Entrevista Claude Troisgros - Monet

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[ CL AUDE TROISGROS ]

O chef conta o que faz – e o que cozinha – quando não está à frente das câmeras no programa Que Marravilha!, que neste mês ganha episódios especiais, com massas e sobremesas por Sarah Mund

E

LE É FRANCÊS, RENOMADO e faz parte de uma família famosa na alta gastronomia. Mas nem por isso Claude Troisgros faz questão de coisas requinta­das. E isso fica ainda mais claro pessoalmente. De forma descontraída, ele recebeu a reportagem da MONET em seu restaurante Olympe, no Rio de Janeiro – onde vive desde 1979 –, para contar o que está por vir nos cinco episódios de Que Marravilha! – Massas e Sobremesas e QUE quais suas preferências MARRAVILHA! I quando é o chef que A PARTIR DO DIA 2, senta à mesa. Entre QUINTAS, 21H30, boas risadas, Troisgros GNT, 41 E 541 (HD) revelou quais os conselhos de família que segue até hoje, deu dicas do que observar quando se vai a um restaurante e suas impressões sobre a culinária brasileira. O que você acha que há de melhor na culinária brasileira?

FOTO: JOHNNY MAZZILLI

ADORO JANTARES ESPECIAIS GASTRONÔMICOS. MAS UM BOLINHO DE FEIJOADA COM CAIPIRINHA ME FAZ MUITO FELIZ. COMER É SABER ESCOLHER O MOMENTO CERTO E COM A PESSOA CERTA”

Francês com tempero brasileiro

Ela é muito vasta, não só por ser um país grande, mas porque sofreu influências de culturas muito diferentes. Cada região do país tem a sua particularidade. Sem contar o tanto de especiarias que ainda desconhecemos, peixes, ervas, folhas. Por isso o Brasil está em boa forma na gastronomia. Os ingredientes evoluíram, os chefs evoluíram e até a TV evoluiu. Eu não gosto de falar em alta gastronomia, mas há uma influência em querer mostrar produtos brasileiros de uma maneira mais moderna. O olho do mundo está no Brasil com tanta

coisa acontecendo. São produtos surpreendentes e chefs competentes. Quais as diferenças e as similaridades que são encontradas entre a cozinha francesa e a brasileira?

A comida mineira se parece com a que se come no interior da França, comida caseira. Feijoada é como cassoulet com outro feijão e coq au vin e galinha ao molho pardo são parecidos. Quando se vai para a região do Mediterrâneo, aí não, até porque, apesar da costa enorme, no Brasil quase não se come peixe. É inacreditável. Na Amazônia, por exemplo, tem peixes incríveis e o principal prato é o pato. De onde tiram o pato até hoje eu não sei [risos].

Tem algum prato de que você gosta e que não é popular entre os brasileiros?

O brasileiro não tem a cultura de comer peixe. Você encontra churrascarias em todo lugar, mas não restaurantes de peixes. Eu estou doido para abrir um, só estou esperando o momento certo. Para isso preciso de um barco que vá pescar para mim, tem que ser em frente ao mar. O cliente tem que sentir o frescor, ver a água na frente. É uma pena, porque o Brasil tem bons peixes, uma costa imensa e peixes de rio incríveis. O paladar de uma cultura se forma pouco a pouco. Não é porque sou estrangeiro que sei mais, mas eu demorei a entender um pouco essas coisas. Acho que parte do sucesso dos meus restaurantes é que eu soube adaptar os pratos para os brasileiros. Alguns chefs não têm essa habilidade ou não querem mudar nada, o que é um erro. É preciso ter abertura de espírito.

E o contrário: temos algum prato popular do qual você não gosta?

Em qualquer lugar do mundo vai ter algo de que você não gosta. Sarapatel, por exemplo. Acho que não sou o único que não gosta, mas tenho certeza que é por uma coisa até psicológica, por saber que é feito com entranhas. Mas, de repente, alguém sabe fazer muito bem e eu ainda não provei. Acho que a gente não pode criticar nenhum estilo de comida, devemos respeitar o regionalismo. Se alguma coisa é popular, é porque é boa, se não gostamos é porque alguma coisa saiu errada no caminho, ou virou um prato turístico e não tem mais a ver com a receita original. Sua família está na gastronomia há várias gerações. Que ensinamentos você traz dos mais velhos e passa para os mais novos?

A família toda vivia em cima de um restaurante, então nossas vidas desde muito cedo estavam envolvidas com a cozinha. Aprendemos a lidar com clientes, fornecedores, produtores, administração, tudo. Então tivemos muitos ensinamentos sem nem perceber – saíram da rotina mesmo. Meu pai, que foi um dos criadores da Nouvelle Cuisine francesa, tinha uma linha de conduta sempre bem definida, que passou para a gente e eu passei para os meus filhos. Fora a técnica culinária e a qualidade do produto, em termos de prato finalizado, é preciso três coisas: acidez é fundamental – vinagre, limão, maracujá, laranja, tomate... essas coisas dão água na boca, ativam as glândulas salivares; a segunda é a crocância, fazer barulho na boca, o “crac” é uma massagem para o cérebro, dá vontade de comer mais; a terceira é o verde, porque tem um sinônimo de frescor, natureza, algo que acabou de ser colhido. Se você tivesse que escolher uma refeição, qual seria?

Difícil... Há tantas boas. Adoro jantares especiais gastronômicos. No dia a dia, fico satisfeito com uma salada verde e uma boa carne. Mas um bolinho de feijoada com caipirinha me faz muito feliz. Comer é saber escolher o momento certo e com a pessoa certa. O U T U B R O + M o­n e t + 5 9


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