Revista de Gestão Pública/DF - volume 2 - número 2

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José Dion de Melo Teles

Ciência e vários outras, na Inglaterra. Então, o presidente viu que era um homem que tinha todas as qualidades, que era uma pessoa honesta, com propósitos, com competência gerencial comprovada, e o aprovou para o INPA. Todos os anos, eu contribuía com o último centavo para apoiar a reunião do SBPC que era considerada inimiga do sistema, era caixa de ressonância de comunistas. Eu apoiava a realização do encontro em julho e o financiamento da revista da SBPC “Ciência e Cultura”, porque eu era um sujeito que era convocado para uma tarefa com essas condições e precisava de apoio, sem restrições para isso, para chegar lá. Também não ia levar quireras, probleminhas, pois eu tinha de resolver. Se chegasse a um ponto como no caso do Wick, eu ia até o Presidente da República ou parava tudo. Você acha que hoje em dia seria possível uma coisa dessa? Essa é a pergunta. De forma que eu não sou realmente esse titã. Eu tive a felicidade de trabalhar em uma época em que era permitido pensar grande, em que os apoios eram sem condições de entraves, e tive equipes maravilhosas, fantásticas. Isso é uma coisa que é uma fortuna. RGP: Em termos de qualidades gerenciais para conduzir ações e projetos na administração pública, quais conselhos o senhor daria para gerentes, administradores? José Dion de Melo Teles: Acho que a receita básica de uma liderança aceita, não imposta, vem daquela pessoa, como um gerente, que cria todas as condições para seus auxiliares crescerem e até a superarem, não tendo medo da inteligência. Criar o clima, como procurei fazer, deixaria a pessoa tranqüila quanto à remuneração. No caso do SERPRO e do CNPq, todo mundo era CLT, não era regime único. Tinha que produzir. Você fornece um bom ambiente para a pessoa crescer, pensar em voz alta, não se sentir constrangida com suas idéias, que podem parecer estranhas, mas devem ser olhadas com cuidado e estudadas, porque nessas idéias pode haver um valor novo. O membro da equipe deve ser sempre

desafiado intelectualmente. Isso tem que ser um exercício constante. As pessoas criativas não podem cair em monotonia intelectual. Isso é o fim, elas vão embora. Esses fatores são importantíssimos, mas o conjunto deles está baseado na vontade de fazer as pessoas melhorarem. É como se em uma escola o que se estivesse ensinando fosse o crescimento pessoal. Então se dá estímulo à metodologia de fazer perguntas. É mais difícil fazer pergunta inteligente do que a responder. A escola, sobretudo, o SERPRO, tinha isso. Certamente, uma coisa marcante foi a estrutura do centro de treinamento do SERPRO, que varria o Brasil todo. Todos os gerentes sabiam exatamente o que estavam fazendo ali. Os manuais eram feitos com folhas soltas e, caso se trocasse uma vírgula, trocava-se a página toda. Tudo era atualizado. Era proibido remissão. Quando a auditoria ia, não checava somente recibos e 'besteiras' financeiras. Entrevistava as pessoas para saber se estavam inteiradas do seu papel, com o treinamento suficiente para operar e se estavam felizes com o que estavam fazendo, porque tem uma lei natural que diz que a gente faz o que sabe e dá preferência ao que gosta. Se você está fora disso, você é uma pessoa infeliz e, como tal, é um problema dentro da equipe. Então, uma das coisas que era interessante era a chegada do manual para saber como é que você procederia, por exemplo, para emitir um cheque. Dependendo da função da pessoa, aquele miolo de conhecimento tinha que estar dominado. Caso contrário, um relatório diria que o treinamento estava falhando, o supervisor estava falhando, mas isso não era uma ameaça e não era colocado em clima inquisitório. Esse funcionário podia diretamente se dirigir ao sistema de treinamento. Ele poderia, por exemplo, dizer que gostaria de aprender inglês porque estava com dificuldade de ler os manuais, e isso sem ninguém mandar. RGP: Sem mais considerações, agradecemos sua colaboração.

Revista de Gestão Pública/DF v. 2 n. 2 jul./dez. 2008

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