Arquitetura isolamento

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e sanitários, comprometedores de seu projeto de modernidade, e que implantasse as mudanças sociais, políticas e econômicas necessárias para alcançar o progresso e o desenvolvimento. O trinômio estrutural deste processo era estado, lei e ordem. Uma legislação adequada possibilitaria a atuação do estado para a manutenção da ordem (TRINDADE, 1998, p. 119). Precedendo todas as ações estatais, portanto, foram elaboradas leis, ou, como quer Foucault, mecanismos, que, ao buscar o ordenamento social e urbano, definiam padrões aceitáveis e inaceitáveis, certos e errados. Foi assim com o Código Penal, de 1890. Com o objetivo de proteger o trabalhador e sua família, a legislação procurou ordenar a liberdade social a partir da criminalização de uma multiplicidade de comportamentos. O crime passou a ser encarado como desordem social e como desvio de comportamento. Segundo TRINDADE (ibid., 119), esse Código “instaurou dispositivos relacionados à demanda pela ordem e permitiu o controle social através de mecanismos legais”. Uma das instâncias desse controle social eram as instituições de regime fechado para abrigo de grupos sociais. Diferentemente do que ocorria anteriormente, essas instituições atuariam na educação e correção do indivíduo e não simplesmente na sua segregação. Por intermédio de uma disciplina rígida, uma nova vida era ali imposta, baseada na educação e no trabalho, fazendo com que os estabelecimentos se transformassem também em símbolos dos novos tempos. Penitenciárias, abrigos de menores, asilos para mendigos e velhos eram exemplos de espaços institucionalizados de isolamento que disseminaram-se no Brasil durante a Primeira República, sendo sempre aclamados como uma medida moderna, racional e humanitária. Na frente sanitária, a ação estatal voltou-se para a higienização da cidade e o controle das doenças infecto-contagiosas, ambas também precedidas por uma regulamentação que possibilitava a estruturação burocrática do aparelho estatal e a viabilidade jurídica dessas intervenções. A higienização da cidade ocorria através do urbanismo, que, simultaneamente, ordenava seu crescimento (definindo-se setores de expansão urbana), fazia o embelezamento de seu espaço e a erradicação das epidemias (SEGAWA, 1999, p. 18-21). Como característica constante, essa renovação urbana empurrou a pobreza para regiões mais afastadas. Já o controle das doenças transmissíveis apoiava-se em quatro pilares: notificação obrigatória dos casos existentes, isolamento compulsório dos portadores dessas moléstias, desinfecção de ambientes e de objetos e vigilância de casos suspeitos, previstos no Decreto Federal nº 5.156, de 8 de março de 1904 (SOUZA-ARAÚJO, 1956, p. 118). Esse Decreto dividiu o isolamento em “nosocomial” e “domiciliário”. Começou a configurar-se a necessidade de um espaço específico de segregação, o hospital de isolamento, definido cientificamente de acordo com características das doenças tidas como transmissíveis. A questão sanitária, portanto, requeria um espaço de isolamento. Assim como os loucos, os criminosos, os mendigos e as crianças abandonadas, os doentes comprometiam a ordem social. Sob o risco de prejudicar a saúde coletiva, passariam a ser objetos de um intenso controle social. 16


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