6 minute read

Novidades Nacionais

...E a Caravana de Chico passa

por_ Bruno Albertim ■ do_ Recife

Advertisement

O barulho veio antes da audição. Depois que “por você, largo mulher e filhos”, versos do single “Tua Cantiga”, vazaram e fizeram estalar uma polêmica sobre machismo na música, seu autor, Francisco Buarque de Hollanda, se defendeu com humor: “Machismo seria manter a mulher e a amante.” Chico continua afiadíssimo. E as letras, melodias e arranjos de “Caravanas” dão fé disso.

Aos 74 anos, exigente consigo como ninguém mais, reaparece com as mais explícitas referências políticas em anos, sinal de luz em tempos obscuros. Primeiro álbum de inéditas desde 2011, “Caravanas” é Chico Buarque mais lapidado pelo tempo. E bem editado. São apenas nove, em vez das usuais doze canções que costuma lançar por disco.

Parceria com o baixista Jorge Helder, “Casualmente” é uma declaração de amor a Cuba em forma de bolero, cantada metade em português, metade em espanhol. Um sutil e dúbio recado aos odiadores das redes sociais, “Desaforo” é um samba sobre alguém com o hábito inadiável de falar da vida alheia. “Massarandupió”, marcada por guitarras, é uma parceria com o neto Chico Brown: o título faz referência a uma praia baiana de naturismo. De um humor luminoso, “Blues para Bia”, com seu violão e seus metais, é a declaração de amor de um eu-lírico masculino a uma garota gay.

Em formato de samba com várias subversões harmônicas, “Jogo de Bola” é também declaração, mas a outro amor antigo de Chico: o futebol. Outra neta, Clara Buarque, participa da regravação de “Dueto”, dobradinha do avô de 1979 com Nara Leão. Chico reedita ainda outra antiga, “A Moça do Sonho”, do musical “Cambaio” (2001), de João Falcão e Adriana Falcão.

No ápice do novo trabalho, ele tensiona as questões contemporâneas de imigração, preconceito social e clandestinidade em “As Caravanas”: a canção que dá nome ao disco fala que “não há barreira que retenha esses estranhos/ suburbanos tipo muçulmanos do Jacarezinho a caminho do Jardim de Alah”. Já “Tua Cantiga” é uma arrojada balada buarqueana sobre o amor suspendendo a ordem natural dos afetos. Lirismo magnético.

VEJA MAIS!

O vídeo oficial de “As Caravanas”: ubc.vc/AsCaravanas

O canto de Lucina

Nitidamente mais interessadaem construir uma obra do que rir de acordo com os humores do mercado, Lucina, a cantora mato-grossense radicada no Rio, acaba de lançar seu mais novo álbum, oito anos depois do elogiado “+ Do Que Parece”. “Canto de Árvore” reafirma o calibre refinado que marca a trajetória da artista desde seu aparecimento, com a dupla Luhli e Lucina (1972-1998). Na faixa-título, parceria com o poeta arrudA, o arranjo singelo do violão de Lucina cede o protagonismo a uma letra belíssima. Em outras das onze canções inéditas, sendo dez dela própria, Marcelo Dworecki (baixo, cavaquinho e violão), Peri Panne (violoncelo e vocal), Otávio Ortega (acordeão e teclado) e Décio Gioielli (percussão e tambores metálicos) fazem a base sonora. “Foi autoprodução, feito em janeiro deste ano no estúdio Cajueiro. Ney Marques teve participação especial, e a Calavera patrocinou o estúdio”, enumera Lucina. O resultado alcança uma sonoridade difícil de ser engavetada em conceitos pré-formatados, moldura musical para uma poética aguçada.

Mariana Volker e Liminha: vem mais coisa boa aí

Além de cobrir os bastidores deste último Rock in Rio numa “invasão” ao Instagram da UBC, a cantora carioca Mariana Volker aproveitou também para soltar a voz. Foi no show de covers da banda capitaneada por Liminha em homenagem a grandes clássicos do rock, quando Mariana entoou nada menos que “Rock ‘n’ Roll”, classicaço do Led Zepellin. A parceria entre Mariana e Liminha é antiga. Em 2014, ela gravou com ele o elogiado EP “Palafita”, uma vigorosa aquarela sonora de um pop solar, levemente psicodélico, com bons aportes de blues, reggae e rock. Sem conceito ou prazos amarrados, Mariana já está, de novo, pensando em entrar em estúdio. Quer reunir coisas que anda gravando para começar a pensar num próximo disco. De novo, sob a batuta do tarimbado parceiro.

Pedro Salomão: o poema é a solução

Pedro Salomão é o que se pode chamar de influenciador digital no meio musical. Juntas, suas redes sociais contam com meio milhão de seguidores. Não à toa, ainda que não exatamente frequente nos meios tradicionais, virou bombação nas plataformas de streaming. Lançado no primeiro semestre de 2017, seu primeiro EP já rodou mais de um milhão de vezes. Na rede, ele vai aumentando o alcance de sua poética em canções como “Leoa”, “Cafuné”, “Só Você é Você” e “Olhar de Aquarela”. O título do EP chama atenção também pelo trocadilho bem-humorado e sincero: “Cada Um Com Seus Poemas”.

VEJA MAIS!

Entrevista em vídeo para a UBC em nosso canal no YouTube: www.youtube.com/user/UBCMusica

Rei Arthur

A capa, assinada pela artista plástica paraense Elisa Arruda, traz o artista no centro: a cabeça de Arthur Nogueira suspensa numa via-láctea emoldurada por duas meias-luas. É arte, é mensagem e, não à toa, “Rei Ninguém” foi lançado durante a última São Paulo Fashion Week, em agosto. O trabalho, empacotado pelo selo Joia Moderna, traz participação de luxo de Fafá de Belém, conterrânea de Arthur, na faixa “Consegui”, parceria dele com Antonio Cicero (tema de reportagem nesta edição da Revista, lá na página 16). Antes, Arthur Nogueira já havia dedicado ao poeta, com releituras, “Presente”, seu álbum anterior. “Só faço música para os poetas, estou sempre em busca deles”, resume um dos artistas com maior estofo na nova MPB.

VEJA MAIS!

Arthur Nogueira fala sobre as ideias e inquietudes que moldaram o projeto “Rei Ninguém”: ubc.vc/ArthurN

Carlos Dafé, os 70 anos do Príncipe do Soul

Nos anos 1970, ele comandava uma espécie de república artísticano bairro carioca de Vigário Geral. Em sua casa no topo dacomunidade, nomes como Tim Maia, Oberdan Magalhães (Banda Black Rio) e João Nogueira se revezavam nos banquinhos, instrumentos e vocais. Dali para as boates e clubes do resto do Rio foi um pulo. Dafé tinha mesmo o que mostrar. “Pra Que Vou Recordar o Que Chorei”, um samba-soul que lhe rendeu a alcunha de Marvin Gaye Brasileiro, foi só um de seus inúmeros sucessos, com cem regravações em português, espanhol, inglês e até russo. Neste dia 25 de outubro, o grande Dafé completa 70 anos. E, apesar da agenda de shows imensamente menor, mantém um título: segundo o batismo do crítico Nelson Motta ainda nos anos 1970, a voz cortante, aguda, de Dafé, diferente do padrão grave do gênero, o colocaria no lugar de Príncipe do Soul. Bem ao lado do Rei, e seu amigo, Tim.

Domenico, ainda mais experimental

Já lançado no Japão, está disponível no Brasil o segundo álbum solo de Domenico Lancellotti — ou o terceiro, se levado em consideração “Sincerely Hot”, disco em que assumiu, conforme o acordo de revezamento entre os parceiros, o comando frontal do projeto +2, formado com Alexandre Kassin e Moreno Veloso. Lançado pelo selo indie carioca Lab 344, “Serra dos Órgãos” chega seis anos depois de “Cine Privê” e tem arranjos de metais de Marlon Sette, além de uma miríade de participações de expoentes da cena contemporânea carioca, Bruno Di Lullo e Stéphane San Juan entre eles. Só de músicas inéditas, traz momentos como “Voltar-se”, marcada pela batida de violão de Bem Gil, e “The Good is a Big God”, num belo arranjo de cordas e sem letra, mas com as vocalizes de Nina Miranda. Na canção “Projeção”, o próprio Domenico investe num falsete sob a moldura de cordas. O resultado é seu projeto mais experimental.

O outro mundo de Chris Fuscaldo

Chris Fuscaldo sempre escreveu sobre música. Jornalista com passagens por jornais e revistas, começou a escrever música em 2013, enquanto, em “desaceleração” da rotina da imprensa, se dedicava a um livro e a um mestrado na Argentina. De volta ao país, conheceu o produtor argentino radicado no Rio Juan Cardoni, que a convenceu a voltar aos palcos, algo que já havia feito antes. Surgia o embrião de “Mundo Ficção”, seu álbum de estreia. “É a mistura das minhas referências com as do Juan: o pop e o rock vieram dos dois; a MPB partiu de mim; o tango, dele”, conta a cantora, que chamou o resultado final de TPB, ou tango popular brasileiro. Chris não descansa. Enquanto vai mostrando o disco novo, finaliza a biografia de Zé Ramalho. Tudo devidamente registrado em seu blog Garota FM, agora convertido no site oficial chrisfuscaldo.com.br.

This article is from: