Sistema Nacional de Integridade Portugal

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completamente ineficaz a este nível, ao contrário de outros países que encontram neste tipo de instrumentos um eficaz aliado na deteção e prevenção de crimes, mas que são por vezes acusados de abusar dos direitos dos cidadãos. Investigação A investigação criminal é um dos setores do combate à corrupção onde a falta de meios apropriados mais se faz sentir. Sublinha-se a questão da adequação e apropriação dos meios, mais do que a sua quantidade. De facto, apesar de existirem constantes queixas quanto aos recursos humanos do Ministério Público e da Polícia Judiciária, foi considerado por vários dos entrevistados que a ineficácia destes organismos não resulta do número de pessoas, mas sim da produção individual de cada agente. Os meios ao dispor dos magistrados e dos inspetores e a sua formação e especialização neste tipo de criminalidade são duas das maiores falhas. Por exemplo, a inexistência de sistemas informáticos unificados, ou que permitam o acesso imediato e em simultâneo às várias bases de dados da Administração Pública é razão para demoras constantes nos inquéritos-crime. Sem este tipo de meios, os magistrados veem-se obrigados a requisitar informações a várias entidades da Administração Pública, por vezes de forma sequencial., demorando meses, senão anos, a concretizar algo tão simples como a verificação do património do suspeito/arguido. A falta de formação e especialização neste tipo de criminalidade também vai no mesmo sentido: provoca o atraso constante dos processos por ser necessário um estudo mais cuidado das características destes crimes, ou um mau sentido de orientação na investigação por falta de prática ou de conhecimentos específicos apenas adquiríveis por via de peritos externos. Não está aqui em causa a quantidade de investigações ou inquéritos, pois estes apresentam-se até em grandes números (1234 arguidos constituídos por crimes económicos e 46 milhões EUR congelados em seis meses), dada a população portuguesa. A questão está na qualidade do trabalho de investigação que resulta, por sua vez, de uma outra ordem de dados que apresenta números bem mais reduzidos: quantas investigações criminais de corrupção resultam em acusações; e quantas acusações resultam em condenações efetivas (seja em primeira instância ou num tribunal superior). Sabendo que a corrupção é atualmente um fenómeno que abrange mais do que uma simples relação entre duas partes, podendo igualmente ter um caráter internacional, transnacional, transregional ou transdistrital, envolvendo um maior número de participantes e auxiliando-se de tecnologias e meios cada vez mais avançados, o papel das unidades com SISTEMA NACIONAL DE INTEGRIDADE

competências específicas torna-se ainda mais importante. Neste sentido, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal carrega a maior responsabilidade, com competências de coordenação, recolha de informação e investigação de crimes de maior complexidade. Trata-se de um organismo cujo desempenho e proatividade poderia influenciar de forma determinante a prossecução criminal da corrupção em Portugal. No entanto, isso não acontece, já que existem graves obstáculos ao seu desempenho: O primeiro obstáculo é a falta de recursos, principalmente recursos de investigação especializados como as perícias: o DCIAP não costuma ter verbas suficientes para uma investigação constante e eficaz, dependendo muito dos próprios recursos (como o Núcleo de Assessoria Técnica – NAT) ou dos recursos dos OPC, nomeadamente da PJ. O facto de não existir qualquer retorno de verbas para o DCIAP quando uma investigação criminal tem sucesso ou resulta na recuperação de património pelo Estado (por vezes em largos milhões de euros), torna a atividade de investigação extremamente dependente de verbas orçamentais previamente fixadas, não contribuindo para uma evolução do ímpeto de investigação e, simultaneamente, sujeitando os organismos de investigação criminal (quer do MP quer da PJ) a uma asfixia facilmente manipulável pelas medidas orçamentais do Executivo. O segundo obstáculo é a inexistência de um gabinete de intelligence: o DCIAP, de acordo com as suas competências de organismo centralizador de informação, recolhe grandes quantidades de informações sobre todos os processos-crime relacionados com um elenco de crimes previamente fixados. No entanto, não existe qualquer tratamento dessa informação, seja a nível de prevenção criminal, averiguação de áreas de risco ou definição do perfil comum dos arguidos. Esta informação recolhida acaba por ficar estanque, não tendo uma utilidade correspondente ao seu potencial, de forma algo similar ao que acontece no CPC. Dada a crescente natureza da corrupção como um fenómeno internacional, inclusive a nível europeu, a inexistência de um tratamento de informação a este nível e a sua partilha com congéneres internacionais constitui também um obstáculo ao combate à corrupção ao nível da UE. Refira-se como último obstáculo a falta de uma coordenação eficaz: como anteriormente mencionado, o DCIAP é um organismo centralizador e de coordenação, cujas competências deveriam caracterizá-lo como um bloco central de uma extensa rede de informação, na qual participariam todos os DIAP, serviços e representações do MP, a PGR e os OPC. No entanto, tem sido apontado que esta função não é concretizada pelo DCIAP, existindo uma grande desorganização, principalmente a nível do MP quando se trata de partilha de informação e coordenação de investigações


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