O cuidado em cena

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ainda ao atendimento das necessidades das gerações futuras que também têm direito a um planeta habitável”. (BOFF, 2012, p. 21). Ou seja, a sustentabilidade tem relação direta com as condutas da sociedade, requer ação consciente e inovadora da política e do Estado e se relaciona com a vida de cada pessoa. O cuidado, define o autor, “representa uma relação amorosa, respeitosa e não agressiva para com a realidade e por isso não destrutiva”. (BOFF, 2012, p. 127). Portanto, a sustentabilidade estaria atrelada a uma responsabilidade mais direta do Estado, na medida em que “representa o lado mais objetivo, ambiental, econômico e social da gestão dos bens naturais e de sua distribuição”. (BOFF, 2012, p. 21). Entendo que, com ações políticas neste sentido, estaríamos sendo educados e estimulados a uma cultura do cuidado, ao escolher “as atitudes, os valores éticos e espirituais que acompanham todo esse processo sem os quais a própria sustentabilidade não acontece ou não se garante a médio e longo prazo”. (BOFF, 2012, p. 227). Catadoras e catadores de materiais recicláveis têm sido vinculadas/os ao papel de “agentes ambientais”. Quais seriam os significados deste tipo de asserção? De maneira geral, nas andanças de minha pesquisa de campo, essa era uma expressão amplamente utilizada como estratégia para a valorização de sua profissão. As/os catadoras/es têm sido consideradas/os “agentes ambientais”, porquanto cumprem um relevante papel no reaproveitamento das matérias primas; contudo, em grande parte, realizam esta contribuição à sustentabilidade em uma situação de exploração, precarização e exclusão social. Isso contrasta radicalmente com os preceitos do cuidado, dos direitos humanos e da justiça social. É neste sentido que Alencar (2008, p. 3) argumenta “que não há possibilidade de sustentabilidade enquanto existir exclusão social” e, portanto, “a proposta de desenvolvimento sustentável não se integra ao paradigma de acumulação capitalista”. (ALENCAR, 2008, p. 6). Ou seja, neste cenário, sustentabilidade e cuidado encontram-se um tanto destorcidos e desarticulados. Aos meus olhos, o selo verbalizado por algumas pessoas, sobretudo enquanto representantes do Estado, de “agentes ambientais” parecia uma forma de engodo, já que, – apesar de estas/es trabalhadoras/es colaborarem para o meio ambiente, para o bem social de muitas pessoas, cuidando do meio ambiente, – no seu dia a dia laboral, a sustentabilidade e o cuidado não pareciam atuantes, gerando condições de trabalho precárias e, por vezes, insustentáveis. 255


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