Continente #124

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1 PAViMento Os moradores jogam lixo no espaço acima do térreo e da sobreloja, projetado para funcionar como área de lazer

avacalhação. Aqui, muitos moradores não têm modos e jogam lixo pela janela, num verdadeiro desrespeito ao prédio”, reclama o aposentado Geraldo Oliveira, 68, enquanto um saco plástico é jogado de uma das unidades de cima do seu apartamento, como que para corroborar sua queixa. Residente desde 2000 no Pirapama, ele conta que adquiriu o seu imóvel por R$ 10 mil, sendo sua primeira moradia própria. “Foi uma luta de 40 anos de serviço para conseguir uma morada, que obtive graças a ex-clientes da época em que eu tinha uma barraca de coco na Avenida Dantas Barreto. Eles me indicaram o imóvel aqui no Pirapama. Todos os meus irmãos já tinham casa, menos

eu. Achei bom poder comprar. Porém, se fosse para entrar hoje no Pirapama, eu não viria mais. Aqui, é fácil de adquirir, mas difícil de vender. Meu sonho é sair daqui”, relata Geraldo, que mora sozinho no apartamento 709 do Bloco B, composto de quarto, sala e banheiro. Diferentemente de Geraldo, a consultora em tecnologia da informação Kalina de Moraes, 44, sonha em poder comprar uma unidade no edifício e permanecer. Ela tornou-se inquilina em 2000. “Foi um período difícil para mim. Saí de um casamento sem nada, por opção. Buscava uma mudança de vida. Quando entrei no apartamento, mesmo com vários problemas estruturais visíveis no imóvel, sabia que era a minha casa. Só ajeitei as janelas, que estavam ruins. Peguei um colchão emprestado. Comprei apenas o essencial, no início. Fui me acomodando aos poucos, com sofá, TV e outros móveis e utensílios”, recorda. Identificando-se com o espaço, Kaline diz gostar do clima decadente do centro e da proximidade com o seu trabalho. “Gosto muito da noite, de poder voltar para casa a pé do trabalho e ir ao Carnaval no Recife Antigo para encontrar os amigos. O cantinho da minha casa preferido é a área de serviço, onde gostava de me apoiar na janela para contemplar a Lua. Porém, não faço mais isso porque as pessoas jogam restos de comida que entram pelas janelas dos cômodos.” Como se não bastasse a limitação de ter que deixar as janelas do apartamento fechadas, a moradora conta que ele já foi arrombado duas vezes, entre 2005 e 2006. Casos como os de Kaline não são isolados. Outros moradores já tiveram seus apartamentos invadidos. Em grande parte, isso se dá pela falta de controle no acesso de pessoas através do térreo e das sobrelojas ao bloco privativo dos apartamentos. Uma das saídas encontradas pela administração foi colocar câmeras de segurança para monitorar as entradas e saídas, os elevadores e corredores. Apesar das melhorias, a portaria não conta com interfone para os funcionários poderem se comunicar com os moradores. “Até bem pouco tempo, o ambiente do Pirapama era barra-pesada. Agora, melhorou muito. Trabalho à noite e,

embora o fluxo de pessoas aqui diminua, é sempre mais arriscado pelo horário”, comenta o porteiro Jorge Barbosa, que também já morou no edifício.

LUtA PoR MeLHoRiAS

“O prédio é muito aberto, permitindo uma grande circulação de pessoas diariamente. Por isso resolvemos fechar a entrada da Rua do Hospício, para ter um maior controle dos que passam por aqui”, afirma Marluce Maciel, síndica do Pirapama. Responsável pela administração do prédio há 10 anos, ela tem uma relação bastante próxima com o edifício, onde passou a trabalhar em 1979, primeiro como secretária de João Cleophas e, depois, para o advogado José Urbano da Costa Carvalho. “Na época, dr. João Cleophas morava no Rio e vinha ao Recife de duas a três vezes por ano. Ele dizia que ficava muito triste com a decadência do prédio. Em parte, acredito que ele tenha se arrependido de fazer apartamentos pequenos. O prédio foi construído para a alta sociedade, mas, com o passar do tempo, devido às más administrações e à inadimplência dos moradores, foi se

o projeto de Delfim Amorim aliou a arquitetura do Brasil e a de Portugal, a partir do uso de azulejos, tijolos aparentes e cobogós deteriorando, a ponto de chegar a uma situação bastante crítica”, aponta. Ela se tornou síndica por sugestão do próprio José Urbano. Para se candidatar ao cargo, Marluce obteve uma carta dele relatando a história do prédio e recomendando o seu nome para a administração. “Quando assumi o condomínio, me deram um crédito de confiança. Fiquei com medo da responsabilidade por ser um edifício grande e pelos inúmeros problemas que havia. Com o passar do tempo, fui criando força para tomar conta daqui”, diz Marluce. Uma das primeiras ações empreendidas, com ajuda da polícia, foi a retirada das casas de massagens e dos pontos de venda de drogas que existiam dentro do prédio. “Várias vezes, homens batiam aqui na

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