sentados na margem a especular. (Que Estamos Buscando?, pág. 93) Que nos está impedindo de dar o salto? O que no-lo impede é a tradição, que é memória, que é experiência (…). Tanto nos satisfazemos com palavras, com explicações, que não damos o salto, mesmo percebendo a necessidade de saltar. Alvitra-se que não ousamos lançar-nos à corrente porque temos medo do desconhecido. Mas, é-me possível saber o que acontecerá, é-me possível conhecer o desconhecido? Se eu o conhecesse, não haveria então temor algum - e não seria o desconhecido. Nunca me será dado conhecer o desconhecido, se não me aventuro. (Idem, pág. 93-94) Será o temor que nos está impedindo de lançar-nos à aventura? Que é temor? Só pode haver temor em relação com alguma coisa, ele não existe em isolamento. Como posso temer a morte, (…) uma coisa que desconheço? Só posso temer o que conheço. Quando digo que temo a morte, estarei mesmo


com medo do desconhecido, ou estou com medo de perder o que me é conhecido? (…) (Idem, pág. 94)


2. ALMA, SENTIMENTO, INTELECTO, VIDA, DESEJO, TEMPORAL

Pergunta: Credes na alma? Krishnamurti: (…) Pois bem; existe alma? A alma como entidade espiritual, não? - ou como caráter? Senhores, que entendeis por “alma” (…)? Referis-vos à psique? Estamos perguntando (…) se a alma, a entidade psicológica, existe. Existe, evidentemente, (…). (O que te Fará Feliz, pág. 56- 57) Portanto, (…) Será realidade ou ilusão aquilo que se denomina alma, e será ela única? Existe ela separadamente e exerce a sua influência sobre o ser fisiológico ou psicológico? Chegaremos nós, pelo estudo dos tecidos e fluidos orgânicos, a saber o que é o pensamento, (…) a mente, a saber o que é essa consciência que jaz oculta na matéria viva? (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 12) Por essa razão deveis despertar, deveis abrir todas as janelas e portas de vossas almas e partir em busca da única Realidade da vida; e não vos deveis perder em tentativas febris e vãs, em corredores e becos escuros. (…) (O Reino da Felicidade, pág. 62) (…) Que temos em vista, quando falamos a respeito da alma? Referimo-nos a uma consciência limitada. Para mim, há somente a vida eterna - em contraste com essa consciência limitada que chamamos o “eu”. (…) (Palestras na Itália e Noruega, 1933, pág. 122) Enquanto houver tal consciência de separação, do “eu”, da personalidade, não pode existir a realização da verdade; (…). (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág.24) (…) Não é sempre a ação do “ego”, o sentimento do “meu”, um processo de limitação? Vamos averiguar se a expansão pessoal conduz à Realidade, ou se a Realidade só se manifesta depois de desaparecer a personalidade, o “ego”. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 187) (…) Qual o interesse que pomos em descobrir a verdade acerca da natureza e das atividades do “ego”, da personalidade? A meditação, a disciplina espiritual


nenhum significado tem se em primeiro lugar não estiver bem claro para nós esse ponto. (…) (Idem, pág. 195) Pergunta: Quereis dizer que inteligência e consciência individual são palavras sinônimas? Krishnamurti: A consciência é o resultado da continuidade identificada. A sensação, o sentimento, a racionalização e a continuidade da memória identificada constituem a consciência individual, (…) (Idem, pág. 216) O amor, é evidente, não é sentimento. Ser sentimental, ser emotivo, não significa ter amor, porque o sentimentalismo e a emoção são meras sensações. O indivíduo religioso que chora por causa de Jesus ou de Krishna (…) é apenas sentimental, emotivo. Está entregue à sensação, que é um processo do pensamento. (…) O sentimentalismo, a emotividade, são puras formas de auto-expansão. Estar cheio de emoção não significa ter amor, porque uma pessoa sentimental pode tornar-se cruel quando os seus sentimentos não são correspondidos, quando não consegue dar expansão aos seus sentimentos. (…) (Da Insatisfação à Felicidade, pág. 224) (…) Ficai cônscios do sentimento de vir a ser; com o sentimento vem a sensibilidade, a qual começa a revelar tudo quanto se contém no vir a ser. O sentimento é endurecido pelo intelecto e pelas numerosas e sutis racionalizações, (…). (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 43) Presentemente, a educação moderna está desenvolvendo o intelecto, oferecendo cada vez mais explicações da vida, teorias e mais teorias. (…) A mente - o intelecto - fica satisfeita com essas inúmeras explicações, mas a inteligência não, pois para entender tem de haver completa unidade da mente e do coração na ação. (Palestras na Itália e Noruega, 1933, pág. 125-126) O tempo, pois, é uma ilusão (…) O desejo tem tempo, a sensação tem tempo, mas o amor nada tem que ver com o tempo. O amor é um “estado de ser”. (…) (Visão da Realidade, pág. 230) (…) Assim, intelectualmente, estais sendo tolhido, sufocado, controlado, moldado e, por conseguinte, (…) não há possibilidade de libertação. Tampouco a há do ponto de vista emocional - mas não deis à palavra “emocional” o sentido de “sentimentalismo”. Um ente sentimental é perigoso: pode tornar-se estúpido, insensível. (…) (Uma Nova Maneira de Agir, 1ª ed., pág. 122) O adestramento do intelecto não produz inteligência. (…) Há uma enorme diferença entre intelecto e inteligência. O intelecto é o mero pensamento


funcionando independentemente da emoção (sentimento). (…) pode-se ter grande intelecto, mas não se ter inteligência. (…) (Palestras na Itália e Noruega, 1933, pág. 125) (…) Uma inteligência que é produto do desejo, da expansão do “ego”, há de estar sempre a criar resistência e não pode, jamais, dar-nos a tranqüilidade. Essa inteligência protetora do “ego” é produto do tempo, do impermanente, e não pode, portanto, jamais, conhecer o Atemporal. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 215) (…) Desenvolvemos uma certa qualidade de inteligência, em nossa atividade de expansão pessoal; com a nossa avidez, (..) instinto aquisitivo, (…) conflitos e penas, (…). Pode essa inteligência compreender o Real (…)? (Idem, pág. 201) (…) O essencial é sabermos se essa inteligência que foi cultivada na expansão do “eu” é capaz de perceber ou descobrir a verdade; (…) Para descobrir-se a verdade, é necessário que estejamos livres da inteligência que está ligada à expansão do “ego”, porquanto esta é sempre (…) limitante. (Idem, pág. 201) Ora, que é a mente? Ela não é apenas uma série de reações aos desafios que estão sempre a assaltar-nos, mas também uma série de lembranças, conscientes ou inconscientes, as quais estão constantemente moldando o presente em conformidade com o condicionamento. (…) Observai e vereis que vossa mente é uma série de desejos, mais o impulso a preenchê-los (…) (O Homem Livre, pág. 41) Há, pois, uma diferença entre o intelecto e a mente. O intelecto é “separativo”, “funcional”, não pode ver o todo; ele funciona dentro de um padrão. E a mente é a totalidade que pode ver o todo. O intelecto está contido na mente; mas o intelecto não contém a mente. (…) É a capacidade da mente que percebe o todo, e não o intelecto. (O Passo Decisivo, pág. 272) (…) Há uma atividade diferente que não procede do “ego” e que cumpre ser encontrada. Uma inteligência diferente é necessária para compreender-se o Atemporal, pois é só este que nos pode libertar de nossas lutas e sofrimentos incessantes. A inteligência que agora possuímos é produto do desejo de satisfação e segurança, material e espiritual, é resultado da cupidez, (…) da auto-identificação. Tal inteligência é incapaz de compreender o Real. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 215-216) Pergunta: Como podemos ultrapassar essa inteligência limitada? Krishnamurti: Se ficarmos passivamente vigilantes de suas atividades complexas e inter-relacionadas. Com essa vigilância, as causas que nutrem a


inteligência do “ego” extinguem-se sem esforço auto-consciente. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 216-217) Assim, pois, enquanto atribuímos exagerada importância ao intelecto, à mente que adquire saber, ilustração, experiência e lembranças, não existirá “a outra coisa”. Pode-se em certas ocasiões ter rápidas visões da “outra coisa”; mas (…) são reduzidas imediatamente às medidas do tempo, (…). (Poder e Realização, pág. 86-87) (…) O culto do intelecto, em oposição à vida, conduziu-nos à nossa frustração, com suas inumeráveis vias de fuga. (…) A presente crise nasceu do culto do intelecto, que dividiu a vida numa série de ações opostas e contraditórias; foi o intelecto que negou o fator de unificação, que é o amor. (…) (A arte da Libertação, pág. 248) Ora, dividimos a mente em pensamento, razão, intelecto; mas (…) a mente é, para mim, inteligência, inteligência que se cria, mas obscurecida pela memória; a mente, que é inteligência, está (…) confundida com aquela consciência do “eu”, resultado do ambiente. (…) (A Luta do Homem, pág. 65) (…) A vida, por certo, implica ação diária, pensamento diário, sentimento diário (…). Implica as lutas, as dores, as ânsias, os enganos, as tribulações, a rotina do escritório, dos negócios, (…). Por “vida” entendemos não uma só esfera ou camada da consciência, mas o processo total da existência, que é a nossa relação com as coisas, com as pessoas, com as idéias. É isso o que entendemos por vida - e não uma coisa abstrata. (Novo Acesso à Vida, pág. 49) (…) O viver realmente exige abundância de amor, de sensibilidade ao silêncio, grande simplicidade a par de abundante experiência. Requer uma mente capaz de pensar com toda a clareza, não tolhida pelo preconceito ou a superstição, pela esperança ou pelo medo. Tudo isso é a vida, e se não estais sendo educados para viver, vossa educação é completamente sem significação. (…) (A Cultura e o Problema Humano, pág. 35) Que é “desejo”? E por que separamos o desejo da mente? (…) Em primeiro lugar, precisamos saber o que é o desejo, para podermos examiná-lo com mais profundidade. (…) “Experimentai” realmente a coisa sobre que estamos falando, e, desse modo, as palavras terão significação. (Realização sem Esforço, pág. 14-15) Como se origina o desejo? Pode-se dizer com segurança que ele nasce do perceber ou ver, do contato, da sensação - depois o desejo. (…) Primeiro vedes um automóvel, depois vem o contato, a sensação, e, por fim, o desejo de possuir o carro, conduzi-lo. (…) A seguir (…) há conflito. Nessas condições, na


própria realização do desejo há conflito, dor, sofrimento, alegria, (…). A entidade criada pelo desejo (…) está identificada com o prazer (…). O desejo, que nasce da percepção-contato-sensação, está identificado com aquele “eu” que deseja apegar-se ao que é agradável e afastar de si o que é doloroso. (…) (Idem, pág. 15) Vamos, pois, investigar, descobrir o que é desejo. Com a compreensão do desejo vem a disciplina - disciplina não imposta por ninguém, que não é ajustamento nem repressão, porém uma disciplina inerente à própria compreensão do desejo. Como disse, desejo é apetite, aspiração, ânsia não preenchida. E, ou cedemos a essa ânsia, (…) desejo, ou o reprimimos, porque a sociedade nos diz que devemos reprimi-lo, porque as religiões organizadas preceituam que devemos transmutá-lo, etc. (…) (A Suprema Realização, pág. 43) Temos desejo, que é, na realidade, reação a um apetite. Desejo ser uma coisa, e “reajo”. Essa reação depende da intensidade de meu sentimento. Se é intenso o sentimento, imperiosa a emoção, o preenchimento é então quase imediato, seja em pensamento, seja em ato. (…) (A Suprema Realização, pág. 44) O desejo, reação a uma sensação a que se deu continuidade pelo pensamento, busca seu preenchimento; e, nas várias formas de preenchimento, há sempre contradição. Dessa contradição vem o conflito; e onde há conflito há esforço. O desejo, pois, gera o esforço, se não compreendemos o seu “processo” total. (Idem, pág. 44) Tendes um prazer, sexual ou trivial, e pensais nele; criais em vossa mente imagens, símbolos, palavras. E, quanto mais pensais nesse prazer, tanto mais intenso ele se torna. E essa intensidade exige preenchimento. Mas nesse preenchimento há uma contradição, pois desejais também preencher-vos em outros sentidos. (…) Por conseguinte, para fugirdes à contradição, à dor causada pelo conflito, dizeis ser necessário reprimir o desejo. Mas, não é importante reprimir o desejo, moldá-lo, sublimá-lo, porém, sim, compreendê-lo, compreender o que lhe dá substância, intensidade, urgência de preenchimento. Compreendido isso, tem o desejo significação completamente diferente. (Idem, pág. 45) (…) A mente, que é também vontade, é a fonte do esforço, das intenções, dos motivos conscientes e inconscientes - o centro do “eu” e do “meu” e (…), por mais longe que tente alcançar, pode esse centro produzir uma transformação fundamental em si mesmo? (Claridade na Ação, pág. 27)


(…) Só pode haver revolução quando a mente cessa de funcionar no campo do tempo, porque então se torna possível a existência de um elemento novo, independente do tempo. (…) Podeis chamar esse elemento “Deus” ou “a Verdade”. (…) (Idem, pág. 28) Há duas espécies de vontade - a vontade que nasce do desejo, da carência, do anseio - e a vontade do discernimento, da compreensão, (…). (Palestras em Ojai, 1936, pág. 94) (…) A vontade resultante do desejo baseia-se no esforço consciente da aquisição, (…). Este esforço consciente ou inconsciente de querer, de ansiar, cria a totalidade do processo do “eu”, e daí surgem o atrito, a tristeza e a cogitação do além. Desse processo surge também o conflito dos opostos (…) (Idem, pág. 94-95) Ora, não há vontade divina, mas apenas a vontade simples, comum, do desejo: a vontade de obter sucesso, de estar satisfeito, de ser. Essa vontade é uma resistência, e é fruto do medo que guia, escolhe, justifica, disciplina. Essa vontade não é divina. Ela não está em conflito com a chamada vontade divina, mas, (…) é uma fonte de tristeza e de conflito, porque é a vontade do medo. Não pode haver conflito entre a luz e a treva; onde existe uma, não existe a outra. (Palestras em Ommen, Holanda, 1937-1938, pág. 103) Pergunta: Podeis (…) explicar a diferença existente entre mudança na vontade e mudança de vontade? Krishnamurti: Mudança na vontade é apenas o resultado de dualidade na consciência, e mudança de vontade tem lugar na plenitude de nosso ser integral. (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 46) Uma é mudança de grau e a outra é mudança de espécie. O conflito da carência ou a mudança do objeto do desejo é apenas mudança na vontade, mas com a cessação de toda carência dá-se a mudança de vontade. (Idem, pág. 46) Mudança na vontade é uma submissão à autoridade do ideal e da conduta. Mudança de vontade é discernimento, inteligência, na qual não há conflito da antítese. Nesta última, existe um profundo e espontâneo ajustamento; na primeira, há compulsão por meio da ignorância, da carência e do temor. (Idem, pág. 46) Se, quando escutais (…), fazeis algum esforço, isto é ainda resultado do conhecido. Quase todos nós vivemos pela ação da vontade, (…). A vontade de “vir a ser”, ser, é ação do conhecido, (…). Por conseguinte, a ação da vontade não pode encontrar nunca o que é real. (…) (Viver sem Temor, pág. 17)


Nota: Conforme fontes orientais e ocidentais, incluindo Escrituras, a alma e seu campo abrange sentimento, emoção, paixão; mente concreta, temporal, intelecto, correspondente inteligência; vida, prana, princípio vital; e desejovontade, kâma, vinculado ao Id da psicanálise. Aqui foram incluídos textos correspondentes, de Krishnamurti.


3. O “EU”; NATUREZA PSICOLÓGICA, ATIVIDADES ABRANGIDAS

Em nossas recentes reuniões, tratamos da importância de se compreenderem as tendências do “eu”. Porque, afinal de contas, as pessoas que pensam mais seriamente não podem deixar de saber que o “eu” é a verdadeira causa de todas as nossas iniqüidades e sofrimentos. (…) (Quando o Pensamento Cessa, pág. 73) Pode-se ver que o pensamento tem fabricado o “eu”, o “eu” que se tornou independente, o “eu” que tem adquirido conhecimentos, o “eu” que é o observador, o “eu” que é passado, o passado que atravessa o presente e se projeta a si mesmo. Este é ainda o “eu” produzido pelo pensamento, e esse “eu” se tem tornado independente do pensamento (…) (La Verdad y la Realidad, pág. 231) (…) Esse “eu” tem um nome, uma forma. Tem uma etiqueta chamada X ou Y ou João. Identifica-se com o corpo, com o rosto; há a identificação do “eu” com o nome e com a forma, ( … ) e com o ideal que quer seguir. Também com o desejo de mudar o “eu” por alguma outra forma de “eu”, por outro nome. Este “eu” é produto do tempo e do pensamento. O “eu” é a palavra: elimino a palavra e que é o “eu”? (Idem, pág. 131) E esse “eu” sofre. O “eu” que sofre é você. O “eu”, em sua grande ansiedade, é a grande ansiedade de você. (…) De modo que esse “eu” se move na corrente da cobiça, (…) do egoísmo, do temor, da ansiedade, etc. (…) Enquanto vivemos, estamos envolvidos nessa corrente; (…). Essa corrente é o “egocentrismo” (…); essa expressão inclui todas as descrições do “eu” que acabamos de fazer. E, quando morremos, o organismo morre, porém a corrente egocêntrica continua. (Idem, pág. 232) O que o pensamento produz é sempre produto dele próprio e, portanto, coisa do tempo. Não há dúvida de que esse todo é o “eu” o “ego”, quer superior, quer inferior (…). O “eu”, portanto, é um feixe de lembranças (…). Não existe entidade espiritual identificada como “eu” ou distinta do “eu”; porque, quando dizeis que existe uma entidade espiritual separada do “eu”, ela é ainda um produto do pensamento (…) e pensamento é memória. Assim, o “vós” e o “eu”, superior ou inferior, (…) é memória. (A Arte da Libertação, pág. 127)


(…) O “eu” é, apenas, reação, e, por conseguinte, o findar da reação é o findar do “eu”. Eis por que importa se compreenda todo o processo do “eu”, (…) do pensar. (…) O “eu” é mecânico e, por conseguinte, só pode reagir mecanicamente; e para se passar além necessita-se de auto-conhecimento completo. (…) (Que Estamos Buscando?, 1ª ed., pág. 214) Através do grande desenvolvimento da habilidade, temos fortalecido em nossa consciência a estrutura e a natureza do “eu”. O “eu” é violência, (…) cobiça, inveja, etc. (…). Enquanto exista o centro, o “eu”, toda ação será distorcida. (…) Desta maneira, pode-se desenvolver uma grande capacidade, porém a essa capacidade falta equilíbrio, harmonia. (…) (La Totalidad de la Vida, pág. 157) Em primeiro lugar, (…) o “eu” são as várias qualidades, virtudes, idiossincrasias, esperanças, paixões, valores, que tenho cultivado, as lembranças que conservei (…). O “eu”, que se acha identificado com a propriedade, a casa, a família, um amigo, uma esposa, um marido, com experiência; o “eu” que cultivou certas virtudes, (…) que deseja preencher-se, que tem lembranças inúmeras, agradáveis e desagradáveis - este “eu” diz: “tenho medo; quero a garantia (…) de continuidade.” (Palestras na Austrália e Holanda, 1955, pág. 117) Posso, pois, estar cônscio da minha avidez, (…) inveja, momento a momento? Estes sentimentos são expressões do “eu”, do “ego” (…). O “ego” é sempre o “ego”, em qualquer nível que o coloquemos. Seja “superior”, seja “inferior”, o “eu” está sempre compreendido na esfera do pensamento. (…) (Percepção Criadora, pág. 109) (…) O “eu” é um feixe de lembranças, e isso é tempo, e a mera continuação no tempo não leva ninguém ao eterno, que está fora do tempo. Só se extingue o temor da morte, quando o desconhecido penetra vosso coração. (…) (A Arte da Libertação, pág. 131) (…) O “eu” é mecânico e, por conseguinte, só pode reagir mecanicamente; e para se passar além, necessita-se auto-conhecimento completo. (…) Ora, nós habitualmente agimos de um centro que tem um ponto, que é o “eu” (…); é esse o centro de onde reagimos; (…). (Que Estamos Buscando? pág. 214) Sabeis o que entendo por “eu”? Com essa palavra quero significar a idéia, a memória, a conclusão, a experiência, as várias formas de intenções, confessáveis e inconfessáveis, o esforço consciente para ser ou para não ser, a memória acumulada do inconsciente, da raça, do grupo, do indivíduo, da tribo, etc., tudo isso, quer projetado exteriormente como ação, quer projetado


espiritualmente como virtude; a luta que daí resulta é o “eu”. (…) A totalidade desse processo constitui o “eu”; (…). (Quando o Pensamento Cessa, pág. 75) O “eu” é egotista, suas atividades, por mais nobres que sejam, são separativas e geram isolamento. (…) Conhecemos também aqueles momentos extraordinários em que o “eu” é inexistente, em que não há tendência para esforço ou luta, e que ocorrem quando existe o amor. (A Primeira e Última Liberdade, 1ª ed., pág. 75) O que entendemos por “eu”? (…) “São todos os meus sentidos, (…) sentimentos, (…) imaginação (…) exigências românticas, (…) posses, (…) marido, (…) esposa, (…) qualidades, (…) lutas, (…) conquistas, ambições, (…) aspirações, (…) infelicidade, (…) alegrias” - tudo isso seria o “eu”. Você pode acrescentar mais palavras, mas a essência dele é o centro, o “eu”, meus impulsos (…). A partir desse centro, ocorre toda ação; (…) as nossas aspirações, (…) ambições, desavenças, (…) desacordos, (…) opiniões, julgamentos, experiências, estão centrados nisso. (…) (Perguntas e Respostas, pág. 9) (…) Pensamos que, no processo do tempo, no crescer e transformar-se, o “eu” se tornará, no fim, realidade. Tal é nossa esperança, nosso anelo: que o “eu” se tornará perfeito através do tempo. Que é esse “eu”? É um nome, uma forma, um feixe de lembranças, esperanças, ilustrações, ânsias, dores, sofrimentos e alegrias passageiras. (…) (Claridade na Ação, pág. 142) (…) Mas existe o “eu” que não é meu corpo, o “eu” que é minha compreensão acumulada, (…) as riquezas que juntei - não o “eu” físico, mas o “eu” psicológico, que é memória e que desejo continue a existir, que não quero que finde. Em verdade, não é a morte que tememos, mas esse findar. Desejamos continuidade. (…) (Arte da Libertação, pág. 128) Que é o “eu”? Se uma pessoa observa realmente a si própria, observa que o “eu” é uma massa de experiências acumuladas, de mágoas, de prazeres, de idéias, conceitos, palavras. É o que somos: um feixe de memórias (lembranças). (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 169) Todos nós somos, psicologicamente, o resultado de nosso ambiente educacional e social. A sociedade, com seus códigos de moralidade, suas crenças e dogmas, suas contradições, seus conflitos, suas ambições, sua avidez, sua inveja, suas guerras - é o que nós somos. (Idem, pág. 169) Memória identificada com a propriedade, a família, o nome - isso é o que cada um de nós é, (…). Podemos ter certa capacidade para escrever poesias ou pintar quadros; podemos ser bastante sagazes nos negócios, ou muito sutis no interpretar determinada teologia; mas o que na realidade somos é um feixe de


coisas lembradas - as mágoas, as dores, as vaidades, os preenchimentos e frustrações do passado. (…) (Idem, pág. 169) Nunca percebemos (…) por que existem em nós diversas entidades, que gravitam todas em torno do “eu”. O “eu” é constituído dessas entidades, que são meros desejos, sob várias formas. Desse conglomerado de desejos surge a figura central, o “pensador”, a vontade do “eu” (…). (A Educação e o Significado da Vida, 1ª ed., pág. 67) Existe essa entidade complexa chamada “ego”, com todas as suas agonias, seu sofrer, suas ânsias, seu desejo de preenchimento, de “vir a ser”, de domínio, de posição, de segurança, seu desejo de ser alguém, de “expressarse” de diferentes maneiras. (…) Com esse “ego” vou olhando as coisas e, de acordo com ele, traduzindo-as; conseqüentemente, é muito natural pensar-se que nada existe de novo, uma vez que tudo está sendo contaminado pelo passado. (Experimente um Novo Caminho, pág. 64) Ora, o que acontece quando se acumulou conhecimento, experiência? Qualquer outra experiência que vocês tenham é imediatamente traduzida em termos de “mais e mais”, e vocês nunca estão realmente experimentando, mas (…) amontoando; e esse amontoar é o processo da mente, que é o centro do “mais e mais”. O “mais e mais” é o “eu”, o ego, a entidade (…) preocupada em acumular, seja negativa ou positivamente. (…) (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 139) Que centro é esse? Sem dúvida, é o “eu”, o “ego”, a mente, (…) tão sensível, sobremodo hábil e capaz de compreender uma tão grande variedade de experiências, de armazenar inúmeras lembranças, que pode inventar, que sabe planear um avião (…). Esse centro, máquina complexa, de potencialidades ilimitadas, está circunscrito pela idéia do “eu”: meu prazer, minha segurança, minhas vaidades, minhas posses, meu progresso, meu preenchimento. (Percepção Criadora, pág. 52-53) É um centro de afeição, de ódio, de prazeres efêmeros, de inveja, avidez e sofrimento. E posso realizar uma revolução nesse centro, de modo que o “eu” se torne inexistente? Porque o “eu” é a fonte de todo sofrimento, (…). Ainda que o “eu” tenha satisfações passageiras, alegrias e afeições superficiais, ele está constantemente multiplicando problemas e produzindo sofrimento. Por mais alto ou em qualquer nível que se coloque o “ego”, ele estará sempre compreendido no campo do pensamento (…) (Idem, pág. 53) (…) A atividade egocêntrica do “eu” é um processo temporal. É a memória que dá continuidade à atividade do centro, que é o “eu”. Se observardes a vós mesmos, e vos tornardes cônscios desse centro de atividade, vereis que ele é


só processo de tempo, de memória, de experiência, e de tradução de cada experiência de acordo com a memória. (…) (A Primeira e Última Liberdade, 1ª ed., pág. 125) Quero, pois, averiguar o que é esse centro e ver se é realmente possível dissolvê-lo, transformá-lo, desarraigá-lo. Que é o “eu” da maioria de nós? É um centro de desejo, que se manifesta sob várias formas de continuidade (…). É o desejo de ser mais, de perpetuar a experiência, de enriquecimento por meio da aquisição, lembranças, sensações, símbolos, nomes, palavras. (Claridade na Ação, pág. 103) Se observardes bem, vereis que não existe nenhum “eu” permanente, mas só memórias - a memória do que eu fui, do que eu sou e do que deveria ser; vereis que ele é o desejo de “mais”, o desejo de um saber maior, de uma experiência maior, desejo de uma identidade contínua, identidade com a casa, com o país, com idéias, com pessoas. Esse processo se desenvolve não só consciente, mas também nas camadas mais profundas, nas camadas inconscientes da mente, e, por conseguinte, esse centro, que é o “eu”, é mantido e nutrido pelo tempo. (Idem, pág. 103) Tudo isso, pois, constitui o “eu” , (…) - o “eu” que está sempre a desejar “mais”, sempre insatisfeito, sempre lutando por mais experiência, mais sensações, cultivando a virtude a fim de reforçar-se em seu centro; por essa razão, ele nunca é virtude, mas tão somente expansão de si próprio, sob o disfarce de virtude. Aí tendes o que é o “eu”, ele é o nome, a forma, o sentimento que se oculta atrás do símbolo, (…) luta para adquirir, reter, expandir-se ou diminuirse, cria uma sociedade aquisitiva, cheia de conflito, competição, crueldade, guerra, etc. (Idem, pág. 104) (…) O centro é o “eu”, que tanto é físico como emocional e intelectual. O “eu” cria o espaço que o circunda, porque o centro existe. E, já que o centro existe e cria o espaço, e se este é o único espaço que o homem tem possibilidade de conhecer, nesse caso não há liberdade nenhuma. (…) (Uma Nova Maneira de Agir, 1ª ed., pág. 136) Portanto, psicologicamente, não se pode evitar a dor, se se está psicologicamente em busca de prazer. Desejamos uma coisa, e não desejamos outra. A exigência de continuação de dado prazer é o centro de onde pensamos, funcionamos e atuamos - centro que se pode chamar “ego”, “eu”, “personalidade”; (…) Onde há um centro, há sempre espaço em torno dele, espaço no qual ocorre a ação do medo e do prazer. (…) (A Importância da Transformação, pág. 121)


Tendes de trabalhar muito diligentemente para descobrirdes as atividades de vossa mente, como funciona, suas ações egocêntricas, o “eu” e o “não-eu”; deveis “familiarizar-vos” inteiramente convosco e com os truques que a mente pratica consigo mesma, as ilusões e falácias, a criação das imagens, e as idéias românticas que nutrimos. A pessoa que é capaz de sentimentalidade, é incapaz de amar, a sentimentalidade gera brutalidade, crueldade, violência, e não amor. (Fora da Violência, pág. 79) A questão sobre que temos discutido é a seguinte: Como é possível reconhecer as várias atividades do “eu” e suas formas sutis, atrás das quais a mente se abriga? (…) A ação baseada em idéia é uma forma do “eu”, (…). Assim, a idéia, posta em ação, se transforma em meio de dar continuidade ao “eu”. (…) A busca de poder, de posição, de autoridade, a ambição, etc., são formas do “eu”, (…). (Quando o Pensamento Cessa, pág. 74) (…) Mas a verdade se manifesta de momento a momento, quando a mente é capaz de libertar-se de todas as acumulações. Porque quem acumula é o “eu”, e ele acumula para se impor, (…) dominar, (…) expandir se, (…) preencher-se. Só com a libertação do “eu” pode a verdade manifestar-se (…) (Nós Somos o Problema, pág. 85-86) Ora, antes de perguntardes: “pode o eu evolver?”, tendes de saber o que é o “eu”. Dizer “o eu evolve” não tem sentido. Que é o “eu”? O “eu” são vossos móveis, vossa casa, vossos livros, vossa memória, lembranças de prazer e dor - o “eu” é um feixe de “memórias”. É mais alguma coisa? Dizeis que o “eu” é espiritual, que nele existe uma essência espiritual. (…) Não é isso uma invenção do pensamento? (…) Não aceiteis nada, nem mesmo o vosso “eu”, porque, para descobrirdes a Verdade, a mente deve estar livre do “eu” (…) “eu superior” e “eu” é a mesma coisa - uma pura invenção dualista. (O Novo Ente Humano, pág. 30) O “ego”, esse feixe de lembranças, é o resultado do passado, produto do tempo, e esse “ego”, por mais que evolva, será capaz de conhecer o Atemporal? Pode o “eu”, com o tornar-se maior, mais nobre, no correr do tempo, sentir o Real? (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 142) Ora, a inocência é algo não contaminado, algo totalmente novo, fresco; é um “estado de descobrimento”, no qual a mente é sempre jovem. Para averiguardes isso, (…) não podeis continuar a transportar essa carga do passado. O passado (…) tem de findar, para que a mente possa descobrir aquela “coisa nova”; e ele deve chegar a seu fim, sem que seja necessário esforço, disciplina, controle ou repressão. O “velho” não pode achar “o novo”, (…). (Experimente um Novo Caminho, pág. 64)


Compreendeis o problema? Essa entidade, o ego, é produto do tempo, (…) de um milhar de experiências, (…) de contradições, batalhas, ansiedades, (…) da “culpa” (sentimento de culpa), do sofrimento, da aflição, do prazer. É o resíduo do passado, (…) nenhuma possibilidade tem de descobrir o novo. O novo não pode ser posto em palavras; é algo imensurável, energia sem causa, sem fim, sem começo; e, para que a mente possa encontrar-se neste estado de criação, o velho, o ego, deve findar. Mas como fazê-lo findar? (Idem, pág. 64-65) Quando observais, não em termos de tempo, essa consciência integral; quando o pensamento já não é escravo do tempo, já não é uma reação, e se acha em completa quietude, então, por estar o cérebro totalmente quieto, não mais “experimentando”, será possível penetrar até às raízes da consciência total. Só então se verificará a verdadeira mutação, (…) transformação. (…) (Idem, pág. 68) (…) Assim sendo, o que me parece importante é essa investigação do “eu”, de “mim”, para se conhecer o “eu” tal qual é, com suas ambições, invejas, exigências agressivas, falácias, divisão em “superior” e “inferior” - de tal maneira que não só seja revelada a mente consciente, mas também a inconsciente, o repositório da antiga tradição (…). O conhecimento da totalidade do “eu” significa o seu fim. (…) (Transformação Fundamental, pág. 60)


4. CONSCIÊNCIA, UNIDADE, EGO, SUPEREGO, CONFORME O AUTOR

Para compreendermos (…) precisamos entender a questão da consciência. Que entendemos por consciência? (…) A consciência, de certo, é um processo de reação a um estímulo, a que chamais experiência. Isto é, há um desafio, que é sempre novo; mas a reação é sempre velha. (…) Essa experiência recebe uma designação (…) ela é boa ou má, agradável ou dolorosa. (…) Assim, a consciência, nos diferentes níveis, é o processo total do experimentar (…). Esse processo total, (…) chama-se consciência. (…) A memória é o armazém, o registro, e é a memória que intervém, que reage ao estímulo; e a esse processo chamamos consciência. (…) (Arte da Libertação, pág. 53-54) (…) Por consciência entendemos (…) o pensamento, o sentimento e a ação, conscientes ou inconscientes. (…) Os sentidos, que criam o sentimento, e as fórmulas, os conceitos, as idéias, a opinião, a crença positiva ou negativa - tudo isso está compreendido no campo da consciência. (…) (Viagem por um Mar Desconhecido, pág. 111) A consciência constitui toda a esfera de nosso pensamento, todo o campo da idéia e da ideação. O pensamento organizado se torna idéia, da qual resulta ação; e a consciência se constitui de muitas camadas de pensamento, ocultas e patentes, conscientes e inconscientes. É a esfera do conhecido, da tradição, da memória do que foi. É o que temos aprendido, o passado em relação ao presente. (Experimente um Novo Caminho, pág. 38) O passado transmitido através de séculos, o passado da raça, da nação, da comunidade, da família; os símbolos, as palavras, as experiências, o choque dos desejos contraditórios; as inumeráveis lutas, prazeres e dores; as coisas que aprendemos de nossos antepassados e as modernas tecnologias que se lhes acrescentaram - tudo isso constitui a consciência, é o campo do pensamento, (…) do conhecido, e nós vivemos na superfície desse campo. (…) (Idem, pág. 38) Se olhamos o conteúdo da consciência encontramos recordações, temores, ansiedades, o “eu creio” e o “eu não creio”, todos produtos do tempo. E o pensamento diz que isto é tudo que tenho, devo protegê-lo, defendê-lo (…). O movimento do pensar tem sua origem na memória; ainda que pense em


liberdade, segue pertencendo ao passado. Portanto, não pode produzir mudança radical. (…) (Tradición y Revolución, pág. 95-96) A consciência, tal como a conhecemos, pertence ao tempo, é um processo de registro a acumulação de experiência, nos seus diferentes níveis. Tudo o que ocorre no interior dessa consciência é sua própria projeção; tem qualidade própria e é mensurável. Durante o sono, ou essa consciência se fortalece ou sucede algo de todo diferente. Para a maioria de nós, o sono fortifica a experiência, é um processo de registrar e acumular, no qual há expansão, mas não renovação. (…) Esse processo de vir a ser tem de cessar completamente, (…). (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 37) O outro ponto é: “Não é necessário despejarmos tudo o que está oculto nos labirintos do subconsciente para nos descondicionarmos?” Como disse, a consciência é constituída de diferentes camadas. Primeiro, temos a camada superficial, e abaixo desta a memória, porque sem memória não há ação. Imediatamente abaixo está o desejo de ser, de “vir a ser”, o desejo de realizar. Se vos aprofundardes mais, encontrareis um estado de completa negação, de incerteza, de vazio. Esse total constitui a consciência. (…) (A Arte da Libertação, pág. 117) Pois bem, enquanto houver o desejo de ser, de “vir-a-ser”, de realizar, de obter, há de haver o fortalecimento, nas muitas camadas da consciência, do “eu” e do “meu”; e o esvaziamento dessas muitas camadas só é possível quando compreendeis o processo de “vir a ser” (Idem, pág. 117) Quando um problema não é solúvel conscientemente, pode o inconsciente ajudar a resolvê-lo? Que é o consciente e que é o inconsciente? Existe uma linha precisa onde um acaba e o outro começa? Tem o consciente um limite que não pode ultrapassar? (…) O inconsciente é uma coisa separada do consciente? São os dois dissimilares? Na falta de um, o outro começa a funcionar? (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 133-134) Ora, sabemos que existe a mente consciente e a mente inconsciente, mas a maioria de nós funciona apenas no nível consciente, na camada superficial da mente, e toda a nossa vida (…) se limita a isso. Vivemos na chamada mente consciente e nunca damos atenção à mente inconsciente, mais profunda, da qual nos vem ocasionalmente uma mensagem, uma sugestão; mas essa sugestão não é atendida, ou é adulterada. (…) (Que Estamos Buscando, 1ª ed., pág. 174) Nosso problema (…) é este; existe, de fato, um estado único, e não dois estados, como sejam o consciente e o inconsciente; só há um “estado de ser”, que é a consciência, embora gostemos de dividi-la em consciente e


inconsciente. Mas a consciência é sempre do passado, nunca do presente; (…). Nunca estamos conscientes do agora. (…) Observai os vossos corações e as vossas mentes, e vereis que a consciência funciona sempre entre o passado e o futuro, sendo o presente mera passagem do passado para o futuro. (…) (Que Estamos Buscando, 1ª ed., pág. 175) A mente consciente está claramente procurando uma saída do problema, e essa saída é uma conclusão satisfatória. Não é a mente consciente, ela própria, constituída de conclusões, positivas ou negativas, e será capaz de procurar algo diferente? (…) Não há dúvida de que a mente consciente é constituída do passado, está fundada no passado, (…). Ela é incapaz de examinar o problema sem a cortina protetora de suas conclusões; é incapaz de estudar, de estar silenciosamente cônscia do próprio problema. Conhece, apenas, conclusões agradáveis ou desagradáveis, e só é capaz de acrescentar, a si própria, mais conclusões, mais idéias, mais fixações. (…) (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 134) Krishnamurti: Voltemos a isto. Penetrando na consciência, e vendo quão fragmentária ela é, pode naturalmente uma (parte dos fragmentos) transformarse na outra (a total). Então viriam juntos, porque temos dividido a vida em consciente e inconsciente, oculto e revelado. Este é o ponto de vista psicanalítico, psicológico. Para mim, pessoalmente, isto não ocorre. Não separo o consciente do inconsciente. Mas aparentemente, para a maioria de nós, há essa divisão. (The Awakening of Intelligence, pág. 386) (…) Dá-se a verdadeira integração quando, por todas as camadas da consciência, existe percepção e compreensão (…). As numerosas partes adversas e contraditórias da nossa consciência só podem integrar-se quando já não existe a causa dessas divisões; dentro do padrão do “eu” só pode haver conflito; nunca integração, plenitude. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 134) Krishnamurti: (…) Se não há conteúdo, não há consciência. Dentro da consciência há muitos fragmentos; não é um único conteúdo sólido. Existem diferentes níveis, atitudes, características, atividades, (…). Tudo isso é a consciência total. Uma parte dessa consciência total, um fragmento, assume importância; então diz: “eu sou a consciência”, ou “eu não sou a consciência”, “eu sou isto”, “eu não sou isto”. (Tradición y Revolución, pág. 148) Nossa consciência (…) está ocupada com os próprios conceitos e conclusões, assim como com as idéias de outra gente; está cheia de temores, ansiedades e prazeres, e, junto a ocasionais expressões de alegria, está a dor. Essa é nossa consciência. Esse é o padrão da existência que levamos. (La Totalidad de la Vida, pág. 192)


É de algum modo possível produzir uma mudança radical na própria consciência? Porque, se isso não é possível, estamos vivendo perpetuamente em uma prisão com nossas idéias, (…) conceitos - vivendo em um campo (…) de confusão, incerteza, instabilidade. E ao indivíduo parece que, se se move de um lugar a outro desse campo, terá mudado grandemente; porém continua no mesmo campo. Enquanto vivemos dentro do campo a que chamamos nossa consciência, (…) ainda assim não há nesse campo uma transformação humana fundamental. (Idem, pág. 192) O “eu” é uma entidade total. Conquanto falemos de “consciente” e “inconsciente”, só existe de fato um estado: a consciência. Conhecemos a arte que chamamos “o consciente”; a outra parte, porém, é muito difícil de conhecer-se; entretanto, a mente é um processo total que inclui tanto a consciência interior como a consciência periférica, o oculto bem como o manifesto. Ora, pode uma pessoa tomar conhecimento dessa consciência total que é o “eu”, com seus desejos, suas ânsias, seus temores, seus impulsos, sua luta constante para aperfeiçoar- se, sua ânsia de preenchimento - (…) sem fortalecer a atividade do “eu”? E pode todo esse processo do “eu” terminar? (…) (Percepção Criadora, pág. 5-7) Ora, pode uma pessoa tomar conhecimento dessa consciência total que é o “eu”, com seus desejos, suas ânsias, seus temores, seus impulsos, sua luta constante para aperfeiçoar-se, sua ânsia de preenchimento - (…) sem fortalecer a atividade do “eu”? E pode todo esse processo do “eu” terminar? Por certo, ele não pode extinguir-se por um ato de volição, (…) de nenhum artifício, nem pela repetição de frases, (…). (Idem, pág. 57-58) (…) Se vos tornardes indiscriminadamente cônscios do “eu” em todas as suas atividades; cônscios de todo o processo do nosso pensar, tanto o cognitivo como o oculto; se perceberdes sem julgamento nem condenação, produzireis infalivelmente aquela revolução no centro. A mente se tornará então sutil num grau extraordinário, espantosamente ativa e vigilante (Idem, pág. 59) Tende (…) e vereis que a ação criadora é uma coisa que nasce quando a mente está tranqüila, quando o “eu” está totalmente ausente. A atividade criadora que conhecemos ocasionalmente, resultante de agitação, não é a mesma coisa que a ação criadora livre do centro. A ação criadora livre do centro não é temporal, porque não é invenção da mente; (…). Mas a criação a que me refiro não é para dar-nos satisfação, é algo totalmente desconhecido, (…) e virá apenas quando a mente, perfeitamente cônscia do processo do “eu”, compreende a significação deste e, por conseguinte, não mais o nutre de experiência. (Percepção Criadora, pág. 60)


(…) Como indivíduos, tendes que compreender o processo da consciência por meio do discernimento direto, sem escolha. A autoridade do ideal e do desejo impede e perverte o verdadeiro discernimento. Quando há carência, quando a mente está cativa dos opostos, não pode haver discernimento. As reações psicológicas impedem o verdadeiro discernimento. Se dependermos da escolha, do conflito dos opostos, criaremos sempre a dualidade em nossas ações, (…). (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 13-14) (…) Descobrimos, assim, uma coisa muito interessante, ou seja, que todo conhecimento é o passado, todo conhecimento tecnológico vem dele, e esse passado se “projeta”, modificado pelo presente, no futuro. Assim, vós como entidade sois o passado, (…) vossas “memórias”, (…) tradições, (…) experiência. Acabamos de ver, pois, que o “vós”, o “eu”, o “ego”, o “superego”, tudo é passado. (…) (O Novo Ente Humano, pág. 141) (…) Queremos que esse “eu” subsista e se torne perfeito, e, por conseguinte, dizemos que além do “eu” está um “super-eu”, um “eu” mais alto, uma entidade espiritual atemporal. Mas, visto que a pensamos (…) está ainda dentro da esfera do tempo, (…). (Claridade na Ação, pág. 142) A mente, ao perceber a sua própria impermanência, a sua transitoriedade, anseia por um estado permanente, e esta própria ânsia cria o símbolo, a sensação, a idéia, a crença, a que nos apegamos. Temos, pois, o “eu” transitório, e o “super-eu”, o “eu superior”, que consideramos permanente; e a mente, buscando o permanente, cria a dualidade, o conflito dos opostos. (…) (Idem, pág.143) Mas, em primeiro lugar, não estais cônscios da existência de uma entidade diferente, o “eu” superior, que controla o inferior? Há em cada um de nós uma coisa que existe separadamente, e que guia, molda, observa cada pensamento. (…) Como nasceu esta entidade separada? Não é ela um resultado da mente, (…) do pensamento? É, evidentemente; (…). Se eu não a tivesse pensado, ela não poderia existir; (…) E o que é produto do pensamento pode ser uma entidade espiritual, separada do pensamento? Pode ser uma entidade atemporal, uma coisa eterna, que transcende o processo do pensamento? Se é uma entidade atemporal, então não me é possível pensá-la, porquanto só sou capaz de pensar dentro dos limites do tempo. (…) (Claridade na Ação, pág. 64-65) Posso, pois, estar cônscio (…). O “ego” é sempre o “ego” em qualquer nível que o coloquemos. Seja “superior”, seja “inferior”, o “eu” está sempre compreendido na esfera do pensamento. (…) (Percepção Criadora, pág. 109)


(…) Podeis situar o “eu” num nível qualquer, podeis chamá-lo “eu superior” ou “eu inferior”, mas isso representa ainda o processo do pensar; e, se não se compreende o pensamento, o seu pensar (…) continua sendo um processo de fuga. (Por que não te Satisfaz a Vida, pág. 74) Que é essa ânsia extraordinária de subsistir, que tem cada um de nós? E o que é que subsiste, (…)? Certo, o que continua é o nome, a forma, a experiência, o conhecimento, e várias lembranças. (…) O dividirdes a vós mesmos em “eu superior” e “eu inferior” não tem aqui cabimento, porque sois e continuais a ser (…) a soma de todas aquelas coisas. (…) (Idem, pág. 82) Assim, o todo da consciência, embora o chameis “superior” ou “inferior”, é memória. (…) E nesse campo, que é a consciência, não existe nada novo. (…) E o pensamento é memória, não importa se vossa própria memória ou memória acumulada de um milênio de propaganda. (…) O pensamento jamais poderá promover aquela revolução. (Viagem por um Mar Desconhecido, pág. 185)


5. CONSCIENTE, SUBCONSCIENTE, INCONSCIENTE, CAMADAS

Estive mostrando quanto é trivial o consciente, com suas atividades superficiais, sua perene tagarelice, etc.; e o inconsciente é também muito trivial. O inconsciente, como o consciente, só se torna importante quando o pensamento lhe dá continuidade. O pensamento tem seu lugar próprio, sua utilidade (…) em assuntos técnicos, etc., mas o pensamento é de todo fútil, quando se trata de operar aquela radical transformação. Quando percebo que é o pensamento que dá continuidade, está terminada a continuidade do pensador. (A Mente Sem Medo, 1ª ed., pág. 51) Conhecemos o que é o consciente; sabemos que vivemos, nos movemos, funcionamos dia a dia (…). Entretanto, há as camadas ocultas do inconsciente, as quais governam o consciente, pois (…) são muito mais vitais e muito mais ativas do que a chamada mente superficial. (…) (O Problema da Revolução Total, pág. 33) A mente consciente ocupa se do imediato, do limitado presente, ao passo que a inconsciente está sob o peso dos séculos e não pode ser represada ou desviada por alguma necessidade imediata. O inconsciente tem a qualidade de tempo profundo, e a mente consciente, com sua recente cultura, não pode haver-se com ela de acordo com as suas necessidades passageiras. Para erradicar a autocontradição, a mente superficial precisa compreender esse fato e estar em repouso - o que não significa dar vazão às inúmeras pressões da mente oculta. Quando não há resistência entre a manifesta e a oculta, então esta, porque tem a paciência do tempo, não violará o imediato. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 23) Precisamos despertar a plena capacidade da mente superficial, que vive na atividade cotidiana, e também compreender a mente oculta. Ao compreender a mente oculta. Ao compreender a mente oculta, estabelece-se um viver total, em que a autocontradição, com sua alternância de tristeza e felicidade, desaparece. É essencial que nos familiarizemos com a mente oculta e com seus processos; mas é igualmente importante não nos ocuparmos dela em excesso ou dar-lhe importância indevida. Só quando compreender o superficial e o oculto, poderá a mente ir além de suas limitações e descobrir a atemporal bem aventurança. (Idem, pág. 24)


(…) Educar apenas a mente consciente sem compreender a inconsciente acarreta contradição em nossas vidas, (…). A mente oculta é muito mais dinâmica do que a superficial. A maioria dos educadores está apenas interessada em fornecer informações ou conhecimento à mente superficial, preparando- a para conseguir um emprego e ajustar-se à sociedade. (…) Tudo o que a chamada educação faz é sobrepor-lhe uma camada de conhecimento e técnica, e dotá-la de certa capacidade para ajustar-se ao ambiente. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 22-23) Uma vez que haja percepção e compreensão dos poderes e capacidade das muitas camadas da mente oculta, os detalhes poderão concatenar-se sábia e inteligentemente. O importante é a compreensão da mente oculta, e não a mera educação da mente superficial no sentido de adquirir conhecimento, conquanto este seja necessário. Essa compreensão da mente oculta liberta a mente total de conflito, e só então haverá inteligência. (Idem, pág. 24) Não sei quantos de nós estão cônscios de que existe um subconsciente, de que há diferentes camadas em nossa consciência. Parece-me que a maioria de nós só está cônscia da mente superficial, das atividades diárias, (…). Não temos percebimento da profundeza, da importância, da significação das camadas ocultas; e às vezes, graças a um sonho, uma mensagem, ficamos cônscios de que há outros “estados de ser” (…) (A Arte da Libertação, pág. 116) O inconsciente é o depósito oculto do passado, individual e coletivo. É o repositório de séculos de propaganda, de toda experiência e conhecimento, das tradições e complexidades da raça. Agora, por mais engenhoso que vós sejais, que o analista seja, a mente consciente não pode abeirar se do inconsciente por meio de análise. (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 130) Pela análise só se pode arranhar a superfície do inconsciente, não se pode penetrá-lo muito profundamente - como creio que a maioria dos analistas concordaria, atualmente. A mente consciente foi educada, “treinada” numa determinada direção, adquiriu conhecimentos técnicos em certas especialidades, para que a pessoa possa ganhar a vida (…) - mas por essa maneira não é possível abeirar-nos do inconsciente. (Idem, pág. 130) O inconsciente, que é o “oculto”, tem de ser considerado negativamente. (…) Estar cônscio de uma coisa negativamente (…) é olhá-la e escutá-la sem resistência, sem condenação, sem rejeição. Do mesmo modo, é possível ficarmos cônscios, “sem escolha” da totalidade do inconsciente - e esse é o percebimento negativo. (Idem, pág. 130-131)


A mente oculta, inexplorada e não compreendida, com sua parte sua parte superficial que foi “educada”, entra em contacto com os desafios e exigências do presente imediato. A superficial pode reagir adequadamente ao desafio; mas, por haver uma contradição entre a mente superficial e a oculta, qualquer experiência da mente superficial só fará aumentar o conflito entre ela e a oculta. (…) A mente superficial, experimentando o externo sem compreender o interno, o oculto, só produz um conflito mais profundo e mais amplo. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 24) O inconsciente, embora essa palavra sugira algo oculto, de que não temos percebimento, faz também parte do conhecido; ele é o passado. Podeis desconhecer o inteiro conteúdo do inconsciente, (…) não o terdes examinado, observado, mas provavelmente tendes sonhos, comunicações procedentes daquela vasta região subterrânea da mente. Ela existe, e é o conhecido, porque é o passado. Nela nada existe de novo; (…) (Experimente um Novo Caminho, pág. 39) Existe inconsciente? (…) Se há inconsciente, de que maneira poderá a mente consciente descobri-lo? (…) Ao que sei, o inconsciente é o passado, a herança racial, o depósito da totalidade do esforço humano; um nível muito profundo existente em cada um de nós. De que maneira pode a mente consciente descobrir esse depósito, (…) coisa oculta, cuja existência admitimos? (…) (A Essência da Maturidade, pág. 24) Não sei se já notastes que, no momento em que se vê algo sem o pensamento, não há observador, só há observação. Quando olhais para uma nuvem, sem vossas lembranças acumuladas relativas às nuvens, estais apenas observando. Da mesma maneira temos de observar o inconsciente; e quando observais assim, negativamente, existe inconsciente? Não apagastes completamente o inconsciente com todo o seu conteúdo? Há, pois, um percebimento imediato da totalidade da consciência. (…) (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 69) A mente consciente é incitada, impelida, tangida ou coibida pelo inconsciente. Podeis pensar que sois, exteriormente, uma pessoa muito pacata, sem ambições; mas por baixo, profundamente oculto, está o clamor que vos vai no coração - vossos impulsos, compulsões, desejos, motivos. O inconsciente é o reservatório de todo o passado da humanidade, não apenas do passado do vosso existir, mas o de vosso pai (…) ancestrais, (…) nação, da humanidade; as tradições raciais, os preconceitos de casta; tudo isso está contido no inconsciente. (Autoconhecimento, Base da Sabedoria, pág. 82-83) (…) Sem dúvida, todo o campo mental - o consciente e o inconsciente - está condicionado pela nossa particular cultura. Isso é bastante óbvio. (…) No


campo do inconsciente se acham todas as tradições, o resíduo, assim o herdado como o adquirido, de todo o passado do homem, (…) (Transformação Fundamental, pág. 56-51) Minha vida e a vossa se acham num estado de fragmentação, de fracionamento. Vivemos uma vida dualista, dizendo uma coisa, fazendo outra, pensando uma coisa e dizendo coisa diferente. Contradição, dualidade - eis a vida que estamos vivendo. E eu estou perguntando: Por quê? Por que está a vida tão fragmentada? (…) (Palestras com Estudantes Americanos, pág. 64) A mente oculta é muito mais potente que a superficial, por mais que esta seja instruída e capaz de se ajustar; e isso não é algo tão inexplicável. A mente oculta ou inconsciente é o repositório das memórias raciais. A religião, a superstição, o símbolo, as tradições (…) de uma raça, a influência, tanto da literatura sagrada como da profana, de aspirações, frustrações, maneirismos e variedades de alimento - tudo isso está enraizado no inconsciente. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 23) Os desejos manifestos e secretos, com suas motivações, esperanças e medos, suas tristezas e prazeres; e as crenças, sustentadas através de pressões por maior segurança, traduzindo-se de várias maneiras - essas coisas também estão contidas na mente oculta, que não só tem essa extraordinária capacidade de reter o passado residual, como tem também a capacidade de influir no futuro. Indícios de tudo isso são apresentados à mente superficial através de sonhos e de várias outras formas, quando ela não está totalmente ocupada com os acontecimentos cotidianos. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 23) A mente oculta não é nada de sagrado, (…) a ser temido, nem requer um especialista para expô-1a à mente superficial. Mas, graças à enorme potência da mente oculta, a mente superficial não pode haver-se com ela como desejaria. A mente superficial é em grande parte impotente em relação à sua própria parte oculta. Por mais que procure dominar, dar forma ou controlar a mente oculta, devido às suas exigências e objetivos sociais imediatos, a mente superficial só consegue arranhar a superfície da mente oculta; e então há um hiato de contradição entre ambas. Procuramos vencer essa divisão através da disciplina, (…) várias práticas, sanções, etc.; mas não conseguimos (Idem, pág. 23) É possível ao ente humano livrar-se totalmente do passado, de modo que se torne novo e olhe a vida de maneira inteiramente diferente? O que chamamos “o inconsciente” - não importa se relativo a passado de cinqüenta ou de dois milhões de anos - não tem existência real. Resíduo racial, tradição, motivos secretos, anseios, prazeres (…). Está sempre na consciência. Só há


consciência, embora não percebamos o seu conteúdo total. (…) todas as nossas atividades, no âmbito do inconsciente, do consciente, do passado, do futuro etc., estão contidas nesse campo. (…) (A Importância da Transformação, pág. 10) É possível estar-se livre em todo o campo da mente, tanto o chamado inconsciente, como no consciente? Como já dissemos, não existe tal coisa - o inconsciente. Só existe o campo da consciência. Podemos estar cônscios de determinada seção do campo, e não estar cônscios do restante. Se não estamos cônscios do restante, não compreenderemos a totalidade do campo. Infelizmente esse campo foi dividido em consciente e inconsciente, (…). Tornou-se moda estudar o inconsciente. (…) (Idem, pág. 47) A revolução implica, por certo, um percebimento total de toda a estrutura psicológica do “eu”, consciente e inconsciente, e que esteja totalmente livre dessa estrutura, sem pensar em “tornar-se outra coisa”. (…) (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 91) (…) Como estive dizendo (…), se não há compreensão do inconsciente, toda “mudança” psicológica é simples ajustamento a um padrão estabelecido pelo inconsciente. E a crise atual (…) exige uma revolução. (Idem, pág. 91) (…) Podemos tentar compreender o inconsciente por meio de exame e análise, mas isso obviamente não produzirá revolução. Podeis modificar, reformar; mas (…) não é revolução, não é completa libertação do passado. Necessita-se de uma mente jovem, nova, “inocente”, e essa mente só pode existir quando nos libertamos psicologicamente do passado. (Idem, pág. 92) Se, a fim de compreender a estrutura total do “eu”, de extraordinária complexidade, procederdes passo a passo, descobrindo camada por camada, examinando cada pensamento, sentimento e motivo, ver-vos-eis todo enredado no processo analítico; que vos levará semanas, meses, anos; e quando admitimos o tempo no processo de autocompreensão, temos de estar preparados para toda espécie de deformação, porquanto o “eu” (…) se move, vive, luta, deseja, nega; (…) (Liberte-se do Passado, pág. 27) (…) Descobrireis, assim, por vós mesmos, que não é esse o caminho que deveis seguir; (…) que a única maneira de olhardes a vós mesmos é fazê-lo totalmente, imediatamente, fora do tempo; e só podeis ver a totalidade de vós mesmos quando a mente não está fragmentada. O que vedes em sua totalidade é a verdade. (Idem, pág. 27) Necessitamos de mudança social (…). Quer conscientes, quer inconscientes, todas nossas ações produzem conflito em nossa existência. O consciente é racional, sua atividade, deliberada. O inconsciente é muito mais forte do que o


consciente. Olhai para dentro de vós mesmos, profundamente, não de acordo com Freud ou outro - olhai-vos realmente. E, para olhardes, deveis estar livres para olhar. Se dizeis: “Isto é correto” ou “Isto é errado”, “Isto é bom” ou “Isto é mau” (…), nesse caso não estais livres para olhar, (…) observar, para penetrar neste imenso campo da consciência. O inconsciente, como já disse, é muito forte. Ele é o repositório racial, coletivo, e nos governa muito mais do que a mente consciente; e, também, tem seus próprios motivos, impulsos, alvos. Envia-nos mensagens através de sonhos (…). Assim, a menos que se opere aquela revolução radical, fundamental, o conflito humano durará infinitamente. (…) (Viagem por um Mar Desconhecido, pág. 115-116) Durante o sono, e freqüentemente nas horas de vigília, quando cessa completamente o vir a ser, quando terminou o efeito de uma causa, então, aquilo que está além do tempo, além da medida de causa e efeito, surge na existência. (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 37-38) Se não pode achar uma conclusão satisfatória, a mente consciente desiste da busca e torna-se quieta; e nessa mente superficial, agora tranqüila, o inconsciente faz surgir, subitamente, uma solução. Ora, a mente inconsciente, a mais profunda, é diversa (…)? O inconsciente não é também constituído de conclusões e memórias raciais, grupais e sociais? Certo, o inconsciente é também o resultado do passado, do desejo, e a diferença consiste, apenas, em estar submerso, e à espera; e, quando solicitado, envia à superfície as suas próprias conclusões ocultas. Se forem satisfatórias, a mente superficial as adota; se não, fica (…) esperando encontrar por milagre uma solução. Se nenhuma solução encontra, reconcilia-se, exausta, com o problema, (…). (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 134-135)


6. INCONSCIENTE COLETIVO; CONSCIÊNCIA DA HUMANIDADE

Estamos tentando olhar a totalidade da vida; e a vida é imensa, não são simplesmente as camadas superficiais de nossa existência diária. A vida é infinita, extraordinariamente sutil, fluida, móvel, sem posição estática; e não é possível compreender a totalidade desse extraordinário movimento da vida com a mente consciente, com todas as suas crenças, conceitos, idiossincrasias, seu ponto de vista fragmentário, porque tal ponto de vista não pode dar percebimento total. (…) (O Descobrimento do Amor, pág. 86) (…) Percebemos, pois, o fato de que o nosso pensar é condicionado pelo passado, o qual se projeta para o futuro; (…) porque não há dois estados tais como o passado e o futuro, mas só um estado que inclui todo o passado - o consciente e o inconsciente, o coletivo e o individual. O passado coletivo e o individual, reagindo ao presente, produzem certas reações que criam a consciência individual; (…). E no momento em que temos o passado, temos inevitavelmente o futuro, porque o futuro não passa de continuidade do passado, modificado, (…) (Que Estamos Buscando, 1ª ed., pág. 176-177) O que conhecemos na vida, atualmente, é uma série de lutas, de ajustamentos, de limitações, de coerções contínuas. E, nesse processo, não há, nunca, renovação, jamais ocorre algo novo. Ocasionalmente, surge uma sugestão, porém, é traduzida pela mente consciente e posta em conformidade com o padrão das nossas conveniências de cada dia. (…) (Poder e Realização, pág. 82) O inconsciente tem um papel muito importante em nossa vida. A maioria de nós não conhece o inconsciente, a não ser através de sonhos, (…) de ocasionais sugestões ou mensagens relativas a coisas que estão ocultas. (…) (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 67) No inconsciente estão enraizadas não só as reações comuns do indivíduo, mas também as reações coletivas da raça a que pertence, no meio cultural em que foi criado - (…) a tremenda acumulação de experiência humana, através das idades. Tudo isso lá está, no inconsciente. Descobrir todo o inconsciente por meio de análise, de investigação gradual, é absolutamente impossível; (…) (Idem pág. 68)


(…) Quando a mente é posta tranqüila, artificialmente, a camada superficial da mente pode receber mensagens, não apenas do seu próprio inconsciente, mas também do inconsciente coletivo; e essas mensagens são traduzidas segundo o condicionamento da mente. (…) (Que Estamos Buscando, 1ª ed., pág. 157) Isso não é questão de análise, porquanto não se pode analisar o inconsciente. Há especialistas, bem sei, que tentam fazê-lo, mas não o creio possível. O inconsciente não pode ser analisado pelo consciente. Já vos digo porquê. Através de sonhos, sugestões, de símbolos, de mensagens diversas, tenta o inconsciente comunicar-se com a mente consciente. Essas sugestões e mensagens requerem interpretação, e a mente consciente as interpreta conforme seu próprio condicionamento, suas peculiares idiossincrasias. (…) (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed. pág. 15) (…) A mente consciente é moldada pela inconsciente; e é muito difícil compreender os secretos motivos, intenções e compulsões do inconsciente, porque não somos capazes de conseguir acesso ao inconsciente pelo esforço consciente. É negativamente que devemos abeirar-nos dele, e não pelo processo positivo da análise. (…) (Idem, pág. 50) O inconsciente é o depósito oculto do passado, individual e coletivo. É o repositório de séculos de propaganda, de toda experiência e conhecimento, das tradições e complexidades de raça.(…). (O homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 130) A mente consciente não pode, jamais, perceber a totalidade. A mente consciente é a mente individual, ao passo que a mente inconsciente nunca é individual. A mente inconsciente é a raça, a experiência coletiva da humanidade. (…) (O Descobrimento do Amor, pág. 85) Aqui estamos tratando de observar o movimento da consciência e sua relação com o mundo, e de ver se essa consciência é individual, separada, ou se é o total da humanidade. Desde a infância se nos educa para sermos indivíduos, cada qual com uma alma separada; (…) (La Llama de la Atención, pág. 103) O cérebro - que se desenvolveu através dos tempos, milhões e milhões de anos - é o cérebro comum da humanidade. Podemos não gostar de constatar isso, porque estamos acostumados à idéia de que nossos cérebros são individuais. (…) (Perguntas e Respostas, pág. 113) (…) O indivíduo não é um processo isolado, separado do todo, mas, sim, o “processo total da humanidade”; por conseqüência, os que sentem verdadeiro interesse e desejam realizar uma revolução de valores, radical e fundamental, esses devem começar por si mesmos. (A Arte da Libertação, pág. 28)


Portanto, primeiro temos de olhar nossa consciência, ver de que está composta, qual é o seu conteúdo. Devemos perguntar-nos se esse conteúdo da consciência (…) é de fato uma consciência individual. Ou se essa consciência individual, que cada um de nós sustenta como separada de outras consciências, não é individual em absoluto? Ou é a consciência da humanidade? (La Llama de la Atención, pág. 82) Por favor, escutem (…). Somente observem (…) o que estamos dizendo: a consciência com que nos temos identificado como indivíduos é em absoluto individual? Ou é a consciência da humanidade? Ou seja, que a consciência, com todo o seu conteúdo de angústia, recordação, dor, atitudes nacionalistas, crenças, cultos, etc., é invariável em todo o mundo. Onde se encontre o homem, está sofrendo, competindo, lutando; está ansioso, cheio de incerteza, soçobro, desespero, desalento, crendo em supersticiosos disparates. Isso é comum a toda a humanidade, quer seja na Ásia, aqui ou na Europa. (Idem, pág. 82-83) De modo que nossa consciência, com a qual nos temos identificado como nossa consciência “individual”, é uma ilusão. É a consciência do resto da humanidade. O ser é o mundo, e o mundo é cada um de nós. (…) Toda a vida têm lutado como indivíduos, como algo separado do resto da humanidade; e quando descobrem que a consciência de cada um de vocês é a consciência do resto da humanidade, isso significa que cada um de vocês é a humanidade, não um indivíduo separado, (…) (La Llama de la Atención, pág. 83)


7. ESPÍRITO-MENTE, ATEMPORAL, VIDA, AMOR, VONTADE (ETERNA)

Se, quando escutais (…), fazeis algum esforço, isto é ainda resultado do conhecido. (…) Notai que todo conhecimento, toda experiência fortalece a vontade, o conhecido, o “eu”, o “ego”, e que essa vontade, esse “eu” nunca pode perceber claramente o que é verdadeiro, jamais achar a Deus (…) porque seu Deus é o conhecido. (Viver sem Temor, pág. 17) Só quando o espírito se encontra num estado de correspondência com o desconhecido, só então há a possibilidade de criação, que é a Verdade. (…) (Idem, pág. 17) Se pensais que sois uma entidade espiritual ou realidade, o que significa isso? Não implica um estado imortal fora do tempo que é eterno? Se ele é eterno, então não tem crescimento; pois aquilo que é capaz de crescimento não é eterno. (…) (Palestras em Ojai e Sarobia, 1940, pág. 95) (…) Se essa essência espiritual é supostamente amor, inteligência, verdade, então como pode ser cercada por essas trevas que confundem (…)? (Idem, pág. 95) (…) E, todavia, esta mente está em busca de alguma realidade que evidentemente deve achar-se fora do tempo; (…) Sendo a mente o único instrumento com que podemos sentir, experimentar, é fora de dúvida que, no movimento de experimentar a Realidade, a mente é da mesma qualidade que a Verdade, o Atemporal, não achais? (Poder e Realização, pág. 70) (…) Onde estais, aí está Ele, e onde estou, aqui Ele está; e quando alguém tem vivido o gozado nesse Reino, está com Ele. Porque tereis encontrado a vós mesmos, tereis encontrado o verdadeiro “Eu”; e uma vez que o tenhais encontrado, podereis sempre voltar à Fonte. (O Reino da Felicidade, pág. 8384) Tendes então a chave de todo o conhecimento, tendes sempre o poder de ser parte da Eterna Compaixão, da Fonte Eterna de todas as coisas.(…) (Idem, pág. 84)


(…) Tal força, tal poder para a luta, tal poder de dar energia para a criação, é o Reino da Felicidade. Se um homem encontrar tal força e ao mesmo tempo tal alegria, tal luta e ao mesmo tempo tal êxtase na vida, tal crescimento e ao mesmo tempo a forma perfeita - tal homem descobrirá que tem dentro de si um Companheiro Eterno, (…) (Idem, pág. 91) (…) Sois o templo externo, e ardendo dentro de vós está o Eterno, o Santo dos Santos, no qual podereis entrar e adorar à vontade, longe do mundo, (…) de todos os tumultos e perturbações. (O Reino da Felicidade, pág. 25) (…) Mas todos são feitos pelas mesmas mãos, (…) com a mesma argila, (…) produto da mesma roda que gira e gira. Na essência nós somos iguais, mas no mundo da forma somos diferentes; e de acordo com essas diferenças varia a nossa compreensão da Verdade. Quanto maiores fordes, quanto mais houverdes sofrido, (…) mais houverdes gozado, mais próximos estareis da unidade com essa Essência. (…) (Idem, pág. 65) (…) Já expliquei o que entendo por individualidade: o estado em que a ação se realiza com entendimento, libertada de todos os padrões - sociais, econômicos ou espirituais. É a isso que chamo verdadeira individualidade, por ser ação nascida da plenitude do entendimento (…). (Coletânea de Palestras, 19301935, pág. 52) Todos vós deveis entrar nesse Reino da Felicidade. (…) Aquele a quem adoramos é o nosso Altar, (…) a Fonte de todas as coisas. Ele está acima de argumentos, (…) de discussões, de ambições pessoais, de lutas pessoais; Ele é o nosso “Eu”. (…) (O Reino da Felicidade, pág. 70) Enquanto puderdes (…) só podeis refletir a pureza desse Reino quando houverdes encontrado o vosso verdadeiro Ser (Self), quando viverdes eternamente nesse Reino e O tiverdes como Eterno Companheiro. Então tereis em vós essa paz que dá imensa força e poder (…) Aquela Voz que está sempre chamando, (…) (Idem, pág. 89) (…) Ó Amado,/ O Ser do qual tu és o todo,/ Procura o caminho do iluminado êxtase. (A Canção da Vida, 4ª ed., 1982, III, 2, pág. 10) (…) Ó Amado,/ O Ser do qual tu és o todo,/ Dança a Canção da Eternidade. (Idem, 111, 4, pág. 10) (…) Ó Amado, o Ser do qual tu és a totalidade,/ Está em fusão para unir-se ao incorruptível. (Idem, III, 6, pág. 11) O Ser, o Amado,/ A oculta e integral beleza,/ É a imortalidade do amor. (Idem, VI, 3, pág. 15)


Ó Vida, Ó Amado,/ Só em ti está o perene amor,/ Só em ti reside o eterno pensamento. (Idem, XXV, 3, pág. 43) (…) Ó Amado,/ O Ser do qual tu és o todo,/ Marcha para o centro de todas as coisas. (Idem, III, 3, pág. 10) Ó amigo!/ Procura o Amado,/ Nos secretos recessos do teu coração./ (…) (Idem, XXI, 3, pág. 35) Inteligência, para mim, não é o conhecimento tirado dos livros. Podeis ser mui eruditos e, apesar disso, estúpidos. Podeis haver lido muitas filosofias e, apesar disso, desconhecer a beatitude do pensamento criativo, o qual somente pode existir (…) pelo constante apercebimento das coisas estúpidas do passado e das que estiverem sendo criadas. Somente então virá à existência o êxtase do que é verdadeiro. (Palestras em New York City, 1935, pág. 21) (…) Tendes pois de estar enamorados da Vida. Isso exige grande inteligência, não informações ou conhecimentos, porém essa grande inteligência que desperta quando defrontais a Vida abertamente, completamente, quando a mente e o coração estiverem por completo vulneráveis em face da Vida. (Idem, 1935, pág. 60) (…) A vida é o desconhecido, assim como a morte é o desconhecido, como a verdade é o desconhecido. A vida é o desconhecido; mas nós nos aferramos a uma insignificante expressão dessa vida, e isso a que nos apegamos é simples memória, (…). A mente se apega a essa coisa vazia, chamada memória, e memória é a mente, o “eu”, (…) (A Arte da Libertação, pág. 131) Assim, pois, depende da mente que a Verdade seja absoluta ou eterna. (…) Mas a mente que está cônscia de tudo o que se passa interiormente, e percebe a verdade aí contida, essa mente é atemporal; só essa mente pode saber o que existe para além das palavras, dos nomes, do permanente e do transitório. (Novos Roteiros em Educação, pág. 142-143) (…) Quando o “eu” já não está lutando, consciente ou inconscientemente, para tornar-se algo, quando o “eu” está de todo inconsciente de si mesmo, nesse momento se verifica aquele estado de devoção, aquele estado de Realidade. Nesse momento, a mente é o Real, é Deus. (…) (Poder e Realização, pág. 71) (…) Não há então, no centro, uma revolução, uma transformação fundamental? (…) Então, não há mais temor. A mente, em si mesma, é o desconhecido; é o novo, “o não contaminado”. Por conseguinte, é o Real, o incorruptível, independente do tempo. (Idem, pág. 73)


O adestramento do intelecto não produz inteligência. Antes, a inteligência surge quando se age em perfeita harmonia, intelectual e emocionalmente. (…) O intelecto é o mero pensamento funcionando independentemente da emoção (sentimento). Quando o intelecto, divorciado da emoção (sentimento), é adestrado numa direção particular, pode-se ter grande intelecto, mas não se tem inteligência, porque na inteligência há a capacidade inerente de sentir tanto como a de raciocinar, (…) intensa e harmoniosamente. (Palestras na Itália e Noruega, 1933, pág. 125) (…) Inteligência é o resumo de vossas experiências, que vos proporciona, não somente a razão, mas também essa outra capacidade que se denomina intuição. (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 16) (…) A mente, porém, que só quer “vir a ser” não pode compreender o “ser”. É a compreensão do “ser”, (…) daquilo que somos, que produz uma extraordinária exaltação, a libertação do pensamento criador, da vida criadora. (Debates sobre Educação, pág. 97) (…) Inteligência é a verdade, a plenitude, a beleza e o amor mesmo. E nenhum mestre, nem disciplina alguma, vos conduzirão a ela. (…) (A Luta do Homem, pág. 89) Eu vos asseguro que, quando houver completa nudez, completa falta de esperança, então num momento assim, de vital insegurança, nascerá a chama da suprema inteligência, a beatitude da verdade. (Palestras em New York City, 1935, pág. 24) Há duas espécies de vontade - a vontade que nasce do desejo, da carência, do anseio, - e a vontade do discernimento, da compreensão. (Palestras em Ojai, Califórnia, 1936, pág. 94) A vontade resultante do desejo, baseia-se no esforço consciente de aquisição, (…). Este esforço consciente ou inconsciente de querer, de ansiar, cria a totalidade do processo do “eu”, e daí surgem o atrito, a tristeza e a cogitação do além. Desse processo surge também o conflito entre os opostos.(…) (Idem, pág. 94-95) O que estou dizendo é que, para viver com grandeza, para pensar criativamente, tem o indivíduo de estar por completo aberto à vida, isento de quaisquer reações autoprotetoras (…). Tendes pois de estar enamorados da vida. Isto exige grande inteligência, (…) (Palestras em New York City, 1935, pág. 60)


(…) Não há respostas para a vida; a vida é uma “coisa viva”, de momento a momento, e o homem que busca uma resposta para a vida está buscando a estagnação da mediocridade. (…) (As Ilusões da Mente, pág. 44) A vida é como o rio - fluente, célere, fugitiva, sempre em movimento. Ides ao encontro da vida com o pesado fardo da memória, da experiência; e por isso, naturalmente, nunca tendes contato com a vida. Vosso contato (…)e, gradualmente, o saber e a experiência se tornam os fatos mais destrutivos da vida. (Novos Roteiros em Educação, pág. 149-150) (…) Por certo, uma vida que tem significação, que contém as riquezas da verdadeira felicidade, não pertence ao tempo. Como o amor, a vida é atemporal; (…) (A Arte da Libertação, pág. 160) (…) A vida, o amor, a realidade são sempre novos e são necessários mente e coração viçosos para compreendê-los. O amor é sempre novo, mas esse frescor é estragado pelo intelecto mecânico, com as suas complexidades, ansiedades, ciúmes e assim por diante. (Palestras em Ommen, Holanda, 19371938, pág. 112-113) O amor não pertence ao tempo, não é alcançável por meio de esforço consciente, (…) de disciplina, de identificação, pois tudo isso faz parte do processo do tempo. A mente, que só conhece o processo do tempo, não pode reconhecer o amor. O amor é a única coisa eternamente nova. (…) (A Primeira e Última Liberdade, 1ª ed., pág. 126) Nossa questão (…). Onde há ação do “eu” há amor. O amor não é do tempo, não podeis praticar o amor, pois isso seria uma atividade consciente do “eu”, que espera, por meio do amor, alcançar um resultado. (Quando o Pensamento Cessa, pág. 211) (…) Uma vez que os mais de nós temos cultivado a mente, (…) não sabemos o que é o amor. Falamos a respeito do amor; (…) mas, no momento em que estou consciente de que amo, entrou em atividade o “eu” e, conseqüentemente, o amor deixou de existir. (Idem, pág. 211-212) O amor não pode ser cultivado. Só encontrareis o amor nas relações; (…) quando existe o amor, que é a sua própria eternidade, não há então a busca de Deus, porque o amor é Deus. (A Arte da Libertação, pág. 195) Ora, não há vontade divina, mas apenas a vontade simples, comum, do desejo: a vontade de obter sucesso, de estar satisfeito, de ser. Essa vontade é uma resistência, e é fruto do medo, que guia, escolhe, justifica, disciplina. Essa vontade não é divina. Ela não está em conflito com a chamada vontade divina, mas (…) é uma fonte de tristeza e de conflito, porque é a vontade do medo.


Não pode haver conflito entre a luz e a treva; onde existe uma, não existe a outra. (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1937-1938, pág. 103) (…) Se assim estiverdes apercebidos, há uma nova espécie de vontade ou de compreensão, que não é a vontade do conflito ou da renúncia, mas da plenitude, que é divina. Esta compreensão é a aproximação da realidade, que não é produto da vontade de conseguir, da vontade da ansiedade e do conflito. A paz é dessa totalidade, dessa compreensão. (Palestras em Ojai e Sarobia, 1940, pág. 27-28) (…) Quando começardes a discernir, por meio da experiência, como a ação nascida da carência cria sua própria limitação, então haverá mutação de vontade. Até então há apenas mudança na vontade. É a atividade automantenedora da ignorância (…). A mudança fundamental de vontade é inteligência. (Palestras em Ommem, Holanda, 1936, pág. 17) Nota: Segundo várias fontes, orientais e ocidentais, incluindo Escrituras, formam o espírito e seu campo a mente abstrata, atemporal, respectiva inteligência (manas sem kâma); amor, sabedoria, puro, vida, buddhi, origem da intuição; e vontade, unidade divina (atam). Foram aqui reunidos textos pertinentes, de Krishnamurti.


8. INTELIGÊNCIA, DISCERNIMENTO, PERCEBIMENTO, CONCEITOS

Pergunta: Que é inteligência? Krishnamurti: (…) A maioria das pessoas se satisfaz com uma definição do que é inteligência. (…) A mente inteligente é aquela que investiga, (…) observa, aprende, estuda. E isso significa o quê? Que só há inteligência quando não há medo, quando estais disposto a rebelar-vos contra toda a estrutura social, a fim de descobrir o que é Deus, (…) a verdade relativa a qualquer coisa. (A Cultura e o Problema Humano, pág. 19) Inteligência não é sapiência. Se pudésseis ler todos os livros do mundo, isso não vos daria inteligência. A inteligência é coisa muito sutil; ela não tem ancoradouro. Surge quando compreendeis o processo total da mente (…). A inteligência, pois, surge com a compreensão de vós mesmos; e só podeis compreender-vos em relação com o mundo das pessoas, das coisas, e das idéias. Inteligência não é coisa adquirível, como a sapiência; ela surge (…) quando não há medo; quando há sentimento de amor, (…). (Idem, pág. 19) Compreender o falso como falso, perceber o verdadeiro no falso, reconhecer o verdadeiro como verdadeiro, eis o começo da inteligência. (…) (Reflexões sobre a Vida, 1ª ed., pág. 58) Vamos investigar juntos o que é a inteligência. (…) Um dos fatores da inteligência é o de investigar e descobrir; explorar a natureza do falso, porque na compreensão do falso, no descobrimento do que é ilusão, está a verdade, que é inteligência. (La Llama de la Atención, pág. 113) A inteligência tem uma causa? O pensamento tem uma causa. Um indivíduo pensa porque possui experiências passadas, informação e conhecimento acumulado através do tempo. Esse conhecimento nunca é completo, tem de andar junto com a ignorância, (…). O pensamento, por força, tem de ser parcial, limitado, fragmentado, porque é o produto do conhecimento, (…). O pensamento criou as guerras e os instrumentos da guerra (…). O pensamento criou todo o mundo tecnológico. (…) (Idem, pág. 113-114) Que é inteligência? Inteligência é perceber o ilusório, o falso, o irreal e descartá-lo; não afirmar meramente que é falso e continuar no mesmo, sem


descartá-lo por completo. (…) Ver, por exemplo, que o nacionalismo, com todo o seu patriotismo, seu isolamento, sua estreiteza de idéias é destrutivo, (…). E ver a verdade disso, é descartar o falso. Isso é inteligência. (…) Inteligência não é a engenhosa busca de argumentos, de opiniões contraditórias que se opõem umas às outras. (…) A inteligência está mais além do pensamento. (La Llama de la Atención, pág. 127-128) Não desejo ser parcialmente inteligente, mas inteligente de maneira integral. Quase todos nós somos inteligentes “em camadas”, vós provavelmente num sentido, e eu em outro. Alguns de vós sois inteligentes nas atividades comerciais, outros nas (…) de escritório, etc. As pessoas são inteligentes de diferentes maneiras, mas não somos integralmente inteligentes. Ser integralmente inteligente significa existir sem o “eu”. (…) (A Primeira e Última Liberdade, 1ª ed., pág. 78) Inteligência não é acumulação de experiências e de conhecimento. Inteligência é o mais alto grau de sensibilidade. Ser sensível a todas as coisas, aos pássaros, à sordidez, à pobreza, à beleza de uma árvore, à formosura de um rosto, ao ocaso, às cores, (…) ao sorriso de uma criança, às lágrimas, ao riso, à dor, à agonia, à angústia, às desditas (…) - ser totalmente sensível a tudo significa ser inteligente. E não podemos ser inteligentes se cuidamos apenas de reprimir ou de ceder. Só podemos ser sensíveis quando há compreensão. (A Suprema Realização, pág. 44) Que é inteligência? Um homem que está assustado e ansioso; que é invejoso e ávido; cuja mente está copiando, imitando, cheia de saber e da experiência de outros; cuja mente é limitada, controlada, moldada pela sociedade, pelo ambiente - esse homem é inteligente? Vós o chamais inteligente, mas não o é, (…). (Novos Roteiros em Educação, pág. 152) (…) Estar consciente de tudo isso, sem opção, sem ser tragado pela complexidade das questões vitais, sem resistir ao fluxo avassalador da vida, é ser inteligente. Implica também não depender das circunstâncias e, portanto, estar apto a compreender e a libertar-se da influência e das condições ambientais. (…) Mas, a inteligência supera todas as barreiras, livre de qualquer objetivo de ganho individual ou coletivo. (…) A capacidade de destruir o passado psicológico é a essência da inteligência, (…). O sofrimento é a negação da inteligência. (Diário de Krishnamurti, pág. 81) Tem o amor uma causa? Dissemos que a inteligência não tem causa - é inteligência, (…) é luz. Quando há luz, não é minha luz ou a luz de vocês. O sol não é o sol de vocês ou meu sol; é a claridade da luz. Tem o amor uma causa? Se não tem, então o amor e a inteligência caminham juntos. (…) (La Llama de la Atención, pág. 120)


Devemos discutir também a natureza da inteligência. A compaixão tem sua própria inteligência, o amor tem sua inerente inteligência. Vamos investigar o que é inteligência. Certamente, não pode ser ela encontrada em livros. Conhecimento não é inteligência. Onde há amor, compaixão, há a beleza de sua própria inteligência. A compaixão não pode existir se você é hindu, católico, protestante, budista ou marxista. O amor não é produto do pensamento. No entendimento da natureza do amor, compaixão, que é negar tudo aquilo que não é, ver o falso no falso é o início da inteligência. (…) Ver a natureza da desordem, e terminá-la, não continuá-la dia após dia, mas cessá-la - o fim é percepção imediata, que é inteligência. (Mind Without Measure, pág. 58-59) Estamos perguntando o que é inteligência. Esperteza não é inteligência. Ter grande quantidade de conhecimento sobre vários assuntos - matemática, história, ciência, poesia, pintura - não constitui atividade da inteligência. O investigador do átomo pode ter extraordinária capacidade de concentração, imaginação, investigação, discussão, formulação de hipóteses e mais hipóteses, teorias e mais teorias, mas tudo isso não é inteligência. (…) (Idem, pág. 59) Inteligência, para mim, não é o conhecimento tirado dos livros. Podeis ser mui eruditos e, apesar disso, estúpidos. Podeis haver lido muitas filosofias e, apesar disso, desconhecer a beatitude do pensamento criativo, o qual somente pode existir quando a mente e o coração começarem a se libertar (…) pelo constante apercebimento das coisas estúpidas (…). Somente então virá à existência o êxtase do que é verdadeiro. (Palestras em New York City, 1935, pág. 21) Que é conhecimento? (…) A inteligência utiliza-se dos conhecimentos, pois ela é a capacidade de pensar com clareza, objetividade, sensatez, naturalidade. Conseqüentemente, é isenta de emoção, preconceito, preferências ou inclinações pessoais. Inteligência é a capacidade de compreensão direta. (…) Inteligência é a qualidade característica da mente sensível, viva, consciente. Ela não se prende a nenhum juízo ou avaliação pessoal, e faculta imparcialidade e lucidez ao pensamento. A inteligência em nada se deixa envolver. (…) (Ensinar e Aprender, pág. 19) Inteligência não é inventividade, memória, ou mero exercício verbal. É muito mais do que isso. Por bem informados e talentosos que sejamos, em certo aspecto da existência, somos ignorantes em outros sentidos. O acúmulo de conhecimentos não reflete, necessariamente, uma mente inteligente. Tampouco a capacidade e o talento. Mas a sensível percepção da vida, de


seus problemas, (…) contradições, (…) aflições e alegrias, revela sabedoria. (…) (Diário de Krishnamurti, pág. 81) A maioria pensa que inteligência é resultado da aquisição de conhecimento, informação, experiência. Por ter grande soma de conhecimento e experiência, acreditamos ser capazes de fazer face à vida com inteligência. Mas a vida é uma coisa extraordinária, nunca é estacionária; como o rio, está fluindo constantemente, nunca pára. (…) (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 139) A inteligência só é possível quando há liberdade real em relação ao ego, (…) ao “eu”, isto é, quando a mente já não seja o centro da busca de “mais e mais”; quando ela já não está subjugada pelo desejo de experiência maior, mais vasta, mais expansiva. (…) A compreensão de todo esse processo é o autoconhecimento. Quando alguém se conhece tal como é, sem um centro acumulador, desse autoconhecer provém a inteligência capaz de fazer face à vida; e essa inteligência é criativa. (Idem, pág. 140) A dimensão diferente só pode operar através da inteligência; se não há essa inteligência, ela não pode operar. Dessa forma, na vida diária ela só pode operar quando a inteligência está funcionando. A inteligência não pode operar quando o velho cérebro está ativo, quando há qualquer forma de crença e aderência a qualquer fragmento particular do cérebro. Tudo isso é falta de inteligência. (…) Quando se descobre a limitação do velho, esta mesma descoberta é inteligência. (The Awakening of Intelligence, pág. 412) (…) Para mim, inteligência é a mente e o coração em plena harmonia; e então verificareis, por vós mesmos (…), o que é essa realidade. (Palestras em Auckland, 1934, pág. 112-113) A inteligência é a essência mesma da divindade; mas é evidente que a inteligência tanto pode criar como destruir, que ela governa e dirige as emoções - é o impulso que nos propele para o nosso alvo. (…) (O Reino da Felicidade, pág. 56) (…) A inteligência pode e deve encontrar por si mesma a Verdade, deve aprender a viver sua própria vida no Reino da Felicidade. Sem um espírito cultivado e uma inteligência inata, não vos será possível aproximar-vos do alvo. (…) (Idem, pág. 56) O êxtase da Realidade encontra-se pela inteligência desperta e no mais alto grau de intensidade. Inteligência não significa cultivo da memória ou da razão, mas, sim, uma percepção da qual é banida a identificação e a escolha. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 199)


Uma inteligência desperta tem um discernimento profundo, verdadeiro, em todos os problemas psicológicos, nas crises, nos bloqueios, etc.; não é uma compreensão intelectual, não é um (…) conflito. Ter discernimento é uma questão humana, é despertar esta inteligência; ou, tendo esta inteligência, existe o discernimento (…). Em um discernimento assim, não há conflito; (…) A partir desse discernimento, que é inteligência, surge a ação (…) instantânea. (La Totalidad de la Vida, pág. 177) Porém, se se acham atentos a todas essas coisas e estão insatisfeitos (…) A chama do descontentamento, devido a não haver saída, (…) não haver um objeto no qual satisfazer-se, se converte em uma grande paixão. (…) Visto que a compaixão está relacionada com a inteligência, não há inteligência sem compaixão. E só pode haver compaixão quando houver amor, o que é completamente livre de todas as recordações, ciúmes pessoais e assim por diante. (O Futuro da Humanidade, pág. 70) Essa paixão é inteligência. Se vocês não se encontram perturbados nestas coisas superficiais (…), essa chama extraordinária se intensifica. Isso produz na mente uma qualidade de profundo e instantâneo discernimento (…), e a ação provém desse discernimento. (La Totalidad de la Vida, pág. 178) Há uma inteligência que seja incorruptível, não baseada em circunstâncias, não pragmática, não egocêntrica, quer dizer: não fracionada, total? Há uma inteligência que seja impecável, sem frestas, que abarque toda a manifestação do homem? Para inquirir sobre isto, deve o cérebro estar livre de qualquer conclusão, (…) de movimento egocêntrico, (…) de medo, de sofrimento. Quando há o fim do sofrimento, há paixão. (…) Não há paixão “por” alguma coisa. A paixão existe per se, por si mesma (…). Assim, se tem que descobrir (…) como se aproximar dessa paixão, que não é luxúria nem tem nenhum motivo. Há tal paixão? (…) Quando o sofrimento chega ao fim, há amor e compaixão. E quando há compaixão, (…) então essa compaixão tem sua própria quintessência e inteligência. Isto é, não pertence ao tempo nem a teoria alguma, a nenhuma tecnologia, a ninguém; tal inteligência não é pessoal nem universal, nem as palavras a exprimem. (Last Talks at Saanen, 1985, pág. 138139) (…) Inteligência é a atividade do todo da vida, e essa inteligência não é sua nem minha. Não pertence a nenhum país ou povo, como o amor não é cristão ou hindu, etc. Portanto, (…) pesquisem sobre tudo isto, porque nossas vidas dependem disso. Somos pessoas desafortunadas e miseráveis, sempre em conflito. (…) Temos aceitado isso como parte da vida. Mas se investigarmos


tudo isso, dá-se o despertar daquela inteligência, e, quando ela se acha em operação, ação, só então há correta ação. (Mind Without Measure, pág. 59) Não é a inteligência de um homem engenhoso, não estamos falando disso. Agora opere com essa inteligência, que não é sua nem minha - que não é do Dr. Shaimberg, do Dr. Bohm ou de outra pessoa. Esse discernimento é inteligência universal, inteligência global ou cósmica. Avançando mais nisso, tenha um discernimento na dor que não é a dor do pensamento. Então, nesse discernimento há compaixão. (La Totalidad de la Vida pág. 131) Agora tenha um discernimento na compaixão. É a compaixão o fim de toda a vida? O fim de toda a morte? Parece sê-lo, porque a mente se esvazia de todas as cargas que o homem se impôs a si mesmo (…). Portanto, você tem esse sentimento extraordinário, tem dentro de si essa coisa tremenda. Aprofunde-se nessa compaixão. E então há algo sagrado, não contaminado pelo homem. E isso pode ser a origem de todas as coisas - que o homem mutilou. Entende? (Idem, pág. 131) (…) A mente despida de todas as suas lembranças e óbices, funcionando espontaneamente, plenamente, a mente, vigilante e perceptiva, cria a compreensão, e isso é inteligência, (…); isso para mim é imortalidade, atemporalidade. (…) (A Luta do Homem, pág. 60) Inteligência é o discernimento do essencial, e para discernir o essencial temos de estar livres dos obstáculos que a mente “projeta” (…) (A Educação e o Significado da Vida, pág. 39) A chama da inteligência, do amor, só pode ser despertada quando a mente está vitalmente apercebida do próprio pensamento condicionado, com seus temores, valores e desejos. (Palestras em Nova York, Eddington, Madras, 1936, pág. 80-81) (…) A inteligência pura é aquele estado mental em que há um percebimento isento de escolha, em que a mente está silenciosa. Nesse estado de silêncio só há o ser; nele, surge aquela Realidade (…) maravilhosa atividade criadora, que está fora do tempo. (As Ilusões da Mente, pág. 35) Por “percebimento”, entendo um estado de vigilância em que não há escolha. Estamos simplesmente observando o que é. Mas ninguém pode observar o que é, se tem alguma idéia ou opinião a respeito do que vê, dizendo-o “bom” ou “mau”, (…) avaliando. (Experimente um Novo Caminho, pág. 99) (…) Mas, acontece que a mente da maioria de nós está embotada, semiadormecida; só certas partes dela se acham ativas - as partes especializadas, pelas quais funcionamos automaticamente, pela associação, pela memória, tal


como um cérebro eletrônico. A mente, para ser vigilante, sensível, necessita de espaço, no qual possa olhar as coisas sem nenhum fundo de conhecimentos prévios; (…) (Idem, pág. 99-100) Devemos ficar apercebidos, atentos. (…) Concentração é a convergência de todas as energias sobre alguma coisa na qual estamos interessados. (…) O começo do apercebimento é a natural concentração do interesse em que não há conflito de desejos e escolha, e, por isso, há a possibilidade de se compreenderem os diferentes desejos que se opõem. (…) (Palestras em Ojai e Sarobia, 1940, pág. 101) (…) Apercebimento é a compreensão total do processo do desejo consciente e inconsciente. No princípio mesmo do apercebimento, há a percepção do que é verdadeiro; a verdade não é um resultado ou uma consecução, mas é para ser compreendida. (…) Esta compreensão não nasce da simples razão ou da emoção, porém é o resultado do apercebimento, da perfeição da açãopensamento. (Idem, pág. 102) A compreensão não reside nos livros. Podeis ser estudiosos de livros (…), mas, se não souberdes como viver, todo o vosso conhecimento fenece; não tem substância nem valor. Enquanto que, um momento de pleno apercebimento, de pleno entendimento consciente, produz uma paz real, perene; não uma coisa estática, mas esta paz que está continuamente em movimento, que é ilimitada. (Palestras em Auckland, 1934, pág. 72) A percepção é o processo de libertar a mente-coração dos vínculos que causam conflitos e dores, e torná-la receptiva para o que está oculto. (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 122) Eu vos asseguro que, quando houver completa nudez, (…) falta de esperança, então, num momento assim, de vital insegurança, nascerá a chama da suprema inteligência, a beatitude da verdade. (New York City, 1935, pág. 24) Como disse (…), inteligência é a solução única que produzirá a harmonia neste mundo de conflito, harmonia entre a mente e o coração, na ação. (…) Vós próprios, mediante o vosso apercebimento, (…) é que podereis discernir o verdadeiro significado destas múltiplas barreiras limitadoras. Só isso produzirá a inteligência perdurável, que vos há de revelar a imortalidade. (Idem, pág. 27) Isto é, se estiverdes plenamente despertos, apercebidos de uma ação que exija o vosso ser inteiro, então percebereis que todas essas perversões ocultas, inconscientes, virão à tona e vos impedirão de agir plenamente, de modo completo. Será essa a ocasião, então, de lhes fazer frente e, se a chama do apercebimento for intensa, essa chama consumirá as causas limitadoras. (Idem, pág. 32)


Ora, o apercebimento não é isso. O apercebimento é o discernir, sem julgamento, o processo de criar muros autoprotetores e limitações por detrás das quais a mente toma abrigo e conforto. (Palestras em Nova York, Eddington, Madras, 1936, pág. 38) (…) A compreensão surge somente pelo discernimento do processo do “eu”, com sua ignorância, suas tendências e temores. Onde houver profunda e criadora inteligência, haverá reta educação, reta ação e relações retas com o ambiente. (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 60) A ação é vital, porém não (…) as opiniões e conclusões lógicas. (…) A autoridade do ideal e do desejo impede e perverte o verdadeiro discernimento. Quando há carência, quando a mente está cativa dos opostos, não pode haver discernimento. (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 13-14) (…) As reações psicológicas impedem o verdadeiro discernimento. Se dependermos da escolha, do conflito dos opostos, criaremos sempre a dualidade em nossas ações, engendrando assim a tristeza, (…) (Idem, pág. 14) (…) O discernimento é a percepção direta, sem escolha, daquilo que é, e perceber diretamente é estar livre do fundo da carência. Isto só pode acontecer quando cessa o esforço (…) entre os opostos. Os opostos são resultado da carência (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 22) (…) Pelo discernimento sem escolha desperta-se a intuição criadora, a inteligência, que é a única a poder libertar a mente-coração dos múltiplos processos sutis da ignorância, da carência e do medo. (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 55)


9. SENTIMENTO, SENSAÇÃO, DISTINÇÃO; SENSIBILIDADE

“Sentir” é a capacidade de apreciar a curva de um ramo de árvore, (…) as coisas sórdidas, a lama da estrada, ser sensível ao sofrimento de outrem, assistir com enlevo ao crepúsculo. Isso não é sentimento, nem mera emoção. Emoção e sentimento ou sentimentalidade podem converter-se em crueldade, e ser explorados pela sociedade; e o indivíduo sentimental, impressionável, torna-se escravo da sociedade. Mas, necessitamos da capacidade de sentir intensamente; sentir a beleza, (…) a palavra e o silêncio entre duas palavras. Dessa capacidade necessitamos, (…) torna a mente altamente sensível. (A Suprema Realização, pág. 17) Assim como um sentimento pode ser interpretado, assim também é possível darmos a qualquer sentimento a aparência de Realidade. A tradução depende do intérprete e, se este for influenciado por preconceitos, se é ignorante, se tiver sido moldado por um padrão de pensamento, a sua compreensão corresponderá a esse condicionamento. (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 54) (…) O sentimento de terdes conseguido algo, de serdes mais hábil que outro, (…) de vos terdes tornado um homem bem sucedido, respeitado, considerado, um exemplo para outros - que indica tudo isso? Naturalmente, esse sentimento é acompanhado de orgulho (…). E, assim, quando existe esse sentimento da importância do “eu”, há o conflito, a luta, o esforço para manter esse estado ininterruptamente. (Novos Roteiros em Educação, pág. 104-105) Que entendeis por “emoção”? Sensação, reação, “resposta” dos sentidos? Ódio, amor, o sentimento de amor ou simpatia por outra pessoa: são emoções. A umas, como o amor e a simpatia, chamamos positivas, enquanto a outras, como o ódio, chamamos negativas, (…). (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 57) (…) O sentimento é endurecido pelo intelecto e pelas suas numerosas e sutis racionalizações, (…). Podeis compreender tudo isso, (…) mas de pouca importância será; somente o conhecimento e o sentimento podem produzir a centelha criadora da compreensão. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 43)


A sensação e a reação têm de gerar sempre conflito, e o próprio conflito é uma nova sensação. (…) A atividade da mente, em todos os seus diferentes níveis, é favorecer a sensação; (…). (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 237) A sensação é uma coisa, e a felicidade, outra. A sensação está sempre buscando mais sensação, em círculos cada vez mais largos. Não há fim para os prazeres da sensação; (…) há sempre o desejo do mais, e a exigência do mais nunca tem fim. A sensação e a insatisfação são inseparáveis, porque o desejo do mais liga uma à outra (…) e, quando são contrariadas, há cóleras, há ciúme, há ódio. (…) (Idem, pág. 237) A mente não pode conhecer a felicidade. A felicidade não é uma coisa que se pode procurar e achar, como a sensação. (…) Felicidade lembrada é apenas sensação, (…). O que se acabou não é a felicidade; a experiência da felicidade que se apagou é sensação, porque lembrança é o passado (…). (Idem, pág. 238) Temos, não raro, emoções religiosas, vagas, às vezes, outras bem precisas. São emoções que nos infundem intensa devoção e alegria, que nos requintam a sensibilidade, que nos dão um fugaz sentimento de união com todas as coisas. Procuramos, depois, com a ajuda dessas inspirações, resolver os nossos problemas e afeições. São numerosas tais revelações, mas o pensamento, cativo do tempo, da confusão e da dor, procura servir-se delas como estimulantes que o ajudem a vencer os conflitos. (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 231) (…) Qualquer tipo de sensação, por mais requintada ou vulgar que seja, cria a resistência, (…). Ser sensível é morrer para cada resíduo da sensação; ser sensível, de maneira absoluta e contundente, a uma flor, a uma pessoa ou a um sorriso, é estar livre das marcas da memória, responsáveis pela destruição da sensibilidade. Estar consciente de todo o processo das sensações, dos sentimentos e das demais manifestações do pensamento, impede a formação de marcas e cicatrizes. As sensações, os sentimentos e os pensamentos são sempre fragmentados, parciais e, portanto, de efeito destruidor. A sensibilidade é a síntese do corpo, da mente e do coração. (Diário de Krishnamurti, pág. 149) A sensação e a sensibilidade são duas coisas diferentes. A mente escrava do pensamento, da sensação, das emoções, é uma mente residual. Ela aprecia o resíduo, pensa no mundo dos prazeres, deixando cada pensamento uma marca, que constitui o resíduo. Essa marca contribui para embrutecer e insensibilizar a mente; e a disciplina, o controle e a repressão ainda a tornam mais embrutecida. Estou dizendo que a sensibilidade não é sensação, (…) não deixa marca nem resíduo. (…) (Ensinar e Aprender, pág. 85-86)


No mundo moderno, (…) tendemos a perder a sensibilidade. Pela palavra “sensibilidade” não entendo sentimentalidade, emocionalismo, nem mera sensação, porém a capacidade de percepção, (…) de ouvir, de escutar, de sentir a ave que canta (…). É muito difícil à maioria de nós sentir as coisas com intensidade, porque temos tantos problemas! (…) (A Suprema Realização, pág. 17) A sensibilidade no mais alto grau é inteligência. Se o indivíduo não é sensível a tudo - a seu próprio sofrimento, ao sofrimento de um grupo humano (…); ao sofrimento de tudo que vive (…), não pode resolver nenhum dos seus problemas. E temos muitos problemas, não só no nível físico, (…) econômico, (…) social, mas também nos níveis mais profundos de nossa existência (…). E nossos problemas, tanto conscientes como inconscientes, embotam-nos a mente, roubam-lhe a sensibilidade. E perder sensibilidade é perder inteligência. (Idem, pág. 17-18) O conflito leva à insensibilidade. A mente pode dominar o corpo e suprimir os sentidos, mas, desse modo, torna o corpo insensível; e um corpo insensível torna-se um obstáculo ao pleno vôo da mente. A mortificação do corpo absolutamente não leva à busca das camadas mais profundas da consciência; pois isso só é possível quando mente, emoções e corpo não estão em contradição entre si, mas (…) integrados e em uníssono, sem esforço e sem que sejam forçados por qualquer conceito, crença, ideal. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 17) Sensibilidade e sensação são duas coisas distintas. As sensações, as emoções e os sentimentos sempre deixam resíduos, cujo acúmulo acaba por deformar e embrutecer a mente. Por serem contraditórias, as sensações sempre produzem conflito, e este, por sua vez, embota a mente e distorce a percepção. Apreciar a beleza das coisas em termos de sensação, de gostar ou não gostar, é o mesmo que estar insensível ao belo; a sensação distingue o belo do feio; mas, a divisão é incapaz de perceber a beleza. (…) (Diário de Krishnamurti, pág. 149) Ter sensibilidade significa ser sensível a tudo o que nos cerca - às plantas, aos animais, às árvores, ao céu, às águas do rio, aos pássaros; e também ao estado de humor das pessoas que nos cercam, e dos estranhos pelos quais passamos. Essa sensibilidade acarreta a qualidade de ação não calculada, não egoísta, que é a verdadeira moral (…) e conduta. Sendo sensível, a criança será franca, não será retraída em sua conduta; portanto, uma simples sugestão por parte do professor será aceita com facilidade, sem resistência nem atrito. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 13)


Em todo o mundo, (…) o aprender exige sensibilidade. Se não sois sensível a vós mesmo, a vosso ambiente, a vossas relações, (…) ao que se está passando em derredor de vós, (…) então, por mais que vos disciplineis, vos ireis tornando cada vez mais insensível, (…) mais egocêntrico - e isso gera problemas (…). (A Luz que não se Apaga, pág. 76) Por que sou eu ou por que sois vós tão insensíveis ao sofrimento de outro homem? Por que somos indiferentes para com o carregador que transporta uma pesada carga, para com a mulher que tem nos braços o seu filho? (…) Não há dúvida de que é o sofrimento que nos torna insensíveis; por não compreendermos o sofrimento, tornamo-nos indiferentes a ele. Se compreendo o sofrimento, torno-me sensível. (…) (Novo Acesso à Vida, pág. 111) (…) Se existe falta de sensibilidade para a fealdade, para a tristeza, deverá existir também uma profunda insensibilidade para a beleza, para a alegria (…). (Palestras em Ommen, Holanda, 1937-1938, pág. 42) Assim, intelectualmente, estais sendo tolhido, sufocado, controlado, moldado (…), não há (…) libertação. Tampouco a há do ponto de vista emocional - mas não deis à palavra “emocional” o sentido de sentimental. Um ente sentimental é perigoso, pode tornar-se cruel, estúpido, insensível. (…) (Uma Nova Maneira de Agir, 1ª ed., pág. 122) Para se ver a beleza do rosto de uma pessoa, (…) de um rio, de uma folha caída, (…) de um sorriso, (…) de uma ave a voar, necessita-se (…) de alta sensibilidade, (…). (Idem, pág. 122) Necessitais desse sentimento extraordinário, dessa sensibilidade para tudo: para o animal, (…) as podridões da miséria e do desespero humano. Deveis ser sensível, isto é, sentir intensamente (…) - sensibilidade que não é emoção (…). Se não fordes tão completamente sensível, não haverá inteligência. A inteligência vem com a sensibilidade e a observação. (O Despertar da Sensibilidade, pág. 136) A sensibilidade não é resultado do saber e de ilimitados conhecimentos. Podeis conhecer todos os livros do mundo (…); mas isso não produz inteligência. O que produz inteligência é aquela sensibilidade, a sensibilidade total de vossa mente, consciente e inconsciente, a sensibilidade de vosso coração, com sua extraordinária capacidade de afeição, de compaixão e de generosidade. (Idem, pág. 136) E, quando existe essa sensibilidade aliada à observação, há também inteligência, para observar, ver as coisas como são, sem nenhuma fórmula, nenhuma opinião; para ver a nuvem como nuvem; ver vossos mais íntimos pensamentos, vossos secretos desejos, exatamente como são, sem lhes dar


nenhuma interpretação, sem aceitá-los, sem rejeitá-los; (…) e para observar, quando viajais num ônibus, o passageiro a vosso lado, seus modos, sua maneira de falar; observar, simplesmente. Dessa observação vem a clareza. (…) Como vemos, pois, com a sensibilidade e a observação, vem aquela extraordinária inteligência. (Idem, pág. 136) Não havendo sensibilidade, não pode haver afeto; o amor próprio não indica sensibilidade; podemos ter sensibilidade em relação às nossas famílias, (…) realizações, (…) nível social e (…) talento, mas isso não quer dizer que sejamos sensíveis. Trata-se de estreita e limitada reação, (…). Ser sensível não é ter bom gosto, pois este é uma qualidade pessoal, e a percepção da beleza está justamente no libertar-se de toda reação. Se não soubermos apreciar e sentir a beleza, não poderemos amar. (…) (Diário de Krishnamurti, pág. 168) (…) Sentir a natureza, o rio, o céu, as pessoas, a estrada imunda, faz parte da afeição, cuja essência é a própria sensibilidade. Mas, a maioria das pessoas teme a sensibilidade, e isso porque não querem sofrer; para evitar o sofrimento, preferem embrutecer-se, mas nem assim ele desaparece. (…) Amar é romper com essa cadeia interminável de reações individuais; não há barreiras para o amor; ele não se limita a um ou vários objetos (…). Ao tomarmos consciência do fato, libertamo-nos da servidão; é justamente o medo do fato que nos aprisiona. (…) (Idem, pág. 168) Como é possível amar, sem sensibilidade? Sentimentalismo e emocionalismo negam a sensibilidade, porque são terrivelmente cruéis; são responsáveis pelas guerras. (…) (A Luz que não se Apaga, pág. 76) (…) Compreendeis o que entendo por “sensibilidade”? A maioria de nós deseja ser sensível ao belo - à boa música, aos belos quadros, etc. - mas não desejamos ser sensíveis às coisas feias, barulhentas, (…). (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 147) Para poderdes ser sensível num sentido, deveis ser sensível em ambos os sentidos. Não há verdadeira sensibilidade se sois sensível a uma coisa e insensível a outra. A pessoa que é insensível a qualquer coisa na vida, não é totalmente sensível, (…), (Idem, pág. 147) Não achais necessário que o pensamento claro e correto seja sensível? Para sentir profundamente, não é necessário um coração aberto? (…) Embrutecemos nossa mente, nosso sentimento, nosso corpo, com as crenças e a malevolência, com estimulantes poderosos e insensibilizantes. (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 17)


(…) Como podeis ser sensíveis, quando diariamente vos entregais a leituras ou assistis a filmes em que se vos apresentam matanças de milhares de indivíduos - carnificinas que vos são descritas como lances sensacionais de um torneio esportivo? Talvez vos cause desgosto (…), mas a freqüente repetição dessas ferozes brutalidades acabam por insensibilizar-vos a mente-coração, (…). (Idem, pág. 17) Se não desejais sentimentos embotados e empedernidos, deveis pagar o preço disso. Urge abandonardes a pressa, a confusão, as profissões e atividades inadequadas. Deveis tornar-vos cônscios de vossos apetites, de vosso ambiente delimitador, e começareis, então, com uma justa compreensão dos mesmos, a novamente despertar a sensibilidade. (…) (Idem, pág. 18) A pessoa que “experimenta” um pôr-do-sol não é sensível. Poderá dizer: “Que beleza, que maravilha” e ficar extasiada (…), mas essa pessoa não é sensível. Ser sensível implica um estado mental em que só existe o fato, e não todas as vossas lembranças relativas ao fato. Esse perceber, esse ver, esse escutar de cada momento tem na vida uma ação extraordinária. (…) (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. l36)


10. AMOR; NÃO É EMOÇÃO, PRAZER, SENTIMENTALISMO

Já refletiste sobre o que é amor? É ele essa tortura que conhecemos? Essa espécie de amor poderá ser bela no começo - quando dizemos a alguém: “amo-te” - mas depressa se deteriora, convertendo-se numa relação em que prepondera a posse, o domínio, o ódio, o ciúme, a ansiedade, o medo. (A Libertação dos Condicionamentos, pág. 48) Agora, que é amor, (…) que é ele realmente, e não como gostaríamos que fosse? O que gostaríamos que fosse o amor é uma mera idéia, um conceito. (…) Devemos começar com o que é, e não com o que deveria ser. Devemos começar com o fato, e não com as opiniões e conclusões. (…) (O Descobrimento do Amor, pág. 167) Assim, vamos agora investigar, (…) Que é realmente o nosso amor? Nele há prazer, dor, ansiedade, ciúme, apego, ânsia de posse, de domínio, e o medo de perdermos o que possuímos. Há o amor existente nas relações entre duas pessoas, e há amor a uma idéia, uma fórmula, uma utopia, ou a Deus. (…) Por essa razão, há o casamento legal, instituído pela sociedade para a proteção da prole. (…) (Idem, pág. 167) O amor que temos é o conhecido, com todos os seus sofrimentos e sua confusão; nele, há a tortura do ciúme, os horrores e penas da violência, o prazer sexual. É isso que conhecemos, (…) (Idem pág. 169) A maioria de nós não sabe o que é amor. Conhecemos a dor e o prazer de amar (…); assim, o amor é, para nós, algo desconhecido, tal como a morte. Mas, com a mente livre do conhecido, apresenta-se-nos aquilo que não é cognoscível por meio de palavras, de experiência, de visões (…). (Idem, pág. 172) Devemos perguntar: É o amor prazer, desejo, pensamento? Pode o amor ser continuamente cultivado? Sem o amor, o sentimento de compaixão, sua chama, inteligência, tem a vida muito pouco significado. Você pode inventar um propósito para a vida, a perfeição, conhecer tudo sobre a profissão, mas sem a beleza fundamental do amor, fica a vida sem sentido. (…) (Mind Without Measure, pág. 28)


Para a maioria dos homens, amor é posse. Mas, havendo ciúme, inveja, existirá também crueldade, ódio. O amor só existe e cresce na ausência do ódio, da inveja, da ambição. Sem amor, a vida é como terra estéril, árida, dura, brutal. Porém, no momento em que existe afeição, ela é como a terra que floresce com água, com chuva, com beleza. (…) (Ensinar e Aprender, pág. 55) Você sabe, uma de nossas dificuldades é que associamos amor com prazer, com sexo. Amor, para a maioria de nós, significa ciúme, ansiedade, possessividade, apego. A isso chamamos amor. Mas o amor é apego? É o amor prazer? O amor é desejo? É o amor o oposto do ódio? Se é oposto do ódio, então não há amor. Você pode compreender isso? Quando alguém tenta se tornar corajoso, esta coragem é nascida do medo. Portanto, o amor não pode conter o seu oposto. O amor existe onde não há ciúme, agressividade, ódio. (The World of Peace pág. 96-98) Que é amor? É prazer - prazer no reiterativo ato sexual, ao que geralmente se chama amor? O amor da esposa, no qual há grande prazer, posse (…), com base no desejo, é amor? Quando existe um possessivo apego em relação ao outro tem que haver ciúme, temor, antagonismo. (…) Se não se compreende plenamente o significado do apego, jamais se poderá descobrir a verdade do amor. (…) (La Totalidad de la Vida, pág. 148) (…) Esperamos amar o homem através do amor de Deus, mas se não soubermos como amar o homem, como podemos amar a realidade? Amar o homem é amar a realidade. Julgamos que amar a outrem é tão doloroso, tantos problemas complexos estão envolvidos nisso, que consideramos ser mais fácil e mais satisfatório amarmos um ideal, o que é emocionalismo intelectual, não amor. (Idem, pág. 41) Você sabe, para descobrir o que é, você deve negar totalmente o que não é. Através da negação do que não é, se chega ao que é. Deve-se descobrir se o prazer é amor. O amor é desejo? O amor está associado ao sexo, e o sexo se tornou extraordinariamente importante, não é? Você o vê em todos os lugares; pega qualquer revista, caminha em qualquer rua, infindavelmente vê este “amor”. Por que o sexo se tomou colossalmente importante, como ele está associado ao que chamamos “amor”? Por quê? Você alguma vez fez essa pergunta? (…) (Talks and Dialogues, Sidney, Austrália, 1970, pág. 45) O amor é pensamento? Pode o pensamento cultivar o amor? O amor não é prazer, não é desejo, não é recordação, ainda que essas coisas tenham seu lugar. Que é, então, o amor? É ciúme? É o amor um sentimento de posse minha mulher, meu esposo, minha noiva? (…) Contém medo o amor? Não é nenhuma dessas coisas, apaguem-nas completamente, terminem com elas,


pondo-as em seu lugar correto. Então há amor. (La Totalidad de la Vida, pág. 172) O amor não é pensamento. Não é desejo, prazer, não é o movimento de imagens, e enquanto você tem imagens de outrem não há amor. E perguntamos: é possível viver uma vida sem qualquer imagem? Só assim você entra em contacto com outro. (Mind Without Measure, pág. 80) A inteligência requer liberdade, e a liberdade requer a cessação de todo conflito. Torna-se existente a inteligência e deixa de existir o conflito quando o “observador” é a coisa observada, porque então não há divisão. Então, existe amor. Hesitamos em empregar essa palavra já tão terrivelmente “carregada”; o amor está associado ao prazer, ao sexo, ao medo, ao ciúme, à dependência, ao desejo de posse. (…) (Fora da Violência, pág. 134) Sem dúvida, o amor é estado de espírito em que o “eu” perdeu toda a sua importância. Amar é ser amistoso. (…) Quando amais, não tendes inimizade e não causais inimizade. E vós causais inimizade ao pertencerdes a religiões, nações, partidos políticos. Se possuís muitas terras, imensas riquezas, enquanto outro pouco ou nada tem, causais inimizade, ainda que freqüenteis os templos, ou mandeis construir templos com vossas riquezas. Não tendes afabilidade quando estais em busca de posição, poder, prestígio. (O Homem Livre, pág. 181) Dependemos da sensação para a continuidade do assim chamado amor, e, quando essa satisfação é negada, procuramos encontrá-la em outrem. (…) Sem compreender a ansiedade, não pode haver plenitude do amor. (…) Para compreender essa plenitude, esse estado integral, precisamos começar a estar apercebidos do desejo como ganância e possessividade.(…) (Palestras em Ojai e Saróbia, 1940, pág. 44) O amor não é sensação. A sensação faz nascer o pensamento, por meio das palavras e dos símbolos. As sensações e o pensamento tomam o lugar do amor, tornam-se um substituto do amor. As sensações são produtos da mente, como o são também os apetites sexuais. A mente gera o apetite, a paixão, através da lembrança, e recebe dessa fonte sensações. (…) As sensações são agradáveis e desagradáveis, e a mente se prende às agradáveis, tornando-se escrava delas.(…) A mente é o fabricante dos problemas e, portanto, não pode resolvê-los. (…) (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 99-100) O pensamento é fragmentário, limitado; (…) não pode resolver o problema do que é o amor, e não pode cultivar o amor. Quando se cria uma abstração com o pensamento, cria-se o afastamento de “o que é”. (…) Isto é o que se tem feito durante toda a vida; porém, jamais se saberá, mediante a abstração, o que é


amor; nunca se conhecerá a imensa beleza, profundidade e significação do amor. (La Totalidad de la Vida, pág. 149) O processo do pensamento nega sempre o amor. O pensamento é que tem complicações emocionais, e não o amor. O pensamento é o maior obstáculo ao amor. O pensamento cria uma divisão entre o que é e o que deveria ser, (…). Essa estrutura moral, criada pela mente para manter coesas as relações sociais, não é amor, (…). O pensamento não conduz ao amor, não pode cultivar o amor; (…). O próprio desejo de cultivar o amor é ação do pensamento. (Comentários sobre o Viver, 1ª ed. pág. 14) O pensamento não é amor; mas o pensamento, como prazer, aprisiona o amor e traz a dor para dentro dessa prisão. Na negação do que não é, fica o que é. Na negação do que não é amor, surge o amor, no qual cessa o “eu” e o “não eu”. (A Outra Margem do Caminho, pág. 98) Onde há amor não existe problema de sexo. Isso só se torna um problema quando o amor é substituído pela sensação. Portanto, a questão realmente é: como controlar a sensação. Se existisse a chama vital do amor, o problema do sexo cessaria. Atualmente o sexo tomou-se um problema devido à sensação, ao hábito e ao estímulo, (…). A literatura, os anúncios, a conversa, o vestir tudo isso estimula a sensação e intensifica o conflito. (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 72) Todos nós possuímos capacidade para um amor profundo e abrangente, porém, pelo conflito e pelas falsas relações, pela sensação e pelo hábito, destruímos sua beleza. (…) Não podemos manter a chama artificialmente acesa, mas podemos despertar a inteligência, o amor, pelo constante discernimento das múltiplas ilusões e limitações que presentemente dominam a nossa mente-coração, todo o nosso ser. (Idem, pág. 72) (…) O amor não é sentimentalidade, não é emocionalismo, nem devoção. É um “estado de ser” lúcido, são, racional, incorrupto, do qual procede a ação total, a única que pode dar a verdadeira solução a todos os nossos problemas. (…) (O Homem Livre, pág. 89-90) Se ficardes vigilante, (…) vereis o papel importante que o pensamento representa na vida. O pensamento tem, naturalmente, seu devido lugar, mas não está em nenhum aspecto relacionado com o amor. (…) Que é então o amor? O amor é um estado de ser em que não existe pensamento; a própria definição do amor é um processo do pensamento, (…) não é amor. (Comentários sobre o Viver, pág. 14-15) (…) Porque, em suma, quando realmente amamos alguém, nesse amor existe a isenção do sentimento de posse. Temos, em dadas ocasiões, raras, aliás,


esse sentimento de intensa afeição em que não existe a ânsia de possuir, de conquistar. E isso nos reconduz ao que disse (…), isto é, que existirá ânsia de possuir enquanto houver insuficiência, falta de riqueza interior. E essa riqueza interior se encontra, não com acumulações, mas na inteligência, na ação vigilante em presença do conflito causado pela falta de compreensão do ambiente. (A Luta do Homem, pág. 88) (…) Podemos amar alguém em particular, mas não conhecemos aquele “estado de ser” extraordinariamente vivo e lúcido, que é o amor. A maioria de nós tem muito pouco amor no coração, (…). Por não termos amor, encontramos em geral um meio de aliviar-nos, seguindo uma certa via de “autopreenchimento”, que pode ser sexual, intelectual, ou de ordem neurótica; de maneira que nossos problemas crescem e se tornam mais e mais agudos. (Experimente um Novo Caminho, pág. 114) Só pode haver amor quando se compreende o processo integral da mente. O amor não é coisa da mente, e não se pode pensar no amor. (…) O amor só pode existir quando ausente o pensamento do “eu”, e o libertar-nos do “eu” só se consegue pelo autoconhecimento. (…) Vereis, então, que o amor nada tem que ver com os sentidos, e que ele não é um meio de preenchimento. (…) (Por que não te Satisfaz a Vida?, pág. 53-54) (…) O amor é um modo de ser e, nesse estado, o “eu”, com as suas identificações, (…) angústias e (…) posses, está ausente. Não pode existir amor, enquanto as atividades do “eu”, tanto as conscientes como as inconscientes, subsistirem. Eis por que importa compreender o processo do “eu”, o centro do reconhecimento (…). (Idem, pág. 54) A mente que está livre do tempo - tempo que é pensamento, que é desejo essa mente conhece o amor. Para a maioria de nós, o amor é sensual. Observai-o em vós mesmos. Para a maioria de nós, amor é ciúme - uma contradição composta de ódio e amor. Não sabemos, com efeito, o que é amor. Conhecemos a comiseração, a piedade, (…). (A Suprema Realização, pág. 51) Só conheceis o amor sob o aspecto de contradição, dor e prazer, angústia e ciúme - a dor, a brutalidade, a violência do ciúme! (…) Se não conheceis a beleza, jamais conhecereis o amor - não a beleza de uma mulher ou de um homem, não o sexo: a Beleza! (Idem, pág. 51) (…) E quando se compreende a natureza do pensamento, começa-se a descobrir o que é amor. O amor não é desejo ou prazer. Mas, para nós, para quase todo mundo, o amor é prazer e desejo. (…) Visto que o amor não é desejo e nem prazer, como podemos conhecê-lo? Evidentemente, nós não podemos cultivá-lo, (…): identifica-se a pessoa com uma imagem que dizem


ser o amor, (…). Como então conhecer essa coisa? Para conhecê-la, temos de descobrir o que é a beleza. (A Essência da Maturidade, pág. 95) Ora, como alcançar o amor? (…) Vós necessitais do amor, assim como necessitais de água quando sentis sede. Como alcançá-lo? Por meio do tempo? (…) O tempo poderá dar-vos aquele amor que é desvelo, (…) beleza? O amor e a beleza andam juntos, nunca estão separados. Infelizmente, para a maioria de nós, beleza significa sensualidade, sexualidade. (…) (Uma Nova Maneira de Agir, 1ª ed., pág. 155) O amor não é uma coisa da mente; o amor não é idéia. O amor só pode existir depois de extinta a atividade do “eu”. Vós, porém, chamais essa atividade do “eu” positiva; (…) leva à destruição, à separação, à aflição, à confusão, (…). E, todavia, todos nós falamos de cooperação, de fraternidade. Basicamente, o que desejamos é ficar apegados às nossas atividades egocêntricas. (Quando o Pensamento Cessa, pág. 221) Vemos os caminhos do intelecto: não vemos o caminho do amor. O caminho do amor não pode ser encontrado por meio do intelecto. O intelecto, com todas as suas ramificações, (…) desejos, ambições, empenhos, tem de cessar, para que o verdadeiro amor venha à existência. Não sabeis que, quando amais, cooperais, não estais pensando em vós mesmos? Essa é a mais alta forma de inteligência (…). Onde houver direitos adquiridos, não pode haver amor; só há processo de exploração, que culmina no temor. O amor só pode começar a existir, quando a mente não existe. (…) (Quando o Pensamento Cessa, pág. 99-100) (…) Amamos com a mente, e não com o coração; a mente pode modificar-se, o amor não; a mente pode fazer-se vulnerável, o amor não pode; a mente sempre pode retrair-se, tornar-se exclusiva, pessoal ou impessoal, o amor não pode ser comparado nem delimitado. (…) Pode a mente, cuja essência mesma é o tempo, captar o amor, que é sua própria eternidade? (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 39) Ninguém pode ensinar-vos a amar. Se as pessoas pudessem ser ensinadas a amar, o problema do mundo seria então muito simples, (…). Se pudéssemos aprender a amar, num livro, assim como aprendemos matemática, este nosso mundo seria uma maravilha; não haveria ódios, nem exploração, nem guerras, nem separação entre o rico e o pobre; viveríamos todos muito amigavelmente, uns com os outros. (…) Não podeis aprender a amar, mas o que podeis fazer é observar o ódio e, mansamente, o afastardes de vós. Não batalhareis contra o ódio, (…) mas


vede o ódio em sua essência própria e deixai-o extinguir-se por si mesmo. (…) (A Cultura e o Problema Humano, pág. 64) Enquanto existir a atividade da mente, não pode, por certo, haver amor. Quando houver amor, não teremos mais problemas sociais. Mas o amor não é coisa adquirível. Pode a mente esforçar-se por adquiri-lo, como uma nova idéia (…); mas a mente não pode achar-se num “estado de amor” (…). (A Renovação da Mente, pág. 12-13) Assim, se puderdes ver tudo isso, compreendereis que é na realidade a mente que se opõe à existência do estado criador. Uma vez cônscia do seu próprio movimento, a mente cessa. Só então pode realizar-se o estado criador; esse estado criador é a única salvação, porque ele é amor. O amor nada tem em comum com o sentimentalismo; (…) com a sensação; (…) não pode ser fabricado pela mente. A mente só é capaz de criar imagens de sensação, de experiência; e imagens não são o amor. (…) (Quando o Pensamento Cessa, pág. 175-176) Desejais saber o que é o amor de Deus, (…). Porque não sabeis o que é amor, adorais a Deus. (…) Mas, amor a Deus é amor ao homem; temos de começar pelo amor ao homem; mas como não conhecemos este amor, voltamo-nos para certa coisa misteriosa que chamamos “Deus” e procuramos descobrir o que é amor. (…) (O Problema da Revolução Total, pág. 93-94) (…) Você ama alguém? Este amor contém ciúme posse, dominação, apego? Então não é amor. É apenas uma forma de prazer, entretenimento. Quando há sofrimento, não pode haver amor e, portanto, nenhuma inteligência. O amor tem sua própria inteligência. A compaixão possui sua qualidade de pura e não adulterada inteligência. Quando ela existe, opera no mundo. Esta inteligência não é resultado do pensamento; o pensamento é apenas uma pequena ocupação dela. Quando você ouve isto, vê a verdade de tudo isto - se você assim procede - o perfume, o sentimento de estar amando completamente surge, ou você volta para a velha rotina? (Mind Without Measure, pág. 28-29) (…) Para o homem feliz, o homem que ama, não há divisões; ele não é brâmane, nem inglês, (…). Para esse homem não há divisões de “altos” e “baixos”. (…) Quando amais, tendes um sentimento de riqueza que vos perfuma a vida e estais pronto a dividir o vosso coração com outro. Quando está cheio o coração, as coisas da mente fenecem. (A Arte da Libertação, pág. 36) Ora, que se entende por beleza, (…) por verdade? (…) Senhores, essa confiança se chama amor, afeição; e, quando amais alguém, não há


diferenças, não há alto nem baixo. Quando há amor, essa chama extraordinária, então ele é a própria eternidade. (Novo Acesso à Vida, pág. 84) Senhores, não conheceis aquele “estado de ser” íntimo, aquela interior tranqüilidade, em que floresce o amor, a bondade, a generosidade, a piedade? Aquele estado de ser, obviamente, é a essência mesma da beleza, e, sem ele, o simples decorar de nós mesmos significa dar realce aos valores (…) dos sentidos; (…) (Idem, pág. 84-85) Ora, a velha reação procede do pensamento. (…) Porque, sem nos libertarmos do resíduo da experiência não é possível a recepção do novo. (…) Como é então possível o novo? Só é possível, quando não há mais resíduo de memória, e há resíduo quando a experiência não é completada, concluída (…) Quando a experiência é completa, não deixa resíduo algum; esta é a beleza da vida. O amor não é resíduo, o amor não é experiência - é um “estado de ser”. O amor é eternamente novo. (…) (Da Insatisfação à Felicidade, pág. 72-73) Senhores, desenvolvemos a nossa mente, somos o que se chama “intelectuais”, e isso significa que estamos cheios de palavras, de explanações, de técnicas. Somos polemistas, sutis argumentadores e controversistas. Enchemos o coração com as coisas da mente, e eis por que nos achamos num estado de contradição. Mas o amor não é facilmente encontrável. Tendes de trabalhar muito para alcançardes. (…) Isso significa que, para alcançar o que é amor, necessita-se de autoconhecimento - não o conhecimento de Sankara, Buda ou Cristo, que se colhe em certos livros. (…) (O Homem Livre, pág. 90) (…) Compreender as relações é compreender a mim mesmo, é fazer nascer aquela qualidade de amor na qual existe bem-estar. Se sei amar minha esposa (…) filhos ou meu próximo, sei amar a todo o mundo. Visto que não amo a ninguém, estou permanecendo apenas no nível intelectual (…) O idealista causa enfado: ama a humanidade com o cérebro, não a ama com o coração. (…) O amor só está no presente, não no tempo, (…) no futuro. Para quem ama, a eternidade é agora; porque o amor é sua própria eternidade. (A Arte da Libertação, pág. 78) Só o amor pode transformar o mundo. Sistema algum, seja da esquerda, seja da direita, por mais sabiamente, (…) convincentemente (…) concebido, pode trazer a paz e a felicidade (…) O amor não é um ideal; ele surge onde existe o respeito e a compaixão de todos para com todos. Esse modo de ser se apresenta com a riqueza da compreensão. (O caminho da Vida, pág. 22)


11. FRATERNIDADE, BENEVOLÊNCIA, COMPAIXÃO, PERDÃO

Aqueles de vós que falam em fraternidade são geralmente nacionalistas no coração. Que significa fraternidade, como idéia ou realidade? Como podeis realmente ter o sentimento de amor fraternal em vossos corações, quando mantendes uma série de crenças dogmáticas, quando fazeis distinções religiosas? E isso é o que estais fazendo em vossas sociedades, grupos. (Palestras em Adyar, Índia, 1933-1934, pág. 47) Estais agindo de acordo com o espírito de fraternidade, quando existem tais distinções? Como podeis conhecer esse espírito quando tendes a consciência de classe? Como pode haver unidade ou fraternidade, quando pensais somente em termos de vossa família, de vossa nacionalidade, de vosso Deus? (Idem, pág. 47) (…) As religiões e as nacionalidades realmente engaiolam as pessoas, entravam-nas. Isso está evidenciado no mundo, através da história; e o mundo tem, agora, cada vez mais seitas, (…) corporações fechadas por paredes de crenças, com seus guias especiais; e, no entanto, falais de fraternidade! (Palestras em Auckland, 1934, pág. 82) Como pode haver verdadeira fraternidade quando o instinto possessivo é tão profundo e, por isso, necessariamente, deve conduzir a guerras, pois está baseando no nacionalismo, no patriotismo. (…) Um homem que é realmente fraternal, afetuoso, não fala de fraternidade; vós não falais de fraternidade à vossa irmã ou à vossa esposa, porque já existe um afeto natural. E como pode haver fraternidade, verdadeira unidade humana, quando existe exploração? (…) (Idem, pág. 82) (…) Dizer que pelo nacionalismo seremos, no devido tempo, internacionais, teremos a fraternidade, é um processo de pensamento muito errôneo. Só depois de quebrardes os estreitos limites da mente e do coração, podereis passar além; e quando as paredes estiverem por terra, se descortinará a vastidão do horizonte da vida. (A Arte da Libertação, pág. 104) A dificuldade é ser fraternal, ser bom, ser benevolente, ser generoso; e isso é impossível, enquanto só pensarmos em nós mesmos. Estais pensando em vós mesmos quando atribuís a máxima importância (…) como meio de vos


proporcionar felicidade, (…) conservar vosso nome, vossa religião, vossas perspectivas, vossa autoridade, vossa conta no banco, vossas jóias. (A Arte da Libertação, pág. 104) Quando um homem está interessado só em si mesmo e no prolongamento de si mesmo, como pode ele ter amor no coração, como pode ter boa vontade? (…) O homem que não pensa em si criará por certo um mundo novo, uma nova ordem, e é para esse homem que devemos volver os olhos (…) A boa vontade, a felicidade, a bem-aventurança, só virá quando houver a busca do real. O real está perto, não distante. (…) (Idem, pág. 104-105) (…) O amor não é suscetível de pensar-se, não pode ser cultivado (…) A prática do amor, (…) da fraternidade está sempre no terreno da mente (…) Porque não sabemos amar a um só, o nosso amor à humanidade é fictício. Quando amais, não há um só nem muitos, só há amor. (…) (A Arte da Libertação, pág. 182) (…) O amor é “extensivo” e por isso é possível amar ao que é particular. Mas a maioria de nós, não tendo esse amor “extensivo”, volta-se para o particular, e o particular destrói. (A Arte da Libertação, pág. 214) Que é amor? Que é compaixão? A palavra “compaixão” significa paixão por todos, afeição para com todos os seres - inclusive os animais que matais para comer. (…) Sabemos o que significa amar, ou só conhecemos o prazer e o desejo, chamando-os “amor”? É certo que o prazer e o desejo se acompanham também de ternura, desvelo, afeição, etc., mas o amor é prazer, desejo? (…) Um homem depende de sua esposa, ama sua esposa, mas se ela olha para outro homem, fica enraivecido (…) frustrado, infeliz (…) É isso que chamais “amor” (…) (Fora da Violência, pág. 36) Senhor, que é compaixão? Não é um estado de simpatia, piedade, consideração? E nesse estado, por certo, não há sentimento de estardes ajudando a outrem. (…) Nesse estado de compaixão, podemos dar ajuda, dar simpatia a outro, mas não há conflito interior. (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 198) Sois responsáveis pelas misérias e pelos desastres que ocorrem no mundo, pois na vossa vida diária sois cruéis, opressores, ávidos e ambiciosos. (…) Abrigai em vossos corações a paz e a compaixão, e aclarar-se-ão as vossas dúvidas. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 16) (…) Se não extirpais de vós mesmos as causas da inimizade, da ambição, da avidez, são falsos os vossos deuses e vos conduzirão à desgraça. Só a benevolência e a compaixão são capazes de promover a ordem e a paz no mundo; (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 26)


Ora bem, (…) Num mundo como o atual, em que há tanta violência, (…) ódio e brutalidade, a palavra “compaixão” é quase sem significação. (…) Há violência em todos nós, consciente ou inconscientemente. Existe agressividade, o desejo de ser ou “vir a ser” algo, o impulso para nos “expressarmos” custe o que custar, para nos preenchermos sexualmente, nas relações sociais, no escrever, no pintar (…) (Experimente um Novo Caminho, pág. 49) (…) O pensamento não pode, em circunstância nenhuma, cultivar a compaixão (…) Mas, se cada um de nós não tiver um profundo sentimento de compaixão, tornar-nos-emos cada vez mais brutais e desumanos uns com os outros. (…) (Idem, pág. 51) Para produzir ordem, vós mesmo deveis ter consideração e compaixão para com outrem. A ação nascida do ódio só pode criar futuros ódios. A raiva em todas as circunstâncias é a ausência de compreensão e amor. (…) (Palestras em Ojai e Saróbia, 1940, pág. 46) Não estais realmente preocupado com a injustiça; se estivésseis, jamais vos zangaríeis; (…) Se nas nossas relações humanas existirem a compaixão e o perdão, a generosidade e a benevolência, como pode haver também brutalidade e ódio? Se não tivermos amor, como poderá haver ordem e paz? (…) (Idem, pág. 46) (…) se quereis a paz, urge empregardes meios pacíficos (…) Só a benevolência e a compaixão tornarão possível a paz no mundo, não a força, nem a sagacidade, nem a simples legislação. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 16) Perdemos o sentimento de humanidade; reconhecemo-nos responsáveis somente perante a classe ou grupo a que pertencemos; (…) perante um nome, um rótulo. Perdemos a compaixão, o amor ao todo, e, sem essa vivificante chama da vida, volvemo-nos para os políticos, (…) os sacerdotes, (…) Em nada disso há esperança. Só no interior de cada um de nós reside a compreensão criadora, a compaixão, tão necessária para o bem-estar do homem. Os meios criam os fins justos; (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 84) Quando há compaixão, o sentimento da compaixão, ela não atinge apenas o pobre aldeão ou o animal faminto; sua intensidade é sempre a mesma onde quer que estejais, numa choça ou num palácio (…) (O Homem Livre, pág. 109) Como dissemos (…) o amor nada tem em comum com o tempo, nem com a memória. E essa excelência que chamamos amor é compaixão, a qual inclui a ternura, a bondade, a generosidade, etc. (…) (Viagem por um Mar Desconhecido, pág. 61)


Acho, pois, necessário que a mente humana compreenda totalmente essa questão - o que é a bondade. A palavra “bondade' não é o fato, (…) não é a coisa (…) A bondade só pode desabrochar, florir, na liberdade. A liberdade não é uma reação, (…) e tampouco é uma resistência ou revolta contra alguma coisa. É um estado de espírito; e esse estado de espírito (…) não pode ser compreendido se não há espaço. A liberdade exige espaço. (O Descobrimento do Amor, pág. 117) Aí está a razão por que importa descobrir se uma pessoa pode ser boa, (…) sem se esforçar para ser boa, sem lutar para libertar-se da inveja, da ambição, da crueldade (…) Pode haver bondade, sem se fazer esforço para “ser bom”? Acho que só haverá, se cada um de nós escutar, ficar atento. (…) Esquecei todos os livros que lestes, tudo o que vos têm ensinado, e prestai atenção à asserção de que não pode haver virtude, enquanto houver esforço para ser virtuoso. (…) (Realização sem Esforço, pág. 38-39) (…) Qual é a relação entre amor e compaixão, ou são eles o mesmo movimento? Quando usamos a palavra “relação”, ela implica dualidade, separação, mas estamos perguntando que lugar tem o amor na compaixão, ou é o amor a mais alta expressão da compaixão? Como pode ter compaixão se você pertence a alguma religião, segue algum guru, crê em alguma coisa, em escrituras, etc., se estiver apegado a uma conclusão? Quando você aceita um guru, chega a um desfecho, ou se você acredita fortemente em deus ou num salvador, nisto ou naquilo, pode haver compaixão? Você pode dedicar-se a trabalho social, ajudar o pobre desamparado de piedade, simpatia, caridade, mas isso é tudo que compreende o amor e a compaixão? (Mind Without Measure, pág. 97) Estamos tentando descobrir se é possível viver neste mundo sem nenhum medo, conflito, com um enorme senso de compaixão, o que exige grande soma de inteligência. Você não pode ter compaixão sem inteligência. E essa inteligência não é atividade do pensamento. Você não pode ser compassivo se está ligado a determinada ideologia, a um particular tribalismo estreito, ou a algum conceito religioso, porque tudo isso é limitação. A compaixão só pode surgir, despertar, quando há o fim do ressentimento, o que representa o fim do movimento egocêntrico. (The World of Peace, pág. 86) O amor é como a morte. Amor significa compaixão. Amor, compaixão, significam inteligência suprema, não a inteligência de livros, de estudiosos e da experiência. Isso é necessário até certo ponto, mas só há a quintessência da inteligência total quando há amor, compaixão. Não pode haver compaixão e amor sem morte, que é o fim de todas as coisas. Então há criação. Ou seja, o universo, não de acordo com os astrofísicos, é a suprema ordem. (…)


E essa inteligência não pode existir sem compaixão, amor e morte. Isso não é um processo de meditação, mas de profunda investigação. Inquirir com grande silêncio, não “eu estou investigando”. Grande silêncio, grande espaço. O que é essencialmente amor, compaixão e morte é a aludida inteligência, que é criação. Criação existe quando estes outros dois existem: amor e morte. Tudo o mais é invenção. (Last Talks at Saanen, 1985, pág. 127) (…) No entendimento da natureza do amor, havendo a virtude da mente unida ao coração, surge a inteligência. A inteligência é o entendimento ou descoberta do que é o amor. Inteligência nada tem a ver com o pensamento, esperteza, conhecimento. Você pode ser muito eficiente em seus estudos, no seu trabalho, ser capaz de discutir habilmente, racionalmente, mas isso não é inteligência. A inteligência é acompanhada de amor e compaixão, e você não pode chegar a essa inteligência como um indivíduo (isolado). A compaixão não é sua nem minha, da mesma forma que o pensamento não é seu nem meu. Quando há inteligência, não há eu e você. E a inteligência não fica em seu coração ou em sua mente. Tal inteligência, que é suprema, está em toda parte. Ela é a inteligência que move a terra e os céus, as estrelas, porque ela é compaixão. (Mind Without Measure, pág. 97) E onde há qualidade de amor, então daí surge a compaixão; onde há compaixão há inteligência - não a inteligência do interesse próprio, não a inteligência do pensamento, não a inteligência (…) do acúmulo de conhecimento, pois a compaixão nada tem a ver com conhecimento - mas a inteligência que proporciona segurança à humanidade, estabilidade e um vasto sentido de expansão. (The World of Peace, pág. 98) (…) Quando compreendo a mim mesmo, compreendo a vós, e dessa compreensão nasce o amor. O amor é o fator que está faltando - há falta de afeição, de cordialidade, nas relações; e porque falta esse amor, essa ternura, essa generosidade, essa compaixão, em nossas relações, escapamo-nos para a ação em massa, que produz maior confusão e maior miséria. (…) (A Arte da Libertação, pág. 63) (…) O amor ultrapassa e sobreleva tudo isso; ele transcende o plano dos sentidos. É em si mesmo eterno e independente, e não um resultado. Nele há misericórdia e generosidade, perdão e compaixão. Com o amor, surge a humildade e a brandura (…) (Autoconhecimento, Correto Pensar, Felicidade, pág. 90) O amor não é oposto de coisa alguma. Não é o oposto do ódio ou da violência (…) Para o homem que ama não há erro; ou, se há, sabe corrigi-lo imediatamente. O homem que ama não tem ciúme, (…) remorsos. Para ele não


existe o perdão, porque nunca surge uma ocasião em que haja algo para perdoar. Tudo isso exige profunda investigação (…) (Fora da Violência, pág. 37) Vossa comiseração, pois, não é amor. E é amor o perdão? Que está implicado no perdão? Vós me insultais e eu fico ressentido e guardo isso na lembrança; depois (…) digo: “perdôo-vos”. (…) Um homem que ama não guarda inimizade, sendo indiferente a todas essas coisas, (…) Enquanto a mente é o árbitro, não há amor; porque a mente só arbitra segundo o interesse de posse (…) A mente só pode corromper o amor, não pode dar beleza. (A Arte da Libertação, pág. 180-181)


12. CHAMA SEM FUMAÇA, VIRTUDES (AMOR), PAIXÃO SEM CAUSA

Como é essencialmente simples a vida, e como a complicamos! O amor não é complexo, mas a mente o faz complexo. Vivemos demais com a mente e desconhecemos os caminhos do amor. Conhecemos os caminhos do desejo e o ímpeto do desejo; desconhecemos, porém, o amor. O amor é a chama sem fumo. Estamos muito bem familiarizados com a fumaça; ela enche a cabeça e o coração (…) Não somos simples, como a beleza da chama; torturamo-nos com ela. Não vivemos com a chama, acompanhando-a prestamente aonde quer que nos leve. (Comentários sobre o Viver, pág. 208) O amor, positivamente, é uma chama sem fumaça. É só a fumaça que conhecemos bem - a fumaça do ciúme, da ira, da dependência, (…) de apego. Não temos a chama, mas estamos perfeitamente familiarizados com a fumaça; e aquela chama só podemos ter quando não houver mais fumaça. (Viver sem Confusão, pág. 60-61) Será de fato difícil a transformação do indivíduo? É difícil ser bondoso, amar alguém? Afinal, é esta a essência de uma transformação radical. (…) Estamos de tal maneira entranhados nos impulsos que incitam ao ódio, à antipatia, que perdemos a chama pura, ficou-nos só fumo; (…) Não possuímos mais (…) a chama da criação; tomamos o fumo pela chama. (…) (Que Estamos Buscando, pág. 91) O amor não é coisa da mente. A mente gera a fumaça do ciúme, da posse, da saudade, da evocação do passado, da ansiedade pelo amanhã, da tristeza e da preocupação; e essa fumaça sufoca a chama, infalivelmente. Quando não existe fumaça, existe chama. As duas coisas não podem existir juntas. (…) Desejo é projeção do pensamento, e pensamento não é amor. (Comentários sobre o Viver, pág. 199) (…) A revolução só poderá realizar-se quando houver amor, e não antes. O amor é a única chama sem fumo; mas, infelizmente, enchemos os nossos corações com as coisas da mente, e por isso os corações estão vazios e as mentes cheias. (Que Estamos Buscando, pág. 31) (…) Quando amais a um, amais a outros, há cordialidade para com todos. Sois então sensível, flexível. (…) O amor não é coisa para ser cultivada; ele nasce,


pronta e imediatamente, quando não é impedido pelas coisas da mente. Estão vazios os nossos corações, e é por isso que não existe comunhão (…) Quando há amor - cordialidade, generosidade, afabilidade, compaixão - não se necessita de filosofia alguma nem de instrutores; porque o amor é a própria verdade. (Idem, pág. 38) (…) O amor é algo novo, eterno, de momento a momento. Nunca é o mesmo, nunca é como foi antes; e sem o seu perfume, (…) sua beleza, (…) sua bondade, procurar com a ajuda de um guru aquilo que podeis achar por vós mesmo é de todo inútil. (Da Insatisfação à Felicidade, pág. 91) Não é assim o amor. Ele é como aquele bosque do outro lado da estrada: sempre a renovar-se porque está sempre a morrer. Não existe nele a permanência que o pensamento busca (…) A consciência do pensamento e a consciência do amor são duas coisas diferentes: uma leva à escravidão, e a outra, à floração da bondade. (…) O amor é anônimo (…) Sem ele, não se pode encontrar a bem-aventurança da verdade. (A Outra Margem do Caminho, pág. 133) Quando (…) Já se houver dedicação, bondade, solicitude, daí surgirá a finura, a polidez, a benevolência para com os demais, (…) a pessoa pensa cada vez menos em si (…) E aquele que não tem preocupação egocêntrica é, na verdade, um ser humano livre. (…) (Ensinar e Aprender, pág. 55-56) Amor é um sentimento em que existe doçura, mansidão, ternura, consideração, beleza. No amor não há avidez, nem ciúme. (Idem, pág. 57) (…) Para o homem feliz, o homem que ama, não há divisões; ele não é brâmane, nem inglês, nem alemão, nem hindu. Para esse homem não há divisões de “altos” e “baixos”. (…) Quando amais, tendes um sentimento de riqueza que vos perfuma a vida e estais pronto a dividir o vosso coração com outrem. Quando está cheio o coração, as coisas da mente fenecem. (A Arte da Libertação, pág. 36) (…) O problema da desigualdade só poderá ser resolvido quando existir o amor (…) O homem que ama não está interessado em quem é superior nem inferior; para ele não existe igualdade nem desigualdade; só há um “estado de ser”, que é amor. (…) (Visão da Realidade, pág. 196) (…) Quando estais naquele “estado de amor”, não existe repugnância. Ele é como uma flor que exala o seu perfume (…) Um homem que ama está todo entregue ao seu amor, não lhe importando se as pessoas têm “rostos inexpressivos” (…) (Novo Acesso à Vida, pág. 133)


(…) Quando há amor, isso é de somenos importância. Embora observeis os fatos, (…) não vos repugnam. Não é o amor, mas, sim, o coração vazio, o espírito árido, o intelecto endurecido, que é repelido ou atraído. E quando uma pessoa ama, não há escravização. Há sempre uma renovação, uma fresca vitalidade, uma alegria não no falar, mas naquele próprio estado. (…) (Idem, pág. 133) (…) O amor não tem códigos de moral, (…) não é reforma. Quando o amor se torna prazer, a dor é inevitável. O amor não é pensamento, e é o pensamento que dá prazer - prazer sexual, (…) do sucesso. (…) O pensamento, pelo pensar nesse prazer, dá-lhe vitalidade (…) Essa exigência de prazer é o que chamamos sexo (…) Ele se acompanha de uma grande abundância de afeição, ternura, desvelo, companheirismo, etc. (…) (A Outra Margem do Caminho, pág. 57) Não sabeis que, quando amais, cooperais, não estais pensando em vós mesmos? Esta é a mais elevada forma de inteligência - e não quando amamos como uma entidade superior, ou quando nos achamos em boa situação, o que nada mais é que temor. (A Primeira e Última Liberdade, 1ª ed., pág. 116) (…) Sabemos o que o amor significa? O amor não pede nada a outrem. (…) O amor não reclama nada da esposa, do marido, nada reclama dos outros, nem física nem emocional nem intelectualmente. Não segue a outrem, não tem um conceito para logo seguir esse conceito. Porque o amor não é ciúme (…) O amor não busca posição, status, prestígio. Porém possui sua própria capacidade, destreza, inteligência. (La Llama de la Atención, pág. 49-50) (…) Quando amais alguém, não pensais no que ireis ganhar dessa pessoa. Não amais a pessoa porque ele ou ela vos dá dinheiro, ou posição, ou outra espécie de satisfação. Simplesmente, amais - se tal amor realmente existe. Ora, se amo verdadeiramente o que estou fazendo, não há ambição. Não me comparo com ninguém (…) Amo o meu trabalho e, portanto, a minha mente, o meu coração, o meu ser inteiro está nele. (…) (Idem, pág. 220) Deseja também saber (…) Ora, amar é ser livre. No amor, são livres ambas as partes. Se existe a possibilidade de sofrimento, não se trata então de amor, mas, sim, puramente, de uma forma sutil do instinto de posse, (…) de aquisição. Se amais, se realmente amais alguém, não há possibilidade de lhe causardes dor (…) (A Luta do Homem, pág. 53-54) (…) Mas, o estar cônscio de ser nada significa ser alguma coisa. Ser nada (…) não pode ser provocado; esse estado só se conhece havendo amor. Mas o amor não é uma coisa que possa ser procurada; ele vem quando há em nós


uma revolução interior, quando o “eu” já não é importante, já não é o centro da nossa existência. (Claridade na Ação, pág. 98) Parece-me verdadeiramente importante viver completamente cada dia, com tanta plenitude, tão criadoramente, tão ricamente, que nunca tenhamos um amanhã. Isso, afinal, é amor. (…) O amor não conhece o amanhã. (As Ilusões da Mente, pág. 105) (…) A mente que está quieta conhecerá o ser, o amor. O amor não é pessoal nem impessoal. Amor é amor, e a mente não o pode definir ou descrever como inclusivo ou exclusivo. O amor é a própria eternidade; ele é o real, o supremo, o imensurável. (O que te Fará Feliz? pág. 97-98) Assim, sem se morrer não há amor, porque o amor é sempre novo e não uma rotina de sexo e prazer. Para a maior parte de nós, por todo o mundo, o sexo tornou-se um problema enorme, (…) de que retiramos prazer (…) Até parece que o sexo acaba de ser descoberto pela primeira vez, sendo-lhe dado lugar em todas as revistas (…) (O Mundo Somos Nós, pág. 132) Se não sabeis o que é amor, morreis como um lastimável ente humano, sem conhecer aquela imensidade que se chama “vida”. E, no conhecer a plenitude da vida, encontra-se a plenitude do “desconhecido”. (…) (Uma Nova Maneira de Agir, pág. 66) (…) A ação não deve ter motivo, (…) não deve ser a busca de um fim; e a ação que não busca um fim só pode vir quando há o amor. O amor não é coisa difícil. Só há amor quando o intelecto compreende a si mesmo, (…) quando o processo de pensamento, com suas hábeis manobras, seus ajustamentos, (…) busca de segurança, deixa de funcionar, descobrireis então que vosso coração é rico, cheio, abundante de felicidade, porque descobriu aquilo que é eterno. (A Arte da Libertação, pág. 105) (…) Só a mente que percebeu o significado do tempo, da morte e do amor - os três estão relacionados entre si - só essa mente pode “explodir” no “desconhecido”. (Idem, pág. 66) Que significa amar? Será algo ideal, (…) distante, inatingível? Ter a qualidade da simpatia, da compreensão, de ajudar os outros naturalmente, sem motivo algum, ser espontaneamente bom, ter consideração por uma planta ou por um animal, sentir-se solidário com os camponeses, generoso com o amigo, (…) o próximo - não é isso o que entendemos por amor? Não é o amor um estado em que não há ressentimento, mas eterno perdão? E não será possível senti-lo? (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 95)


Nossa educação, desde a infância, é desenvolvida em torno da idéia de vir a ser alguém, (…) e mui poucos dentre nós tivemos ocasião de aprender a amar o que estamos fazendo. Quando amais o que estais fazendo, trabalhais sem motivo, sem ânsia de êxito. (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 220) O problema é: o que é o amor sem motivo? Pode acaso haver amor sem nenhum incentivo, sem que se deseje tirar algum proveito dele? Pode haver amor em que não haja mágoa por ele não ser retribuído? Se eu lhe ofereço a minha amizade e você a recusa, não ficarei ferido? Esse sentimento de mágoa é o resultado de amizade, de generosidade, de simpatia? Certamente, enquanto eu me sinto magoado, enquanto houver em mim medo, (…) ou o ajudar esperando que você me ajude - o que se chama serviço - não haverá amor. (O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 97) Ora, a menos que compreendamos a paixão, acho que não seremos capazes de compreender o sofrimento. A paixão é algo que mui poucos de nós realmente já experimentaram. Poderemos ter experimentado entusiasmo, (…) num estado emocional (…) (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 179) (…) Nossa paixão é sempre por alguma coisa: pela música, pela pintura, pela literatura, (…) por uma mulher ou um homem; é sempre o efeito de uma causa. (Idem, pág. 179) Quando vos apaixonais por alguém, sempre ficais num estado de grande emoção, o qual é o efeito daquela causa; e a paixão de que falo é paixão sem causa. É estar apaixonado por tudo, e não simplesmente por uma certa coisa (…) (Idem, pág. 179) Só quando temos liberdade, temos paixão. Não me refiro à paixão carnal, a qual tem seu lugar próprio; refiro-me a um estado de liberdade em que existe intensa energia e paixão. (…) A paixão está sempre no presente; não é algo já passado ou que teremos amanhã, pois esta é a paixão criada pelo pensamento. (…) Ora, há diferença entre a paixão do prazer e a paixão que nasce quando estamos completamente libertos da confusão, quando há claridade total. (A Importância da Transformação, pág. 38) No estado de “paixão sem causa” há uma intensidade livre de todo apego; mas, quando a paixão tem causa, há apego, e apego é o começo do sofrimento. Em geral, temos apego - a uma pessoa, um país, uma crença, uma idéia - e quando o objeto de nosso apego nos é retirado ou, ainda, quando perde o seu significado, vemo-nos vazios, incompletos. (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 179-180)


Acho que o terminar do sofrimento depende da intensidade da paixão. Só pode haver paixão, quando há total abandono do “eu”. Nunca pode uma pessoa “apaixonar-se” se não houver a completa ausência disso que chamamos “pensamento”. (…) (Idem, pág. 181-182) (…) E o auto-abandono de que falo é aquele estado de beleza sem causa, o qual, por essa razão, é um estado de paixão. E pode-se transcender tudo o que é resultado da causa? (Idem, pág.182). O problema agora é este: Que é o amor sem “motivo”? Pode haver amor sem “motivo”, sem incentivo algum, sem tirarmos dele nenhum proveito para nós mesmos? Pode haver amor sem ressentimento, em que não haja sentimento de mágoa quando o nosso amor não é correspondido? Pode haver amor em que damos e não recebemos? Quando dais não sentis mágoa, se a pessoa não retribuir? (…) Assim, pois, enquanto houver ressentimento, (…) temor, (…) vereis que o vosso incentivo não é o amor. Se compreendestes, aí tendes a resposta. (Novos Roteiros em Educação, pág. 121) Ora, que se entende por beleza, e que se entende por verdade? A beleza, de certo, não é um ornamento (…) Senhores, não conheceis aquele “estado de ser” íntimo, aquela interior tranqüilidade, em que floresce o amor, a bondade, a generosidade, a piedade? Aquele estado de ser, obviamente, é a essência mesma da beleza (…) (Novo Acesso à Vida, pág. 84-85) (…) Cada um de nós tem um templo, mas precisamos criar a imagem, o ídolo, a Beleza, em torno da qual possamos desenvolver o nosso amor e nossa devoção; porque, se conservarmos o templo vazio, não poderemos criar. (O Reino da Felicidade, pág. 24) É pela adoração, pelo amor, pela devoção, que criamos, que damos vida ao templo. Para mim esse templo é o coração. Se puserdes Aquele que é a encarnação do Amor e da Verdade em vosso coração, se ali o criardes com as vossas próprias mãos, (…) mente, (…) emoções, esse coração, em vez de frio e abstrato e deserto, se torna real e vivo e radiante. Tal é a Verdade. (O Reino da Felicidade, pág. 24-25) Não emprego a palavra “paixão” no sentido de “prazer exaltado”; porém, antes, em referência àquele estado da mente que está sempre a aprender e, por conseguinte, sempre ardorosa, viva, em movimento, nova e, portanto, apaixonada. Bem poucos de nós se apaixonam. Temos prazeres sensuais, luxúria, diversões; mas o sentimento de paixão, esse a maioria de nós não tem. Sem paixão, no elevado sentido ou significado da palavra, como se pode aprender, (…) descobrir coisas novas, (…) investigar, (…) mover-se com a celeridade que a investigação requer? (A Suprema Realização, pág. 128)


O amor, para a maioria de nós, é paixão, concupiscência (…) A fumaça (…) - o ciúme, o ódio, a inveja, a avidez - destrói a chama. Mas onde está o amor, aí está a beleza e a paixão. Deveis ter paixão, mas não traduzais prontamente essa palavra em “paixão sexual”. Por “paixão” entendo a “paixão da intensidade”, essa energia que de pronto percebe as coisas, claramente, ardentemente. Sem paixão, não há austeridade. (…) A austeridade vem com o desprendimento, e no desprendimento há paixão e, por conseguinte, beleza. Não a beleza criada pelo homem; não a beleza artística (…) Mas refiro-me a uma beleza que transcende o pensamento e o sentimento. E esta só pode surgir quando há alta sensibilidade (…) (O Passo Decisivo, pág. 276) Paixão, para a maioria de nós, significa apenas satisfação mental ou física, a qual depressa declina e tem de ser sempre renovada. Em geral, as paixões são despertadas por circunstâncias externas ou por nosso especial temperamento, (…) idiossincrasias e apetites. (…) Isso poderá, com efeito, proporcionar (…) um certo ardor, (…) mas referimo-nos a uma paixão mais difícil de alcançar, porque a paixão que se requer para qualquer ação deve ser sem motivo. (…) Pode haver alguma ocasião rara em que a mente funcione sem “motivo”, sem desejo de satisfação (…) (A Importância da Transformação, pág. 114-115) O que é importante (…) A raiz da palavra “paixão” significa “sofrimento”. Mas não estamos a usar essa palavra no sentido de sofrimento, ou da energia que se manifesta por meio da cólera, do ódio, da resistência. Estamos a usá-la no sentido daquela paixão que vem naturalmente e sem esforço, quando há amor. (O Mundo Somos Nós, pág. 75) Sem amor, vivemos no sofrimento, na aflição, em conflito perene. E o amor, por certo, é sem conflito. (…) Nasce o amor ao começarmos a compreender realmente a totalidade de nosso próprio ser. (…) Na mutação da ação há paixão, que é energia; e, com essa energia, que faz parte do amor, (…) da criação, tem a mente a possibilidade de ingressar num estado jamais concebido ou formulado por ela própria, num estado desconhecido. (Experimente um Novo Caminho, pág. 115-116) Qual é, pois, o problema? Como ter essa criadora alegria de viver, ser sem limitações no sentir, amplo no pensar, e ao mesmo tempo preciso, claro, ordenado, no viver? Creio que a maioria não é assim, porque nunca sentimos nada intensamente, nunca aplicamos completamente a coisa alguma nosso coração e nossa mente. (…) Mas vós e eu nunca conheceremos essa alegria, se não sentirmos as coisas profundamente, se não houver paixão em nossa vida - paixão (…) no sentido de sentirmos as coisas com toda a força; (…) quando houver uma revolução total em nosso pensar, em todo o nosso ser. (A Cultura e o Problema Humano, pág. 61)


13. PENSAMENTO, SENTIMENTO, AÇÃO; HARMONIA, AÇÃO INTEGRADA

Por que razão dividiu o homem a sua existência em compartimentos diferentes - o intelecto e as emoções? Cada um desses compartimentos parece independente do outro. Na vida, essas duas forças motoras são muitas vezes tão contraditórias, que parecem dilacerar a própria estrutura de nosso ser. Harmonizá-las, de modo que o homem possa atuar como uma entidade total, foi sempre um dos principais alvos da vida. (…) (A Luz que não se Apaga, pág. 100) Exatamente: o pensar e o sentir são uma só coisa; sempre, desde o começo, foram uma só coisa, e é isso, precisamente, o que estou dizendo. Nosso problema, por conseguinte, não é a integração dos diferentes fragmentos, mas, sim, a compreensão dessa mente e desse coração que são uma só coisa. (…) (Idem, pág. 102) Desejo explicar, hoje, que há um modo de viver naturalmente, espontaneamente. (…) Quando viveis completamente na harmonia de vossa mente e coração, então o vosso agir é natural, espontâneo, sem esforço. (Palestras na Itália e Noruega, 1933, pág. 130) Afinal, sentir é pensar, não? As duas coisas são inseparáveis. (…) O sentimento sempre acompanha o pensamento. E sentimento é percepçãosensação-contato, etc. Sentir é ser sensível; (…) (O Passo Decisivo, pág. 65) Achais mesmo muito importante que a mente e o coração se unam? (…) Por que procurar uni-los? Essa preocupação é ainda do intelecto e não oriunda (…) de vossa sensibilidade, que faz parte de vós. Dividistes a vida em intelecto e coração; intelectualmente observais o emurchecer do coração e, verbalmente, vos preocupais com isso. (A Outra Margem do Caminho, pág. 21-22) (…) Aquilo a que vos opondes é a periculosidade do intelecto, que endeusais. Essa periculosidade cria uma multidão de problemas. Vedes provavelmente os efeitos das atividades intelectuais, no mundo - as guerras, a competição, a arrogância do poder - e talvez tenhais medo do que está para acontecer, do desespero do homem. (Idem, pág. 22)


(…) Enquanto existir essa divisão entre os sentimentos e o intelecto - um a dominar o outro - um destruirá o outro, inevitavelmente; não há possibilidade de uni-los. (…) O amor não pertence a nenhum dos dois, porque o amor não é de natureza dominadora. Não é uma coisa fabricada pelo pensamento ou pelo sentimento. (…) O amor está no começo e não no fim de algum esforço. (A Outra Margem do Caminho, pág. 22) Separamos o intelecto do sentimento, desenvolvemos o intelecto à custa do sentimento. Somos como um tripé com uma perna mais longa do que as outras, não temos equilíbrio. Somos educados para sermos intelectuais; (…) (A Educação e o Significado da Vida, pág. 79) (…) O que pode produzir a transformação em nós, e por conseguinte na sociedade, é a compreensão do processo integral do pensar, que não é diferente do sentir. Sentir é pensar; (…) (Por que não te Satisfaz a Vida, pág. 73) Krishnamurti: (…) Só conheço dois movimentos: um, o de pensar - o movimento intelectual, racional; o segundo, o sentimento de benevolência, delicadeza, doçura; (…) São dois movimentos separados? Ou porque os temos tratado como dois movimentos separados, surge todo nosso infortúnio, nossa confusão? (Tradición y Revolución, pág. 402) Não achais necessário que o pensamento claro e correto seja sensível? Para sentir profundamente, não é necessário um coração aberto? Não se requer um corpo sadio para que as suas reações sejam prontas e adequadas? Embrutecemos nossa mente, nosso sentimento, nosso corpo, com as crenças e a malevolência, com estimulantes poderosos e insensibilizantes. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 17) Se não desejais sentimentos embotados e empedernidos, deveis pagar o preço disso. Urge abandonardes a pressa, a confusão, as profissões e atividades inadequadas. Deveis torna-vos cônscios de vossos apetites, de vosso ambiente delimitador, e começardes, então, com uma justa compreensão dos mesmos, a novamente despertardes a sensibilidade. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 18) Com a observação constante de vossos pensamentos-sentimentos, cairão por terra as causas do egotismo e da estreiteza mental. Se desejais atingir um elevado grau de sensibilidade e clareza, deveis trabalhar deliberadamente para esse fim; não podeis ser mundanos e ao mesmo tempo sinceros na busca da Realidade. (Idem, pág. 18) Hipertrofiamos o intelecto, em prejuízo de nossos sentimentos mais profundos e claros, e uma civilização baseada no cultivo do intelecto há de produzir


brutalidades e o culto da prosperidade. O basear-se no intelecto ou só no sentimento conduz ao desequilíbrio (…) É necessário que compreendamos as tendências do intelecto, mediante vigilância constante,(…) transcender o próprio raciocinar. (Idem, pág. 18-19) (…) O culto do intelecto, em oposição à vida, conduziu-nos à nossa atual frustração, com suas inumeráveis vias de fuga. (…) A presente crise nasceu do culto do intelecto, e foi o intelecto que dividiu a vida numa série de ações opostas e contraditórias; foi o intelecto que negou o fator de unificação que é o amor. (A Arte da Libertação, pág. 248) O intelecto encheu o nosso coração, que estava vazio, com coisas da mente; e só quando a mente está cônscia do seu próprio raciocinar é capaz de transcender a si mesma, e só então haverá enriquecimento do coração. Só o (…) enriquecimento do coração pode trazer a paz a este mundo louco e cheio de lutas. (Idem, pág. 248) Com essa busca de saber, com nossos desejos gananciosos, estamos perdendo o amor, estamos embotando o sentimento do belo, a sensibilidade à crueldade; estamo-nos tornando cada vez mais especializados e cada vez menos integrados. A sabedoria não pode ser substituída pela erudição (…) (A Educação e o Significado da Vida, 1ª ed.,pág. 78) (…) A erudição é necessária, a ciência tem o seu lugar próprio; mas, se a mente e o coração estão sufocados pela erudição, e se a causa do sofrimento é posta de parte com uma explicação, a vida se torna vazia e sem sentido. (…) (Idem, pág. 78) Que quer dizer “razão”? Pode a razão separar-se do sentimento? Vós os separastes, porque desenvolvestes o intelecto e nada mais. E tendes, assim, uma espécie de tripé, com uma perna muito mais longa que as outras duas e que por isso não pode ficar em equilíbrio. É o que aconteceu. Somos altamente intelectuais. (…) E temo-nos servido do intelecto como meio para encontrarmos a Realidade. (Uma Nova Maneira de Viver, pág. 139) Mas o intelecto representa uma parte, somente, e não o todo. Compreender a realidade e raciocinar são duas coisas diferentes. Sem razão (…) não podemos viver. Razão é equilíbrio, integração. (…) Mas a razão, como a conhecemos, é operação intelectual e não pode produzir senão fragmentação, como estamos vendo no mundo todo (…) O intelecto está produzindo toda esta devastação, degradação e miséria (…) A razão precisa transcender a si mesma, para encontrar a Realidade. (Idem, pág. 139) Expressando-o diferentemente, com o raciocinar não se pode encontrar o real, porquanto o raciocinar é produto do passado, (…) depende do tempo, é reação


no tempo e, por conseguinte, o raciocinar não pode nunca ser o atemporal. É preciso que o raciocinar termine, porque só então poderá manifestar-se o atemporal. Quando a mente tem percepção do seu existir, sobrevém um silêncio extraordinário, uma grande tranqüilidade (…) É nesse estado que pode dar-se a criação (…) (Idem, pág. 139-140) (…) Separamos a mente dos sentimentos (…) a inteligência da mente e do coração, que para mim são uma só coisa. Inteligência é pensamento e sentimento em perfeita harmonia. (A Luta do Homem, pág. 83) (…) Entendo por pensamento, não o mero raciocínio intelectual, que é somente cinzas, mas o equilíbrio entre os sentimentos e a razão, entre os afetos e o pensamento; e esse equilíbrio não é influenciado nem atingido pelo conflito dos opostos. (…) (A Luta do Homem, pág. 147-148) (…) E a mente e o coração, que são para mim a mesma coisa (…) se debilitam e obscurecem pela memória (…) Mas, se fordes ao encontro do ambiente sempre renovados, sem a carga dessa memória do passado, (…) vereis então surgir a compreensão de todas as coisas (…) (A Luta do Homem, pág. 113) Assim, a própria ação destrói as ilusões, não a disciplina auto-imposta. (…) Isso abre imensas avenidas à mente e ao coração (…) Mas só podereis viver completamente quando tiverdes percepção direta e a percepção direta não se atinge por meio de escolha (…) de esforço (…) Ela está na chama do apercebimento, que é a harmonia da mente e do coração na ação. (Palestras em Adyar, Índia, 1933-1934, pág. 162-163) Quando estiverdes apercebido, com a mente e o coração, da necessidade da ação completa, agireis harmoniosamente. Então todos os vossos temores, (…) barreiras, (…) desejo de poder, de atingir - tudo isso se revelará, e as sombras da desarmonia dissipar-se-ão. (Idem, pág. 93) Agora, já expliquei que o conflito não produz o pensar criador. Para se ser criador, para se produzir qualquer coisa, a mente precisa estar em paz, o coração cheio. (…) (A Arte da Libertação, pág. 219) Essa tranqüilidade da compreensão não é produzida por ato de vontade, porquanto a vontade é também parte do vir-a-ser, do ansiar. Só pode estar tranqüila a mente-coração depois de cessar o tormento e o conflito do anseio. Assim como um lago se apresenta calmo após o vendaval, assim também está tranqüila a mente-coração, em sua sabedoria (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 143) (…) Cumpre compreender esse anseio logo que se revele no nosso pensarsentir-agir. Pela auto-vigilância constante, é possível compreender e


transcender as tendências do anseio, do vir-a-ser pessoal. Não dependais do tempo, mas buscai com ardor o autoconhecimento. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 143-144) (…) Poucos de nós estamos preparados para examinar um problema profundamente, e perceber o movimento de nosso próprio pensamento, sentimento e ação, como um todo geral, integrado; (…) (A Arte da Libertação, pág. 133) Mas, que é ação? Bem considerada, ela é aquilo que pensamos e sentimos. E enquanto não tiverdes percepção de vosso pensamento, de vossos sentimentos, tem de haver insuficiência (…) (A Luta do Homem, pág. 81-82) A ação é esse movimento que é, ele próprio, pensamento e sentimento (…) Essa ação é a relação entre o indivíduo e a sociedade. Pois bem: se esse movimento do pensamento for claro, simples, direto, espontâneo, profundo, não existirá então conflito no indivíduo, contra a sociedade, porque a ação é, nesse caso, a própria expressão desse movimento vivo e criador. (A Luta do Homem, pág. 153) Nessas condições, (…) Não há técnica de pensar, mas somente a espontânea ação criadora da inteligência, a qual é a harmonia da razão, do sentimento e da ação, não separadas ou divorciadas entre si. (Idem, pág. 153) Pensar criativamente é estabelecer harmonia entre a mente, o sentimento e a ação. Isto é, se estais convencidos de uma ação, em visardes a uma recompensa final, essa ação, resultado da inteligência, afasta todos os óbices impostos à mente pela falta de compreensão. (A Luta do Homem, pág. 154155) Visto que a todos nós interessa a ação e que, sem ação, não se pode viver, é de toda necessidade entrarmos a fundo na questão e procurarmos compreendê-la plenamente. É uma questão difícil, porque vivemos, em geral, uma vida desintegrada, seccionada (…) Assim, (…) precisamos verificar o que é atividade e o que é ação. (…) Há uma vasta diferença entre atividade e ação. (…) (A Arte da Libertação, pág. 39) (…) Muito importa compreender a distinção entre atividade e ação. Eu chamaria atividade à conduta de vida baseada em níveis independentes, (…) “desintegrados” - isto é, queremos viver como se a vida estivesse num único nível, sem nos preocuparmos com os outros níveis, com outros campos da consciência. Se examinarmos tais atividades, verificaremos que se baseiam em idéias, e a idéia é um “processo” de isolamento (…) e não de unificação. (…) (Idem, pág. 40)


(…) A “ação integrada” não nasce de uma idéia; nasce assim que compreendeis a vida como um processo total, não fragmentado em compartimentos separados, em atividades separadas do todo da existência. (…) (A Arte da Libertação, pág. 41) Nosso problema, portanto, é o de como agir “integralmente”, como um todo, e não em diferentes níveis não relacionados entre si. Para se agir como todo, (…) integralmente, é óbvia a necessidade de autoconhecimento. O autoconhecimento não é uma idéia: é um movimento. (…) (Idem, pág. 41) (…) Nessas condições, o homem sincero não deve deixar-se envolver na atividade, mas, sim compreender as relações, pelo processo do autoconhecimento. A compreensão do processo do “eu”, do “meu”, na sua inteireza, traz a “ação integrada”, e essa ação é completa, não criará conflito. (Idem, pág. 41-42) Existe uma ação que não seja resultado do movimento do pensar, (…) não condicionada por ideologias (…) criada pelo pensamento? Existe uma ação que esteja totalmente livre do pensamento? Uma ação semelhante seria então completa, total, íntegra - não fragmentária, não contraditória. Uma ação assim seria uma ação total, na qual não haveria arrependimento, nenhum sentido de “Eu houvera desejado não fazer isso”, ou “Tratarei de fazer aquilo”. A desordem surge quando opera o movimento do pensar; o pensamento mesmo é fragmentário e, quando opera, tudo tem de ser fragmentário (…) Qual é uma ação sem pensamento? (La Totalidad de la Vida, pág. 196) (…) Ação significa fazer agora, não fazer amanhã ou haver feito no passado. Como o amor, essa ação não é do tempo. O amor e a compaixão estão mais além do intelecto, (…) da memória; são um estado da mente que assim atua [N.Revisor: há um erro gramatical aqui; examinar o texto em inglês], porque o amor e a compaixão são supremamente inteligentes - e a inteligência atua. Onde há espaço há ordem, que é a ação da inteligência; esta não é minha nem de vocês, é inteligência que nasce do amor e da compaixão. O espaço na mente implica que esta não se encontra ocupada; (…) (La Totalidad de la Vida, pág. 196-197) Estou, pois, alvitrando que só se tornará possível a verdadeira ação quando a mente compreender a totalidade de sua ocupação, tanto consciente como inconsciente, e conhecer o momento em que cessou a ocupação. Vereis, então, que a ação resultante desses momentos de desocupação é a única ação “integrada”. Quando não está ocupada, a mente não está contaminada pela sociedade, não é produto de inumeráveis influências, não é hinduísta nem cristã, nem comunista, nem capitalista. Por conseguinte, ela própria é uma


totalidade de ação, com que não tereis de ocupar-vos e em que não precisais pensar. (Da Solidão à Plenitude Humana, pág. 78) A ação é esse movimento, que é, ele próprio, pensamento e sentimento (…) Essa ação é a relação entre o indivíduo e a sociedade. Ela é conduta, trabalho, cooperação, que chamamos preenchimento. Isto é, quando a mente atua sem visar a uma culminância ou objetivo, e é portanto criador o seu pensar, esse pensar é ação (…) (A Luta do Homem, pág. 153) (…) Intrinsecamente, o pensamento é um produto do tempo, é medida e, portanto, fragmentário. (…) Se o vêem claramente uma vez, então poderão descobrir que é a ação, uma ação correta, precisa, na qual não há imaginação nem argumentações, nada senão o factual. (La Verdad y la Realidad, pág. 7374) Estamos tratando de descobrir que é a ação total, não fragmentária, a ação que não se acha presa no movimento do tempo, que não é tradicional e, portanto, não é mecânica. Quer o indivíduo viver uma vida sem conflito, viver em uma sociedade que não destrua a liberdade e, assim, sobreviver, (…) (Idem, pág. 74) Assim, a ação, como a conhecemos, é, na realidade, reação, incessante “vir-aser”, ou seja, negação, evitação do que é; mas quando estamos cônscios do vazio, sem escolha, sem condenação, nem justificação, então, nessa compreensão do que é, há ação, e essa ação é o Ser criador. (…) (A Arte da Libertação, pág. 109-110) Como disse (…), a inteligência é a solução única que produzirá a harmonia neste mundo de conflito, a harmonia entre a mente e o coração, na ação. (…) (Palestras em New York City, 1935, pág. 27) Ora, (…) A essência da inteligência reside na compreensão da vida ou da experiência com a mente e coração frescos, renovados e aliviados de fardos. (…) (Idem, pág. 49) Compreendo a pergunta. (…) Quando há harmonia total - harmonia real, não imaginária - quando o corpo, o coração e a mente estão integrados de modo completo e harmonioso, quando existe esse sentido de inteligência que é harmonia, e essa inteligência está usando o pensamento, haverá então divisão entre o observador e observado? Evidentemente, não. Quando não existe harmonia, há fragmentação, e então o pensamento cria a divisão do “eu” e do “não eu”, o observador e o observado. (El Despertar de la Inteligência, pág. 177)


A harmonia é quietude. Existe uma harmonia entre o corpo, o coração e a mente, harmonia completa, sem dissonância. Ao passo que, se o corpo é sensível, se está ativo e não deteriorado, tem sua própria inteligência. Deve o indivíduo possuir um corpo assim, vivo, ativo, não drogado. (…) (El Despertar de la Inteligencia, 1ª ed., pág. 174) (…) E deve também ter um coração - não excitação, não sentimentalismo, nem emocionalismo, nem entusiasmo, senão esse sentido de plenitude, de profundidade, de qualidade e energia que só pode existir quando há amor. E deve ter uma mente com um espaço imenso. Então há harmonia. (Idem, pág. 174-175) Como, pois, há de a mente encontrar isso? [N.Revisor: É esse o sentido?] Estou seguro de que todos vocês (…) se perguntarão: como pode um indivíduo ter esse sentimento de completa integridade, de unidade entre o corpo, o coração e a mente, sem sentido algum de distorção, divisão ou fragmentação? (…) Vocês vêem a realidade disso, (…) Vêem a verdade de que devem ter completa harmonia dentro de si, na mente, no coração e no corpo. Como podem vocês chegar a isso? (El Despertar de Ia Inteligencia, II, pág. 175) Pois bem, (…) Como dissemos, quando há harmonia há silêncio. Quando a mente, o coração e o organismo estão em harmonia completa, há silêncio; porém, quando um dos três se deforma, se perverte, o que há é ruído. (…) Porém quando vocês vêem a verdade disso - a verdade, não o que “deveria ser” - quando vêem que isso é o real, então é a inteligência que o vê. Portanto, é a operação da inteligência a que produzirá esse estado. (Idem, pág. 175) O pensamento é do tempo, a inteligência não é do tempo. A inteligência é imensurável - não a inteligência científica, (…) a de um técnico, ou a de uma dona-de-casa, ou a de um homem que conhece muitíssimo. Isso está dentro do campo do pensamento e do conhecido. Quando a mente se acha em completo silêncio (…) só então há harmonia total, imenso espaço e silêncio. Somente então o imensurável é. (Idem, pág. 175-176) Pergunta: A harmonia surge quando finda o conflito? Krishnamurti: Quero descobrir o que é harmonia entre a mente, o corpo e o coração, a completa sensação de ser total, sem fragmentação, sem superdesenvolvimento do intelecto, mas com o intelecto operando claramente, objetivamente, sã mente; e o coração operando não com sentimento, emocionalismo, exaltação histérica, mas com uma qualidade de afeição, cuidado, amor, compaixão, vitalidade; e o corpo com sua própria inteligência, não influenciada pelo intelecto. O sentimento de que tudo está operando,


funcionando belamente como uma maravilhosa máquina é importante. É possível? (Exploration into Insight, pág. 52) Há integração, quando somos capazes de observar os fatores da desintegração. A integração não está num ou noutro nível da nossa existência, ela é a reunião do todo. Antes que isso seja possível, temos de descobrir o que significa desintegração (…) (Comentários sobre o Viver, 1ª ed., pág. 192) Pergunta: Qual a maneira de alcançar a integração? Krishnamurti: Que quer dizer integração? Não significa completar-se, viver sem conflito nem sofrimento? Em geral tentamos a integração nas camadas superficiais da consciência; procuramos Integrar-nos a fim de funcionarmos normalmente dentro do padrão da sociedade; desejamos ajustar-nos a um ambiente, que aceitamos como normal; mas não impugnamos o valor da estrutura social que nos circunda. A aquiescência a um padrão é considerado integração; a educação e a religião organizada facilitam-nos essa aquiescência. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 132-133) A integração não tem significado mais profundo do que o mero ajustamento à sociedade e seus padrões? (…) Não é a integração o ser puro, e não apenas a satisfação de nosso desejo de nos tornarmos um todo, (…) “normais”? (…) O impulso à integração pode resultar da ambição, do desejo de mando, do temor à insuficiência, etc. (…) Há uns poucos que reprimem o anseio de prosperidade material, mas dão guarida ao desejo de se tornarem virtuosos, serem mestres, alcançarem a glória espiritual. Também aqui não temos a verdadeira integração. (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 133-134) (…) Dá-se a verdadeira integração quando, por todas as camadas da consciência, existe percepção e compreensão. Nossa consciência superficial é fruto da educação, de influências, e é só quando o pensamento transcende as limitações por ele próprio criadas, que pode haver a verdadeira integração. As numerosas partes adversas e contraditórias de nossa consciência só podem integrar-se quando já não existe a causa dessas divisões: dentro do padrão do “eu”, só pode haver conflito, nunca integração, plenitude. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 134) Verifica-se a integração quando estamos livres do anseio. Não é ela um fim, em si, mas se buscardes o autoconhecimento, sempre com profundeza, tornarse-á a integração o caminho por onde alcançareis a Realidade. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 134) Ora, a inteligência, sem dúvida, só pode surgir quando sois livres para pesquisar, livres para pensar, livres para impugnar todas as tradições, para que nossa mente se torne muito ativa, muito lúcida e sejais, como indivíduo, uma


entidade “integrada”, plenamente eficaz, - e não uma entidade assustada que nunca sabe o que lhe cumpre fazer e, por isso, obedece, sentindo intensamente uma coisa e sendo obrigada a ajustar-se a outra exteriormente. (…) Por isso, interiormente, há um conflito constante. (Novos Roteiros em Educação, pág. 33) Ora, por certo, quando o falso é percebido como falso, o verdadeiro existe. Quando se está cônscio dos fatores da degeneração, não apenas verbalmente, mas profundamente, não há integração? (…) A integração não é um alvo, um fim, mas um estado de ser; é uma coisa viva, e como pode uma coisa viva ser alvo, objetivo? (…) Quando não há conflito, há integração. A integração é um estado de completa atenção. Não pode haver atenção completa quando há esforço, conflito, resistência, concentração. (Reflexões sobre a Vida, pág. 61)


14. INTUIÇÃO (INSIGHT); VERDADEIRA, FALSA, IMPULSO

Que entendemos por intuição? Por sentimento intuitivo, entendemos um sentimento não racionalizado, não muito logicamente pensado, um sentimento que atribuímos a uma fonte situada fora da mente, a que chamamos um lampejo da consciência superior. (Quando o Pensamento Cessa, pág. 200) Sem compreender integralmente o processo do desejo, não podeis confiar na intuição, pois ela pode ser extraordinariamente enganosa. (…) Não alegueis que os cientistas têm a percepção intuitiva de um problema. Os cientistas trabalham, impessoalmente, lutam com o problema, lutam, lutam, e, não conseguindo achar a solução, põem-no de lado; quando recomeçam a trabalhar, vêem subitamente a solução - eis a sua intuição. (…) (Idem, pág. 201) Acontece com a maioria de nós que a mente-coração não é capaz de permanecer aberta para tal êxtase. A “inspiração” é acidental, não provocada, grande demais para a nossa mente-coração. A inspiração é maior do que aquele que a experimenta, e por isso procura ele baixá-la ao seu próprio nível, à órbita de sua compreensão. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 107) Pergunta: “Insight” não é intuição? O senhor poderia discutir essa súbita clareza que algumas pessoas têm? (…) Krishnamurti: Durante as várias palestras já realizadas, o orador tem usado a palavra “insight”. Isso significa ver dentro das coisas, dentro do mecanismo total do pensamento (…) Não é análise, não é exercício da capacidade intelectual, nem resultado do conhecimento. (…) (Perguntas e Respostas, pág. 20) Essa palavra, “intuição”, é, pode-se dizer, uma palavra ardilosa, que muitos usam. A realidade da intuição pode ser resultado do desejo. Uma pessoa pode desejar algo e, então, após alguns dias, ter uma intuição sobre isso. (…) Ficase então em dúvida quanto a essa palavra, especialmente quando é usada por pessoas um tanto românticas, imaginativas, sentimentais e que buscam algo. (Idem, pág. 20-21)


Portanto, o que é “insight”? É perceber algo instantaneamente, algo verdadeiro, lógico, sensato, racional. O insight deve operar instantaneamente. Não se trata de se ter um insight e não se fazer nada a respeito. Se a pessoa tem um insight dentro da natureza total do pensamento, há uma ação instantânea. (Perguntas e Respostas, pág. 21) Por outro lado, um insight significa que há uma ação que não é uma simples repetição do pensamento. Ter um insight (…) significa que se está observando sem recordações, sem argumentação pró e contra, é somente observar o movimento e a natureza totais da necessidade (…) Uma pessoa tem um insight disso e, a partir daí, ela age. E essa ação é lógica, sensata e saudável. Uma pessoa não pode ter um insight e agir de modo oposto; isso não é um insight. (Idem, pág. 21) Insight é a percepção total de todo esse movimento complexo de mensuração. Você só pode ter esse insight quando percebe sem conhecimento prévio, pois, se estiver usando seus conhecimentos, então ele é comparativo, mensurável. O insight não é mensurável. Quando há o insight imensurável, o desdobramento de todo o mecanismo de comparação não só é dividido, mas cessa imediatamente. Você pode testar isso; (…) (Perguntas e Respostas, pág. 113) Pergunta: A intuição compreende a experiência passada e mais alguma coisa, ou somente a experiência passada? Krishnamurti: Para mim, intuição é inteligência, e inteligência não é a experiência do passado, mas a compreensão dessa experiência. (A Luta do Homem, pág. 51) Para mim, o passado é uma carga, e representa apenas lacunas na compreensão. (…) Mas, se houver ação espontânea no presente, em contínuo movimento, nela haverá inteligência, e essa inteligência é intuição. A inteligência não pode separar-se da intuição. (Idem, pág. 51-52) Como pode o indivíduo despertar essa inteligência, essa intuição criadora que compreende o significado da realidade sem o processo da análise e da lógica? Por intuição não quero dizer preenchimento do desejo, como faz a maioria das pessoas. Se a moral, que significa relações mútuas, for baseada na inteligência e na intuição, então haverá riqueza, plenitude e uma constante beleza na vida. (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 31) Para que possa vir à existência essa intuição criadora, todo anseio com seus temores deve cessar. A cessação da carência não é resultado da abstenção. Nem por meio da análise cuidadosa pode o desejo ser racionalmente afastado.


A libertação da carência, de seus temores e ilusões, vem por meio da percepção silenciosa e persistente, sem a escolha deliberada da volição (…) (Idem, pág. 31-32) Ora, quando é que compreendeis (…) Não sei se já notastes que só há compreensão quando a mente está muito quieta (…); dá-se o lampejo da compreensão quando não há verbalização do pensamento. Experimentai-o e vereis que tendes o clarão da compreensão, aquela extraordinária rapidez da intuição, quando a mente está muito tranqüila, quando o pensamento está ausente (…) (O Que te Fará Feliz? pág. 107) Explicarei novamente (…) Se entenderdes isto, se realmente sentirdes com todo o vosso ser - isto é, emocional e mentalmente - a futilidade da escolha, então já não escolhereis; então há discernimento; há resposta intuitiva que é livre de escolha, e isso é apercebimento. (Palestras na Itália e Noruega, 1933, pág. 33) É preciso muito cuidado com esta palavra “intuição”; nela se encerra muita ilusão, porquanto a intuição pode ser ditada por nossas próprias esperanças, temores, amarguras, desejos, etc. Procuramos uma solução de ordem intelectual ou emocional, como se o intelecto fosse coisa separada da emoção, e a emoção, da reação física. (A Questão do Impossível, pág. 41) Não estou negando que haja intuição, porém o que a pessoa mediana, vulgar, denomina intuição, não é a verdadeira (Palestras em Auckland, 1934, pág. 7679) A palavra “intuição” (…) é perigosa em extremo. Desejo uma certa coisa muito profundamente; sinto que é um desejo justo, e chamo-o “intuição”. (…) Só de uma coisa sabemos: que nossa mente, tal como os macacos, está sempre inquieta, a fazer algazarra, a saltar de um lado para outro, a mexer-se incessantemente, a pensar, a afligir-se. (…) Dizemos então: “Como exercitá-la para quietar-se?”. Passamos anos e anos a exercitá-la para quietar-se e, ao cabo desse tempo, ela se torna um macaco de outra espécie. (O Mistério da Compreensão, pág. 81) Krishnamurti: Quando falamos de intuição, voz interior, que quer dizer isso? Essa voz interior pode ser completamente falsa. (…) Estou procurando averiguar se a intuição é verdadeira ou falsa. Ora, sem dúvida, enquanto não compreendemos o processo do desejo, consciente (…) e inconsciente, não podemos fiar-nos na intuição, porque o desejo pode conduzir-nos a certos “fatos” que não são fatos absolutamente. (…) (Palestras na Austrália e Holanda, 1955, pág. 37)


(…) Pelo discernimento sem escolha, se desperta a intuição criadora, a inteligência que é a única a poder libertar a mente-coração dos múltiplos processos sutis da ignorância, da carência e do medo. (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 55) A crença não deve ser confundida com a intuição, e a intuição não é preenchimento de desejo. A crença (…) baseia-se na evasão, na frustração, na limitação, e essa mesma crença impede a mente-coração de dissolver a ignorância autocriada. (Palestras em Ojai, Califórnia, 1936, pág. 29) (…) Não estando diretamente em contacto com um Mestre, precisamos depender ou dum intermediário, ou de nossa chamada intuição. A dependência de um intermediário destrói a compreensão e o amor; (…) condiciona a mente; e a chamada intuição tem seus graves perigos, pois ela pode ser somente um desejo auto-enganador. (Palestras em Ojai e Saróbia, 1940, pág. 77-78) O importante ,pois, é que se perceba a verdade num súbito clarão, que se esteja sensível num tão alto grau, que o fato revele instantaneamente a verdade. Mas isso requer muita humildade; (Visão da Realidade, pág. 239) (…) Quanto mais harmonizarmos os nossos sentimentos fortes e a mente penetrante pelo aperfeiçoamento e purificação, tanto mais aptos estaremos para ouvir essa Voz, a Intuição, que é comum a todos, a Intuição que é da Humanidade e não de um indivíduo particular (…) (O Reino da Felicidade, pág. 9) Assimilando esse ideal (…) Uma perfeita harmonia de emoções e da mente é essencial para que essa Intuição, essa Voz do vosso verdadeiro Ego (Self) se possa expressar. A Intuição é o cochicho do Espírito. (O Reino da Felicidade, pág. 9) (…) Se nesse momento entenderdes com todo o vosso ser, se nesse momento ficardes consciente da futilidade da escolha, então brotará daí a flor da Intuição, a flor do discernimento. A ação que daí nasce é infinita; então a ação é a própria vida. (Palestra na Itália e Noruega, 1933, pág. 35) Para cultivar essa Voz até se tornar o único Tirano, a única Voz a que obedecemos, temos de descobrir o nosso alvo e trabalhar incessantemente para atingi-lo. (…) A primeira coisa essencial é o fortalecimento dessa Voz que de vez em quando se afirma por si mesma em cada um de nós. E ao cultivarmos e enobrecermos a Intuição, devemos aprender a pensar e a agir por nós mesmos. O culto dessa Voz da Intuição quer dizer uma vida de acordo com os seus éditos. (O Reino da Felicidade, pág. 6)


(…) Quando tendes esse desejo, essa capacidade de vos encher com o Seu gênio, com a Sua força, com a Sua nobreza, então vós próprios vos enobreceis e aprendeis a refletir a Sua divina originalidade, todas as fontes de beleza, de criação; e as tentativas de ser original, belo, criador, são de pouco proveito se não tivermos a compreensão e a capacidade de alcançar a fonte das coisas. (…) (O Reino da Felicidade, pág. 28) A única autoridade que reconheceis, o único comando que admitis, deve ser a Voz dessa Intuição, que é inalterável, que coisa alguma no mundo pode abalar. Desse modo desenvolvereis gradualmente esse senso de beleza, que é vossa própria criação (…) (O Reino da Felicidade, pág. 39) Deveis viver lá vossa própria vida, obedecer à vossa própria Voz, achar vosso próprio Mestre (…) Não podeis ser felizes enquanto não fizerdes a felicidade de outros, e só podeis tornar outros felizes, se houverdes entrado nesse Reino, se houverdes colhidos os murmúrios daquela Voz que é Eterna (…) (O Reino da Felicidade, pág. 58-59) E, como disse antes, deve vir um tempo, virá um tempo, em que aquela Voz, aquele Tirano, vos dirá que renuncies a tudo e a sigais; e para esse tempo deveis estar preparados. Deveis ter o vosso jardim bem sachado e cultivado, e as suas flores prontas a serem colhidas. Então podereis dar da vossa devoção, da vossa inteligência, com maior certeza, com maior conhecimento de que elas serão aproveitadas, porque as exercitastes, porque as cultivastes, porque conheceis a capacidade delas; (…) (O Reino da Felicidade, pág. 76) Enquanto marchardes com visão clara, enquanto ouvirdes essa Voz que é universal e a ela obedecerdes, não importa o que diga quem quer que seja no mundo; porque estareis com a razão, quando estiverdes obedecendo ao Altíssimo. (…) (O Reino da Felicidade, pág. 19) Como o trovão é cheio de forças, ameaças e mistério, assim é a Voz da Verdade no homem forte. Como a voz do trovão é projetada de montanha em montanha, e como cada montanha a recebe e devolve a outra, assim é a voz dEle - o nosso Governador, nosso Legislador, nosso Guia e nosso Amigo - no homem que está seguindo a Verdade absoluta, a Verdade de sua própria criação. (O Reino da Felicidade, pág. 90) Como, porém, posso ter essa visão intuitiva? O que devo fazer, ou não fazer, para ter essa visão intuitiva instantânea, que não pertence ao tempo, (…) à memória, que não possui nenhuma causa (…)? Portanto, como a mente tem essa visão intuitiva? (…) Essa visão intuitiva torna-se possível se a sua mente estiver liberta do tempo. (A Eliminação do Tempo Psicológico, pág. 77)


(…) Antes, a ação estava baseada no pensamento. Agora, quando existe visão intuitiva, há somente ação. (…) Porque a visão intuitiva é racional, a ação é racional. A ação se torna irracional quando atua a partir do pensamento. Portanto, a visão intuitiva não usa o pensamento. (Idem, pág. 86) Uma visão intuitiva parcial. Os cientistas, os pintores, os arquitetos, os médicos (…) têm uma visão intuitiva parcial. Estamos falando, porém, de “X” e de “Y”, que estão procurando a base; estão se tornando racionais, e estamos dizendo que a visão intuitiva não possui tempo e, portanto, não possui pensamentos, e essa visão intuitiva é ação. (…) (Idem, pág. 86) É possível termos uma visão intuitiva total, o que representa o fim de “mim”, porque o “mim” é o tempo? O “mim”, meu ego, minha resistência, minhas mágoas, tudo isso. Esse “mim” pode acabar? É somente quando ele acaba que ocorre a visão intuitiva total; foi isso que descobrimos. (A Eliminação do Tempo Psicológico, pág. 91) Porque se você possui essa visão intuitiva, ela é uma paixão, e não apenas uma hábil visão intuitiva; ela é uma paixão que não permitirá que fique parado; terá de se mover, dar seja lá o que for. (…) Você possui a paixão dessa visão intuitiva; e essa paixão é como um rio com um grande volume de água que transborda; ela tem de avançar da mesma maneira. (Idem, pág. 105-106) Não necessariamente. Poderíamos considerar que a visão intuitiva é um movimento mais amplo do que o processo material que ocorre no cérebro e, conseqüentemente, que o movimento mais amplo pode agir sobre o movimento mais restrito, mas o mais restrito não pode agir sobre o mais amplo. (A Eliminação do Tempo Psicológico, pág. 139) Sim, estamos dizendo a mesma coisa. (Idem, pág. 139) [N.Revisor: Este parágrafo não acrescenta coisa alguma à obra. Sugiro eliminá-lo.] Uma coisa acaba de surgir na minha mente. O amor não tem nenhuma causa. O ódio tem uma causa. A visão não tem nenhuma causa. O processo material, como o pensamento, tem uma causa. Certo? (Idem, pág. 143) Uma vez que a visão intuitiva não possui causa, ela tem um efeito preciso sobre aquilo que tem causa. (Idem, pág. 143) É um lampejo, naturalmente, e esse lampejo altera todo o padrão, opera sobre ele; usa o padrão, no sentido de que eu argumento, raciocino, uso a lógica, e tudo isso. (…) (Idem, pág. 144) O processo material está trabalhando na escuridão, no tempo, no conhecimento, na ignorância. Quando, surge a visão intuitiva, ocorre a


eliminação daquela escuridão. Isso é tudo que estamos dizendo. A visão intuitiva elimina aquela escuridão (…) Conseqüentemente, essa luz alterou, digo, ela pôs fim à ignorância. (A Eliminação do Tempo Psicológico, pág. 147) (…) Essa escuridão existe enquanto o “eu” (self) está ali; ele é o criador dessa escuridão, mas a luz dissipa exatamente o centro da escuridão. Isso é tudo. (…) (Idem, pág. 149) O pensamento tem atuado na escuridão, criando sua própria escuridão e funcionando nela; e a visão intuitiva é, como dissemos, como um lampejo que atravessa a escuridão. Quando, então, essa visão intuitiva clareia a escuridão, o homem pode atuar, ou funcionar racionalmente? (Idem, pág. 159) Dissemos que, enquanto o centro estiver criando a escuridão, e o pensamento estiver operando nela, haverá desordem e a sociedade será como é agora. Para nos afastarmos disso, temos de ter a visão intuitiva. A visão intuitiva só pode ocorrer quando há um lampejo, uma luz, uma luz repentina, que elimina não apenas a escuridão como também o seu criador. (A Eliminação do Tempo Psicológico, pág. 162) Não está ligada ao tempo. Dissemos que a visão intuitiva é a eliminação da escuridão, que é o próprio centro do “eu” (self) (…) A visão intuitiva dissipa exatamente esse centro. (A Eliminação do Tempo Psicológico, pág. 160) Naquela base não há escuridão como escuridão, ou luz como luz. Naquela base não há divisão. Nada tem origem na vontade, no tempo, ou no pensamento. D.B. [N.Revisor: Essas iniciais não significam nada para os novos leitores. Precisamos especificar que é o David Bohm]: Está dizendo que aquela luz e aquela escuridão não estão divididos? Krishnamurti: Exatamente. D.B.: O que é a mesma coisa que dizer que não há nem uma nem outra coisa? Krishnamurti: Nem uma nem outra; é isso mesmo. Há algo mais. Há uma percepção de que existe um movimento diferente, que é “não-dualista” (A Eliminação do Tempo Psicológico, pág. 171) Quero me referir ao movimento, o movimento que não é tempo. Esse movimento não cria divisão. Portanto, quero voltar, chegar à base. Se, nessa base, não há nem escuridão nem luz, não há divisão - o que acontece então? (Idem, pág. 171)


Dissemos que o movimento é energia total. Essa visão intuitiva captou, viu, esse extraordinário movimento, e ele é parte dessa energia. (Idem, pág. 179)


15. PROGRESSO; RELATIVO NA ALMA, NÃO OCORRE NO ESPÍRITO

Pensamos que há progresso, evolução, que através do tempo alcançaremos um resultado; (…) sendo esse resultado a união com a realidade. Falamos do progresso evolutivo do homem, dizemos que, com o tempo, “viremos a ser” alguma coisa - se não nesta vida, na vida futura. Isto é, (…) evolvemos para algo maior, mais belo, mais digno, etc. (A Arte da Libertação, pág. 134) Pois bem, existe a possibilidade de vos tornardes mais sábio, mais belo, mais virtuoso, mais aproximado da realidade, pelo processo do tempo? É o que queremos dizer, quando falamos de evolução. Existe, obviamente, uma evolução fisiológica, (…) mas existe um desenvolvimento psicológico, evolução psicológica, ou se trata apenas de uma fantasia de nossa mente? (…) (Idem, pág. 134) Ora, para vos tornardes alguma coisa, precisais especializar-vos (…) - e tudo o que se especializa, logo morre, declina, porque a especialização implica sempre falta de adaptabilidade. (…) Isto é, o autoconhecimento é um processo de especialização? Se é, então esse processo de especialização destrói o homem - e é isso o que está acontecendo. (…) (Idem, pág. 134-135) Pergunta: Qual a vossa idéia de evolução? Krishnamurti: É óbvio (…) o simples tornando-se mais complexo será evolução? Ao falardes em evolução não pensais apenas na evolução da forma. Pensais na sutil evolução da consciência a que chamais o “eu”. (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 82) Disto surge a pergunta: Haverá crescimento, uma continuidade futura? Pode o “eu” tornar-se onicompreensivo, perdurável? (Idem, pág. 82) Aquilo que é capaz de crescimento não é eterno. O que é perdurável está indoa-ser. Vós me perguntais se o “eu” evolui, se se torna glorioso, divino. (Idem, pág. 82) (…) Com relação à continuidade, precisamos apreciar a idéia de que existe em nós uma essência espiritual, a qual é contínua. (…) Tudo quanto é, em essência, atemporal, eterno. Se assim é, então é evidente que o atemporal, o


eterno, é algo que transcende o nascer e o morrer. (…) (Uma Nova Maneira de Viver, pág. 135) Ora, que é isso que chamamos continuidade? Que é que continua? De duas coisas, uma: ou é uma entidade espiritual e, por conseguinte, fora do tempo, ou é, simplesmente, a memória, dando continuidade a si mesma, por meio do resíduo da experiência. (…) Isto é, se sou uma entidade espiritual, então sou atemporal; logo, não há continuidade. Porque o que é espiritualidade, verdade, divindade, está fora do tempo (…) (Da Insatisfação à Felicidade, pág. 61) Se isso que eu sou é uma entidade espiritual, ela deve ser sem continuidade, não pode progredir, não pode crescer, não pode vir-a-ser (…) Então, a vida e a morte são uma coisa só, há então atemporalidade, eternidade. (…) (Idem, pág. 61) (…) O que continua não tem renovação, não tem frescor, não tem novidade, porque está apenas continuando o que foi ontem, numa forma modificada. (…) Não há renovação por meio da memória, (…) da continuidade; só ocorre renovação quando há um término (…) quando há morte, quando a idéia cessa. Então, todos os dias há renovação. (…) (Da Insatisfação à Felicidade, pág. 63) Evolução, no sentido de extensão da própria individualidade através do tempo, é uma ilusão. O que é imperfeito, (…) ainda que multiplicado e aumentado, permanecerá sempre imperfeito. (…) Ora, é vão aumentar ao enegésimo grau esta autoconsciência que é separação; ela permanecerá separada porque tem as suas raízes na separação. Portanto, a amplificação deste “eu sou”, que é separação, não pode conduzir ao universal. (…) (Experiência e Conduta, em Carta de Notícias” de maio-junho de 1941, pág. 3) Pergunta: A evolução nos ajudará a encontrar Deus? Krishnamurti: Não sei o que entendia por “evolução” nem (…) por “Deus”. Essa questão me parece bastante importante (…) (Palestras na Austrália e Holanda, 1955, pág. 132) E o interrogante deseja saber se, através do tempo, se pode chegar ao conhecimento daquilo que se acha além do tempo. (…) Somos escravos do tempo; nossa mente, toda ela, só pensa em termos de ontem, de hoje ou de amanhã. (…) Existe alguma coisa na mente que está fora do tempo - o espírito (…) O que é suscetível de desenvolvimento, evolução, “vir-a-ser”, não é parte do eterno (…) (Idem, pág. 133) Pergunta: Acreditais no progresso?


Krishnamurti: Há o movimento da chamada progressão do simples para o complexo. Existe o processo de constante ajustamento ao ambiente, que promove transformações ou mudanças, (…) “Progredimos”!:possuímos rádios, cinemas, rápidos meios de transporte (…) Temos habitações maiores e mais confortáveis, mais luxo, (…) entretenimentos (…) Pode considerar-se progresso, isso? É progresso a expansão do desejo material? Ou reside o progresso na compaixão? (O Egoísmo e o problema da Paz, pág. 140-141) Existe progresso no campo da ciência mecânica, e a conquista do espaço. Entretanto, não me refiro a essa espécie de progresso, porque o progresso na ciência mecânica será sempre transitório (…) (Palestras em Adyar, Índia, 19331934, pág. 150-151) Não pode haver preenchimento para o homem no progresso mecânico. (…) Quando falamos de progresso, aplicado ao que chamamos crescimento individual, que queremos dizer com isso? Queremos dizer a aquisição de mais conhecimento, de maior virtude, que é preenchimento. (…) (Idem, pág. 151) Vós adorais o sucesso. Vosso deus é o sucesso, que vos confere títulos, diplomas, posição e autoridade. Há uma constante batalha dentro de vós mesmos - a luta por alcançardes aquilo que desejais. Nunca tendes um momento tranqüilo, nunca existe paz em vosso coração, porque estais sempre a esforçar-vos por vos tornardes alguma coisa, por progredirdes. (Por que não te Satisfaz a Vida? pág. 50) Não vos deixeis seduzir pela palavra “progresso”. As coisas mecânicas progridem, mas o pensamento humano nunca pode progredir senão no seu próprio “vir-a-ser”. Move-se o pensamento do conhecido para o conhecido; mas isso não é crescimento, não é evolução, não é liberdade. (Idem, pág. 50) (…) Não entendemos por evolver o constante vir-a-ser do indivíduo, do seu “ego”, que acumula e rejeita, que é ávido e quer ser não ávido - o movimento interminável do vir-a-ser? A natureza mesma do “ego” é de criar contradição. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 100) Entendemos também por progresso o constante expandir do desejo, do “ego” (…) Ora, nesse processo de expansão, de vir-a-ser, podemos em algum tempo chegar ao fim do conflito e da aflição? (…) Se é para a continuação das lutas e dos sofrimentos, que valor tem o progresso, a evolução do desejo, a expansão do “ego”? (…) Mas, não é da própria natureza do anseio criar e alimentar o conflito e o sofrimento? (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 141) O “ego”, esse feixe de lembranças, é o resultado do passado, produto do tempo; e esse “ego”, por mais que evolva, será capaz de conhecer o


Atemporal? Pode o “eu”, com o tornar-se maior e mais nobre, no correr do tempo, sentir o Real? (Idem, pág. 142) Desejais “progresso” e felicidade ao mesmo tempo, e aí é que está a dificuldade. (…) Desejais a expansão de vosso “ego”, mas sem o conflito, o sofrimento que inevitavelmente a acompanham. Temos medo de nos ver assim como somos; procuramos fugir da realidade e a essa fuga chamamos “progresso” ou busca da felicidade. (…) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 205-206) Acreditamos que, se não “progredirmos”, nos deterioraremos; que nos tornaremos indolentes, infensos ao pensar (…) Nossa educação e o mundo que criamos nos ajudam a fugir; todavia, para sermos felizes, precisamos conhecer a causa do sofrimento. Conhecer a causa do sofrimento, e transcendê-la, significa encará-la, frente a frente, e não buscar refúgio em ideais ilusórios ou outras atividades do “ego”. A causa do sofrimento é a expansão do “ego”. (…) (Idem, pág. 206) Pergunta: Já dissestes que o esclarecimento jamais nos poderá vir pela expansão pessoal; mas não vem ele com a expansão da consciência individual? Krishnamurti: O esclarecimento, a compreensão do Real, não poderá vir, nunca, pela expansão do “ego”, por um esforço realizado pelo “ego” no sentido de crescer, “vir-a-ser”, alcançar algo - e esforço algum está separado da vontade, do “ego”. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 199-200) Precisamos conhecer (…) É claro que há desenvolvimento físico, a plantinha se converte numa grande árvore; há o progresso técnico (…) Mas há progresso psicológico, evolução psicológica? É disso que estamos tratando: se há um desenvolvimento, uma evolução do “eu” (…) Pelo processo da evolução, através do tempo, pode o “eu”, centro do mal, tornar-se nobre, bom? Não pode (…) (Claridade na Ação, pág. 141-142) Pensamos que, no processo do tempo, no crescer e transformar-se, o “eu” se tornará, no fim, realidade. (…) Que é esse “eu”? É um nome, uma forma, um feixe de lembranças, esperanças, frustrações, ânsias, dores, sofrimentos e alegrias passageiras. Queremos que esse “eu” subsista e se torne perfeito (…) (Idem, pág. 142) Se admitirmos a possibilidade e evolução e progresso psicológico, nesse caso temos de admitir também o tempo. Mas o tempo é produto do pensamento. E o pensamento (…) é sempre velho. Ele pode transformar-se, modificar-se, ser aumentado ou diminuído, mas será sempre pensamento, reação da memória, pertence ao passado. (…) Se não há tempo psicológico (como não há), estais


então em contato com “o que é” e não com o que “deveria ser”. (…) Repito, “o que deveria ser” é uma invenção, uma fuga ao fato - “o que é” (…) (Palestras com Estudantes Americanos, pág. 144) Essa idéia de crescer progressivamente é falsa, para mim, porque aquilo que cresce não é eterno. Já se demonstrou alguma vez, que quanto mais tendes, mais entendeis? (Palestras em Adyar, Índia, 1933-1934, pág. 32) Um homem aumenta sua propriedade e nela se encerra; outro aumenta seu conhecimento e por ele fica limitado. Qual a diferença? Esse processo de crescimento acumulativo é superficial, falso desde o próprio começo, porque aquilo que é capaz de crescer não é eterno. (Idem, pág. 32-33) (…) Quando pensamos em termos de progresso, desenvolvimento, não estamos pensando e sentindo dentro de padrão do tempo? Existe um vir-a-ser, um modificar e alterar, no plano horizontal; esse vir-a-ser conhece a dor e a tristeza, mas conduzirá ele à Realidade? Não; porque o vir-a- ser condicionanos ao tempo. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 143) Só há vir-a-ser e evolver no plano horizontal da existência, mas conduz isso ao Atemporal? A potência criadora só pode ser conhecida depois de abandonado o plano horizontal. (…) Por meio do tempo não se pode conhecer o Atemporal. (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 99) Pensamos em termos de passado, presente e futuro (…) Pensamos e sentimos em termos de acumulação (…) “Ser” não é totalmente diferente de “vir-a-ser”? Só compreendendo o processo e a significação de “vir-a-ser”, podemos “ser”. (…) Quando percebeis a imensidade do “ser”, há então silêncio (…) (Idem, pág. 142-143) (…) Devemos pôr de lado todas essas coisas e chegar-nos ao problema central, que é: Como dissolver o “eu”, que nos prende ao tempo, e no qual não existe nem amor nem compaixão? Só é possível passarmos além, depois que a nossa mente não mais se divida em pensador e pensamento, quando (…) pensador e pensamento são uma só unidade, só então há silêncio, (…) não há fabricação de imagens, nem a expectativa de “mais” experiência. Nesse silêncio não há nenhum experimentador experimentando, e só então há uma revolução psicológica criadora. (Claridade na Ação, pág. 145) Uma vez cônscia de todo esse processo do “eu”, em sua atividade, que deve a mente fazer? Só com a renovação, só com a revolução - não pela evolução, não com o “eu” na atividade de vir-a-ser, mas sim pelo completo findar do eu”, há o novo. O processo do tempo não pode trazer o novo; o tempo não é caminho da criação. (Quando o Pensamento Cessa, pág. 220)


Assim (…) Dizeis: “eliminai, libertai a mente desta consciência de “mim mesmo”, como um “eu”, e então o que é que permanece?” O que resta quando sois sumamente felizes, criativos? O que permanece é essa felicidade. (…) Existe este admirável sentimento de amor ou este êxtase. (…) (Palestras em Auckland, 1934, pág. 116) (…) Digo-vos que não posso descrever (…) exprimir em palavras essa vivente realidade que está além de toda idéia do progresso, de crescimento. (…) (Coletânea de Palestras, 1930-1933, pág. 44) Para mim, a verdade, essa integridade de que falo, acha-se em todas as coisas. Portanto, a idéia de que necessitais progredir em direção à realidade é uma idéia falsa. Não se pode progredir na direção de uma coisa que sempre está presente. Não se trata de avançar para o exterior ou de voltar-se para o interior, mas sim de se libertar dessa consciência que se percebe a si mesma como separada. (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 18) Quando houverdes realizado tal integridade, vereis que tal realidade não tem futuro nem passado; e todos os problemas relacionados com tais coisas desaparecem inteiramente. Uma vez que o homem realize isso, vem-lhe a tranqüilidade, não a da estagnação, porém a da criação, a do ser eterno. Para mim, a realização desta verdade é a finalidade do homem. (Idem, pág. 18)


16. ORDEM, DESORDEM DO PENSAMENTO; FATORES, EFEITOS

O pensamento é necessário em certas áreas, mas o pensamento psicológico sempre traz desordem. Quando o pensamento psicológico está ausente, a mente por si mesma está em ordem. (The World of Peace, pág. 90) O pensamento criou a desordem através do conflito entre o que “é” e “o que deveria ser”, o real e o teórico. O pensamento olha para a forma real, de um limitado ponto de vista e, portanto, sua ação deve inevitavelmente criar desordem. Você encara isso como uma verdade, uma lei - ou apenas como uma idéia? Entende? Sou ambicioso, ávido - isso é “o que é”. Mas o oposto - “o que deveria ser” - tem sido criado pelo ser humano na tentativa de entender “o que é”, e também como um meio de escapar ao “que é”. Mas só há “o que é”. E quando você percebe “o que é” sem o seu oposto, então essa percepção traz a ordem. (Idem, pág. 90) Pergunta: O cérebro tenta criar ordem. É isso um processo dualístico ou nãodualístico? Krishnamurti: Vou explicar-lhe. As células do cérebro exigem ordem. Do contrário, não podem funcionar. Não há dualidade nisso. Durante o dia, há desordem porque o centro está alerta, o centro é a causa da fragmentação; a fragmentação é conhecida somente por meio de fragmentos; não é consciente da totalidade dos fragmentos e, por isso, não há ordem; conseqüentemente vive em desordem. É a desordem. (…) (Exploration into Insight, pág. 123) Krishnamurti: As células do cérebro precisam de ordem; sem isso, se tornam neuróticas, destrutivas. Isso é um fato. As células do cérebro estão sempre exigindo ordem, e o centro está sempre criando fragmentação. Essa ordem é negada quando há um centro, porque o centro está sempre produzindo destruição, conflito e tudo o mais, que é a negação da segurança, (…) da ordem. Não há dualidade. Esse processo continua. O cérebro dizer: “devo ter ordem”, não é dualidade. (Idem, pág. 123) Pergunta: Espere, você não está respondendo à minha pergunta. (…) Estou perguntando, como é que você fica consciente dessa desordem. Se é o centro que está consciente da desordem, então é ainda desordem. (Exploration Into Insight, pág. 124)


Krishnamurti: Você percebe que, quando o centro está consciente de que isso é desordem, então ele cria a dualidade de ordem e desordem. Desse modo, como você observa a desordem, sem ou com o centro? Se é uma observação com o centro, há divisão. Se não há observação do centro, então há somente desordem. (Idem, pág. 124) (…) Onde há o centro, há desordem. A desordem é o centro. Como fica você consciente? Está o centro consciente da desordem ou há somente desordem? Se não há centro para estar consciente da desordem, há completa ordem. Então os fragmentos chegam a um fim, obviamente, porque não há centro que esteja produzindo os fragmentos. (Exploration into Insight, pág. 125) Alguém vem e diz: Olhe, através de milênios o homem tem evoluído pelo conhecimento e hoje você certamente é diferente dos grandes macacos. E diz: Olhe, enquanto você está registrando, está vivendo uma vida fragmentária, porque o conhecimento é fragmentário e o que quer que você faça a partir desse estado fragmentário do cérebro, é incompleto. Portanto há dor, sofrimento. (Idéia, pág. 153) Quando isso está claro, qual é, então, a causa da desordem? Esta tem muitas causas: o desejo de realização pessoal, a ansiedade de não realizar-se, a vida contraditória que se vive, dizendo uma coisa e fazendo algo por completo diferente (…) Porém, poderia o indivíduo inquirir dentro de si mesmo e descobrir se existe uma causa fundamental. (…) A raiz, a causa original, é o “eu”, o “meu”, o “ego”, a personalidade gerada pelo pensamento, pela memória, pelas múltiplas experiências, (…) palavras, (…) sentimento de separação e isolamento; essa é a causa original da desordem. O “eu” é produzido pelo pensamento (…) (La Llama de la Atención, pág. 129) Interlocutor: O fato de ver essa desordem, já implica que o observador, o indivíduo, se tenha afastado da desordem. Krishnamurti: Há três coisas abrangidas nisto: a ordem, o afastar-se e a observação da desordem. Afastar-se da desordem, o mesmo ato de afastar-se dela, é ordem. (…) Como se observa a desordem em si mesmo? Se olha a desordem (…) como a um estranho, como algo separado da ordem e, por conseguinte, há uma divisão: você e a coisa que está observando? (La Verdad y la Realidad, pág. 82) Krishnamurti: De modo que o afastar-se disso é estar totalmente envolvido no que se observa. E quando eu observo essa desordem, quando a observo sem todas as reações, recordações, as coisas que afloram à mente, então, nessa observação total, há ordem, essa mesma observação total é ordem. (…) (Idem, pág. 85)


Que é o espaço? Pode haver espaço sem ordem? Quando há desordem em uma habitação, há espaço? Quando um indivíduo arroja suas roupas em qualquer lugar e tudo se acha em desordem, há espaço? O espaço só existe quando tudo está no lugar que lhe corresponde. Isso externamente. Vejamos agora internamente. Nossas mentes se acham tão confusas, toda nossa vida é contradição, desordem, estamos aprisionados em diversos hábitos: drogas, fumo, bebida, sexo, etc. Obviamente, os hábitos são mecânicos, e onde há hábitos há desordem. Internamente, que é a ordem? É algo ditado pelo pensamento? O pensamento mesmo é um movimento de desordem. (La Totalidad de la Vida, pág. 196) Assim, (…) nossa vida é toda de desordem, tanto exterior como interiormente. Vemo-nos em conflito, em contradição, exterior e interiormente. E a ordem não é possível quando há conflito, ódio, inveja, avidez, competição, idéias brutais a respeito dos “outros”. E nós necessitamos de ordem, numa escala infinita. (…) (A Suprema Realização, pág. 176) Só se pode criar a ordem negativamente. Isto é, a ordem não pode ser criada pela imitação ou pelo ajustamento. Vivendo, como estais, à beira do abismo, tendes de achar a solução correta. (…) (Idem, pág. 176) (…) A ordem deve começar dentro de nós mesmos, para depois manifestar-se exteriormente. Não se pode promover a ordem exteriormente, como o fazem os políticos e os reformadores do mundo inteiro. Só pode haver ordem quando interiormente impera a ordem. Então, toda ação, todo movimento da vida é conforme a ordem, correta, racional. Assim, para encontrarmos a ordem, devemos proceder negativamente. (…) (Idem, pág. 177) A verdadeira ordem traz consigo um espaço imenso; espaço significa silêncio; desse silêncio surge este extraordinário sentido do vazio. Não se assustem com essa palavra “vazio”; quando existe esse vazio, então certas coisas podem ocorrer. (La Totalidad de la Vida, pág. 197) (…) A menos que a ordem seja estabelecida no mundo da realidade, não existem bases para uma ulterior investigação. É possível conduzir-se ordenadamente no mundo da realidade, não de acordo com um padrão estabelecido pelo pensamento - o qual continua em desordem? (…) A ordem implica grande virtude; a virtude é a essência da ordem, não o seguir um esquema de ordem, o qual se torna mecânico. (…) (La Verdad y la Realidad, pág. 202) (…) Quem é, então, que vai produzir ordem neste mundo da realidade? O homem tem dito: “Deus trará a ordem. Crê em Deus.” Porém essa ordem se


converte em algo mecânico, porque nosso desejo é o de estar seguros, encontrar a forma mais fácil de viver. (…) (Idem, pág. 202) Agora investigaremos (…) Pode o indivíduo observar esta desordem em que vive - que é conflito, contradição, desejos opostos, dor, sofrimento, medo, prazer, etc. - pode observar toda essa estrutura da desordem sem o pensamento? (…) Porque se houver qualquer movimento do pensar (…) este vai criar mais desordem (…) (Idem, pág. 203) Vamos ver se o pensamento, como tempo, pode cessar. (…) Esta é a essência mesma da meditação. Compreendem? (…) Só então há ordem e, portanto, virtude. Não a virtude cultivada, que requer tempo e, por conseguinte, não é virtude (…) Isto significa que devemos inquirir (…) o que é a liberdade. (…) Se o tempo cessa, isso significa que o homem é profundamente livre. (…) Quando a liberdade não está atada ao pensamento, então é absoluta. (…) (Idem, pág. 203-204) Quando negamos - não a sociedade, mas interiormente em nós mesmos quando negamos o medo, a ambição, a avidez, a inveja, a busca de prazer e de prestígio - tudo isso gera desordem interior - então, na negação total dessa desordem, surge uma ordem, que é beleza, e não a que resulta de pressões ou comportamentos ambientais. Essa ordem é absolutamente necessária e vereis que ela é retidão. (O Mundo Somos Nós, pág. 90) (…) A ordem não pode ser criada pelo pensamento, através do tempo, num processo gradual. A virtude não é uma coisa cultivável, não é um hábito. Tal virtude é produto do tempo, (…) do pensamento e, por conseguinte, não é virtude. (…) Mas, quando se compreende a natureza do pensamento e do tempo, surge daí a virtude com sua disciplina própria. Porque disciplina é ordem, mas não a disciplina de imitação, de ajustamento, de obediência. (…) (A Essência da Maturidade, pág. 94) Há uma espécie de disciplina quando fazemos uma coisa pelo gosto de fazê-la. Mas a disciplina que é mero ajustamento a um padrão, nobre ou ignóbil, não é a verdadeira disciplina, pois só gera desordem, caos. Mas, para compreender a ordem, que é virtude, precisa-se compreender a natureza do pensar. E a compreensão do pensar exige disciplina. Observar qualquer coisa bem de perto, observar, prestar atenção (…) - esse observar, que só dura um instante, exige enorme disciplina, porque, do contrário, sois incapaz de olhar. (Idem, pág. 94) Estamos vendo, pois, que a ordem interior, a ordem na mente, em nosso ser, nunca pode ser produto do pensamento. O pensamento pode criar hábitos, ajustamento, obediência, e isso, é bem de ver, só leva a uma desordem maior


(…) É necessário compreender todo esse processo do pensamento: como pensamos, por que pensamos, observando-o simplesmente. Se a ele dispensais atenção, não apenas intelectual ou emocionalmente, porém totalmente, nessa atenção total há imediata compreensão e, por conseguinte, ação imediata. E quando se compreende a natureza do pensamento, começase a descobrir o que é o amor. (…) (A Essência da Maturidade, pág. 94-95) Já considerastes alguma vez (…) por que razão quase todos nós somos um tanto negligentes (…) no vestir, nas maneiras, no pensar, no modo de fazermos as coisas? Por que somos impontuais e (…) desatenciosos para com os outros? E que é que põe ordem em todas as coisas, ordem no vestir, no pensar, no falar, na maneira de andar, (…) de tratarmos os que são menos afortunados do que nós? Que é que produz essa ordem singular, que não resulta de compulsão, de plano nenhum, de nenhuma atividade mental deliberada? Já considerastes isso? (A Cultura e o Problema Humano, pág. 60) Sabeis o que entendo por “ordem”? É estar sentado e quieto, sem constrangimento, comer com elegância, sem sofreguidão, ser calmo, descansado, mas ao mesmo tempo exato, claro no pensar e, ainda, sem limitações. Que é que produz essa ordem na vida? (Idem, pág. 60) A ordem, por certo, só desponta com a virtude; porque, se não sois virtuoso, não apenas nas pequenas, mas em todas as coisas, vossa vida se torna caótica (…) Ser virtuoso, por si só, tem muito pouca significação; mas, quando sois virtuoso, há precisão no vosso pensamento, ordem em todo o vosso viver, e essa é a função da virtude. (Idem, pág. 60) Mas, que acontece quando um homem se esforça para se tornar virtuoso, (…) bondoso, eficiente, atencioso, (…) consome suas energias tentando estabelecer a ordem (…)? (…) Seus esforços só o levam à respeitabilidade, causadora da mediocridade mental; esse homem, por conseguinte, não é virtuoso. Já olhastes atentamente para uma flor? Como é admiravelmente simétrica (…); há nela, também, singular delicadeza, perfume, encanto. (…) Nosso problema, pois, é sermos precisos, claros e sem limitações. (A Cultura e o Problema Humano, pág. 60-61) Vede, o esforço para ser ordeiro, cuidadoso, tem forte influência limitante. (…) Torno-me “insuportável” para mim próprio e para os outros. (…) Essa pessoa poderá ser muito ordeira, muito clara, poderá empregar as palavras com precisão, ser muito atenta e atenciosa, mas perdeu a criadora alegria de viver. (Idem, pág. 61) Ordem, apuro, clareza no pensar, não são em si muito importantes, mas tornam-se importantes para o homem que é sensível, que sente


profundamente, que se acha num estado de perpétua revolução interior. Se sentis intensamente a sorte do infeliz, do mendigo (…), se sois altamente receptivo, sensível a todas as coisas, então essa própria sensibilidade traz ordem, virtude; (…) (Idem, pág. 62) A ordem não é hábito; o hábito torna-se automático e perde toda a sua vitalidade, quando (…) em estado mecânico. (…) Tem-se observado as pessoas que são muito ordenadas; elas possuem certa rigidez, não são flexíveis, carecem de vitalidade; têm-se tornado mais duras, excêntricas, porque seguem um padrão particular que, na opinião delas, é ordem. E isso se converte gradualmente em um estado neurótico (…) (El Despertar de la Inteligencia, II, pág. 103) De maneira que controle não é ordem. Nunca se pode ter ordem por meio de controle, porque ordem significa funcionar claramente, ver de modo total, sem distorção alguma; porém onde há conflito deve haver distorção. O controle também implica repressão, conformidade, ajuste e divisão entre o observador e o observado. (…) (Idem, pág. 106)


17. FRAGMENTAÇÃO DA CONSCIÊNCIA; DESVIOS, NEUROSES

Vivemos em fragmentos. Há o fragmento chamado “vida espiritual”, o fragmento que é o intelecto, o fragmento que são as emoções, o fragmento que são os sentidos físicos. Acha-se, pois, a mente fracionada em vários fragmentos, cada um deles encerrado num compartimento estanque e muito escassamente em relação com os outros. Por isso, existe entre eles um perene conflito, o qual procuramos evitar mediante fuga. (…) (O Descobrimento do Amor, pág. 12) (…) No escritório somos uma coisa, em casa somos outra coisa; falais de democracia e, no íntimo, sois autocrata; falais em amor ao próximo e, ao mesmo tempo, o estais matando na competição; uma parte de vós está ativa, a olhar independentemente da outra. Estais cônscios dessa existência fragmentária em vós mesmos? E será possível ao cérebro (…) tomar-se cônscio do campo inteiro? É possível olharmos o todo da consciência, completa e totalmente, o que significa sermos entes humanos totais? (Libertese do Passado, pág. 27) A palavra “indivíduo” significa “indivisível”, não fragmentado. “Individualidade” significa uma totalidade, o todo, e a palavra “todo” significa “são”, “puro”. Mas, vós não sois um indivíduo, porque não estais são, porque estais dividido, fragmentado, interiormente; estais em contradição com vós mesmo, partido, e, por conseguinte, não sois de modo algum um indivíduo. Assim, em vista dessa fragmentação, como se pode exigir que um fragmento assuma a autoridade sobre os demais fragmentos? (Fora da Violência, pág. 11) O homem é um ser fragmentário. Por que é que há tal divisão? Um fragmento se acha tremendamente ativo, o outro não funciona em absoluto. Um fragmento é vulgar, burguês, mesquinho. Quando se une esses dois fragmentos para se tornarem uma energia harmônica, (…) não dividida? (Tradición y Revolución, pág. 53) Quando cessa o fragmento de ser um fragmento? (…) O movimento de definir, do chegar a ser, é sempre (…) fragmentado. Existe um movimento que não pertença a essas categorias? Veja o que ocorre se não houver movimento algum. (Idem, pág. 54)


A principal dificuldade é esta, que o homem vive fragmentado, não só em seu interior, mas também exteriormente: ele é cientista, médico, soldado, sacerdote, teólogo, especialista desta ou daquela matéria. Interiormente, sua vida está fragmentada, fracionada; sua mente, seu intelecto, é sutil e sagaz; por vezes, ele é brutal, agressivo, enquanto outras vezes pode mostrar-se bondoso, manso, afetuoso; esforça-se por ser um ente moral, embora a moralidade social seja de todo imoral, e seus inúmeros desejos antagônicos são a causa dessa fragmentação existente por dentro e por fora, dessa contradição interior e exterior. (Palestras com Estudantes Americanos, pág. 77) A maioria das pessoas funciona apenas com um fragmento, uma parte muito pequena do cérebro. Por isso, sua visão de vida é fragmentária. Somente uma parte do seu cérebro está operando ativamente em suas vidas, de forma que o cérebro não está funcionando totalmente. Portanto, você pode descobrir se o cérebro pode operar de uma forma total, completa. (…) (The World of Peace, pág. 50) (…) O conteúdo da consciência é a consciência. Quando não há conteúdo não há consciência. Nesse conteúdo existem tremendos fatores de conflito, de fragmentação. Um fragmento assume a autoridade, um fragmento não se identifica a si mesmo com os outros fragmentos. Ele se sente inseguro; há tão vastos conflitos, aí! Ele não se identifica com nenhum fragmento; só o faz quando diz: “isto me agrada, isto não me agrada”. (Tradición y Revolución, pág. 149-150) É onde quero chegar, vejo que estou fragmentado: digo uma coisa e faço outra, penso uma coisa e contradigo o que penso. E vejo claramente que não devo fazer disso um problema. (The Future is Now, pág. 113) (…) Se eu faço disso um problema, dizendo a mim mesmo que não devo ser fragmentado, essa declaração surge da fragmentação. Alguma coisa surgida da fragmentação é outra forma de fragmentação. Mas o meu cérebro é treinado para criar problemas. Portanto, tenho de estar atento ao ciclo completo. Então o que devo fazer? (Idem, pág. 113-114) (…) Não se ponha nessa posição; você chegou a uma conclusão; portanto, conclusão é outra fragmentação. Eu faço esta pergunta: Há uma maneira de viver não fragmentária, na qual esteja envolvida a qualidade da mente religiosa, profunda bondade, sem nenhuma dualidade? (Idem, pág. 114) Como pode a mente, que inclui o cérebro, ver uma coisa totalmente? (…) Nós vemos as coisas fragmentariamente, não é verdade? Trabalho, família, comunidade, indivíduos, minha opinião, vossa opinião, meu Deus, vosso Deus - tudo vemos em fragmentos. (…) Se vejo a vida em fragmentos, porque minha


mente está condicionada, é claro que não posso ver a totalidade (…) Se me separo, por causa de minha ambição, de meus preconceitos pessoais, não posso ver o todo. (…) (A Questão do Impossível, pág. 122) Apresenta-se, assim, a questão: Como pode a mente, tão enredada que está nesse hábito de ver e agir fragmentariamente, ver o todo? Claro que não pode. Se estou todo interessado em meu próprio preenchimento, na realização de minha ambição, no competir e no meu desejo de sucesso, não posso ver a humanidade no seu todo. (…) Enquanto a mente continuar a operar nesse campo da fragmentação, é óbvio, não poderá ver o todo. (…) (Idem, pág. 122) Assim, para observar realmente o que é, ver o seu inteiro significado, a mente deve estar nova, clara, não dividida. E isso leva-nos a outro problema: Como olhar sem a divisão em “eu” e “não eu”, “nós” e “eles”. (Fora da Violência, pág. 93) Como dissemos, (…) Como é que escutais e observais outra pessoa, (…) a vós mesmo? A chave dessa observação se encontra em ver as coisas sem divisão. (…) Nossa existência está toda fragmentada. Em nós mesmos estamos divididos, em contradição. Vivemos fragmentariamente.(…) (Idem, pág. 93) Um fragmento, dentre os múltiplos fragmentos, julga-se capacitado para observar. Embora tenha assumido a autoridade, ele continua sendo um fragmento entre os demais fragmentos. E esse fragmento olha e diz: “Eu compreendo; sei qual é a ação correta”. (Fora da Violência, pág. 93) Senhor, (…) Agora prosseguiremos: como posso eu, que vivo em fragmentos, muitos fragmentos (…) “isto é bom, aquilo é mal”, “isto é sagrado, aquilo não é”, “a tecnologia”, tudo isso carece realmente de importância, porém ir a um templo é infinitamente importante; como se pode viver sem fragmentação? (El Despertar de la Inteligencia, II, pág. 81) (…) O interlocutor diz “Mediante a integração”, (…) integrando todos os fragmentos? (…) E quem é a entidade que vai reunir todos os pedaços? O Atman superior, o Cosmos, (…) Jesus Cristo, Krishna? Tudo isso é fragmentação (…) (Idem, pág. 82) Pergunta: Você vê, sinto-me de todo sem saída nesta situação. O fato é que há conflito, e a atuação do “eu” leva a maior conflito. Vendo a natureza disso, pode a mente compreender que está totalmente em conflito? (Exploration into Insight, pág. 61) Krishnamurti: Pode a mente estar consciente de um estado no qual não há conflito? É isso o que você está tentando dizer? Ou só a mente pode conhecer o conflito? Certo? Está a sua mente de todo consciente do conflito, ou isso é


apenas uma palavra? Ou há uma parte da mente que diz “estou consciente de que me acho totalmente em conflito, e há uma parte de mim observando o conflito.” Ou há uma parte da mente desejando estar livre do conflito, de que forma, e há um fragmento que diz “não estou em conflito” e que se separa da totalidade do conflito? Se há um fragmento separado, então esse fragmento diz: “Devo fazer, suprimir, ir além. Então esta é uma pergunta legítima. Está a sua mente de todo consciente de que nada há senão conflito ou há um fragmento que se sobressai e diz: “Estou consciente de que me acho em conflito, mas não total?”Portanto, o conflito é de um fragmento ou é total”? Há escuridão total ou uma leve luz em algum lugar? (Idem, pág. 61) Se se divide em fragmentos a consciência, um dos fragmentos indaga: “Que são os outros fragmentos?”. Mas, se só há um movimento total, não existe fragmentação e, por conseguinte, não se faz tal pergunta. (…) Percebeis a consciência como um todo, ou a vedes como um fragmento a examinar os outros fragmentos? Vós a vedes parcialmente, ou a vedes em sua inteireza, como um movimento total (…)? Que é então esse movimento? Como observálo? (A Questão do Impossível, pág. 152) No presente não somos sensíveis; há imagens neste campo que são sensíveis quando nossa particular personalidade, (…) idiossincrasias, (…) prazeres são negados e então há uma luta. Somos sensíveis em fragmentos, em marcas, mas não somos sensíveis completamente. Portanto, a pergunta é: Como pode o fragmento, que é parte do todo, que está se tomando estúpido cada dia repetidamente, como pode essa parte tornar-se também sensível da mesma forma que é o todo? (…) (The Awakening of Intelligence, pág. 190-191) Como dissemos, o pensamento criou o “eu”, e então, por ser o pensamento fragmentário em si mesmo, converte o “eu” em um fragmento. Quando se diz “eu”, “meu”, eu quero, eu não quero, eu sou isto, eu não sou aquilo, isso é o resultado do pensamento. E como o pensamento mesmo é fragmentário nunca é a totalidade - o que ele cria também se torna fragmentário. “Meu mundo”, “minha religião”, “minha crença”, “meu país” (…) esse é o modo como isso se torna fragmentário. (La Verdad y la Realidad, pág. 73) Compreendo. Olho, posso ver parte de meu condicionamento; ver que estou condicionado como comunista ou muçulmano, mas há outras partes. Posso investigar conscientemente os vários fragmentos que compõem o “eu”, o conteúdo de minha consciência? Posso conscientemente olhá-lo? (The Future is Now, pág. 390)


Se a consciência se constitui de meus desesperos, minhas temores, prazeres, (…) esperanças, “sentimentos de culpa”, experiência do passado, então, nenhuma ação dela emanada tempo algum, libertar a consciência de suas limitações. (A Impossível, pág. 165)

ansiedades, e da vasta poderá, em Questão do

(…) Se se quer investigar profundamente a estrutura e natureza da consciência, quem fará a investigação? Um fragmento, dentre os muitos fragmentos? Ou existe uma entidade, um agente transcendental capaz de observar a consciência? Pode a mente consciente, aquela que funciona todos os dias, observar o conteúdo das camadas inconscientes ou mais profundas? E quais são as fronteiras, os limites da consciência? (A Questão do Impossível, pág. 149) Pergunta: Você diz que esse centro é tempo-espaço, também parece postular a possibilidade de ir além do campo do tempo-espaço. O espaço é aquilo que opera. Ele não é capaz de ir mais longe. Se pudesse, o tempo-espaço deixaria de ser conteúdo da consciência. Krishnamurti: Vamos começar de novo. O conteúdo da consciência é consciência. Isso é irrefutável. O centro é o criador de fragmentos. O centro torna-se consciente dos fragmentos quando os fragmentos são notados ou entram em ação; do contrário, o centro não fica consciente dos outros fragmentos. O centro é o observador dos fragmentos. Não se identifica com os fragmentos. Por isso, há sempre o observador e o observado, o pensador e a experiência. O centro é o criador de fragmentos e tenta reuni-los e ir além. Um dos fragmentos diz “dorme” e o outro fragmento diz “fique atento”. No estado de manter-se atento, há desordem. As células do cérebro, durante o sono, tentam estabelecer ordem, porque não podem funcionar efetivamente em desordem. (Exploration into Insight, pág. 122) Uma insatisfação de tal natureza não nos torna neuróticos nem produz desequilíbrio. Existe desequilíbrio somente quando a insatisfação se transfere a algo, ou fica presa em perturbação de uma ou outra classe; então há distorção, há todo gênero de lutas internas. (La Totalidade de la Vida, pág. 178) Eu me pergunto (…) como há de cessar o pensamento sem que esse processo de terminar se perverta, dispare para algum estado imaginativo, tendendo para desequilibrado, indefinido e neurótico? Como pode esse pensamento, que deve funcionar com grande energia e vitalidade, estar ao mesmo tempo completamente quieto? (El Despertar de la Inteligencia, II, pág. 172)


Estamo-nos perguntando - vós e eu - se existe alguma maneira inteiramente nova de proceder, sem conflito, nem contradição. Onde há contradição, há esforço, e onde há esforço há conflito - que é resistência ou aceitação. Resistência é abrigar-nos atrás de idéias; aceitação é imitação. Estamos sempre contra a corrente; (…) Podemos mover-nos, viver, ser, funcionar de maneira tal que não tenhamos de lutar contra nenhuma corrente? Quanto mais conflito existe, tanto mais tensão. Da tensão resultam neuroses e psicoses de toda espécie. (Encontro com o Eterno, pág. 74) (…) Somos, assim, levados a perguntar: Temos possibilidade de libertar-nos desse medo, não apenas do medo e da dependência superficiais, existentes nas relações, mas do medo profundamente radicado em nós? (…) Porque, se um homem teme, faz as coisas mais irracionais que se podem imaginar. Com medo, um homem está como que desequilibrado, num estado de neurose e, portanto, incapacitado de pensar com clareza, de observar com exatidão. (O Novo Ente Humano, pág. 157) Vós não sabeis quando sois neurótico? Alguém precisa dizer-vos que sois? (…) Sempre que há “exageração” de qualquer fragmento, há neurose. Se sois superiormente intelectual, isso é uma forma de neurose, embora os indivíduos intelectuais sejam tidos em elevada conta. Estar apegado a certa crença (…) é uma forma de neurose. (…) Qualquer espécie de medo é uma forma de neurose, todo ajustamento é uma forma de neurose e qualquer comparação de vós mesmo com outra pessoa é de fundo neurótico. (A Questão do Impossível, pág. 153-154) Logo, sois neurótico! (…) Deste nosso exame alguma coisa já aprendemos: toda “exageração” de qualquer fragmento da consciência (pois a vemos toda fragmentada), todo empenho em realçar um dado fragmento, é uma forma de neurose. (…) (Idem, pág. 154) Nós, como agora somos, dividimos a consciência, e nessa divisão há muitas fragmentações, muitas subdivisões - de ordem intelectual, emocional, etc; e atribuir importância a dado fragmento é neurose. Isso significa que, exagerando a importância de dado fragmento, a mente se torna incapaz de ver com clareza. (A Questão do Impossível, pág. 154) (…) Essa fragmentação - se nela se dá realce a um fragmento, a seus interesses, seus problemas, desprezando-se os demais fragmentos - leva não só ao conflito, mas também a grande confusão, porque cada fragmento quer manifestar-se, salientar-se, e, se damos importância a um só, os outros começam a protestar, a clamar. Esse clamor é confusão; e, dessa confusão,


provêm impulsos neuróticos, desejos de preenchimento, de “vir-a-ser' , “realizar-se”. (Idem, pág. 154) Sim. A neurose é apenas um sintoma, a causa pode achar-se no inconsciente. É claro que assim pode ser, e provavelmente é. (A Questão do Impossível, pág. 154) O que devemos fazer? Como saber, num mundo que é de certa forma neurótico, no qual os amigos e parentes são ligeiramente desequilibrados (…)? Não se pode recorrer a ninguém; portanto, o que acontece na mente de uma pessoa, agora que ela não depende mais de outras pessoas, de livros, de psicólogos, de autoridades? (Perguntas e Respostas, pág. 33) (…) A neurose é resultado da dependência. A gente depende da esposa, do médico; (…) de Deus ou dos psicólogos. Estabelecemos uma série de dependências (…), esperando que nessas dependências estaremos seguros. E quando descobrimos que não podemos depender de ninguém, o que acontece? Produz-se em nós uma tremenda revolução psicológica, que, geralmente, não queremos enfrentar. (…) (Perguntas e Respostas, pág. 33) Pergunta: Que é loucura? Krishnamurti: (…) A maioria de nós somos neuróticos, não? Em geral, somos ligeiramente desequilibrados, temos idéias (…), crenças peculiares. Certa vez, conversávamos com um católico fervoroso, e ele disse: “Vocês, hindus, são o povo mais supersticioso, fanático, neurótico; crêem em tantas coisas anormais”! (…) (Fora da Violência, pág. 126) (…) Esse homem estava completamente inconsciente de sua própria anormalidade, suas próprias crenças, suas estúpidas idéias. Assim, quem é equilibrado? É, fora de dúvida, o homem sem medo, (…) íntegro. O que é inteiro está são, e é sagrado; mas nós não o somos, somos entes humanos fragmentados e, por conseguinte, desequilibrados. (…) (Idem, pág. 125-126) Mas veja que o próprio estado de dependência de outrem pode ser a causa de uma neurose psicológica profunda. Quando se quebra esse padrão, o que acontece? A pessoa sara! Precisamos estar sãos para descobrir o que é a verdade. A dependência veio da infância (…) Não depender de nada, significa que estamos sozinhos, inteiros, íntegros - isso é saúde, (…) que produz racionalidade, clareza, integridade. (Perguntas e Respostas, pág. 33-34) (…) Significa uma mente em que não há divisão de espécie alguma; uma mente total, portanto, sã. Só o indivíduo neurótico é obrigado a controlar-se; e, quando chega ao ponto de estabelecer o controle total de si próprio, está


completamente neurĂłtico, impossibilitado de mover-se livremente. (Fora da ViolĂŞncia, pĂĄg. 96)


18. VISÃO GLOBAL, HOLÍSTICA, DA CONSCIÊNCIA, DA VIDA

Nossas vidas acham-se fragmentadas, divididas, jamais somos algo total; nunca temos uma observação holística. Observamos sempre de um ponto de vista particular. Estamos tão divididos internamente, que nossas vidas são em si mesmas contraditórias e, portanto, existe um constante conflito. Nunca olhamos a vida como uma totalidade completa e indivisível. (La Llama de la Atención, pág. 69) A observação holística é uma percepção sã, cordata, racional, lógica e total total (whole) implica sagrada (holy). É possível para um ser humano como qualquer de nós, que é um leigo, não é um especialista, é possível para ele olhar a contraditória e confusa consciência, olhá-la como uma totalidade? Ou deve olhar cada parte dela separadamente? (…) (La Llama de la Atención, pág. 107) Observar holisticamente é observar ou prestar atenção a todo o conteúdo de algo. Normalmente, olhamos as coisas de maneira parcial, conforme nosso prazer ou nosso condicionamento, ou segundo algum ponto de vista ideal; sempre olhamos as coisas fragmentariamente. O político está (…) comprometido com a política, o economista, o cientista, o homem de negócios, cada um tem seu próprio compromisso, geralmente ao longo de toda a vida. Parece que jamais encaramos o movimento total da vida. Assim (…) podemos encarar a vida holisticamente, como um movimento total desde o princípio até o fim, sem fragmentação nem desvio nem ilusão alguma. É importante compreender como a mente cria ilusões de auto-importância e todos os múltiplos tipos de ilusão (…) Olhamos algo com uma idéia ou crença preconcebida, de maneira que nunca o vemos realmente, como um fato. (La Totalidad de la Vida, pág. 208) A ordem implica harmonia na vida diária. A harmonia não é uma idéia. Nós nos achamos encerrados na prisão das idéias, e nisso não há harmonia. A harmonia e a claridade implicam ver as coisas holisticamente, observar a vida como um movimento unitário total - não “Eu sou um homem de negócio no escritório e uma pessoa diferente em minha casa;” não “Eu sou um artista e por isso posso fazer as coisas mais excêntricas e absurdas”; não esse despedaçar


ou fragmentar a vida em múltiplas categorias, a elite e a não elite, (…) o intelectual e o romântico, o que constitui nosso normal modo de viver. Vejam o importante, que é encarar a vida como movimento total, no qual tudo está incluído, (…) não há divisões como o bem e o mal, o céu e o inferno. Vejam holisticamente, (…) observem o amigo, a esposa ou o esposo, numa visão total. (La Totalidad de la Vida, pág. 209) E, como dissemos, vemos tudo fragmentariamente e somos treinados desde a infância para olhar, observar, aprender, viver em fragmentos. E há a vasta expansão da mente que nunca tocamos ou conhecemos; essa mente é extensa, imensurável, mas nunca a sentimos, não conhecemos sua qualidade, porque nunca olhamos para as coisas completamente, com a totalidade de nossa mente, .(…) coração, nervos, olhos, ouvidos. Para nós, o conceito é extraordinariamente importante, não os atos de ver ou fazer. (The Awakening of Intelligence, pág. 188) É possível ver-se a totalidade da vida, a qual semelha um rio, a rolar infinitamente, sem descanso, cheio de beleza, impelido pelo enorme volume de suas águas? Pode-se ver totalmente essa vida? Pois só vendo totalmente uma coisa, a compreendemos; mas não podemos vê-la totalmente, completamente, se há alguma atividade egocêntrica a guiar, a moldar a nossa ação e os nossos pensamentos. É a imagem egocêntrica que se identifica com a família, com a nação, conclusões ideológicas, com partidos - políticos ou religiosos. É esse centro que, dizendo-se em busca de Deus, da Verdade, impede a compreensão do todo da vida. E compreender esse centro, tal como realmente é, requer uma mente que não esteja repleta de conceitos e conclusões. (…) (Viagem por um Mar Desconhecido, pág. 26) Pode-se viver uma vida que seja total, não fragmentada? - uma vida em que o pensamento não se fragmente como família, escritório, igreja, isto ou aquilo? Uma vida em que a morte tenha sido tão separada que, quando chega, estamos espantados com ela, incapazes de enfrentá-la, porque não temos uma vida total. (La Totalidad de la Vida, pág. 190) O conhecimento é o “eu”, e quer o coloquemos no mais alto, quer no mais ínfimo nível, ele é sempre “eu” - experiência acumulada (…) O “eu” é incapaz de perceber a totalidade dessa coisa extraordinária que chamamos de “vida”, e por essa razão é que fragmentamos o mundo (…) (Da Solidão à Plenitude Humana, pág. 101) Para pordes fim (…), deveis olhar todo o campo da existência; não apenas uma parte dele, sua totalidade. Em nosso estado atual, somos incapazes de observar o campo inteiro - o todo - porque dividimos a vida em vida de


negócios, vida de família, vida religiosa, etc; e, como cada uma dessas frações tem sua própria energia ativa, cada fragmento está oposto aos outros fragmentos e, assim, essas energias fragmentárias estão dissipando nossa energia total. (O Novo Ente Humano, pág. 75) Pode-se olhar o campo inteiro (…) Para percebê-lo totalmente, necessitamos de uma mente não fragmentada. Como consegui-la? Como pode a mente fragmentada sacudir todos os fragmentos, para ter uma percepção total? (…) Não posso vê-lo, porque o intelecto é um fragmento e não posso servir-me de um fragmento para compreender o todo. Deve haver uma diferente espécie de percepção e essa espécie de percepção só existe quando o observador está ausente, sem nenhuma imagem, (…) (Idem, pág. 75) (…) Essas imagens são produzidas pelo observador (…) Assim, ao verdes a verdade de que há conflito sempre que há observador - e o observador é o produtor de imagens, é tradição, é a entidade condicionada, é o censor - ao verdes essa verdade, estareis então observando sem observador e vendo a totalidade da existência. Tem a mente, então, uma energia tremenda, porque sua energia não está sendo dissipada. (…) (Idem, pág. 75) Podemos falar acerca da totalidade da vida? Pode-se perceber essa totalidade, se a mente se acha fragmentada? Você não pode dar-se conta do total, se só está olhando através de uma pequena abertura. (La Totalidad de la Vida, pág. 9) Interlocutor: Como sei que estou fragmentado? Krishnamurti: Quando os desejos opostos, os anelos, os pensamentos opostos produzem conflito. Então a pessoa sofre, se torna consciente de sua fragmentação. (Idem, pág. 9) Interlocutor: (…) Porém nesses momentos ocorre com freqüência que o indivíduo não quer desprender-se do conflito. Krishnamurti: Esse é um assunto diferente. O que nos perguntamos é: Pode o fragmento dissolver-se? Porque só então é possível ver o total. (Idem, pág. 9) Veja, senhor. Pode você dar-se conta de seu fragmento? Dar-se conta de que você é um norte-americano, (…) eu sou um hindu, um judeu, um comunista (…) - de que o indivíduo vive somente nesse estado? (…) (La Totalidad de la Vida, pág. 10) Pode então dar-se conta realmente dos diversos fragmentos? De que eu sou um hindu, (…) um judeu, um árabe, (…) um comunista, um católico, um homem


de negócios (…); de que eu sou um artista, (…) um cientista - entende? Toda essa fragmentação sociológica. (Idem, pág. 10) Podemos, pois, (…) dar-nos conta de que um indivíduo é isso? Eu sou um fragmento e, portanto, estou criando mais fragmentos, mais conflito, (…) infelicidade, confusão, sofrimento; porque, quando há sofrimento, este afeta tudo. (Idem, pág. 10-11) Este é realmente um grande descobrimento, se compreendemos a verdade de que o indivíduo é o passado, o presente e o futuro - o que é tempo como movimento psicológico. (…) Observar holisticamente o movimento total da existência é viver tanto a vida como a morte. Porém a pessoa se aferra à vida e foge da morte; (…) (La Llama de la Atención, pág. 71-72) Pode a mente observar seu conteúdo sem nenhuma escolha quanto a esse conteúdo - não escolhendo nenhuma parte do conteúdo, (…) o conjunto, mas observando totalmente? Ora, como é possível observar totalmente? Quando o olho para o mapa da França, vindo da Inglaterra e cruzando o Canal, vejo a estrada que conduz a Gstaad. Posso citar as milhas percorridas, (…) ver a direção, e isso é muito simples, porque está marcado no mapa e eu sigo. Ao fazê-lo, não olho nenhuma outra parte do mapa, porque conheço a direção na qual desejo ir, e, por isso, essa direção exclui todas as outras. Da mesma forma, uma mente que está se orientando numa direção, não vê o todo. (Talks in Saanen, 1974-1975, pág. 14) Se quero encontrar algo, (…) que penso ser real, então a direção é determinada e eu sigo naquela direção, e minha mente se torna incapaz de ver a totalidade. Pois bem, quando eu olho o conteúdo de minha consciência - que é o mesmo da de vocês - estabeleço uma direção além da qual devo ir. Um movimento numa particular direção, atendendo a certo prazer, não desejando isto ou aquilo, torna o indivíduo incapaz de ver o todo. Se sou um cientista, só vejo numa única direção. Se um artista, da mesma forma, se tenho certo talento ou dote natural, olho igualmente só uma direção. (…) (Idem, pág. 14) Assim, a mente se torna incapaz de ver o todo e a imensidade da totalidade, se houver um movimento numa particular direção. Portanto, pode a mente não ter direção alguma? Esta é uma pergunta difícil - escutem-na. Evidentemente, a mente tem de ter direção quando vou daqui para casa, (…) tenho de dirigir um carro, (…) de exercer uma função técnica - tudo isso são direções. (Idem, pág. 14) Mas estou falando de uma mente que entende a natureza da direção e assim é capaz de ver globalmente. Quando ela vê o todo, pode então operar numa direção. Compreenderam? Se tenho todo o quadro da mente, posso tê-lo nos


detalhes; mas, se minha mente apenas funciona nos detalhes, então não posso dimensioná-la no todo. Se estou envolvido em minhas opiniões, (…) ansiedades, no que desejo fazer, (…) no que devo fazer, não posso ver o todo, obviamente. (Idem, pág. 14-15) Se venho da Índia com meus preconceitos, superstições e tradições, não posso ver totalmente. Dessa forma, minha pergunta é: Pode a mente estar livre de direção ? - o que não significa que esteja sem direção. Quando ela opera totalmente, a direção se torna clara, muito forte e efetiva. Mas quando a mente só opera num sentido, de acordo com um padrão por ela estabelecido, então não pode ver o todo. (Talks in Saanen, 1974-1975, pág. 15) Há o conteúdo de minha consciência - o conteúdo constitui minha consciência. Ora, posso olhá-la como um todo ? - sem nenhuma direção (…) julgamento (…) escolha, apenas olhá-la, o que implica em nenhum observador, pois esse observador é o passado - pode ele olhar com aquela inteligência que não é formada pelo pensamento, já que o pensamento é passado? Faça-o! Isso requer tremenda disciplina, não a disciplina de supressão, controle, imitação ou conformidade, mas uma disciplina que é um ato no qual a verdade é vista. A operação da verdade cria sua própria ação, que é disciplina. (Idem, pág. 15) Pode sua mente olhar seu conteúdo quando você fala com alguém através dos seus gestos, da maneira como anda (…) senta e come, de seu comportamento? O comportamento indica o conteúdo de sua consciência - se você está indo de acordo com o prazer, com a recompensa ou a dor, que são partes de sua consciência. (…) (Talks in Saanen, 1974-1975, pág. 15) O comportamento expõe o conteúdo de sua consciência. Você pode esconderse atrás de um comportamento polido, cuidadosamente mantido, mas esse comportamento é simplesmente mecânico. Daí surge outra pergunta: é a mente inteiramente mecânica - ou há uma parte de cérebro que não é de forma alguma mecânica? (Idem, pág. 15) Continuemos (…) considerando a natureza e estrutura da consciência. (…) Se não compreendermos o conteúdo da consciência (e a possibilidade de o ultrapassarmos), toda ação(…) produzirá necessariamente confusão. Releva, pois, compreender bem claramente a natureza fragmentária de nossa consciência - o dar-se demasiada atenção a um fragmento, como o intelecto, uma crença, o corpo, etc. (…) (A Questão do Impossível, pág. 164-165) Esses fragmentos que compõem a nossa consciência - de onde emana toda ação - produzirão inevitavelmente contradição e aflição. (…) Não tem sentido dizermos para nós mesmos que todos esses fragmentos devem ser reunidos ou “integrados”, porque então aparece o problema relativo a quem tem a


possibilidade de integrá-los (…) Assim, deve haver uma maneira de olhar todo esse conjunto de fragmentos com uma mente não fragmentária. (A Questão do Impossível, pág. 165) Percebo que minha mente - que também compreende o cérebro e todas as reações nervosas e psicológicas - percebo que a totalidade dessa consciência está fragmentada, fracionada, pela cultura em que vivemos, (…) criada pelas gerações passadas e continuada pela atual. E toda ação, ou o predomínio de um fragmento sobre os outros, levará inevitavelmente a uma enorme confusão. (Idem, pág. 165) Assim, pergunta-se: “Há uma ação que não seja fragmentária e não possa contradizer outra ação que irá verificar-se daqui a um minuto?”. Vemos que o pensamento desempenha um papel muito importante nessa consciência. O pensamento não só é a reação do passado, mas também a reação de todo o nosso sentir. Todas as nossas reações nervosas, esperanças, temores, prazeres, sofrimentos, estão nele contidos. (…) (A Questão do Impossível, pág. 165) Esta é uma questão muito séria (…) Temos de devotar nossa energia e paixão, e nossa vida, a compreendê-la (…) Quando se vê a vida como um todo, não há mais problema algum. Só a mente e o coração que se acham fragmentados criam problemas. O centro do fragmento é o “eu”. O “eu” é criado pelo pensamento (…) O “eu” - “minha” casa, “minha” desilusão, “meu” desejo de tornar-se importante - esse “eu” é produto do pensamento, que divide. (…) (A Questão do Impossível, pág. 44) Assim, pergunta-se: Pode a mente, o cérebro, o coração, o ser inteiro, observar sem o “eu”? O “eu” vem do passado; não existe “eu” do presente. O presente não pertence ao tempo. Pode a mente libertar-se do “eu”, para olhar toda a vastidão da vida? Pode, sim, e de maneira completa, total, quando se compreendeu fundamentalmente, com todo o ser, a natureza do pensar. (…) Se não fordes capaz de observar sem o “eu”, os problemas continuarão existentes - cada problema em oposição a outro. (Idem, pág. 44) (…) Não se trata de que os múltiplos fragmentos cheguem a integrar-se em nossa consciência humana (…) Porém, é possível olhar a vida como uma totalidade? Olhar o sofrimento, o prazer, a dor, a ansiedade, a solidão, o ir ao escritório, o ter uma casa, o sexo, o ter filhos - olhar tudo, não como se fossem atividades separadas, senão como um movimento holístico, como uma ação unitária? (La Llama de la Atención, pág. 69) É isso possível (…)? Ou estamos obrigados a viver eternamente na fragmentação (…) no conflito? É possível observar a fragmentação e a


identificação com esses fragmentos? Observar, não corrigir, não transcender, não escapar disso nem reprimi-lo, senão observar. Não é um problema (…), porque se vocês tentam fazer algo a respeito, então atuam a partir de um fragmento, estão cultivando mais fragmentos e divisões. (…) (Idem, pág. 69) (…) Ao passo que se pode observar holisticamente, observar todo o movimento da vida como um movimento único, então não só chega ao fim o conflito, com sua energia destrutiva, senão que dessa observação surge uma maneira totalmente nova de encarar a vida. (…) E, dando-se conta, pergunta-se então como se há de reunir tudo isto para formar uma totalidade? E quem é a entidade, o “eu” que há de reunir todas essas diversas partes e integrá-las? Essa entidade não é por acaso também um fragmento? (…) (La Llama de la Atención, pág. 70) (…) O que estamos procurando fazer é juntar esses fragmentos de contradição, para com eles constituir uma totalidade, algo de inteiriço. Compreendeis? Vemos que nossa vida está dividida em fragmentos e, portanto, tratamos de integrar esses fragmentos, de juntá-los num todo! Ora, isso é impossível. Porque um fragmento será sempre um fragmento, ainda que lhe sejam acrescentados outros fragmentos. O estado de não contradição só é possível quando a mente funciona como um todo. (A Suprema Realização, pág. 201) (…) Se examinardes essa palavra (integração) e descobrirdes todo o seu conteúdo, sereis forçados a perguntar a vós mesmos quem é a entidade capaz de realizar a integração. Por certo, a própria entidade que irá integrar os múltiplos fragmentos faz parte deles e, portanto, não poderá efetuar sua integração. Vendo-se isso claramente, ou seja, as parcelas de desejo, nesta nossa vida tão dividida e fragmentada, jamais poderão ser unidas, integradas, porque a própria entidade, o (…) observador que está tentando ajuntá-las, faz parte da fragmentação - (…) torna-se óbvio que deve haver um diverso modo de proceder, e ele consiste em ver a contradição, os fragmentos, as exigências e desejos contrários, observá-los, para ver se há possibilidade de ultrapassá-los, de transcendê-los. É esse transcender que constitui a revolução radical. (Palestras com os Estudantes Americanos, pág. 77) Assim, já que estamos fragmentados, divididos, em contradição, existe um conflito entre os numerosos fragmentos. Como pode essa fragmentação tornarse um todo? Sabemos que, para vivermos uma vida harmoniosa, ordeira, sã, essa fragmentação, essa separação entre “vós” e “mim” deve acabar. (Fora da Violência, pág. 93-94)


Muito facilmente somos persuadidos a fugir, porque não sabemos como essa fragmentação pode tornar-se um todo. Não dizemos integrar-se, porque integração supõe “alguém” que faz a integração: um fragmento que junta todos os outros fragmentos! (Fora da Violência, pág. 94) Tentamos muitos meios e modos, no desejo de acabarmos com a fragmentação. Uma das maneiras mais em voga é encarregarmos um analista de fazer esse trabalho para nós; ou, também, analisarmos a nós mesmos. (…) Nunca indagamos quem é o analista. Obviamente, ele é um daqueles numerosos fragmentos, e quer analisar sua própria estrutura integral. Mas o próprio analista, sendo um fragmento, está condicionado. (…) (Idem, pág. 94) Um dos nossos condicionamentos é essa idéia de que devemos analisar-nos, olhar-nos introspectivamente. Nessa análise, há sempre o “censor”, a entidade que controla, guia, molda; há sempre conflito entre o analista e a coisa analisada. (…) Se vos servis do conhecimento, da associação e acumulação, da análise, como meio de vos compreenderdes, cessastes de aprender sobre vós. O aprender requer liberdade para podermos observar “sem o censor” (Fora da Violência, pág. 94-95) Vede, (…) havendo análise, há o analista e a coisa analisada - um fragmento assume a autoridade e analisa a outra parte. E, nessa divisão, surgem o consciente e o inconsciente. É então que perguntamos: Pode a mente consciente examinar o inconsciente? - e isso implica que a mente consciente se separa do resto (…) Partimos portanto, da falsa suposição de que a mente superficial é separada da “outra”. (…) (A Questão do Impossível, pág. 153) Enfrentar a vida é enfrentá-la como um todo, e não fragmentariamente; e isso só podeis fazer quando conheceis a vós mesmo. É porque não conheceis o inteiro processo de vós mesmo que dividis a vida em fragmentos e, dessa maneira, perpetuais o conflito e o sofrimento. Não se pode construir um todo harmonioso juntando fragmentos, mas com o autoconhecimento alcança-se uma plenitude, um senso da totalidade. (O Homem e seus Desejos em Conflito, 1ª ed., pág. 165) A questão não é como integrar os diversos fragmentos, senão como é possível viver sem fragmentação. (Tradición y Revolución, pág. 116) Que relação tem tudo isso com o amor? Qual é a relação que há entre mim, você e o artista? Penso que o amor é o núcleo essencial da relação. O amor tem sido rebaixado ao sexo e toda a moralidade que o rodeia. Se não houver amor, a fragmentação haverá de continuar. (Idem, pág. 123)



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