A Misericórdia de Santa Comba Dão

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José Morais Branquinho

A MISERICÓRDIA DE SANTA COMBA DÃO SÉCULOS XVI A XIX

CÂMARA MUNICIPAL DE SANTA COMBA DÃO 2008



José Morais Branquinho

A MISERICÓRDIA DE SANTA COMBA DÃO SÉCULOS XVI A XIX


FICHA TÉCNICA: TÍTULO: A MISERICÓRDIA DE SANTA COMBA DÃO AUTOR: José Morais Branquinho EDIÇÃO: Câmara Municipal de Santa Comba Dão CAPA: Nossa Senhora da Misericórdia, em madeira policromada. Fotografia de Paulo Neves. Composição gráfica de Sandro Matos. TIRAGEM: DEPÓSITO LEGAL: GRÁFICA: MORGRÁFICA


Agradecimentos Agradeço ao Provedor Rui Santos e à Mesa da Santa Casa a autorização para consulta dos arquivos. À Directora do Arquivo Distrital de Viseu e a todas as funcionárias pelo apoio que deram a quinhentos quiló metros de distância! Ao Dr. Paulo Nogueira pela disponibilidade que teve para nos guiar na Igreja da Misericórdia. Ao Dr. Nuno Ferreira pelo excelente trabalho na organização dos arquivos e pela transcrição de alguns documentos. Ao Paulo Neves, da Fotoflash, pelas fotografias número 1, 3, 16, 19 e a Senhora da Misericórdia. Ao Sandro Matos pelo tratamento informático de todas as imagens. À Drª Rita Amaral Rêgo pela ajuda na revisão do texto. Ao Dr. António Nunes da Costa Neves pelo incentivo e apoio. Ao Sr. Presidente da Câmara Municipal, Engenheiro João Lourenço, pelo apoio, sensibilidade e interesse demonstrados.


Ao Provedor, Sr. Amadeu Prata Aos Irmãos Júlio de Lemos e Gil Ramos



ÍNDICE GERAL

1. Introdução …..……………………………………………………………………

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2. Santa Comba Dão no século XVI. De Condado a Município …..……………….

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3. A Fundação da Misericórdia …….………………………………………………. 10 4. A Igreja Velha …….……………………………………………………………... 12 5. A Capela de Santo António ……………………………………………………...

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6. O Compromisso ………………………………………………………………….

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7. A Igreja Nova da Misericórdia …………………………………………………..

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8. O Hospital ………………………………………………………………………..

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9. Acerca dos rendimentos …………………………………………………………. 36 10. Os Provedores da Santa Casa …………………………………………………... 38 11. Apêndice I – Livro da Capela de António Varela Rangel de Macedo ……….

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12. Apêndice II – Treslado do Testamento´de Isabel Gomes de Almeida e de Manuel dos Santos Pedrosa. ……………………………………………………

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13. Apêndice III – Escritura da farmácia. ………………………………………….. 75 14. Bibliografia ………………………………………………………………..……

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1. INTRODUÇÃO Recordo-me, ainda menino, quando frequentava a catequese na Sala de Sessões da Igreja da Misericórdia, de ver uns livros muito antigos, que serviam para escrever e para brincar, quando a catequista se distraía. Mais tarde, fui despertando para o estudo da História, e apercebi-me do valor que aquelas antiguidades poderiam ter. Hoje, sei que o Arquivo da Misericórdia de Santa Comba Dão tem existido ao longo dos anos, sem que verdadeiramente alguém dê valor à sua importância histórica. Na década de oitenta do século XX, a Mesa da Santa Casa da Misericórdia decidiu proceder a obras na cobertura do corpo principal, porque chovia dentro da Igreja, tendo sido feita uma nova abóbada em madeira pelo carpinteiro Gabriel Ramos. Nessa mesma altura, foi retirada a balaustrada, que dividia o corpo principal do altarmor. Foi feito o restauro dos altares, por técnicos de competência duvidosa, que alteraram completamente o cromatismo antigo dos dourados e a imitação do lápis-lazúli. Felizmente, não tocaram nos anjos dos altares colaterais, que ainda nos transmitem um pouco da beleza primitiva do conjunto. Em 1995, porque a minha vida profissional me permitiu, dirigi-me ao então Provedor, Sr. Amadeu Prata, ora já falecido, e pedi para consultar os arquivos mais antigos. Dessa consulta resultou um relatório que lhe enviei posteriormente, contendo os livros que estavam num armário na Sala de Sessões. Esse documento, achou por bem o Sr. Provedor tornar público no Jornal Defesa da Beira, de 9 de Fevereiro de 1996, e nele constavam indicações sobre o mau estado dos arquivos e a necessidade de serem organizados para tornar mais fácil a sua consulta. O arranjo que foi feito na Sala de Sessões, na década de oitenta levou a uma tentativa de juntar num armário os livros antigos que aparentavam bom estado, alguns desses, encapados com pergaminhos que teriam sido parte integrante de um missal mais antigo. Aqueles que apresentavam mau estado, rasgados ou parcialmente queimados, estavam dentro de algumas caixas de papelão na divisória da Sala de Sessões que dá acesso à Sacristia. Foi assim que os encontrei. Os livros e os documentos das caixas, coloquei-os no armário por ser um local menos húmido. A publicação do relatório provocou o que se desejava: a divulgação dos arquivos e da sua riqueza documental.


No final da década de noventa, tive a imensa gratidão de conhecer um jovem estudante universitário, Nuno Ferreira, natural do concelho de Santa Comba Dão, entretanto já falecido. Nessa época, no âmbito dos estudos universitários que então prosseguia, empenhou-se em inventariar e organizar os arquivos. O seu trabalho foi reconhecido pela Mesa da Santa Casa da Misericórdia, embora se mantenha o acesso restrito, tanto ao Inventário, como ao Arquivo. Tudo fiz para que neste ano de 2008, ano da comemoração dos 440 anos de existência da Misericódia de Santa Comba Dão, levar ao conhecimento dos Santacombadenses aquilo que aprendi nos arquivos da Santa Casa. As consultas foram iniciadas com autorização da Mesa, então presidida pelo Sr. Provedor Amadeu Prata, sendo as mais recentes e a sessão fotográfica possíveis graças à actual Mesa, presidida pelo Sr. Provedor Rui Santos. Este trabalho não pretende ser exaustivo quanto ao conhecimento da Misericórdia nas épocas referidas, pois muitos documentos ficaram por investigar, nomeadamente no respeitante à área económica. Por outro lado, seria interessante e fica o desafio para continuar a escrever a História da Misericórdia do século XX. Assim, esperamos que este simples contributo seja um estímulo para outros.


2. Santa Comba Dão no século XVI. De Condado a Município. Como seria a vida numa pequena localidade do interior do país, cabeça de Condado, cuja principal actividade económica era a agricultura e que nos últimos séculos da Idade Medieval tinha como senhor, o todo poderoso Bispo de Coimbra? São parcos os estudos sobre a realidade social, política e económica do actual território de Santa Comba Dão, no século XVI. Sabe-se que, enquanto senhorio eclesiástico, afastava a instalação de mercadores dinâmicos ou nobres ambiciosos que pudessem desenvolver a localidade. Por outro lado, a terra era pobre e mais pobre se tornava com os impostos pagos ao Bispo. A Carta de Foral de D. Manuel, outorgada em 1514, poder-nos-á dar uma ideia relativa sobre alguns dos aspectos nela mencionados. Segundo este documento, se dará ao Bispo de Coimbra “seiscentos reais de dinheiro por ano”, mais a oitava parte das terras que se vendam, mais quarenta reais pela parada de cervo. Havia três cavalarias: o cavaleiro D’ Aires Gomez pagava dez Reais; Afonso Pires da Cavalaria de Maçoude pagava sete reais e o cavaleiro Pedro Anes pagava quatro reais. Quem tiver lagar de vinho paga um real por ano. Com algum pormenor se refere o foral aos assuntos relacionados com a produção de vinho, o que nos leva a deduzir que esse seria o principal produto da terra ou aquele que daria mais proveitos ou, se quisermos, impostos. São também referidos os cereais e a açougagem ou a venda de carne. A nada mais dá importância, remetendo os omissos para o foral de Arganil. O Cadastro Geral do Reino, ordenado por D. João III em 1527, refere que na “villa” de Santa Comba existiam 91 fogos, na Póvoa do Coval 9, na Póvoa das Fontaínhas 4 e no hospital da Ponte do Criz 1. Aplicando a regra de 4 habitantes por fogo, diríamos que Santa Comba teria, àquela data, entre 350 e 400 habitantes. Muito mais população, tinham, então, os vizinhos concelhos do Couto do Mosteiro com 192 fogos, Óvoa com 145 e S. João de Areias com 190. Este facto justifica-se porque, ao longo da Idade Média, nunca passou por Santa Comba Dão uma via verdadeiramente importante. A Estrada Real, ao atravessar o rio Criz, flectia na direcção da Portela da


Colmeosa, fazendo do Couto do Mosteiro local de passagem dos mo vimentos para Viseu oriundos de Coimbra. Óvoa localizava-se perto da passagem da Estrada do Sal, vinda da Foz do Dão na direcção da Guarda. S. João de Areias beneficiava da proximidade da Estrada do Sal sendo local de cruzamento com outra via que vinha da Estrada da Beira e, de Tábua, seguia para Viseu por Tondela ou por Carregal do Sal (Campos, 1984 e Branquinho, 1984).

3. A Fundação da Misericórdia As Misericórdias surgiram por acção da Rainha D. Leonor nos finais do século XV, sendo a primeira a Misericórdia de Lisboa que nasceu da Confraria de Nossa Senhora da Piedade em 15 de Agosto de 1498 (SERRÃO, 1998). Talvez esse facto explique que a Nossa Senhora da Piedade apareça representada no verso da Bandeira Real das Misericórdias.

Fig.1 Imagem de Nossa Senhora da Piedade que se encontra na Sacristia da Igreja da Misericórdia. Em pedra policromada, tem cerca de 30 cm de altura e deverá ser, possivelmente, do século XVII.


Fig.2. Imagem do final do século XIX onde se vê, entre as árvores, a varanda da antiga Misericórdia. (Colecção de Sandro Matos)

Desconhecemos a data exacta da instituição da Santa Casa da Misericórdia de Santa Comba Dão, devido à inexistência de documentação coeva, particularmente um alvará. Nas Informações Paroquiais de 1721, em Santa Comba “ (...) há a casa da mizericordia com seu hospital dotados porém de mui poucas rendas”, não consta quando esta fosse instituída, mas sabe-se que em 24 de Janeiro de 1569 fez a primeira doação de bens à confraria de “Mizericordia hum Álvaro Neves desta vistoria e nas suas cazas e em terras suas se fez a Igreja da Misericordia que hoje há (...) ”. Em 1758, o Pároco de Santa Comba, Inácio Gomes da Silva, nas respostas solicitadas pelo Marquês de Pombal informa “ (...) que tem caza de misericórdia a coal erigio Alvaro Neves Pachequo haverá duzentos annos, e António Varela Rangel de Macedo ascendentes da caza do capitão maior, parte do seu rendimento chegará a trezentos mil reis (...) ”1. Assim, poderemos concluir que, a Irmandade da Misericórdia foi instituída em meados do século XVI, havendo autores que a situam em 28 de Março de 1571. Estamos em crer que tal afirmação se deve ao facto de ser esta a data em que se disse a primeira missa na Misericórdia Velha, sendo de 1571 a data do manuscrito mais antigo que se

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A.N.T.T., Dicionário Geográfico Padre Luís Cardoso, Vol.1, microfilme 360, f. 2473, 1758. Ver igualmente artigo no Jornal Defesa da Beira, “Há 250 anos... Álvaro Neves de Pacheco” de José Morais Branquinho, p 10, de 26 de Setembro de 1997.


encontra nos Arquivos da Santa Casa, mais precisamente o Livro dos Irmãos. Segundo as Informações Paroquiais, a primeira doação feita à confraria da Misericórdia data de 1569, sendo óbvio, portanto, que a Misericórdia de Santa Comba foi fundada numa data próxima (Sá, 2001), sendo de considerar a data de 1568, apontada por Godolphim1.

3. A Igreja Velha Nos terrenos de Álvaro Neves é construído um edifício, do qual resta apenas a parte central do frontão, voltada para a Igreja Matriz, e onde prevalecem as características arquitectónicas do Renascimento. Encima a porta de entrada principal um balcão balaustrado, de época posterior, suportado por duas mísulas de pedra calcária. Numa inscrição também em calcário, pendendo de uma das paredes do compartimento de comunicação da actual Igreja com a sacristia, pode ler-se o seguinte: “A XXVIII de Março de MDLXXI se disse a primeira missa na Igreja da Real Casa da Mizericórdia Velha, erecta por Álvaro Neves, onde existem as casas da residência da Igreja desta vila (...) ”.

Figura 3. Imagem de S. Sebastião, da Capela de Álvaro Neves.

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Goodolphim, Costa, As Misericórdias, pág. 369.


Sabe-se que em 1609 o Provedor Calixto de S. Paio de Barros mandou reformar a cela de S. Sebastião, pertencente a Álvaro Neves, local onde este fo i sepultado, tendo a sua morte ocorrido em 28 de Dezembro de 1582, segundo atesta o assento de óbito1 . A Imagem de S. Sebast ião, em pedra policromada, é o que resta, encontrando-se na actual sacristia da Misericórdia. Certo é que, o edifício da antiga Misericórdia, construído nos inícios do século XVII, não deveria ser obra de grande qualidade, pois um século mais tarde, a 3 de Maio de 1722, em reunião da mesa presidida pelo provedor Pedro Ferreira Leitão, afirma-se que

“esta casa está ameaçando ruína e necessita de reparo”. O

dinheiro não deveria abundar, tendo em conta que mais à frente se indica que “as esmolas que se davam em Quinta-feira Santa se guardam para o reparo da Santa Casa”. No entanto, em 2 de Julho de 1730, o dinheiro existente deve meter-se a juros “por não se poder fazer a reforma do edifício por falta de pedreiros”. No mesmo edifício funcionava pela mesma altura o Tribunal de Justiça, servindo ainda de aposentadoria a Ministros da Justiça, Comissários de Bula e prisão. Contra este estado de coisas se pronuncia a Mesa em 21 de Agosto de 1730, defendendo que “a Casa da Hospedaria da Santa Casa sirva para os religiosos que pregam a quaresma e outros religiosos que forem de passagem”.

Figura 4. Primitiva Casa da Misericórdia.

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A. D. V. Registos Paroquiais de Santa Comba Dão, Óbitos, maço 4, livro1, folhas 217. No assento de óbito vem a indicação que deixou sua mulher por testamenteira.


5. A Capela de Santo António A Capela de Santo António foi instituída em 10 de Dezembro de 1603, por testamento de António Varela Rangel de Macedo1, Santacombadense que andou por partes da Índia, tendo acumulado aí alguma riqueza que deixou a dois herdeiros, seu irmão João Roiz, ou Rodrigues de Macedo2 e à Santa Casa da Misericórdia de Santa Comba Dão. Assim, a Misericórdia ficou herdeira de oitocentos e vinte e dois mil, trezentos e cinquenta reis, soma com alguma importância para a época. Esta quantia resultou da venda das fazendas e outros móveis, armazenados por António Macedo em Lisboa, deixando explicito no seu testamento que o resultado seria para instituir a sua Capela de Santo António na Igreja Velha da Misericórdia. Assim fez a Irmandade, construindo uma capela que não custou mais de cem mil reis e, com o restante dinheiro, adquiriu terras na região, cujo rendimento serviu para manter a sua capela ou seja, pagar ao capelão, a cera e todos os ornamentos necessários. O Bispo Conde concedeu a licença de bênção da Capela, a pedido da Irmandade, em 18 de Agosto de 1604 (Ferreira 2002). O Mestre Álvaro Nogueira3, natural de Penacova, ourou e pintou o retábulo da Capela de Santo António, nas casas da Misericórdia Velha, em 1606. Durante estes trabalhos não esteve presente o Provedor, porque se tinha deslocado à sua terra, Ranhados, e tinha ficado preso pela neve, que nesse ano de 1606 caiu abundantemente por toda a região norte da Diocese de Viseu. Outra das cláusulas do testamento obrigava a que a capela fosse construída caso a Igreja da Misericórdia mudasse de local, o que vem a acontecer mais tarde com a construção da Igreja Nova. António Varela Rangel de Macedo, natural de Santa Comba Dão, faleceu entre 10 e 13 de Dezembro de1603, ou seja, entre a data da aprovação de seu testamento e a data de abertura do mesmo documento. Pouco se conhece acerca desta personagem, no entanto sabemos que erigiu a Misericórdia de Santa Comba Dão juntamente com Álvaro 1

A.H.S.C.M.S.C.D., 1/D/010, livro 001, Tombo da Capela de António Varela Rangel de Macedo, pág.1 a 19, cx. 154, Transcrito e policopiado da autoria de Pilar Clode e José Morais Branquinho, Biblioteca Municipal Cónego Alves Mateus de Santa Comba Dão. Ver artigo no Jornal Defesa da Beira, “Século XVI, Um Santacombadense na Índia”, de José Morais Branquinho, página 12, de 12/4/1996 e “A Capela de Santo António”, artigo do mesmo autor no jornal Defesa da Beira, de 3/5/1996, pág. 9. Ver apêndice I. 2 Roiz ou Ruiz, o mesmo que Rodrigues, segundo o Dicionário Onomástico e Etimológico de Pedro Machado. 3 A.H.S.C.M.S.C.D., 1/D/010, livro 001, Tombo da Capela de António Varela Rangel de Macedo, na última página, inédito.


Neves, por volta de 1568. E, o Padre Inácio Mendes da Silva em 1758, diz-nos que ambos são ascendentes do Capitão-mor Sousa e Vasconcelos. A relação familiar entre os dois não é conhecida. Sabemos apenas que Álvaro Neves devia ser senhor de rendimentos, pois para além das terras e da capela de S. Sebastião, tinha pelo menos uma criada negra4, privilégio que não estava ao alcance de qualquer um. Quanto a António Varela Rangel de Macedo, não consta que tenha deixado descendência, mas seu irmão, João Rodrigues de Macedo, casou com Maria Soares e tiveram como descendente João de Macedo Varela que, por sua vez, desposou Filipa Pedrosa. Deste casamento nasce José de Macedo Varela, Capitão-Mor de Mortágua, que vem contrair matrimónio a Santa Comba com Maria de Figueiredo Rangel, em 24 de Setembro de 16725. A filha do Capitão-Mor de Mortágua, Joana Josefa de Macedo, casa em 24 de Fevereiro de 16996 com António de Sousa e Vasconcelos, filho de António de Sousa e Mariana Vasconcelos. Mariana é filha do 9º Senhor de Mossâmedes, Manuel Pereira de Almeida e Vasconcelos, natural de Braga, proprietário de vastas terras desde o Coval à Colmeosa e a quem se deve a construção da Casa dos Arcos. É este casamento que origina a junção entre as famílias Vasconcelos e Macedo. Sabe-se também que António Varela Rangel de Macedo deve ter partido para Lisboa e, daqui, buscou o Oriente, por certo no intuito de enriquecer à conta dos tecidos, porcelanas e outros bens que o seu cargo de escrivão da alfândega de Diu lhe permitia. No seu testamento revela que conhece a cidade de Goa, tal o pormenor das referências a elementos toponímicos, e que por lá terá sido feitor de Jorge Pinto de Lemos, falecido na viagem de regresso da Índia. A redacção deste testamento é considerada uma verdadeira prática de devoção, recomendada por todos os autores espirituais (ARIÉS & DUBY, 1989). Devido às considerações que tece acerca da boa morte, inscreve-o directamente numa perspectiva marcadamente cristã, na medida em que o objectivo do testador não é tanto resolver pelo melhor os seus negócios temporais, mas antes prever as condições da sua sepultura, remediar tanto quanto possível o mau uso que eventualmente tenha feito dos seus bens em vida e, sobretudo, perpetuar as orações dos vivos, através de legados apropriados e 4

A. D. V., Registos Paroquiais, Registo de Baptismo, Livro 1, f. 60. A 16 de Março de 1577 é baptizado o filho de uma negra, criada de Álvaro Neves. 5 A. D. V., Registo de Casamento, maço 4, livro 1, folha 208 v. 6 A. D. V., Registo de Casamento, maço 4, livro 1, folha 131 v.


da fundação de missas. Começando com a invocação da Santíssima Trindade, "Em nome da Santíssima Trindade padre, filho e Espírito Santo...", o testador pede que "na hora de minha morte me não desampare senão que com o anjo de minha guarda, e com S. Miguel, e S. Rafael e S. Gabriel e todos os mais anjos do céu e com os bem aventurados S. João Batista, S. Pedro e S. Paulo, S. António, S. Francisco, S. André, S. João Evangelista, S. Felipe. Santíssimo Sacramento, S. Jorge, S. Jerónimo, S. Domingos, S. Bernardo, S. Ana, S. Maria Madalena... e com todos os outros santos e santas da corte celestial..." . Em seguida o testador indica as condições em que quer ser enterrado, no claustro do Mosteiro da Santíssima Trindade em Lisboa ou, no caso de vir a morrer noutra parte, que fosse enterrado na Misericórdia de Santa Comba Dão. Vêm depois os legados pios, nomeadamente as fundações de missas, um frontal de damasco para o altar de Nossa Senhora de Santa Comba Dão, um vestido azul para a nossa Senhora da Piedade de Miranda do Corvo; quinze mil reis a sua irmã Filipa; quinze mil reis à irmã Francisca; vinte mil reis ao irmão Luis; vinte mil reis e toda a sua parte da herança paterna a seu irmão José Roiz; dez mil reis para a irmã Tomasia; quinze mil reis à prima Maria e ao primo Paulo dez mil reis. Refere, depois, uma série de mandados que terão de ser satisfeitos no Oriente, nas cidades de Goa, Diu e Ormuz, a saber: vinte patacas para Maria Botelha, em Goa; seis patacas para Francisca Soares, em Ormuz; seis patacas para Sebastião Dias, Distribuidor do Paço dos Tabeliães, em Goa caso tenha em sua casa a pequena Inês; mais trezentos serafins para a mesma rapariga, filha duma tal Ana; dois fardos de açúcar que faltarão na conta de Jorge Pinto de Lemos que faleceu na Nau que vinha da Índia e de quem Varela Rangel teria sido feitor. Deixa a seu irmão João Ruiz de Macedo a patente de escrivão da Alfândega de Diu. Ficamos a saber, através de um mandado, que Varela Rangel terá feito outro testamento sobre os bens que deixou na Índia. Prossegue com informações relativas a toda a sua fazenda e bens, nomeadamente escravos, sedas, peças ricas da China e outras mercadorias da Índia, todos em poder de seu irmão, João Ruiz de Macedo, das quais mais tarde farão um rol. Após a venda da fazenda "a mor valia que puder ser" o dinheiro daí resultante será entregue, em Santa Comba, "em mão de pessoa abonada" que o colocará num cofre com duas fechaduras, tendo cada um dos dois herdeiros a sua chave, não se podendo tirar "real nem ceitil" sem o consentimento de ambos. O dinheiro será utilizado na compra de bens de raiz, como foros e rendas, na vila de Santa Comba Dão e seu termo. Essas propriedades, segundo o testador, "fiquem unidas todas juntas sem nunca se


poderem vender nem escambar, nem alhear, em tempo algum" e seus rendimentos fiquem vinculados à capela que quer ordenar. Esses mesmos rendimentos seriam divididos pelos dois herdeiros, João Roiz de Macedo e a Santa Casa da Misericórdia de Santa Comba Dão. Manda, depois, que na Igreja da Misericórdia se faça uma capela a Santo António, gastando até cem mil reis na sua execução e apetrechamento. Ordena ainda ao testador que todas as escrituras de compra dos bens, assim como os rendimentos da venda da sua fazenda, sejam registados num livro, "muito bem encadernado", que se há-de comprar. Este testamento é uma fonte muito rica para o conhecimento da vida nos inícios do século XVII, tanto para as mentalidades e economia, como pelos novos termos linguísticos adoptados das civilizações orientais. Simão do Vale, o escrivão que pacientemente o urdiu, segue as regras da escrita da época, isto é, a ausência das mesmas. Em 30 de Julho de 1695, o administrador da Capela é José de Macedo Varela. A Casa da Misericórdia estava obrigada a fornecer cera, vinho e hóstias ao capelão. Decide então a mesa obrigar o fornecimento de hóstias e vinho e ainda cinco mil e quinhentos reis em cada ano7. Em 1705 a capela recebe mais bens de raíz por força do testamento de Valentim de Macedo Varela8 falecido em Penacova. Era cavaleiro professo da Ordem de Cristo e tinha como desejo ser sepultado na Igreja da vila de Penacova. “... tem no leal Mosteiro do Lorvão um conto de reis e mil cruzados que deixa às sobrinhas filhas de D. Joana de Macedo Varela e de seu Marido António de Souza e Vasconcelos Capitão Mayor da Vila de Santa Comba Dão”. Nomeia o seu herdeiro o seu sobrinho Feliciano de Macedo Varela, como administrador da Capela de evocação a Santo António, deixando-lhe o vínculo e morgadio da Capela, à qual junta bens de raiz. Redigiu-o o Licenciado Pedro de Miranda, em vila de Penacova, onde morava Valentim de Macedo Varela. Foram testemunhas o Prior António de Almeida Henriques, António Martins Raposo, padre Plácido Pimentel, Pedro de Miranda, Luís Pimentel de Melo e o boticário Manuel de Carvalho. O tabelião foi Manuel Raposo Correia. Em 31 de Março de 1739, aquando do início da construção da Igreja Nova, em Mesa presidida por Bento Fernandes e Seixas se decide que “...se fizesse a Capela de 7

A.H.S.C.M.S.C.D., 1/C/006//Lv003, 1737-1762, Despesa da Obra da Nova Igreja e Dependências, caixa 039, folha 48. 8 A.H.S.C.M.S.C.D., 1/D/010, livro 001,folhas 58 a 59.


Santo António no corpo da nova obra junto ao coro e que da mesma parte se pusesse a tribuna com dois arcos e seu pé direito no meio para por cima desta se por a cornija...”. O seu retábulo foi feito por José Esteves da Fonseca, mestre entalhador, em 1756, pelo qual recebeu 4800 reis9. Num documento posterior, de 14 de Abril de 1757, o provedor toma conhecimento que o novo retábulo da Capela terá orçado em 54200 reis (Ferreira, 2002). A 24 de Fevereiro de 1798, a Capela de Santo António é novamente contemplada noutro testamento. Dona Joana Teresa Rangel10, natural da vila de Santa Comba Dão quer ser sepultada na Igreja Matriz. Nomeia e institui seu herdeiro António de Sousa Almeida Macedo e Vasconcelos, capitão-mor. É sua vontade que os seus (…bens de raiz no distrito e lugar de S. Payo de Farinha Podre fiquem perpetuamente vinculados ou unidos aos vínculos e morgados que instituíram os meus parentes…) António Varela Rangel, Valentim de Macedo e José Macedo Varela. Deixa ainda a seu irmão, João de São Payo Rangel, irmão da Companhia de Jesus, secularizado pelo papa, a quantia de cem mil reis por ano. Foi escrivão Caetano dos Santos Brandão.

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A.H.S.C.M.S.C.D., 1/C/006//Lv003, 1737-1762, Despesa da Obra da Nova Igreja e Dependências, caixa 039, pág. 1. Ver artigo, A Igreja da Misericórdia, de José Morais Branquinho, Jornal Defesa da Beira, página 10, de 27 de Setembro de 1996. 10 A.H.S.C.M.S.C.D., 1/D/010, livro 001.


Figura 5. Lado do Evangelho da Igreja da Misericórdia. Capela de S. António. Por cima o brasão dos Macedos, Sousa, Almeida e Vasconcelos.

Figura 6. Retábulo da Capela de S. António da autoria de José Esteves da Fonseca, feito em 1756. Na mesma capela está a imagem do Senhor da Cana Verde, em madeira policromada.


6. O Compromisso O primeiro compromisso da Santa Casa da Misericórdia seria, provavelmente, igual ao da Misericórdia de Lisboa. Foi a partir desta que proliferaram por todo o Império dezenas de instituições, tendo a maior parte delas seguido o exemplo da Casa Mãe1 . Nos Arquivos de Santa Comba Dão não existe cópia dos primeiros regulamentos, mas a primeira reforma do compromisso foi aprovada em 1 de Janeiro de 1635. Esta, achou por bem fazê-la o Provedor João Gomes de Almeida, “por o compromisso velho tinha muitas falências e roturas e falta de folhas e capítulos viciados2 (...), sendo talvez esta a justificação para o desaparecimento do original. Socorreu-se a Mesa da Misericórdia do compromisso da Irmandade de Coimbra (...) por ser moderno e estarem as coisas nele bem ordenadas (...)3 , para a elaboração do novo corpo regulamentador das actividades da Irmandade que vai vigorar até 1 de Setembro de 1709, altura em que é publicado em mesa uma nova reforma que tinha sido objecto de confirmação dada pelo rei D. João V em 23 de Maio 4. Segundo o compromisso, os candidatos a irmãos tinham de reunir condições, tais como ser “limpos de sangue sem alguma raça de Mouro ou Judeu”, que “não sirva a casa por salário”. As principais obrigações dos irmãos são acudirem quando são chamados e quatro vezes no ano em que terão de participar em actividades da irmandade, estando a primeira relacionada com o dia da Visitação de Santa Isabel, dia de eleição do Provedor e oficiais da mesa; a segunda para acompanhar a procissão do dia de Todos os Santos; a terceira nas missas e nos ofícios que se façam por todos os irmãos defuntos, normalmente a três de Novembro e a quarta será para acompanhar a procissão de Quinta-feira das Endoenças, à tarde, para acompanharem os penitentes e visitarem o Santo Sepulcro que se ache em algumas igrejas da comunidade.

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Caetano, J.O. (1995). Para uma Iconografia da Virgem da Misericórdia, Mater Misericordiae. Lisboa: Santa Casa da Misericórdia. P.15). 2 A.H.S.C.M.S.C.D./1/A//001/ livro 003, caixa 001, Livro do compromisso de 1635, registo que manda fazer João Gomes de Almeida, prov edor, p. 53. 3 Idem, p. 54, inédito. 4 A.N.T.T., Chancelaria de D. João V - Comuns, livro 30, fls.369, microfilme 457.


Serão admitidos até 120 irmãos que, estabelece o compromisso, terão de eleger de entre eles, um irmão hospitaleiro. O tesoureiro será sempre o padre Capelão e “o pão de foro remível, conforme o testador António Rangel, não deverá ser todo gasto devendo algum ser depositado”. Este Compromisso é revisto por uma comissão composta por Licenciado Manuel de Andrada, Simão João, Manoel de Loureiro, Nuno da Costa, Manoel de Homem e António João Bandeira. De salientar é o facto de o tesoureiro ter de ser o padre capelão, o que revela a enorme força do clero e a tendência de controlar as principais receitas e bens da Irmandade. Esta influência está bem patente quando, em reunião de mesa de 1728 presidida pelo Reverendo José Pais Teixeira, é negada a admissão como irmão a D. António de Sá, Capitão-Mor da vila, membro da Nobreza1. A votação era feita com feijões brancos e pretos, contrariando o estabelecido no compromisso, ou seja, a utilização de favas para os processos de votação. Do compromisso de 1635 fica a Procissão da Quinta-feira das Endoenças, hoje Procissão de Quinta-feira Santa Quinta feira de endoenças se costuma a Irmandade da Mizericórdia ajuntar para ir visitar em procissão algumas Igrejas e sepulcros em que está o santissimo sacramento, e com esta demonstração exterior do povo christão ao devidi sentimento de Christo Redentor (...). Sairá da Caza da Mizericordia no tempo e pellos lugares costumados (...) e as varas do palio serão dos irmãos da meza, como até agora se usou e o capelão da caza levará o Christo como sempre fez e o escrivão da meza levará a bandeira da Irmandade diante das mais insignias que é o principio da procissão, e seguirão logo as insignias da paixão conforme os passos delas, as quais levarão os irmãos a que se encomendarem e a cada huma acompanharão dois irmãos com dois bordois, como a primeira bandeira e as varas do governo da procissão se darão a irmãos a que se tenha respeito no governo dela e um deles irá diante da primeira bandeira para fazer com todo o bom modo dar lugar e desmar a gente repartidamente em o corpo da procissão, e diante do pállio, que é o remate e fim dela irá o mordomo da capela também com sua vara (...) com o que se segue o pállio onde vai o provedor (...)2 .

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A.H.S.C.M.S.C.D. Livro 005,Caixa 001. A.H.S.C.M.S.C.D./1/A//001/Livro 003,Caixa 001, Livro do Compromisso de 1635. Capítulo 29.


Figura 7. Bandeira de Nossa Senhora da Misericórdia e no verso Nossa Senhora da Piedade. Século XVII.

Figura 8. Bandeira de Nossa Senhora da Misericórdia e no verso Nossa Senhora da Piedade. Século XVIII.

Figura 9. Bandeira de Nossa Senhora da Misericórdia e no verso Nossa Senhora da Piedade. Século XIX.

Figura 10. Bandeira da última ceia e no verso lava-pés. Século XVIII.


Figura 11. Bandeira de Oração de Jesus no Horto e no verso o beijo de Judas. Século XVIII.

Figura 12. Bandeira de Jesus perante o Sumo Sacerdote e no verso a Flagelação. Século XVIII.

Figura 13. Bandeira de Jesus perante Pilatos e no verso condenação de Jesus. Século XVIII:

Figura 14. Bandeira de Jesus perante Herodes e no verso coroação de espinhos. Século XVIII.


Figura 15. Bandeira de Jesus a caminho do calvário e no verso toalha de Verónica. Século XVIII.

Esta procissão é realizada, por certo, desde a fundação da Irmandade. Actualmente participam na procissão as sete últimas Bandeiras. A procissão dos Passos de Nosso Senhor Jesus Cristo, Sexta-feira Santa, só se inicia no dia sete do mês de Abril do ano de 16411 . A Santa Casa teve compromissos novos em 1709, 1807, 1907, 1912, 1955 e 1973.

Figura 16. Urna onde se colocava o pão sagrado em Quinta-feira Santa.

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Idem., Livro do Compromisso de 1635.


7. A Igreja Nova da Misericórdia

Já em 1722, os Irmãos preocupavam-se com a ruína em que se encontrava a Igreja velha da Misericórdia. Em 1737 decidiu-se pela construção da nova Igreja mandando-se fazer a planta para a dita obra pelo arquitecto Gaspar Ferreira da cidade de Coimbra e que se fizesse a elleição do sítio que fosse mais conveniente (...) e mandando-se vir a esta vila o dito arquitecto e fez a elleição do terreno em sítio do Cimo de Vila em quintal que foi de Manuel da Veiga. (A.H.S.C.M.S.C.D. Livro de obra da Igreja Nova)

Gaspar Ferreira é considerado um dos maiores arquitectos de Coimbra do século XVIII. Traçou as plantas de inúmeros edifícios naquele distrito e, ainda no distrito de Viseu. Do seu traço é também o edifício da Santa Casa de Mangualde. A localização do edifício da Santa Casa de Santa Co mba Dão é por ele esco lhida por ser no local mais elevado da vila, segundo nossa opinião. Posteriormente, são erguidos à sua volta edifícios particulares que esconderam a Igreja. Em 27 de Janeiro do mesmo ano, pedem os irmãos que cobrem-se as dívidas para dar início às obras da Igreja da Santa casa (...) se não dêem cartas de guia aos pobres em valor superior a 20 reis (...) que os enfermeiros não tratem ninguém sem ordem da Mesa (...) aos pobres do lava pés se dêem seis vinténs (...) na semana santa não se façam despesas em confeites. (A.H.S.C.M.S.C.D. Livro de obra da Igreja Nova) A 3 de Junho fo i mandada pôr a pregão a obra sendo dada a construir aos mestres António Ribeiro e Pascoal Rodrigues. O mestre António Ribeiro era natural do lugar do Souto, Freguesia de São Tiago de Poiares, termo da vila de Barcelo s, assistente na cidade de Viseu na obra da Igreja de S. Miguel. Em 1 de Julho de 1737, em mesa presidida pelo Provedor José Bernardes Coelho Figueiredo, decide-se que, enquanto durarem as obras da Igreja, os infermeiros não curem doente sem autorização da Mesa.


Em 21 de Setembro do mesmo ano foi lançada a primeira pedra, benzida segundo o ritual romano 1. António Ribeiro não levou a termo a sua empreitada, já que faleceu em 1738. Sucedeu-lhe a sua viúva como parte responsável no contrato, mas no terreno será o filho António Ribeiro Alves quem continua a obra. Com a morte deste a 25 de Março de 1742, será o seu irmão Manuel Ribeiro Alves a terminar as obras 2, sendo aceite como o novo mestre em 14 de Novembro de 1746. Seis dias antes da morte de António Ribeiro Alves, havia falecido um oficial de pedreiro, o que leva a supor ter ocorrido um acidente de trabalho; seriam sepultados dentro da Igreja e foram acompanhados pela Irmandade da Misericórdia, tendo a Misericórdia dispendido 1.500 réis com o enterro do oficial de pedreiro e 7.050 réis com o do mestre pedreiro (Neves, 2002).

Figura 17. Igreja Nova da Misericórdia

O dinheiro escasseava e a planta original foi alterada por algumas soluções arquitectónicas serem demasiado caras. Em 1747 o emadeiramento das casas novas da

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A.H.S.C.M.S.C.D., 1/C/006//Lv003, 1737-1762, Despesa da Obra da Nova Igreja e Dependências, caixa 039, inédito. 2 Ver “ Igreja Matriz e Capelas da Freguesia de S. João de Areias”, nota 115, página 188.


Misericórdia foi dado a mestre Caetano da Fonseca da vila de Lagos, pelo seu lanço de seis moedas de ouro de quatro mil e oitocentos reis cada. No dia 25 de Junho de 1758 foi feito o termo de arrematação do ladrilho do patamar de entrada e as respectivas escadas a “D(?) Gonçalves” de Santa Comba e a “Daniel Alves, de S. João de Areyas por sesenta e cinco mil reis” . A obra terá de estar concluída até Janeiro do ano seguinte, segundo o termo elaborado pelo escrivão José Pinto Coelho. A Igreja da Misericórdia é de construção simples. A planta é longitudinal co m coberturas diferenciadas de duas e três águas. A fachada principal tem um pórtico de arco rebaixado e encimado por frontão curvo, com brasão heráldico. O alçado lateral esquerdo com corpo da sacristia e construções de diferenciadas volumetrias. O alçado lateral direito tem um janelão na capela-mor. Do mesmo lado e no fim da nave tem torre sineira com quatro ventanas. O interior é de nave única, coro alto, capela-mor e sacristia. Do lado do Evangelho com a Capela dedicada a Santo António encimada com as armas dos Macedos, Sousas, Almeidas e Vasconcelos. No lado da Epístola há uma porta de acesso ao púlpito. A cobertura é de falsa abóbada de berço em madeira assente em cornija. Um degrau dá acesso ao arco triunfal, ladeado por dois altares policromados. O Altar-mor é de talha policromada com abóbada de berço assente em cornija. O edifício possui, no rés-do-chão, instalações sanitárias e salas de arrumos, com escadaria para o piso superior, ao cimo hall com três janelas de sacada e uma janela com conversadeira, dá acesso ao coro alto, à sala de sessões que se desenvolve paralelamente à nave da Igreja, ao gabinete do provedor e a salas de arrumos e arquivos. Os quatro altares têm estrutura e gramát ica tardo-barroca. No altar-mor está uma imagem de Nossa Senhora das Misericórdias. Em tempos o centro do altar era ocupado por uma pintura a óleo da Visitação, assinada com o nome Matos e com a data de 1882. No altar do lado do evangelho está um doutor da Igreja e do lado da epístola está uma imagem de S. José com o menino ao colo. As três imagens são recentes, provavelmente do século XIX, sendo os autores desconhecidos. A tribuna tem trono e tribuna em falsa abóbada, remate composto por frontão contracurvado, onde despontam dois anjos.


Na sacristia há um arcaz de cinco corpos, sendo o tecto composto por quadraturas que rodeiam Nossa Senhora da Conceição pintado em “trompe d’oeil”1 . A pintura é feita sobre fina tela, posteriormente colada na madeira.

Figura 18. Nossa Senhora da Conceição. Pintura no tecto da sacristia.

A tribuna da capela-mor é da responsabilidade do entalhador João da Fonseca, por contracto de 27 de Junho de 1774 2 . Compareceu nas moradas do Reverendo Padre Francisco da Nossa Senhora do Rosário, Procurador da Santa Casa, estando presentes Manuel Botelho da Veiga e José Luís, para além da maior parte dos irmãos da Mesa. Fará a obra da tribuna da capela-mor, com o risco que veio de Coimbra, e será a tribuna de madeira de castanho 1

Carvalho, J. (1999). Igreja da Misericórdia de Santa Comba Dão. Monumentos Nacionais. É referido pelo Dr. António Nunes da Costa Neves, IGREJA MATRIZ E CAPELAS DA FREGUESIA DE S. JOÃO DE AREIAS, p. 162. João da Fonseca Ribeiro é ainda autor da tribuna do altar-mor da igreja de Santa Maria de Currelos e do altar-mor da Igreja Matriz de S. João de Areias. Também o Dr. Francisco António Antunes Gonçalves Ferreira, in SANTA COMBA DÃO, Uma Monografia, aponta João da Fonseca como entalhador da tribuna da capela-mor. Ainda em A.D.V., Notas de Santa Comba Dão, L. 72, fls. 75-77.

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Figura 19. Altar-mor e colaterais da Igreja da Misericórdia da autoria de João da Fonseca, 1774.

ou cerne de Carvalho. O mestre terá a obrigação de dar todas as madeiras e pregos, de modo a terminar a obra no mês de Setembro do ano seguinte, pagando a Santa Casa a quantia de cento e noventa mil reis. As testemunhas foram José Pedro dos Santos, Mestre de Gramática e o estudante João Ferreira. O Tabelião foi Miguel Caetano de Morais. A tribuna tem trono e tribuna em falsa abóbada, remate composto por frontão contracurvado onde despontam dois anjos. A madeira usada para a construção da Igreja vem do Coval, de Cagido, Cernada, Silvares e os vendedores são Gaspar Antunes, Manuel Gomes Abreu, António Alves, João Pais da Costa e Pedro de Figueiredo 1 . As obras da construção da Igreja prolongaram-se até 1761, tendo sido gastos quatro contos, seiscentos e sessenta e oito, quinhentos e noventa e dois reis, isto apenas na obra de pedraria: 1738 - 566 800 reis 1739 - 656 237 reis 1740 - 873 800 reis 1741 - 198 270 reis 1

Ver nota 21.


1742 - 191 060 reis 1743 - 416 114 reis 1744 - 76 315 reis 1745 - 38 831 reis 1746 - 181 500 reis 1747 - 245 105 reis 1748 - 103 840 reis 1749 - 54 365 reis 1750 - 280 640 reis 1751 - 108 010 reis 1752 - 30 510 reis 1753 - 165 125 reis 1754 - 144 870 reis 1755 - 13 260 reis 1756 - 39 020 reis 1757 - 15 650 reis 1758 - 106 400 reis 1759 - 96 890 reis 1760 - 56 420 reis 1761 - 9 460 reis As obras da construção da Igreja Nova decorreram com algumas dificuldades evidentes pela escassez de dinheiro, o que se revela no corte de despesa e na alteração do projecto, conforme a obra vai avançando. A pedido do Padre Ignácio José Gomes da Silva, pároco da Matriz, no dia 1 de Julho de 1777, o Santíssimo passa para a Misericórdia, por aquela Igreja se encontrar em ruína, regressando à Matriz em 1800. O sino primitivo da Igreja encontra-se guardado à entrada das casas do despacho e nele pode ler-se: “Maria José André de Argos me fez no ano de 1765”. O nome Argos está associado ao Mestre Sineiro de Santander, reino da Biscaia, Espanha, João de Argos, que se comprometeu a fazer o sino para a Igreja de S. João de Areias, embora o sino não tenha chegado até aos nossos dias (Neves, 2002).


Em Setembro de 1782, mestre Arcângelo de Almeida, natural do lugar de Nogueira, Seia, contratou dourar e pintar o retábulo da capela-mor. A 9 de Outubro do mesmo ano, compareceu nas casas de morada de Manuel Arrais de Mendonça Perestrelo, em Santa Comba, estando presente o Procurador da Santa Casa, Reverendo Padre Francisco da Nossa Senhora do Rosário, e José Luís para que se possam cobrar todos os juros que se devem à Santa Casa, vencidos e destrates, e para que sejam recolhidas todas as rendas. Estão presentes Hipólito Botelho da Veiga, Manuel Pires Vaz, João Paulo Ferreira, José Joaquim Ferreira, António José da Veiga, António Pais, Bento Gomes da Costa Manuel Arrais de Mendonça Perestrelo. Nessa altura foi ajustado o douramento e pintura do retábulo que Arcângelo de Almeida se obrigou terminar até ao fim de Dezembro do mesmo ano. Em 26 de Outubro de 1786 declara ter recebido a quantia de 9$700 reis da obra pintura que tinha feito na Igreja da Misericórdia1. O douramento e a pintura do retábulo-mor terá, no entanto, custado 29 moedas de ouro, cada uma a 4$200 reis, conforme a escritura de fiança2.

8. O Hospital Escasseiam as fontes sobre a existência do Hospital, sua localização e funcionamento. Os rendimentos da Santa Casa não deveriam ser avultados de forma a garantir um médico em permanência. A forma encontrada para socorrer os enfermos era pedir alvarás à coroa para colocar Mamposteiros, homens que pediam esmola, em todas as localidades que distassem três léguas à volta de Santa Comba Dão. Surgem, no entanto, alguns dados referentes ao tratamento dos enfermos, mendigos, pobres e órfãos. O rei Filipe III dá alvará, em 31 de Maio de 1631, à Santa Casa por “petição do provedor e irmãos da Misericórdia de Santa Comba Dão, do bispado de Coimbra”,

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A.H.S.C.M.S.C.D/1/C/004/Mç001/cx035, Nuno Ferreira. A. D. V., Notas de Santa Comba Dão, L. 58, fls. 55 v. – 57.


para pedir esmola “três léguas ao redor da dita vila”3. Nova petição é feita a D. João IV, que é confirmada por alvará de 8 de Março de 16424. Para além do pedido costumeiro de esmolar três léguas ao redor da freguesia, nesta petição é pedido que os oficiais da Santa Casa tenham os mesmos privilégios dos da Santa Casa da Misericórdia de Coimbra. Em 1688, António Gomes dos Santos servia de barbeiro na Santa Casa, “e porque tinha feito muitas sangrias e lançado ventosas (práticas médicas da época) pedia que lhe mandassem pagar a metade dos débitos”5. Em 20 de Março de 1688, o rei D. Pedro II confirmou o alvará de seu irmão D. Afonso VI, de 4 de Outubro de 1664, autorizando a Santa Casa a “pôr mamposteiros que tirem esmolas pela freguesia de três léguas ao redor para acudirem aos pobres e doentes do hospital”. Estes alvarás foram publicados em 1936 pelo Dr. João Manuel Esteves Pereira, que com eles fez folhetos para oferecer à Comissão Organizadora do Hospital de Santa Comba Dão, presidida pelo advogado Alfredo Mendes de Almeida Ferrão, destinando o produto da venda do folheto ao novo hospital. Tomo a liberdade de transcrever os alvarás tal como é feito nos referidos folhetos. Eu el-rei faço saber que por parte do provedor e irmãos da Misericórdia da vila de Santa Combadão me foi apresentado um alvará de el-rei D Afonso, meu irmão e senhor, que santa glória haja, e por êle assinado. Do qual treslado é o seguinte: Eu el-rei faço saber aos que este alvará virem que, havendo respeito ao que por sua petição me enviaram dizer o provedor e irmãos da Misericórdia da vila de Santa Combadão sobre poderem pôr daqui em diante mamposteiros que tirem esmolas pela freguesia de três léguas ao redor para acudirem aos pobres e doentes do hospital, os quais tenham e usem dos privilégios de que usavam pelos alvarás, que até ao presente lhe foram concedidos de três em três anos, visto o que alegam e a resposta que sobre isso deu o procurador da minha corôa que não teve a isso dúvida: Hei por bem e me praz que daqui em diante possa a dita Santa Casa da Misericórdia pôr mamposteiros para tirarem as esmolas de que fazem menção para o efeito referido e que gozem dos priviulégios de que tratam como pedem. E êste alvará se cumprirá como se nêle contém, e valerá, posto que o seu efeito haja de durar mais de um ano, sem embargo da Ordenação do livro segundo, título quarenta, em contrário. – Manuel do Couto o fez em Lisboa a 4 de Outubro de 1664.- Francisco Pereira de Castelo Branco o fez escrever.=Rei=.

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A.N.T.T. Chancelaria de Filipe III, registo de doações, ofícios e mercês, livro 29, folha 36 verso, microfilme 6901. 4 A.N.T.T. Chancelaria de D. João IV, registo de doações, livro 14, folha 14, microfilme 1120. 5 A.H.S.C.M.S.C.D /1/C/006/Lv003/7, Livro das obras da Igreja.


Pedindo-me o dito provedor e irmãos da Misericórdia da vila de Santa Combadão que lhe fizesse mercê confirmar em meu nome o dito alvará porque, pelo não estar, não guardavam aos mamposteiros os seus privilégios, com que os pobres pereciam pela casa não ter rendas, e visto seu requerimento, de que houve vista da Corôa e não teve dúvida a se lhe deferir: Hei por bem de lhes confirmar, como por êste confirmo ehei por confirmado, o dito alvará neste encorporado, para que em virtude dêle possam pôr mamposteiros, que tirem as esmolas pelas freguesias de três léguas ao redor e que gozem dos privilégios que lhe foram concedidos pelo alvará de que fazem menção, cumprindo-se êste alvará como nele se contém, o qual valerá, posto que o seu efeito haja de durar mais de um ano, sem embargo da Ordenação, livro 2º, título quarenta, em contrário, e pagará o novo direito, se o dever, na forma de minhas ordens. Tomé da Silva o fez em Lisboa a vinte de Março de 1680 e oito. Francisco Galvão o fez escrever. =Rei= O monteiro-mór João de Roxes de Azevedo. Pagou quinhentos e quarenta reis. E aos oficiais trezentos e catorze reis. Lisboa, o primeiro de Abril de 1688. Dom Sebastião Maldonado. Os folhetos têm as seguintes notas: Acham-se os alvarás, atrás transcritos, registados no livro dezoito a folhas 208 verso da chancelaria de D.Pedro II existente no Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Mamposteiros, conforme definem autores dos séculos XVI e XVIII, eram como que procuradores incumbidos da cobrança de esmolas. Duarte Nunes de Leão, na sua Ortografia (1576), a página 61, verso, dando a etimologia de Mamposteiro, escreve que é homem posto por mão de alguns para algum negócio. Rafael Bluteau, no seu Vocabulário (1712-1721), define mamposteiro dos cativos aquele que arrecada as esmolas e as condenações, que se dão para resgate, e mamposteiro da Bula o que arrecada as esmolas da Bula da Cruzada, havendo mamposteiros-móres e menores. Ao mamposteiro – mór dos cativos se referia a Ordenação, Livro 1º, título 62, parágrafo 26. Estes mamposteiros foram extintos no reinado de D. José. Victor Ribeiro, na sua História da Beneficencia pública em Portugal, Coimbra 1907, a páginas 64, elucida que os mamposteiros da Misericórdias se chamaram anteriormente pedidores e que el-rei D.Manuel I, na carta de privilégios concedida à Misericórdia de Lisboa, claramente lhe permitiu que tivesse mamposteiros com as mesmas prerrogativas que usavam os dos cativos. E por analogia houve esparsos pelo país os mamposteiros de todas as numerosas Misercórdias. Por volta de 1705 o Hospital da Santa Casa é contemplado no Testamento de Manuel dos Santos Pedrosa e sua mulher (anexo II) 1. 1

A.H.S.C.M.S.C.D. 1/D/010/ livro 001, Tombo da Capela de António Varela Rangel de Macedo, folhas 58 a 69, caixa 154, “ Instituímos por nossa herdeira e testamenteira a casa da misericórdia desta vila e ao seu hospital para que pagos todos os nossos legados lhe fiquem todos os nossos bens (...) 16 de Maio de 1692. Ver apêndice II.


Em 17 de Junho de 1717, D. João V concede cartas de privilégio para que se pudesse colocar “a esmolar” Manuel Fernandes Pedro na Freguesia de Vila Nova da Rainha, Manuel Lourenço no Lugar de Vila Meã, freguesia do Sobral do Concelho de Mortágua e na freguesia de Friúmes do mesmo concelho e Manuel Rodrigues na Freguesia de S. Miguel de Parada, do antigo concelho de S. João de Areias, englobadas que estavam na distância de três léguas da vila de Santa Comba Dão. Em 1719, nas actas da Mesa de 27 de Agosto, “se dava quatro mil reis de partido ao médico e que como esta casa não tem hospital, nem conveniência delle e em ter médico de ter partido”1. O Hospital surge nas Informações Paroquiais, em 1721, e três anos depois é médico assistente dos doentes o Dr. Manuel da Cruz Bernardes, Provedor em 1717. Em 1784 faz-se referência a um requerimento feito pelo Dr. Luís José Monteiro para médico do partido da Santa Casa, para com os pobres mendigos por seis mil reis cada ano, o que foi aceite pela mesa presidida pelo Doutor Estevão Manoel da Cunha Pinto. Em 6 de Março de 1794, uma quitação do Tesoureiro da Santa Casa da Misericórdia, revela o pagamento a João Paulo Ferreira, cirurgião, a quantia de 3200 reis devidos do salário da sua profissão2. Em 5 de Abril de 1871, o provedor determina a data para arrematação das obras da nova Casa da Botica, contígua à Igreja da Santa Casa3. Só em 7 de Julho de 1877 a Santa Casa faz um contrato com o Farmacêutico que então a servia, Manuel de Matos Viegas, natural de Vila Nova, Mortágua. Esse contracto, devidamente escriturado, inicia a exploração da Farmácia em moldes diferentes do que existia até então. A abertura do estabelecimento foi no dia dezassete de Junho4. Nesta casa funcionou durante grande parte do século XX, a Farmácia Figueiredo. A Botica, mais tarde a Farmácia, foi das obras mais significativas e com enorme alcance social desenvolvidas pela Misericórdia de Santa Comba Dão. Todos os pobres tinham acesso gratuito a medicamentos. Em Finais do século XIX, a Santa Casa não tinha hospital (Godolphim, 1998). A Santa Casa da Misericórdia tinha como uma das muitas funções, auxiliar os enfermos e as pessoas com mais necessidades. Nos seus sucessivos compromisos deve recolher os órfãos e promover o seu casamento, sendo esta uma das características mais marcantes da Santa Casa da Misericórdia de Santa Comba Dão, que abarcava uma vasta 1

A.H.S.C.M.S.C.D /1/C/006/Lv.003/7, inédito. A.H.S.C.M.S.C.D., /1/A/005, Mç. 001, Cx. 002, Nuno Ferreira. 3 A.H.S.C.M.S.C.D., /1/B/003/ Mç. 001, Cx. 005, Nuno Ferreira. 4 A.D.V., Cartório Notarial de Santa Comba Dão, livro nº.184/11, folhas 26 v.. Ver apêndice III. 2


região incluindo habitantes de algumas povoações dos actuais concelhos de Mortágua, Tábua, Carregal do Sal, Tondela e Penacova. A acção da Santa Casa era feita num raio de três léguas ao seu redor, cerca de 15 quilómetros, já que esta era a área permitida pelos sucessivos alvarás régios para os Mamposteiros pedirem esmola. Assim, em 1689 foi eleita a freguesia do Sobral (Mortágua), para nela se casar um órfão e para o officio de lava pés os pobres das freguesias de Mortágua, Pála, Espinho. Vale Ermígio, Cortegaça, Marmeleira, Cercosa, Almaça, Couto do Mosteiro, S. Joaninho, Treixedo, Santa Comba Dão e do Couto nãp veio pobre pelo que foi substituída por S. João de Areias”5. Em 1691 foram eleitos doze orfãos das seguintes freguesias: Couto do Mosteiro = Ardavaz = Villa nova da Raínha = mouras = Tonda = Tondela = Lobam = Canas de Sabugosa =Santiago = Santa Eulália = Castelões = Santa Comba Dão”6. Em Outubro do mesmo ano “casar duas orfâs de S. João de Areias e Couto do Mosteiro e para o officio de lava pés os pobres de Sobral (...) Nandufe, Molelos, Ferreirós, Cabanas, Oliveira do Conde, Currelos, Papízios, Santa Comba Dão”7. Em Outubro de 1692 “duas orfãs de Mortágua e Canas de Sabugosa e os pobres de Santa Cruz, Freguesia de Pinheiro de Àzere, Travanqua, Oliveira de Cunhedo, Óvoa, São Paio de Farinha Podre. (...) Àzere, Sinde”8. E em 1693 “se fez a eleição da freguesia de Tonda e para a cerimónia de lava pés (...) os pobres das freguesias de Midões, espariz, Póvoa de Midões, (...) São João da Boavista, Mortágoa, Espinho, Val de Eremígio, Cortegaça, Marmeleira, Cercosa e Santa Comba Dão. Em 1696 “ casar orfão da vila e de S. Joaninho”. O Padre Manuel de Almeida fundou uma Capela para instituir dotes de casamento a pessoas de poucas posses. Entre 1847 e 1858 foram pedidos cerca de quarenta dotes de casamento de trinta mil reis cada. Nos registos consta que o dote foi dado a nove noivas de Pinheiro de Ázere, sete do Couto do Mosteiro, seis de Santa Comba e Óvoa, duas de Nagosela, Treixedo e Vimieiro, uma de Coval, Rojão, Gestosa, Cagido, Vila Pouca e Chamadouro. O dote foi diferente para todas as noivas e em nenhum caso atingiu o valor e 30 mil reis o que pressupõe que cada caso era analisado revelendo que cada noiva teria situações económicas diferentes (Ferreira, 2002).

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A.H.S.C.M.S.C.D. /1/C/006/Lv. 003/7, folha 19. A.H.S.C.M.S.C.D. /1/C/006/Lv. 003/7, folha 26. 7 A.H.S.C.M.S.C.D. /1/C/006/Lv. 003/7. 8 A.H.S.C.M.S.C.D. /1/C/006/Lv. 003/7, folha 29. 6


9. Acerca dos rendimentos A Santa Casa da Misericórdia de Santa Comba Dão não poderia ter um passado e um presente tão ricos, a fazer o bem se não tivessem existido verdadeiros beneméritos, uns mais conhecidos do que outros. Álvaro Neves em 1569 e António Varela Rangel de Macedo em 1603 são os primeiros. Este, no século XVII, tornou-se o grande benfeitor, ao ponto de condicionar o compromisso de 1635, no que diz respeito a uma verba dever ser posta a render juros. Outros se seguiram, que deixaram a Santa Casa como testamenteira, usufrutuária e herdeira de imensos bens de raíz (propriedades). Ainda hoje, os terrenos que se vendem para adequirir fundos para o funcionamento do lar, da creche e do hospital são legados de pessoas como Isabel Gomes de Almeida e Manuel dos Santos Pedrosa em 16929, Jerónimo Mendes Ferreira em 1694. O Licenciado Jerónimo Mendes Ferreira institui por herdeira a Santa Casa, ficando esta com a obrigação de mandar dizer trinta missas no Convento de Santa Cruz do Bussaco, sendo testemunha o capitão-mor José de Macedo Varela em 9 de Maio de 169410. Em 1684, Domingos Ferreira e sua mulher Isabel de Seixas, moradores no Burgo de Santa Clara, extra muros da cidade de Coimbra e naturais desta vila, deixam useira de seus bens a Santa Casa e desejam ser sepultados no Mosteiro de S. Francisco. Deixam a terça parte à sua filha Madalena, no caso de ela casar com cristão velho e não com pessoa de “infecta nação”. O tabelião foi Manuel Ferreira do Amaral em 2 de Julho de 1684. As testemunhas foram Manuel Fernandes, aprendiz de espingardaria; João; João Simões e os alfaiates Manuel Gomes e Francisco Carvalho 11. Outros benfeitores importantes são Valentim Macedo Varela em 1705, Joana Teresa Rangel em 1798 e o Padre Manuel de Almeida. Em 1777, o irmão e provedor, Reverendo Francisco de Nossa Senhora do Rosário, dá 110 mil reis à Santa Casa para que mais tarde lhe sejam pagas missas. A Santa Casa tinha várias formas de aumentar os seus rendimentos e uma das mais usadas seria o pagamento de uma cota por cada irmão que entrava para a 9

A.H.S.C.M.S.C.D.1/D/010, livro 001, folhas 58 a 59. O Treslado do testamento é o apêndice II. 10 Idem, Ibidem, folha 37, verso. 11 Idem, Ibidem, folhas 79 a 81.


irmandade. Mas, nos primeiros tempos, como já vimos anteriormente, as receitas da Misericórdia provinham sobretudo de esmolas, cujos peditórios eram feitos pelos Mamposteiros, que curiosamente em Odemira se chamavam “quadrilhas” (Quaresma, 1993). Outra seria através de empréstimos de capital, à taxa de 5 % ao ano. Desde 1706 emprestavam-se quantias que variavam entre os 5 e os 45 mil reis. Até finais do século XIX vigorou sempre o mesmo juro. O aforamento era outra forma de recolher rendimentos, “quatro alqueires de milho de pão, de milho-miúdo bom ou 4 mil reis”. O rendimento variava conforme as áreas aforadas. De todos, os bens fundiários e o património urbano constituiriam a sua principal renda, sob a forma de contratos enfiteuse, bens geralmente deixados em testamentos. A venda de terrenos, menos usual, também era praticada. Geralmente os doadores não permitiam nos seus testamentos a venda de bens de raiz, ou seja, a venda de terras. Nos finais do século XIX, a Misericórdia de Santa Comba tinha de receita 1:370$000, sendo o capital nominal de 900$000 e o capital mutuado de 12:760$000 (Godolphim, 1998).


10. Os Provedores da Santa Casa 1596 Reverendo António Cordeiro 1604 Gomes Franco 1605 Simão Franco 1606 Reverendo António Cordeiro (natural de Ranhados) 1617 António de Andrada 1634 João Gomes Almeida 1638 Reverendo Manuel Gomes Varela 1640 Licenciado Abel Pereira 1641 Licenciado Abel Pereira 1659 Reverendo João Gomes 1661 Manuel de Andrade 1673 José de Macedo Varela 1683 Alexandre Pereira 1688 Reverendo Pedro de Gamboa e Vasconcelos 1689 Reverendo Pedro de Gamboa e Vasconcelos 1690 Licenciado Manuel Gomes 1691 Manuel Bernardes e Seixas 1692 Manuel Bernardes e Seixas 1693 Padre Manuel Antunes de Andrade 1694 Padre Manuel de Almeida 1695 Dr. Giraldo Nunes Coelho 1696 Reverendo Padre Miguel Coelho 1697 Pedro Ferreira Leitão 1698 Licenciado Manuel Teixeira de Andrada 1699 Manuel da Silva Homem 1700 José de Macedo Varela, (Capitão-Mor de Mortágua; Cavaleiro da Ordem de Cristo; Administrador da Capela de Santo António). 1701 Reverendo Padre Bernardo de Figueiredo 1702 António da Fonseca Perestrelo 1703 André de Payva da Cunha


1688 Reverendo Padre Bernardo de Figueiredo 1689 Dr. Bento Bernardes de Seixas 1690 João Gomes Coelho 1691 Paulo Lobo da Silva 1692 Reverendo Abade de Mouraz Giraldo Nunes Coelho 1693 Manuel Gomes de Morais 1694 Reverendo Pedro do Amaral Abranches 1695 Feleciano de Macedo Varela 1696 Dr. Manuel da Cruz Bernardes (médico) 1697 Dom António de Eça 1698 Teodósio da Cunha Pinto 1699 Teodósio da Cunha Pinto 1700 Pedro Ferreira Leitão 1701 António de Paiva Homem 1702 António de Paiva Homem 1703 Reverendo Thomé de Sá da Bandeira 1704 Reverendo Thomé de Sá da Bandeira 1705 Reverendo José Pais Teixeira 1706 Reverendo João Gomes Coelho 1707 José Fernandes da Silva 1708 Doutor Bernardes e Seixas 1709 Manuel da Rocha e Mello 1727 Reverendo José Pais Teixeira 1730 José Fernandes da Silva 1 732 Dr. Bernardes de Seixas 1737 Doutor José Bernardo Coelho de Figueiredo 1739 Bento Fernandes e Seixas 1741 Doutor Manuel da Cruz Bernardes 1742 Doutor João Pinto Coelho 1746 Doutor Hipólito Coelho da Veiga 1747 Dom Francisco de Eça 1752 Doutor Manuel da Cunha Pinto


1753 Doutor Estevão Manuel da Cunha Pinto 1755 Doutor Estanislau da Cunha Coelho ( Natural de Ovar, Juiz da Coroa, Desembargador e Colegial de S. Pedro. Pai de Maria Hipólita Cassiana Flôr da Rosa Cunha Gusmão e Figueiredo que casou com António de Sousa Macedo Almeida e Vasconcelos em 13.08.1770). 1756 Doutor Estanislau da Cunha Coelho 1757 Doutor Estanislau da Cunha Coelho 1763 Teófilo Benedito da Cunha Pinto 1764 Reverendo Doutor Hipólito Botelho da Veiga 1769 Capitão Manuel Ribeiro da Costa, (Comissário do Santo Ofício). 1770 Doutor Estevão Manuel da Cunha Pinto 1774 Reverendo Francisco de Nossa Senhora do Rosário 1775 José Arrais de Mendonça Perestrelo 1776 Ma nuel Arrais de Mendonça Perestrelo 1782 Reverendo Francisco da Nossa Senhora do Rosário 1784 Doutor Estevão Manuel da Cunha Pinto 1787 Reverendo Francisco da Nossa Senhora do Rosário 1790 Manuel Arrais de Mendonça Perestrelo e Cunha 1791 Doutor Estevão Manuel da Cunha Pinto 1796 Doutor Estevão Manuel da Cunha Pinto 1797 Manuel Pires Vaz 1798 Manuel Borges de Sá 1799 Doutor Estevão Manuel da Cunha Pinto 1800 José Joaquim da Costa Morais do Amaral ( Juíz da Câmara em 1818). 1801 José Joaquim da Costa Morais do Amaral 1802 José Marinho de Sá Correia (Juíz da Câmara em 1825). 1803 José Marinho de Sá Correia 1804 José Maria de Sousa e Almeida e Vasconcelos 1805 Doutor José Joaquim Ferreira 1806 Doutor José Joaquim Ferreira 1807 Roque Ribeiro de Abranches Castelo Branco 1808 Roque Ribeiro de Abranches Castelo Branco


1796 D. Luís Vasques Cunha (Prior da Freguesia de Tábua, filho do Conde da Cunha) 1797 D. Luís Vasques Cunha 1798 João Correia da Costa Godinho 1799 José Maria de Sousa e Almeida e Vasconcelos. (Natural de Santa Comba Dão. Coronel das Milícias de Tondela, Comendador da Ordem de Crista, Governador e Capitão-General da Província de Angola, Deputado às Cortes Constituintes de 1820, Fidalgo Cavaleiro da Casa Real.) 1800 José Maria de Sousa e Almeida e Vasconcelos 1801 Luís de Sousa e Vasconcelos ( Juíz da Câmara em 1816 e 1817). 1802 António de Sousa de Almeida e Vasconcelos 1803

1804

1805

1806 Francisco da Costa Pais do Amaral (filho de José Joaquim da Costa Morais do Amaral) 1807

1808

1809 D, Luís Vasques Cunha 1810 António de Sousa D’ Almeida Vasconcelos 1811 Barão José Maria de Sousa Almeida e Vasconcelos 1812 António de Sousa Almeida Macedo Vasconcelos 1813

1814

1815

1816 Barão José Maria de Sousa e Almeida e Vasconcelos 1817

1818 Francisco da Costa Pais do Amaral 1819

1820 Barão José Maria de Sousa e Almeida e Vasconcelos 1821

1822


1796

1797

1798 José da Fonseca Saldanha 1799

1800 Barão José Maria de Sousa Almeida e Vasconcelos 1801 Miguel António Sousa Horta Almeida e Vasconcelos 1802

1803

1804

1805

1806

1891 Albino José Vieira das Neves


11. Apêndice I Livro da Capela de António Varela Rangel de Macedo Transcrição do Testamento

Livro da capella de António Varella Rangel, & de seus descendentes: Instituida & fundada nesta Sancta casa da Misericordia, da villa de Sancta Combadao. No qual livro consta da fundação da dita capella, e da obrigação que ficou a esta casa e a João Roiz de maçedo, herdeiros e testamenteiros do ditto António Varella o que tudo constará em tres titulos differentes como manda a verba do testamento que trata deste livro. Anno domini 1606 Testamento Treslado do Testamento

Saibam quantos este estromento dado em pubrica (publica) forma e autoridade de Justiça, com o treslado de hum testamento virem que no anno de nascimento de nosso Snor Jhs Xpo (Senhor Jesus Cristo) de mil e seiscentos e quatro annos, em os tres dias do mes de Março do ditto anno, em esta villa de Santa Comba dão nas casas de morada de mim tabalião ao diante nomeado pelo padre Joam Frª (Ferreira) morador em a dita villa, e escrivão este presente anno, da casa da Sta Misericordia da dita villa, me foi dado a petição seguinte, com o despacho ao pé della de manoel dinis Joiz ordinairo em a dita villa este presente anno, e com ela o testamento de que na petição faz menção, requerendo me comprisse (...) o dito despacho, o que tudo he o seguinte. Bras Frº (Francisco ou Franco) (tabelião) o escrevi Petição Dizem o provedor e irmãos da misericordia desta villa de Sta Combadão que Antonio Rangel natural desta dita villa, faleceo os dias passados na cidade de Lxª (Lisboa). E fez seu testamento no qual deixou por erdeira, na metade de seus bens a dita casa e na outra metade a Joam Ruiz de maçedo de quem era irmão. O qual Joam Ruiz de maçedo trouxe o dito testamento a esta casa e porque ora he necessario tornar o dito testamento a dita cidade de Lxª onde esta a fazenda que o dito defunto deixou para se arrecadar e partir conforme a elle extemen (?) que se perqa ou guaste Pedem a V. m lhe made dar o treslado em pubriqa forma para andar no cartorio da dita casa, E receberão justª e m. Despacho Vista esta petição e o que nela pedem o Provedor e mais irmãos da Santa Casa Misericordia desta villa de Stª Combadão, mando a qualquer tabelião


pubrigo que perante mim serve a quem for destribuido de o treslado do dito testamento de que fazem menção em pubriga forma e em modo que faça fe manoel dirige Por virtude do qual despacho entam (então) tresladey aqui o dito testamento cujo treslado he o seguinte. Bras Frco ( ) o escrevi. Testamento Em nome da Stssima Trindade Padre, fillio e esp'rito Santo, Tres Pªs e hu' so d's verdadrº (três pessoas e um só Deus verdadeiro) e da gloriosíssima sempre Virgem Maria nossa irmâ sua mai (mãe) e de todos os Santos e Santas da corte do Ceo. Eu Antº (António) Varella Rangel ora estante nesta cidade de Lx ao esperito Santo1 aonde Deus me trouxe pela sua devina misericordia das partes da India2 estando em todo meu perfeito juizo e entendimentº que nosso Snor me deu em hu'a cama doente conhecendo com o segundo a cozina (?) do Apostolo Sam Paulo. depois do pecado de Adam, estão instituido pela divina providencia que todos os homens morrão, em seu castigo, e com esto ser he tanta e tão grande a bondade de nosso Deus, que essa mesma morte qe he castigo de nossa culpa, recebe elle por materea de nosso merecimentº quando a esperamos com o devido aparelho, da vida e a sofremos com paciência oferecendonos a ela com hua varonil, não tanto compelidos e constrangidos pella obrigação natural de morrer quanto recebendo o per bandito e passagem pª (para) a eterna felicidade e vida bem aventurada e pera que morrendo sejam testemunhas fieis e leais da infalbel verdade que nosso Deus disse aos Primeiros Padres que pecando elles e todos seus descendentes morreriamos o que com a morte actual de cada hum fiqa verificado e comprido, portanta desejando oferecerme a ela mais co m merito que compelido estando em meu livre e são juízo do qual Nosso Snor foi servido darme e antes de chegar a derradeira ora da minha morte detremino de despirme e aparelharme pera ella não somente enderencando a vida presente segundo minha fraquesa, ajudado com o divino favor o que seja tal que consigua bem morrer mas ainda ordenado e dispondo de todos meus bens em serviço de Deus com tudo o que he a meu carrego pera depois da minha morte e pª acertar hu'a cousa e outra, rogo a Nosso Snor Ihs Xpo seja servido de me dar seu favor ajuda e graça pelos merecimentos de sua morte e paixão que sofreo, e pelo Santissimo sangue que derramou na arvore da Vera Cruz, pelos Pecadores de cujo numero diante de sua divina magestade, confesso ser eu o major, em cuja fé sempre vivi e protesto viver e morrer como verdadrº filho de sua santa Igreja catholica de Roma, sem que tentação algu'a nem elusão do demonio inimigo do genero umano e contrairo della, agora, nem em tpº algu' (tempo algum) seya bastante pª me fazer faltar em sua inteireza nem pª que deixe de sentir e que como agora sinto, e creo tudo aquillo nos ensina dando desde logo como per falssa qualquer cousa que em contrairo desta suma verdade me oppuser e abomino como a tal sendo certo que nao ha hu outra fe na qual se possa conseguir eterna felicidade senão esta, e rogo a purissima e gloriosissima virgem e mai de Deus avoguada (advogada) dos peccadores, e minha que na ora de minha morte me não 1

A Igreja do Espírito Santo ficava situada na altura, onde mais tarde foram os armazéns do Chiado. A Igreja foi totalmente destruída pelo terramoto de 1755. ( Poderá observar-se na maqueta da cidade de Lisboa, no Museu da Cidade). 2 Pela expressão utilizada " aonde Deus me trouxe pela sua devina misericórdia das partes da India" poderemos concluir que Varela Rangel esteve, de facto, na India.


desampare senão que com o Anjo de minha guarda, e com S. Miguel e S. Rafael e S. Gabriel e todos os mais Anjos do ceo e com os bem aventurados S. João Bautista, Sam Pedro S. Paulo, Santo Antº, S. Frcº (Francisco), Stº André, S. João Evangelista, S. Felipe, S. Scº (Sacramento), S. Jorge, s. Jeronimo, S. Domingos, S. Bernardo, Stª Anna, Stª Maria Madalena, meus avoguados e com todos os outros santos e santas da corte celestial me socorrão e ajudem com o seu especial favor para que minha alma per sua intercessão e meritos da paixão de Jesu Xpo nosso Snor seija collocado na gloria e bem aventurançã para que desde seu principio foi criada alcancando me perdão de minhas culpas e pecados de seu preciosissimo filho e salvador do genero humano pois me criou, remio e comprou por seu preciosissimo sangue. Mando e ordeno qu quando Deus nosso Snor for servido levarme desta presente vida para a outra nesta cidade de Lixª que meu corpo seja enterrado no mosteiro da Sant íssima Tirindade della donde sou irmão com o habito da mesma ordem e me acompanharão os Padres della a quem deixo dez cruzados desmola, aos quais amostrarão a minha carta da Irmandade, e sendo caso que faleça na beira ou em qualquer outra parte me enterrarão na Casa da Santa Misericordia da Villa de Santa Combadão a qual deixo os ditos dez cruzados que avião de dar aos frades da Santissima Tirindade se morresse nesta cidade. E acompanharme ha a bandeira da Santa Misericordia a quem deixo mil re's desmola e morrrendo na beira acompanharme ha a confraria dos fieis de Deus á qual deixo os ditos mil re's desmola e não avendo esta confraria mando se digão em missas pelas almas do fogo do Purguatório E assi me aco mpanhara a cruz da freguesia com seus padres da Igreja a quem deixo quatro cruzados desmola, e morrendo na beira os deixo á confraria do Santo Sacramtº que me acompanhara com sua cera; e assi me acompanharão os meninos orfãos a quem deixo seis tostois desmola e sendo na beira em seu lugar se darão a doze pobres que me acompanharão com doze tochas em luguar dos meninos orfãos, e sendo aqui me acompanharão os meninos orfãos com a dita esmola e doze pobres com as doze tochas e darão a cada hum pobre seu vintem desmola Mando que se mandem dizer trinta missas em altares previlegiados, em que se tira hu'a alma do fogo do Purgatório, as quais se dirão no mesmo dia que Deus me levar, sendo oras, ou ao outro dia, o mais tardar, morrendo nesta cidade e falecendo for mas mandarão dizer meus testamentrºs, aos quais rogo e peço as farão dizer com a brevidade possivel como neles comfio e encarrego suas conciencias Mando que o dia de meu enterramento sendo oras e não o sendo ao outro dia logo seguinte, se me faça hú oficio hordnrº (ordinário ou missa), co m a esmola, e oferta acostumada, e ao mes outro de nove licõis (lições) e ao Anno outro com suas ofertas Mando que se faca hú frontal de damasco1 branco para o Altar de nossa Snra' da villa de santacombadão, e não avendo damasco branco se fara de cetim2 branco, 1

Damasco é um tecido de seda de lavores, assim chamado porque a invenção veio da cidade de Damasco. 2 Cetim é um tecido de seda, lustroso e macio.


satisfazendo a esmola do que mais valer o damasco, crecendo algu'a cousa da peça farse ha hu'a opa a snra' mando que se de hu' vestido azul a nossa snra' da Piedade de Miranda do Corvo Deixo a minha irmã Felipa de macedo quinze mil re's de minha fazenda per hu'a so vez Deixo a minha irmã frcª (Francisca) Ruiz' outros quinze mil re's da mesma manrª Deixo a meu irmão luis Guomez vinte mil re's de minha fazenda que mando lhe dem pela mesma manrª deixo a meu irmão José Ruiz' vinte mil re's que lhe darão de minha fazenda, e a legitima que me cabe e pertençe de meu pai e mais que tenho na villa de Santacombadão deixo a minha irmã Tomasa ( ou Tomásia) Ruiz' dez mil re's de minha fazenda deixo a minha Prima Maria Guomez quinze mil re's para ajuda de seu casamtº deixo a meu Primo Paulo Ruiz' dez mil re's de minha fazenda, os quais leguados todos se lhe darão a hús e outros, per hu'a so vez depois de vendida minha fazenda, e feita em drº (dinheiro) Mando que nestas primrªs Naos que forem á India depois de minha morte se ma'de' vinte pataqas per pª segura pª que se dem e restitu'ao a hu'a maria botelha que pousava na cidade de goa, ao pelourinho novo, avante dos tintoreiros, que tem hú irmão que se chama d'alvez (À margem: " Satisfeito por mão de Simão do valle d'azevedo em goa1 Mando que se andem nas mesmas Naos mais seis patacas, para que se dem a hu'a frcª Soares moradora em Ormuz2 que tinha hu'a fª (uma filha), que se chamava catona que pousava no tp'o do capitão dom pº porª defronte de nossa Snra' da graca das casas de diogo me'dez (Mendes) de Livrª (he satisfeito na forma assima) Mandarão mais vinte patacas, nas mesmas naos, a bastião (Sebastião) dias destribuidor do paço dos tabeliães para que se lhe dem tendo em sua casa ines filha de Ana gth (?) sendo a menina viva para ajuda de a alimenterem, e sendo a menina morta se dem a sua mai annagth (?) Mando que se escreva a India nestas Primeirªs naos, a domingues Nunez Lapidario, meu procurador que pousa na cidade de goa ao bon Jesu se tem ja sat isfeito com dar hús

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Note-se qu Simão do Vale é o escrivão da Misericórdia de Santa Comba e que terá ido a Goa satisfazer os mandados do testamento. 2 Ormuz é porto situado numa pequena ilha à entrada do Golfo Pérsico. CORTESÃO, História dos Descobrimentos Portugueses.


trezentos sarafins 1 de minha fazenda que la fiqou a hu'a menina por nome inez filha danagth(?) que ficava em casa de bastião diz destribuidor, do paço dos tabeliães que mandei se lhe dessem para ajuda de seu casamtº, e tambem escreverão a dita annagth pª que digua o que pensa nisto, e mando recado, que os não tem dados, pela ordem que deixei, ma'do que da minha fazenda que ca tenho se lhe mandem a India e se depositem em mão de pessoa abonada para com elles se ajudar a casar, e sendo a dita menina morta ou morrendo sem casar se darão cem cerafins a sua mai Ana gh, os dozentos avendo algu'a cousa de divida per assinado meu se paguara, e o que mais remanaçer, se dara a misericordia da dita cidade de goa, e não avendo divida se lhe darão os ditos dozentos çerafins E mando que nas mesmas naos se escreva a India ou a china, exporão frcª Fialho dous fardos de acuquer que lhe faltarão da conta de Jorge Pinto de Lemos que faleçeo na nao vinda da china, de que eu fui feitor que a nao lhe ficou devendo os ditos dous fardos de acuquer e os pode arecadar, per cuja a viaje por oude Fernão dalbuquerque, ou Joan delgado, tao bem deixei per lembrança a meus procuradores em hu testamentº que fiz na India quado me embarquei para o Reino, que do drº meu que la se arecadase, restituissem a dono da viagem que ou avia de ser fernão dalbuqurque ou Joam delguado, cem serafins que lhe podia dever de nossas co'tas Escreverão a domingos Nunes Lapidario meu procurador, em cuja mão fiqou o testamento que fiz na India, que mora em Goa ao bon Jesu, e saibão delle se fez esta restituição acima dos cem çerafins ao dito dono da viagem, senão avisem-no que o faca porque mando se restituão, e não avendo lá drº mandoq' lho mandem chega, para que me desencarreguem minhalma, o que encarrego sobre as almas de meus testamenteiros, e tambem o avisarão que avendo lá algu'a divida minha que sabidamente per assinado meu eu dever que apague e me desencarregue minhalma Escreverão ao dito dominguos Nunez meu procurador, que hu'a moca minha china2 , per nome aninha, que lhe deixei casa a china a qual acho que não a podia vender, que do meu drº torne a tomar per ella o que me deu e lhe de sua carta de alforria, e liberdadde para ser livre Avisarão ao mesmo meu procurador domingos nunez, ou a qualquer dos outros meus Procuradores, tirem hu'a sentenca que ouve contra pº (Pero ou Pedro?) alvez feitor que foi da nao da china, de frcº da silva que importa outenta e tantos Pardaos3 a qual esta no cartorio dandrade do livrª que pousa na Rua de nossa snra do monte na travessa de sa'to amaro, em huas casas terreas de balqão e nela esta obriguado, a paguar a dita contia luis da (?) jenro de frcº dandrade como per ella se vera, arrecadasse delle o dito dinhrº, e com elle e co' o mais que la ouver de minha fazenda me desencarreguem minhalma das cousas que la deixei apontadas no testamento e agora neste declaro

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No documento surgem várias formas como "serafins", "sarafins", "çarafins" e "cerafins" explicadas talvez pelo pouco cuidado do escrivão quando copiou os documentos originais. Serafin é uma moeda utilizada na Índia. MACHADO, Dic. Etimológico. 2 "Uma moça minha china". O testador refere-se a uma escrava a quem deu carta de alforria. 3 Pardau era o nome que se aplicava a duas espécies de moedas na Índia, uma de ouro e outra de prata. MACHADO, Dic Etimológico.


E mando a meus testamenteiros que nas Primeiras naos que forem a India, depois da minha morte, mandem os avisos que neste meu testamento mando, as pªs declaradas nas adicois e verbas delle e drº e tudo o mais que lhe ma'do, mandem pª desencarreguar minhalma do que e'carreguo as suas delles e assimandem nas ditas naos o treslado do autentiqo de todas as verbas deste testamento, que pertence ao que ma'do fazer nas partes da India o qual se entreguara ao dos, diguo ao Procurador dos defuntos a que' peço Peço per merçe, e rogo da parte de D's (Deus) o faca co'prir e desencarregasse minhalma, A minha patente que tenho de quatro annos descrivão de Dio1 dalfandega e todos os mais meus servicos, que tenho feito a sua magde (Magestade) deixo a meu Irmão Joam Ruiz de macedo, em solido indo os elle servir a India, e vendendo ou renu'cia'doo em (?) per Lcª (licença) de sua magde de tudo proçedido e que re'da do dito carrego descrivão da dita alfandaga de Dio e dos mais servicos, partira irmamente a santa misericórdia de Santa Comba dão, tanto hu' como outro, e isto afora a capella que na dita santa casa quero ordenar, o que sera para ajuda e adjutorio da dita santa casa, quanto o que lhe vier a sua parte do dito officio e serviços e outro si o dito meu irmão da sua parte, o que lhe bem vier tirando da parte os guastos que nos requerimentos disto se fizerem Mando que toda a minha fazenda e bens que são escravos, e sedas, e pecas riquas da china e outras mercadorias da India que todas estão em poder do dito meu irmão Joam Ruiz de maçedo dos quais no fim deste farei rol per mim e per elle assinado e dinhrº que tudo tem em seu poder e elle per seu juramento declarara depois de minha morte Cumprão todas as cousas que neste meu testamento mando se fação per minhalma, cheguados e pago tudo e satisfeito e comprido do remaneçente que devem de ser mais de quatro mil cruzados, quero e mando que se venda tudo a mor valia que poder ser e tudo o procedido da dita minha fazenda, se leve a dita villa de santa Comba Dao', em drº, e se depositara na mao' de pª abonada, a prazimentº de meus Herderºs e testamentrºs em hu' cofre de que cada hu' tera sua chave, em duas fechaduras e delle se não tirara Real 2 nem çeitil 3 per necessidade que aja urgentissima sem conssentimento dos ditos meus testamentrºs, pela manrª que ao diante ordenar, os quais meus bens fazenda, todos sem fiquar cousa algu'a, nem vestido nem alfaia de servir, per minima e de pouca valia que seija se venderão pelos ditos meus testamentrºs ou per seus bastantes procuradores e aprazimento de todos arecadando o drº, na forma que nesta adicão acima hordeno Mando quero e ordeno, que paguos como diguo todos meus leguados e minha alma comprida, todo o mais dinhrº procedido dos ditos meus bens que fiquar liquidos e compre em bens de Rai'z foros e rendas na villa de santacombadão e seu termo e em seus arredores ou onde se achare milhor acondicionados e mais livres e rendosos e mais baratos e isentos as quais compras se farão a prazimento dos ditos meus testamentrºs, e sendo acordados e contentes de se fazer algu'a compra depois de conçertados com as 1 2 3

Cidade de Diu. Moeda. Moeda mandada cunhar em homenagem à conquista de Ceuta.


partes se hira tirar o drº do cofre aonde deixo ordenado esse que for necessario pª a dita compra quando se fizer, e doutra maneira não se tirara delle Mando quero e ordeno, que todas as ditas propriedades, rendas, foros que se comprarem, co' dito dinhrº que mando nellas se empregue todo o remanecente dos ditos leguados, sem se guastar em outra cousa, nem empreguar, fiquem em capela e unidas todas juntas sem nunqa se poderem ve'der nem escambar (trocar), nem alhear, em tempo algu' e assi se declara nas escrituras de compras e a foramentos q' das ditas propriedades, rendas e foros se fizerem, as quais co mpras dirão meus testamentrºs, para a dita capela que quero ordenar, para que fiquem unidas e vinculadas a ella como em este meu testam’to ordeno com os encarregos nelle declarados, de manrº que Pela dita escritura conste, serem da capela, e comprados per elles pª ella, como exocutores deste meu testam'to Instituo e deixo per meus erdrºs, e testametrºs nos ditos bens, e nos mais meus que se acharem per minha morte, a meu irmão Joam Ruiz de maçedo e a casa da santa misericordia, da villa de santa Combadão pela maneira seguinte que eles meus erdrºs e testamentrºs, vendão e cobrem a sua mão pela manerª, que fiqa ordenado, toda minha fazenda, e comprida minhalma e paguos todos os mais leguados, como neste mando de todo o monte mor, no mais que fiquar liquido de que mando se compre em foros, rendas e propriedades para que a santa casa da misericordia cobre a metade dos rendimentos, e o dito meu irmão Joam Ruiz de maçedo, cobre a outra metade dos ditos rendimentos, andando as ditas propriedades e fazendas sempre vivas e sem deminuição algu'a e sem se podere' alienar nem escambar cousa algu'a em tpo' algu' pela dita santa casa per necessidade que aja , nem o dito meu irmão, pera que dos ditos rendimetºs dellas se me cumprão os encarregos da dita minha capella que quero se me faça na dita casa da mia' (misericórda) Mando que se me faça hu'a capella de Santo Antonio, na santa casa da misericordia da villa de santa combadão donde sou natural na parte e luguar da casa que milhor e mais decente for e parecer aos Snrs Provedor e cabido da santa casa, comparecer de meu Irmão Joam Rui'z de maçedo outro si meu erdrº e testamentrº que a tudo quero que assista e se fara per sua traça e ordem, na qual capella quero que se guastem ate cem mil re's em se fazer e se fara a dita capella com seu arco de pedraria, e com seu altar e com seu retabolo de madeira, com seu nicho em que esta a imagem do bem aventurado Santo Antonio todo mui bem forrado e gurnecido, e pintado o retabolo e imagem e no Principio do arco, ou na parte onde mais decente for se Pera hu' letreiro pintado com letras grandes que digua cuja e a capella e quem a mandou fazer, e institoio e quem he seu administrador, o qual sempre se chamara Varella, e a obriguação que tem de missas, e a fabriqua Mando que a santa casa da dita misericordia que instituo em a metade dos bens e propriedades que ma'do se comprem pera a dita capella da sua parte dos ditos bens seija obriguada a fazer e fabriqar, a dita capella e reparaila de todo o necessario, e se for no estado que mando se fara e dahi per diante ate fim do mundo sera obriguada a dita santa casa, dos rendimentos da metade das ditas propriedades que logo se partirão entre ella e o dito meu irmão a administrar, a dita capella de toda a fabriqua e ornamentos


necessarios, de frontal de vestimentas e caliz (cálix), pondolhe hu' frontal e vestimenta de cetim, de cor acabado e guarnecido, muito bem cada vinte anos, hu', de manrª que sempre o Altar esta ordenado, e assim e pera hu'a alampeda, de metal na dita capella que se ascendera todos so dias santos, e no dia do bem Aventurado Santo Antonio e vespera estara accesa todo o dia a dita alampada, e assi mais me mandara dizer a dita santa casa, minha erdrª na metade dos ditos bens, e testamenteira dos ditos rendimtº delle de me manda r dizer na dita minha capella, hu'a missa officiada cadano em dia do be' aventurado Stº Antonio para sempre dos sempres enquanto o mundo durar, com seu responso no cabo da missa, e do mais remenecente que lhe fiqar de fabriqa e ornar a dita capella, e mandar dizer a dita missa, despesa e repartila pelos pobres e necessitados da santa casa, mais necessitados com o parecer aos snors provedor e irmao's que Pelo tpo' ao diante forem, contanto que seja o que se guaste som'te e rendim'to da metade da dita fazenda, que lhe deixo, fiquando se'pre inteiras e inviolave's, as ditas propriedades a dita capella sem se poderem alienar Mando a meu Irmão Joam Ruiz meu testamentrº que faça fazer a dita capella aos snor' Provedor e irmãos da dita santa casa, da misericordia minha erdrª, e testamentrª, assi e da manrª que mando se me fara fazendo a guarnecer e Pintar tudo mtº bem ate se g uastarem os ditos cem mil re's que se darão loguo pera isso aos irmãos e provedor da dita santa casa do drº que se achar amoedado ao tpo' de minha morte e não o avendo o primrº que se fizer de minha fazenda o que fara fazer começar e acabar, do dia do meu falecimento a hu' anno a custo da metade da minha fazenda que deixo a parte da dita santa casa, e não a fazendo nem ornado no dito anno e tpo' nem comprido com a obriguação q lhe mando, hordinaria e deixandoa denifiquar o dito meu irmão possa sem mais ordem lançar mão da dita fazenda e unila a sua metade comprindo com a obriguação que a dita santa casa he obriguada para sempre porque per assi o não comprir, o privo da dita erança, e administração, e quero, que por esse so efeito o dito meu irmão a aja in solidú (na totalidade) Mando a meu irmão Joam Rui'z de macedo ao queal instituo em a metade dos ditos bens, que se acharem liquidos, depois de pagos meus leguados e comprida minhalma, que dos rendimentos da dita sua parte que lhe deixo me mande dizer na dita minha capella de santo Antonio que instituo e ordeno e mando se me faça na dita santa casa da misericordia da dita villa de santa Combadão, duas missas rezadas cada semana húa as chaguas, e outra de requiem com húa comemoração ao ben aventurado Snto Antoº e a nossa snra' na missa das chaguas, e na de requiem duas comemoracõ is hu'a pelas almas do fogo do purgatorio, e outra per meu pai e mais as quaiz mando se me diguão cada somana na dita capella com seu responso no cabo da missa, pera sempre dos sempres emquanto o mundo durar, e assi me ma'dara fazer na dita minha capella, cadano per dia dos finados ou per todo seu outavas hu' officio ordinario de quatro padres com a offerta que parecer ao dito meu testamentrº, com seu responso, isto cadano para sempre per minha alma, e de meu pai e mai e não comprindo o dito meu irmão e seus sucessores que na dita capella e ben's sucederem, com esta obriguação, per hu' ano mando que a dita santa casa lance mão e tome os ditos bens, unindoos a outra sua metade e ma'darmeha dizer as ditas missas e officio da maneira que mando ao ditto meu irmão o mande dizer, de manrª que não cumprindo qualquer dos ditos meus testamentºs com a obrigua ção que tem da dita minha capella o outro que comprir tome e possua todos os ditos bens e seija in solidum administrador da dita capella


Mando que tanto que minha fazenda for ve'dida, e comprador do procedido della, as propriedades, rendas e foros, da manrª e pela ordem que ma'do se faça, logo se partão entre a santa mia' e o dito meu irmão, meus testamentrºs, e erdrºs, pello meio fiquando tanto a hu' como a outro, e cada hu' comprira dos rendimtºs da sua parte o que mando, e lhe encarreguo, e dahi per diante nunca jamais se poderão partir, nem dividir, nem alhear, e sempre andarão conjuntos et unidos a dita minha cappella, e obriguaco is della et a metade que tem santa misericordia, sempre andara nella e administrara a dita cappella e comprira com a obriguacão que lhe mando e o remanecente do que render cadano destribuira pelas necessidades da casa, e pobres como parecer aos snors' Provedor e cabido della, avendo per em respeito aos pobres meus parentes se os ouver, viuvas e orfãos, e enfermos, e peregrinos, que mtº lhe enco mendo A outra ametade que cabe e deixo a meu irmão Joam Ruiz de macedo, do procedido dos dito bens sempre andara nelle e per sua morte, vira o seu fº ou filha mais velho, preferindose sempre o macho a femea, o qual elle per sua morte nomear, e assi hira dahi per diante, e andara em seus decendentes ate fim do mundo, se os ouver, e não ave'do, filho nem filha, nem descendente do dito meu irmão sobcedera nos ditos bens e cappella, o meu parente mais chegado, dos rendimentos dos quais bens comprirão o dito meu irmão e seus sobcessores com as missas e officios que lhe mando se lhe diguão, na ditta minha cappella, da qual serão administradores, sob as penas em este meu testamento conte nelas e do mais remanecente farão o que lhe bem vier, não podendo nunqua vender partir nem alhear, os ditos bens que quero que andem sempre unidos a hu'a so pessoa a qual sempre se chamara Varella per memoria de quem inst ituio a dita cappella Comprarsea hu' livro muito bem encadernado no qual se farão tres titulos per mão do escrivão da sa'ta casa da misericordia em hu' dos quais se escrevera o drº que rendeo minha fazenda, e o que se paguou de legados e o que fiqua liquido para se fazer a cappella, e comprarem os bens e rendas que mando para administração e fabriqa della E em outro titulo do dito livro se tresladarão todas as escrituras autentiquas per tabelião pubrico e concertadas com as proprias das co mpras das propriedades, foros e rendas que se fizerem com o dito drº pª a dita minha cappella Em outro titulo do mesmo livro se escrevera a partilha que se fez das ditas propriedades entre a santa casa da misericordia e o dito meu irmão, meus erdeiros e testamentrºs em que se declararam as peças que fiqão a cada hu', e de que hão de comprir cada hu' com sua obrigacão que lhe mando feitas pelo escrivão da dita sa'ta casa, e o snor' provedor e irmãos que servirem na mesa e pelo dito meu irmão e assinadas per todos sendo muito declaradamente, o qual livro fiquara no cartório da dita santa casa, per tombo da dita cappella pera sempre pª a todo o tempo se saber, quais são as propriedades, e rendas que são obriguadas aos encarregos della e se fazerem comprir a meus tetstamentrºs, e subcessores e peço aos visitadores que quando vierem visitar o bpto vão ver a dita minha cappella, e acha'do que não está ornada de frontais e vestimentas e cortinas e do mais, ou que se me não cumpre com obriguação que tem e mando, o fara cumprir com tudo e repairar, do que levara seu selario a custa de qualquer de meus testamentrºs e administradores que achar faltas no comprimento de sua obriguação, e peço outro si a


meu irmão Joam Ruiz de macedo que faca outro livro que tenha em sua casa e deixe aos subcessores, e administradores que pello tempo em diante forem, da dita cappella em que lançe outro si todas as escrituras, e partilhas pela manrª acima dito, para tombo della autentiqo como nelle confio Porquanto todos meus bens ou o mor Parte delles estão em fazenda que se ha de vender, quero e mando que do drº que ouver, se cumpra logo minhalma, e se me fara a cappella, e não avendo drº, se venda logo o que para isso bastar e os mais leguados se cumprirão assi como se for vendendo porque não quero nem he minha vontade, que se queime a dita fazenda e se venda mal, et se defraude co m isso a dita cappella, do que carrego as conciencias de meus testam'trºs Porquanto mando se facão muitas cousas que hão de hir ainda e ca se hão de comprar Propriedades pª a cappella o que não se podera fazer dentro de hu' anno quero que deste meu testamento se não tome conta dentro de tres annos, dentro dos quais mando se cumpra tudo a contendo nelle Mando que as missas e officios qu ma'do se me digão na dita minha cappella, se diguão na dita santa casa da misericordia enquanto a cappella se fizer, e não for acabada, as quais se começarão a dizer do dia que D's for servido levarme per diante loguo naquella somana seguinte Porquanto se acha devaguar na beira foros et rendas como ma'do comprar, enqua'to se não comprarem se Parecer bem a meus erdrºs, et testamentrºs que se de algu' do dito drº ao guanho per contrato licito e seguro sem perda a pªs seguras co' boas fianças se lhe podera dar para que da sorte principal se não deminua nada e se empregue tudo tudo o que não sera cousa de deixar de empreguar, tudo nos ditos tres annos, nas ditas propriedades e querendo o dito meu irmão trazer a sua metade que lhe pertençe os ditos tres annos, dando fiança como digo de os empreguar, e empreguandoos nas ditas propriedades nos ditos tres annos se lhe dara et ira comprindo com sua obriguação et farseão as ditas compras da manrª que acima deixo ordenado per consentimento de meus testamentrºs, et essas clausulas que mando se farão nas escrituras Tenho dito a meu irmão Joam Ruiz de mecedo, meu testamenteiro, que faca algu'as restituicois que lhe tenho mandado fazer, em segredo, pelo que lhe ma'do as faça de meus bens, do monte mor, et o que elle por seu juramento jurar que deu, pello que sera crido quero que se lhe leve em conta ate contia de quarenta mil re's somente, em hu'a cousa que disse desse per minha Parte, et meu mandado et outro si sera o dito meu irmão per seu juramento, sem mais prova de todo o drº que disser que mandou a India, que mando se mande e se levara em conta conforme as adicõis que mando neste meu testamento se mande a India e a outra cousa não Deixo a Antonio dandrade quatro ma'teos de caça novo não deixa estes ma'teos Deixo a Guiomar Carvalha filha de filicio Roiz com a qual estava concertado de casar, o fato novo que lhe ma'dei fazer pera ella, e a cadea (fio de ouro?) de quarenta mil re's que se lhe comprou et o escritorinho, com os brinquinhos que tem britis fez que tudo tem em


poder, et o mais fato q' tiverem meu em seu poder, et tudo o mais mando que se lhe peça et que se entreguem a meus testamentrºs, tendo mais alg'ua cousa minha em seu poder Mando que se me digua hu trintairo 1 de sa'to amador na villa de Santa combadão Mando que querendo meu irmão Joam Roiz algu'as peças do meu fato pello que valerem, e pela avaliação se lhe dem pelo tanto, que outrem der paguando a valia dellas logo como qualquer outra pª et de todo meu fato e bens e fazenda o dito meu irmão fara inventairo na dita villa de santacomba per seu juramento, de tudo declarado tudo o que fiqar per minha morte Declaro que em Poder de gcº (Gonçalo?) guomez meu Primo, esta hu' escravo meu per nome dominguos cos da china de idade de quatorze annos, o qual se o lhe quizer ma'do se lhe de, per vinte mil re's que paguara a minha fazenda, os mais se venderão Porque esta he a minha Ultima e deradrª vontade, assi quero que se cumpra e faca tudo depois de minha morte, inteiramente como neste meu testamento ordeno, et mando, o qual quero que valha et tenha força e vigor em juizo e fora delle, como testamtº et como codicilho na milhor via e forma que posso quero que valha e tenha vigor, et per elle confirmo quaisquer codicilhos que no diante fizer, et revoguo todas e quaisquer testamtºs cedo las et codicilho s que tiver feitos ate oje et este so quero que valha, se guarde et tenha força e vigor et outro nenhú não, o qual roguei et mandei ao Ldo (Licenciado) Diogo antunes escrevesse per mim et assinasse co mo testemunha per estar doente e não poder escrever, e eu anotei et ditei e li despois descrito, et ditado estando em meu perfeito juizo et entendimetº qual nosso Snor' me deu e per estar a minha vontade et ser verdade ser esta o assinei e afirmei, de meu sinal et u Lº Diogo Antunes da Costa natural do Concº Tábua ora estando nesta cidade de Lxª que este fiz et assinei como testemunha a rogo do dito Antº Varella Rangel, testador em a cidade de Lxª et pousadas do dito testador na Rua do spirito Stº aos nove dias do mez de dezembro do Anno de Nosso Snor' Ih's xpo de mil et seiscentos e tres annos, escrito em sete meas folhas com esta sem vicio nem borradura que duvida faça Mando mais que o dia do meu enterrametº me levem, de oferta com meu corpo por minhaalma, dous sacos de trigo et hu' odre de vinho Declaro que onde digo que meu corpo seja enterrado no mosterº da santissima trindade et me acompanhem os padres, aos quais deixo dez cruzados desmola quero se lhe dem aos ditos padres dez mil re's desmola e serão obriguados a darme sepultura na crasta (claustro) do dito mostrº onde os Padres se enterrão et me darão o habito com que me enterrem, e me acompanharão todos e per isso lhes deixo os ditos dez mil re's desmola per hu'a so vez Declaro que os tres officios que mando se me fação, por minhalma assi o do enterrametº, mes e Anno seijão de nove licois com seus responsos no cabo sobre minha sepultura, que estara coberta, et com seis tochas derredor enquanto se fizerem os ditos 1

Ou trintario. Exéquias no 30º dia do falecimento; grupo de trinta missas, ditas por trinta padres num dia ou em trinta dias por um padre.


officios, et se ofertara cada officio com hu' saco de trigo e hu' odre de vinho, et hu carnrº (carneiro), et hu'a duzia de gualinhas et suas ca'deias et o mais se paguara aos padres como he costume et Posto que diguo que no fim deste farei rol per mim et meu irmão assinado, do que me fiqua não o faço porque o dito meu irmão tem tudo em poder o qual per seu jurametº fara inventairo de tudo o que fiquar per minha morte, et eu et elle o faremos de fora per assinado nosso, et porque de tudo isto sou contente et he a minha ult ima et derradeira vontade, fiz mais estas adicõis para mais clareza que tudo se fez per verdade et tudo vai duma letra e pena somente os emendados et acrescentados e entrelinhas et pagina atras et esta que vai doutra tinta e pena e per verdade ma'dei fazer et declarar, assi tudo isto, et assinei lecenciado, que tudo escrevi per seu mandado e a seu rogo et assinei no dito dia, mes et anno, acima declarado de mil e seiscentos e tres ann os, aos nove dias do mes de dezembro da dita era et em sua casa, et presença et per sua nota que elle vio et leo, Antº varella, diogo antunes da costa Aprovação Saibão quantos este estromento daprovação virem que no anno do nascimtº de nosso Snor' Ihs' xpo de mil et seiscentos e tres annos, aos dez dias do mes de dezembro na cidade de Lisboa, junti a Igreja do sperito santo da pedreira nas casas da morada de Antº varella Rangel estando elle presente deitado em cama doente da doença que nosso Snr' foi servido dar lhe, mas em todo o seu juizo et entendimetº segundo o parecer de mim tabelião, et das testemunhas abaixo escritas, logo a de suas mãos as de mi tabelião, perante as testemunhas me foi dado esta cedula de seu testamento dizendo que era sua et que lha fizera Diogo antunes da costa, et que depois de feita lha dera et estava a sua vontade et portanto aprova et r etifiqua et ha per boa, bom et verdadeiro, digo ha per seu bom et verdadeiro testamento, et ult ima vontade, e quer que se cu'pra em todo como nella se contem, testemunhas que foram presentes chamados e roguados per parte delle testador, Diogo antunes da costa que a dita cedula fiz et o Ldº Cristovão Cordeiro freire morador na villa da Redinha, e capitão della, ora estando nesta cidade de Lisboa, et frcº Marques capatrº (sapateiro) morador a hi junto et lopo (Lopo ou Lobo) guomez alfaiate, morador ali junto et antónio da cunha alfaiate morador na dita rua, que todos disserão que bem conhecião ao dito testador, ser o proprio que presente estava, et esta aprovação assinou per sua mão, eu frcº fagundes tabelião pubrico per el Rei nosso Snor nesta cidade de Lisboa que este estrome'to da Provação fiz et o asinei em Pubriquo, Declaro eu Tabelião que esta ce dula esta escrita em outo meas folhas de papel, com que comei esta aprovação António Varella; Lopo Guomez, Frcº Marques, antº da cunha, cristovão cordeiro freire, Diogo antunes da costa, Pagou mhil. Abertura do testamento O Ldº (Licenciado) Dioguo Soares, cidadão e juiz do civel desta cidade de Lisboa et seus termos (...) faço saber, aos que esta certidão dabertura detestamento virem et o conhecimento della co m dereito pertençe r que o escrivão que esta subescreveo me deu fe que elle abrira o testametº atras escrito de Antº varella Rangel, que se diz ser já falecido, da vida presente o qual vinha cerado e lacrado et cosido ao redor co' hu'a linha


branqa, o qual esta aprovado per frcº fagu'des tabelião pubrico de notas, desta cidade, o qual testamento, esta escrito em outo meas folhas de papel comado estromento daprovação, em que se começou esta certidão, o qual testamento trazia hu's concertados com deferente tinta, que dizem, Rangel, cera, fo's, giados, hu'a, et, se, et hu' acrescentado que diz solamente , confirme as adicõis que mando neste testamento, se ma'de ha India et em outra cousa não e assii mais estava no dito tetamtº hu'a entrelinha, que diz santa misericordia o qual testamento não trazia outra entrelinha, borradura nem risquado, que duvida faça que tudo mais esta limpo de que mandei passar a presente per mim assinada feita em Lisboa aos treze dias do mes de dezembro de mil seiscentos e tres annos, pagou desta quarenta re's e quatro dasinar, eu miguel couçeiro os subescrevi; Diogo Soares o qual testamtº eu sobrediti bras frcº, tabalião pubrico et judicial per el Rei nosso snor', em a dita villa de santa Combadão, et seus termos, tresladei do proprio testametº do dito António Varella Rangel, per virtude do despacho do dito manuel diniz Ruiz bem et verdadrªmente o qual concertei este treslado et com o escrivão abaixo assinado et vai tresladado tudo da minha letra em dezassete meas folhas com esta et hu'a branqua adiante sem entrelinha, nem risquado que duvida faça em este estromento, que assinei em pubrico q' talhe,// monta este em vinte e dous re's per ba'da quinhentos e dous re's -, concertado, Simão de Vale Certefico Pello juramento dos santos evangelhos que recebi que a letra e sinal pubrico do estromento atras e acima escrito he de bras frcº tabalião na villa de Santacombadão que oje em dia serve seu officio per verdade fiz e assinei esta em Lisboa a vinte e hu' de Junho, de mil e seiscentos e cinquo bast ião denis (Sebastião Dinis) O Doutor Antonio dinis do conselho desta fazenda de sua magde juiz das justifacaçõis della et todos que esta certidão virem faço saber que o estrometº atras escrito ao pe do qual começa esta certidão ser feito e assinado em pubrico per bras frcº tabalião na villa de santa combadão pelo que hei per justificada a letra et o sinal pubrico do dito estrome'to vista a certidão de registo ao pe do dito estrome'to pelo qual, se justifiqua de que mandei passar a presente per mim asinada Sebastião denis a fez em Lisboa a vinte e hu' de Junho de mil e seiscentos et cinquo// Paguou quarenta re's, e dasinar quarenta// E eu Andre maçhado a fiz escrever - reconhecesse o reconhecimetº de sebastião diniz// Antonio diniz - eu Simão de Vale escrivão desta casa neste anno de seisce'tos e seis (...) escrevi e assinei neste treslado do proprio testametº e assinei Simão de Vale Rendimento da Fazenda Titulo da fazenda que se vendeo em lxª pelo padre Joam frº e frº guomez, como procuradores da casa da mia' com Joam Ruiz de macedo, irmão et erdrº dodito defunto, aqual fazenda estava nos caixois em casa de frº de guouvea que mora junto da igreija dos Martires et comecarão de vender aos trinta dias do mes de março de mil et seiscentos e quatro as pecas seguintes Item, Dezasseis paos daguila1 que pesarão onze onze arrate's2 menos duas oncas3 , a mil et quinhentos re's cada aratel, somou dezasseis mil et trezentos e quarenta re's 1 2 3

Paus de Águila são pedaços de madeira aromática da Ásia. MACHADO, Dic. Etimológico. O Arrátel é um peso correspondente a 459 gramas. Onça é um peso correspondente à décima sexta parte do arrátel.


Item, Sete Rodelas, cada hu'a per mil et duzentos re's somou outo mil et quatrocentos Item, tres boes hu' de percolana (porcelana) et dous verdes por mil re's Item, tres percolanas grandes como alguidares Duas sãs et hu'a com um borcelo fora por dous mil re's Item, Hu' pedaco de dente dalifante aratel et sete onças per trezentos re's Item, outro pedaço de pao que chamão arabatega1 por quinhentos e vinte re's Item, dezanove percolanas de pratos grandes por trezentos e vinte re's cada hu'a somou seis mil e outenta re's Item, tres saleiros da mesma percolana duzentos re's cada hu' somão seiscentos re's Item, duas gualhetas et dous pirez por trezentos et vinte re's somão Item, dous taboleiros da china por cinquo mil et outocentos re's Item, Hu' forno de cobre por setecentos re's Item, Hu's calcois ou ceroulas braquos por hu' cruzado Item, quatro calcois brancos como estes novos somão mil et duzentos re's Item, Hu'a corja2 (18) destas mesmas ceroulas que são vinte, a trezentos re's cada hu'a somão seis mil re's Item, Quatro ceroulas destas pelo mesmo preço somão mil et duzentos re's Ao Pelourinho Velho3 Item, Hu'a jaqua4 com o alfanje5 por novecentos re's 1

Arabatega.Sobre este termo encontramos o mais parecido que é batega. É oriundo do Árabe e quer dizer melões. Sendo a referência feita a um pedaço de "pao" ou pau, madeira portanto, estamos em crer que estes melões seriam fruto de uma planta diferente daquela que produz os nossos melões. Em MACHADO, Dic. Etimológico é citado um documento: "a mata destas patecas he muyto diferente da que dá os melões de Portugal (...) " 2 Corja, na sua significação originária e Indo-Portuguesa é o nome do número vinte na contagem, é vintena de objectos da mesma natureza. MACHADO, Dic. Etimológico. 3 "O Pelourinho Velho era praça com 44 metros de comprido, de norte a sul, e 33 de largura. No ano de 1650, João Nunes Tinoco, arquitecto de D. João IV, assim o mostrou na planta de Lisboa. Desembocavam nessa praça a Rua de Ver-o-Peso, Rua Nova, Rua da Prataria e Rua de D. Gil Eanes. Neste Largo havia várias mesas com os apetrechos de escrita e em frente de cada uma estava um escrivão, pronto para fazer requerimentos cartas ou qualquer documento que o povo ia encomendar-lhe. (...). VIDAL, – Idem. 4 Espécie de jaqueta. 5 Sabre de folha curta e larga.


Item, Hu' gibão1 de tafeeira2 usado por seiscentos re's Item, Hu's calcõis tafeeira mouriscos por seiscentos et cinquenta re's Item, Duas ceroulas branqas por outocentos re's Item, Hu' gibão de tafeeira já usado por quinhentos e quarenta re's Item, Hu' gibão de cetim já usado por mil re's Item, Hu's calcois mourisqos et roupeta de tafeeira novos per dous mil et outocentos et cinquoenta re's Item, Outras ceroulas mourisquas por seiscentos et cinquoenta re's Item, Outros calcois doutra cor da tafeeira per novecentos et cinquoenta re's Item, Outros calcois de tafeeira novos, per mil re's Item, quatro esteiras3 por mil et quatrocentos re's Item, Dous pavilhõis (tendas) caraças et dosinde (dossel?) per onze mil re's Item, Hu' alquife (alquife ou será alquicé?) vermelho com suas percintas (precintas) et cordão e pião per seis mil re's Item, Hu' cabide da china que tinha cinquo peças per dous mil et outocentos re's Item, Hu' arco et aljava com suas setas per novecentos re's Item, Dous calcois et hu' gibão et hu'a roupeta de tafeeira rouxa, et outrs calcois et hu'a roupeta de tafeeira doutra cor, listrada tudo per quatro mil et quinhentos re's Item, tres azaguajas4 da china per mil et quatro ce'to re's Item, Hu's calcois velhos como ceroulas per duze'tos re's Item, Hu' catore (catre, cama) dourado da china, et hu' pavilhão de los verde, com o capelo de veludo lavado de bastidor, et cinquo paineis da china per cuare'ta e outo mil re's Item, O negro que se deitou da gamela et se mangau dez mil re's

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Vestidura antiga que cobria os homens desde o pescoço à cintura. Tafeeira ou tafieira é uma espécie de chita da Índia. Tecido de junco. Azagaia. Lança curta de arremesso.


Item, Hu' farragoulo 1 da India per quatro mil re's Item, Hu'a peça de tafeeira per dous mil re's Item, duas percelanas cubertas per seis çetos re's Item, quatro pares de capatos Hu' cruzado Item, Hu'a canastra velha da India quatro cetos et setenta re's Item, Quatro peças de percelana irmãs dos pratos a trezentos et vinte como os mais somão mil et duzentos et outenta re's Item, pagou hu' mercador da Rua nova2 quinze mil re's perque devia trinta, conforme a hu´ conhecimento que tinha Joam Ruiz Item, Vendeose hu' negro per nome Pedro per vinte et cinquo mil re's Item, Doze guardanapos et duas toalhas da India tudo por seis çe'tos et quarenta re's Todas estas peças fora' vendidas em prese'ça de nós todos três acima declarados em certeza do qual todos aqui assinamos Joa Fcº, Joam Ruiz, Frcº Guomez fazenda q' ficou nos caixois Rol et declaração das peças que fiquão no caixão meão que foi de Antº varela o qual faço eu Joam frº, escrivão da misericórdia em presença de Joam Ruiz de Macedo erdrº, et de frcº Guomez aos outo dias de abril de seiscentos et quatro, os quais no fim assinaremos todos Estes apontamentos que se seguem et os que fiqão atraz todos foram tresladados do livro do Padre Joam Frª o qual fez sendo escrivão da casa Item, Primrªmente fiqua no caixão, hu' cobertor de veludo verde lavrado de bastidor, et juntamente fiqua hu' meio travesseiro, et duas almofadinhas do mesmo feitio Item, fiqua mais hu' meio travesseiro de velludo cramesim3 et duas almofadinhas, do mesmo guarnecidas douro 1

Capote de mangas curtas. "A Rua Nova foi foi aberta no ano de 1310. Ali se encontrava quanto de melhor e mais elegante havia na época. Riquíssimos estabelecimentos a ladeavam e depois da descoberta da Índia não haveria nos países europeus outra rua que lhe fizesse inveja. As sedas e porcelanas da China e do Japão, preciosos charões, objectos de adorno vindos daqueles povos, tão admiráveis no bom gosto e perfeição dos seus objectos de arte, deslumbravam os olhos dos transeuntes. Toda a élite da sociedade pretérita se reunia na Rua Nova (...)".VIDAL,Lisboa Antiga e Lisboa Moderna. Tal era a Rua Nova, cujo local, em parte é ocupado pela Rua dos Capelistas. 3 O mesmo que carmesim. Cor vermelha muito viva. 2


Item, fiquão mais dous travesseiros de velludo verde de hu'a parte, et da outra de velludo cramesim Item, fiquão mais duas co lchas branquas prespontadas Item, mais duas alcatifas, hu'a de o dias et outra deleguara Item, Hu'a mant ilha de velludo verde lavrado de bastidor Item, fiquão quarenta peças de safita branquo Item, trinta e cinquo touquilhas de veos Item, dous pares de luvas dambar preto Item, cinquo pares de meas de seda, dous novos e tres já trazidos Item, hu' pedaço de dente dabada1 Item, hu' leitor pe de sinete2 Item, hu' rosairo de cavalo marinho 3 Item, hu' pano atado com treze pedras bazares4 como azeitoninhas, mais que comuas et hu'a grande que pesou seis outavas et mais hu’a cant idade pouqa de outras quebradas et de pouca valhia por serem muito meudas, et dous papes dalmisquar 5, et outro papel com outra cantadade de granadinhas6 pouca cousa et valhia tudo isto fiqua atado junto Item, fiqua hu'a caixinha da china com vinte et dous tintos pera as barbas Item, fiqua outra quaixinha da china et outra bra'qua Conta da roupa branqua nova Item, camisas trinta e cinquo as cinquo de guarnição

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Do Malaio "bádaq". Rinoceronte. MACHADO, Dic. Etimológico. De notar que MACHADO faz referência a um texto escrito por volta de 1605, o que torna a referência no presente documento mais antiga cerca de dois anos. 2 Utensílio com assinatura ou divisa gravada. 3 Rosairo poderá querer dizer porção ou quantidade. Cavalo marinho era o nome pelo qual era conhecido o Hipopótamo. Significará a expressão quantidade de pele de Hipopótamo(?) 4 Pedras Bazares era o nome pelo qual era conhecido uma concreção calcárea formada em várias partes do corpo de certos quadrúpedes. Pedra usada contra a peçonha, de cor verde. MACHADO, Dic. Etimológico. 5 Substância aromática segregada por ruminante asiático, que tem sobre o ventre uma bolsa donde se extrai o almíscar. É muito utilizado em perfumaria; antigamente atribuíam-lhe efeitos medicinais. Actualmente o animal que o segrega está em vias de extinção. 6 Pedras finas de cor arroxeada.


Item, lancois vinte et dous Item, toalhas de mesa outo Item, toalhas daqua as maos trinta e seis Item, guardanapos carenta et tres Item, traveseiros quatorze Item, almofadinhas vinte Item, ciroulas quatro novas, et sete já lavadas afora as vendidas Item, Duas touquas mourisquas de seda Item, Dous Piois dourados de pavilhão Item, Duas peças de cacha Item, fiquão mais quatro peças de tinta das barbas Rol do caixão Piqueno Item, hu' vest ido de chamalote1 de seda diguo guorguorão s. capa roupeta et calcois, et gibão de tafeta lavrado Item, hu' vestido de pano verde fino s. capa roupeta, capa bandada et apassamanada2 Item, hu' roupão de cor passamanada com sua gualteira Item, hu'a capa de chamalote preto, afeição da India vendida Item, Dous cacois et duas roupetas novas de tafeeira Item, hu's calco is et roupeta et gibão de mitão Item, tres gibõis de tafeçira usados Item, Outro gibão branco de caraça usado Item, quatro pares de capatos Item, Hu'a camisa et travesseiro et toalha de mãos usada, et dous coletes usados

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Tecido de lã de camelo. Passamane. Certo tipo de tecido.


Rol do qaixão grande Item, fiquão quinze peças de volante Item, trinta e tres peças de lins Item, vinte e cinquo peças de çetim Item, noventa et duas peças de touquilhas tudo isto branco Item, fiqua toda a seda como esta declarada no inventairo sem se bolir nela Fato que fiqua de fora dos caixõis Item, fiqua hu' cabide grande da china dourado Item, hu'a espingarda com sua mangua1 Item, fiqua em poder de Joam Ruiz, dezanove peças de percolanas todas de tigelas grandes e piquenas Item, outra espinguarda Item, Hu'a espada Item, Hu'a canastra da India encourada - ve'dida Item, Onze canas de benguala2 Item, Hu' almo fariz Item, Hu'a bacia Assinamos aqui todos, Joam Ruiz de Maçedo, frcº Guomez, Joam Frª Aos nove dias do mes de Majo de mil et seiscentos et quatro annos, na casa do cabido desta santa casa da Mizericordia em presença de Guomez frcº provedor da dita casa et dos mais irmãos abaixo assinados se tomou conta das adicõis atrás escritas as quais fazem em conta cento et noventa mil et quatroçentos et sete'ta convem a saber que eu Joam Frª recebi destes em Lxª cento et cinquoenta et quatro mil et outocento re's et Joam Ruiz de Maçedo, recebeo deles vinte e outo mil et duzentos re's et Frcº Guomez da Igreija recebeo sete mil quatrocentos et setenta que tudo hu' et outro que' recebemos os sobreditos faz a dita soma de cento et noventa mil et quatrocentos et setenta re's, salvo milhor conta, se a ouver de hu'a et de outra parte, et porque eu dito Joa Frª, recebi os ditos cento et cinquoenta et quatro mil, et outocentos re's, os entreguei em presença 1 2

Onde se guarda a espingarda. Canas de Bengala. Canas da Índia.


do dito provedor et mais irmãos et do dito Joam Ruiz de Macedo de que me derão quitação per todos asinada no mesmo dia et em certeza de tudo mandarão fazer este termo pelo qual fiquão obriguados os ditos Joam Ruiz et Frcº Guomez a dar sat isfação da cópia que receberão e asinarão todos et eu Joam Frª o escrevi, O Provedor Guomez Frª, Joam Frª, Joam Ruiz de Macedo, Frcº Guomez, Manuel Guomez, x'qvâo Frª Leitão, Antº Joam, Pº Guomez, Simão Joam, Simão Frcº Conhecimento que fez Joam Ruiz de Macedo em como se entreguava dos caixõis Diguo eu Joam Ruiz de Macedo que me entregueis e estão em meu poder os tres caixõis que estavão em Sam Francisco desta cidade de Lxª dos quais tomo entrega et me obrigo a dar conta de toda a fazenda que nelles esta conforme os inventairo que fizemos Joam Frcº escreveu depois da primª venda que fizemos nesta cidade e por este me obrigo a entreguar tudo o conteudo no dito inventairo, que esta por nos ambos assinado, em lxª a quinze de Julho. 605 Joam Ruiz de Macedo o que levou Joam Ruiz de Macedo que fiqou fora dos caixõis Item, Hu'a espinguarda Item, Hu'a bacia Item, Hu' almo fariz Item, Hu'a espada Item, sete canas de benguala Do que rendeo toda esta fazenda (que ficou nos caixõis) Item, O que rendeo toda esta fazenda atrás escrita vendida pello s ditos Joam Ruiz de Macedo e Frcº Dias e assinarão ambos no cabido todas as adicois atras et adiante como tudo consta do livro de Frcº dias Procurador da casa Item, A seda bat ida de lamquin 1 q' são cincates 2 cmº a tres mil e duzentos re's o cate soma trezentos et vinte e hu' mil e seiscentos r'es Item, A seda de cipeo q' são quarenta et nove cates vendida a dous mil et duzentos re's o cate soma cento e sete mil et outocentos re's Item, O retros3 q' são trinta et tres cates cmº vendido a dous mil et seiscentos re's so ma cento et noventa e hu' mil re's et cem re's Item, tres corjas de lin's et cetins menos hu'a peça foi vendida a corja a sesenta mil re's soma cento e setenta e sete mil re's 1

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Lonquim. Tecido de seda usado sobre o corpo. Cinco cates. Cate é peso usado na Malásia e na China. MACHADO, Dicionário. Etimológico. Fio ou fios de seda torcidos.


Item, Duas corjas de tafeta a quarenta mil re's a corja, soma outenta mil re's Item, seis corjas de veos menos duas peças a quarenta mil re's a corja soma duzentos et trinta e seis mil re's Item, Treze volantes a outocentos re's a peça soma dez mil et quatrocentos re's Item, Alem do acima declarado derão os mercadores que o sobredito comprarão mais quarenta mil re's mortos Somão estas adicõis atras Hu' conto ce'to e sesenta e tres mil e novecentos re's A fazenda conteuda nas adico is atras pellos preços nellas declarados, vendemos a Fernão Gth, e dioguo j. e Pero lopez mercadores na rua Nova com mais os quarenta mil re's mortos, conteudos na outava ultima adição o que tudo faz em soma com os ditos quarenta mil re's mortos hu' conto e cento e setenta e tres mil novecentos re's e per verdade assinamos aqui Joam Ruiz de Macedo e eu a Dez de Novembro de mil e seisce'tos e cinquo annos Joam Ruiz de Macedo, Frcº dias Item, Hu' cubertor, hu'a mantilha, hu' mº travesseiro e duas almofadinhas, tudo bordado e dous coxins 1, hu' mº travesseiro e duas almofadinhas de veludo foi tudo vendido em outenta mil Item, Hu' vestido verdoso, e outro de gorgorão 2 de seda s. de cada hu' capa, roupeta e calcas, e hu' gibão de seda, e hu' roupão e hu'a carapuça foi vendida em vinte e quatro mil re's Item, A Francisco da Guama, et a Manoel Vaz vendemos a seguinte soma cento e quatro mil Item, Dous papos dalmiscar em dous mil re's Item, vinte e hu' lencois em cinquo mil e duzentos e cinquenta re's Item, Trinta e quatro camisas em cinquo mil et noveçe'tos et cinquenta Item, sete calcois em dous mil e duzentos et vinte digo dous mil e quinhentos e vinte Item, Vinte e cinquo toalhas de maos em dous mil re's Item, Trinta guardanapos em dous mil e duze'tos re's Item, Quatro toalhas de mesa em seisce'tos e oute'ta re's

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Almofada que serve de assento. Tecido encorpado.


Item, Panos menores escarpin's ceroulas velhas e outras meudezas em quinhentos re's Item, Treze travesseiros et desasete almofadas em dous mil e trezentos e quarenta re's Item, Seis peças de veo em treze mil e quinhentos re's Item, Hu' volante, em mil re's Item, Quatro arate's menos onça e mea de tinta das barbas, em quatro mil e quinhe'tos re's Item, Hu'a pedra Bazar que pesou seis outavas em seis mil et novecentos re's Item, Treze pedras com outras meudas Bazares pesarão seta outavas e quarta (...) seisce'tos e vinte Item, Meo cate de seda do cipeo em mil e cento et cinquenta re's Item, Quatro corjas de granadas em quatroce'tos e oute'ta Item, Duas caixas douradas em treze'tos e seseta re's Item, Duas lotas (?) em mil e seiscentos re's Item, Hu' pedaço de queixo em seisce'tos re's Item, Hu' sinete e hu'as contas em seisçe'tos re's Item, Mais dous caixois grandes em treze mil et quinhentos re's Item, Outro caixão piqueno em mil e quinhe'tos re's Item, Demos aos corretores duas peças de veo Item, A Felicio Ruiz demos hu'as luvas dambar porq' he nosso escrivão e perque forão feitas para sua fª e elle no lhas mereçe Item, No Pelourinho Velho se venderão dous pares de meas de seda novas, da India em mil e duzetos re's Item, Duas roupetas em setecentos e vinte Item, Quatro gibois em mil e seiscentos Item, Dous colletes em cento et vinte Item, Mais hu' gibão em seiscentod e outenta


Item, Duas alcatifas em vinte mil re's Item, Duas colchas em doze mil re's Item, Tres roupetas hu'a se vendeo em quatroçe'tos re's as duas entreguei na casa da mia' As peças que levou Joam Ruiz de maçedo para sua casa são as seguintes Tres pares de meas hu'as novas, e os outros dous pares usados em mil e seiscetos re's Hu'as luvas dambar em mil e seisçe'tos re's Hu'a peça de veo em dous mil re's Hu' volante em outocentos re's Dous calcois de tafeeira em outece'tos re's Dezanove porcelanas em dous mil e quatroçe'tos a caçha em q' estava embruilhada a fazenda do caixão grande, e hu' pachariz1 em outocentos re's quatro canas de benguala em cete e vinte Hu' travesseiro e duas almofadas em duzetos Hu' lencol em duzentos e cinquoenta Hu'as toalhas de mesa cento e seteta levei eu frcº dias, hu'a pedra piquena bazar por hu' tostão O que rendeo Arrecadamos, quinze mil e quatrocentos re's do mercador que os devia Da adicão do cobertor ate aqui soma tudo Hu' conto e trezentos, e setenta mil, e duzentos e dez re's Do qual drº Demos Joam Ruiz de Macedo e eu quinze mil re's a sua prima Felipa de maçedo, de que ela cobrou conheçimento que tem em sua mão, o qual drº foi de todo o monte, e assi fica hu' conto e trezentos et cinquoenta e cinquo mil e duzentos e dez re's Dos quais elle dito Joam Ruiz de maçedo leva em seu poder, setecentos e vinte e sete mil e seiscentos e dez re's, e eu frº Dias levo seiscentos, e vinte e sete mil e seiscentos re's, e asinamos a vinte e tres de Novembro de seiscentos e cinquo 1

Do Malaio. Quer dizer arroz mal cozido. Não nos parece que seja este o significado que o autor do texto pretenda atribuir.


Declaro q' não quis Joam de Ruiz de macedo assinar dizendo que o que estava feito bastava, nem quis que o drº fosse na forma q' convinha q'era levarmolo junto ambos ele e eu Frcº Dias q'isto fez e assinei a vinte e quatro de Novembro, era sobredita Francisco Dias Levou mais Joam Ruiz de maçedo o seguinte Item, Hu'a espingarda em mil re's Item, Hu'a bacia em setecentos e trinta Item, Hu' almo fariz trezentos e dez Item, Hu'a espada em mil re's Item, Sete canas de bengala em çento e vinte Ate se vir Joam Ruiz de Macedo, tinhamos feito e arrecadado, hu' conto e trezentos, e seteta mil e duzentos e dez re's Depois vendi as alcatifas e colçhas em trinta e dous mil Arecadei do inquisidor, mil e duzentos e oute'ta re's q' devia de hu's perco lanas Vendi hu'a roupeta em quatrocentos re's Somão estas adicõ is trinta e tres mil et seiscentos e outenta re's os quais juntos a hu' conto, e trezentos e setenta mil e duzentos e dez re's, soma tudo hu' conto et quatrocentos e tres mil e oitocentos e noventa re's Isto fora cinquo mil re's q' deu gcº guomez em q' Joam Ruiz não entra Declaro que os cinquo mil re's que arecadamos de guonculo (Gonçalo) guomez pinhrº, erão de hu' escravo que lhe deixou Antº Varella Rangel do qual avia de dar dez mil re's avião, e porq' o dito gcº guomez os não queria dar sem letigio e tomava tal fundemtº q' com bons pareceres especialmte de Antº dias Cardoso aceitei os ditos cinquo mil rer's os quais vão carregados atraz Conhecimtº de Joam Ruiz de macedo da sua parte do drº que levou Levo eu Joam Ruiz de Maçedo em meu poder a demasia de seiscentos e vinte e sete mil e seiscentos re's, o q' falta para perfazer a cotia de hu' conto et trezentos e setenta mil e duzentos e dez re's, que se fizerão na fazenda que ora vendemo s Frcº dias e eu, que ficou de Antº Varella meu irmão que esta no ceo os quais me obrigo a entreguar, conforme ao testamtº do dito defunto na villa de santa combadão, e per firmeza delle dei este por mim assinado aos ditos frcº Dias em lxª a vinte e tres de Novembro de 606 Joam Ruiz de Macedo Titulo das contas do tº do Padre Joam Frª, e Joam Ruiz de macedo da fazenda e drº q' (dinheiro que) acusa tem recebido como consta do livro de Joam frª como procurador da casa


Somão as contas deste lº como delle pareçe cento e noventa e quqtro mil et quatrocentos et setenta re's, et assi se acha mais seiscentos, e quarenta re's que se derão por respeito de Joam Ruiz em hu's guardanapos et toalhas de mesa a hu' amigo de frcº de guouveia, que elle abonou, que soma ao todo ao todo cento e noventa e cinquo mil e ce'to e dez re's Hu' escravo que arecadou o Prior de felício Ruiz trinta mil re's Da fazenda que trouxeram Joam Frª e Joam Roiz a esta casa afora estas cousas, acima de tafetas, lin's, touquilhas, cetins, volantes et hu'a toalha, beijoim1 , encensso, quinze mil e setecentos re's, como consta do lº fol 64 Conta do que trouxe frcº Dias e Joam Roiz de maçedo Hu' conto, e trezentos e setenta mil e duzetos e dez re's entrando nesta conta os quinze mil re's que deram a Felipa de maçedo Trouxe mais Frcº Dias trinta e dous mil re's das alcatifas e colçhas e mil e duzentos e outenta re's que arecadou do Inquisidor Antonio Dias Cardoso, e hu' cruzado de hu'a roupeta, q' vendeo, que tudo ist i soma afora a soma de mor contia trinta e tres mil e seiscentos, et outenta re's Somão as duas adicois das contas atras como dellas pareçe hu' conto e seiscentos e quarenta e quatro mil e setecentos re's Dos quais vem a mia' e a Joam Ruiz a cada hu' como pareçe das ditas contas, outocentos et vinte e dous mil e trezentos e cinquoenta re's Porquantos deleguados ha ctº (cento) e vinte mil re's, entrando nesta copia quinze mil que derão para a India, dos quais veo a cada erdrº sesenta mil re's os quais abat idos a cada hu' a sua a metade fiqa a esta casa e a Joam Roiz tão somente setecentos et sesenta e dous mil e trezentos e cinquoenta re's a cada hu' E Porque Joam Roiz de macedo trouxe de Lxª per sua conta, setecentos e vinte e sete mil e seisce'tos e dez re's e tinha mais em si da primrª vez que foi co m Joam Frª, trinta e dous mil e quatrocentos re's com mais seiscentos e quare'ta re's q' carregão sobrelle da fazenda que venderão et assi mais hu'a peça de touquilha que esta nesta casa per sua conta em dous mil re's que tudo soma trinta e cinquo mil equarenta re's que somo tudo estas duas adicois desta cap setecents e sesenta e dous mil e seiscentos e cinquoenta re's Tem mais em si o dito Joam Roiz de maçedo cinquoenta e tres mil e noventa re's q' recebeo nesta mesa em drº, de contado da derradrª vez que veo de Lxª, " porquanto esta casa lhe estava devendo vinte mil re's que avia emprestado para principiar esta capela, lhe não carregamos mais q' tão somente trinta e tres mil e nove'ta re's" (O citado aparece riscado e com a seguinte nota lateral: Esta adicão esta errada e he necessario que se vejão as contas que se fizerão com Joam Roiz(...)

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Benjoim. Incenso, resina Javanesa.


Soma o que tem em si o dito Joam Roiz de macedo como pareçe na adicão açima, et das atras ao todo setecentos e noventa e cinquo mil e setecentos e corenta re's, q' abatidos desta co'ta vinte e cinquo, mil re's, que deu o dito Joam Roiz a seu cunhado Domingues Vaz e a sua prima maria guomez restão tão somente sete centos e setenta mil e setecento e corenta re's Donde se entende ter a casa da mia' em si setecentos e sesenta e dous mil e trezentos e cinquoenta, que vem a ser menos q'Joam Ruiz outo mil e trezentos e noventa E Porquanto Joam Roiz não hade ter mais liquidos tirados os leguados q' tão somente setecentos e sesenta e dous mil e trezentos e cinquoenta re's, e tem em si o que pareçe na adicão acima, fiqua devendo a esta casa outo mil e trezentos e noventa re's Hade ser meeiro alem de tudo isto em frontal e opa que deixou o defunto a Igreija desta villa et assi mais os guastos q' Joam frª fez em lxª por ambos como pareçe do seu lº que esta na casa e assido lº do Tombo, e guastos delle q' se vera E assi mais os dias q ficou frcº dias em lxª por conta dambos conforme assentarão que forão sete dias Cabe mais a Joam Roiz da seda do frontal e opa bocaxim1 passamane franja e feitio tres mil e trezentos e quinze re's lº Da despesa de todos os guastos da cappella que manda fazer antº Varela Rangel q d's tem Primrªmente a imagem de Santo Antº para a cappella assi de feitio como de pintar, e carreto, tres mil e cem re's Ao carpintrº que fez o retabolo outo mil re's De dourar e pintar o Retabolo vinte mil e outocentos e sesenta re's Dous casticais grandas pª a mesma cappella dous mil e outocentos e corenta re's Mil re’s q’ se derão aos mor’ bpo’ pª dar q’ se erguessem o altar na cappella De hu'a alampeda pª a mesma cappella mil e quinhentos re's Da Cappella De hu' frontal de guadamecim dourado et couros pª os casticais mil e trezentos et outenta re's 2

De frete et aluguer pª estas peças de lxª ate esta villa cento e cinquoenta re's Hu's cast icais de pao e estante treze'tos re's 1 2

Entretela. Guadamecim ou guadameci é antiga tapeçaria de couro pintado.


De hu'a pedra clara trezentos re's De hu' varão de ferro e escapetas pª elle qutrocentos e sesenta re's Hu'as franjas e froces pª a vestime'ta e frontal decetim et lin's a amesma casa tinha e feit io da mesma vest imenta e frontal dous mil et novecentos e setenta çinquo re's De boguaxim pª esta vestimenta e frontal mil e qutrocentos re's De doze covados1 de lin's e cetim pª o frontal et vestimenta, da mesma cappella seis mil re's Hu' tostão de corda pª a roldana e ala'pada Hu'a toalha pª o altar cento et cinquenta re's Consta de todas as adicois dos livros desta casa destes tres annos proximos passodos em que foram provedores guomez frcº, Simão frcº, et o Prior Antº Cordrº, mostrarem todos os guastos que se fizerão na obra da cappella et acrecentamtº da Igreija et choro, com todas as cousas necessarias e tocantes assi a cappella, forro, tijolo, pulpito et alevantar as paredes da Igreija per respeito do Arco da Cappella e portas que se abrirão com as adicois acima tocantes ao ornato do Altar et retabolo, ce'to e outenta e seis mil e quatrocentos et vinte e tres re's, afora a pedra dara que ainda que vai na adicão açima, não entra nesta conta et com ella fazem em soma ce'to et outenta e seis mil e setecentos et vinte e tes re's Fora missal et calix q' esta pª se co'prar lº de todos os guastos de papeis et deliguencias que perte'çem acappella de Antonio Varella alem da obra da cappella Montarãose ao Padre Joam Frª, et a frcº guomez como procuradores desta casa quando forão a lxª, com Joam Ruiz de Macedo, vender a fazenda de Antonio varella et arecadala a cada hu' cinquo mil et outocentos re's que fazem em soma onze mil e seiscentos re's Derão ao Padre frcº da costa, dous mil re's a conta da esmola das missas que disse pelo Prior Antº Cordrº, por Andar em Lxª ocupado em negocios tocantes a fazenda de Antº varella tirando a limpo asseda que Joam Ruiz de maçedo tinha tirado dos caixois que fiquarão de seu irmão e dado ao conde meirinho mor em satisfação de hu'a divida que lhe devia a qual seda he a seguinte Vinte cinquo arate's e meo de retroses Hu'a corja de touquilhas brancas Duas peças de tafeta branco

1

Antiga medida de comprimento que corresponde a 66 cm.


Duas peças de cetim bra'co Duas peças de damasco branco Duas peças de volantes brancos As quais peças constão de hu' livro da fazenda do conde meirinho mor q' elle mandou dar ao dito Prior; o treslado do qual anda no cartório desta mesa, Per respeito desta seda se fez demanda a Joam Ruiz da parte desta casa, (...) per lha dar seu irmão em sua vida mas que a titava dos caixois depois do seu falecimtº Montarãose a frcº dias em cento e sete'ta e seis dias q' andou em lxª em negocios da fazenda de Antº varella trinta e tres mil e duzentos re's Mais a frcº dias de outo dias q' andou em Coimbra com cavalguadura, a dous tostois per dia mil e seiscentos re's Deu frcº dias hu' cruzado ao ldº (Licenciado) quintal per ver testamtº e responder a elle digo o testamtº de Antº varella Rangel Mais de tres hidas q' se fizerão a Viseu s Frcº dias, Antº Cordrº, et Provedor, com duas pataquas, q' se derão a hu' letrado, e outras deligencias de papeis dous mil, e duzentos e setenta re's Somão estas adico is afora os dos centos et oute'ta e tantos mil - cinquoenta e hu' mil et setenta re's E com os cento et outenta e seis mil, et setece'tos e vinte e tres re's, fazem em so ma duzentos e trinta e sete mil e setecentos e noventa e tres re's eu Simão do Vale Escrivão da casa (...) ano de seiscentos e seis o so escrevi(...) proprio a asines O prº Antonio Cordrº // Simão do vale


12. Apêndice II Treslado do Testamento de Isabel Gomes de Almeida e Manuel dos Santos Pedrosa. Em nome de Deos Amen eu Manuel dos Santos Pedrosa e eu Isabel Guomez de almeyda moradores nesta vila de Santa Comba Dão (...) na incerteza da vida e na certeza da morte, estando eu Manuel dos Santos Pedrosa doente da doença que Deus me deu porem em meu perfeito juízo e entendimento como Deus foi servido darme, e eu Isabel Guomez de Almeyda estando de pé (...) porém de alguns achaques mas com o meu juízo e entendimento que nosso senhor foi servido darme, desejando salvarmos por descarrego das nossas consciências ordenamos nossos testamentos de mão (...) na maneira seguinte. Primeiramente encomendamos nossas almas a Deos e Senhor nosso (...) nolas creou (...) nolas leve a glória (...) donde foram creadas e isto (...) merecimento da morte e paixão de seu unigénito filho; tomamos por nossa advogada a Virgem Maria Senhora Nossa, com todos os Santos e Sanctas da corte do ceo (...) que intercedão por nos diante do tribunal divino: Cremos tudo aquillo, (...) tem e ensina a Santa Madre Igreja Romana e em que Santa Fé Católica protestamos de viver e morrer, e nela nos salvar. Mandamos que sendo nosso Senhor servido levarnos nossos corpos sejão sepultados na Igreja desta vila, donde somos freguezes a cada um dos quais acompanharão cincoenta pobres com suas tochas, aos quais se dará a esmola costumada, e que por nossas almas se fação Que por nossas almas se façao a cada um de nós tres officios de nove licoens aos quais assistiram cincoenta sacerdotes, aos quais se dará a esmola costumada nesta freguezia Mandamos que depois de nosso falecimento se nos digão cem missas na Casa de Nossa Senhora da Ribeira sita na freguesia de Pinheiro de Azere nos dias em que for privilegiado o altar da dita Senhora convem a saber cincoenta missas pela alma de cad hum de nós E outro sim que se nos digam duzentas missas na Igreja desta dita villa nos dias em que for privilegiado a altar da gloriosa Santa Anna no qual se dirão todas convem a saber cem (...) pela alma de cada hum de nós (...) quais todas se dará de esmola por cada uma sessenta reis E outro sim que se nos digao trezentas missas na Igreja desta vila convem a saber cento e cincoenta pela alma de cada hum de nos e todas serão ditas com a brevidade possível e por estas se dara de esmola por cada uma cincoenta reis E eu Manuel dos Santos Pedrosa mando que se me digao duzentas missas pelas almas de meu pay. Minha may e minha avó Anna Pedrosa e pela de meu tio os (...) Manuel


Rodrigues convem a saber cincoenta pela de cada hum pelas quais se dará a esmolla costumada de cincoenta res E eu Isabel Guomez de Almeyda mando que se me digao duzentas missas pelas almas de meu pay, minha may e minha irmã Maria Agueda convem a saber cincoenta por cada uma pelas quais se dara a esmolla costumada de cincoenta reis Deixamos a confraria do Senhor desta dita villa dez alqueires de pão de foro dos quais o nosso herdeiro entegará os titulos aos mordomos da dita confraria dos que se acharem por nosso falecimento em pessoas seguras e isto com obrigação de nos mandar dizer a dita confraria enquanto existir duas missas, uma em dia glorioso de S. Joseph pela alma de mim Manuel dos Santos Pedrosa e outra em dia da gloriosa santa Anna pela alma de mim Isabel Guomez de Almeyda Deixamos a confraria de nossa Senhora sita na mesma Igreja quatro mil reis E a mais confrarias da mesma Igreja e a Irmandades das almas dez tostoens a cada uma por uma só vez E a confraria do Senhor acima nomeada dous mil reis por uma só vez Deixamos a Irmandade de Nossa Senhora da Ribeira um alqueire de azeite de foro do qual o nosso herdeiro lhe entregará assinado em pessoa segura, e que seja de quatro mil reis com obrigação de nos mandar dizer a dita Irmandade para sempre uma missa pelas nossas almas e este legado se cumprira por falecimento do ultimo que de nos ficar Deixamos a nossa criada Maria filha de Anna Mendes moradora na villa de Mortagoa quatro alqueires de pão de foro dos quais o nosso herdeiro por falecimento do ultimo que de nos ficar lhe entregara os (...) e quando não os haja lhe deixamos quatro mil reis, e isto alem das soldadas que constar lhe ficamos devendo Ordenamos que se paguem a todos os nossos criados todas as soldadas lhe ficamos devendo como também a todas as pessoas que nos serviram ou com que tivessemos contas que por seu juramento sera crido até a quantia de quatrocentos reis Declaramos que por todas as missas, que mandamos dizer pelas nossas almas queremos que as que mandamos dizer por falecimento de cada um de nos se digao logo tanto que algum de nos falecer e as outras se digam por falecimento do ultimo que de nos ficar Eu Manuel dos Santos Pedrosa deixo a meu afilhado Manoel filho de Manoel Guomes morador na villa de Treixedo, trinta alqueires de pão do foro dos quais me pagão na dita vila, com a obrigação de me mandar dizer pela minha alma logo depois de meu falecimento trinta missas por uma so vez as quais serão ditas na Igrija desta dita villa


Deixo a minha prima viuva que ficou de Domingos (...) dez mil reis de bens de raiz que tenho no concelho da dita villa de Treixedo Deixo a Barbara da Sylva fuilha de Agueda da Sylva desta villa quarenta mil reis em bens de raiz com a obrigação de me mandar dizer por minha alma logo depois de meu falecimento dez missas por uma só vez Deixo a minha afilhada Maria filha de Erivaldo Peixoto desta villa dez mil reis Deixo a Maria Figueira filha que ficou de Pedro Barbosa desta villa dez mil reis Deixo a Magdalena Pedrosa molher do dito Erivaldo Peixoto cinco mil reis Deixo a Maria Marques viuva que ficou de Pedro Barbosa dez mil reis Deixo a sua filha Joanna cinco mil reis Deixo a minha afilhada Antónia filha de Manuel Jorge da vi lla de Óvoa trinta mil reis em bens de raiz com a obrigação de me mandar dizer doze missas pela minha alma logo depois de meu falecimento e isto por uma so vez Declaro, que o legado, que deixo a dita Barbara da Silva, no caso que ela morra sem lhe ficarem herdeiros legitimos seus descendentes, em tal caso o deixo a caza da mizericordia desta dita villa com a obrigação de mandarem dizer pela minha alma uma missa para sempre E eu Isabel Guomes de Almeyda deixo a Francisca filha de João Dinis desta villa todo o chão da Gestozinha, que possuo com o meu marido Manuel dos Santos Pedrosa, que parte com o ribeiro e com o dito João de Niz, que será avaliado por dous homens que bem entendam e que não chegando a valia de quarenta mil reis mando que estes se lhe perfaçam de bens de raiz donde quer que me pertencerem com a obrigação de me mendar dizer quinze missas pela minha alma logo depois de meu falecimento por uma só vez Deixo a meu afilhado Manuel filho de Manuel de Niz e de sua mulher Maria Francisca quarenta mil reis em bens de rais, que serão avaliados por dois homens que bem o entendam na qual quantia entrará a vinha que possuo com meu marido a São Sylvestre, que parte de uma banda com Joseph de Macedo Varella e da outra com Manuel Ayres, e isto com a obrigação de me mandar dizer quinze missas por minha alma logo depois de meu falecimento e isto por uma só vez Deixo a minha afilhada Bernarda filha de Pedro Pais desta villa quarenta mil reis em bens de raiz, que serão avaliados dos que me pertencerem com obrigação de me mandar dizer quinze missas pela minha alma logo depois de meu falecimento e isto por uma só vez Deixo a meu primo Manuel de Niz veuvo trinta mil reis em bens de raiz que lhe serão entregues e avaliados dos que me pertencerem e por sua morte sucedera nelles seu neto


Manoel com a obrigação de me mandar dizer por minha alma depois de meu falecimento dez missas por uma só vez as quais declero com as mais que que tenho encarregado a todos os meus legatários serão ditas nesta Igreja donde sou freguez Deixo a Agueda da Sylva desta villa cinco alqueires de pão de foro Instituimos por nossa herdeira e testamenteira a Caza da Mizericórdia desta villa e ao seu hospital para que pagos todos os nossos legados lhe fiquem todos os nossos bens assim e da maneira que se acharem e forem nossos e nos pertencerem com declaração que eu Manuel dos Santos Pedrosa deixo por usufrutuaria de toda a minha meação a minha mulher Isabel Guomez de Almeyda que em sua vida comma os usos e frutos de toda a minha direita (...) e que por sua morte sucede nela a dita Caza = E eu Isabel Guimez de Almeyda deixo a meu marido Manuel dos Santos Pedrosa por usofrutuario de toda a minha direita parte (...) e que em sua vida lhe coma os usos e fructos e por sua morte deixo também por usufrutuario da minha direita parte a meu irmão 16 de Mayo de 1692 escreveu Manoel Guomez, licenciado Aprovação, Geraldo Guomes de Morais; Joseph Mendes, barbeiro Assinam de cruz; Simam Alves, trabalhador e Domingos Nunes Licenciado Joam de Almeida, de Mortágoa Tabelião: António Mendes 1º Codicilho 10 de Outubro de 1695 escrito por Manuel Guomes “deixo um rol na mam do Reverendo Prior, João Guomez” Aprovação. Testemunhas: Reverendo Padre Joam Brandam, Joseph Mendes, Domingos (criado). Dr Manuel da Sylva, Licenciado Joam de Almeyda e Manoel de Mello Tabelião: Diogo do Sylva e Mello 2º Codicilho 8 de Dezembro de 1704 escrito por Manuel Guomes “Isabel Guomez fica com frutos do ano, azeite, pão, vinho, ouro, prata, dinheiro e oratório com santos” “Catherina de Niz fica com a saia vermelha e preta” “ Francisca de Jesus a saia azul de chamalote” Aprovação. Licenciado Manuel Guomez de Morais, Luis da Costa de Figueiredo, André Henriques da Sylva e Sebastiam Guomes Testemunhas: Felipe, Geraldo Peixoto e Manoel Paes Teixeira. Tabelião: Dionisio de Lemos. 3º Codicilho. 23 de Abril de 1705, escreveu Manoel Guomes. Isabel Guomez dá o leito e a roupa a seus criados. O treslado do testamento e dos codicilhos foi feito pelo escrivão da Santa Casa António da Costa Rangel em 4 de Maio de 1706.


13. Apêndice III Escritura da Farmácia

7 de Julho de1877 Escriptura da administração de estabelecimento com direitos e obrigações recíprocas entre a Santa Caza da Mizericórdia desta villa e o Pharfameceutico da mesma Caza. Saibão os que virem esta publica e escrita de contracto, que digo, escriptura que no ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e setenta e sete a os sete dias do mês de Julho nesta villa de Santa Comba Dão (…) forão presentes dum lado Manuel de Matos Viegas natural de Villa Nova, jogado de Mortágoa, e doutro Luís José Coelho Sobral, solteiro, advogado, desta villa, na qualidade de procurador especial e( ) da Meza da Santa Caza da Mizericórdia desta villa nos mostra pela procuração auttentica que fica archivada aceite escrituras para se copialas nos traslados que desta villa se…. ambos residentes nesta mesma villa e pessoas conhecidas de mim tabelião e de duas testemunhas idóneas, residentes, nomeadas e assignadas de que de tudo dou fé. E logo neste acto por ambos os autorgantes juntamente e por cada um de per si …presentes as mesmas testemunhas. Que a Santa Casa da Mizericórdia esta villa fará contracto co o primeiro outorgante de este na qualidade de Pharmaceutico merecedor (?) para gerir a pharmacia à pouco estabelecida pela mesma Santa casa da Misericórdia nesta villa como consta da Sessão da renovação de vinte e nove de Abril do corrente ano celebrada no respectivo livro das actas cujo contracto tem por base as condições, clausulas e obrigações exaradas na respectiva acta em sessão de dezassete de Março do corrente anno; e que na conformidade da mesma acta e assumia com ella celebrar este contracto em que o primeiro outorgante se obriga a gerir e administrar como Pharmaceutico nesta dita pharmacia na forma e termos que se seguem = Primeiro= Receberá o primeiro outorgante, da Santa Caza da Mizericordia, pela dita gerência e administração o ordenado annoal de duzentos mil reis e habitará materialmente a casa em que se acha estabelecida a pharmacia. =Segundo= Para que (…) da arrecadação das dividas (…) do receituário vendido. Receberá a comissão de dez por cento do que se liquidar no fim de cada ano deduzido (…) e mais despesas com o cojá fasteamento da mesma pharmacia. =Terceiro= Das dividas cobradas (…) de execução não receberá o primeiro outorgante percentagem alguma, pois que os dez por cento acima referidos só tem lugar com relação ás dividas arrecadadas voluntariamente =Todas= Todas as despesas de arrecadação das dividas da botica e das mais do (…) ficão a cargo da mesa da Santa Caza da Mizericordia e não do primeiro outorgante = Quarto = Será o primeiro outorgante responsável pelas dividas que ficarem a dever os devedores à sua pharmacia sendo elles já falidos de bens no tempo com que fiou. = Quinto = (…) o mesmo primeiro outorgante de fazer activa a cobrança de quaisquer dividas neste estabelecimento da pharmacia logo que finde o ano depois de controladas ou ainda antes se lhe (…) que os respectivos devedores não (…) de fortuna ou de crédito. = Sexto = Não haviará receitas aos pobres sem despacho do provedor ou quem legalmente o substituir lançado no papel da mesma receita sob pena de lhe não serem abonados nas suas contas. = Sétimo = Todos os meses enviará ao provedor uma relação de todos os devedores à pharmacia e (…) quando os (…) com os seus pagamentos, e aqueles que (…) deverão ser demandados afim do provedor dar as providências para se fazer certa cobrança judicialmente. = Oitavo = Quando ouver receitas de (…) de drogas o primeiro outorgante apresentara ao provedor uma relação dos que forem necessários para que elle determine que se


mande vir de Lisboa ou Porto como julgar mais cómodo fornecendo para isso a mesma Santa Caza da Mizericórdia o dinheiro necessário para serem pagos no acto de compra. Esta relação será lançada por extenço (…) em seguida a requesição da compra e será ali mesmo que o Provedor deverá lançar o seu despacho. =Nono=Realizada a compra o primeiro outorgante marcará em frente das drogas requesitadas o custo por que effectuara a compra comprovada com a respectiva factura…ouver recebido para mais ou recebido diferença que ouver para menos. = Décimo = Para as despesas miúdas e ordinárias se proverá pelo apurado ao balcão dvendo relacionar-se e comprovarse todas estas despesas na tomada das contas. = Hudecimo =Todos os annos no fim de Junho deve (…) balanço ao estabelecimento e apresentar-se à Meza da Santa Caza uma conta geral. Haverá para a regular escripturação os livros competentes: Primeiro um livro de receitas e despesas geral tanto de drogas como de utencilios no qual deverá lançar em primeiro a receita o inventário ou balanço das drogas e utencilios existentes e mensalmente o que se for comprando (…) e inutlizando até chegar ao fim do anno em que se balanceará esta conta; Segundo outro livro para descrever a divida geral de todas as pessoas ao estabelecimento da pharmácia e a conta da importância do receitoario aviado por esmolas aos pobres; Terceiro livro dos balanços (…) da pharmácia em que se mostre em resumo; primeiro quanto recebeu de dinheiro apresado ao balcão ou caixão? e divida pretérita; e segundo quanto se fiou aos particulares e quanto se deu aos pobres em medicamentos; terceira as despesas feitas no costeamento das despezas necessárias para a botica; quarto livro em que se lance todos os nomes dos devedores de receitas fiadas com importância de mais dividas e logar de sua residência=Duo-décimo=Que este contracto durará por tempo indeterminado podendo qualquer das partes contratantes desligarem-se delle observando-se o seguinte: Elle primeiro outorgante querendo desligar-se avisará a Meza sessenta dias antes da sua sahida a qual só poderá realisar depois de haver outro que o substituirá uma vez que esse outro se apresente a tomar entrega da pharmácia dentro doutros sessenta dias mediatos aquelles; devendo o primeiro outorgante quando sahir fazer entrega na presença da meza ou quem por ela for considerado para este fim e á face do inventário, de todos os objectos pertencentes ao estabelecimento do pharmácia e que estavão debaixo da sua responsabilidade. Pela sua parte também a Santa Caza se obriga, querendo despedir o primeiro outorgante, a fazelo prevenindoo com sessenta dias de antecipação afim de que elle neste espaço de tempo possa organizar e regularizar as contas que é obrigado a prestar na forma acima determinada. Outrossim pactuarão os segundos outorgantes que este contracto começou a vigorar desde o dia desasete de Junho próximo pretérito, (…) que foi nesse dia que se abriu ao publico a referida pharmácia e o primeiro outorgante começou a geriala e a administrala, contandose por conseguinte desde aquele dia … a existência deste contracto para todos os efeitos legais. Assim o disseram … e mutuamente aceitarão; e apresentaram um sello destampillha do valor de quinhentos reis que vai ser sellado no fim desta, que asignarão com as testemunhas presentes, Adriano de Gouvea Augusto, solteiro, proprietário de Treixedo, e João Gomes do Amaral, casado, marceneiro, desta villa, depois deste instrumento ser lido por mim tabellião António Ferreira de Albuquerque. Manuel de Matos Viega; Luís José Coelho; Adriano de Gouvea; João Gomes do Amaral.


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