O cuidado em cena

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complexas tais como as: hospitalares, jurídicas, familiares, locais, estatais, nacionais, internacionais e transnacionais. O lugar do humano, entenda-se primacialmente mulheres, dentro do cuidado, socialmente falando, é anunciado e circunscrito sem ser pensado como necessitado de dar e de receber cuidado e sem ser posto como basilar à circunscrição dos direitos de cidadania. As responsabilidades não são compartilhadas; e, do ponto de vista político, econômico e cultural, o cuidado tem pertencido ao campo das relações tensas que se dão entre a responsabilidade e as decisões sobre quem vai cuidar, quando existe a emergência da doença, a necessidade de alguém ser cuidado por sua incapacidade, as intempéries e as grandes ou pequenas catástrofes. Definese como uma forma de trabalho, de relação e de epistemologia que é circunscrita ao lugar dos que não têm direito; reproduz-se, portanto, uma não ética do próprio princípio do cuidar. Este processo não considera o modo como o humano se produz e se reproduz ou pode se desfazer, em sua própria produção normativa, considerando-se sua realidade empírica. Este é um campo de conhecimentos conectado a tensões com as relações de poder imbricadas nele e com suas prerrogativas da feminização, que desde longa data são apontadas por diferentes vozes e por múltiplas posições de sujeito, em particular pela episteme feminista, que sempre esteve preocupada em retirar o tema do cuidado e sua prática das grandes composições abstratas e o faz porque entende que com essas composições ele se mantém naturalizado e invisivilizado. Se estas atividades, concepções e práticas em políticas públicas, de mercado e de voluntariado, frente às necessidades e exigências do cuidado, se reduzirem ao objetivado pela necessidade, sem democratização e desigualmente postas, no que tange aos agentes que devem fazê-lo, nele são apagados os conteúdos subjetivos e de desigualdades, mantendo-se sua construção monolítica que se mostra como se fosse coerente e racional. Em sintonia com as perspectivas feminista e descolonial, o corpo, a cor, a geração, a etnia e os marcadores dos processos de feminização deste campo constituem território de combate. A atuação política exige atos criativos e vozes diversas; por isso, assim posicionada, parto do pressuposto de que, no cuidado, as normatividades não podem ser tomadas como restritivas, mas como bases a partir das quais se possa compor aspectos de validade para elocuções novas e para alcançar acordo a respeito do lugar 34


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