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poder criativo. «A filosofia tem uma função que permanece perfeitamente actual, criar conceitos. Ninguém o pode fazer por ela (…) ela é criadora ou até revolucionária, por natureza, na medida em que não pára de criar novos conceitos. A única condição é que eles tenham uma necessidade, mas também uma estranheza, e têm-nas na medida em que respondam a verdadeiros problemas. O conceito é o que impede o pensamento de ser uma simples opinião, um parecer, uma discussão, uma tagarelice. Todo o conceito é um paradoxo, forçosamente»17. Justamente, o filósofo não tem opiniões, por isso também nada a discutir, nada a argumentar, é mesmo contra o anti-pensamento opinativo que ele maneja o poder do conceito. O conceito não é uma opinião, não é nem a opinião «verdadeira» dialecticamente formada nem a arqui-opinião de uma subjectividade universal constituinte: nem Doxa racional nem Ur-doxa transcendental. Antes é um operador muito preciso, muito específico, em si mesmo indiscutível, válido apenas pela fecundidade eventual dos seus efeitos paradoxais, ou seja, por aquilo que, em domínios heterogéneos, ele faz pensar, ver e até sentir e que sem ele continuaria impensado, invisível, insensível, precisamente porque o que ele revela, o que só ele pode revelar, é por natureza incaptável no horizonte real-vivido das opiniões. Pragmatismo intrínseco da noção filosófica, do conceito-paradoxo. O conceito intervém pois reagindo sobre as opiniões, sobre os fluxos ordinários de ideias, criando «pregnâncias» inéditas, novas singularidades ou um novo sistema de pontos singulares, propondo uma redistribuição inesperada dos dados, uma reclassificação insólita e todavia iluminadora das coisas e dos seres, aproximando coisas que se supunha afastadas, afastando outras que se supunha próximas. Só a filosofia detém esta capacidade, esta força selvagem do con17
P 186-187.
Lógica do Acontecimento
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