RUMINANTES A REVISTA DA AGROPECUÁRIA WWW.REVISTA-RUMINANTES.COM
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ANO 10 | 2020 OUT/NOV/DEZ (TRIMESTRAL) PREÇO: € 5.00
Exemplar de oferta
Pasto Alentejano
300 mil borregos em engorda no sistema intensivo
Engorda de novilhos
FOTOGRAFIA: FRANCISCA GUSMÃO
As vantagens das dietas ricas em fenossilagens
Entrevista a Manuel Die
Gestão holística
Um exemplo no Alto Alentejo
CONDIÇÕES DOS VITELEIROS O IMPACTO NA DOENÇA RESPIRATÓRIA BOVINA
CAMAS QUENTES ENTREVISTA A UM UTILIZADOR, PRODUTOR DE VACAS DE LEITE
NIR PORTÁTIL A OPINIÃO DE ESPECIALISTAS NA CONSULTORIA DE NUTRIÇÃO
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
EDITORIAL
A escolha do editor
REVISTA RUMINANTES 39
Mande-nos a sua foto preferida para: geral@revista-ruminantes.com.
OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO 2020
DIRETOR Nuno Marques nm@revista-ruminantes.com COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Ana Gomes, André Almeida, André Antunes, André Lopes, António Marques, António Moitinho, Augusto Serralheiro, Carlos Manuel, Carlos Vouzela, Casimiro Marques, Deolinda Silva, Filipe Maricato, George Stilwell, Gorete Lopes, Huw Mcconochie, Inês Romeiras, Javier Lopez, Joana Silva, João Pedro Freire, João Santos, José Alves, José Caiado, José Santos Silva, Lambert Van Der Linde, Luís Capela, Luís Fragoso, Luís Raposo, Manuel Die, Pedro Castelo, Raquel Lourinhã, Ricardo Bexiga, Rita Silva, Rita Teixeira, Sara Fernandes, Sara Garcia, Tiago Serralheiro. Foto FG, Herdade do Salvador.
REDAÇÃO Francisca Gusmão, Inês Ajuda
Caro Leitor,
E
m setembro, a ministra da agricultura convocou os órgãos de comunicação especializados para apresentar a Agenda de Inovação para a agricultura até 2030. Um plano que pretende, segundo palavras da responsável do governo, “nortear a estratégia e as politicas do setor, sempre em linha com as prioridades europeias e internacionais”. Cada ministro, sua agenda. Nesta fase de desenvolvimento, o plano aborda apenas as grandes linhas gerais (intenções estratégicas, metas, destinatários...) estabelecidas para os níveis mais altos da pirâmide de execução deste ambicioso plano. Esta agenda é abrangente, e vai requerer um grande trabalho para se conseguir fazer o mapa de implementação de cada uma das medidas definidas para os níveis mais baixos da pirâmide, ou seja, de quem está no terreno. Espero que os planos de ação subjacentes à sua implementação e concretização (quem, como, quando e com quanto) sejam apresentados muito em breve. Uma das metas refere-se a “Mais inovação”. O objetivo é “aumentar em 60% o investimento em investigação e desenvolvimento”. Com “um investimento maior e mais focado na investigação, inovação e capacitação, para que estes sejam o motor de transformação da agricultura e alimentação”. Este ponto é, na minha opinião, muito importante. É bom que existam estruturas de proximidade ligadas à investigação aplicada e à extensão rural, e que os órgãos de comunicação, como a Ruminantes, possam contribuir para distribuir o conhecimento destas estruturas pelos produtores.
PUBLICIDADE E ASSINATURAS Nuno Marques comercial@revista-ruminantes.com
Enquanto o governo se preocupa em divulgar a grande agenda para os próximos 10 anos, agricultores, investigadores, técnicos... vão continuando a fazer o seu trabalho do dia a dia. Nesta edição encontramos mais uma vez uma mão cheia de profissionais de excelente qualidade. Sem ou com agenda a 10 anos, com ou sem subsídios, eles vão tomando as suas decisões e fazendo o seu trabalho diário em prol do seu negócio e do seu setor. Nesta edição divulgamos trabalhos de investigação aplicada com grande utilidade para quem está no terreno, entrevistas em explorações intensivas com grande sentido de responsabilidade social, reportagens em produtores com diferentes abordagens para produzir o mesmo produto mas sempre com grande preocupação com o bem-estar animal, empresas que procuram oferecer o melhor serviço aos seus produtores para otimizar os custos, melhorar o aproveitamento das forragens e aumentar a rentabilidade do negócio. A procura pela melhoria dos resultados produtivos, económicos, de bem-estar animal e responsabilidade social é transversal a todos os setores. Por fim, damos-lhe a conhecer o testemunho de um produtor com vacas de carne, no Alto Alentejo que, após 15 anos a produzir vitelos em modo convencional, decidiu começar a produzir no sistema de gestão holístico. Pela primeira vez, disponibilizamos o podcast da entrevista realizada para esta edição no nosso site: www.revista-ruminantes.com Nuno Marques
FOTOGRAFIA Francisco Marques DESIGN GRÁFICO E PRÉ-IMPRESSÃO Francisca Gusmão fg@revista-ruminantes.com IMPRESSÃO Jorge Fernandes Lda. Rua Quinta Conde de Mascarenhas nº9, Vale Fetal 2825-259 Charneca da Caparica Telefone: 212 548 320 ESCRITÓRIOS E REDAÇÃO Rua Alexandre Herculano nº 21, 5º Dto 2780-051 Oeiras Telemóvel: 917 284 954 geral@revista-ruminantes.com PROPRIEDADE/EDITOR Aghorizons, Lda / Nuno Marques Contribuinte nº 510 759 955 Sede: Rua Alexandre Herculano nº 21, 5º Dto. 2780-051 Oeiras GERENTE Nuno Duque Pereira Monteiro Marques DETENTORES DO CAPITAL SOCIAL Nuno Duque Pereira Monteiro Marques (50% participação) Ana Francisca C. P. Botelho de Gusmão Monteiro Marques (50% participação) TIRAGEM 5.000 exemplares PERIODICIDADE Trimestral REGISTO Nº 126038 DEPÓSITO LEGAL Nº 325298/11 O editor não assume a responsabilidade por conceitos emitidos em artigos assinados, anúncios e imagens, sendo os mesmos da total responsabilidade dos seus autores e das empresas que autorizam a sua publicação. Reprodução proibida sem a autorização da Aghorizons Lda. Alguns autores nesta edição não adotaram o novo acordo ortográfico. O "Estatuto Editorial" pode ser consultado no nosso site em: www.revista-ruminantes.com/estatuto-editorial www.revista-ruminantes.com www.facebook.com/RevistaRuminantes
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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SUMÁRIO
#39 OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO 2020
08 Pasto Alentejano 300.000 borregos em engorda
12 Raça INRA 401 e Suffolk Avaliar o crescimento de borregos
18 Inseminação artificial Melhorar as raças Merinas autóctones
20 Aleitamento em cabritos Diferenças entre o sistema artificial e o natural
24 Recria de cabras leiteiras As boas práticas na recria em vários países
28 Engorda de novilhos Dietas ricas em fenossilagens versus concentrados
34 Gestão e lucro Como aumentar a rentabilidade da vacada
36 Gases com efeito estufa influência dos sistemas de produção de vacas leiteiras
38 Nutrição proteica Uma ferramenta útil na produção de leite
44 Eficiência reprodutiva Fertlidade e diminuição do intervalo entre partos
46 Alimentação de vitelos Efeitos do fornecimento de Alkosel vs selénio orgânico
48 Problemas podais A importância da alimentação na prevenção
52 Doença respiratória bovina O impacto das condições ambientais dos viteleiros
56 Vacas leiteiras Como aumentar a longevidade
60 Pneumonias em bovinos Medidas preventivas e tratamento
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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SUMÁRIO
64 Há 10 anos em ProCross O testemunho dum produtor holandês em Portugal
66 Gestão holística O sistema regenerativo de produção no Alto Alentejo
74 Vantagens do NIR portátil Avaliação da qualidade das forragens e do TMR
76 Robots de ordenha Vantagens da tecnologia na gestão da exploração
80 Camas quentes O testemunho do produtor Filipe Maricato
84 Troup'O em vacas de carne A empresa Vet Equilíbrio fala sobre a sua utilização
88 Agropecuária do futuro Especialistas anunciam as mega-tendências
90 Sensor de células somáticas Avaliar individualmente os quartos do úbere
90 Wezoot Auctions App para gestão integral de um leilão de gado
92 Observatório Matérias Primas Será agora o fim de mais um ciclo?
94 Observatório Leite Do Covid-19 aos desafios futuros
96 Índice VL e VL-erva Leite continua mal valorizado
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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No Pasto Alentejano são anualmente engordados 300 mil borregos para venda em carne, e vivos. A exploração dispõe de 11 pavilhões com uma área coberta de 25.000m2.
A construção dos pavilhões teve por base um projeto, desenhado por Augusto, em que se tiveram em conta alguns fatores importantes, como a orientação do vento (para garantir a melhor ventilação), a disponibilidade de água (que existe abundantemente nesta zona), os acessos e a distância ao matadouro.
PRODUÇÃO | BORREGOS
300.000 EM ENGORDA
AS NOVAS INSTALAÇÕES DO PASTO ALENTEJANO, NA POVOAÇÃO DE LENTISCAIS, SOUSEL, SURPREENDEM PELA IMPONÊNCIA DAS CONSTRUÇÕES. SÃO 11 PAVILHÕES MODERNOS, PERFEITAMENTE ALINHADOS, ONDE SÃO ANUALMENTE ENGORDADOS 300 MIL BORREGOS PARA VENDA EM CARNE E VIVOS. Por Ruminantes | Fotos FG, Pasto Alentejano
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o recinto de entrada do Pasto Alentejano, um painel com os retratos dos fundadores, Vicente Serralheiro e sua mulher, Etelvina Serralheiro, dá as boas vindas. Foi com eles que começou o negócio, em 1918, da compra de borregos que vendiam no seu talho, em Sousel e, mais tarde, para talhos de Lisboa. Nos primeiros dias de setembro, entrevistámos um dos seus filhos Augusto Serralheiro, e o filho deste, Tiago, que nos receberam no escritório da empresa. Além do Pasto Alentejano, dedicada à engorda de 8
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borregos, que é gerida por Augusto, o negócio de família abrange também o matadouro local. Este foi adquirido maioritariamente há três anos pela família, cabendo a gestão ao irmão, José Serralheiro. PASTO ALENTEJANO “Comprar os borregos a quem tem as ovelhas, quanto mais próximo melhor, e vender os borregos já mortos, ou vivos, para exportação.” É assim que Augusto define o objetivo do negócio da empresa que gere, o Pasto Alentejano. A uma distância de 500 metros fica o matadouro para onde é
escoada uma parte dos animais: “Há 3 anos adquirimos a maioria do matadouro, que estava em risco de vir a fechar. Trata-se de uma unidade muito ampla, que emprega muita gente, e que nos faz falta porque de outra maneira teríamos que ir abater longe, em Beja, Santarém ou Tomar. O matadouro constitui uma parte indissociável do negócio, como explica Augusto: “A rentabilidade vem da transformação, independentemente de a carne ir para exportação, ou não.” “O Pasto Alentejano tem a responsabilidade de estar na ‘ponta’ dos produtores”, começa por dizer Augusto, explicando a ligação
Pasto Alentejano, 300.000 em engorda
Da esquerda para a direita: Augusto Serralheiro tem a seu cargo a gestão do Pasto Alentejano, e José Serralheiro, seu irmão gere o matadouro que a empresa adquiriu há 3 anos. Ao seu lado, a nova geração que já entrou no negócio: Filipe Serralheiro e Tiago Serralheiro.
Augusto Serralheiro
Tiago Serralheiro
estreita que têm com os produtores, e os benefícios duma relação win-to-win para ambas as partes: “Aquilo que tentámos foi criar uma ligação com os produtores, de forma organizada, para que eles nos possam avisar quando vão ter borregos, e quantos. Assim podemos preparar-nos. É interessante fazermos esta gestão, e vantajoso para ambos.” NOVAS INSTALAÇÕES As novas instalações do Pasto Alentejano começaram a ser construídas há 4 anos. Atualmente são 11 pavilhões com uma área coberta de 25.000m2, dos quais 12.000m2 foram construídos este ano. “Nesta exploração engordam-se borregos para dois tipos de mercado: o mercado nacional, que é o da carne, e o da exportação”, explica Augusto. A construção dos pavilhões teve por base um projeto, desenhado por si, em que se
tiveram em conta alguns fatores importantes como a orientação do vento (para garantir a melhor ventilação), a disponibilidade de água (que existe abundantemente nesta zona), os acessos e a distância ao matadouro. Do primeiro para o último pavilhão já houve alterações: “optámos por fazer os parques para 150 animais em vez de 300, porque assim conseguimos identificar melhor os problemas, para além dos benefícios ao nível do bem-estar. “A RENTABILIDADE VEM DA TRANSFORMAÇÃO” “A rentabilidade vem da transformação, independentemente de o borrego ir para exportação, para carne, à peça... Quanto mais transformado, maior é a rentabilidade. Lembro-me de quanto o meu pai pagava por um borrego e, depois daquilo partido, quanto é que a minha mãe fazia em caixa”, conta
Augusto. “Mesmo no negócio da exportação, existe transformação. Nós compramos os borregos com x quilos, engordamos até ao peso que o cliente quer e, como temos o matadouro, podemos preparar a carne de acordo com qualquer exigência dos clientes.” Embora atualmente o negócio dos animais vivos seja mais rentável, o gerente do Pasto Alentejano não tem dúvidas de que o futuro está na carne. Não querendo para já levantar o véu todo, anunciou apenas para daqui a 6 meses um novo projeto para a carne que vai dar lugar a mais 50 postos de trabalho na empresa. Como seria num contexto em que a venda à peça ganhasse maior importância, quisemos saber. “Num prisma nacional, o descompensado (venda à peça) podia ser um problema, mas num prisma internacional há escoamento para tudo; um exemplo disso: nós tínhamos subprodutos (tripas, molejas)
…
“O PASTO ALENTEJANO TEM A RESPONSABILIDADE DE ESTAR NA ‘PONTA’ DOS PRODUTORES.” RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Pasto Alentejano, 300.000 em engorda
A água fornecida aos bebedouros é extraída diretamente de um furo, para estar sempre fresca e em abundância.
…que agora são vendidos como produtos
gourmet para outros países. Neste momento, o mais fácil é vender carcaças inteiras, mas isso qualquer um faz.” “TAMBÉM TEMOS UMA FUNÇÃO SOCIAL” Às instalações do Prado Alentejano chegam 8 a 10 mil animais por semana, com pesos entre 12 e 50 kg, dum leque muito variado de fornecedores, “São cerca de 1.000, de Sagres a Bragança. Recebemos aqui produtores com 2 borregos, outros com 2.000 borregos. Tratamos todos de maneira igual: chegam, descarregam e recebem logo”, diz Augusto. "Quando aconteceu esta situação da Covid-19, houve uma enorme pressão dos produtores para venderem os borregos, Nós praticamos habitualmente um preço semanal e nunca o alterámos, o que deixou os nossos produtores satisfeitos e reconhecidos. Queremos o bom nome da empresa acima de tudo, e foi isso que nos fez crescer. Também temos uma função social.” Há cerca de um ano, surgiu a ideia de comprar aos produtores os animais de refugo, que eles já não conseguiam vender ou vendiam a um preço muito baixo. “Em vez de 10 euros por ovelha, pagamos 40 ou 50 euros. Com esse dinheiro, já têm mais margem para investir no negócio. Atualmente estamos a abater 2 a 3 mil ovelhas [de refugo] por semana que enviamos para países como o Qatar, Líbano ou Jordânia. Foi mais uma maneira que encontrámos, com vantagem mútua, para fidelizar os nossos clientes. Se o produtor acabar, nós também acabamos. O nosso negocio é de muito volume, com uma margem curta.”
“PREFIRO O CRUZADO COM ILE DE FRANCE” “A maioria dos animais que engordamos são Merino puro e cruzado, mas prefiro o cruzado com Ile de France. O Ile de France é um borrego com um índice de conversão melhor do que um Merino normal. Ao nível da carcaça consegue-se mais peso e menos gordura, é uma carcaça que sai muito melhor. O problema das raças muito puras é que, nas explorações de grande dimensão, tornam-se muito sensíveis e trazem mais problemas. Para exportação, idealmente prefiro o cruzado com Ile de France. Exportamos com 40 kg e no destino engordam mais 30 kg, em média.” Com que peso abatem? Com 32 kg em média. Abatemos desde os 20 kg aos 36 kg. Com que peso entram os borregos na exploração? Depende da época do ano. Com 18 kg, de setembro até ao final do ano, com 23 kg de janeiro a março e com 25 kg de março a julho que é quando há mais erva e o produtor não gasta dinheiro com o alimento. Que dados técnicos médios tem na exploração? IC: 4,1 na reposição de 1kg de peso vivo; GMD: fêmeas 280 g/dia, machos 350 g/dia; Mortalidade: 1,3%. Que indicadores usam na gestão do negócio? Controlamos diariamente o consumo de ração através da monitorização dos silos, e
semanalmente a quantidade de borregos que entra, o peso e o preço médio de entrada. A mortalidade é uma preocupação? Temos uma altura crítica, de julho a setembro, mas faz parte da exploração. Fazemos todos os procedimentos em termos de bem-estar animal e a nível sanitário para controlar os problemas que vêm do campo nessa altura. Aqui juntam-se borregos das mais diversas proveniências, é uma realidade a que não se pode escapar. A temperatura constitui um problema? Os pavilhões estão feitos e orientados de maneira a adequarem-se de forma natural à mudança das condições climáticas. No inverno temos as naves mais fechadas, e no verão abrimos tudo de forma a fazer circular o vento. Que melhorias desejaria ver da parte dos produtores? Sobretudo ao nível sanitário. Não podemos fazer milagres, por exemplo quando os animais não foram vacinados no campo e são vacinados aqui, por vezes reagem mal à vacina. Faz parte do nosso trabalho ajudar os produtores a trabalharem melhor. Não perdendo rentabilidade no nosso negócio, temos que estar em sintonia com o produtor, apoiá-lo, porque sem ele o nosso negócio acaba. Quantos animais engordam? Cerca de 350 mil, 50% para exportação. Qual a primeira coisa que faz
"NUM FUTURO BREVE, UM NOVO PROJETO NO MATADOURO IRÁ DAR LUGAR A MAIS 50 POSTOS DE TRABALHO NA EMPRESA." 10
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Pasto Alentejano, 300.000 em engorda
quando chega aqui de manhã? Sinto-me feliz. Com a vontade com que venho, qualquer problema que apareça, que todos os dias aparecem, a gente resolve. Chego aqui preparado para o que aparecer. Que cuidados têm com os animais que vão para exportação? Todos os definidos pelos protocolos, que têm que ser seguidos. Nos animais para exportação, exigem que seja Merina pura? Não, os clientes querem essencialmente boa qualidade. Temos a ovelha Merina que tem boas características e um bom índice de conversão (à semelhança de outras raças) mas que, mesmo com um carneiro normal, dá um borrego bom; conseguimos levá-lo até aos 30 kg (com 13, 14 kg de carne) e o cliente vai bem servido. Os ovinos têm futuro na Europa? Sim, é a espécie menos trabalhada, ficou sempre na retaguarda e por isso há ainda um trabalho muito grande a ser feito. O aspeto cultural pode ter uma grande importância no desenvolvimento da espécie, já que os muçulmanos e os judeus não comem porco. Que cuidados têm na receção dos animais na exploração? Vacinação, desparasitação, boas condições
de água e bem-estar. Usamos até 6 tipos de ração diferentes consoante a fase do animal, nenhuma delas medicada. Correndo tudo bem, que mortalidade têm? A média anual é 1,3%, número que queremos continuar a melhorar mas do qual nos orgulhamos. Quais são os principais problemas de saúde e bem-estar que tem na exploração? As pneumonias, 80 a 90% dos problemas dos borregos são a nível dos pulmões. Como vê a questão do bem-estar animal? É a coisa mais importante numa exploração. Este ano sentimos o retorno de forma muito nítida, já que dobrámos a área coberta e aumentámos apenas em 30% o número de animais. Desta forma os animais nunca competem pela comida. O índice de conversão aumentou em mais de 10%. Atualmente temos uma área coberta de 25 mil metros quadrados, dos quais 12 mil foram construídos este ano; num parque que tinha 200 borregos passaram a estar só 150. Fizemos isto porque tínhamos a certeza que íamos obter bons resultados. Estamos também a instalar um programa na exploração que nos vai permitir avaliar todos
os indicadores de bem-estar, ao dia (consumo de água, alimentação, amoníaco, CO2), para avaliarmos se há alguma coisa que ainda possa ser melhorada. Queremos perceber melhor os borregos, saber a que horas comem mais, a que horas bebem mais, etc. Quais são os 4 requisitos para se ter sucesso numa engorda? Tempo, tempo, tempo e tempo, e neste tempo todo estar lá. Bons animais, boa alimentação, boa água, boas condições, tudo isso é comprável. Mas ter isso tudo sem tempo, não dá. Os cem anos que estão aqui de experiência, a envolvência, a dedicação, o know-how, é tudo isso que faz com que isto esteja assim. Não há um único fim de semana em que eu ou o meu irmão não estejamos cá. Quais são os vossos objetivos a 5 anos? Que tenhamos todos saúde, se assim for ainda há espaço para crescermos. Temos um projeto muito importante em curso na parte da carne, ao nível da transformação. Neste momento temos as forças todas viradas para esse projeto no matadouro. Quando esse acabar, virá outro. O negócio do matadouro está aqui [na engorda], aqui é que estão “as balas”, é isto que alimenta aquilo. Agora já estamos prontos para ir para aquele lado, mais uma vez a questão do tempo.
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SARA VALEIRAS FERNANDES Engenheira agrónoma LEAF-ISA* s.filipaa@hotmail.com
JOÃO PEDRO BENGALA FREIRE Engenheiro agrónomo Professor Catedrático, LEAF-ISA* jpfreire@isa.ulisboa.pt
ANDRÉ MARTINHO DE ALMEIDA Engenheiro zootécnico Professor Auxiliar, LEAF-ISA* aalmeida@isa.ulisboa.pt
*LEAF-ISA - Instituto Superior de Agronomia, Universidade de Lisboa. Tapada da Ajuda, Lisboa.
PRODUÇÃO | OVINOS
AVALIAR O CRESCIMENTO DE BORREGOS NO PRESENTE TRABALHO, DESENVOLVIDO NA EMPRESA KICANDO, LOCALIZADA EM BENAVENTE, PRETENDEU-SE AVALIAR O CRESCIMENTO DE BORREGOS DAS RAÇAS INRA 401 E SUFFOLK, E BORREGOS DO CRUZAMENTO DESTAS DUAS RAÇAS, NUMA EXPLORAÇÃO OVINA SEMI-INTENSIVA NA ZONA DO RIBATEJO.
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ortugal é um país com uma aptidão natural para a produção de pequenos ruminantes. Tradicionalmente, ovinos e caprinos têm sido explorados em Portugal em sistemas do tipo extensivo ou semiextensivo. Em anos recentes temse assistido a alguma intensificação na produção destes animais. Esta intensificação traduz-se numa estabulação permanente dos animais, com recurso a alimentos comprados ou produzidos na própria exploração. Os sistemas intensivos caracterizam-se também pela existência de efetivos de dimensão considerável, estando muitas vezes associados à produção de leite ovino. No que respeita a animais de aptidão de carne de borrego em Portugal, tal intensificação é ainda relativamente incipiente. No entanto, o potencial para a produção em sistemas intensivos é grande. Nestes sistemas visa-se maximizar o número de borregos produzidos por ovelha, atingindo-se médias superiores a um parto por ano. As ovelhas estão estabuladas permanentemente, sendo de interesse usar raças exóticas de elevado potencial produtivo que, por serem alimentadas com forragem e concentrados não necessitam de estar sujeitas às flutuações
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sazonais. Apesar dos custos elevados (instalações e equipamentos, reprodutores, alimentação, mão de obra, etc.), podem representar uma oportunidade interessante no contexto da produção ovina, tanto para o consumo nacional, como para a exportação de animais vivos. Nestes sistemas usamse frequentemente cruzamentos de raças especializadas, tanto na linha paterna como na linha materna. Num sistema baseado em cruzamentos de raças é importante dar atenção à seleção das linhas paternas e das linhas maternas, existindo várias possibilidades. Recentemente em Portugal, a raça Suffolk (Figura 1) tem surgido como uma possibilidade interessante na linha paterna. Estes animais são originários de Inglaterra e são definidos pela boa conformação de carcaça e qualidade de carne, e crescimento rápido. Relativamente às raças maternas, existe uma grande variedade de possibilidades, desde as raças autóctones a raças exóticas. Em Portugal têm surgido recentemente animais da raça INRA401 (Figura 2), também conhecida como La Romane. Esta raça foi desenvolvida em França pelo INRA (Institut National de la Recherche Agronomique). Tem bom crescimento e boas características maternas,
de conformação e de rendimento de carcaça. Esta raça apresenta uma prolificidade de 2,0, com uma excelente capacidade reprodutiva em contra estação e boa produção de leite. A implantação das raças Suffolk e INRA401 em Portugal é ainda relativamente incipiente, sabendo-se pouco sobre a performance produtiva, nomeadamente sobre a evolução dos seus pesos vivos, ou sobre a caracterização morfológica destas raças ou dos seus cruzamentos (Figura 3). A caracterização morfológica é um assunto com um interesse bastante grande na medida em que permite inferir aspetos tais como o peso vivo (PV) dos animais. Com efeito, alguns estudos demonstram uma elevada correlação entre o PV do animal e determinadas medidas corporais. Estas medições biométricas podem ser facilmente recolhidas recorrendo a uma fita métrica. O presente trabalho foi desenvolvido na empresa Kicando, localizada em Benavente. A exploração é caraterizada pela sua produção semi-intensiva de ovinos de carne das raças INRA401 e Suffolk, e do cruzamento destas duas raças. A empresa possui um ovil (Figura 4) com caraterísticas
Avaliação do crescimento de borregos INRA 401, Suffolk e Cruzamentos
FIGURA 1 ANIMAL DE RAÇA SUFFOLK
FIGURA 2 OVELHAS INRA401
FIGURA 3 OVELHA INRA401 COM BORREGO CRUZADO
FIGURA 4 VISTA DO OVIL DA EXPLORAÇÃO
"NUM SISTEMA BASEADO EM CRUZAMENTOS DE RAÇAS É IMPORTANTE DAR ATENÇÃO À SELEÇÃO DAS LINHAS PATERNAS E MATERNAS" distintas das do maneio tradicional que usualmente se encontram neste género de exploração. Através dum corredor central é distribuído o alimento fornecido aos animais, com auxílio dum trator. O objetivo deste trabalho consiste na avaliação do crescimento de borregos das raças INRA 401, Suffolk e de borregos do cruzamento destas duas raças, numa exploração ovina semi-intensiva na zona do Ribatejo. Uma vez que estas raças são pouco comuns em Portugal, complementou-se o estudo com várias medições morfológicas com o intuito de se avaliar o crescimento dos borregos do ponto de vista corporal. MATERIAIS E MÉTODOS Para a elaboração deste estudo, foi necessária a realização de um trabalho de campo, realizado na empresa Kicando, de forma a recolher todos os dados necessários, como o peso e as medições corporais dos animais, desde os 0 dias aos 120 dias de idade. Um dos parâmetros mais utilizados para avaliar o crescimento dos animais, assim como o resultado financeiro do ciclo de produção, é o ganho médio diário (GMD), dado pela seguinte equação: GMD(g/dia)=((peso atual do animal(g)-peso anterior do animal(g)))/(nºde dias entre as duas pesagens). Na obtenção e avaliação do GMD dum animal, é importante terem-se em consideração alguns fatores, tais como: se os animais foram pesados em jejum, o tempo de jejum, e se foi retirado só o alimento ou se também houve restrição da água. Como estudo complementar, realizaram-se sete medições biométricas, como se pode verificar nas figuras 5 e 6.
FIGURA 5 MEDIÇÕES MORFOLÓGICAS EM OVINOS: ALTURA NO FINAL DO PESCOÇO (HN), ALTURA ATÉ Á GARUPA (HC), ALTURA ATÉ AO PEITO (HB), COMPRIMENTO DO CORPO (BL) E A CIRCUNFERÊNCIA TORÁCICA (TC).
FIGURA 6 MEDIÇÕES MORFOLÓGICAS EM OVINOS: LARGURA DO PEITO (BW), LARGURA DA GARUPA (RW).
Para a análise estatística dos pesos dos borregos, foi utilizado o modelo não-linear de Gompertz, Y=Ae^(-Be^(-Kt) )+ε, em que Y é o peso corporal à idade t; A é o peso à idade adulta; B é uma constante de integração, relacionada aos pesos iniciais de Y e t; e K é interpretado como taxa de maturação. Depois de selecionado o modelo, calculou-se a taxa de crescimento absoluta (TCA), obtida a partir da primeira derivada do modelo ajustado (modelo não-linear de Gompertz), em relação ao tempo. (dY/dt)=AKBe^(-Kt) e^(-Be^(-Kt)). A TCA é, na realidade, o ganho de peso obtido por unidade de tempo (g/dia), como neste caso o tempo está em "dia", representa o ganho de peso médio diário. Para a análise estatística das medidas morfológicas, os dados foram tratados estatisticamente recorrendo ao uso do programa SAS (SAS, 1991), utilizando o modelo linear geral (GLM). Este é um procedimento da ANOVA em que os cálculos são realizados utilizando uma abordagem de regressão dos mínimos quadrados para descrever a relação estatística entre um ou mais preditores (Bw, Rw, Hn, Hc, Hb, Bl, Tc) e uma variável continua (tempo, em dias). RESULTADOS E DISCUSSÃO A Tabela 1 (ver página seguinte) ilustra os resultados obtidos do estudo feito com os pesos dos borregos ao longo do seu crescimento, durante 120 dias, das três diferentes raças em estudo, INRA 401 (n=5, 3 fêmeas e 2 machos), Suffolk (n=9, 6 fêmeas e 3 machos) e borregos cruzados destas duas raças (n=65, 28 fêmeas e 37 machos). Com base nos valores apresentados, os pesos das fêmeas correspondem a 63% do peso dos
…
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Avaliação do crescimento de borregos INRA 401, Suffolk e Cruzamentos
TABELA 1 RESULTADOS DOS PESOS DOS BORREGOS DAS DIFERENTES RAÇAS EM ESTUDO, INRA 401, SUFFOLK E CRUZADOS Sexo
a
Raça
Erro
p
♂ (n=42)
♀ (n=37)
I (n=5)
S (n=9)
C (n=65)
SEM's
Sexo
Raça
80,05
51,59
45,88
86,08
65,50
4,05
0,0003
0,0896
b
2,84
2,55
2,69
2,57
2,83
0,05
0,0047
0,2498
k
0,013
0,015
0,016
0,013
0,014
0,005
0,1279
0,4070
Legenda: a – peso à idade adulta; b – constante de integração, relacionada aos pesos iniciais do animal e sem interpretação lógica bem definida, valor estabelecido pelos valores iniciais de Y e t da equação de Gompertz; k – taxa de maturação; ♂ - macho; ♀ - fêmea; I – raça INRA 401; S – raça Suffolk; C – cruzado de INRA 401 com Suffolk; SEMs – erro associado às variáveis; p – efeito do sexo/raça nos parâmetros a/b/k. Valores de p inferiores a 0,05 são considerados significativamente diferentes.
FIGURA 7 CRESCIMENTO DOS BORREGOS SUFFOLK EM 120 DIAS 60 50
Peso (kg)
40 30 20 10 0
0 20 40 60 80 100 120 140 Dias M
F
Exponencial (M)
Exponencial (F)
FIGURA 8 CRESCIMENTO DOS BORREGOS INRA 401 EM 120 DIAS 70 60
Peso (kg)
50 40 30 20 10 0
0 20 40 60 80 100 120 140 Dias M
F
Exponencial (M)
Exponencial (F)
FIGURA 9 CRESCIMENTO DOS BORREGOS CRUZADOS EM 120 DIAS 60 50
Peso (kg)
40 30 20 10 0 0 20 40 60 80 100 120 140 Dias M
14
F
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Exponencial (M)
Exponencial (F)
…
machos. Relativamente às raças, os pesos dos borregos cruzados correspondem a 76 % dos da raça Suffolk, enquanto que, em relação aos INRA 401, os pesos dos borregos cruzados foram 42,8 % maiores. Relativamente ao efeito do sexo no peso, e tal como expectável, observou-se que as fêmeas atingiram um peso à maturidade inferior em comparação aos machos. As figuras 7, 8 e 9 ilustram os pesos obtidos dos animais ao longo dos 120 dias, das diferentes raças em estudo, complementando a tabela anterior para a obtenção de conclusões deste trabalho. Na figura 7, relativa aos borregos Suffolk, tanto os machos como as fêmeas apresentaram pesos entre os 40 e os 50 kg aos 120 dias, de acordo com os dados existentes, o esperado à idade adulta era de 86 kg. Esta diferença pode ser explicada pela baixa taxa de maturação relativamente aos INRA 401. Não querendo dizer que estes animais não atinjam este valor, mas sim que demoraram mais tempo. Na figura 8, relativa aos borregos INRA 401, observa-se que tanto os machos como as fêmeas apresentam 30 kg aos 120 dias, pelo que poderá ser esperado que estes atinjam os 45,85 kg na idade adulta. Em relação aos PV dos borregos cruzados, ilustrados na figura 9, apresentam uma menor dispersão dos pontos, devido ao elevado efetivo de animais cruzados. Aos 120 dias, as fêmeas possuíam em média 30 a 40 kg e os machos 40 a 50 kg, sendo que, segundo a equação de Gompertz, o peso à maturação é de 65,50 kg. Em comparação com os animais Suffolk, apresentam uma taxa de maturação muito semelhante, mas os borregos resultantes do cruzamento das raças encontravam-se mais próximos de atingir o peso adulto estimado. Finalmente, na figura 10 observa-se uma combinação das curvas para os três genótipos, constatando-se que os animais de raça Suffolk são os que atingem pesos superiores e os INRA 401 os que atingem pesos inferiores, apresentando os cruzados valores intermédios entre as duas raças. Na tabela 2 são representadas as médias relativas aos resultados obtidos ao longo dos 120 dias de estudo, em que foram feitas as diferentes medições morfológicas nos borregos uma vez por semana. Nos borregos INRA 401, são as medidas Bw e Rw (largura do peito e largura da garupa) as que mais variam, enquanto que as medidas Hn, Hc e Hb não divergem muito. Em relação às variáveis Bw e Rw, como esperado, são semelhantes, visto que traduzem a largura do peito e a largura da garupa, pela proporcionalidade destas medidas. Estes resultados ilustram a fisiologia que normalmente um animal INRA 401 apresenta: um corpo longo e arredondado, pernas bem desenvolvidas e um peito profundo. No caso dos INRA
…
Avaliação do crescimento de borregos INRA 401, Suffolk e Cruzamentos
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Avaliação do crescimento de borregos INRA 401, Suffolk e Cruzamentos
… 401 e dos animais cruzados, estas
CONCLUSÕES E PERSPETIVAS FUTURAS Este estudo constituiu uma primeira aproximação, em Portugal, à temática dos cruzamentos entre a raça INRA401 utilizada em linha materna e a raça Suffolk utilizada em linha paterna. Avaliámos os crescimentos dos animais resultantes destes cruzamentos com as raças que lhe deram origem, desde o nascimento até aos 120 dias. Como seria de esperar, os animais cruzados obtiveram pesos médios intermédios entre os da raça Suffolk e os da raça INRA401. Paralelamente, as medidas morfológicas realizadas espelharam de certa forma esta realidade. Como complemento a este estudo, seria interessante realizar medições das características da carne e da carcaça nomeadamente sobre o rendimento de carcaça e a percentagem de partes nobres da mesma. Finalmente, e como perspetiva futura, teria interesse contrastar as curvas de crescimento dos borregos cruzados com as curvas de crescimento de outros cruzamentos com outras linhas paternas pesadas como, por exemplo, a Ile de France, o Dorper ou o Texel.
FIGURA 10 BORREGOS CRUZADOS, INRA 401 E SUFFOLK 60 50 40 Peso (kg)
medidas são semelhantes, mas os Suffolk destacaram-se por apresentarem uma média superior, visto que apresentam uma conformação corporal ótima para a produção de carne. As variáveis Bl e Tc foram as medidas que mais variaram entre as raças, ambas são muito superiores nos animais Suffolk pois traduzem o comprimento do corpo e a circunferência torácica. Os borregos INRA 401 e os cruzados são muito semelhantes entre si, apesar dos primeiros terem um desvio padrão superior aos cruzados. Logo, há uma maior homogeneidade nas medidas morfológicas nos borregos resultantes do cruzamento em estudo (INRA 401 X Suffolk). Embora se deva salientar que o efetivo de borregos cruzados é bastante superior ao dos INRA 401, o que pode influenciar estes resultados. Seria expectável que o uso de carneiros Suffolk em cruzamentos proporcionasse uma melhoria das características morfológicas nos primeiros partos. No caso em estudo, verificou-se que os borregos adquiriram caraterísticas relativamente semelhantes à linha materna, no que diz respeito às diferentes medidas morfológicas.
30 20 10 0 0 20 40 60 80 100 120 140 Dias Cruzados
INRA 401
Suffolk
TABELA 2 RESULTADOS OBTIDOS DAS MEDIDAS MORFOLÓGICAS PARA AS DIFERENTES RAÇAS DE BORREGOS INRA 401 (n=5)
CRUZADOS (n=65)
SUFFOLK (n=9)
SEM's
p
< 0,0001
Média
DP
Média
DP
Média
DP
Bw
43,39a
2,23
44,13a
0,62
48,09b
1,67
0,57
Rw
48,09a
2,35
47,02a
0,66
50,42b
1,76
0,60
< 0,0001
Hn
49,13a
1,72
49,52a
0,48
51,39b
1,29
0,43
< 0,0001
Hc
50,03a
1,84
49,55a
0,51
51,33b
1,38
0,46
< 0,0001
Hb
32,03a
1,42
30,63b
0,40
32,16a
1,06
0,36
< 0,0001
Bl
53,91a
2,50
53,77a
0,70
58,52b
1,87
0,64
< 0,0001
Tc
73,21a
3,16
71,63b
0,88
79,18c
2,37
0,83
< 0,0001
Legenda SEMs – Standard Error of Mean, Erro Padrão da Média; Bw - largura do peito; Rw largura da garupa; Hn - altura no final do pescoço; Hc - altura até à garupa; Hb - altura até ao peito; Bl - comprimento do corpo; Tc - circunferência torácica. Valores de p inferiores a 0,05 são considerados significativamente diferentes. DP – Desvio Padrão. Médias com letras diferentes indicam diferenças significativas (p < 0.05).
Agradecimentos: Os autores agradecem à empresa Kicando (Benavente) todas as facilidades concedidas e toda a ajuda na realização deste trabalho. Para mais informações, contactar A M Almedida em: aalmeida@isa.ulisboa.pt.
"ESTE ESTUDO CONSTITUIU UMA PRIMEIRA APROXIMAÇÃO, EM PORTUGAL, À TEMÁTICA DOS CRUZAMENTOS ENTRE A RAÇA INRA401 UTILIZADA EM LINHA MATERNA E A RAÇA SUFFOLK UTILIZADA EM LINHA PATERNA." 16
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Em 2019, a dedicação do produtor Rúben Dionísio foi largamente recompensada. Nos três lotes inseminados, com aproximadamente 30 fêmeas cada, obteve taxas de gestação de 61%, 61,1% e 58%.
O rebanho Merino do produtor Rúben Dionísio conta atualmente com 220 fêmeas em linha pura.
GENÉTICA | OVINOS
INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL NA RAÇA MERINA 2019 FOI UM ANO DE SUCESSO: REFLEXO DO TRABALHO DE EQUIPAS SÓLIDAS E QUE TÊM ACUMULADO CONHECIMENTO AO LONGO DOS ANOS, A MÉDIA DE GESTAÇÃO ALCANÇADA À INSEMINAÇÃO FOI, EM 2019, DE 50% NO MERINO BRANCO E 40% NO MERINO PRETO, ENTRE AS 500 FÊMEAS INSEMINADAS.
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Inseminação artificial na raça Merina
LUÍS CAPELA Doutorando na área da reprodução de bovinos Faculdade de Medicina Veterinária capelavet@gmail.com
F
ruto de constantes desenvolvimentos e muita dedicação para o aperfeiçoamento técnico dos programas de melhoramento, 2019 revelou-se um ano de sucesso no melhoramento genético das raças autóctones Merina branca e Merina preta. A equipa da ANCORME (Associação Nacional de Criadores de Ovinos de Raça Merina), num trabalho simbiótico com o CRHA (Centro de Reprodução da Herdade da Abóbada) e a Universidade de Évora, alcançou no passado ano os melhores resultados desde que iniciou a inseminação artificial ao abrigo do projeto "Apoio técnico aos programas de conservação e melhoramento genético em ruminantes ALT20-03-0246-FEDER-000017". Reflexo do trabalho de equipas sólidas e que têm acumulado conhecimento ao longo dos anos, a média de gestação alcançada à inseminação foi, em 2019, de 50% na Merina branca e 40% para a Merina preta, entre as 500 fêmeas inseminadas. Os resultados, que estão ombro a ombro com o que de melhor se faz no Mundo, demonstram o futuro da IA nos programas de melhoramento como ferramenta ao dispor dos produtores, os principais beneficiados. SOBRE A ANCORME A ANCORME foi constituída no final de maio de 1990 e tem-se dedicado ao trabalho de registo e melhoramento das duas Raças Merinas autóctones. No período de 1990 a 1994, a Associação dedicou-se quase
exclusivamente à Raça Merina Branca, com apreciação de múltiplos rebanhos da região do Alentejo e sua posterior admissão no Registo Zootécnico dos animais (ovelhas e carneiros). Em 1994 foi também incluída no trabalho da Associação a Raça Merina Preta. Atualmente encontram-se inscritos nos Livros de adultos, no caso do Merino Preto, 822 machos e 15354 fêmeas, em 65 criadores; no caso do Merino Branco estão inscritos 652 machos e 10621 fêmeas, em 35 criadores. A Associação tem utilizado, desde 2013 e no âmbito do plano de melhoramento promovido junto dos seus associados, a inseminação artificial (IA) com o objetivo de introduzir nas explorações reprodutores geneticamente superiores (machos e fêmeas) e que conduzem a um progresso genético nas raças. Para isso desenvolveu parcerias com o INIAV- Fonte Boa, que utiliza a informação de campo recolhida pela ANCORME e determina anualmente os valores genéticos para todos os animais inscritos nos livros. Tem também uma parceria com o CRHA que se responsabiliza pelo processamento, recolha, avaliação e aplicação do sémen. Antes de dar inicio ao protocolo de IA estabelecido, é constituído um calendário que envolve e compromete as três entidades: a ANCORME, o CRHA e o criador. São verificadas as condições de maneio nas explorações aderentes, e selecionados e identificados com coleira os animais a participar, de acordo com: - idade entre os 2 e 6 anos; - valor genético para efeitos maternos. (VGPDma) quanto maior melhor. No caso das fêmeas não primíparas: - condição corporal 2.5-4; - bom estado sanitário. INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL De todas as vantagens, mais ou menos teóricas, que se podem enumerar, há uma bastante prática, objetiva e realista: melhorar a genética do efetivo! Todos os produtores querem melhorar a genética do seu rebanho, certo? Porquê? Porque é sinónimo de aumentar a produtividade, além de conferir prestígio. Para isso, a inseminação artificial é uma excelente ferramenta, exigindo relativamente pouco trabalho. Se bem elaborada oferece resultados a curto prazo, como veremos mais à frente num caso concreto. Nesta espécie, mais que nos bovinos, a titulo de exemplo, a inseminação é dificultada pela anatomia do animal, a qual praticamente impossibilita a deposição do sémen no interior do útero e exige técnicos especializados. Desta forma, a utilização de
sémen criopreservado fica limitada, dando-se preferência ao sémen fresco ou refrigerado. O progresso genético é possibilitado rapidamente pois, ao reduzir o número de macho necessários, podemos escolher os melhores dos melhores. Outra vantagem, por muitos erradamente desvalorizada, é a incorporação de nova genética no efetivo, sem que para isso seja necessário introduzir novos animais, muitas vezes portadores de agentes infeciosos (doenças) indesejáveis ou inexistentes na exploração. Uma exploração fechada (onde não entram animais novos) é muito mais segura e controlável. UMA EXPLORAÇÃO EXEMPLO A exploração de Rúben Dionísio, localizada em Évora, teve início em 2012. Até 2015 possuía um efetivo cruzado de raças melhoradas, Sullfolk, Charolais e P3, altura em que optou por converter todo o efetivo em Merina branca. Decidiu optar pela rusticidade, o objetivo era o de fazer mais facilmente 3 partos em 2 anos, na tentativa de melhorar a produtividade. Para isso adquiriu 50 animais de refugo para aproveitar a sua descendência, comprando algum tempo depois mais 70 animais. Assim começou o seu rebanho Merino que atualmente já conta com 220 fêmeas em linha pura. No outono de 2017 decidiu aproveitar os serviços prestados pela ANCORME e implementar a inseminação artificial. A primeira tentativa não foi bem sucedida, sendo a taxa de gestantes bastante precária. Mas, e porque há sempre uma boa dose de perseverança no progresso, nos anos seguintes voltou a tentar, melhorando a taxa de ano para ano. Em 2019, a sua dedicação foi largamente recompensada. Nos três lotes inseminados, com aproximadamente 30 fêmeas cada, obteve taxas de gestação de 61%, 61,1% e 58%. A uma média da ordem dos 60% somou ainda dois primeiros lugares na FIAPE (Estremoz), respetivamente nas categorias "Borrego" e "Borregas", ambos vencidos com animais nascidos de IA. Em apenas 4 anos dedicados à raça merina, mas com um enorme sentido de "bem fazer", esta exploração exemplar é prova de que a inseminação artificial permite um progresso genético significativo, mesmo a curto prazo. No presente, as jovens promessas já correm na sua exploração, filhos de ovelhas e carneiros nascidos de inseminação. Estamos todos ansiosos por ver o seu desempenho. Artigo feito em colaboração com o INIAV e a Universidade de Évora. Agradecimentos: à equipa da ANCORME, CRHA (em especial ao Dr. Carlos Bettencurt e à Dra. Ana Queirós), à Universidade de Évora (em particular ao Prof. Ricardo Romão).
"OS RESULTADOS, QUE ESTÃO OMBRO A OMBRO COM O QUE DE MELHOR SE FAZ NO MUNDO, DEMONSTRAM O FUTURO DA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL NOS PROGRAMAS DE MELHORAMENTO." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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PRODUÇÃO | CAPRINOS
ALEITAMENTO ARTIFICIAL VS. NATURAL EM CABRITOS NESTE ARTIGO, FAZEMOS UMA ABORDAGEM ÀS DIFERENÇAS ENTRE O ALEITAMENTO NATURAL E O ALEITAMENTO ARTIFICIAL, E APRESENTAMOS O EXEMPLO CONCRETO DE UMA EXPLORAÇÃO NO CONCELHO DE REGUENGOS DE MONSARAZ CARACTERIZADA COMO SENDO DE APTIDÃO LEITEIRA EM REGIME INTENSIVO, COM ACESSO A PASTAGEM.
A
RAQUEL LOURINHÃ Eng. Zootécnica Plantivet raquellourinha@plantivet.com
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
alimentação das crias na primeira fase da sua vida é extremamente importante para a rentabilidade de uma exploração. Alimentar as crias de forma adequada permite um desenvolvimento corporal mais rápido e atingir o desmame com idades mais precoces, o que possibilita uma redução nos custos de produção. As explorações em regime extensivo e semi-intensivo, e/ou com efetivos de pequena dimensão, optam normalmente pelo aleitamento natural, no qual os cabritos
permanecem com as cabras, desde o nascimento até ao desmame. Nas explorações leiteiras em regime intensivo e com efetivos de maior dimensão, recorre-se habitualmente ao aleitamento artificial, sendo que os cabritos são separados das cabras após o nascimento e aleitados com leite de substituição. A opção por um sistema de aleitamento natural ou de aleitamento artificial deve ter em conta as condições existentes na exploração para a realização de aleitamento artificial e os custos associados a essa opção. No aleitamento artificial, os principais
Aleitamento artificial vs. natural em cabritos
aspetos a ter em conta são a ingestão de colostro, as instalações, os equipamentos e a adaptação dos cabritos à amamentadora. A IMPORTÂNCIA DO COLOSTRO O colostro é a substância segregada pela glândula mamária nos primeiros dias após o parto. A sua ingestão é de extrema importância para o cabrito, fornecendo nutrição e imunidade. Deve ser assegurada independentemente do sistema de aleitamento escolhido. Para conferir imunidade passiva ao cabrito, o colostro deve ser ingerido nas primeiras 6 horas de vida. Após 12 horas de vida, a capacidade de absorção das imunoglobulinas pelo cabrito fica significativamente reduzida, pois os enterócitos na sua maturação tornam-se impermeáveis à passagem das imunoglobulinas. Para além disto, a concentração de imunoglobulinas no colostro vai diminuindo ao longo das 24 horas após o parto. A quantidade de colostro adequada para um cabrito é de cerca 5% do peso vivo, em 2 doses diárias, durante os 2 primeiros dias de vida, ou seja, um cabrito que ao nascimento tenha 3 kg, necessitará no mínimo de 300 ml de colostro por dia. Em sistema de aleitamento artificial, o colostro geralmente é fornecido ao cabrito através de biberão ou sonda gástrica. Após ser ordenhado, o colostro pode ser pasteurizado, em garrafas colocadas em banho-maria durante 1 hora à temperatura constante de 56ºC. A pasteurização tem como vantagem a prevenção da transmissão de doenças entre a cabra e as suas crias. O colostro após ser pasteurizado é arrefecido e armazenado em congelação. Antes de ser fornecido aos cabritos, o colostro deve ser descongelado em refrigeração e depois aquecido em banho-maria de forma a preservar as qualidades nutritivas do mesmo. INSTALAÇÕES E EQUIPAMENTOS PARA O ALEITAMENTO ARTIFICIAL Nos sistemas de alimentação artificial, os cabritos são geralmente instalados num espaço separado, que pode ou não ser climatizado, com ventilação natural ou forçada. Um cabrito
necessita de uma área com cerca de 0,25 m2. A temperatura adequada para um cabrito varia com a idade, ao nascimento essa temperatura é próxima dos 30ºC, durante a primeira semana de vida situa-se entre os 20ºC e os 25ºC e vai diminuindo até à altura do desmame entre os 13ºC e os 15ºC. Para os cabritos, o frio é mais prejudicial do que o calor, podendo mesmo pôr em risco a sua sobrevivência, devido à perda de calor corporal e consequente perda de energia. A manutenção de uma temperatura adequada no interior das instalações para cabritos pode ser feita com recurso a aquecedores ou lâmpadas de infravermelhos. A ventilação das instalações é importante, para efetuar a renovação do ar e evitar acumulação de gases tóxicos no interior do cabriteiro, contribui também para a regulação da temperatura no interior das instalações. No verão é necessário um maior caudal de ventilação do que no inverno, isto porque, no verão a diferença entre a temperatura interior e exterior é menor. Os cabritos em aleitamento artificial podem ter maior tendência para problemas de saúde, principalmente relacionados com o trato gastrointestinal, devido a uma maior concentração de crias no mesmo espaço, o que aumenta a concentração de microrganismos no ambiente. As camas destinadas aos cabritos podem ser de palha ou em estrado plástico com fossa para dejetos por baixo. As camas de palha têm a vantagem de ser mais confortáveis para o cabrito, embora mais difíceis de desinfetar em caso de contaminação por microrganismos. Enquanto, as camas com estrado plástico, por permitirem o escoamento das fezes e urinas, são mais higiénicas e facilmente limpas e desinfetadas. AMAMENTADORA A amamentadora é um equipamento elétrico que possui uma entrada de água, um depósito para o leite de substituição em pó e uma cuba com agitador, onde é feita a mistura da água com o leite em pó. O leite é depois distribuído aos cabritos por meio de tubos de borracha que estão ligados a chuchas. A amamentadora pode ser calibrada em termos
de temperatura e concentração do leite. A quantidade de leite em pó a utilizar por cada litro de água depende das instruções fornecidas pela marca do fabricante do leite de substituição. Para evitar problemas digestivos nos cabritos, principalmente diarreias, o leite deve ser fornecido a uma temperatura de 40ºC e a uma concentração constante. Ao utilizar a amamentadora, é necessário calibrar após cada limpeza e desinfeção e efetuar manutenções regulares ao equipamento. A lavagem e desinfeção da cuba, tubos e chuchas da amamentadora pode ser efetuada com água e uma solução detergente e desinfetante à base de hipoclorito de sódio. ADAPTAÇÃO DO CABRITO AO SISTEMA DE ALEITAMENTO ARTIFICIAL Para facilitar a adaptação do cabrito ao aleitamento artificial, este deve ser retirado à cabra o mais cedo possível, antes do estabelecimento da relação mãe-cria, que pode dificultar a posterior adaptação dos cabritos ao sistema de alimentação artificial. A adaptação do cabrito à amamentadora deve ser realizada várias vezes por dia nos primeiros dias de vida, em ambiente calmo. Esta adaptação é facilitada se o cabrito estiver sem comer algumas horas e se existirem no mesmo parque outras crias já habituadas ao sistema de aleitamento artificial. DESMAME O desmame é uma fase crítica no desenvolvimento dos cabritos. A altura a realizar o desmame depende de vários fatores como a idade, raça, peso vivo e do desenvolvimento corporal do cabrito. A opção pelo aleitamento natural ou artificial tem associada vantagens e desvantagens, descritas na Tabela 1. EXEMPLO DE UMA EXPLORAÇÃO CAPRINA A exploração está localizada no concelho de Reguengos de Monsaraz e carateriza-se como uma exploração de aptidão leiteira em regime intensivo com acesso a pastagem.
…
TABELA 1 VANTAGENS E DESVANTAGENS DO ALEITAMENTO NATURAL Aleitamento natural
Vantagens
Desvantagens
Mais natural
Diminuição da quantidade de leite no tanque
Menor necessidade de equipamentos
Problemas de afilhamento
Menor necessidade de aclimatização
Lotes de cabritos menos homogéneos
Menor necessidade de mão-de-obra Menor taxa de mortalidade
"A QUANTIDADE DE COLOSTRO ADEQUADA PARA UM CABRITO É DE CERCA 5% DO PESO VIVO, EM 2 DOSES DIÁRIAS, DURANTE OS 2 PRIMEIROS DIAS DE VIDA." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Aleitamento artificial vs. natural em cabritos
… Atualmente tem um efetivo com cerca de
200 cabras e 5 bodes reprodutores, de raça murciano-granadina, incluindo cerca de 160 cabras em lactação. A exploração recorre ao aleitamento natural e ao aleitamento artificial. A escolha do tipo de aleitamento está dependente de factores como cumprir contratos de fornecimento de leite e a disponibilidade de mão-de-obra. INSTALAÇÕES PARA ALEITAMENTO ARTIFICIAL Em termos de instalações para as crias, a exploração possui um cabriteiro e um parque destinado às crias, ambos localizados à entrada do cabril. O cabriteiro tem uma área de 10 m2 em estrado plástico, com capacidade para cerca de 40 cabritos. Por baixo do estrado, encontra-se instalada uma fossa para escoamento de fezes e urinas. A ventilação do espaço é efetuada através de janelas e o aquecimento no inverno, é feito com recurso a um aquecedor. No interior do cabriteiro está instalada uma
amamentadora (Amamentadora JR, modelo AG-21). No exterior do cabriteiro existe um parque com cerca de 25 m2, com cama de palha, normalmente utilizado para preparar os cabritos para o desmame. Neste parque os cabritos tem à sua disposição água, ração de iniciação e palha à descrição. ÉPOCA DE PARIÇÃO COM ALEITAMENTO NATURAL A época de parição em aleitamento natural decorreu entre maio e junho de 2018 e teve com resultado o nascimento de 86 crias (39 fêmeas e 47 machos). À nascença todas as crias foram identificadas com um brinco e o umbigo foi desinfectado. Os cabritos ficaram com as cabras desde o nascimento até ao desmame. Durante o tempo de aleitamento realizou-se apenas uma ordenha diária. As cabras primíparas e cabras com partos gemelares, por vezes rejeitam uma ou mais crias, para auxiliar o afilhamento, a cabra com as crias é colocada num parque separada
das restantes cabras. A partir do 7º dia de idade, para se poder aproveitar mais leite na ordenha, os cabritos passam a noite num parque separados das cabras, com ração de iniciação e palha à descrição. Na altura do desmame aos 45 dias, estavam presentes na exploração 77 crias (37 fêmeas e 47 machos). ÉPOCA DE PARIÇÃO COM ALEITAMENTO ARTIFICIAL A época de aleitamento artificial decorreu entre janeiro e março de 2018 e teve como resultado o nascimento de 149 crias (80 fêmeas e 69 machos). Os cabritos após o nascimento ingeriram o colostro nas cabras e de seguida foram instalados no cabriteiro e/ou num parque de cria, no exterior do cabriteiro. O leite de substituição foi fornecido à descrição com recurso a uma amamentadora. A habituação dos cabritos ao aleitamento artificial foi efetuada 2 vezes ao dia. Verificou-se que quando os cabritos ficaram com as cabras
"NESTA EXPLORAÇÃO, O ALEITAMENTO ARTIFICIAL TEM AINDA A DESVANTAGEM DA ELEVADA TAXA DE MORTALIDADE."
TABELA 2 RESULTADOS DA EXPLORAÇÃO COM ALEITAMENTO NATURAL VS. ALEITAMENTO ARTIFICIAL
TABELA 3 COMPARAÇÃO DO CUSTO DO ALEITAMENTO NATURAL COM O ALEITAMENTO ARTIFICIAL
Tipo de aleitamento
Natural
Artificial
Tipo de aleitamento
Natural
Artificial
Nascimentos (nº de crias)
86
149
16,31 €
39
80
Custo de alimentação do cabrito até aos 45 dias
31,50 €
Fêmeas Machos
47
69
Custo com a sanidade
2€
2,6 €
Desmame (nº de crias)
77
50
Custo com a mão-de-obra
4,5 €
22,5 €
Fêmeas
37
34
TOTAL
38 €
41,41 €
Machos
40
16
Taxa mortalidade ao desmame
9,3 %
68,5 %
Fêmeas
5,1 %
61,3 %
Machos
12,8 %
76,8 %
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Aleitamento artificial vs. natural em cabritos
mais de 12 horas após o nascimento, a adaptação do cabrito à amamentadora foi mais lenta e difícil. Em condições normais, ao 3º dia de habituação ao aleitamento artificial, quase todos os cabritos estavam adaptados à amamentadora. Aos 45 dias, quando se efetuou o desmame, estavam presentes na exploração 50 crias (34 fêmeas e 16 machos) (Tabela 2). No caso desta exploração, a taxa de mortalidade em aleitamento artificial foi muito superior à registada em aleitamento natural. Estes resultados devem-se possivelmente, a ingestão insuficiente de colostro pelos cabritos no sistema de aleitamento artificial e ao dimensionamento inadequado das instalações. A elevada concentração de cabritos causou dificuldades de acesso das crias à amamentadora e aumentou em muito a carga infecciosa. COMPARAÇÃO DOS CUSTOS ENTRE O ALEITAMENTO NATURAL E O ALEITAMENTO ARTIFICIAL Atualmente o preço médio de um 1 litro de leite de cabra ronda os 0,70€ e um saco de 25 kg leite de substituição de boa qualidade foi adquirido a 56,56€. Na exploração acima descrita, para o aleitamento artificial, utilizou-se o leite
de substituição para borregos e cabritos da marca Elvor, com uma concentração para cabritos de 160g de leite em pó para 1 litro de água. Em termos de consumo de leite, considerou-se que um cabrito até ao desmame, aos 45 dias, consome cerca de 1 litro por dia. No aleitamento natural a mão-de-obra é reduzida, sendo apenas necessário separar os cabritos das cabras antes da ordenha e efetuar algumas tarefas pontuais como a vacinação e desparasitação. Em aleitamento artificial o maneio das crias é mais demorado, sendo necessário despender tempo na habituação dos cabritos à amamentadora e na higienização dos equipamentos e sua calibração. No aleitamento natural, o tempo despendido na exploração com maneio das crias foi de 1 hora por dia, enquanto no aleitamento artificial foi de 5 horas por dia. Para o cálculo dos custos com mão-de-obra considerou-se que 1 hora equivale a 10€. Na criação de um cabrito existem também custos associados à sanidade. Nesta exploração os cabritos são vacinados aos 14 dias de idade e voltam a ser vacinados após 3 a 4 semanas. A desparasitação das crias no aleitamento natural é efectuada a cada 10 dias, enquanto
no aleitamento artificial é semanal. Considerou-se que cada dose de vacina custa 0,70€ e cada dose de desparasitante custa 0,20€. O aleitamento artificial tem um custo de alimentação baixo por cabrito, mas quando se considera a mão-de-obra necessária, os custos aumentam significativamente. Nas condições desta exploração, o aleitamento artificial tem ainda a desvantagem de ter uma elevada taxa de mortalidade (Tabela 2). Para determinar o custo de criação por cabrito em aleitamento natural e artificial (Tabela 3), não foram contabilizados os custos com energia nem com amortizações de equipamentos. Nesta exploração, o aleitamento natural é a opção mais viável, pois não exitem condições adequadas para o aleitamento artificial. O aleitamento natural tem ainda a vantagem de ter um custo de mão-de-obra muito menor do que o aleitamento artificial. Na atual conjuntura em que o preço pago por litro de leite de cabra não é muito elevado, mesmo que existissem condições para o aleitamento artificial, a opção continuaria a ser pelo aleitamento natural, por ter um custo mais baixo. Bibliografia: consultar o autor.
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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PRODUÇÃO | CABRAS DE LEITE
BOAS PRÁTICAS NA RECRIA
NESTE TRABALHO COMPARAM-SE AS RECOMENDAÇÕES DE BOAS PRÁTICAS NA RECRIA DE CABRAS LEITEIRAS, DISPONÍVEIS EM VÁRIOS PAÍSES (FRANÇA, CANADÁ, EUA E AUSTRÁLIA). ESTAS RECOMENDAÇÕES RESULTAM MAIS DE UMA RECOLHA DE “COMO SE FAZ” DO QUE PROPRIAMENTE DA COMPILAÇÃO DE ESTUDOS CIENTÍFICOS. ISTO NÃO QUER DIZER QUE SEJAM RECOMENDAÇÕES POUCO CREDÍVEIS, MAS É IMPORTANTE REFERIR QUE MUITAS (AINDA) NÃO SÃO SUPORTADAS POR EVIDÊNCIA CIENTÍFICA.
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Boas práticas na recria de cabras leiteiras
que podem ser encontrados na internet. O QUE SÃO CONSIDERADAS BOAS PRÁTICAS NA RECRIA DE CAPRINOS DE LEITE – A EXPERIÊNCIA NOUTROS PAÍSES GEORGE STILWELL MédicoVeterinário Faculdade de Medicina Veterinária Universidade de Lisboa
A
s "boas práticas” são boas em múltiplos aspetos. Garantem mais produção, melhores produtos, melhor rendimento, maior saúde e bem-estar animal, maior satisfação profissional e mais sustentabilidade. As boas práticas nascem da experiência pessoal e do conhecimento empírico, mas são obviamente preferíveis se forem sustentadas pela ciência e pela partilha de saberes. A produção de leite de cabra em regime intensivo é uma atividade relativamente recente e que ainda trabalha mais no registo da tal experiência pessoal e conhecimento empírico do que baseada na investigação, até porque esta ainda é bastante escassa. Este pequeno trabalho vem demonstrar um pouco este facto ao apresentar e comparar as recomendações de boas práticas disponíveis em vários países (França, Canadá, EUA e Austrália), que resultam mais de uma recolha de “como se faz” do que propriamente da compilação de estudos científicos. Isto não quer dizer que sejam recomendações pouco credíveis, mas é importante referir que muitas (ainda) não são suportadas por evidência científica. De qualquer maneira o objetivo é apresentar aquilo que outros fazem e que tem demonstrado bons resultados, para que o produtor português possa comparar as suas próprias práticas e verificar se são, de facto, as melhores. Como o espaço é curto e os temas são tantos, irei dividir a exposição em duas partes, ficando a segunda para o próximo número da Ruminantes: I. as boas-práticas na recria; II. as boas-práticas na cabra produtora de leite. Para além disso irei organizar o texto numa forma muito esquemática. Para os mais interessados nos detalhes, apresento no fim a lista dos vários manuais de recomendações,
MATERNIDADES E CUIDADOS NO PARTO Deve existir um local próprio para os partos que deve ser limpo, bem iluminado e ventilado e com cama seca (1,2,5,6). Se possível os partos devem ocorrer no exterior, mas longe dos parques dos animais em produção, excepto no tempo frio ou chuvoso (7). Parques-maternidades devem ter uma baixa densidade de cabras para parir (2). Cama deve ser de palha ou outro material absorvente (1). Necessidade de os partos ocorrerem numa área que seja facilmente visualizada pelo pessoal da exploração nas suas atividades diárias, garantindo que todos os animais são observados no periparto (1,2,6), mas sem serem perturbados (6). Sugere-se a instalação de câmaras ou um plano de visitas às maternidades para garantir monitorização constante (2). Deve estar instituído um protocolo para remoção das placentas (6). CUIDADOS NO PARTO Todos os guias (exceto 4, que é omisso) recomendam a separação imediata do cabrito, e não deixar mamar nas mães, principalmente se estiverem em curso programas de erradicação de doenças (e.g. CAEV, paratuberculose) (1,2,3,5,6,7). Se necessário tapar ponta dos tetos das cabras parturientes com adesivo (2). CUIDADOS DO RECÉM-NASCIDO Esfregar e secar cabrito com uma toalha limpa (2,3,6). Colocar debaixo de luz e manter a temperatura ambiente entre 10-18 ºC (5) ou perto dos 20 ºC (3). Usar secadores de cabelo para secar e aquecer os cabritos em vez de toalhas ou lâmpadas (1). MANEIO DO COLOSTRO Garantir que o colostro é de cabras livres de CAE (6) ou é pasteurizado (1,3,4,5,6). Ou usar colostro de vaca (5,7) ou colostro de substituição (5). Apenas usar colostro congelado e pasteurizado (2). Não usar colostro de substituição, porque não oferece a proteção adequada (2). Não misturar colostros de várias cabras (5) ou de cabras recém-importadas (7). Só usar colostro de cabras secas há 2 meses e de preferência de multíparas (3,7). Usar só o primeiro colostro (2,3). Só usar colostro de alta qualidade com
concentração de IgG >50 g/l (3). Usar só colostro de qualidade que deve ser amarelo e espesso (2) ou usar um colostrometro antes de pasteurizar (1, 2). Colheita higiénica (6). Dar imediatamente (5) ou 1 a 6 horas após o nascimento (2,3,6), ou sempre antes das 8-12 horas (2). O mais cedo possível e sempre antes das 18 horas (1). Administrar 50 ml/kg peso vivo em 4 vezes (5) ou 62,5 g/kg peso vivo em 3 vezes (1) ou 100g/kg peso vivo em duas a três refeições (3), nas primeiras 24 horas de vida. Semelhantemente, 150 ml/kg peso vivo distribuído ao longo das primeiras 24 horas de vida (6). Dar pelo menos 227 gramas (10% peso vivo) na primeira refeição (2). Oferta por biberão com tetina (só entubar cabritos muito fracos com dificuldade em beber por si) (1,2,6). Lavar e desinfectar biberões e tetinas após cada refeição (1). Continuar a dar colostro aos cabritos por 24 horas (1,6) ou 2-3 dias (3,5). ALEITAMENTO Usar leite de substituição (3,5,6,7), leite de vaca (5,7) ou leite acidificado com pH 4,1 a 4,5 (6). Quase todos os guias apenas recomendam seguir instruções dos fornecedores de leite de substituição ou sugerem a concentração de leite em pó de 160-180 g/l (4). Não dar mais de 280-340 ml de leite por dia/ cabrito nas primeiras semanas e não mais que 450 ml/cabrito por refeição a partir dessa idade (1). Mesmo no pico do aleitamento não dar mais de 1 litro (em duas refeições) por cabrito por dia (7). Usar leite de substituição com 24% gordura (4) ou 20-28 % proteína e 16-24 % gordura (1,2). Evitar uso de leites com proteína vegetal (soja) (2) ou leites de substituição de borregos ou vitelos (1). Oferecer leite quente (39 ºC) porque aumenta o consumo (1). Aleitamento deve ser feito com biberão com tetinas e deve ser 4 a 5 vezes ao dia nas duas primeiras semanas e depois 2-3 vezes ao dia até ao desmame (1,6) ou 3 refeições nos primeiros dias e depois 2 refeições até ao desmame (3). Dois manuais recomendam oferta de leite ad libitum (4,7), mas frio para não estimular consumo e assim garantir que os cabritos procuram concentrado (7). Nunca dar leite menos do que 2 vezes ao dia (5). Alternativa em explorações maiores são os alimentadores automáticos (1,3,5,6) com não mais de 20 ou 15 cabritos por tetina (3 e 4, respetivamente) ou leite despejado na manjedoura com cerca 10 cm disponível por cabrito presente no parque (3). Lavar e desinfectar biberões, tetinas e outro
…
"NO ALEITAMENTO, DEVE-SE USAR LEITE DE SUBSTITUIÇÃO, LEITE DE VACA OU LEITE ACIDIFICADO COM PH 4,1 A 4,5." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Boas práticas na recria de cabras leiteiras
…material usado na alimentação por leite,
a seguir a cada refeição (3,4,5,7). A tubagem dos alimentadores automáticos deve ser lavada semanalmente (3). Não usar leite descartado ou de cabras em tratamento (2). CONCENTRADO E FORRAGENS Espaço à manjedoura de 20 cm (3) ou 12-15 cm (4) ou 3-5 cm (6,7), por cabrito. Concentrado próprio duas vezes ao dia a partir dos 8-10 dias (3) ou 21-28 dias (6). Concentrado com proteína bruta 18% (4,7) e com teor energético de 11 MJ/dia (7), a partir das 2 semanas Feno de qualidade (de erva e palatável) a partir dos 10-15 dias de vida (3,4,5,7) ou antes do desmame (6), oferecido 3 vezes ao dia (4). Evitar feno de luzerna antes dos 4 meses – aumenta o risco de timpanismo (4). Evitar feno muito palatável e com semente pois os animais podem comer demais e rejeitar o concentrado (7). Acesso a água fresca e limpa desde sempre (6,7) ou a partir da 1ª semana de idade (3,4,5). SAÚDE E PLANOS DE PROFILAXIA Desinfectar umbigo logo após o nascimento (1,2,3,4,5,6) com tintura de iodo 7% (1,6), solução iodada (2,3) ou clorexidina (2). Repetir passadas 24 horas se houver sinais de infeção (6). Cortar cordões umbilicais muito compridos a poucos centímetros do umbigo (1). Pinçar ou ligar o cordão umbilical se houver hemorragias ou vestígios de sangue vivo no umbigo (6). Injetar vitaminas e minerais segundo um programa veterinário (2,6), nomeadamente selénio e vitamina E (1). Em situações de solos pobres suplementar cabras com selénio e vitamina E (1). Vacinar cabritos às 3 semanas e repetir às 6 semanas contra clostridioses e pasteureloses (1,4). Vacinar cabras no final de gestação contra clostrideos tipo C e D e tétano (1,2,7). Instituir programa de tratamento com coccidiostático às 3 semanas e novamente ao desmame (3). Não usar desparasitantes exceto se houver comprovação laboratorial da presença de ovos de vermes (7). Animais doentes devem ser removidos e isolados do resto do grupo (7). DESCORNA Entre 3 e 14 dias (1,2), a partir dos 12 dias, entre 8 e 12 dias (4), entre 3 e 10 dias (5), antes das 3 semanas (6) ou entre os 3 e 7 dias (7). Todos alertam para a necessidade do botão ser bem evidente. Usar termocautério (1,5,6) e sob orientação veterinária (5). Pressionar instrumento contra a cabeça não mais de 10 segundos e não usar
pasta-caustica (5). Deve-se fazer analgesia segundos indicações do médico-veterinário (6). Colocar spray desinfectante (3). INSTALAÇÕES Evitar sobre-densidade nos parques da recria (1). Manter em pequenos grupos nas duas primeiras semanas e depois passar para parques com maior número (2). Grupos homogéneos: de 15 cabritos em parques de 2x2 metros, com densidade por animal de 0,25 m2 (4); de 20-25 cabritos com densidade 0,25 a 0,30 m2 por animal (3); densidade 0,30 a 0,50 m2/cabrito (5,6). Manter fêmeas separadas de machos (3) pelo menos a partir das 12 semanas (5). Adicionar frequentemente material de cama (palha) limpo e seco (3,4,5,6). Todos os guias recomendam elevado grau de limpeza, higiene, ventilação e conforto térmico nas instalações destinadas à recria. Manter temperatura ambiente entre 12 e 15 ºC (4). Fazer vazio sanitário sempre que possível (1). Evitar entrada de roedores, aves ou outros animais (7). Instalações da recria, pelo menos nas duas primeiras semanas, devem estar longe do local onde estão animais adultos ou cabritos recém-adquiridos (1,2,3). DESMAME Na decisão sobre o momento para o desmame considerar tanto o peso como a idade (6) ou só o peso (1). Desmamar quando o cabrito pesar pelo menos 14 kg e consumir 300 g/dia de forragens e 150-200 g/dia de concentrado (3) ou pesar 2,5 vezes o seu peso ao nascimento (1,5,6) e consumir aproximadamente 150 g/dia (5) ou 115 g/dia (1) de concentrado. Todos recomendam verificar que o cabrito bebe água, rumina e faça fezes bem moldadas. Acesso a água fresca e limpa durante o desmame é essencial (6). A preparação para o desmame deve ser gradual, se possível, a partir das 6 semanas de idade (3,6). Não reduzir concentração do leite de substituição, mas sim a quantidade oferecida (3). No caso de alimentadores automáticos o desmame tem de ser brusco, mas nesses casos deve-se confirmar com cuidado se há consumo suficiente de alimentos sólidos (3,4). Manter a mesma dieta sólida durante uma semana após o desmame, para haver uma transição mais gradual (7). MONITORIZAR O CRESCIMENTO Registar sempre o peso ao nascimento, e fazer pesagens e avaliações da condição corporal durante a recria (4,6).
Não recriar cabritos com peso ao nascimento <3 kg (3). Apontar para peso mínimo ao nascimento de 4,5 kg (único), 4 kg (gêmeos) e 3,3 kg (triplos) (4) ou de 2,7 a 5 kg (1). Objetivos de crescimento: 10 kg aos 30 dias e 16 kg aos 60 dias (20% do peso adulto) (3) ou 14 kg aos 2 meses (4). COMENTÁRIOS FINAIS Muitas das recomendações que apresentamos acima na verdade não encontram grande suporte científico e isso explica algumas variações. Ou seja, resultam da adoção de práticas que a experiência e o bom-senso, parecem suportar. Assim, devem ser vistas apenas como orientações e alertas, destinadas a garantir elevados níveis de saúde, bem-estar e crescimento na recria de caprinos. Outro cuidado a ter na leitura e eventual aplicação de algumas destas recomendações é que elas foram compiladas para as raças leiteiras mais comuns nas explorações comerciais (por exemplo, Saanen e Alpina) e para as condições típicas destes países - França, Canadá, EUA e Austrália. No entanto, é importante referir que estas condições não são muito diferentes dos sistemas de produção intensivos que temos neste momento a funcionar em Portugal. Em suma, este é um pequeno trabalho de recolha e divulgação que pretende dar uma ajuda e boas ideias aos nossos produtores. Lista das publicações consultadas: (1) - University of Wisconsin, Madison, EUA. Hedrich, C., Duemler C., Considine D. Best management practices for dairy goat farmers. 2008. (2) - University of California, Davis, EUA. Carlson, J. Kidding and Kid Rearing. 2014. (3) - INOSYS-Réseaux d’Élevage, Paris, França. INOSYS. L’élevage des chevrettes: recommandations et conseils. 2016. (4) - Institut de l’élevage, Paris, França. Institut de L’Élevage. Les fiches techniques caprines du SudOuest: Place aux chevrettes. 2009. ISBN 978-2-84148-740-0 (5) - Canadian Agri-Food Research Council, Ottawa, Canadá. Recommended code of practice for the care and handling of farm animals – Goats. CARC. 2003. (6) - Ontario Goat, Guelph, Ontario, Canadá. Best Management Practices for Commercial Goat Production. 2014.. (7) - Rural Industries Research and Development Corporation, Canberra, Australia. Abud, G., Arthur Stubbs. Dairy Goat Manual – Second Edition. 2009. ISBN 1 74151 795 8.
"A PREPARAÇÃO PARA O DESMAME DEVE SER GRADUAL, SE POSSÍVEL, A PARTIR DAS 6 SEMANAS DE IDADE." 26
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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ALIMENTAÇÃO | BOVINOS DE CARNE
AS FENOSSILAGENS NA ENGORDA DE NOVILHOS
A UTILIZAÇÃO DE DIETAS COMPLETAS COM INCORPORAÇÃO DE 50% DA MS COMO FENOSILAGENS DE BOA QUALIDADE, PODE PERMITIR ALCANÇAR ÍNDICES DE PRODUTIVIDADE SEMELHANTES AOS DE ALIMENTADOS COM DIETAS COMPOSTAS MAIORITARIAMENTE POR ALIMENTOS CONCENTRADOS, EMBORA COM REDUÇÃO DA EFICIÊNCIA ALIMENTAR. Por José Santos Silva, com a colaboração da equipa do projeto LegForBov | INIAV: Alexandra Francisco; Ana Paula Portugal; João Marques de Almeida; João Paulo Carneiro; Teresa Carita; Teresa Dentinho. CEBAL: Eliana Jerónimo; FMV: Rui Bessa; Susana Alves; Fertiprado: Ana Barradas; João Pedro Pereira; ELIPEC: António José Rodrigues. Fotos Ana Paula Portugal
A
JOSÉ SANTOS SILVA Investigador principal do Polo da Fonte Boa do INIAV jose.santossilva@@iniav.pt
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
maior componente dos custos com a produção pecuária é a alimentação dos animais. Contrariamente às espécies de monogástricos, os ruminantes, devido à sua fisiologia digestiva, são capazes de utilizar alimentos ricos em fibra que são convertidos em produtos animais de elevado valor biológico. O recurso a pastagens e forragens, e a subprodutos da produção agroindustrial na alimentação de ruminantes, reduz a competição com outras espécies pelas fontes alimentares, para além de outros benefícios de ordem económica, social, ambiental e ética. O aumento da área destinada à produção de pastagens biodiversas reduz o impacto negativo da produção de ruminantes na produção de gases
de estufa através do aumento do sequestro de carbono no solo pela incorporação de matéria orgânica de origem vegetal e animal. Esta estratégia consta do Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (107/2019, 2019), a par de outras como a melhoria da alimentação animal e a gestão de estrumes, como alternativa à redução drástica do efetivo bovino em Portugal, que foi apontada como a principal medida necessária para se atingir a neutralidade carbónica em 2050. Em Portugal, a alimentação dos novilhos destinados ao abate inclui uma forte componente de alimentos concentrados, com elevada eficiência do uso dos recursos nesta fase do sistema de produção em que as exigências nutricionais dos animais são muito elevadas. Contudo, poderão ser alternativas
As fenossilagens na engorda de novilhos
dietas baseadas em forragens com níveis altos de proteína e elevada digestibilidade. O recurso a estas dietas seria um estímulo ao aumento da área de produção de pastagens e forragens de qualidade, com redução da dependência de matérias-primas importadas (cereais e concentrados proteicos), a par de reflexos positivos na saúde e bem-estar dos animais e eventualmente na qualidade dos produtos. Neste contexto, está em curso o projeto LegForBov (https://projects.iniav.pt/ LegForBov/), um Grupo Operacional, em que participam entidades do sistema científico nacional (INIAV, FMV-ULisboa e CEBAL), empresas e outras entidades ligadas à produção agropecuária (Fertiprado, ELIPEC e APAE). No âmbito deste projeto estão a ser realizados diversos ensaios no Polo da Fonte Boa do INIAV (Estação Zootécnica Nacional) para testar dietas que incluam forragens biodiversas, e subprodutos agroindustriais em diversas combinações, procurando identificar os pontos-chave a ter em conta na formulação de dietas completas para bovinos em fase de engorda. CONDIÇÕES EXPERIMENTAIS O primeiro ensaio do projeto decorreu entre setembro de 2019 e janeiro de 2020. Envolveu 16 vitelos machos e 15 fêmeas cruzados Limousine x Alentejano, desmamados com cerca de 7 meses e com um peso médio de 228,5 ± 28,93 kg. Os animais distribuíram-se por 16 parques em grupos de 2, de acordo com o sexo e o peso. Utilizaramse 2 dietas completas em que 50% da matéria seca (MS) foi proveniente de feno-silagens e 50% de alimentos concentrados. Usou-se uma feno-silagem de uma mistura biodiversa, obtida num corte de inverno (Fs-I), e outra de Trevo-da-Pérsia cortado na primavera (FsP). A composição média das feno-silagens utilizadas apresenta-se no Quadro 1. A Fs-I obteve-se de um corte em janeiro de 2019 e as condições ambientais determinaram que a forragem fosse processada com os valores de MS baixos, inferiores aos recomendados (cerca de 50%). Os valores de proteína foram médios (15,1% MS). A forragem identificada como Fs-P resultou de um corte de Trevo-da-Pérsia extreme, com um valor elevado de proteína (17,7% MS). As feno-silagens utilizaram-se na produção de dietas completas para novilhos em que representaram 50% da MS (Quadro 1). 2 RAÇÕES COMPLEMENTARES Com base na composição das 2 feno-silagens formularam-se 2 rações complementares, para obter dietas com 16% de proteína na MS. As dietas foram preparadas diariamente usando um misturador estacionário (MAMMUT TMR mixer "Profi Mix" PM 1.5ST). Considerou-se ainda um tratamento constituído por alimento concentrado “ad libitum” e palha de aveia, esta restringida a um máximo de 20% da MS oferecida. A
QUADRO 1 COMPOSIÇÃO QUÍMICA E DIGESTIBILIDADE DAS FENOSILAGENS
Fs-I
Fs-P
Matéria seca (%)
33,7
56,6
Proteína bruta (% MS1)
15,2
17,6
Azoto solúvel (% N-Total)
59,8
41,1
Azoto amoniacal (% N-Total)
10,6
9,54
pH Digestibilidade MO2(%) 1
4,4
4,5
66,7
54,5
MS - Matéria seca; 2MO - Matéria orgânica.
QUADRO 2 COMPOSIÇÃO QUÍMICA E VALOR NUTRITIVO DA DIETA CONTROLO E DAS DIETAS COMPLETAS INCLUINDO FENOSILAGENS DE CORTE DE INVERNO (FS-I) OU DE PRIMAVERA (FS-P).
Composição química
Concentrado
Palha
Fs-I
Fs-P
MS (%)
89,1
92
47,8
66,9
PB (% MS)
18,3
4,4
16,1
16,3
GB (% MS)
2,4
1,47
2,28
2,09
NDF (% MS)
15,1
73,2
29
32,8
ADF (% MS)
6,3
49,6
19,95
24,1
ADL (% MS)
1,2
6
2,9
4,2
Açúcar (% MS)
5,75
0
6,51
3,24
Amido (% MS)
48,4
0
21
20,9
Dig MO (%)
84,7
23,7
69,3
69,9
EM*
11,6
3,5
9,4
9,6
MS - matéria seca; PB - proteína bruta; NDF - fibra detergente neutro; ADF - fibra detergente ácido; ADL - lenhina; MO – matéria orgânica; EM - energia metabolizável.
composição química e o valor nutritivo do concentrado, da palha e das dietas completas, apresentam-se no Quadro 2. O abate dos animais fez-se no matadouro da Santacarnes, em Santarém, tendo como peso alvo os 500 kg para os machos e 400 kg para as fêmeas. RESULTADOS PRODUTIVOS A utilização de feno-silagens aumentou a ingestão de alimento relativamente ao Controlo. Com a dieta Fs-I, os valores médios da ingestão diária por animal foram particularmente elevados (18,8 e 15,0 kg para machos e fêmeas, respetivamente). Este efeito deveu-se às diferenças na concentração energética e nas proporções de MS das dietas. Quanto à composição da MS, os animais alimentados com a dieta Controlo ingeriram cerca de 125 % mais de amido e cerca de 25 % menos de fibra (NDF) do que os alimentados com as dietas completas (Gráfico 1). ÍNDICES PRODUTIVOS E OS CUSTOS COM A ALIMENTAÇÃO Estão apresentados no Quadro 3 alguns índices produtivos e os custos com a alimentação para cada um dos grupos de
animais (machos e fêmeas) sujeitos às 3 dietas. Os ganhos de peso totais foram superiores para as dietas Controlo e Fs-I (170 e 163 kg respetivamente) do que para a dieta Fs-P (140 kg). Os ganhos médios diários de peso apresentaram o mesmo padrão, com valores de 1,62 e 1,60 kg/dia para as dietas Controlo e Fs-I e de 1,42 kg/dia para a dieta Fs-P. O consumo de concentrados foi menor com as dietas completas (32 % e 46 % para machos e fêmeas respetivamente), mas os índices de conversão dos alimentos foram superiores, particularmente no caso dieta Fs-I (14,3). No entanto, quando a análise foi feita para a MS ingerida, as dietas Controlo e Fs-I apresentaram valores semelhantes entre si e inferiores aos da Fs-P. CUSTOS DE PRODUÇÃO Os custos de produção estimaram-se com base no valor do mercado das forragens (Fs-I - 80 €/t; Fs-P - 90 €/t; 60€/t – palha) e das matérias-primas usadas nos concentrados (Controlo - 267,8€/t; Fs-I - 268,3€/t e; Fs-P - 259,8€/t). Os custos estimados da alimentação por kg de aumento de peso vivo, foram de 1,63 € para a dieta Controlo e 2,03 € (+ 24%) e 1,95 € (+ 20%) para as dietas Fs-I e Fs-P respetivamente. Considerando
…
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As fenossilagens na engorda de novilhos
QUADRO 3 EFEITO DA DIETA NAS CARACTERÍSTICAS PRODUTIVAS DURANTE A ENGORDA DE NOVILHOS LIMOUSINE X ALENTEJANO ALIMENTADOS COM UMA DIETA BASEADA NUM ALIMENTO CONCENTRADO (CONTROLO) OU EM DIETAS COMPLETAS COM FENOSILAGENS DE CORTE DE INVERNO (FS-I) OU DE PRIMAVERA (FS-P).
Machos Controlo
Fêmeas Mistura Fs-I
Mistura Fs-P
Mistura Fs-I
Mistura Fs-P
Ganho total de peso (kg)
214
218
197
127
108
83
GMD (kg)
1,802
1,895
1,774
1,435
1,301
1,065
Consumo de total de alimento (kg)
1229
2774
1948
953
1728
1118
Consumo de concentrado (kg)
1019
736
736
816
458
422
Consumo MS (kg)
1094
1304
1304
849
812
748
Índice de conversão das dietas
5,81
12,71
9,88
7,46
15,81
13,46
Índice de conversão MS
5,17
5,98
6,61
6,65
7,43
9,01
Custo/kg
1,43
1,69
1,54
1,83
2,1
2,09
QUADRO 4 EFEITO DA DIETA NA COMPOSIÇÃO EM ÁCIDOS GORDOS (Ag) DA GORDURA DA CARNE DE NOVILHOS CRUZADOS LIMOUSINE X ALENTEJANO, ALIMENTADOS COM UMA DIETA BASEADA NUM ALIMENTO CONCENTRADO (CONTROLO) OU EM DIETAS COMPLETAS COM FENOSILAGENS DE CORTE DE INVERNO (FS-I) OU DE PRIMAVERA (FS-P).
Controlo
Fs-I
Fs-P
Ag saturados
45,2
49,3
50,3
Ag ramificados
0,92
1,03
1,16
Ag cis-monoinsaturados
44,4
39,2
41,2
Ag polinsaturados (n-6)
6,2
4,86
5,49
Ag polinsaturados (n-3)
0,82
1,41
1,52
Total ag polinsaturados
7,02
6,28
7,02
…
os custos dos concentrados como fixos, os dados deste ensaio indicam que para alcançar custos semelhantes aos da dieta Controlo, as feno-silagens teriam de ser valorizadas em 53,4€/t e 65,0€/t para a Fs-I e Fs-P, respetivamente. Os custos na produção variam de acordo com as condições particulares das explorações e geralmente são inferiores aos preços de mercado. Na prática, os custos de oportunidade da opção pela utilização de dietas baseadas em forragens
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Controlo
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dependerão das condições particulares das explorações, do valor final do produto no mercado e de eventuais vantagens pela opção de sistemas de produção com baixa pegada de carbono. EFEITOS SOBRE A QUALIDADE DAS CARCAÇAS E DA CARNE Neste estudo foram ainda considerados os resultados disponíveis relacionados com a qualidade das carcaças e da carne. Neste
conjunto de dados, o efeito do sexo só foi relevante para o peso das carcaças (289,4 para machos vs 218,4 kg para fêmeas) devido às diferenças nos pesos de abate (512,2 vs 400,7 kg). Não houve diferenças no rendimento das carcaças, e o valor médio foi de 55,5%. A maior parte das carcaças de machos e fêmeas foram classificadas como R3 (68%) e as restantes como R2. O peso das carcaças foi superior para as dietas Controlo e Fs-I do que para as misturas Fs-P, sem diferenças no rendimento de carcaça. QUALIDADE DA CARNE E DA GORDURA DAS CARCAÇAS Foi avaliado um conjunto de características associadas com a qualidade da carne e da gordura das carcaças. As dietas não afetaram a deposição de gordura intramuscular na carne, com um valor médio de 2,88%, que corresponde a uma carne com baixo teor em gordura, como é característico das carnes provenientes de animais relacionados com a raça Alentejana (Costa et al., 2015; SantosSilva et al., 2020). Os valores de pH da carne foram elevados e indiciam a existência de um número significativo de carnes com
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As fenossilagens na engorda de novilhos
o que tem implicações na qualidade da carne. Se considerarmos 6,0 o valor de pH acima do qual a carne se define como DFD (Alvarez et al., 2014), 22 % das carnes estavam nessas condições e todas eram provenientes de animais alimentados com as dietas completas. Pode resultar de uma redução nas reservas de glicogénio muscular no momento do abate, o que impede que sejam atingidos os valores normais de pH na carne (5,5-5,8). Assim, o maneio dos animais no período que antecede o abate deverá ser objeto de particular atenção, reduzindo as situações de stress durante o transporte e alojamento. A cor da gordura subcutânea e da carne foram avaliadas por métodos instrumentais (colorímetro). A utilização da dieta Fs-I esteve associada a um aumento do índice de amarelo b* e da intensidade da cor C. Contudo, em valor absoluto as diferenças nos valores de b* e C foram pequenas e não se detetavam visualmente, pelo que não houve implicações em termos do valor das carcaças. A cor da carne não foi afetada pela dieta e os valores indicam que a maioria teria boa aceitação pelos consumidores (Holman et al., 2017) e que as alterações da cor da carne entre os 3 e os 7 dias após o abate não seriam percetíveis (Abril et al., 2001).
GRÁFICO 1 INGESTÃO MÉDIA DIÁRIA DE ALIMENTO, MATÉRIA SECA, FIBRA E AMIDO DE NOVILHOS (MACHOS E FÊMEAS) CRUZADOS LIMOUSINE X ALENTEJANO ALIMENTADOS COM UMA DIETA BASEADA NUM ALIMENTO CONCENTRADO (CONTROLO) OU EM DIETAS COMPLETAS COM FENOSILAGENS DE CORTE DE INVERNO (FS-I) OU DE PRIMAVERA (FS-P).
16
kg
… características DFD (dark, firm and dry),
14
Controlo
12
Fs-I
10
Fs-P
8 6 4 2 0
Alimento total
MS
NDF
Amido
GRÁFICO 2 PROPORÇÃO DOS PRINCIPAIS ISÓMEROS DA BIOIDROGENAÇÃO RUMINAL NA GORDURA DA CARNE DE NOVILHOS CRUZADOS LIMOUSINE X ALENTEJANO. 1,0 0,9
Controlo
0,8
Fs-I
EFEITO DAS DIETAS NA FORÇA DE CORTE Foi avaliado o efeito das dietas na força de corte no 7º dia após o abate, como forma de identificar o seu impacto sobre a tenrura da carne. Os valores encontrados foram mais favoráveis para as dietas Controlo e Fs-I, com um valor médio de 2,74 kg/cm2, do que para a dieta Fs-P, com um valor de 3,57 kg/cm2. A estes valores corresponde a classificação de carne “muito tenra” ou “tenra” de acordo com Belew et al. (2003). PRESENÇA DE ÁCIDOS GORDOS (Ag) O resumo dos resultados obtidos para a composição da gordura intramuscular apresenta-se no Quadro 4 e no Gráfico 2. As dietas completas influenciaram positivamente o valor nutricional da carne devido ao aumento das proporções dos ácidos gordos polinsaturados n-3 (FAO, 2010) e de cadeia ramificada, e à diminuição da proporção do isómero t10-18:1, um produto intermediário da bioidrogenação ruminal com efeitos negativos na saúde (Dugan et al., 2011). Contudo, aumentou a proporção dos ácidos gordos saturados, que é um grupo de ácidos gordos cujo consumo deve ser limitado (FAO, 2010) (Gráfico 2). CONCLUSÕES Os resultados indicam que a utilização de dietas completas com incorporação de 50% da MS, como feno-silagens de boa qualidade, podem permitir alcançar índices de produtividade semelhantes aos de
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% ag totais
0,7
Fs-P
0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0
t10-18:1
t11-18:1
animais alimentados com dietas compostas maioritariamente por concentrados, embora com redução da eficiência alimentar. A qualidade das carcaças não foi afetada pela dieta e a gordura da carne teve uma composição mais favorável. O consumo de concentrados foi menor com as dietas completas mas os custos da alimentação foram superiores ao Controlo. A viabilidade económica destas soluções depende das condições das explorações, dos mercados e dos apoios à produção. Vão realizar-se outros ensaios no âmbito do projeto LegForBov, considerando outros fatores alimentares, com o objetivo de definir os parâmetros a considerar na formulação de dietas completas para novilhos em fase de engorda com incorporação de elevadas quantidades de feno-silagens de misturas biodiversas de elevada qualidade sem comprometer o desempenho produtivo, a qualidade dos produtos e a rentabilidade do sistema.
t10-/t11-18:1
c9,t11-18:2
Agradecimentos: Projeto LegForBov – Alimentos alternativos na produção de carne de bovino financiado pelo PRD2020 através do FEADER (PDR2020-101031179/031180/031181/031182/031183/031184), e projetos UIDB / 05183 / 2020 (MED) e UIDP / CVT / 00276/2020 (CIISA) financiados por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e Tecnologia. 031179/03 1180/031181/031182/031183/031184), e projetos UIDB / 05183 / 2020 (MED) e UIDP / CVT / 00276/2020 (CIISA) financiados por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Bibliografia: Consultar os autores.
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PRODUÇÃO | VACAS DE LEITE
A GESTÃO E O LUCRO NAS EXPLORAÇÕES
ATUALMENTE, A CRISE NO PREÇO DO LEITE E O AUMENTO ACENTUADO DOS FATORES DE PRODUÇÃO DENOTAM A NECESSIDADE DE UMA ABORDAGEM RENOVADA. ESTE ARTIGO VISA DESTACAR OS PONTOS EM QUE OS PRODUTORES PRECISAM DE SE CONCENTRAR PARA SE TORNAREM MAIS EFICIENTES E MANTEREM UM NEGÓCIO LUCRATIVO. EM BOA VERDADE, OS PONTOS ABORDADOS NESTE ARTIGO SÃO AQUELES EM QUE OS PRODUTORES MAIS RENTÁVEIS SE CONCENTRAM PARA QUE O SEU NEGÓCIO SE AFASTE O MAIS POSSÍVEL, POSITIVAMENTE, DO PONTO DE EQUILÍBRIO.
HUW MCCONOCHIE Nutricionista de Vacas Leiteiras Zinpro Corporation
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
E
xplorações de leite que operam perto do ponto de equilíbrio (ponto em que não há défice nem lucro) não têm um modelo de negócio sustentável. A volatilidade dos mercados pode provocar sérios danos nestes negócios, por isso é essencial aumentar as margens de lucro, quer através da redução de custos, quer por melhorias no desempenho físico. O último ponto é provavelmente mais fácil de alcançar, e o primeiro deve ser meramente uma consequência. A principal razão para isto é que a maioria dos custos, em termos de preços de matérias primas,
está geralmente fora do controlo do produtor e, em segundo lugar, por ser muito difícil cortar custos sem afectar negativamente o desempenho. Por isso, a mensagem a reter pelos produtores de leite, deve ser: “Só se deve cortar nos custos que não tenham impacto negativo nos resultados.” Atualmente, a crise no preço do leite e o aumento acentuado dos fatores de produção denotam a necessidade de uma abordagem renovada. Este artigo visa destacar os pontos em que os produtores precisam de se concentrar para se tornarem mais eficientes e manterem um negócio lucrativo. Em boa
A gestão e o lucro nas explorações
verdade, os pontos abordados neste artigo são aqueles em que os produtores mais rentáveis se concentram para que o seu negócio se afaste o mais possível, positivamente, do ponto de equilíbrio. Um mau desempenho, por si só, não custa dinheiro. Quando uma vacada tem um desempenho abaixo do seu potencial, isso significa que existem ganhos potenciais que podem ser conseguidos apenas através de melhoramentos contínuos. REDUÇÃO DA PRODUÇÃO EM RESPOSTA ÀS EXIGÊNCIAS DOS PROCESSADORES Recentemente, foi pedido aos produtores de leite que reduzissem a produção em resposta à queda da procura de leite. Muitos optaram pela secagem precoce das vacas, enquanto outros optaram por refugar os animais com pior produção. A questão, porém, é saber quais as vacas que devem ser refugadas. Numa perspectiva puramente económica, as vacas que não estão a produzir o suficiente para cobrir os seus custos variáveis diários, devem ser refugadas (desde que, obviamente, não estejam prenhas). Se estiverem, podem ser secas mais cedo no caso de não estarem a produzir o suficiente para cobrir os custos fixos mais os custos de manter uma vaca seca. Um dos problemas destas abordagens prende-se com o possível aumento da produção de leite das vacas que permanecem na exploração, devido à diminuição da densidade populacional. Esta estratégia de refugo pode também ser utilizada em alturas normais, desde que existam vacas disponíveis para entrar na exploração e substituir as vacas com mau desempenho, caso contrário, afectará a produção total. DEZ ÁREAS ONDE A RENTABILIDADE DA VACADA PODE SER AUMENTADA 1. A solução para a poluição é a diluição. Há que tentar ter sempre a maior quantidade de leite possível com uma densidade populacional que não tenha um impacto negativo na produtividade da vacada. Uma boa solução passa por identificar as vacas com pior desempenho o mais cedo possível na lactação e marcá-las para não serem inseminadas. Isto significa que existe sempre um conjunto de vacas por onde escolher quando vacas recém-paridas estiverem a entrar no efetivo. 2. Vacas recém-paridas saudáveis. A única forma de ter vacas recém-paridas saudáveis é através da gestão correta do período de transição. Os pontos de maior foco do
produtor deverão ser a redução do stress e a manutenção do consumo de matéria seca até ao parto, e a otimização do consumo de matéria seca no pós-parto. O design e a capacidade das instalações também têm um efeito significativo na saúde na fase de transição. 3. Maximizar a longevidade da vaca. Bons resultados na recria aumentam a probabilidade de as novilhas ficarem mais tempo na vacada. Uma boa gestão da transição e um conforto excelente reduzem o número de vacas refugadas e, consequentemente, a taxa de reposição. 4. Obter ganhos associados à qualidade do leite. Uma transição bem feita e uma nutrição adequada irão assegurar que o conteúdo de proteína e de gordura no leite seja maximizado. A higiene, a rotina da ordenha e a remoção de vacas com história de mamite crónica, ajudarão a controlar a contagem de células somáticas (CCS) da exploração. 5. Maximizar a receita com os custos de alimentação (IOFC). As decisões no que toca à alimentação devem sempre ser baseadas na maximização do IOFC por vaca ou por efetivo. É importante não tomar decisões baseadas no cálculo do IOFC por litro, uma vez que isso resulta muitas vezes num comprometimento da eficiência geral do efetivo, bem como numa contradição do ponto 1 supracitado no artigo. 6. Comprar e produzir forragens de alta qualidade. Há que relembrar o valor inestimável duma forragem de qualidade. A qualidade da forragem produzida/comprada influencia o custo da alimentação suplementar e o impacto no IOFC. É importante também lembrar que é muito difícil produzir o mesmo nível de leite com uma forragem pobre do que com uma forragem de alta qualidade, independentemente do rácio de alimentação suplementar. Há que otimizar o rendimento da fibra não digerível (pNDF) e comprar as fontes de fibra menos digeríveis para otimizar a saúde ruminal. Contudo, não se deve esquecer que a qualidade da forragem dita o seu custo. 7. Gerar parições. Há que salientar dois aspetos sobre este assunto: primeiro, há que gerar parições consistentemente, uma vez que esta estabilidade irá permitir uma manutenção dos dias em lactação (DIM) num valor baixo e melhorar o fluxo de vacas nos parques de transição. Picos e quebras no padrão de partos da exploração irão eventualmente criar
problemas. Em segundo lugar, há que apontar a que todas a vacas fiquem prenhas (em média) aos 110 dias em lactação, uma vez que quando aumenta o número de dias em aberto, o lucro diminui. 8. Reduzir custos de forma inteligente. Em termos simples, não se deverá reduzir nenhum custo que tenha impacto na rentabilidade do rebanho ou que afete a capacidade de produzir leite de forma eficiente no futuro. A melhor maneira de cortar custos é através de um melhoramento do valor. Por exemplo, uma forragem com um elevado teor em energia ou milho, com um alto teor de amido, reduzem o custo por unidade de energia/amido. 9. Controlar custos com mão-de-obra. A chave para controlar estes custos é ter eficiência nos métodos de trabalho e investir na automação. A existência de protocolos para os processos do dia-a-dia da exploração é essencial. Outra vantagem dos protocolos é que trazem consistência, e as vacas adoram consistência! Ao conceber e desenvolver um protocolo, deve certificar-se que a integração e o treino dos trabalhadores da exploração são adequados, e que todas as infraestruturas e materiais necessários à implementação do protocolo estão a postos para que este seja executado. 10. Identificar os desperdícios na indústria de produção é essencial. Alguns exemplos são as perdas de silagem nos silos ou de matérias primas arrastadas pelo vento ou caídas no parque durante a alimentação; a mortalidade durante a recria, ou a mortalidade; e o refugo das vacas em lactação. Existem muitas outras outras causas de desperdício, e por isso é importante uma procura contínua das mesmas. Esperamos que este artigo inspire os produtores a examinarem o seu negócio e a identificarem as áreas onde o desempenho poderá ser melhorado. É uma boa ideia calcular o valor de uma melhoria nas 10 áreas chave supracitadas, para que os recursos possam ser priorizados em conformidade, para melhorar a situação. É seguro afirmar que o custo da introdução de Zinpro Performance Minerals® na abordagem nutricional do efetivo será compensado pelo valor que o produtor estava a perder antes da sua introdução, devido à quebra de produção das suas vacas (que graças a este investimento será melhorada). E isto sem esquecer o retorno (comprovado) 9 vezes superior ao investimento.
"EXPLORAÇÕES DE LEITE QUE OPERAM PERTO DO PONTO DE EQUILÍBRIO NÃO TÊM UM MODELO DE NEGÓCIO SUSTENTÁVEL." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Para garantir a melhor eficiência na utilização de energias renováveis, a De Heus instalou recentemente unidades para auto-produção de energia a partir de energia solar em ambas as fábricas (Trofa e Cartaxo).
SAÚDE E BEM ESTAR | VACAS LEITEIRAS
EMISSÕES DE GASES COM EFEITO DE ESTUFA
A PRODUÇÃO DE LEITE É GERADORA DE EMISSÕES DE GASES COM EFEITO DE ESTUFA (GEE), MAS APRESENTA ENORMES POSSIBILIDADES DE SEQUESTRAR CARBONO DA ATMOSFERA ARMAZENANDO-O NO SOLO E NAS PLANTAS QUE COMPÕEM A EXPLORAÇÃO AGROPECUÁRIA.
JOSÉ ALVES Assistente Técnico Ruminantes De Heus Nutrição Animal S.A. jaalves@deheus.com
N
a De Heus acreditamos que a produção de leite é uma atividade agropecuária com grande relevância económica, social e ambiental. Em muitas regiões do mundo, tem um papel crucial no suporte de uma alimentação nutritiva e saudável e também na gestão dos ecossistemas, atuando de forma proactiva na mitigação da degradação ambiental e das alterações climáticas. Como outras atividades humanas, é geradora 36
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de emissões de gases com efeito de estufa (GEE), mas apresenta enormes possibilidades de sequestrar carbono da atmosfera armazenando-o no solo e nas plantas que compõem a exploração agropecuária. A nível mundial, todo o setor leiteiro representa 4% do total das emissões de GEE de origem antropogénica se contabilizarmos a produção de carne decorrente da atividade, e 2,9% se contabilizarmos apenas a produção de leite. As principais fontes de GEE emitidas pelas explorações leiteiras são o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O). O metano resulta da chamada fermentação entérica que faz parte do complexo processo digestivo das vacas. Essa fermentação ocorre no rúmen (um dos compartimentos do aparelho digestivo dos ruminantes) onde existe, em simbiose com o animal, uma população microbiana que utiliza para substrato de fermentação componentes como a fibra (celulose, hemicelulose e lenhina) permitindo o aproveitamento de alimentos que são em grande parte indigestíveis para os
monogástricos. É graças a este sistema que os ruminantes transformam alimentos de baixo valor nutritivo em proteína de elevado valor biológico (carne e leite). O oxido nitroso é emitido sobretudo pela nitrificação e desnitrificação dos solos e pelo estrume e/ou chorume quer durante o armazenamento, quer durante a aplicação nos terrenos de cultivo. As diferenças nos valores de emissões de GEE pelos ruminantes entre as várias regiões do mundo são enormes, e estão associadas aos diferentes sistemas de produção. As regiões com sistemas de produção que usam as melhores práticas e as melhores tecnologias agropecuárias produzem menos metano por kg de carne ou leite que as regiões menos desenvolvidas e com sistemas de produção de baixa produtividade. No gráfico abaixo podem ser observadas as estimativas de emissões de GEE por litro de leite corrigido para a proteína e gordura (FPCM) de várias regiões do mundo. São as regiões menos desenvolvidas as que apresentam maiores emissões relativas (Gráfico 1).
A produção de leite e as emissões de gases com efeito de estufa
MELHORIA DA EFICIÊNCIA DOS SISTEMAS DE PRODUÇÃO Devem ser adotadas as melhores práticas de produção de forragens, maneio reprodutivo, bem-estar animal, maneio dos chorumes e utilização de maquinaria agrícola. Como já foi referido, a eficiência do sistema de produção está diretamente relacionada com o nível de emissões de GEE.
8 7 6 5 4 3 2 1
MUNDO
OCEANIA
ÁSIA ORIENTAL
ÁSIA MERIDIONAL
ÁFRICA SUB-SARIANA
SUDOESTE ASIÁTICO E NORTE ÁFRICA
FEDERAÇÃO RUSSA
0 EUROPA DE LESTE
kg de CO2 eq
SEQUESTRO DE CARBONO NO SOLO Os solos são um dos grandes reservatórios de carbono do planeta. A sua boa gestão é fundamental para a sustentabilidade das explorações agropecuárias. Solos saudáveis são mais resilientes, têm melhor estrutura, são mais fáceis de mobilizar e são mais férteis. As práticas agrícolas que incrementam o teor de matéria orgânica no solo aumentam de forma muito significativa o sequestro de carbono. O aumento de apenas 0,1% do teor de matéria orgânica por hectare representa um sequestro de 8,9 toneladas de CO2 por ano.
defesa da sustentabilidade do planeta e do meio-ambiente destaca-se a assinatura do convénio FEFAC sobre “soja sustentável” (no âmbito do qual a De Heus assumiu o compromisso de, até 2025, utilizar em todas as suas fábricas a nível europeu exclusivamente soja de origem sustentável) e, sempre que possível, matérias-primas de origem local - e consequentemente com menor pegada de carbono – nas suas formulações. A nível industrial, a De Heus tem em curso várias iniciativas fabris para garantir a melhor eficiência na utilização de energias renováveis – como a recente instalação de unidades para auto-produção de energia a partir de energia solar em ambas as fábricas (Trofa e Cartaxo) – e não renováveis. Temos objetivos crescentes de redução de consumo energético, e por isso estamos a promover a substituição de motores por outros de menor consumo, substituição dos “redlers” por outros mais eficientes, etc.. Em paralelo, temos planos fabris de controlo de consumo de água de forma a garantir a minimização das perdas e melhorar a eficiência do recurso. A formulação é outra área com impacto na redução dos GEE em que a De Heus está a trabalhar. Tem em curso a investigação de formulações com vista à redução dos GEE, mas também em nutrição de precisão que, levando à diminuição do desperdício de alimento, gera poupança de matérias primas e atividades relacionadas. Com impacto indireto mas igualmente importante, merecem referência as iniciativas da De Heus no desenvolvimento de tecnologias de substituição de antibióticos, e a disseminação destas práticas e preocupações pelo mercado e pelos clientes. Assumimos assim na De Heus o desafio “Responsible Feeding”: a missão de Alimentar com Responsabilidade, por um planeta e um futuro melhor.
GRÁFICO 1 ESTIMATIVA DE EMISSÃO DE GEE POR KG DE LEITE FPCM À PORTA DA EXPLORAÇÃO
EUROPA OCIDENTAL
UTILIZAÇÃO DE ADITIVOS E SUPLEMENTOS ALIMENTARES Existem aditivos que atuam ao nível do rúmen alterando as fermentações ruminais, diminuindo a formação e libertação de metano. Podem ser sintetizados quimicamente (como o composto 3-NOP), mas também existem substâncias naturais (taninos e algas), probióticos e gorduras ou óleos com efeito idêntico. Os estudos efetuados mostram que a utilização destes aditivos permite reduções nas emissões de metano entre 10 e 25%.
O CONTRIBUTO DA DE HEUS PARA A MITIGAÇÃO DO IMPACTO AMBIENTAL DOS GEE A De Heus, à semelhança as restantes empresas produtoras de alimentos compostos para animais, integra uma indústria dinamizadora da economia circular, que utiliza subprodutos da alimentação humana para alimentação dos animais, reduzindo assim o desperdício. E, através desta reutilização de fluxos residuais da indústria alimentar, contribui para a melhoria da circulação de matérias-primas e para o fecho do ciclo mineral. Naturalmente, a De Heus está atenta às questões ambientais e particularmente aos gases de efeito de estufa. Faz parte da sua cultura contribuir para um futuro melhor e isso passa obrigatoriamente pela implementação e disseminação de medidas de proteção ambiental. Assim, por todo o mundo, a De Heus vem adotando procedimentos rígidos no que respeita à melhoria dos processos, implementando medidas transversais às diferentes unidades de negócio e a todos os setores da empresa. Estão envolvidas as fábricas e os processos de fabrico, passando por temas como a escolha das matérias primas, a construção dos produtos finais e o aconselhamento dado aos clientes. No que respeita a matérias primas, de entre as iniciativas em que a De Heus participa na
AMÉRICA DO SUL E CENTRAL
MELHORIA DAS DIETAS E MANEIO ALIMENTAR A composição da alimentação das vacas tem uma grande influência na produção de metano. As dietas mais equilibradas, e que resultam na maior eficiência alimentar e na maior produtividade dos animais, diminuem a produção de metano por kg de leite.
SEQUESTRO DE CARBONO PELAS PLANTAS As plantas através da fotossíntese captam o CO2 atmosférico e armazenam-no durante o seu crescimento. A produção de forragens e pastagens das explorações leiteiras representa uma importante fonte de sequestro de carbono. As áreas de pastagens permanentes utilizadas na produção leiteira na Europa sequestram anualmente 3.1 mt de carbono.
AMÉRICA DO NORTE
A REDUÇÃO E MITIGAÇÃO DAS EMISSÕES Nos últimos 30 anos o setor agrícola europeu reduziu as emissões de GEE em 23%, contrastando com o setor da aviação e transportes que aumentaram as emissões em 66% e 19% respetivamente. Esta tendência de redução de GEE no setor agrícola irá continuar e intensificar-se-á, à medida que os sistemas de produção se vão tornando mais eficientes e assentes em práticas agrícolas modernas e tecnologicamente avançadas. De acordo com o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC), as medidas de redução das emissões de GEE na produção de ruminantes passam pela melhoria das dietas e do maneio alimentar, pela utilização de aditivos e suplementos alimentares e por medidas de longo prazo que promovam o aumento da eficiência dos sistemas de produção.
Fonte: FAO – Greenhouse Gas Emissions from the Dairy Sector – A Life Cycle Assessment.
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ALIMENTAÇÃO | VACAS DE LEITE
NUTRIÇÃO PROTEICA UMA FERRAMENTA ÚTIL
DURANTE OS ÚLTIMOS ANOS, O PRINCIPAL DESAFIO DOS NUTRICIONISTAS NAS EXPLORAÇÕES DE BOVINOS LEITEIROS CONSISTIU EM AUMENTAR A PRODUÇÃO DE LEITE DOS ANIMAIS. NOS FUTURO, PARA ALÉM DO DESAFIO DE CONTINUAR A AUMENTAR A PRODUÇÃO LEITEIRA/VACA/ DIA, TEREMOS QUE ENFRENTAR ALGUMAS CONDICIONANTES, NOMEADAMENTE AS CRESCENTES EXIGÊNCIAS AMBIENTAIS E POR PARTE DA INDÚSTRIA DE PRODUÇÃO DE LEITE.
JAVIER LOPEZ Technical Sales Manager Ruminantes Kemin Espanha e Portugal javier.lopez@kemin.com
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Durante os últimos anos, o principal desafio dos nutricionistas nas explorações de bovinos leiteiros consistiu em aumentar a produção de leite dos animais. Nos futuro, para além do desafio de continuar a aumentar a produção leiteira/vaca/ dia, teremos que enfrentar algumas condicionantes, nomeadamente as crescentes exigências ambientais e por parte da indústria de produção de leite. No aspeto ambiental centrámos este artigo na excreção de azoto para o meio-ambiente. A excreção de azoto é altamente determinada pela eficiência no uso da proteína por parte do animal e pelo excesso de proteína
fornecida na dieta. Quanto à composição do leite, para determinado tipo de indústria de lacticínios, um bom nível de gordura e proteína verdadeira no leite é cada vez mais valorizado. Em determinados processos industriais, como o fabrico de queijo, o teor destes componentes no leite faz muita diferença tanto no rendimento como na qualidade do produto final. Em ambos os casos, a nutrição proteica, tendo em conta as necessidades de cada aminoácido (AA) é uma ferramenta útil. Se tivermos apenas em consideração a proteína bruta ou metabolizável da dieta, descobriremos que
Nutrição proteica, uma ferramenta útil
al., 2013). Geralmente, nos ruminantes, a eficiência de conversão observada entre o N consumido e o N depositado em proteína varia entre 20 e 32%, mas a eficiência teórica máxima deve estar entre 40 e 45% (Van Vuuren y Meijs, 1987; Hvelplund y Madsen, 1995; Dijkstra, 2013). Um objetivo prático seria atingir cerca de 40% de conversão. Este objetivo pode ser alcançado formulando para um valor baixo de proteína bruta (PB) e equilibrando os AA, como se descreve neste artigo.
existem frações proteicas e alguns AA que estão em excesso e serão excretados para o ambiente, e, outros em quantidade inferior ao necessário, limitando a produção de proteínas do leite. REDUÇÃO DA EXCREÇÃO DE AZOTO PARA O MEIO AMBIENTE Os sistemas de produção dos ruminantes convertem a proteína vegetal em proteína animal, contribuindo fortemente para a nutrição humana através da produção de leite e carne. Os microrganismos do rúmen processam a lignocelulose, a partir de forragem de baixa qualidade, em ácidos gordos voláteis e energia, para transferir azoto não-proteico para proteína microbiana. É desta forma que os ruminantes produzem alimentos de origem animal sem competir pelos alimentos com os não-ruminantes e os humanos. A produção de ruminantes com uma alimentação eficiente é um sistema complexo que começa muitas vezes com uma melhor eficiência do azoto (N) (Flachowsky et al., 2013). As estratégias para reduzir as perdas e melhorar a eficiência dos sistemas de produção de ruminantes baseiam-se num fornecimento ótimo de N degradável no rúmen e numa eficiência ótima de utilização dos aminoácidos absorvidos (Dijkstra et
A nutrição com proteína microbiana do rúmen tem três grandes desafios. Em primeiro lugar, o rúmen contém um grande número de microrganismos, o que dificulta o equilíbrio do perfil das proteínas, e isso, geralmente, leva a uma eficiência alimentar e de azoto muito baixas. Em segundo lugar, nem sempre é fácil obter forragens de alta qualidade (que fornecem energia) e em quantidade suficiente (mínimo 40% do aporte total de matéria seca para evitar problemas de saúde e uma eficiência ainda menor). Por último, é fundamental garantir um bom processo de mistura na produção do alimento para evitar que a vaca escolha de preferência a ração e, em consequência, corra o risco de acidose e baixa eficiência no azoto. Por outro lado, a ração é geralmente baseada numa formulação que proporcione o nível de nutrientes requeridos para um nível de produção de leite a um custo razoável. A melhoria da eficiência da conversão do N tem um grande impacto na rentabilidade da exploração (Tozer, 2012, McGrath et al., 2018, Bach, 2012). Nos últimos anos, enormes esforços e investigações foram feitos para apurar as necessidades de proteína das vacas leiteiras. A crescente compreensão das necessidades das vacas levou-nos a reconhecer dois conjuntos de requisitos de proteínas: proteína degradável no rúmen (RDP) e proteína não degradável no rúmen (RUP). Metabolicamente, a vaca tem requisitos específicos para aminoácidos individuais (AA), em vez de proteínas metabolizáveis (PM). Em conjunto, a complexa atividade metabólica microbiana no rúmen e os processos intestinais fazem com que o estudo do metabolismo do N em ruminantes seja mais desafiante do que para não-ruminantes.
Os AA são os componentes básicos do leite e da proteína corporal e são considerados um dos nutrientes mais importantes na nutrição das vacas leiteiras. Muitos destes AA necessitam de ser suplementados na dieta, pois não podem ser sintetizados em quantidade suficiente para atender às necessidades de produção das vacas. Portanto, esses aminoácidos são conhecidos como AA essenciais. O fornecimento inadequado destes AA essenciais pode limitar a produção de leite e de proteínas do leite. O AA essencial presente nas matérias primas (MP) em quantidade mais pequena em relação às necessidades da vaca é chamado de AA limitante. A metionina (Met) e a lisina (Lys) foram reconhecidas como os principais AA limitantes para as vacas leiteiras lactantes na maioria das práticas de alimentação. Isso é fundamentalmente verdadeiro porque as proteínas alimentares têm concentrações mais baixas de Met e Lys em comparação com as suas concentrações no leite e na proteína microbiana. As dietas na Europa não são capazes de satisfazer as necessidades de Met ou Lys com a utilização de ingredientes alimentares, portanto, é necessário o uso de suplementos protegidos do rúmen. A Met e Lys funcionam em conjunto: ambos os AA são necessários na dieta para uma alimentação mais precisa e para alcançar o máximo rendimento de produção sem sobrecarregar em proteínas. Equilibrar as rações de ruminantes com AA, em vez de %PB, é a abordagem mais avançada quando se trata de nutrição proteica. Schwab et col. (2004) compararam os fornecimentos de MP, Lys e Met como preditores da produção de leite e da produção de proteína do leite. Os resultados mostraram que os suprimentos de Met e Lys são melhores preditores da produção de leite e da produção de proteína do leite do que os suprimentos de MP. Isto ocorre porque quando um dos AA é limitante vai provocar efetivamente um excesso de oferta de todos os outros AA para a vaca. Quando se proporciona o “tijolo” que falta (o AA limitante), uma nova molécula de proteína do leite pode ser sintetizada. Portanto, o excedente de outros aminoácidos diminuirá e a eficiência de utilização de PM será melhorada (Tabela 1).
…
TABELA 1 COEFICIENTE DE CORRELAÇÃO (R2) PARA A PRODUÇÃO LEITEIRA E A PROTEÍNA NO LEITE, QUANDO A PROTEÍNA (PM), A METIONINA (MMET) E A LISINA METABOLIZÁVEL (MLYS) SÃO USADOS COMO PREDITORES. (Schwab & Col, 2004) Parâmetro
Leite
Proteína
MP
0,65
0,74
MMet
0,76
0,81
MLys
0,90
0,90
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Nutrição proteica, uma ferramenta útil
TABELA 2 COMPONENTES E PRODUTIVIDADE DO LEITE, EXPRESSOS COMO PERCENTAGEM DE AUMENTO, APÓS IMPLEMENTAÇÃO DE AMINOÁCIDOS RELACIONADOS COM A NÃO UTILIZAÇÃO DE AMINOÁCIDOS. TPAS-19-1075. (*) RETORNO DO INVESTIMENTO.
Resumo resultados formulação AA TABELA 3
Produção de leite
Gordura
Proteína
Caseína
Plasma Ureia
Eficiência N
+7,5 %
+8,6 %
+5,6 %
+5,2 %
-26,7 %
+5,8%
PROTEÍNA 100%
Proteína verdadeira 95%
Caseína 80%
Whey 20%
…
Quando os nutricionistas de vacas leiteiras confiam apenas na quantidade de PM disponível sem considerar a limitação de AA, a produção real de leite, em quase todos os casos, será menor do que o esperado. Isso indica claramente que, embora o suprimento de PM total possa ser adequada, o balanço de AA disponível pode estar incorreto, o que limita a produção de leite. É amplamente aceite que ao formular com AA individuais, a melhoria na eficiência de utilização de PM proporcionará ao nutricionista a oportunidade de formular dietas com menor conteúdo de PB, sem comprometer a produção de leite e os seus componentes. No entanto, é importante prever com precisão a quantidade exata de Met ou Lys metabolizável que pode ser usada por cada vaca para atingir esse nível de precisão nas nossas dietas. As técnicas de medição precisas são essenciais para obter resultados experimentais confiáveis sobre a utilização de N e AA. Conhecer a taxa de proteção do rúmen e a disponibilidade intestinal do suplemento de RP-AA dá-nos o AA primário disponível para o animal hospedeiro (Hristov et al., 2019). De acordo com a experiência da Kemin, quando a nutrição com AA é implementada aplicando-se o conhecimento nutricional mais recente disponível e com suplementos de AA protegidos no rúmen adequados (tanto metionina como lisina), observa-se um melhor rendimento animal com uma melhor eficiência de azoto (Tabela 1). Em conclusão, os nutricionistas de ruminantes de primeira linha já estão a equilibrar as suas dietas com AA em vez de proteína bruta. A adoção do conceito de equilíbrio para AA individuais pode oferecer infinitas oportunidades para maximizar a rentabilidade das vacas leiteiras. Com aumentos contínuos nos preços dos alimentos e nos custos de produção de leite, a reformulação da dieta com um baixo conteúdo de proteína bruta enquanto se equilibra para AA, utilizando Met e Lys protegidos no rúmen, pode maximizar a
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Azoto não-proteína 5%
Ureia 30-35%
Creatinina e ácido úrico 25%
utilização de PM, assim como a produção e a saúde das vacas leiteiras. Além disso, o equilíbrio dos dois primeiros AA limitantes diminuirá a excreção geral de N para o ambiente, melhorando o N e a eficiência alimentar (Tabela 2). PRODUÇÃO DE COMPONENTES LÁCTEOS PARA A INDÚSTRIA Durante os últimos anos a produção por vaca por dia aumentou, com o que as necessidades de nutrientes aumentaram da mesma forma. Por isso, devemos ter cada vez mais cuidado ao formular as dietas para satisfazer essas necessidades. Se os aportes de aminoácidos não são suficientes, aquilo que primeiro se ressente é a produção de gordura e proteína. Esta última está muito condicionada pelos aportes proteicos. A síntese de proteína é interrompida quando termina o AA que se encontra em menor quantidade relativamente às necessidades (AA limitante). Se aportarmos à dieta uma quantidade maior desse AA, a síntese de proteína será retomada. Por isso, é muito importante satisfazer as necessidades de cada AA. Numa dieta podemos ter proteína metabolizável suficiente, mas se o perfil de AA não é adequado, a síntese será menor do que a esperada. A fração proteica que se vê afetada é a caseína, que é a fração que determina o rendimento dos processos industriais. A proteína do leite é composta por duas frações principais: proteína verdadeira e azoto não proteico (NNP). Normalmente, quando estamos a analisar a proteína total o que realmente estamos a determinar é o teor em N do leite. Mas devemos ter em conta que o NNP não só não é válido para a produção de produtos industriais, como pode ser prejudicial em aspetos organoléticos, como por exemplo nos queijos. Dentro da proteína verdadeira existem duas frações: caseína e proteínas séricas. A caseína é a fração mais determinante quando se trata de melhorar a eficiência do leite em processos industriais. Por isso, devemos diminuir a % de NNP no leite e aumentar a % de proteína
Amónia 10-30%
verdadeira, principalmente a de caseína. Daí a importância de satisfazer as necessidades de cada AA nos animais (Tabela 3). A seguir apresentamos os resultados de três ensaios em explorações comerciais, em que analisámos os parâmetros de qualidade do leite e o rendimento queijeiro na indústria de lacticínios. Nestes ensaios as dietas não foram alteradas. O único parâmetro modificado foi a suplementação com Metionina e Lisina protegidas no rúmen para satisfazer as necessidades dos animais. Os gráficos 1, 2 e 3 mostram os resultados da proteína total, da proteína verdadeira e da caseína em cada uma das explorações. A linha amarela expressa a % de melhoria em relação ao período OFF. Os gráficos 4, 5 e 6 mostram os resultados da taxa de recuperação da gordura do leite, a proteína do leite e a proteína verdadeira durante o período experimental. A percentagem de melhoria em relação ao período OFF está representada na linha amarela. A fórmula que relaciona as taxas de recuperação de proteína no rendimento queijeiro está detalhada a seguir: FÓRMULA MATEMÁTICA PARA O KG DE QUEIJO PRODUZIDO (Taxa de recuperação de proteína do leite x (kg de leite x% de proteína do leite) / (100 x (% de proteína de queijo)) • Grupo AA → kg de queijo produzido por cada 1000 kg de leite coletado = (89,8 * (1000 * 3,33)) / (100 * 23)) = 130 kg. Sendo 89,8% a taxa de recuperação e 3,33% o conteúdo de proteína do leite obtido em média respectivamente. • Grupo de controlo → kg de queijo produzido por cada 1000 kg de leite coletado = (87,3 * (1000 * 3,22)) / (100 * 23)) = 122 kg. Sendo 87,3% a taxa de recuperação e 3,22% o conteúdo de proteína do leite obtido em média respectivamente. • Diferença de queijo elaborado = (130-122) = 8 kg → 56 € (8 kg x 7 €) mais por
…
cada 1.000 kg de leite de vaca recolhido.
Nutrição proteica, uma ferramenta útil
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… PRODUÇÃO DE COMPONENTES
LÁCTEOS PARA A INDÚSTRIA Como discutimos no inicio do artigo, o grande desafio que enfrentaremos nos próximos anos é conseguir fornecer à população a maior quantidade de nutrientes possível (especialmente proteína) com o
menor custo ambiental possível. Nesta secção, a nutrição proteica dos ruminantes desempenha um papel fundamental, por isso devemos estar atentos de forma a cobrir os requisitos de cada AA para assim conseguir a maior quantidade de proteína possível, sem dar em excesso
outros AA que iriam ser excretados para o ambiente. Neste tema, os produtos metionina e lisina protegidos do rúmen desempenham um papel fundamental, permitindo-nos abordar individualmente as necessidades dos AA mais limitantes. Bibliografia: Email javier.lopez@kemin.com
"SE OS APORTES DE AMINOÁCIDOS NÃO SÃO SUFICIENTES, AQUILO QUE PRIMEIRO SE RESSENTE É A PRODUÇÃO DE GORDURA E PROTEÍNA." GRÁFICOS 1, 2 E 3 RESULTADOS DA PROTEÍNA TOTAL, DA PROTEÍNA VERDADEIRA E DA CASEÍNA EM CADA UMA DAS EXPLORAÇÕES. LINHA AMARELA: % DE MELHORIA EM RELAÇÃO AO PERÍODO OFF (CONTROLO).
GRÁFICOS 4, 5 E 6 RESULTADOS DA TAXA DE RECUPERAÇÃO DA GORDURA DO LEITE, A PROTEÍNA DO LEITE E A PROTEÍNA VERDADEIRA DURANTE O PERÍODO EXPERIMENTAL. LINHA AMARELA: % DE MELHORIA EM RELAÇÃO AO PERÍODO OFF (CONTROLO).
7,0%
3,2
6,0%
3,0
5,0%
2,8
4,0%
2,6
3,0%
2,4
2,0%
2,2
1,0%
97
7,0%
95
6,0%
93
5,0%
91
4,0%
89
3,0%
87
2,0%
0,0%
85
3,6
3,5%
97
3,5%
3,4
3,0%
95
3,0%
3,2
2,5%
3,0
2,0%
93
2,5%
91
2,0%
89
1,5%
87
1,0%
Proteína verdadeira
Caseína do leite
Taxa recuperação MF
Taxa recuperação MP
1,5%
2,6
1,0%
2,4
2,0%
2,2
1,0% Proteína do leite
Proteína verdadeira
Caseína do leite
% em leite
2,8
2,0
85
0,0%
Taxa recuperação MF
3,0%
3,2
2,5%
3,0
2,0%
2,8
1,5%
2,6
1,0%
2,4
2,0%
2,2
1,0% Proteína verdadeira
Caseína do leite
PERÍODO DE ADAPTAÇÃO
42
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
0,0%
TRATAMENTO AA
% em leite
3,4
Proteína do leite
Taxa recuperação MP
Taxa recuperação TP
0,5%
GRÁFICO 6 3,5%
% de aumento vs. controlo
% em leite
GRÁFICO 3 3,6
2,0
1,0%
GRÁFICO 5 % de aumento vs. controlo
% em leite
GRÁFICO 2
Taxa recuperação TP
% de aumento vs. controlo
Proteína do leite
97
3,0%
95
2,5%
93
2,0%
91
1,5%
89
1,0%
87
0,5%
85
PERÍODO OFF
Taxa recuperação MF
Taxa recuperação MP
PERCENTAGEM
Taxa recuperação TP
0,0%
% de aumento vs. controlo
2,0
% de aumento vs. controlo
3,4
% em leite
GRÁFICO 4 8,0% % de aumento vs. controlo
% em leite
GRÁFICO 1 3,6
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020 43 RUMINANTES | JAN/FEV/MAR 2020
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A vacada é normalmente alimentada “à mão” durante cerca de 4 meses por ano, rodando pelas várias parcelas de pastagem nos restantes 8 meses.
SAÚDE E BEM ESTAR | VACAS DE CARNE
DIMINUIÇÃO DO INTERVALO ENTRE PARTOS SENDO O VITELO O MAIOR OUTPUT DUMA VACADA DE CARNE, A EFICIÊNCIA REPRODUTIVA É UM FATOR CHAVE PARA DETERMINAR A RENTABILIDADE ECONÓMICA NUMA EXPLORAÇÃO DE BOVINOS ALEITANTES. DESTA FORMA, IMPORTA AO PRODUTOR DEBRUÇAR-SE SOBRE OS DADOS REPRODUTIVOS DA SUA EXPLORAÇÃO, POR EXEMPLO, A FERTILIDADE E INTERVALO ENTRE PARTOS, E ANALISAR OS MESMOS DE FORMA CRÍTICA. Fotos Sara Garcia
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Diminuição do intervalo entre partos numa vacada de carne
PEDRO CASTELO Diretor Técnico Zoopan Eng. Zootécnico pedro.castelo@zoopan.com
SARA GARCIA Eng. Zootécnica Depto. técnico-comercial sara.garcia@zoopan.com
O
objetivo era claro: aumentar a fertilidade e diminuir o intervalo entre partos da vacada. Foi este o repto lançado por David Motta Ferreira, atualmente à frente da gestão da Agropecuária do Monte de São Pedro, em Avis. O Monte de São Pedro começou por ser uma vacaria de leite nos anos 90, pela mão do seu pai. Talvez por ter a “escola dos bovinos de leite”, David tem bem presente a importância da alimentação das vacas sobre os parâmetros produtivos e reprodutivos de uma exploração, e mais especificamente ainda, da importância das vitaminas e minerais na reprodução.
Também por esta razão, é um produtor que se dedica frequentemente à análise dos dados do seu rebanho, uma vacada cruzada, com cerca de 260 vacas adultas, das quais 20 vacas são de raça pura Limousine. Os partos na exploração são distribuídos ao longo do ano, uma vez que os touros se encontram permanentemente na vacada. No que diz respeito ao maneio de pastagens, a exploração optou por fazer um maneio holístico, com aproveitamento direto por parte das vacas e respetiva rotação pelas várias parcelas da herdade. Além de pastagem, a exploração conta também com a produção de silagem de erva e de feno para alimentação da vacada, com recurso ao unifeed nas alturas de maior escassez alimentar e de aumento das necessidades alimentares da vacada. A vacada é normalmente alimentada “à mão” durante cerca de 4 meses por ano, rodando pelas várias parcelas de pastagem nos restantes 8 meses. Durante os 4 meses em que as vacas são alimentadas com recurso a unifeed, é feito um arraçoamento tendo em conta as análises regulares das forragens disponíveis na exploração, corrigido com um núcleo de vitaminas e minerais (Adimix Vacas Aleitantes 120). A altura em que os animais não comem desta mistura representa o maior desafio da exploração. Assim, foi sugerido ao produtor a utilização de baldes de vitaminas e minerais, colocados nas várias parcelas pelas quais a vacada roda, para aproveitamento das pastagens – ZOOMEL Vacas Aleitantes. Em termos de características do produto, o Zoomel Vacas Aleitantes fornece: - minerais e oligoelementos, perfeitamente assimiláveis e equilibrados entre si, permitindo responder às necessidades dos animais, em complementação da alimentação base; - zinco, importante para a síntese das proteínas, crescimento e reprodução; - manganês para a qualidade óssea e fertilidade; - iodo para apoio do metabolismo energético,
lactação e reprodução; - cobalto, percursor da Vitamina B12 no rúmen, fator de crescimento e de equilíbrio dos microrganismos, indispensável à flora do rúmen para a degradação da celulose; - selénio para a prevenção da oxidação e proteção das membranas celulares; - enxofre, favorece a proteossíntese microbiana; - minerais quelatados, biodisponíveis para garantir uma absorção e metabolização no organismo mais eficaz; - açúcares para uma excelente apetência, um bom desenvolvimento da flora do rúmen e uma melhor valorização das forragens. O produtor utiliza os baldes como complemento da alimentação base há 2 campanhas, e os dados apresentados neste artigo referem-se precisamente à comparação entre a época de partos em que não se utilizou qualquer correção vitamínico-mineral nas épocas de maior escassez alimentar (2017/2018) e as duas épocas de partos subsequentes (2018/2019 e 2019/2020), até à data de elaboração deste artigo. Foram calculados os intervalos entre partos, bem como a taxa de fertilidade da vacada para as 3 épocas reprodutivas (Tabela 1) Da análise da Tabela 1, pode verificar-se uma diminuição do intervalo entre partos desde a primeira época reprodutiva analisada (2017/2018) até à última época reprodutiva analisada (2019/2020), notando-se uma melhoria bastante significativa (-35 dias de intervalo entre partos) de 2017/2018 para 2019/2020. Também, pela análise dos dados referentes à taxa de fertilidade da vacada (número de vacas paridas/número de vacas presentes no efetivo * 100), pode-se verificar uma melhoria da taxa de fertilidade no efetivo do Monte de São Pedro, da ordem dos 13,85 % (Tabela 2). Como conclusão, podemos afirmar que é possível melhorar os índices reprodutivos numa exploração de vacas aleitantes através da correção vitamino-mineral de uma forma simples, como a colocação de baldes na pastagem, sem recurso ao unifeed.
TABELA 1 INTERVALO ENTRE PARTOS (INTP), EM DIAS, PARA AS 3 ÉPOCAS REPRODUTIVAS ANALISADAS, NO MONTE DE SÃO PEDRO
Intervalo entre Partos (em dias)
2017/2018
2018/2019
2019/2020
432
423
397
TABELA 2 TAXA DE FERTILIDADE (EM %), PARA AS 3 ÉPOCAS REPRODUTIVAS ANALISADAS, NO MONTE DE SÃO PEDRO
Taxa de Fertilidade
2017/2018
2018/2019
2019/2020
66,15 %
66,20 %
80,00 %
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
45
ALIMENTAÇÃO | VITELOS
ALKOSEL VS SELÉNIO
NESTE ESTUDO AVALIARAM-SE OS EFEITOS DO FORNECIMENTO DE ALKOSEL EM COMPARAÇÃO COM SELÉNIO INORGÂNICO NA TRANSFERÊNCIA DE SELÉNIO VACA-VITELO. Por Departamento técnico TECADI
O
s suplementos de selénio para ruminantes encontramse classificados como sais inorgânicos (como o selenito ou o selenato de sódio) ou fontes orgânicas (tal como selenometionina sintética ou levedura enriquecida em selénio). Uma levedura enriquecida em selénio (SeY) com qualidade alta e consistente é o Alkosel, que consiste em 97-99% de componentes de selénio orgânico. SeY é a escolha correcta para fornecer uma fonte de Se de alta biodisponibilidade às espécies ruminantes. Os sais inorgânicos são conhecidos por serem altamente suscetíveis à dissolução e a formar Se elementar no ambiente ruminal, com efeitos negativos na sua biodisponibilidade. Pode observar-se uma melhoria na absorção de Se quando os sais inorgânicos são cobertos com camadas de proteção(1). Um parâmetro interessante, para avaliar a capacidade das diversas formas de Se para atingir de modo PERíODO DE TRATAMENTO
AMOSTRAS
46
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
apropriado as necessidades minerais das vacas gestantes e da sua descendência, é a eficiência da transferência de Se vaca-vitelo.(2) OBJETIVO Avaliar os efeitos de diferentes formas de selénio fornecidas a vacas durante o último trimestre de gestação e a primeira semana de lactação (como selenito de sódio não protegido ou protegido, ou leveduras enriquecidas em selénio), na eficiência da transferência de Se via dieta vaca-vitelo. MATERIAL E MÉTODOS LOCAL Exploração experimental (National Research Institute of Animal Production na Polónia). ANIMAIS 24 vacas* de raça Simental do dia 195 de gestação ao 7º dia pós-parto e 24 vitelos filhos
destas vacas desde o nascimento até ao 8º dia de vida. TRATAMENTOS No dia 195 de gestação as vacas foram distribuídas aleatoriamente por quatro grupos (n = 6) e a sua descendência pertencia ao mesmo grupo que a mãe: 1) NC: dieta base sem suplementação de Se (0,35mg/kg/MS) 2) SS: selenito de sódio não protegido (0,35mg/kg/MS) 3) P-SS: selenito de sódio protegido (0,35mg/ kg/MS) 4) Alkosel: levedura enriquecida com selénio (0,35mg/kg/MS). PARÂMETROS MEDIDOS Consumo alimentar, ingestão de Se, concentração de Se no leite, Se presente no soro sanguíneo de vacas e vitelos, eficiência de transferência de Selénio.
Antes do parto d93
Parto d0
d7
d8
Sangue das vacas
Sangue das vacas & vitelos, colostro
Leite
Sangue dos vitelos
Alkosel vs. selénio inorgânico na transferência de selénio vaca-vitelo
"O ALKOSEL É UMA LEVEDURA ENRIQUECIDA EM SELÉNIO QUE CONSISTE EM 97 A 99% DE COMPONENTES DE SELÉNIO ORGÂNICO." GRÁFICO 1 STATUS DE SELÉNIO NAS VACAS APÓS O PARTO c 0,074
Concentração de sangue (ug/ml)
0,08 Limiar de deficiência
0,07 0,06
b 0,052
a 0,043
0,05 0,04
+57%
b 0,060
Status Se no início
-9%
0,03 0,02 0,01 0,00 a;b;c:p<0,05
*Stowe & Herdt (1992)
ALKOSEL AUMENTOU A SECREÇÃO DE SELÉNIO NO LEITE As vacas suplementadas com ALKOSEL mostraram uma secreção de Se no colostro e no leite significativamente superior comparativamente às vacas suplementadas com selénio inorgânico (Gráfico 2). No colostro
No leite
+97% vs. NC
+208% vs. NC
+87% vs. SS
+167% vs. SS
+39% vs. P-SS
+105% vs.P-SS
ALKOSEL MELHOROU A TRANFERÊNCIA DE SELÉNIO PARA O VITELO • Os vitelos que receberam Se de vacas suplementadas com Alkosel tiveram maior
SS
P-SS
Alkosel
GRÁFICO 2 SECREÇÃO DE SELÉNIO NO LEITE a 1,38
1,4 1,2
0,8
NC SS P-SS
b 0,99
1,0
mg/d
RESULTADOS ALKOSEL MELHOROU O STATUS DE SELÉNIO DAS VACAS AO PARTO As vacas apresentavam uma deficiência em Se quando o período de suplementação começou: - o status de Se das vacas não suplementadas diminuiu 9% e atingiu um nível de 61% abaixo do limiar de deficiência. Essas vacas deficientes em Se aumentaram a sua deficiência para assegurar um fornecimento mínimo à sua descendência; - os animais suplementados com ALKOSEL aumentaram o Se no sangue em 57% e atingiram um nível de 6% acima do limiar de deficiência; - apesar da administração da dose recomendada de Se (0,35 mg/kg MS) só a suplementação com ALKOSEL atingiu os requerimentos para vacas gestantes (Gráfico 1).
NC
Alkosel a 0,80
c c 0,70 0,74
0,6
b b b 0,30 0,39 0,26
0,4 0,2 0,0
a;b;c:p<0,001
Colostro
Leite, d7
TABELA 1 CONCENTRAÇÃO DE SELÉNIO NO SANGUE DOS VITELOS (UG/ML) NC
SS
P-SS
ALKOSEL
Imediatamente após o nascimento
0,026
0,026
0,036
0,040b
Aos 8 dias de vida
0,027a
0,031a
0,047b
0,047b
a
a
a
Na mesma linha: a,b: p<0,05
concentração de Se no sangue do que os que receberam selénio inorgânico (SS) (Tabela 1). CONCLUSÃO A transferência de Se da dieta para a vaca é mais eficiente quando provém da levedura enriquecida em selénio (Alkosel) do que quando é Se inorgânico – quer este seja protegido ou não. Ao parto, apenas as vacas suplementadas com Alkosel tinham um status de Se adequado, atingindo os requerimentos de vacas gestantes. Como resultado disto, as vacas suplementadas com
Alkosel segregaram mais Se no colostro e no leite – levando a um maior consumo de selénio pelos vitelos. Este estudo confirma a importância de fornecer selénio orgânico dado que se mostra que é a única fonte capaz de atingir os requerimentos da vaca e de assegurar alta transferência para os vitelos. Bibligrafia: 1 - Stewart W.C., Bobe G., Vorachek W.R., Pirelli G.J., Mosher W.D., Nichols T., Van Saun R.J., Forsberg N.E., Hall J.A. (2012): Organic and inorganic selenium: II. Transfer efficiency from ewes to lambs. Journal of Animal Science, 90, 577–584 | 2 - Wlodarczyk R., Birkle B. (2010): Rumen protected selenium – the most effective form of selenium supply in ruminants nutrition. Zycie Weterynaryjne, 85, 238–242..
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SAÚDE E BEM-ESTAR | VACAS DE LEITE
ALIMENTAÇÃO E PROBLEMAS PODAIS
… MAIS DO QUE UMA ESTREITA LIGAÇÃO! NESTE ARTIGO PROCURO ABORDAR E CONTEXTUALIZAR O CONTRIBUTO QUE A ALIMENTAÇÃO E A NUTRIÇÃO PODEM APORTAR NAS QUESTÕES DOS PROBLEMAS PODAIS, QUE ORIGINAM CLAUDICAÇÃO EM RUMINANTES, NOMEADAMENTE AS LAMINITES.
LUÍS RAPOSO Engenheiro zootécnico Dep.TO Ruminantes Reagro l.raposo@reagro.pt
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E
ste tema junta, no mesmo contexto, a eficiência técnico-económica da exploração com o bem-estar animal. Qualquer modificação que cause uma anomalia na marcha/postura torna-se, muitas vezes, condição clínica para a degradação não só da eficiência técnica e econômica das explorações como da imagem que infelizmente é transmitida ao “público”. A laminite é uma doença multifatorial e a compreensão das suas causas continua a ser estudada. Existem, por exemplo, diversas substâncias e toxinas, como as endotoxinas, que são também discutidas como possíveis fatores desencadeadores. Durante um desequilíbrio bacteriano no rúmen a concentração de endotoxinas pode aumentar rapidamente e, uma vez no fluxo sanguíneo, essas endotoxinas podem atingir o tecido do casco e ter um impacto negativo na integridade do tecido. São várias as medidas que podem ser tomadas para reduzir os riscos e, como já vem sendo habitual nos diferentes temas, a prevenção é geralmente o melhor remédio.
MANEIO ALIMENTAR NO PERÍODO DE TRANSIÇÃO (PERI-PARTO) É consensual que existe uma relação estreita entre a alimentação e o desenvolvimento dos problemas podais, pois parte deles são consequências da incapacidade do córion para produzir uma unha saudável, sendo que a alimentação tem uma responsabilidade grande neste fenómeno. Há também muitas evidências de que a laminite pode aparecer durante o período de transição (3 semanas antes/depois do parto). Isto deve-se à existência de inúmeras mudanças fisiológicas e comportamentais inevitáveis, associadas ao parto, e que podem também afetar o córion (um menor crescimento do casco pode ser um dano não visível diretamente). Também aqui a dieta tem um papel significativo e o aumento notável dos casos de claudicação, a aparecer por norma a partir das 8 semanas após o parto, demonstram também a estreita ligação entre a importância da alimentação e as fase mais desafiantes do ciclo de produção, nomeadamente o peri-parto (Gráfico 1).
…
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Alimentação e problemas podais…mais que uma estreita ligação.
FATORES ALIMENTARES QUE PODEM ORIGINAR UMA LAMINITE: - acidose; - o nível de proteína na ração; - a digestão de fibras; - níveis de vitaminas e minerais. O CONTRIBUTO DA ALIMENTAÇÃO E ALGUMAS RECOMENDAÇÕES: - controlar a fibrosidade da ração; - controlar o aporte de energia (evitar excessos e carências); - respeitar as transições; - evitar a distribuição de alimentos mofados ou mal conservados; - aportar um fornecimento suficiente de minerais, oligoelementos e vitaminas (Ca, P, Cu, Zn, S, Co; Vit A, Vit B2, Vit B6 e Vit D); - suplementar com biotina. NUTRIÇÃO E EQUILÍBRIO RUMINAL: RELAÇÃO ENTRE A SAÚDE PODAL E O INÍCIO DE UMA LAMINITE POSSÍVEIS CAUSAS DE ORIGEM ALIMENTAR Vacas em lactação e afetadas por laminite podem ter sofrido uma diminuição de imunidade, um défice de energia, ou um excesso de carboidratos rápidos que podem ter sido a causa do problema. - No período seco é importante o cuidado com rações/dietas muito ricas em concentrados e insuficientemente fibrosas. Após o parto a ingestão ainda está limitada por um volume ruminal insuficiente, e isso poderá causar stress e mobilização corporal (balanço energético negativo). Cuidado com vacas demasiado gordas ao momento do parto. - Défice de energia → emagrecimento: em paralelo com a habitual perda de peso no início da lactação, há uma perda de tônus
muscular que é importante na sustentação do esqueleto e que causa uma sobrecarrega nos aprumos. De igual modo, a mobilização de gordura traz um afinamento da crista gordurosa podal e uma redução da sua função de amortecimento da pata. Em pisos mais duros poderá originar lesões nos cascos e úlceras. - Excesso de proteína poderá conduzir uma sobrecarga hepática prejudicial à capacidade reguladora do fígado, que fica diminuída para poder lidar com situações de inflamação em vacas por sua vez mais suscetíveis a infecções podais. De igual modo, a capacidade desintoxicante e o potencial de gliconeogénese hepática poderão também ficar reduzidos num momento em que existe uma forte mobilização de gordura (início da lactação). Desta forma, vários estudos comprovaram que um excesso de proteínas poderá aumentar essa predisposição. Pastagens e forragens que contenham altos conteúdos de nitrato, muito ricas em proteína (> 22% MAT) ou demasiada proteína de elevada degradabilidade também podem contribuir para um cenário propício a uma laminite, mas em geral o pastoreio pode ajudar a reduzir a frequência de algumas doenças podais. Em casos de vacas estabuladas, uma alimentação rica em proteína e baixa em fibra conduz a fezes mais abundantes e mais líquidas, que vão conspurcar os pisos onde os animais se
movimentam. Esta situação deve ser tida em conta porque predispõe ao crescimento de microrganismos e amolecimento dos cascos, sendo assim mais facilmente atacados por esses agentes patogénicos. MANEIO DA ACIDOSE RUMINAL CLÍNICA E SUBCLÍNICA Práticas alimentares arriscadas podem provocar acidoses que, por sua vez, poderão ser causa de laminite. Exemplo disso são as acidoses ruminais com situação de toxemia, normalmente associadas à ingestão de quantidades excessivas de alimentos concentrados ou de níveis muito elevados de amidos e/ou outros açucares (carboidratos rápidos). Esta situação piora se associada a uma baixa ingestão de forragem ou outras fontes de fibra. Neste mesmo contexto é importante gerir as transições alimentares e não só implementar dietas equilibradas durante as fases críticas e desafiantes (como o período pós-parto) mas respeitar períodos de adaptação às modificações da dieta. A absorção de ácido láctico no sangue, típica de uma acidose, conduz a uma pior circulação sanguínea, menor aporte de nutrientes aos cascos, destruição da flora ruminal (com produção de toxinas) e danos nos vasos sanguíneos. Os sinais de acidose detectados nas patas são geralmente um tom rosado na pele em redor do casco (congestão sanguínea) e um alongamento das unhas.
GRÁFICO 1 Nº DE VACAS COXAS POR MÊS DE LACTAÇÃO 60 Nº de vacas coxas
…
A Tabela 1 demonstra que as pontuações de locomoção pioram claramente após o parto e independentemente da pontuação revelada anteriormente ao parto. O período de transição e o início da lactação constituem um flagrante período de fragilidade de patas/cascos, e alguns casos de laminite que possam surgir a meio da lactação poderão ter sido desencadeados durante o período de transição, vários meses antes. O início da lactação, a involução uterina, as alterações metabólicas e endócrinas são alguns dos momentos mais desafiantes do período de peri-parto, e podem contribuir para o aparecimento de problemas podais. Todos estes desafios e a necessidade de adaptação causam stress oxidativo, uma baixa de imunidade e um estado inflamatório recorrentes.
40
20
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Mês de lactação
TABELA 1 AS PONTUAÇÕES DE LOCOMOÇÃO PIORAM CLARAMENTE APÓS O PARTO E INDEPENDENTEMENTE DA PONTUAÇÃO REVELADA ANTERIORMENTE AO PARTO. Scores de motricidade e locomoção Vacas Novilhas
1
2
3
4
5
5 semanas ANTES parto
36%
5 semana DEPOIS parto
21%
45%
14%
5%
0%
32%
26%
11%
11%
5 semanas ANTES parto
87%
22%
1%
0%
0%
5 semana DEPOIS parto
26%
47%
21%
5%
0%
"ESTUDOS NO REINO UNIDO DIZEM QUE VACAS COM UMA CC < 2,5 NO MOMENTO DO PARTO TÊM MAIOR RISCO DE CLAUDICAÇÃO." 50
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Alimentação e problemas podais…mais que uma estreita ligação.
RELAÇÃO ENTRE COMPORTAMENTO ALIMENTAR E UMA LAMINITE Vacas coxas podem ingerir a mesma quantidade de ração ou eventualmente um pouco menos, se a pontuação da sua locomoção for >3, mas fazem-no através de um menor número de refeições devido à sua dificuldade de movimentação. Isto conduz a uma maior quantidade de ração ingerida por refeição e aumenta o risco de picos de acidose, logo de laminite. Esta limitação no comportamento alimentar é mais notório em vacas primíparas, mas em qualquer dos casos piora a eficiência alimentar, conduzindo a um decréscimo do leite produzido e um maior desperdício alimentar (Gráfico 2). RELAÇÃO ENTRE A PONTUAÇÃO CONDIÇÃO CORPORAL (CC) E A CLAUDICAÇÃO Serão as vacas coxas que ficam magras ou serão as vacas magras que ficam coxas? > Estudos no Reino Unido dizem que: - vacas com uma CC < 2,5 no momento do parto têm maior risco de claudicação;
- a perda de condição corporal aumenta o risco de claudicação; - a melhoria de condição corporal aumenta as chances de recuperação de claudicação; - a baixa condição corporal precede a primeira claudicação (em claudicação repetida) > Porquê? > Hipótese: a perda de condição corporal por mobilização excessiva de reservas de gordura é propícia a uma situação de cetose no início da lactação. Em simultâneo, o afinamento da almofada de gordura na almofada plantar reduz a função de absorção de impacto da pata em choques mais violentos, ao colocar a pata no chão; ambas as situações originam lesões e claudicação. > Espessura do tecido plantar correlacionada com a condição corporal da vaca (*). O INTERESSE E O CONTRIBUTO DA SUPLEMENTAÇÃO MINERAL Alguns principais oligoelementos e vitaminas desempenham um papel fundamental na manutenção da qualidade e integridade
do casco. Cálcio, fosforo, cobre, zinco, manganês, selénio, cobalto e biotina são alguns dos que merecem especial destaque. Uma deficiência ou um inadequado aporte de minerais pode conduzir à deformação e desgaste irregular dos cascos ou ao aparecimento de anéis de crescimento heterogêneos. Além disso, representará uma porta aberta para várias lesões, doenças podais e claudicação. As lesões traumáticas por penetração de corpos estranhos devem-se quase sempre a um casco de má qualidade, que por ser mais mole facilitará a ocorrência de traumas e o desenvolvimento de germes, e podem ser originadas por uma inadequada administração de nutrientes. A carência de microelementos como o cobre (Cu) e o zinco (Zn), e de vitamina E e selénio (Se) são na actualidade considerados fatores de risco para as doenças podais. (*) [Lim et al (2015). Prev Vet Med 118: 370-377; Randall et al (2015). Journal of Dairy Science, 98: 3766-3777; Reuben Newsome, International Dairy Nutrition Symposium, Wageningen, 22 October 2015].
GRÁFICO2 COMPORTAMENTO ALIMENTAR E NÍVEL DE INGESTÃO DE VACAS LEITEIRAS DE ACORDO COM SUA PONTUAÇÃO DE LOCOMOÇÃO (NORRING ET AL., 2014 BACH ET AL.,2007) 275
25 268,1 20
264
270 262
265 260
15
255
247,7
250
10
5
240 4,89
4,6 20,2
0
245
Pontuação 1
4,66 20,1
Pontuação 2
4,61 20,5
Pontuação 3
240 235
3,69 19,6
Pontuação 4
19,5 Pontuação 5
Número de refeições MSI (kg/dia Tempos de ingestão (min/dia)
230 225
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RITA CLÁUDIA NEVES SILVA Médica veterinária ritaclaudians@gmail.com
SAÚDE E BEM ESTAR | VITELOS
IMPACTO DOS VITELEIROS NA DRB
O PRESENTE TRABALHO, DESENVOLVIDO NAS REGIÕES DA BEIRA LITORAL, ESTREMADURA E RIBATEJO, TEVE COMO OBJETIVO A AVALIAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES AMBIENTAIS NOS VITELEIROS, POR FORMA A AFERIR AS POSSÍVEIS RELAÇÕES COM A PREDISPOSIÇÃO DE DOENÇA RESPIRATÓRIA BOVINA (DRB) ENTRE OS VITELOS.
O
complexo respiratório bovino engloba um conjunto de doenças de natureza multifatorial, que pode ter causas, manifestações clínicas e implicações diversas (Snowder et al. 2006). Young (2012) diz-nos que este complexo resulta da combinação entre uma infeção viral e/ou bacteriana com fatores stressantes ambientais e do próprio maneio. A doença respiratória bovina (DRB) continua entre as causas mais frequentes de morte em vitelos, principalmente antes do desmame (Garcia e Daly 2010; Murray et al. 2018). Os animais que resistem à doença têm desempenhos fracos na vida adulta (Garcia e Daly 2010), com repercussões na vida reprodutiva e produtiva (Young 2012). A identificação dos fatores ambientais como fatores de risco no desenvolvimento da DRB revela o importante papel das instalações no bem-estar e saúde dos animais. A caracterização do ambiente dos viteleiros pode ser uma ferramenta chave na prevenção, não só de problemas respiratórios como também de diarreias, ambos comuns entre os vitelos. Esta caracterização deve abranger aspetos como o tipo de alojamento utilizado (cubículo, grupo e/ou iglô), material da cama, ventilação, desinfeção, entre outros (Figura 1). As características do ambiente em que o vitelo se encontra influenciam diretamente a sua saúde. Snowder et al. (2006) defendem a avaliação de fatores como o clima, a 52
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temperatura, a presença de poeiras, a densidade populacional, a humidade e a ventilação. A ventilação tem como funções primordiais a eliminação de gases nocivos, correntes de ar e ar estagnado, e a diminuição dos níveis de endotoxinas e microrganismos patogénicos do ar e poeiras (Teagasc 2017). A presença de gases nocivos e poeiras no ar circulante tem efeitos negativos sobre o aparelho respiratório, irritando as membranas mucosas, o que deixa o organismo mais vulnerável a doenças respiratórias. A acumulação de gases como a amónia prejudica os mecanismos de clearance mucociliar (Potter e Aldridge 2010), cuja velocidade de movimentos é, por si só, menos eficiente nos bovinos do que em outras espécies. Para assegurar que a
ventilação é feita corretamente, o edifício deve ser projetado de modo a permitir a entrada e distribuição uniforme do ar exterior, a sua mistura com os contaminantes do ar interior e posterior saída (Gooch 2007). Todos estes movimentos de ar devem ser feitos a uma velocidade adequada, removendo as partículas indesejadas e o excesso de calor ou vapor de água (Figura 2). A velocidade de circulação do ar tem de ser um parâmetro de controlo regular, não devendo atingir os 0.5 m/s, valor a partir do qual já é considerado uma corrente de ar, prejudicial ao animal (Teagasc 2017). Se a ventilação não for feita corretamente e existirem correntes de ar, o animal pode chegar a duplicar as perdas de energia por calor. Nessa situação, além dos problemas
l tura o na ã ç ila Vent AR
es laçõ Insta
CONTAMINADO
TIPO AGENTES PATOGÉNICOS T ºC
CAMA
DRENAGEM
GASES
HUMIDADE
MISTURA
DESINFEÇÃO
ALIMENTAÇÃO E ÁGUA
FIGURA 1 CARACTERÍSTICAS AVALIADAS NO VITELEIRO
AR FRESCO
AR CONTAMINADO
VENTILAÇÃO POEIRA
CALOR
FIGURA 2 CIRCULAÇÃO DE AR NO ALOJAMENTO
Impacto dos viteleiros na DRB
respiratórios, irá ocorrer uma diminuição da ingestão com menores taxas de conversão e o aparecimento de efeitos a longo prazo (Gooch 2007). A ventilação natural tem por base a energia do vento e/ou o efeito chaminé (Figura 3, adaptação de Nordlund e Halbach 2019), o que a torna eficiente e ao mesmo tempo economicamente favorável, justificando esta opção. Quando não há vento, a renovação de ar faz-se por convecção, ou “efeito chaminé” (também conhecido por efeito pilha), devido às diferenças de temperatura entre o exterior e o interior do edifício. Através do calor gerado pelos animais, o ar do interior do estábulo perde densidade, sobe e sai pelo ponto mais alto do edifício (Santos 2017); isto acontece de forma cíclica, pois à medida que o ar sai há novamente entrada de ar nas aberturas (Teagasc 2017).
EFEITO PILHA
FIGURA 3 EFEITO CHAMINÉ/PILHA Na ausência de vento, as flutuações térmicas criadas pelo calor dos animais são a única fonte de ventilação natural, o que, segundo Nordlund (2007;2008) e Hardesty (2011), pode ser bastante limitador e desafiante. A funcionalidade deste sistema implica a adaptação da construção do próprio alojamento através da presença de: • aberturas laterais na fachada, para forçar a entrada dos ventos prevalentes no edifício; • beirados, para prevenir a entrada de precipitação ao mesmo tempo que permite a entrada de ar e fornece alguma sombra (Gooch 2007), embora Albright (1990 citado por Nordlund 2008) defenda que a velocidade do vento que entra pelos beirados é relativamente baixa para permitir que exista uma boa mistura do ar; • cumeeiras, que permitem a existência do efeito chaminé (Albright 1990 citado por Lago et al. 2006 e por Nordlund 2007); • telhado com inclinação interior, para facilitar a subida do ar; • distância suficiente entre as aberturas (laterais e cumeeira) para que haja circulação interior do ar (Nordlund e Halbach 2019). Adicionalmente poderá existir um sistema de cortinas, com abertura mínima de 50% da área da parede (Nordlund e Halbach 2019), que permite ajustar o ambiente no viteleiro às condições climatéricas exteriores. Este sistema pode ser controlado automaticamente ou manualmente (Gooch 2007), com base
Sinal clínico
Normal
Pontuação se anormal (qualquer severidade)
Descarga ocular
0
2
ou
ou
Descarga nasal
0
4
ou
ou
Orelhas caídas ou inclinação da cabeça
0
5
ou
ou
Tosse Respiração Temperatura
0 0 0
Sem tosse Normal <39,2 ºC
2
Tosse espontânea Respiração rápida ou difícil Igual ou > 39,2 ºC
2 2
FIGURA 4 AVALIAÇÃO DA DRB ATRAVÉS DE UM SISTEMA DE PONTOS (ADAPTADO DE YOUNG 2012)
na capacidade de o operador perceber o que melhor se adequa a cada situação. Isto pode ser difícil no tempo frio, em que alguns operadores fecham totalmente as cortinas por acharem ser o mais correto quando, na realidade, estão a impedir a ventilação do edifício pelos ventos dominantes (Lago et al. 2006). Para além das cortinas ajustáveis, que permitem regular o ambiente interior no tempo frio e ventoso, pode ser necessária a suplementação da ventilação no tempo quente ou sem vento (Rong et al. 2016). Segundo Rong et al. (2016), a taxa de ventilação do alojamento varia com o ângulo de incidência do vento, as aberturas laterais e a cumeeira. Para evitar as correntes de ar ao nível dos animais, o produtor pode optar por algumas estratégias, tais como: - adicionar uma cobertura na zona inferior da entrada do edifício, se esta estiver aberta na direção dos ventos prevalentes; - assegurar que toda a cama dos vitelos está coberta pelo material utilizado, evitando as correntes de ar em superfícies com ripas (Dairy Australia 2017); - adicionar materiais como fardos de palha ou telas em alojamentos de elevadas dimensões. O presente trabalho, desenvolvido no âmbito da dissertação de mestrado integrado em Medicina Veterinária, entre 7 de outubro de 2019 e 10 de fevereiro de 2020, em 46 explorações das regiões da Beira Litoral e Estremadura e Ribatejo, teve como objetivo a avaliação e caracterização das condições ambientais nos viteleiros, por forma a aferir as possíveis relações com a predisposição de DRB entre os vitelos. Os dados relativos a questões do maneio geral dos vitelos e das instalações foram obtidos através de um questionário, dividido em duas partes, uma com as respostas dadas pelo produtor e outra
com a avaliação direta das instalações e dos animais. A avaliação direta das instalações incluiu parâmetros como o material da cama, o “Nesting score” (que avalia a capacidade do vitelo se aninhar na cama), a higiene e o tipo de instalação (interior/exterior) e alojamento utilizados (cubículo/grupo/iglô), enquanto ao nível dos vitelos foi utilizado um sistema de pontuação simplificado para deteção de DRB, desenvolvido pela Universidade da Califórnia (Figura 4). A avaliação das camas é um ponto chave na prevenção de DRB e a Universidade do Wisconsin desenvolveu um sistema de pontuação denominado “Nesting score” (NS), que faz essa avaliação em função da capacidade do vitelo se “aninhar”(Lago et al. 2006). A pontuação, de 1 a 3, é atribuída após um exame visual que avalia a visibilidade dos membros posteriores do vitelo quando deitado. O NS é 1 quando a perna inteira está visível, adequado apenas ao tempo quente. Se a parte inferior da perna estiver coberta e o membro apenas parcialmente visível, o NS é 2, adequado ao tempo frio se em conjunto com um casaco. Quando a cama cobre a totalidade das pernas, o NS é 3, mais adequado ao inverno (Figura 5).
…
1
2
3
FIGURA 5 NESTING SCORE (ADAPTADO DE NORDLUND E HALBACH 2019)
"A AVALIAÇÃO DAS CAMAS É UM PONTO CHAVE NA PREVENÇÃO DA DOENÇA RESPIRATÓRIA BOVINA." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Impacto dos viteleiros na DRB
… A deteção de correntes de ar ao nível dos
animais (velocidade de ar superior a 0,5 m/s) foi efetuada com o auxílio de um anemómetro digital que possibilitou ainda a determinação da temperatura no alojamento. A caracterização dos viteleiros desenvolvida neste estudo, assim como das práticas de maneio e higiene envolvidas, revelou que as implicações das condições fornecidas aos vitelos no desempenho produtivo e reprodutivo dos animais em adultos ainda não são totalmente reconhecidas. Esta afirmação surge pelo facto de ainda existirem produtores que não assumem como prioridade a administração inicial rigorosa do colostro (em termos quantitativos, qualitativos e de tempo) ou o acesso livre de água aos animais, bem como pelo elevado número de alojamentos com classificações de Nesting score 1 e de higiene deficiente (Gráfico I). NESTING SCORE 1 Higiene alojamentos
Higiene baldes
16 14 12
11
9
2 Boa
Razoável
Má
GRÁFICO I HIGIENE DOS ALOJAMENTOS COM NS1 É importante referir que o período em que decorreu o estudo permitiu ainda presenciar o impacto positivo da implementação dos sistemas de certificação das explorações leiteiras em bem-estar animal, por parte das cooperativas, na construção dos alojamentos para os vitelos e nas práticas em termos de maneio. Este facto traduziu-se em ambientes que cumpriam, na sua generalidade, os requisitos em termos de dimensões, densidade animal e temperatura. Um ponto negativo passa pela falta de perceção de alguns produtores dos benefícios obtidos com a implementação das medidas exigidas no desenvolvimento dos vitelos, assumindo o seu cumprimento apenas pela exigência da certificação. O objetivo principal passou pela deteção de correntes de ar ao nível dos vitelos, cuja presença pode passar despercebida ao produtor, e que constitui um fator relevante na predisposição de doença respiratória bovina. O envolvimento e interesse demonstrado por alguns produtores/tratadores neste processo, com a explicação do método utilizado e dos principais objetivos, foi um ponto importante na consciencialização da problemática envolvente. A deteção frequente de valores correspondentes a correntes de ar nos alojamentos, revela a importância desta 54
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
TIPOS DE ALOJAMENTOS ENCONTRADOS NO ESTUDO
avaliação para o sucesso do viteleiro. Para além da deteção de correntes de ar, a classificação em termos de higiene (ainda que subjetiva e através de um modelo próprio) permitiu concluir que grande parte dos produtores ainda descura um parâmetro essencial no sucesso da produção animal. A classificação qualitativa das camas através do Nesting score revelou ser um parâmetro crucial neste estudo, pelo elevado número de classificações inferiores ao recomendado e pela associação a alojamentos com vitelos suspeitos da doença. CONCLUSÕES Os resultados obtidos permitiram concluir que, independentemente do tipo de alojamento escolhido pelo produtor, o método mais adequado na prevenção da DRB tem de incluir o aporte de quantidades suficientes de energia (quer pelo maneio correto do colostro, quer pela alimentação na fase posterior), o acesso a uma zona de descanso seca e com a profundidade adequada a cada época e um ambiente livre de correntes de ar. O desenvolvimento deste estudo permitiu concluir que a dificuldade em assegurar valores de velocidade do ar que permitam a ventilação correta do espaço, diz respeito não só à presença de correntes de ar ao nível dos animais em alguns alojamentos, como à ausência de circulação de ar noutros. Os alojamentos individuais e os grupos devem ser considerados como microambientes dentro do viteleiro, uma vez que a ventilação do pavilhão não assegura a ventilação individual de cada compartimento. Aliada a medidas de prevenção no desenho das instalações está a deteção precoce de animais suspeitos de DRB. A implementação de um sistema de classificação que permita a identificação precoce destes animais, como o que foi utilizado neste estudo, facilita o diagnóstico e evita que este seja tardio e acarrete por isso um maior número de consequências. Sistemas como estes deveriam ser introduzidos na rotina diária da pessoa responsável pelos vitelos, por forma a melhorar o desempenho da exploração. A deteção de animais suspeitos deverá
ser comunicada ao médico veterinário responsável, para que este avalie o animal e institua a terapêutica, se tal for necessário. A existência de protocolos de tratamento é uma ferramenta importante, de forma a garantir a utilização dos fármacos adequados e prescritos pelo médico veterinário, independentemente do trabalhador que administra a medicação. Os resultados obtidos permitiram ainda, com base na bibliografia utilizada, a recomendação de algumas estratégias possíveis de adotar por cada produtor, em relação à melhoria das instalações, seja em relação ao tipo de alojamento ou a aspetos de maneio/ alimentação. A prevenção da Doença Respiratória Bovina deve apostar não só na melhoria das práticas em termos de maneio e higiene dos alojamentos, como numa formação e envolvimento contínuo de produtor e trabalhadores nas mais diversas questões relacionadas com a produção e bem-estar animal. A adoção de sistemas de pontuação, quer das camas, quer no diagnóstico precoce de DRB, podem ser ferramentas práticas e fáceis de utilizar pelos trabalhadores, quando instruídos para o assunto. De realçar o equilíbrio que deve ser procurado entre a ausência de correntes de ar nos viteleiros e a falta de ventilação dos mesmos (Figura 6). FORMAÇÃO DO PRODUTOR E DOS TRABALHADORES
MANEIO ADEQUADO
HIGIENE E NESTING SCORE
CORRENTE DE AR VS. FALTA DE VENTILAÇÃO SISTEMAS DE DETEÇÃO PRECOCE DRB
FIGURA 6 PONTOS-CHAVE NA PREVENÇÃO DA DRB Bibliografia: para mais informações, contactar o autor: ritaclaudians@gmail.com
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FOTO 1. Parque de vacas secas com ventoinhas e aspersores para arrefecimento dos animais. O arrefecimento dos animais no verão para evitar stress pelo calor, é importante não só no pré-parto, mas em todo o período seco.
SAÚDE E BEM ESTAR | VACAS DE LEITE
LONGEVIDADE DAS VACAS LEITEIRAS
QUANTOS ANOS PODERÁ VIVER UMA VACA? NÃO SERÁ RARO EM EFETIVOS DE BOVINOS ALEITANTES ENCONTRARMOS VACAS COM 20 ANOS DE IDADE. NO CASO DAS VACAS LEITEIRAS, A RECORDISTA É UMA VACA IRLANDESA DE NOME BIG BERTHA QUE VIVEU DURANTE 48 ANOS, TENDO DURANTE ESSE PERÍODO DADO À LUZ 39 VITELOS, ANGARIADO 75.000$ PARA A LUTA CONTRA O CANCRO E BATIDO 2 RECORDES DO GUINESS. NO ENTANTO, A REALIDADE PARA A MAIOR PARTE DAS VACAS LEITEIRAS É DIFERENTE.
D RICARDO BEXIGA Médico Veterinário Faculdade Medicina Veterinária Universidade de Lisboa Serbuvet, Lda. ricardobexiga@fmv.ulisboa.pt
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e acordo com trabalhos publicados em várias partes do globo, a idade média à saída de um efetivo leiteiro é de 5 anos para a maior parte das vacas, e as taxas de refugo são superiores a 30%. Isso significa que, com idades médias ao primeiro parto de 24 meses, a vida produtiva das vacas leiteiras rondará os 32 meses já que o período seco é uma fase improdutiva. Alguns poderão questionar se a baixa longevidade das vacas leiteiras estará relacionada com produções elevadas – estaremos nós a “explorar” as nossas vacas até ao ponto de comprometer a sua saúde e com isso a encurtar as suas vidas? Um estudo canadiano que acompanhou mais de 430.000 lactações, por exemplo, não encontrou evidências disso. A mesma questão que agora formulamos em relação a passar dos 13.000 para os 14.000 litros de produção média aos 305 dias, terá seguramente sido colocada
quando esta passou dos 5.000 para os 6.000 litros. A verdade é que se não existir saúde, também não existe produção leiteira, o que é visível por exemplo na listagem das maiores produções tal como registadas no resumo do contraste leiteiro nacional, onde figuram muitas vacas com produções totais acima dos 100.000 litros. DEVEMOS DISTINGUIR ENTRE DOIS TIPOS DE REFUGO Por um lado, existe o refugo voluntário, que pode ser por baixa produção, problemas comportamentais ou venda para outra vacaria. Por outro lado, o involuntário que incluirá o realizado por problemas reprodutivos, problemas relacionados com mastites clínicas ou subclínicas, coxeiras, doenças (hipocalcemia, deslocamento de abomaso ou outro) ou por acidentes. O refugo involuntário acarreta perdas elevadas sob vários pontos de vista. Em
Longevidade das vacas leiteiras
FOTO 2. Cubículos sem tapetes, sem qualquer material de cama, não fornecem condições de conforto para maximizar o tempo que as vacas passam deitadas, acabam por levar a claudicações que muitas vezes acabam por determinar o refugo involuntário.
FOTO 3. Parque de cubículos originalmente com tapetes, após conversão para cama de areia, promovendo um aumento do tempo que os animais permanecem deitados.
primeiro lugar existem perdas económicas associadas às doenças que deram origem ao refugo e ao facto de a remoção precoce do efetivo ser penalizadora porque quanto mais precoce é essa remoção, menor será o contributo financeiro desse animal para a vacaria – tem sido observado que, em média, uma vaca apenas paga o investimento realizado na sua recria ao redor de metade da segunda lactação. Depois, porque existe impacto em termos de bem-estar animal, que é negativo só por si porque se traduz em animais em sofrimento, por vezes com dor crónica, mas também pela má imagem para o consumidor que daí advém. Um elevado refugo involuntário traz também consigo impacto ambiental, pois para a mesma quantidade de leite produzido são necessários mais animais, correspondentes a um maior efetivo de substituição. Finalmente, e caso o refugo involuntário leve à necessidade de aquisição de animais fora da vacaria, a compra destes animais de substituição acarreta o risco de entrada de agentes infeciosos como Staphylococcus aureus, vírus de BVD ou IBR, entre muitos outros. DE QUE FORMA PODEREMOS ENTÃO REDUZIR O REFUGO INVOLUNTÁRIO NOS NOSSOS EFETIVOS? Existem várias áreas onde podemos intervir para melhorar a longevidade dos nossos animais. Uma dessas áreas é a da saúde da glândula mamária. Muitas vacas serão refugadas por terem mastites clínicas recorrentes ou
por terem contagens de células somáticas elevadas de forma crónica. Muitos artigos têm sido escritos sobre a prevenção das mastites, não cabendo no texto atual mais um conjunto de recomendações sobre esta área. No entanto, é importante referir que as mastites, sejam elas clínicas ou subclínicas, têm impacto sobre o refugo noutras áreas, nomeadamente na área reprodutiva. De facto, já foi observado que a ocorrência de mastites clínicas ou subclínicas tem impacto sobre o refugo devido a causas reprodutivas. A utilização de anti-inflamatórios não esteroides (associada ou não à utilização de antibióticos) no tratamento inicial de qualquer mastite clínica é uma ferramenta essencial para poder reduzir o impacto reprodutivo, mas também para ajudar na recuperação da ingestão de matéria seca, da produção, da febre e da dor associadas à mastite clínica. A primeira razão para o refugo involuntário é na maior parte dos estudos a infertilidade das vacas leiteiras. A função reprodutiva pode ser afetada por vários processos. Um deles será sem dúvida o balanço energético negativo que pode interromper a atividade ovárica (em média só 3 semanas após o ponto mais baixo do balanço energético haverá ovulação). Mesmo depois desta atividade ser retomada, várias estruturas reprodutivas (folículos e oócitos) ficam comprometidos na sua qualidade, e por isso viabilidade, devido a este balanço energético negativo. Podem também existir alterações irreversíveis nos ovidutos, estruturas de ligação do útero aos ovários, que impeçam a fecundação de sequer
acontecer. Finalmente, e talvez a maior causa de infertilidade nas vacas leiteiras, a endometrite subclínica ou inflamação da camada mais superficial do útero, determina que a gestação não possa acontecer. Infelizmente, até hoje, não existe um medicamento que tenha eficácia demonstrada no tratamento da endometrite a partir de cerca do dia 35 pós-parto. A intervenção no tratamento desta condição tem de ser realizada no primeiro mês pós-parto, altura em que na maior parte das vezes não existe um diagnóstico da doença. MELHORAR A FERTILIDADE O que podemos fazer para tentar melhorar a fertilidade, é acompanhar frequentemente alguns indicadores para o nosso efetivo e investigar potenciais fatores de risco, quando estes indicadores se afastam dos valores-alvo. A infertilidade, como a maior parte dos problemas nas vacarias leiteiras, é multifatorial e portanto não existe apenas uma medida corretiva que possa solucionar o problema. Acresce que os problemas a nível dos animais são de difícil diagnóstico e com frequência não têm solução, sendo por isso a nível da prevenção que poderemos ter mais impacto. Os 3 indicadores mais úteis para acompanhar a fertilidade do nosso efetivo são (e valores-alvo considerados realistas pelo autor): - taxa de submissão – número de vacas inseminadas num período de 21 dias, de todas as vacas disponíveis para inseminar (valor-alvo de 70%); - taxa de conceção – número de vacas que
…
"A PRIMEIRA RAZÃO PARA O REFUGO INVOLUNTÁRIO É, NA MAIOR PARTE DOS ESTUDOS, A INFERTILIDADE DAS VACAS LEITEIRAS." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Longevidade das vacas leiteiras
FOTO 4. Observou-se que a existência de uma área de exercício exterior aos parques com cubículos, leva a menos casos de coxeiras por razões traumáticas.
… ficaram gestantes de todas as vacas que
foram inseminadas (valor-alvo de 35%); - taxa de prenhez – produto da taxa de submissão pela taxa de conceção, refletindo a verdadeira eficácia reprodutiva do efetivo (valor-alvo de 24%). Para além duma monitorização frequente destes indicadores, acompanhada de intervenção sempre que houver desvios acentuados dos objetivos da vacaria, existem outras medidas às quais se pode recorrer em casos particulares, envolvendo o tratamento hormonal de acordo com aconselhamento médico-veterinário. O doseamento da hormona progesterona na altura da inseminação artificial e 22 dias depois, num grupo de animais, pode ajudar a esclarecer se a altura da inseminação é a correta e se está a ocorrer morte embrionária, funcionando como uma excelente ferramenta de diagnóstico também. EVITAR PROBLEMAS DE SAÚDE NO PERÍODO DE TRANSIÇÃO Muitas vacas que acabam por sair precocemente das vacarias, fazem-no porque morrem ou são refugadas logo no primeiro mês após o parto, ou nos primeiros 100 dias de lactação. Estas vacas correspondem a animais que provavelmente tiveram problemas durante o período de transição, que podemos considerar como decorrendo de 3 semanas antes até 3 semanas depois do parto. A ocorrência de hipocalcemias, metrites, deslocamentos de abomaso ou outros problemas de saúde com génese no período de transição, levam com frequência a uma remoção precoce destes animais dos efetivos. Existem algumas boas práticas que podem diminuir a frequência e o impacto das doenças mencionadas. Estas incluem espaço adequado de manjedoura e de área pré-parto: cerca de 76 cm de comprimento
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de manjedoura e 12 m2 por animal de área, em qualquer altura do ano, isto é, tendo em consideração a distribuição não uniforme dos partos ao longo do ano. Deve também ser proporcionado arrefecimento aos animais quando as temperaturas estão mais elevadas, de modo a combater o stress térmico (Foto 1). Esta medida melhorará o conforto dos animais, e levará também a uma maior ingestão de matéria seca, com vantagens em termos de prevenção de doenças do peri-parto. Para além desse efeito existem evidências de que este arrefecimento, ocorrendo durante todo o período seco, contribui para produções leiteiras mais elevadas na lactação seguinte. Outra das causas que frequentemente leva à saída precoce das vacas leiteiras dos seus efetivos, são as coxeiras ou claudicações. Estas causam um enorme impacto económico sobre as empresas de produção leiteira, não só devido ao refugo involuntário, mas também pelo impacto que têm sobre a produção leiteira e sobre a fertilidade dos animais. Todas as condições que levem ao aumento do tempo que as vacas passam de pé, levarão também ao aumento da frequência de lesões de origem traumática como as úlceras da sola. Sobrepopulação, superfície das camas rija ou cubículos que dificultem os movimentos dos animais para se deitarem ou se levantarem (Foto 2), levam geralmente a esse aumento de tempo que os animais passam em pé. É possível converter parques de cubículos com tapetes em parques com camas de areia com investimentos relativamente baixos (Foto 3). Idealmente, durante o período de descanso das vacas, mais de 85% das vacas que estão em contacto com qualquer ponto dos cubículos, deve estar deitada. Existem também evidências de que quando existe acesso a pastagem ou zona de exercício, para animais alojados
primariamente em cubículos, se observa uma redução da incidência de úlceras da sola e globalmente de coxeiras (Foto 4). A INFLUÊNCIA DA GENÉTICA NA LONGEVIDADE Em termos de outras soluções possíveis para o problema da longevidade das vacas leiteiras, é discutível se a genética pode beneficiar fortemente a longevidade. A heritabilidade, facilidade com que uma característica é passada à geração seguinte, é baixa para a longevidade, apesar de haver características que se sabe serem melhoradoras da longevidade como o ligamento anterior do úbere, pernas e cascos ou contagens de células somáticas. Os índices utilizados hoje em dia para a seleção de sémen atribuem importância variável à longevidade. O crossbreeding, com rotação de raças para tirar partido do vigor híbrido, poderá ter algum impacto positivo na sobrevivência dos animais, mas com algum impacto negativo sobre a produção ao longo da vida. CONCLUSÃO Em conclusão, a longevidade das vacas leiteiras é um problema do qual produtores, veterinários e todos os consultores que trabalham com estes animais devem estar conscientes. É danoso para os animais, para a economia das vacarias e para a imagem de todo o setor produtor de leite. As causas principais da saída precoce e involuntária destes animais são a infertilidade, problemas de saúde do úbere, coxeiras e problemas no período de transição. Em todas estas áreas é possível tomar medidas corretivas, sobretudo preventivas, para conseguir garantir vidas mais longas, saudáveis e produtivas às nossas vacas.
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DEOLINDA SILVA Diretora Serviços Técnicos Ruminantes, Hipra Portugal deolinda.silva@hipra.com
SAÚDE E BEM-ESTAR | BOVINOS
O BRSV NAS PNEUMONIAS EM BOVINOS VÁRIOS ESTUDOS DEMONSTRARAM UMA RELAÇÃO ENTRE OS VÍRUS E O PRÓPRIO SISTEMA DE DEFESAS DOS ANIMAIS, PREDISPONDO QUE OUTROS AGENTES INFECIOSOS, COMO BACTÉRIAS, SE ESTABELEÇAM E POTENCIEM AS LESÕES PULMONARES.
O
vírus respiratório sincicial bovino (BRSV) é um dos mais importantes vírus respiratórios envolvidos no complexo da doença respiratória bovina (DRB), em animais com menos de um ano de idade, sendo os outros agentes envolvidos os vírus BVD, IBR, PI3, Coronavírus, e as bactérias Mannheimia haemolytica, Pasteurella multocida, Histophilus somni e Mycoplasma bovis. A pneumonia bovina tem várias causas associadas, resultando de uma interação complexa entre vírus, bactérias, maneio, instalações e ventilação, condições atmosféricas, nutrição e stress. Vários estudos demonstraram uma relação entre os vírus e o próprio sistema de defesas dos animais, por um lado predispondo que outros agentes infeciosos, como bactérias, se estabeleçam, e por outro potenciando as lesões pulmonares. DISTRIBUIÇÃO DO VÍRUS A distribuição do vírus BRSV é mundial. O vírus causa, frequentemente, surtos de pneumonia durante o período de inverno, sendo responsável por cerca de 60% dos surtos de pneumonia nas vitelas leiteiras e até 70% nos vitelos de engorda. No Reino Unido, mais de 70% dos vitelos de carne são expostos ao BRSV antes dos 9 meses de idade. O BRSV ataca o revestimento das vias respiratórias, originando danos e perfuração desse mesmo revestimento, semelhante a um pneu furado. Esta situação compromete o mecanismo de “limpeza” (depuração) dos 60
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pulmões e permite que as bactérias penetrem nos tecidos. Por vezes, as lesões podem ser tão graves que pode ocorrer uma fuga do ar das vias respiratórias para o tecido pulmonar, e em casos graves, podem desenvolver-se bolhas de ar debaixo da pele dos animais afetados, como se tivesse uma folha de embrulho de bolhas de ar debaixo da pele. Nos surtos de BRSV, podem ser afetados elevados números de animais (60-80%) com uma taxa de mortalidade de 20-30%. SINTOMAS E CONSEQUÊNCIAS Os sintomas podem ser graves, variando desde mortes súbitas até depressão, febre alta, respiração pela boca em vez de pelo nariz, extensão da cabeça, formação de espuma
Foto 1. Os animais que sobrevivem podem ficar com lesões crónicas a longo prazo nos pulmões.
na boca e esforço respiratório intenso. Os animais afetados com menor gravidade podem apresentar febre, dificuldade em respirar, descargas de muco transparente pelos olhos e pelo nariz. Os animais que sobrevivem podem ficar com lesões crónicas a longo prazo nos pulmões (Foto 1). É bem reconhecido que, à medida que o número de casos repetidos aumenta, ou seja, o nº de vezes que um animal tem um caso de doença, também aumenta a severidade das lesões pulmonares e a taxa de mortalidade. Isto resulta numa diminuição do ganho médio de peso diário e numa menor qualidade das carcaças. Está reportado que num surto, os animais que apresentaram sintomas tiveram uma relação peso/idade constantemente inferior (4-10%) durante o período de 8 meses do estudo. Isto equivaleu a uma diminuição do ganho de peso vivo diário de 111 g/dia. IMUNIDADE A imunidade do colostro (“leite tenro”) das mães pode fornecer algum grau de proteção. No entanto, apenas uma pequena proporção da proteção (anticorpos) fornecida pelo colostro sai da corrente sanguínea para proteger o revestimento das vias respiratórias. Estes anticorpos específicos estão apenas presentes durante um curto período de tempo. Assim, embora as amostras de sangue dos vitelos possam demonstrar uma quantidade adequada de anticorpos maternais na corrente sanguínea, a mais importante proteção local do revestimento das vias respiratórias (anticorpos IgA), que é mais difícil de avaliar, diminui rapidamente.
…
Vírus sincicial respiratório bovino e o seu papel nas pneumonias em bovinos
Flexibilidade... Vacina intranasal e intramuscular contra o BRSV
A Referência em Prevenção na Saúde Animal HIPRA PORTUGAL Portela de Mafra e Fontainha, Abrunheira 2665-191 Malveira, Portugal Tel.: (+351) 219 663 450 · Fax: (+351) 219 663 459 · portugal@hipra.com · www.hipra.com
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O BRSV nas pneumonias em bovinos
… PERÍODOS DE RISCO
Existem dois principais períodos de risco para as pneumonias causadas pelo virus sincicial respiratório bovino: - fase inicial da vida porque a imunidade dos vitelos não é a adequada para combater este vírus. Para combater o BRSV é necessário imunidade local (vías respiratorias superiores) que o impeçam de atingir os pulmões. Em idade precoce a imunidade do colostro das mães pode fornecer algum grau de proteção. No entanto, apenas uma pequena proporção da proteção fornecida pelo colostro sai da corrente sanguínea para proteger o revestimento das vias respiratórias. Estes anticorpos específicos estão apenas presentes durante um curto período. Assim, embora as amostras de sangue dos vitelos possam demonstrar uma proteção adequada na corrente sanguínea efetiva, a proteção local mais importante no revestimento das vias respiratórias, que é mais difícil de avaliar, diminui rapidamente; - períodos de stress que ocorrem no dia a dia de uma exploração como o desmame, agrupamento de animais e contactos de risco com animais portadores do BRSV que não apresentam sintomas da doença (ex. animais adultos). COMO ESTABELECER UM DIAGNÓSTICO Devido à natureza disseminada do vírus, pode ser difícil estabelecer um diagnóstico. Os sinais clínicos, conforme descritos acima, podem ser altamente sugestivos de BRSV, no entanto, a parasitose pulmonar aguda pode apresentar sinais clínicos semelhantes. Como é habitual, é importante um exame clínico detalhado e uma história clínica completa. Vários testes de diagnóstico estão ao dispor dos veterinários. Alguns dos testes mais simples, tal como zaragatoas nasais profundas, são fáceis de executar e podem proporcionar bons resultados. As lavagens pulmonares são tecnicamente mais difíceis de executar, no entanto, depois de dominada a técnica, é uma ferramenta extremamente útil para um diagnóstico das
Foto 2. administradas por via sistémica em diferentes idades dos animais.
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causas de pneumonias. As amostras de sangue podem ser úteis, mas é necessário ter em atenção a idade dos vitelos amostrados e a data em que ocorreu o surto. As necrópsias dos animais que morreram podem ser bastante úteis. É sempre importante preservar o cadáver até falar com o veterinário. COMO TRATAR AS PNEUMONIAS CAUSADAS PELO BRSV O tratamento a instituir deve estar sempre de acordo com a recomendação do médico veterinário assistente da exploração. Pode consistir na administração de antiinflamatórios e antibióticos de largo espectro para tratar as infeções bacterianas secundárias. O isolamento dos animais afetados é essencial para prevenir a infeção de outros animais, já que os aerossóis são o principal meio de disseminação do BRSV. A terapêutica de suporte com fluidos orais é extremamente importante já que os vitelos afetados podem diminuir a ingestão de água, ficando desidratados. Em algumas ocasiões a administração de anti-inflamatórios esteroides pode ser considerada, sendo uma das raras ocasiões que estes fármacos são benéficos na medicina bovina. A PREVENÇÃO É SEMPRE MELHOR QUE O TRATAMENTO. COMO PODEMOS PREVENIR O BRSV? Como em qualquer doença, efetuar corretamente os procedimentos básicos de maneio é uma grande ajuda para o controlo da doença. Uma nutrição adequada, manter a exploração fechada, maneio dos lotes de animais em sistema tudo dentro - tudo fora, as condições de alojamento e o maneio do colostro são fatores cruciais. Também estão disponíveis no mercado diversas vacinas para controlo e prevenção do BRSV. Estas vacinas podem ser administradas por via intranasal para estimular a imunidade local rapidamente ou administradas por via sistémica em diferentes idades dos animais (Foto 2). A proteção dos vitelos jovens, com menos de 12 semanas, através da vacinação, é sempre um desafio, devido à interferência dos anticorpos de origem materna (imunidade
colostral). As vacinas intranasais têm sido a resposta a esta questão. ABORDAGENS ATUAIS DE VACINAÇÃO NA PREVENÇÃO DO BRSV: VACINAÇÃO “PELO NARIZ” (INTRANASAL) SEGUIDA DE REFORÇO POR VIA INTRAMUSCULAR O conceito de expor o sistema imunitário a um antigénio (vírus), por diferentes vias, primeiro estimulação da mucosa do nariz e depois reforço sistémico por via intramuscular ou subcutânea, irá alcançar uma resposta equilibrada e mais durável a nível imunológico e deverá ser o caminho a seguir no desenvolvimento de quaisquer novas vacinas respiratórias. A aplicação inicial da vacina pelo nariz origina duas respostas importantes. Primeiro, proporciona uma imunidade/proteção local ao revestimento das vias respiratórias em vitelos muito jovens, desde a primeira semana de vida, apesar da presença da imunidade colostral. Depois, a primeira dose funciona como preparação para a segunda dose, que pode ser administrada debaixo da pele ou por via intramuscular mais tarde. Esta segunda via oferece uma maior duração da imunidade/ proteção. Existe uma enorme variação da eficácia e duração da imunidade das diferentes vacinas e vias de administração. É essencial seguir as recomendações dos fabricantes relativamente ao intervalo entre doses, via de administração e idade dos animais a vacinar. CONCLUSÃO O BRSV é uma causa importante de doença respiratória e é comum nas explorações de bovinos, sendo os animais jovens os mais afetados. O BRSV é disseminado pelo ar e infeta as vias respiratórias superiores e os pulmões, sendo que a imunidade dos animais em idade precoce contra este vírus não é a adequada. A imunidade local das vias respiratórias (superiores e inferiores) é essencial para a proteção contra este vírus. A resposta imunitária às vacinas convencionais para o BRSV (via intramuscular) pode ser afetada pela anticorpos maternais. As vacinas intranasais aportam três principais vantagens na vacinação contra o BRSV: em primeiro lugar induzem a imunidade local “no nariz” (mucosa nasal) essencial para o BRSV, em segundo lugar não são afetadas pelos anticorpos maternais, e em terceiro lugar estimulam a memória do sistema imune para um posterior reforço da vacinação. Este reforço posterior da vacina por via intramuscular, quando a imunidade de origem materna tiver diminuído, vai reforçar a imunidade local e sistémica proporcionando uma duração da imunidade protetora. Para mais informações sobre o tratamento e protocolos de vacinação contra a doença respiratória, consulte o médico veterinário assitente da exploração. Referências bibliográficas: deolinda.silva@hipra.com.
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Lambert van der Linde e a sua equipa, na Herdade da Lavradia.
GENÉTICA | VACAS DE LEITE
HÁ UMA DÉCADA EM PROCROSS
LAMBERT VAN DER LINDE E A SUA FAMÍLIA ORDENHAM VACAS PROCROSS HÁ 10 ANOS E, DE ANO PARA ANO, O NÚMERO DE VACAS TEM VINDO A AUMENTAR. MENORES TAXAS DE SUBSTITUIÇÃO, UMA MELHOR FERTILIDADE E MAIOR LONGEVIDADE, TÊM-LHES PERMITIDO VENDER ANIMAIS ProCROSS PARA OUTRAS EXPLORAÇÕES EM PORTUGAL E ESPANHA. Por Departamento Técnico ProCROSS
P
orque é que começaram com ProCross? “Após 10 anos a usar o sistema de seleção com o código aAa, constatámos que tínhamos um efetivo bom e uniforme, mas a enfermaria continuava cheia, devido a problemas típicos das Holsteins. Em 2008, fui convidado para uma jornada sobre ProCross, na Califórnia. As vacas não eram espetaculares, mas os tamanhos dos efetivos eram fantásticos e mostraram-nos resultados de estudos da Universidade do Minnesota. Isto convenceu-nos a começar o cruzamento com Montbeliarde, da Coopex. Em 2009, nasceram 22 vacas deste animais cruzados, e ficámos satisfeitos com estes primeiros partos. Por isso, começámos, gradualmente, a
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inseminar mais com sémen de Montbeliarde. Desde 2012, que o fazemos a 100%. Sempre com a seguinte rotação: Holstein → Coopex Montbeliarde → VikingRed → Holstein. O resultado: atualmente, temos 6 vacas ProCross a ultrapassar os 100.000 litros. Até agora, temos registos de Holstein puras e dos cruzamentos nascidos em 2009, com resultados interessantes, que nos convencem a continuar com o ProCross.” Como é que tiveram a ideia do ProCross? “Queríamos uma vaca mais fortalecida, uma vez que tínhamos muitos problemas com as nossas vacas Holstein (principalmente de saúde e fertilidade). Por isso, começámos a cruzar, com base em estudos, mostrados
nos EUA, que continham muitos dados atualizados. A rotação com as raças Holstein / Montbeliarde / VikingRed é muito bem-sucedida. Não perdemos produção, gordura e proteína e o efetivo está mais resistente e duradouro.” Qual era a vossa situação anteriormente? “O efetivo era 100% composto por Holstein, com base no sistema de seleção aAa. Isto deu-nos uma vacada bonita, mas com problemas típicos da Holstein, de fertilidade, de saúde ou de arranque nas primeiras lactações, que deixámos de ter com as vacas ProCross. Precisávamos de mais vitelas de substituição na altura, cerca de 15% mais.”
Longevidade das vacas leiteiras
Qual é a vossa situação atual? “Ainda temos um bom número de vacas Holstein mais velhas, um bom lote que nos dá algum dinheiro. Em termos de gestão, temos menos vitelas, menos vacas na enfermaria, menos custos de tratamentos, o queijeiro está satisfeito com o leite e os nossos trabalhadores estão mais felizes. Já ordenhamos vacas ProCross há 10 anos e, de ano para ano, o número de vacas tem vindo a aumentar. Estamos felizes com esta mudança. Dada a menor taxa de substituição, melhor fertilidade e maior longevidade, temos conseguido vender animais ProCross para outras explorações em Portugal e Espanha. Infelizmente, nenhum dos nossos filhos vai continuar, e estamos à procura de alguém para assumir a gestão da exploração.” Quais são as qualidades das vacas ProCross que mais apreciam? “Uma cruzada é mais atenta, curiosa, independente e calma. É um rebanho que dá gosto mostrar a qualquer pessoa que venha visitar a exploração.” O que tem a dizer sobre as vacas ProCross? “Vacas robustas que fornecem uma maior
produção, ao longo da vida, com mais saúde e fertilidade, maior retorno do invetimento e maior satisfação no trabalho.”
HISTÓRIA DA EXPLORAÇÃO “Tinhamos uma exploração na Holanda, com um efetivo de 90 vacas. Em 1996, viemos para Portugal e trouxemos 150 cabeças de Holstein Frisian puras para a Herdade da Lavradia, em Fronteira. Começámos (Lambert, Gerrie e os seus filhos, Gerjanne, Jennifer e Albert, juntamente com o seu irmão e mulher) a transformar uma herdade cerealífera, numa exploração de produção de leite. Começámos a venda de leite nesta exploração de 77 hectares, em 1 de janeiro de 1997, com condições limitadas. Depois, construímos as instalações e fomos aumentando o efetivo. Em 2002, o meu irmão regressou à Holanda. Durante alguns anos, a equipa foi constituída por pessoas oriundas de vários países. Atualmente, trabalhamos com 4 empregados: o Oscar, os dois Pedros e o João. Fazem um trabalho muito bom. Atualmente, fazemos 90 hectares de pastagem e guardamos uma pequena parte para silagem. Também compramos silagem de milho aqui perto. O nutricionista entrega um concentrado para fazer TMR. As vacas em produção
Que touros usam para os cruzamentos VR e Montbeliarde? VikingRed; VR Falcon; V Föske; Montbeliarde; GoodYear; Ralban. Quais são os vossos critérios de seleção? “Preferimos touros provados e usamo-los por vários anos. Têm que ter um código aAa. Para Montbeliarde, escolhemos touros de média ou baixa estatura. Para VikingRed, escolhemos touros de média estatura para manter a uniformidade.” Acham que fazem mais dinheiro agora? “Sim, fizemos as contas, não temos mais leite no tanque, mas a qualidade do leite é fantástica. Temos menos vitelas/novilhas na recria e apenas das melhores vacas, menos trabalho por vaca e também poupamos trabalho, porque a saúde e fertilidade do efetivo melhoraram, sem comprometer a alta produção ao longo da vida. Invistam algum tempo a fazer os cálculos, e surpreendam-se!”
ficam todas juntas num grupo.”
“TEMOS 6 VACAS PROCROSS A ULTRAPASSAR OS 100.000 LITROS." DADOS DA EXPLORAÇÃO DE LAMBERT VAN DER LINDE PROCROSS, PORTUGAL PRODUÇÃO
DADOS GERAIS Efetivo
305 vacas (260 ProCROSS/45 Holstein)
Produção média 365 dias
10.016 litros em 2019
Em ProCross
desde 2008
Longevidade
3,64 lactações, em média
Saúde
redução de 37% nos custos em 9 anos
Nº empregados
4
EFETIVO
Dias em leite
10.016 l
Prod. acumulada/vacas presentes
35.998 l
Prod. acumulada/vaca vendida em 2019
48.439 l
Vacas acima de 100.000 l
6
Vacas acima de 50.000 l
82
Vacas em produção
253
% vacas prenhes
Idade média das vacas Idade média ao 1º parto
52 85% 150 5-4 anos 25 meses
% primeira lactação
21%
% segunda lactação
16%
% 3ª lactação e superiores
63%
€69 €57
2010
2011
2012
FERTILIDADE Inseminação começa aos
Vitelas
€82
€48 €34
3,64
305
% vacas ProCROSS
Custo/vaca/ano €92
€70
Número lactações médias
Vacas adultas
Vacas secas
CUSTOS COM VETERINÁRIOS E MEDICAMENTOS DESDE 2010
165
Leite vendido/vaca/2019
(DADOS DE 14-7-2020)
2016
2017
2018
MORTALIDADE 55 dias
Vacas adultas 2019
52%
1,6%
SUBSTITUIÇÕES
% vacas vistas pelo veterinário sem inseminação
8% 2017
21%
Inseminações/gravidez (vacas)
2,0
2018
16%
Intervalo entre partos
390
2019
25%
Taxa conceção à 1ª inseminação
51%
Taxa de conceção no controlo
83%
Inseminações/gravidez (novilhas)
2019
1,4
VITELAS ATÉ 1 ANO DE IDADE INCLUINDO NADOS MORTOS E GÉMEOS 2017
8.6%
2018
6.7%
2019
6.6%
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GESTÃO HOLÍSTICA
DEL SOL AL SUELDO
NO ANO 2000, AGRICULTOR E VETERINÁRIO ESPANHOL MANUEL DIE MUDOUSE DA ARGENTINA PARA O ALENTEJO, PARA GERIR UMA EXPLORAÇÃO FAMILIAR DE CRIAÇÃO DE BOVINOS DE CARNE EM REGIME EXTENSIVO. HÁ 5 ANOS, DECIDIU ENVEREDAR POR UMA GESTÃO HOLÍSTICA DA EXPLORAÇÃO E ADOTAR O SISTEMA REGENERATIVO DE PRODUÇÃO. Por André Antunes, agricultor e médico veterinário; Ruminantes | Fotos FG, NM
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Del sol al suelo
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oi na herdade de Vale do Grou, junto à histórica povoação de Ouguela encostada a Espanha, que fomos recebidos por Manuel Die, gestor da Sociedade Agrícola Bove cuja principal atividade é a criação de bovinos em regime extensivo. Em modo biológico há cinco anos, a exploração compreende 3 herdades (Defesinha, Freixial e Vale do Grou), localizadas na região do Alto Alentejo, entre Elvas e Campo Maior. No total, são cerca de 700 hectares maioritariamente em sequeiro, dos quais 15 hectares são de olival em regadio. A paisagem divide-se equitativamente entre montado e pastagens abertas. Os solos, em geral, são superficiais, de xisto, típicos das zonas meridionais de antiga aptidão para gado, à exceção de 70 hectares de solos de barro, mais alcalinos. A ligação de Manuel Die ao mundo rural veio pelo exercício da sua profissão como veterinário de campo. Mas foi na década de 90 que teve a sua experiência mais marcante como gestor numa exploração na Argentina dedicada à bovinicultura em extensivo. Foi aí, uns anos mais tarde, já em em 2010, que teve primeiro contacto com a agricultura regenerativa e a gestão holística. "Numa das minhas viagens à Argentina, tomei conhecimento do trabalho de Pablo Borrelli, conhecido "educador de gestão holística". "O Pablo classifica, de uma forma muito simples e didática, as abordagens que existem atualmente no mundo ganadeiro": por um lado, o sistema extensivo, que tem um input muito baixo. Por outro, temos o sistema intensivo, sem base territorial. […] Nas últimas décadas surgiu uma ganadaria extensiva melhorada, baseada numa maior produção e em mais inputs. Porém, ainda que pareça um modo de produção inocente, a ganadaria extensiva foi responsável, durante séculos, por uma degradação muito lenta, devida a más práticas de pastoreio. A quarta janela que Borrelli preconiza, alternativa aos modos de produção convencionais, refere-se à ganadaria regenerativa, cujo objetivo é ter muito poucos inputs, muita produção e uma grande eficácia baseada nos próprios recursos fotossintéticos naturais.” Após 6 anos na Argentina, Manuel Die veio instalar-se no Alentejo, que descreve como “uma experiência absolutamente diferente em todos os sentidos”: Em 2000, e até 2015, comecei com um maneio mais convencional de ganadaria extensiva nesta exploração. A partir daí, a grande mudança, pelo menos a nível mental, foi entrar na gestão holística da exploração”, o que aconteceu há 5 anos. André Antunes (A): Vamos falar sobre esta mudança que fez no modo como gere a exploração,
inspirada na gestão holística, segundo os ensinamentos de Allan Savory. É mesmo possível produzir carne de bovino com pegada de carbono negativa e lucros substanciais, como ele propõe? M: Com certeza que sim! Não é simplesmente um desafio, é algo real que é atingível. Simplesmente, é preciso ter a vontade de o fazer. A: O que é a gestão holística proposta por Allan Savory? M: Regenerar só por si pode parecer uma solução completa, mas se a regeneração não estiver ligada a um contexto social e económico, com toda a complexidade que isso supõe, pode acabar por não funcionar a longo prazo. A gestão holística é um bocadinho isso, é ter uma abordagem muito ampla, onde o importante não é a vaca e a pastagem, mas todo o conjunto, todas as interações. Pressupõe a definição de uma “moldura”, que é no fundo uma base de referência para tomar decisões. Não significa seguir uma regra ou uma receita, consiste simplesmente na adoção de uma metodologia de tomada de decisões. A: Qual é o seu contexto holístico? M: Normalmente, quando falamos em contexto referimo-nos a um contexto desejável, que depende de quem toma as decisões, dos responsáveis [pela exploração]. É fundamental que as decisões estejam em linha com os pressupostos dos tomadores de decisões. Para mim, o pressuposto fundamental é a qualidade de vida, e não apenas o benefício económico. O benefício económico tem que estar ligado à qualidade de vida de quem toma a decisão. No meu caso, o mais importante é ter uma atividade económica de muito baixo risco, porque para mim é muito importante uma vida sem stress. Claro que o lucro económico também é desejável, mas tem que estar ligado a estes dois pontos. Qualquer situação que implique estar no limite do risco e do stress, para mim, definitivamente não entra. A: Que obstáculos encontrou à implementação desta metodologia? M: Inicialmente, o maior obstáculo é fazer uma má interpretação da gestão holística. O primeiro erro é achar que se pode “resumir” a proposta de Allan Savory de usar o gado como ferramenta para melhorar os processos ecossistémicos, a uma tabela, uma listagem ou um planeamento fixo que basta seguir. Não, é um processo. Por outro lado, nós, gestores de ganadaria regenerativa,
cometemos muitas vezes o erro de pensar que só estamos a trabalhar para criar um património biológico, uma base de recursos potente, e por vezes esquecemo-nos que ainda temos muitas dependências. O propósito não é eliminar logo ao início a 100% essas dependências, mas não perder o objetivo de as ir eliminando progressivamente ao longo do tempo. Trata-se, sim, de ter uma estratégia de viver do que realmente existe, que é a energia solar e a fotossíntese, mas sem nunca perder de vista o contexto económico-financeiro. Se eu pensar que tenho que ter todos os recursos próprios da exploração e por idealismo não recorrer a suplementos, se for necessário, posso ter quebras. Ficar arruinado não é solução, nem do ponto de vista ambiental. A: No seu caso, em que ainda não passou tempo suficiente, que indicadores de curto ou médio prazo usa para perceber se está no caminho certo? M: Existindo uma maior eficiência no período vegetativo das pastagens, através de curtos tempos de ocupação e longos períodos de repouso, o primeiro indicador, que é de muito curto prazo, é a criação de um excedente de pastagem seca para o período de não crescimento, e para o solo ficar coberto, pois é uma base para potenciar os processos ecossistémicos. A: Ao nível da produção forrageira, o que mudou? M: A grande poupança económica foi passarmos a ter pastagem em pé para todo o período de não crescimento. Temos que considerar que a qualidade [da pastagem] é a qualidade que se tem. A matéria seca está garantida mas pode ser necessário fazer a correção da proteína. Um animal ruminante precisa de 6 a 7% de proteína bruta para não perder condição corporal. Tem de haver um acompanhamento proteico porque os animais já não migram, como as grandes manadas de antigamente. Existem limitações, os nossos genótipos são de elevados requisitos, nada adaptados, portanto temos que suplementar para garantir a sobrevivência. Nuno Marques (N): Essa boa gestão da proteína como é que se vê, em termos de reprodução animal ou de quilos de carne vendidos? M: O importante é olhar sempre para a condição corporal dos animais, é fundamental que seja essa condição a determinar a fertilidade. Na parição, normalmente no inverno, o animal que pare com baixa condição corporal não vai conseguir ter um cio cedo e concentrado como nós queremos.
"TEM DE HAVER UMA SUPLEMENTAÇÃO PROTEICA PORQUE OS ANIMAIS JÁ NÃO MIGRAM, COMO AS MANADAS DE ANTIGAMENTE." 68
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Bosta típica de vacas que pastam em parques com longos períodos de descanso e que só são desparasitadas quando é necessário.
Para Manuel Die, a grande poupança económica ao nível da produção forrageira foi passar a ter pastagem em pé para todo o período de não crescimento.
Alguns investimentos como cercas elétricas, pontos de água, e abordagens de descompactação do solo, contribuem para criar uma base de recursos futura.
A: Que outros autores ou criadores de gado são exemplos para si? M: Por exemplo, a linha sul africana de Johann Zietsman, que refere que é necessário promover os ecossistemas, não alterando a sua forma, mas admitindo por exemplo a suplementação proteica no verão e genótipos de menores requisitos que têm mais capacidade de consumo. O problema das pastagens secas no verão é que o animal não consegue consumir porque a “caldeira” ruminal tem pouca flora celulolítica por falta de proteína para digerir eficientemente. Nós não alimentamos vacas, alimentamos microorganismos. A: Que suplementação proteica usa? M: Eu utilizo pellets de luzerna de forma pontual e estratégica. Mas podia ser feno de luzerna ou fenossilagem. A: Qual a adaptação genotípica que tem feito a nível de melhoramento genético? M: Eu acreditava muitíssimo na raça Mertolenga, que de facto é uma raça muito rústica, com tamanho ideal e capacidade de adaptação. Mas tinha dois problemas: a falta de docilidade para fazer este maneio, e a falta de precocidade. Portanto, comecei a fazer cruzamentos com a linha Angus. Eu estava habituado a trabalhar com a Aberdeen-Angus, na Argentina. Sabia que era um animal rústico
e precoce, mas o grande erro que cometi foi trazer genética de ambientes absolutamente não adaptados, ou seja, de Angus moderno que copia linhas continentais de altos requisitos e não estão adaptados ao ambiente duro deste ecossistema. Andei um pouco atrás na fertilidade, por este motivo. N): Quando decidiu pelo Angus, pôs em questão outras raças exóticas, ou foi Angus porque já conhecia? M: Decidi pelo Angus, por vários motivos. Porque é uma raça dócil e normalmente precoce. Para que um animal tenha melhores hipóteses de engordar no campo, importa a precocidade sexual. A precocidade sexual leva à precocidade de crescimento. Por isso, há um acabamento mais cedo, para não ter esses grandes requisitos de farinhas, que têm todas essas raças, por norma, continentais. A: Sabemos que uma das preocupações gerais da ganadaria extensiva são as cargas parasitárias. Como lida com elas, a nível profilático? M: Relativamente ao tema parasitário, tanto endo-parasitas como ecto-parasitas, o grande problema tem sido a grande resistência às moléculas químicas. Isto é uma preocupação, não só minha, como dos próprios vendedores. Procuramos animais resistentes a parasitas e não parasitas resistentes a produtos. Deixei de administrar desparasitantes, de forma
gradual, e o resultado tem sido muito bom. Algumas contagens até têm diminuído desde que não uso desparasitantes. Mas isto tem a ver também com o maneio: se cortamos o ciclo com longos períodos de repouso das pastagens, o ciclo dos parasitas é interrompido. Estou a falar essencialmente de parasitas gastrointestinais. Relativamente a ecto-parasitas, também deixei de fazer desparasitação. É muito importante fazer uma seleção individual, e se existem alguns animais que não se adaptam a este sistema, refugá-los. É claro que se houver 50% não se adaptam, temos que voltar a desparasitar. Mas é uma questão estratégica. Estou a falar dos parasitas mais comuns. A: Antes de adotar este tipo de gestão, quais eram os parasitas mais comuns e que incomodavam mais? M: Os parasitas gastrointestinais no geral e alguns tipos de parasitas do fígado, como a Fascíola, aos quais temos que ter atenção. Aí sim, devemos fazer uma desparasitação clínica, caso sejam detetados. Mas o problema é introduzir desparasitantes no organismo como forma de criar resistência. Isso é mudar o conceito a um tratamento individual clínico e esporádico. Muito importante também, é o facto de estarmos a destruir a fauna coprófaga, que é a responsável por fazer com que o estrume se transforme em húmus. Essas bostas, especialmente no verão, ficam
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…como pedra, dado que os coprófagos
não lhes acedem. Este devia ser um assunto importantíssimo, a nível nacional: não destruir os únicos seres que são capazes de converter o estrume em húmus. O húmus é património da humanidade e estamos a aplicar saneamentos obrigatórios pelas instituições. A ADS obriga a desparasitar. A: Fale-nos um pouco da planificação da parição da exploração. M: Já a fazia antes, mas na linha regenerativa é muito importante planificar o período de parição, porque acompanhamos a curva de crescimento da pastagem da natureza e concentramos as parições para aproveitar essa curva. Como já tinha feito este trabalho, até com as mertolengas, para mim foi fácil fazer a transição. Tento concentrar as parições no período mais curto possível para ter o mesmo maneio e seguir a curva da pastagem. Prefiro o inverno, porque a altura de cobrição cai num período em que há quantidade e qualidade de erva. O único período em que existe quantidade e qualidade para que haja reprodução e ovulação, é a primavera. Portanto, a cobrição dura 2,5 meses – de abril até meados de junho. E a parição ocorre de janeiro a março. N: Como é que faz? Retira os touros? M: Sim. Não é aconselhável fazer isto de um dia para o outro, porque com uma parição contínua ficamos sem vacas em pouco tempo. Com o refugo comecei a pouco e pouco, e após 7 ou 8 anos já tinha toda a parição concentrada em cerca de 3 meses. Agora apertei um pouco mais e a ideia – que não é minha, pois isto é feito em todos os países que dependem de pastagens e não de rações ou subsídios – é refugar as vacas que
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vão ficando vazias. Refugamos sempre que não seja uma percentagem muito alta. Esse trabalho para mim é fundamental e já se está a fazer muito aqui no Alentejo e no grupo de produtores de que faço parte. N: Tem poucas vacas que falham a fertilidade? M: Com as mertolengas não tenho problemas. Tinha 3 meses de parição com 93 a 95% de fertilidade. Quando mudei para este cruzamento com Angus de altos requisitos, com o mesmo maneio, ao qual acrescentei um maior aperto dos animais, a fertilidade caiu para os 75%. Depois, corrigindo os erros cometidos no maneio relativos ao tempo de recuperação das pastagens, voltei este ano aos 93%. A: No maneio agro-ecológico, com que base desenha os parques de pastoreio e a localização dos pontos de água? M: Quando queremos iniciar um projeto de ganadaria regenerativa, um erro frequente é começar por fazer cercas e dividir. É preciso fazer um plano da terra, bem estudado, que esteja relacionado com o número de animais. A primeira coisa que fiz foi agrupar todo o rebanho, o que para mim foi fácil por causa das parições. Depois defini as áreas das parcelas para conseguir o objetivo de ter curtos tempos de ocupação e um longo período de repouso. Eu tinha algumas parcelas enormes, de 50 ou 100 hectares, mas comecei a ver qual era o período de ocupação, porque existe um consenso geral de que, na época ativa de crescimento não existe sobrepastoreio quando o tempo de ocupação é inferior a 3 ou 4 dias. Com este critério, comecei a definir parques fixos elétricos com o objetivo de evitar o sobrepastoreio. Muito importante, também,
é adequar os pontos de água a essa nova exigência de água instantânea, que é potente porque temos muito gado junto. A: No que diz respeito à composição florística pratense desde que adotou esta nova abordagem, que tipo de estratégia tem? M: Eu tinha a ideia de fazer pastagens biodiversas, com todo o leque de sementes. Mas este é um critério agronómico, que, a meu ver, não está a funcionar, porque o empurrão inicial resulta — uma boa quantidade de leguminosas —, mas depois o ecossistema volta ao que era. Se não estiver ligada ao maneio, esta é apenas mais uma ferramenta, mas não definitiva. Portanto, em vez de estar sempre a gastar nas pastagens biodiversas com fertilização fosfórica, etc., acabo por dar mais importância ao maneio. Isto não significa não semear. Mas, para mim, é muito importante semear, dentro da sucessão ecológica, de solos degradados e arruinados, aquelas espécies que vão concorrer com aquelas a que chamamos de infestantes – que na realidade, não são infestantes, mas indicadoras de que uma sucessão ecológica está em curso. Por exemplo, se semearmos uma quantidade enorme de sementes que ainda não estão no ponto de sucessão ecológica, o sistema volta novamente à pobreza ecossistémica. A: Em que medida é que a gestão holística tem um efeito positivo no aumento efetivo de água das chuvas? M: Com o solo coberto começam a ocorrer mudanças importantes, tanto ao nível da evaporação, como da água que fica no solo. Há menos lixiviação. O desafio futuro passa por ter um maior crescimento de húmus
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Foto da esquerda: Estado da pastagem à entrada das vacas no novo parque. Foto da direita: Estado da pastagem no fim do 3º dia de pastoreio.
no solo, pois, por enquanto, ainda temos espécies anuais que têm uma capacidade muito limitada para fazer de “esponja” de carbono. A: Portanto, ainda não tem dados sobre o incremento de matéria orgânica que, em princípio, nos dará o real potencial regenerativo deste tipo de agricultura... M: Por enquanto, não, pois este é um indicador de mais longo prazo. Dentro desses indicadores, comecei a utilizar o EOV, que é um sistema em que a matéria orgânica é medida a cada 4 anos. Para já, sei qual é a maior quantidade de produção de matéria seca. Um indicador importante é que estamos a depender cada vez menos dos fatores externos, nomeadamente das forragens. N: Quem nos estiver a ler, pode ficar com a ideia que se produz carne, sem ter que investir dinheiro, quase do zero. Quais são os fatores de produção atuais que está a comprar (rações, forragens, adubo)? M: Os fatores de produção continuam idênticos, só que numa quantidade muitíssimo menor. Mas não fazemos essa comparação por animal. Na realidade, a produtividade que aumenta é por hectare e não por animal. Se continuamos a pensar que é por animal, estamos a trabalhar fora da terra. N: Portanto, o seu indicador é lucro por hectare. M: Quilos de animal por hectare, de forma
sustentável, com o menor recurso possível a ajudas. A: Qual é o principal fator de produção na exploração? M: Atualmente, o maior custo é a mãode-obra. Antes, com o mesmo número de empregados, era a alimentação. A: Quais são as principais fontes de rendimento da exploração? M: Essencialmente provêm de animais de engorda, que é um nicho de mercado de poucos animais, de pastagens. N: Com que idade vende os animais para engorda? M: 15 a 18 meses, basicamente fêmeas. Os vitelos a desmame são vendidos com 6 a 8 meses. N: Em média, que peso têm estes vitelos aos 6 meses? M: São animais mais leves, 170 a 180 quilos de peso vivo. A: A exploração recebe subsídios? M: Sim, basicamente são ajudas de RPB, ajuda por vaca aleitante e agro-ambientais. A: Como é que se consegue conceber e integrar isto no conceito da agricultura regenerativa, do euro solar? M: Aparentemente os subsídios vêm ajudar o produtor, e de facto, é dinheiro que entra. No entanto, este dinheiro acaba por criar um “carrossel”, que passa de umas mãos
para outras. Caso não procuremos um capital biológico e uma base de recursos natural – que significa ser mais eficiente com a fotossíntese –, os subsídios acabam por não servir o seu propósito e criar mais uma dependência. “Mas podias usar o subsídio para fortalecer esta visão”, poderia alguém dizer. Porém, na realidade, o que tenho vindo a fazer é acelerar as dependências de fatores de produção porque, devido à nossa base de recursos pobre, o mais fácil é recorrer a alimentação externa. Está tudo ligado: a indústria promove animais de altos requisitos e penaliza animais pequenos, de menos requisitos. Todo este sistema está ligado por um pensamento, não conspiratório mas simplesmente natural, segundo o qual quem mais beneficia dos subsídios não são os produtores. O dinheiro passa simplesmente por nós que, depois, o entregamos a toda essa bateria de dependências. Com isto não quero dizer que não utilizemos esses subsídios, mas estamos mal focados. Eu próprio continuo com dependências. Se fossemos mais eficientes… só que não estamos isentos de dificuldades. A: Portanto, é possível usar os subsídios como uma oportunidade para preparação de uma futura base natural de recursos, resiliente e estável, investindo no capital biológico… M: Com esforço e indo um bocadinho contra a corrente, mesmo no mercado, pois o mercado quer animais industriais. E apenas conseguimos escoar estes produtos de pastagem, com animais mais leves e com outras condições, e carne mais escura, em
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"OS FATORES DE PRODUÇÃO CONTINUAM IDÊNTICOS, SÓ QUE NUMA QUANTIDADE MUITÍSSIMO MENOR." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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…nichos de mercado muito, muito pequenos. Por isso, para quem tenha poucos animais e tenha necessidade de vender a nichos de mercado, muito bem. De resto, estamos amplamente penalizados.
A: Portanto, não consegue, de momento, vender a um preço justo o que produz, que é uma carne biológica e de pastagem. Em Portugal não existe ainda este mercado que satisfaça o produtor pelo seu esforço e com um produto que, nutricionalmente, é superior e sustentável? M: De maneira nenhuma. Estamos ligados a vender para as engordas. Está tudo organizado assim, até as raças autóctones têm vindo a aumentar o tamanho dos animais, bem como as suas necessidades, para ir tudo para a engorda industrial. A: Qual é o balanço financeiro destes últimos 5 anos, desde que embarcou nesta viagem, que é a gestão holística, e quais são os indicadores principais em que se baseia para chegar a essa conclusão? M: O objetivo sempre foi ter mais lucro. Quando ligas o lucro à qualidade de vida, começam a mudar algumas coisas. A ideia é fazer uma espécie de “brincadeira” e perguntar “quanto necessito para viver?” e se precisas de muito, não vai funcionar. Ou seja, deves começar por definir o lucro e não pela alimentação dos animais. Parece uma loucura, mas temos que definir aquilo que pretendemos para ter qualidade de vida e começar por aí. Depois, colocar por ordem de prioridade outras despesas, como impostos, rendas, etc., por ordem de importância. Por fim, o mais importante será identificar as despesas que vão gerar riqueza de património biológico, e as despesas normais de manutenção. Se nós conseguirmos passar, pouco a pouco, de despesas de manutenção a despesas criadoras de riqueza, vamos conseguindo fugir das dependências. Gerar riqueza significa fomentar os processos ecossistémicos para criar um ambiente que seja a base da nossa vida e não o risco económico de viver com entrada/ saída. Há quem diga que pode ser muito lucrativo viver de uma exploração intensiva, mas coloca-te uma situação que, além de destrutiva, tem muito risco. Portanto, devemos olhar para o contexto pessoal. Existem alguns investimentos que não parece que vão criar riqueza, como cercas elétricas, pontos de água, abordagens de descompactação do solo, etc., mas que, na verdade, vão criar uma base de recursos futura. Por isso é tão importante ter um plano da terra. Se considerar a poupança da alimentação forrageira, em termos de volume e de fibra, no segundo ano esses investimentos já estavam pagos. Portanto, essa poupança de comida
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pagou-me o investimento em cerca de 2 anos. N: Percebi que um dos problemas deste sistema de produção é produzir animais que não são tão valorizados, devido ao seu tamanho. M: Sim, são animais com muita conformação cárnica, mas com uma estrutura leve. A indústria não quer isso. N: Porque não utiliza outras raças, que até são utilizadas no Alentejo e em sistema de extensivo? Seria um problema, em vez de Angus, utilizar uma outra raça que lhe desse mais estrutura? M: De facto, existem várias raças autóctones, como as Mertolengas, a Barrosã, no Norte de Portugal, e muitas outras na Península Ibérica. Porém, o grande problema é que, muitas vezes, são animais com pouca precocidade, e pouca conformação (como acontece na Mertolenga), e são raças criadas, desde há muito tempo, para serem abatidas na engorda industrial – até os vitelos da raça Alentejana, por exemplo. Isto já acontece há várias décadas. Os animais autóctones, que antigamente eram usados para trabalho, tinham falta de aptidão cárnica. A aptidão cárnica é um critério moderno. N: A Angus é, verdadeiramente, a melhor opção? Outras raças muito utilizadas em Portugal, no Alentejo, como Limousine, Charolês ou Salers, não poderiam dar-lhe aquilo que falta para poder vender ao preço que gostaria? M: Não, porque o problema está realmente na contradição de animais de alto requisito. Animais grandes são animais de altos requisitos a nível de metabolismo basal. Além de outros fatores de rusticidade, um animal pequeno tem uma vantagem muito maior, relativamente ao seu peso, de conseguir consumir pastagens de pouca qualidade. A base do nosso problema é que não temos pastagens com densidade energética suficiente. A: Existe o problema também da perceção da qualidade organolética da carne por parte do consumidor? M: Sim, eu tenho tido esse problema. Só consigo vender carne a consumidores conscientes de que a cor da carne não está relacionada com a tenrura e a infiltração. A: Que soluções consegue vislumbrar no futuro para os problemas de comercialização deste tipo de produtos de “nicho”? M: O principal desafio é chegar ao consumidor, e o futuro da PAC vai ter algo que ver com este assunto. A existência de matadouros móveis (entre explorações) seria extraordinária, porque assim podíamo-nos organizar diretamente, entre vários produtores, para escoar os produtos. Eu
sei que o consumidor quer isto. O problema é que a grande intermediação não o permite, devido à sua estratégia de movimento. Sobre a questão de como conseguir chegar ao consumidor, num clima mediterrânico, seria ideal valorizar o que chamamos de vitela nacional. Não temos pastagens com densidade energética suficiente para fazer uma engorda até aos 15, 18 ou 20 meses, mas temos a opção de criar vitelos de 6 a 8 meses, diretamente do montado para o consumidor. O único problema é que, ainda que esse produto fosse valorizado pelo consumidor, o produtor ficaria penalizado pelo preço. Aos preços atuais é muito mais rentável vender um animal para engorda, do que “desmanchálo” e vender. Penso que o consumidor não sabe que tem um produto de luxo nos montados, no Alentejo, e noutros sítios da Extremadura. Um produto ideal, muito mais são, sem fármacos, natural, que vem do campo direto para a mesa. A: E que, se tivesse o incremento bio no preço pago ao produtor, justificaria facilmente… M: Não só bio. Só seria suficiente pagar o mesmo do que vender para uma engorda. É só pensar nisso. Dar-nos-ia a capacidade, aos produtores de campo, para poder trabalhar com esse valor. Neste momento pagam melhor para vender um animal para a engorda para exportação para Israel ou Emirados Árabes... Essa equação absolutamente ilógica tem mais força do que o próprio consumidor português, que deveria poder comprar a carne como uma mais valia. A: Talvez a solução passasse pela venda direta ao consumidor, com várias vantagens nomeadamente ambientais e nutricionais. M: Mas eu não estou capacitado para formar uma empresa diferente a nível de desmancha, embalamento e gestão comercial, e também não tenho idade para fazer esse empreendimento de conseguir vender 250 vitelos por essa via. A: Que conselhos deixaria a um gestor de uma empresa agrícola, no âmbito de uma ganadaria, com interesse em aplicar a gestão holística na sua exploração? M: Primeiro, que olhe bem para si, para o seu contexto, para como pretende que seja o seu futuro, e pense como pode conseguir ligar isto ao projeto produtivo. Depois, que tenha consciência de que a mudança é gradual. Por fim, ter em conta que não são sistemas, não são receitas, mas uma “moldura” para encontrar um rumo. O importante é uma mudança mental radical acompanhada por uma estratégia. Um produtor arruinado, no curto prazo, não ajuda o ambiente. Tem que se ligar tudo.
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Ana Gomes e André Lopes, engenheiros zootécnicos do departamento de nutrição animal da Cooperativa Agrícola de Vila Conde.
PRODUTO | X NIR
NIR PORTÁTIL. A OPINIÃO DE ESPECIALISTAS
COM O OBJETIVO DE MELHORAR A AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DAS FORRAGENS E DO TMR, A COOPERATIVA AGRÍCOLA DE VILA DO CONDE ADQUIRIU HÁ DOIS ANOS UM EQUIPAMENTO X-NIR. A RUMINANTES ENTREVISTOU ANA GOMES E ANDRÉ LOPES, UTILIZADORES DESTA TECNOLOGIA NA CONSULTORIA DE NUTRIÇÃO. Por Ruminantes Fotos NM
N
o departamento de nutrição animal da Cooperativa Agrícola de Vila Conde (CAVC), uma equipa técnica liderada pela engenheira zootécnica Ana Gomes dá apoio a mais de 200 produtores de leite associados. Com o objetivo de melhorar a prestação de serviços aos 74
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seus clientes na avaliação da qualidade das forragens e do TMR, a cooperativa adquiriu, há dois anos, um equipamento X-Nir portátil. A Ruminantes entrevistou Ana Gomes e o seu colega André Lopes, também engenheiro zootécnico de formação com uma experiência de 20 anos sempre ao serviço da CAVC.
Atualmente, André desempenha as funções de coordenador de produção da unidade fabril de misturas e consultoria técnica no âmbito da nutrição, maneio e extensão rural de 70 explorações de vacas leiteiras associadas da Cooperativa. Como consultor de nutrição, tem como principal objetivo “conseguir sempre a otimização das forragens dos
seus clientes, nomeadamente através do aconselhamento das quantidades a fornecer e das misturas complementares à alimentação base: misturas, misturas e granulados, dependendo do tipo de produção (box, robot)”. Garantir a satisfação máxima dos clientes que acompanha passa por “maximizar a produção, minimizar os custos e conseguir uma boa
NIR portátil. A opinião de especialistas.
saúde animal sem sintomas de doenças provocadas pela alimentação”.
uma sensibilidade muito maior em relação às forragens com que trabalhamos.
A CAVC foi pioneira em Portugal na aquisição de um NIR portátil, o X Nir. Que opinião têm desta ferramenta? É muito útil para a tomada rápida de decisão no terreno, porque temos os resultados na hora. Antigamente as análises em laboratório demoravam cerca de uma semana, mais tarde o laboratório adquiriu um NIR de bancada e os resultados demoravam 2 dias. Perdiase alguma fiabilidade nos resultados, nomeadamente nas matérias secas, devido ao tempo de espera e às temperaturas a que as amostras eram submetidas durante o trajeto. Ao fim de um ano já fizemos análises suficientes para pagar o investimento do X NIR. Outra vantagem importante é a capacidade de analisar o TMR para controlar o alimento que chega à manjedoura, ou seja, confirmar na exploração que aquilo que está disponível para as vacas é o que estava previsto no plano alimentar. Dou-lhe um exemplo: cada vez há mais pessoas a fazer rolos, e com este NIR é fácil analisar com mais frequência os rolos para perceber possíveis melhoramentos a fazer no terreno. Com o X NIR podemos fazer todas as análises que pretendemos, em qualquer altura, para ajudar na tomada de decisões, e custa sempre o mesmo. Para além disso, a formulação torna-se um processo muito mais rápido, até pode ser feita no terreno.
Foram dos primeiros, em Portugal, a trabalhar com esta nova tecnologia, e hoje têm dois aparelhos. Quantas análises já fizeram? Fazemos cerca de 950 análises por ano. O segundo aparelho foi comprado em maio deste ano e já tem 230 análises realizadas.
Que argumentos pesaram mais para a decisão de aquisição deste equipamento? Razões comerciais, financeiras e técnicas. A rapidez na resposta aos produtores, o trabalho mais completo (permitindo fazer um número ilimitado de análises com o mesmo custo, e também analizar o TMR). A utilização continuada deste sistema dá-nos
O que conseguiram melhorar no serviço aos vossos clientes? Não só a rapidez nos resultados, como também a possibilidade de mostrar ao cliente, na hora, possíveis problemas na exploração, por exemplo: a analise do TMR permite-nos mostrar in locco as variações nutricionais entre o real e o previsto. O que ganharam os produtores? A possibilidade de conhecerem imediatamente a qualidade das forragens que produziram. Com esta ferramenta, os produtores focam-se mais no processo de fazer as forragens (milho, erva),
na sua qualidade final e também na qualidade do TMR. O foco passou a centrar-se muito mais na qualidade da forragem e em ajustar a dieta base com os objetivos estabelecidos para a produção de leite. Que opinião têm os produtores sobre o X NIR? Dizem que trazemos a máquina no carro. Penso que esta frase diz tudo. Os nossos clientes estão mais exigentes, querem saber com muito maior frequência o valor nutricional e a qualidade das forragens que produzem, e esta vontade de querer ter dados concretos e mais informação sobre as forragens é bom. A fiabilidade do equipamento é dos fatores mais importantes. Que garantias tem dado? A fiabilidade do aparelho depende muito da calibração que nós fazemos. É muito importante que o número de análises realizadas seja suficiente para calibrar o NIR. Quanto mais amostras tivermos, maior é a fiabilidade. Trabalhamos com um laboratório certificado para analisar as amostras (via química
e NIR) e depois fazemos a nossa própria curva. Este é um tema que nunca está acabado, por exemplo, quando se começou a fazer silagem de milho com a tecnologia shredlage tivemos que criar uma curva própria. Sempre que temos uma calibração enviamo-la para a Dinamic General e para o Luís Maciel, e passado 1 a 2 dias recebemos a curva/calibração e o NIR fica atualizado em menos de 1 minuto. Quantas forragens têm introduzidas no X NIR? Silagem milho, silagem de erva, feno de luzerna e o TMR. Qual é a fiabilidade das análises do TMR? São tão fiáveis como as dum NIR de laboratório. Que nutrientes são analisados? A humidade, MS, o amido, PB, ADF, NDF e cinzas. A fiabilidade nos valores de matéria seca é muito elevada. E a fiabilidade nas cinzas da silagens de erva? Também é bastante boa, igual à dos outros nutrientes. De que atualizações precisa? Apenas das que estão relacionadas com as calibrações das curvas estabelecidas para cada forragem. Qual é a manutenção do aparelho? Fazemos a manutenção por contrato anual. Prevê a substituição da lâmpada e do vidro do aparelho, e do alojamento na cloud do software da máquina.
Uma vantagem importante do X NIR é a capacidade de analisar o TMR para controlar o alimento que chega à manjedoura, ou seja, confirmar na exploração que aquilo que está disponível para as vacas é o que estava previsto no plano alimentar.
Se fosse hoje, voltaria a optar por esta ferramenta? Na altura, as expectativas eram altas e o investimento correspondeu plenamente aos nossos objetivos. Se as pessoas forem exigentes com o equipamento e com as calibrações, vão ter grandes vantagens na utilização deste NIR.
"COM O X NIR PODEMOS FAZER TODAS AS ANÁLISES QUE PRETENDEMOS, EM QUALQUER ALTURA, PARA AJUDAR NA TOMADA DE DECISÕES. CUSTA SEMPRE O MESMO." RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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PRODUÇÃO | VACAS DE LEITE
OS JOVENS QUEREM TECNOLOGIA
A VACARIA DOS IRMÃOS MARQUES, EM RORIZ, FOI RECENTEMENTE REMODELADA PELA AQUISIÇÃO DE 2 ROBOTS DE ORDENHA DeLaval. O OBJETIVO DESTE MELHORAMENTO, FOI MELHORAR O BEM-ESTAR DAS PESSOAS QUE TRABALHAM NESTE NEGÓCIO FAMILIAR, QUE JÁ COMEÇA A CONTAR COM A COLABORAÇÃO DA GERAÇÃO MAIS NOVA. Por Ruminantes Fotos FG
C
asimiro e António são irmãos e sócios numa exploração de vacas de leite em Roriz. O negócio já vinha dos pais mas em 1996 foi comprado pelos dois irmãos que asseguram a sua gestão. Atualmente também já trabalha na exploração 76
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
a filha mais velha de Casimiro, Sara. A vacaria foi recentemente remodelada pela aquisição de 2 robots de ordenha que servem 130 vacas em produção dum efetivo total de 270 animais. Na área que têm em volta da exploração, produzem forragens para a alimentação do gado.
Qual é a primeira coisa que fazem quando chegam à exploração? Ver se está tudo em ordem. Depois, dar comida aos animais e fazer limpeza às camas. Há pouco tempo investiram em dois robots. Que sistema tinham?
Os jovens querem tecnologia
Da esquerda para a direita: os irmãos António e Casimiro Marques, e a segunda geração: Sara e Beatriz Marques.
"AS CÉLULAS SOMÁTICAS ESTÃO EM VALORES BAIXÍSSIMOS. NUM MÊS E MEIO DE ORDENHA COM O ROBOT, NÃO TRATÁMOS UM ANIMAL." Uma sala de ordenha com 16 pontos que tinha sido adquirida há 17 anos. Investimos nos robots devido à falta de mão-de-obra e também porque queríamos ter mais qualidade de vida, e para chamar gente nova para aqui. Antes, quanto tempo levavam a ordenhar as vacas? Cerca de 4 horas por dia. Agora também temos que estar aqui mas podemos estar a fazer outras coisas, para além de que não estamos presos a horários fixos. A instalação dos robots foi no início de agosto, e estamos no final de setembro. Como tem corrido a transição? Isto é como tudo, requer uma aprendizagem e habituação. Nos dois primeiros dias praticamente não saímos daqui. Usaram alguma tática para a adaptação das vacas ao robot? Passámos quatro dias com as portas de acesso ao robot abertas, e obrigámo-las todas a passar pelos robots onde tinham ração à discrição. Ao fim de quanto tempo entraram na rotina? Ao terceiro dia isto já andava, mas não se podia virar costas. Ao fim de uma semana, as vacas já estavam a entrar no ritmo, a comer a ração toda... Tiveram quebras de produção? A produção nunca caiu. Contámos sempre
com técnicos da empresa Harker XXI que, nos três primeiros, dias estiveram aqui de dia e de noite. Tivemos uma contrariedade neste processo que foi começar com muitas vacas, 130, para serem ordenhadas, o que é praticamente o máximo para os 2 robôs. A qualidade do leite baixou? Dizem que é normal nos primeiros dias, com robôs, piorar a qualidade do leite, mas aqui até foi ao contrário. Um dos receios no arranque dos robôs está relacionado com o aumento da contagem das células somáticas e de microrganismos totais do leite. Nesta exploração, as células somáticas estão em valores baixíssimos, sempre se mantiveram nestes níveis até hoje. Quem ler a revista pode perguntar-se se rejeitámos muito leite. Não, não é uma questão de rejeitar leite, é que nós não tratamos uma única vaca. Num mês e meio de ordenha com o robô, não tratámos um único animal. Porque foi diferente do habitual? Porque no arranque, nos primeiros dias, não deixámos acumular leite, ou seja, os robots conseguiram ordenhar todas as vacas. O que fizeram à sala de ordenha? Quando entraram os robots, acabou a sala de ordenha. Qual o valor da obra para preparar a instalação dos robots? A obra podia ter sido feita por 5.000€. Mas também não chegou aos 30.000€. Depende do que cada um quiser. Fazer uma fossa e um
DADOS DE PRODUÇÃO Produção total vacaria/ano Efetivo total
1.355.000 l 270
Raça
Holstein
Nº de vacas em ordenha
130
Nº de ordenhas por dia:
2,5
Produção diária aos 365 dias por animal
11.354 l
Nº médio de lactações por vaca
2,2
Gordura média bruta do leite
3,55
Proteína média bruta do leite
3,20
Nº de células somáticas:
135.000
Idade média ao 1º parto
24-25 meses
Intervalo entre partos
396 dias
Nº de inseminações por vaca adulta gestante
1,9
Nº inseminações/vaca adulta
cc 2,5
sítio para estar, pode ser mais barato. Agora, se quiser as condições que nós pusemos – um corredor de acesso por fora, um telhado novo, entre outras coisas. Que extras têm estes robots DeLaval VMS V300? O principal é uma câmara que ajuda a encontrar mais rapidamente o teto, Ou seja, torna a ordenha muito mais rápida. Tem também a vantagem de podermos colocar as tetinas à mão, se quisermos. Por exemplo, se precisarmos de tratar ou secar uma vaca, após a vaca acabar de fazer a ordenha, colocamos o robot no modo manual, secamos a vaca, tratamos e está feito.
…
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Os jovens querem tecnologia
…
Quantas ordenhas estão a fazer por vaca? Ao fim de um mês, já estávamos com 2,5 ordenhas, mas chegaremos às 3. A média de ordenhas deve subir aos poucos. As vacas estão habituadas a duas ordenhas. Quando se é obcecado por querer ter rapidamente um grande numero de ordenhas/vaca, as vacas ficam stressadas, as vacas não descansam, e aparecem outros tipos de problemas como a subida das células somáticas. As vacas têm livre acesso a um ou outro robot? Sim, é um sistema livre. Quando analisa o investimento no robot, olha para leite ordenhado por robot ou por vaca? O meu indicador tem sido o leite ordenhado por vaca/dia. Os dois robots estão a ordenhar sensivelmente o mesmo? Exatamente. Estivemos a ver no outro dia,
por vezes há ligeiras diferenças. Cerca de 4.000 litros por dia no total, 2.000 litros cada. O que mudou na alimentação? Antes não dávamos ração na sala de ordenha, agora damos no robot. É uma ração especial? Sim, é a ração Eficor Robot, especial para robots. Todas as vacas comem no robot, e por isso reajustámos a quantidade na manjedoura. No robot, a atribuição de concentrado é feita de acordo com dois parâmetros, a fase produtiva e a produção de leite. Gorete Lopes, engenheira zootécnica na Coren que acompanha esta exploração, falou-nos sobre as caraterísticas do arraçoamento atual. "Fizemos uma alteração significativa, associada às características da mistura. A base manteve-se, utilizando grande quantidade de silagem de milho (38 a 40 kg), e sempre com mais do que 2 kg de palha. Agora fazemos
uma “manjedoura” bastante fibrosa, para nos salvaguardarmos da saúde ruminal. A função desta base é uma mistura de baixa energia, em que favorecemos a fibra e a manutenção do animal e estimulamos a procura do concentrado. Há um desfasamento, em termos energéticos e proteicos, da ração da manjedoura e do robot. Outro ponto importante foi, antecipadamente à introdução do robot, alterarmos a mistura para reforçar o sistema imunológico da vaca, com um reforço de micronutrientes, tendo em conta o stress a que os animais iam ser sujeitos devido às obras e à adaptação ao robot. O granulado do robot Eficor Robot tem um núcleo próprio, que confere um aroma e uma apetência excecionais. A vaca gosta. A qualidade do granulado confere a dureza necessária para provocar o barulho que cativa o animal a entrar e parar. Em relação aos custos alimentares, antes do robot e agora, conseguimos estar bastante equilibrados. São muito similares."
Sistema de lavagem da câmara de colocação das tetinas do robot.
Gorete Lopes, engenheira zootécnica na Coren.
Carlos Manuel, técnico comercial da Harker XXI.
Arrefecedor de placas para pré-refrigeração do leite.
"AO FIM DE UM MÊS, JÁ ESTÁVAMOS COM 2,5 ORDENHAS, MAS CHEGAREMOS ÀS 3. A MÉDIA DE ORDENHAS DEVE SUBIR AOS POUCOS." 78
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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Filipe Maricato gere a exploração com a ajuda dos seus pais.
Nova sala de ordenha GEA 2x10.
PRODUÇÃO | VACAS DE LEITE
"QUE RICO COLCHÃO!" HÁ UM ASPETO QUE DIFERENCIA A EXPLORAÇÃO DE FILIPE MARICATO DA MAIORIA DAS EXPLORAÇÕES CONGÉNERES: O TIPO DE CAMAS NO ESTÁBULO DAS VACAS EM PRODUÇÃO: UM SISTEMA CONHECIDO POR “CAMAS QUENTES” QUE VIMOS, NO PASSADO MÊS DE SETEMBRO, QUANDO VISITÁMOS A EXPLORAÇÃO. Por Ruminantes Fotos FG
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
"Que rico colchão!"
F
ilipe Maricato vem de uma família de agricultores. Os seus pais começaram com uma ordenha de 6 vacas, em 1988, que entretanto foi crescendo. Talvez por estar tão familiarizado com o negócio da produção de vacas de leite, decidiu vir trabalhar para a exploração quando terminou os estudos na universidade. Há precisamente 10 anos. O seu objetivo era aumentar o número de vacas, passar das 25 tinham para 70 a 80, e renovar a exploração. A construção das novas instalações, a cerca de 1km de Maiorca, concelho de Figueira da Foz, ficou terminada em 2018. Compreende um estábulo de 2.000m2 onde atualmente tem 70 vacas em produção, sala de ordenha GEA paralela 2x10, tanque de leite, viteleiro, maternidade, e ainda um pavilhão de apoio agrícola. A parcela total referente à exploração tem 60.000 m², a juntar a 30 hectares que cultivam. Todas as forragens são produzidas na exploração. O alimento, dado exclusivamente no unifeed, é composto por 10 kg de concentrado, 30 kg de silagem de milho, 6 a 7 kg de erva (quando existe disponibilidade) e 2 ou 3 kg de luzerna. Há um aspeto que diferencia a exploração de Filipe Maricato da maioria das explorações congéneres: o tipo de camas no estábulo das vacas em produção: um sistema conhecido por “camas quentes” que vimos, no passado mês de setembro, quando visitámos a exploração. Porque decidiu instalar este sistema da camas quentes? Nunca fui grande adepto dos cubículos, porque acho que resolvem um problema, que é conseguirmos pôr os animais organizados, mas não são o ideal para as vacas. Estas camas aparecem no seguimento disso, como uma alternativa aos cubículos. Quando descobri o sistema das camas quentes (compost barn), achei logo que seria o ideal, pelos benefícios que traz aos animais. O desenvolvimento das instalações veio no seguimento disso. Como tínhamos que trabalhar com esta cama, decidimos adaptar. O que é necessário fazer de diferente ao nível da construção? O mais importante é dimensionar de forma a garantir área suficiente para cada animal. Aqui, temos à volta de 11 m² de cama por vaca. Poderíamos trabalhar com 8 m², mas isso acabaria por ser mais exigente, em termos de material para as camas e para conseguir mantê-las num bom estado. Não existem paredes altas, usamos um sistema de cortinas que baixam quando é necessário para ajudar a secar a cama. Um bom arejamento é essencial. A cama quente é um espaço totalmente aberto, não existem divisórias, as vacas estão completamente livres. A base é feita em cimento, a um nível mais baixo que o chão da vacaria, para permitir ter uma altura de 40 cm de serradura. Aqui, por uma questão de gestão de custos e como temos a possibilidade de arranjar casca de arroz com facilidade, misturo
os dois materiais, por norma na proporção de 70:30 ou 50:50, em função da humidade. A mistura dos materiais é feita na cama? Sim. Quando fizemos isto pela primeira vez, só usámos serradura porque não consegui arranjar a casca de arroz. Na manutenção é que estou a fazer a mistura das duas. A casca de arroz, em termos de absorção, não é grande coisa. No entanto, não deixa compactar tão facilmente, a cama fica sempre mais solta e muito mais fácil de se mexer. Que benefícios tem este tipo de cama? No sistema anterior, em que por vezes as vacas ficavam deitadas no cimento, havia muitas dermatites. Aquilo que eu constatei logo foi que deixámos de ter, não há vacas com curvilhões inchados, não há feridas, e as vacas estão sempre limpas. Viu maior produção de leite? F: Por enquanto não consegui ver diferenças porque quando mudámos para aqui entraram animais novos. Mas o objetivo era que todas as vacas fizessem, pelo menos, 4 lactações. E em termos de refugo? A taxa de refugo aqui é relativamente baixa. Refugamos mais por infertilidade, do que propriamente por acidentes com o estábulo. Outra das vantagens da cama quente é periodicamente, fornecerem composto para as culturas. Exato. No fundo, pode-se fazer coincidir a retirada das camas com as sementeiras. Podemos retirar o composto de 6 em 6 meses, nós só retiramos uma vez por ano na altura das sementeiras do milho. Que quantidade de composto conseguiu no final de 1 ano? Praticamente o dobro da altura de composto, começámos com 40 cm e, quando retirámos, a zona mais alta tinha cerca de 80 cm. Com que periodicidade acrescentam material às camas? No verão temos uma folga maior. No inverno, todas as semanas. Se for em alturas de muito nevoeiro ou em que haja muita humidade no ar, é problemático. Mas não o é quando há chuva, pois os dias de chuva aqui até são os melhores para as camas porque o estábulo fica fechado. Como é feita a colocação de material nas camas? F: Utilizamos o reboque de espalhar estrume, um reboque pequeno. No inverno adicionamos material pelo menos uma vez por semana. Se houver necessidade, por qualquer motivo, ou se se notar que a cama está muito húmida, tem que se acrescentar. Pelo aspeto, é fácil
de perceber, pois começa a “entorroar”. No verão é diferente, estivemos quase 2 meses sem acrescentar material novo nas camas. Passados 2 anos, o que teria feito de diferente neste estábulo? A ventilação devia ter sido “reforçada” e mais bem distribuída. Este tipo de ventoinhas que aqui temos não é o mais indicado para este tipo de cama. O ideal seriam uns ventiladores mais pequenos, para conseguir criar o efeito de “túnel de ar”. Optei por este sistema porque esses ventiladores são muito ruidosos para além de que seriam precisos muitos mais e o investimento era consideravelmente maior. Estes, por outro lado, fazem uma corrente de ar mais suave e são muito mais silenciosos. Talvez também aumentasse ainda mais a área por animal. Em vez dos 11 m², talvez teria uns 14 m² ou 15 m², por vaca. Tornava-se muito mais simples gerir as camas. Qual é a diferença para as lojettes, em termos de número de animais? Neste espaço tenho 70 vacas. Se fosse com lojettes teria umas 120. Ou seja, o investimento por vaca é bastante maior? Sim, mas o bem-estar animal é incomparável e os problemas de saúde diminuíram significativamente. Nos cascos por exemplo, neste momento, só fazemos correções. Laminites, dermatites, que são sempre um problema, não temos aqui e, se reparar, não há pedilúvios. Se for a uma vacaria que tenha lojettes, isso é obrigatório. Para além disto, os cios detetam-se muito melhor e não há tantos acidentes, como por exemplo, no caso dos cios, quando as vacas têm de andar nos corredores cimentados. O risco de quedas e acidentes aqui é muito menor. Se as suas vacas falassem, o que acha que que lhe diriam? Que rico colchão! (risos)
DADOS DE PRODUÇÃO Produção total vacaria/ano
800.000 l.
Efetivo total
120
Raça
Holstein
Vacas em ordenha
70.
Tempo de ordenha do efetivo
1h30
Produção média aos 365 dias
11.000 l.
Produção média diária
32 a 33 l.
Número médio de lactações
2
Gordura do leite
3,8 a 3,9.
Proteína
3,30 a 3,40
Células somáticas
100.000
Idade ao primeiro parto
26 meses
Intervalo entre partos
cc 420 dias
Nº inseminações/vaca adulta
cc 2,5
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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+ de 10 anos com LELY ASTRONAUT
SOC. CASANOVA UNIPESSOAL, LDA. BARQUEIROS – BARCELOS
QUE MOTIVOS VOS LEVARAM A ADQUIRIR O ROBOT EM 2009? O espaço, a melhoria do bem estar dos animais e a redução da mão de obra. Como havia pouco espaço para instalar uma nova sala de ordenha e o robot requerer muito menos espaço, foi a solução ideal. Para além disso, e com o tráfico livre, as vacas têm a possibilidade de escolher quando querem beber, comer, descansar ou ser ordenhadas, por isso há claramente uma melhoria do bem-estar dos animais e menos stress. Outro motivo foi a redução do trabalho. QUAL O MAIOR DOS BENEFÍCIOS COM A INTRODUÇÃO DO LELY ASTRONAUT? A flexibilidade nos horários de trabalho: temos mais tempo livre para fazer outras atividades fora da vacaria e, se quisermos, podemos fazer o trabalho da vacaria quando for mais conveniente. PASSADOS MAIS DE 10 ANOS, O QUE MUDOU? As melhorias são visíveis, aumentou o numero de ordenhas, e como as vacas estão mais calmas e circulam livremente pelo estábulo houve um aumento na produção de leite. O aumento de qualidade de vida foi notório, temos mais facilidade de horários e já não temos de ordenhar as vacas a uma hora fixa todos os dias.
+ de 590.000 ordenhas realizadas, + de 6,5 milhões de litros de leite retirados, + de 10 anos a trabalhar 24 horas por dia, 365 dias por ano!!!
O novo marco na facilidade de utilização
A Lely apresenta o Astronaut A5 Nós olhamos para as vacas e ouvimos os clientes. O nosso interface de utilização redesenhado facilita a ordenha automática. A ordenha de uma vaca pela primeira vez nunca foi tão fácil. O novo braço híbrido é silencioso e decisivo, o que dá conforto para a vaca e para o operador. E por favor, lembre-se da flexibilidade comprovada, economia de mão de obra e alivio físico. É por isso que o Astronaut A5 lhe oferece a melhor forma de ordenhar, a Si e ás suas vacas.
Saiba mais sobre este novo marco na ordenha no seu Lely Center.
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Lely Center São Félix da Marinha Alteiros t +351 227 538 339 e sao-felix-da-marinha@sao.lelycenter.com
PRODUTO | BOVINOS DE CARNE
O SOFTWARE TROUP’O EM VACAS DE CARNE
A NECESSIDADE DE TORNAR MAIS FÁCIL A GESTÃO DE TODA A INFORMAÇÃO DOS SEUS CLIENTES, LEVOU O MÉDICO VETERINÁRIO LUÍS FRAGOSO A PROCURAR UMA SOLUÇÃO INFORMÁTICA QUE RESPONDESSE ÀS NECESSIDADES DA SUA EMPRESA. O SOFTWARE TROUP'O FOI A SOLUÇÃO PELA QUAL OPTOU HÁ CERCA DE UM ANO. Por Ruminantes
P
ara perceber a importância que a informática pode ter na prestação de serviços e na gestão da informação recolhida em vacadas de carne, entrevistámos Luís Fragoso e Inês Romeiras, médicos veterinários da clínica Vet Equilíbrio. A clínica veterinária Vet Equilíbrio, sediada em Samora Correia, dispõe de um departamento dedicado a animais de produção. Diariamente, presta serviços veterinários no âmbito da clínica, cirurgia e profilaxia sanitária em regime ambulatório, assegurando também o controlo reprodutivo das explorações que segue, principalmente em bovinos de carne. Luís Fragoso, médico veterinário e dono da empresa, divide com a sua colega Inês Romeiras o trabalho de assistência e gestão reprodutiva a 10 explorações com cerca de 1200 vacas de carne em produção.
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RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
Foi através de Bárbara Cunha, colaboradora da Isagri, empresa especializada em software para produção animal, que tomou conhecimento do seu novo programa, o Troup’O Carne, que veio a adquirir há cerca de um ano.
A necessidade de tornar mais fácil a gestão de toda a informação recolhida dos seus clientes levou Luís Fragoso a procurar uma solução informática que respondesse às necessidades da sua empresa: obter relatórios reprodutivos e sanitários das explorações duma forma simples, permitir o registo de dados no campo e a conexão imediata com o computador, e possibilitar a centralização dos dados.
Luís Fragoso, médico veterinário e dono da Vet Equilíbrio, divide com a sua colega Inês Romeiras a assitência às explorações.
Cada um de vós tem os seus clientes? Os clientes são da Vet Equilíbrio, e podem ser assistidos tanto por mim como pela minha colega Inês, quer seja uma situação de clínica, de cirurgia ou reprodução. Ambos temos acesso a todos os clientes. Como faziam a gestão dos dados da reprodução antes de usarem este programa? Já trabalhamos na gestão do controlo reprodutivo há muitos anos. Na altura estes dados não eram relevantes para a maioria dos produtores, mas eu sempre lhes fui incutindo a necessidade de gerirem o negócio com números certos, ou seja, de
O software Troup'O em vacas de carne
saberem exatamente quantas crias tinham por ano, quantos bezerros eram viáveis, quantos desmamaram, quantas vacas pariram e não pariram... Desde muito cedo que percebi que tinha de entregar ao produtor uma mais valia que resultasse do meu trabalho. Não bastava dizerlhes que das vacas controladas 70 estavam prenhas e 30 não estavam. E portanto, na altura, já lá vão uns anos, comecei a fazer o controlo numa folha de Excel. Enquanto eram 100 vacas tudo bem, mas quando passaram a ser centenas tornou-se mais complexo. Vivi da folha Excel durante muito tempo. Os programas que existiam no mercado eram generalistas e não correspondiam ao que nós pretendíamos. Eram virados para os produtores, para a identificação e movimentação dos animais, e nós queríamos um programa que trabalhasse com os nossos índices produtivos. Como descobriu esta alternativa ao Excel? Em conversa com a Bárbara Cunha, da Isagri, fiquei a saber que tinham um programa novo, o Troup’O Carne, capaz de se adaptar às nossas necessidades. Por outro lado, a minha colaboradora Inês, que é também produtora de vacas de carne, já tinha trabalhado com o
anterior programa da Isagri — o ISACARNE — sobretudo para identificação e movimentação de animais. Como apresentava os dados aos seus clientes antes de ter o Troup'O? No mínimo uma vez por ano, promovíamos uma reunião com o proprietário onde mostrávamos em powerpoint, em projeção, os quadros e gráficos referentes aos resultados da exploração. Nesta análise comentávamos todos os dados da vacada e o que estava em causa relativamente à produtividade, com especial foco na identificação das vacas não produtivas e na consequente perda de subsídios à vaca aleitante. Esta apresentação tinha sempre uma grande importância porque, de uma forma simples, eram apresentadas as ineficiências da exploração ou, por exemplo o dinheiro que se tinha deixado de ganhar por haver um intervalo entre partos demasiado grande. E concluíamse as reuniões apontando objetivos, definindo estratégias e corrigindo procedimentos.
as listagens que pretendemos passar para o Excel e/ou para pdf), e personalizável (podemos usar os “nossos” índices, tais como o intervalo entre partos desejável, os partos previstos nesse ano, entre outros). Nós usamos o Troup’O na versão colaborativa, ou seja, ambos temos acesso ao programa, assim como o produtor pode aceder aos seus dados se o pretender; quando não, enviamos-lhe as listagens. Para além disso, podemos aceder a todos os dados do efetivo a partir do telemóvel, já que todas as informações são sincronizadas imediatamente com o computador. Conseguimos ter no local e no momento toda a informação sobre determinado animal que estamos a ver na manga. Isto é muito útil quando é preciso tomar alguma decisão, como por exemplo, se devemos ou não aconselhar o refugo do animal em questão. Outra grande diferença está na simplicidade de navegar entre explorações, no anterior era complexo passar entre dossiers, no Troup’O é muito simples.
Que diferenças existem entre o anterior e o Troup’O? Muitas. Visualmente, o Troup’O é muito mais apelativo e intuitivo (é fácil aplicar os filtros para tirar
É importante o apoio técnico da Isagri para maximizar o potencial da aplicação? Sim, é muito importante. Neste momento, do ponto
de vista da nossa expetativa como prestadores de serviços veterinários, o programa está a 95% do que nós desejamos, mas estamos a trabalhar com a Isagri para chegarmos a 100% dos nossos objetivos iniciais. Como se processa todo o trabalho de recolha e análise dos dados de uma exploração? Fazemos a recolha dos dados diretamente para o telemóvel, mas também utilizamos o suporte em papel para guardar num dossier (backup). Quando vamos para uma exploração, imprimimos a “listagem de campo” com os “filtros de campo” onde estão todos os animais que vamos observar. Durante a visita, registamos as notas em simultâneo no papel e no programa através da aplicação instalada também no telemóvel. Ainda estamos em fase de desmame do papel (risos). Quantas explorações têm atualmente no programa? De momento, a Vet Equilíbrio presta assistência a 10 explorações e cerca de 1200 vacas de carne em produção no total. Duas delas têm o Troup’O e partilham connosco os dados. Aqui está a importância do sistema colaborativo deste programa.
…
"VISUALMENTE, O TROUP’O É MUITO MAIS APELATIVO, INTUITIVO E PERSONALIZÁVEL." GRÁFICO 1 BALANÇO REPRODUTIVO
GRÁFICO 2 REPARTIÇÃO IPP
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
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O software Troup'O em vacas de carne
… O Troup’O é extremamente
importante para veterinários na área da produção animal. Com o programa, é possível aportar informação compilada e trabalhada capaz de gerar mais valias ao negócio dos nossos clientes. Para além da reprodução tem outras áreas, relacionadas com a gestão das explorações pecuárias, que ainda não estamos a explorar comercialmente.
reprodução/concepção para as novilhas. A partir destes índices extraímos todo o tipo de listagens que pretendemos, das quais destaco a listagem dos partos previstos por mês e por ano e que são enviados periodicamente ao produtor. O Excel não permitia isto com a rapidez e eficácia que este programa nos dá.
Que tipo de mapas e informação disponibilizam aos clientes? A data de previsão dos partos é a informação mais solicitada pelos produtores. Todos os meses lhes enviamos a identificação A aplicação envia alertas? das vacas previstas para parir. O Sim. O planning deste programa mapa das vacas potencialmente é muito bom porque faz logo uma não elegíveis ao subsídio da listagem automática onde põe vaca aleitante também é muito informação relevante como por importante. exemplo, “esta vaca já devia ter parido há 18 dias”, ou “esta vaca Compara os resultados vai parir daqui a 10 dias”. Os das diferentes alertas aparecem no cockpit do explorações? programa. Não comparamos os resultados entre explorações de forma Que índices produtivos sistemática, mas sim com os utiliza para monitorizar a valores que entendemos que exploração? são os ideais numa exploração Trabalhamos sempre com os e que definimos com os nossos índices de fertilidade (Gráfico 1), clientes. produtividade, intervalo entre partos (Gráfico 2), intervalos Que indicadores de parto/concepção ou entrada na produção utiliza para Quantas explorações pode ter no programa? As que quisermos, as licenças são por número de vacas adultas (ao primeiro parto) registadas, e não por número de explorações.
fazer uma avaliação numa exploração? • Fertilidade : >= 80%; • Intervalo entre partos: <=400 dias; • Índice de produtividade(*): -5% que o valor do índice de fertilidade já é um valor aceitável. Há que ter sempre a noção de adaptar os objetivos de cada exploração às características e modo de gestão de cada uma delas. Nenhuma é igual a outra. (*) Número de bezerros viáveis desmamados entre 6 e 8 meses. Qual a média de idade a que ocorre o primeiro parto? O normal é aceitar que tal ocorra até aos 30 meses de idade. Tudo o que for abaixo deste indicador, e sem ocorrências desagradáveis no decorrer do trabalho de parto, será uma mais valia para a exploração. Qual o critério que utilizam para o refugo das vacas? Idade da vaca, estado corporal, histórico de partos e número de bezerros desmamados, intervalo médio entre partos, saúde do útero e ovários, valor zootécnico da vaca. Alguns destes fatores são decisivos e têm valor predominante sobre todos os outros tais como a saúde do útero e ovários.Nisso o Troup’O é
uma ferramenta excelente porque temos o registo histórico do animal no telemóvel e podemos tomar a decisão na hora, com o animal à nossa frente. Qual é o caminho de uma empresa como a Vet Equilibrio? Penso que passa muito pela capacidade de assessorar as explorações pecuárias. Até agora tem sido nas áreas da reprodução, sanidade e clínica. No futuro, a participação e até a gestão das explorações deverão ser assentes num conjunto de informação entretanto adquirida pelo trabalho do presente. Esta gestão poderá ser feita através do conhecimento do gráfico de partos (Gráfico 3) e previsão de desmames (Gráfico 4), quantos bezerros vão nascer, qual o período em que os bezerros são mais bem valorizados, em que meses vai haver mais pasto (determinando o período dos partos). Ou seja, queremos ajudar a prever, estabelecer e até reforçar os fluxos financeiros de cada exploração/ cliente, e para isso este tipo de programas são importantíssimos e indispensáveis. O rigor, a capacidade de resposta e o aporte de informação compilada para promover a decisão certa no tempo certo, são as razões do sucesso deste trabalho de assessoria.
"O TROUP’O É EXTREMAMENTE IMPORTANTE PARA QUEM VENDE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. PASSAMOS INFORMAÇÃO QUE ACRESCENTA MUITO VALOR AO NEGÓCIO DOS CLIENTES." GRÁFICO 3 REPARTIÇÃO DE PARTOS
GRÁFICO 4 PREVISÃO DE DESMAME PARA 2019
TOTAL: 76
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A MELHOR FORRAGEM É A SUA? CONHEÇA OS VENCEDORES DAS 3 CATEGORIAS NO PRÓXIMO NÚMERO DA RUMINANTES
Silagem de erva
Silagem de milho
Forragens emergentes
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AGROPECUÁRIA DO FUTURO
AS MEGA TENDÊNCIAS
UMA DÉCADA APÓS A INTRODUÇÃO DE MUDANÇAS SOCIAIS COMO O SMARTPHONE E OS ROBOTS DE ORDENHA, ESTAMOS NO PONTO DE VIRAGEM PARA A CORRIDA TECNOLÓGICA MAIS RÁPIDA DA HISTÓRIA DA AGRICULTURA. A COMBINAÇÃO DE BIG DATA COM CIÊNCIA DE PONTA, INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E TECNOLOGIA CONECTADA À NUVEM SÃO OS INGREDIENTES QUE POTENCIAM ESTA EVOLUÇÃO. Fonte Compilação do artigo "20 Mega Trends for 2020 and Beyond", de Clinton Griffiths.
R
eproduzimos a opinião de vários especialistas em agricultura norte americanos que partilharam a sua visão com o site Dairyherd, num artigo publicado no início deste ano pelo jornalista Clinton Griffiths.
gestão de nutrientes e captura de carbono. “A agricultura é a única indústria que pode provar que pode sequestrar mais carbono do que aquele que a Mãe Natureza já sequestra”, disse Lowell Catlett, execonomista da New Mexico State University.
AGRICULTURA DE CONSERVAÇÃO Culturas de cobertura. As culturas de cobertura aumentaram para 6,2 milhões de hectares nos EUA, de acordo com o Censo Agrícola de 2017. Essa tendência provavelmente continuará devido ao seu papel na saúde do solo,
Carbon Farming. Na próxima década, empresas privadas ou programas governamentais estarão prontos para pagar aos agricultores por manterem o carbono capturado no solo. O mercado global de carbono é estimado em US $ 160 bilhões, de acordo com um estudo da Refinitiv.
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Hiperprecisão. Com hiperprecisão, os lucros são maximizados usando os recursos exatos para o rendimento máximo. Cada semente recebe as suas necessidades ideais, diz Jack Uldrich, ex-oficial da inteligência naval e autor. O mercado global de agricultura de precisão deverá movimentar aproximadamente US $ 10 bilhões em meados da década, de acordo com a Grand View Research. Especialistas dizem que combinar esse investimento com avanços em tecnologia, tratamento de dados e inteligência artificial irá estimular de forma determinante a inovação.
Microbial Farming. Micróbios, como bactérias, fungos e protozoários, têm potencial para grandes avanços. “Eu chamo a isso agricultura subterrânea”, diz Catlett. “Vamos gerir abaixo da superfície tanto quanto acima, graças ao crescente interesse na área dos micróbios.”O mercado microbiano agrícola é estimado em US $ 6 bilhões em 2022, de acordo com a Markets and Markets Research. DADOS CONETADOS 5G. Mais de 40% da população mundial não tem acesso à Internet. À medida que o investimento em
Notícias e novidades de produto
banda larga rural e 5G se difundir, novas oportunidades surgirão em explorações conectadas. De acordo com Jim Carroll, consultor de negócios e autor, dentro de dez anos as pessoas que estarão à frente das explorações vão ser as crianças que nunca conheceram um mundo sem tecnologia. Revolução dos sensores. Novos sensores estão a ajudar a monitorizar e a gerir a produção agrícola e ganadeira. David Hanson, professor de biologia da Universidade do Novo México, tem instalado sensores do tamanho de agulhas nas folhas das plantas para monitorizar o fluxo entre as células, esperando que, um dia, seja possível dar a cada planta apenas a quantidade de água de que precisa. Internet das Coisas e tecnologia Blockchain. Em meados da década, os dispositivos conectados poderão chegar a 75 bilhões. Uldrich diz que, na próxima década, tudo, desde o gado aos campos de cultura, estará ligado à internet. Essas ligações e dados precisarão de uma linguagem e rastreamento próprios. O surgimento da tecnologia Blockchain ajudará a manter tudo organizado e gerenciável.“A tecnologia Blockchain permitirá que os agricultores partilhem os seus dados com segurança com outros agricultores e até mesmo coletivamente numa cooperativa”, diz Uldrich. Inteligência artificial. “Nenhum ser humano consegue entender todos os dados”, diz Uldrich.
“A inteligência artificial e os algoritmos de aprendizagem da máquina vão ajudar os agricultores a filtrar os dados para chegar a conhecimentos de valor para os ajudar a aumentar a eficiência, a produtividade e os rendimentos.” AGRONOMIA AVANÇADA Edição do gene CRISPR. Ao explorar os sistemas imunológicos das bactérias para editar ou cortar e substituir sequências de DNA, o CRISPR-Cas9 (ferramenta de edição de genoma) permite que as alterações genéticas aconteçam de forma mais rápida e barata. Este sistema revolucionário poderá um dia proteger as plantas da seca, doenças ou insetos e ajudar os humanos a combater o cancro ou eliminar doenças genéticas. Expressão de características. Na última década, os cientistas concluíram o sequenciamento de muitos dos genomas alimentares mais importantes do mundo. Em conjunto com os avanços nas ciências genéticas, isso deverá resultar num aumento de novas características em plantas e animais. Robótica de precisão. O surgimento de sensores cada vez mais baratos, melhores sistemas de GPS e máquinas de autoaprendizagem ajuda a que os robôs estejam a tornar-se mais populares. “Algumas dessas robóticas, atualmente, são grandes, desajeitadas e caras”, diz Uldrich. “Na próxima década a tecnologia robótica irá tornar-se muito mais inteligente devido à tecnologia de sensores, inteligência artificial e ligação 5G.” Em nenhum lugar a
robótica é mais evidente do que nas vacarias da América. Em meados da década, os robôs de ordenha representarão um negócio de US $30 bilhões, de acordo com um estudo da Wintergreen Research. Biológicos. As soluções biológicas estão a tornar-se mais populares em culturas convencionais. “Estamos a encontrar maneiras de aumentar a produção e extrair o azoto do ar ou do solo para que não tenhamos que pagar às pessoas por esses materiais no futuro”, diz Uldrich. Os micróbios podem reduzir o uso de pesticidas e fertilizantes em 20%, em 20 anos, de acordo com um relatório da Academia Americana de Microbiologia. PECUÁRIA DIGITAL Reconhecimento facial. O aumento da capacidade dos computadores combinado com aprendizagem automática e a inteligência artificial está a ajudar os produtores a monitorizar e rastrear cada movimento dos seus animais. “Este software pode detetar claudicação ou alterações no animal cerca de dois dias antes dum técnico treinado o conseguir fazer”, diz Catlett. “Pode ajudar a obter uma melhor saúde animal como também servir para provar que os animais não estão sob stress e foram bem tratados”. Rastreadores de fitness. Os rastreadores de fitness, de utilização comum nas pessoas, têm agora lugar nos rebanhos de gado para rastrear o consumo de ração ou forragem, monitorizar o comportamento dos animais relativamente a parâmetros sanitários, ou até mesmo para
prever a probabilidade de estro ou parto. Designer de pecuária. À semelhança das inovações em plantações, as modificações genéticas graças à edição de genes e ao CRISPR-Cas9 virão a ter um grande impacto na indústria pecuária. Do salmão de crescimento rápido ao recente esforço da China para criar porcos tolerantes ao frio, a capacidade de projetar animais adequados para determinados ambientes e resistentes a doenças é hoje uma realidade. Dentro de uma década estes animais poderão vir a ser a norma. Cientistas e agências reguladoras estão a estudar os efeitos de longo prazo da modificação das principais espécies animais para alimentação. Grupos como o National Pork Producers Council estão a tentar que a regulamentação relativa à manipulação genética das espécies de animais seja alterada a seu favor. Explorações leiteiras de grande dimensão. De 2008 a 2018, os EUA perderam 17.000 explorações leiteiras. Ainda assim, o número total de vacas manteve-se e o tamanho do rebanho atingiu uma média de 250 cabeças. Prevêse que as grandes explorações continuem a crescer e as pequenos se diversifiquem, ou desapareçam. “No Texas, há uma empresa de leite que ordenha 100.000 vacas”, diz Catlett. “Se temos 9 milhões de vacas no país, então precisamos apenas de 90 produtores de leite realmente bons para suprir todas as necessidades de leite e laticínios do país.”
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Notícias e novidades de produto
APLICAÇÃO DIGITAL WEZOOT AUCTIONS GESTÃO INTEGRAL DE UM LEILÃO DE GADO
SENSOR DE CONTAGEM DE CÉLULAS DA GEA DAIRYMILK M6850 AVALIAR OS QUARTOS DO ÚBERE A QUALQUER MOMENTO
O
sensor de contagem de células da GEA DairyMilk M6850 é o primeiro sistema de contagem de células somáticas a avaliar os quartos do úbere individualmente durante a ordenha. O seu sistema de alerta notifica rapidamente os agricultores ao detetar os primeiros sinais de doença, para que possam agir imediatamente. Isso minimiza a duração de qualquer tratamento e facilita o processo de cicatrização, protegendo a saúde dos animais e permitindo uma produtividade continua. Este sensor é fácil de instalar e pode ser adaptado aos sistemas de ordenha automático da GEA (DairyRobot ou DairyProQ) a qualquer momento. Os sinais claros de mamite clínica, como grumos, pus ou sangue no leite, requerem cuidados veterinários imediatos; mas a mamite subclínica também pode ter impacto na saúde da vacada e reduzir a qualidade e o volume de leite. Embora, neste caso, as alterações no leite não possam ser detectadas a olho nu, o número de células somáticas será significativamente maior nas análises de laboratório. Assim, tempo precioso é desperdiçado, à espera dos resultados dos testes
do laboratório. Ao contrário dos testes por amostragem aleatória da produção total de leite, o sensor de contagem de células da GEA M6850 verifica cada quarto de úbere individualmente à medida que se ordenha. Antes de o sensor de contagem de células GEA DairyMilk M6850 entrar em produção em série em 2018, mais de 70.000 amostras de leite foram analisadas e comparadas com os resultados do sensor. O sistema analisa continuamente o fluxo de leite de cada quarto do úbere de maneira individual, garantindo segurança e transparência sem custo adicional. Segundo os produtores que já o instalaram, é sensível, preciso e fiável. Para mais informações, consulte os site: www.gea.com.
Complementamos a nossa GAMA DIOXIDOS
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A
Digidelta lançou, numa parceria com a AJASUL – Associação de Jovens Agricultores do Sul, uma aplicação digital inovadora chamada Wezoot Auctions que permite fazer a gestão integral de um leilão de gado (online e presencial) de forma inovadora. Com a aplicação é possível assistir ao leilão em tempo real e submeter uma licitação a partir de qualquer dispositivo com ligação à Internet. Também no parque do leilão o processo de licitação foi digitalizado, através da utilização de botões eletrónicos por parte dos compradores. A solução foi desenvolvida integralmente pela equipa da Digidelta Software, aplicando as mais recentes linguagens de
programação e princípios de usabilidade, procurando oferecer uma ferramenta simples e intuitiva para os vários utilizadores: compradores, vendedores e entidade gestora do leilão. No primeiro leilão de bovinos da AJASUL onde foi implementado o sistema foram apresentadas mais de 700 licitações aos 104 lotes apresentados, num total de cerca de 300 animais. Foram mais de 30 os participantes presenciais e online, registando-se de imediato uma compra online no primeiro leilão. A aplicação vem reforçar a aposta da Digidelta Software na área do software na área da pecuária.
Notícias e novidades de produto
ALERTAR OS AGRICULTORES SOBRE AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS A APP CLIMALERT AJUDA A OTIMIZAR ÁGUA E COLHEITAS Está a nascer uma ferramenta que alerta os agricultores sobre mudanças climáticas, ajudando-o a otimizar a irrigação das culturas e a antecipar ou adiar colheitas. Chama-se “Climalert” e é coordenada pelo Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA) da Universidade do Minho. O projeto, que inclui uma app e uma plataforma web, permite de forma simples e gráfica que os agricultores registem e analisem tendências do estado da sua cultura e da produtividade ou avaliem ciclos de temperatura, precipitação e intempéries. A par desta app, está a ser concebida uma plataforma web de suporte à tomada de decisão
no setor da água, de modo a planear cenários de exploração agrícola e uso hídrico a médio e longo prazo. As ferramentas “Climalert” foram criadas na UMinho, através dos centros de investigação CBMA, Algoritmi e de Sistemas Microeletromecânicos, e estão a ser testadas por stakeholders nos
três países do consórcio. A ideia é perceber, por exemplo, "o estado de secura do solo, o acesso a indicadores de água na planta e na atmosfera ou o stock de água nos rios a albufeiras”. Através destas aplicações, os agricultores podem antecipar um evento climático em uma ou duas semanas, antecipar ou adiar uma colheita e otimizar o seu sistema de irrigação. O “Climalert”, acrónimo de “Climate Alert Smart System for Sustainable Water and Agriculture”, envolve ainda o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), o Instituto Catalão de Investigação da Água (Espanha) e o Centro de Investigação Ambiental Helmholtz (Alemanha).
EMPRESA AGROVETE LANÇA LOJA ONLINE Para facilitar o contacto com os seus clientes, a Agrovete lançou uma loja online. Por enquanto, apenas estão disponíveis as cercas elétricas e os seus componentes, da sua representada Galagher, marca neozelandesa líder de mercado mundial das cercas elétricas. A Agrovete foi fundada em 1962 e ao longo de mais de 50 anos de existência tem vindo a desenvolver-se no sector agrícola e agropecuário. Mais informações em www.agrovete.pt.
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OBSERVATÓRIO DE MATÉRIAS PRIMAS
SERÁ O FIM DE UM CICLO?
O INDICADOR DE QUE ESTE CICLO ACABOU ESTÁ NO QUADRO NO FINAL DESTE ARTIGO, ONDE SE PODE VER QUE A SITUAÇÃO DE STOCKS FINAIS VERSUS PRODUÇÃO ESTÁ A FICAR MENOS FOLGADA. PELO QUE JÁ SE IMAGINA PARA ONDE VÃO OS PREÇOS. Por João Santos
O
s dois/três últimos anos foram marcados em grande medida, pela peste suína na China que, segundo algumas fontes, terá em dada altura levado ao sacrifício de mais de metade dos porcos daquele país. Essa forte e repentina redução de efetivos animais conduziu a uma redução na procura de soja, que só gradualmente foi compensada pelo aumento do seu consumo no resto do mundo, e na China, pelo aumento da produção de peixes em aquacultura e de aves. Pelo lado da oferta, estes últimos anos, tirando uma colheita fraca na Argentina em 2018, tiveram boas safras, donde assistimos a um aumento dos stocks de soja (Quadro 1). Distraídos pelo Covid-19, os compradores pensaram que a tendência ficaria pelos preços relativamente baixos e com tendência para cair mais alguma coisa. Como o tempo estava de feição, a juntar às incertezas em relação à venda de carne devido ao Covid-19, as fábricas de ração não fizeram muitas compras a deferido, em particular no Brasil e nos EUA. No entanto, como já tinha deixado antever no meu 92
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anterior Observatório de MP, os sinais que chegavam da China eram de que a procura neste país estava a recuperar. Estávamos em ano de eleições nos EUA (onde os votos dos agricultores são muito importantes para a eleição do presidente, nomeadamente nos estados predominantemente agrícolas), pelo que o presidente não iria mudar a politica em relação ao etanol ou ao biodiesel por forma a levar a uma redução do preço da soja ou do milho. Antes pelo contrário. Adicionalmente, com o intuito de repor alguma paz com o presidente Trump, o presidente Xi deverá ter dado ordens para que a importação de produtos agrícolas chegasse ao volume acordado para a primeira fase do Acordo Comercial com os EUA. Ainda se lembram da Guerra Comercial? Pois, nos últimos meses a China não tem parado de comprar, tanto a velha como a nova colheita de soja nos EUA. Adicionalmente, no sul da China, em agosto, as inundações tiveram um forte impacto nos campos de milho. Fala-se de uma possível perda de 40 milhões de TM, e como consequência, ou não, além da soja a China também está a comprar muito milho, em
particular no Mar Negro, pelo que o milho também tem a sua história pelo lado da procura. O indicador de que este ciclo acabou está no quadro deste artigo, onde se pode ver que a situação de stocks finais versus produção está a ficar menos folgada… pelo que todos já imaginam para onde vão os preços. PROTEÍNAS O Brasil teve este ano um recorde de produção de soja, 131 milhões de toneladas; a Argentina também teve uma boa colheita e os EUA esperam o mesmo. Como consequência da boa colheita na América do Sul, no início de agosto o preço da farinha de soja estava estabilizado nos 310 €t/m em Lisboa. No relatório de agosto, o USDA subiu a produção dos EUA, mas aumentou, em muito, o consumo de soja na China, pelo que os stock finais pouco oscilaram. Posteriormente, durante o mês de agosto, o tempo esteve muito seco e quente nos EUA e, como consequência, o USDA, no seu relatório de setembro, reviu em baixa a produção interna de soja. Contas feitas, num espaço de um mês, o preço da farinha de soja subiu 50 euros em Lisboa.
Em relação ao futuro, com o nível atual de stocks finais, o mais importante é que a próxima colheita do Brasil e da Argentina corram bem, e que a produção, em particular do Brasil, continue a aumentar. Este aumento irá compensar o mais que previsível incremento da procura da China. Já sabemos que é muito difícil saber o que realmente acontece na China, mas, aparentemente, tudo indica que o consumo vai continuar a aumentar, tendo por base as modernas mega pecuárias construídas com apertadas medidas de biossegurança. Não nos podemos esquecer que o incentivo de recuperar a capacidade de produção de porcos na China é muito grande. O atual preço da carne de porco está acima dos 7$/kg. O tempo não tem estado favorável para o girassol no Mar Negro, esperando-se uma colheita pequena, com a consequente subida de preço do bagaço de girassol, algo que será mais sentido em Portugal a partir do início do ano que vem. Na colza, a colheita deste ano também não foi famosa na Europa e no Canadá pelo que, tendo em vista a procura para o biodiesel, não seja de
Observatório de matérias-primas
esperar que a margem da extração de colza, em termos €% de proteína, possa estar mais competitiva que a farinha de soja. CEREAIS Nos cereais, à imagem da soja, também vimos o mundo dar uma volta desde meados de agosto. A China, pelas mesmas razões da soja, começou a comprar milho como há muito tempo não se tinha visto. E justamente nos sítios que podem fornecer de forma mais competitiva Portugal, ou seja, no mar Negro e no Brasil. Também está a comprar nos EUA, o que até é bom, uma vez que é o milho de referência utilizado pela UE para calcular os direitos de importação. Se o milho nos EUA estiver caro, não há risco de pagar direitos, e o milho das outras origens pode chegar livremente. Os importadores poderão ser agressivos nas suas ofertas, uma vez que não correm risco de ter de pagar direitos de importação. O final da campanha do trigo não foi o ideal, principalmente no Mar Negro, pelo que o preço do trigo também ficou mais forte. Como consequência, até a cevada espanhola, que em junho estava a ser oferecida a preços muitos baixos, corrigiu. E hoje, tanto a cevada como o trigo estão acima dos 200€/tm. No milho, além da procura chinesa, as condições climatéricas para a cultura não foram as ideais, o que agrava os preços. Subiram muito, e há um risco grande de incumprimento dos contratos no Mar Negro. O ano passado, por esta altura, víamos muito trigo e cevada a chegar a Portugal vindo de Inglaterra, onde a colheita tinha sido muito boa, e os operadores estavam na expectativa de que, não havendo acordo em relação
ao Brexit, entrassem em vigor direitos de importação. Este ano, tomando como boas as palavras do Primeiro Ministro Boris Johnson, o Reino Unido vai mesmo sair a 31 de dezembro. Mas este ano os nossos portos não estão cheios de cevada e trigo inglês. Pelo caminho que as negociações do Brexit estão a levar, é bem provável que as importações deste país tenham que pagar direitos. O que seria uma má noticia. NOTAS FINAIS Por detrás das subidas e descidas de preços, à margem de algum empolamento que as mesmas possam ter por causa da atuação dos fundos, há sempre algo fundamental a acontecer na balança da procura/oferta. Com a peste suína vimos a China reduzir em cerca de 10% a importação de soja, somando-se a este efeito o ritmo de aumento de consumo que estava a ter de mais de 5% ao ano. Hoje, tudo indica que a China voltou ao nível de consumo que tinha em 2017. Prever o futuro ainda é mais difícil, uma vez que temos que saber se vai continuar a incrementar o consumo de forma exponencial, como o tinha feito até 2017, ou se vai estabilizar. O certo é que, com o nível de stocks finais em 26% sobre a produção, ainda estamos mais dependentes de que as colheitas nos grandes países produtores corram bem, que haja aumentos de produção, de preferência de rendimento e não de área semeada, para bem do planeta. Em relação ao preço, com a ressalva de que é preciso validar a razão do aumento de importações da China, tudo indica que vai continuar firme. Será o fim dum ciclo? Despeço-me com amizade...
Aumente até aos 6% de açúcares na matéria seca da dieta e aumente a produção das suas vacas!
Melhora o rendimento Aumenta a produção Melhora a qualidade do leite
Redução do pó e da escolha dos animais nos comedouros
QUADRO 1 PRODUÇÃO MUNDIAL E STOCKS FINAIS DE MILHO E SOJA MILHÕES TM
14/15
15/16
16/17
17/18
18/19
19/20
20/21
319
312,8
351,4
342,09
360,3
335,4
362,9
STOCKS FINAIS
77,6
76,6
96,0
98,56
111,88
99,2
96,3
24%
24%
27%
29%
31%
30%
27%
PRODUÇÃO FINAL
1008,8
961,9
1070,2
1076,2
1123,3
1113,5
1186,5,
STOCKS FINAIS
208,2
210,9
227,0
341,2
320,8
312,9
337,9
21%
22%
21%
32%
29%
28%
28%
Fonte de energia imediata
Aumento da ingestão de matéria seca
SOJA PRODUÇÃO FINAL
Diminuição do risco de acidose ruminal
MILHO
www.edfman.com
Melhora a digestibilidade da fibra
Av Antonio Serpa, 23-7º 1050-026 Lisboa Telef: +351 21 7801488 Fax: +351 21 7965230 Email: lisbon@edfman.com
Fonte: USDA s&d relatório de setembro.
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OBSERVATÓRIO DO LEITE
DO COVID-19 AOS DESAFIOS FUTUROS
CHEGÁMOS AO ÚLTIMO OBSERVATÓRIO DO ANO, UM ANO ATÍPICO QUE FICARÁ CERTAMENTE PARA A HISTÓRIA. SEM DÚVIDA QUE MESMO NUM FUTURO LONGÍNQUO SE FALARÃO EM TEMPOS “PRÉ-COVID” E “PÓS-COVID”. Por Joana Silva, Médica Veterinária | Fontes AHDB, DairyGlobal, Rabobank, The Dairy Site O setor leiteiro, como temos visto nas últimas edições, não escapou totalmente incólume aos efeitos da pandemia, apesar da sua resiliência em comparação com outros setores. No entanto, a recessão global é hoje mais do que uma simples conjetura, e os mercados do leite e derivados poderão ver-se a braços com diminuições acentuadas da procura. O abrandamento da economia mundial – tão ou mais difundido que o vírus – em paralelo com a desvalorização dos preços do petróleo, poderá também pôr em causa o poder de compra de economias que geram daí a sua riqueza, impactando negativamente a importação de produtos lácteos. Para este ano, a FAO prevê uma contração das exportações a nível global na ordem dos 4%, devido à pandemia, a diminuição, face ao homólogo, mais elevada das últimas três décadas. Na Europa, no primeiro quadrimestre do ano, esta contração foi especialmente
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sentida no mercado do queijo e do leite em pó desnatado. A evolução do mercado chinês, o primeiro colosso a tremer com os efeitos da pandemia, surtirá também efeitos nos próximos meses, especialmente junto de parceiros comerciais próximos, como a Austrália. No entanto, a avidez associada à China poderá ficar aquém do histórico, tendo em conta a quebra da procura interna e também os stocks mais elevados de produtos, como o leite em pó. Em março, as condicionantes do mercado levaram a um desvio do leite em natureza para a produção de leite em pó, um dos principais componentes do cabaz da importação no país. Por outro lado, aponta-se já um início de recuperação dos efetivos suínos, devastados pelo surto de Peste Suína Africana que assolou o país, e consequente maior necessidade de proteína whey. Em julho deste ano, a China importou cerca de 64 000 toneladas desta matéria-prima, o
valor mais alto em dez anos. Ainda no efetivo leiteiro, a longo prazo, os investimentos nacionais no setor almejam chegar a um acréscimo do efetivo na ordem das 700 000 cabeças, compreendendo um aumento do efetivo chinês na ordem dos 8% nos próximos anos. Saído da sombra do cenário da incerteza está também o Brexit, agora garantido, muito embora ainda não estejam redigidos os pressupostos das relações comerciais futuras. A incerteza associada a este cenário, bem como o risco de disrupção dos mercados, poderão per si semear nestes uma tendência de aversão ao risco. Apesar de não existir nenhuma ligação aparente entre a pandemia e o Brexit, ambos levantam questões-chave no que toca à complexidade das cadeias logísticas, e na análise que cada interveniente deve fazer dos seus mercados internos e externos: quão dependente está uma dada economia das importações
de ingredientes ou matériasprimas para satisfazer as suas necessidades? Em paralelo, existirá dependência de um dado parceiro económico para garantir as exportações necessárias, bem como adaptar-se a novos parceiros caso seja necessário? Focando a análise no elo final da cadeia – o consumidor doméstico – a adaptabilidade foi notória: se nos países desenvolvidos tínhamos o perfil predominante do consumidor com poder de compra mas limitado de tempo, o confinamento transformou muitos deles em consumidores com excedente de tempo e algumas limitações financeiras, as quais poderão levar a que o consumo de bens alimentares fique restringido às necessidades básicas. Outra tendência que promete fidelizar muitos consumidores no longo prazo foi a adaptação às compras online, as quais podem dificultar a venda de muitos produtos de valor acrescentado cujos atributos qualitativos não serão tão
Observatório do leite
facilmente percecionados através deste canal de compra. Patentes nos mercados estão ainda estratégias que visam a produção de alimentos sem comprometimento da biodiversidade, em paralelo com a otimização do processo e criação de valor para todos os intervenientes. Exemplos disso são a “Estratégia do Prado ao Prato” e a “Estratégia Biodiversidade 2030”, apresentadas pela Comissão Europeia em maio deste ano, e que têm como um dos principais objetivos garantir que 25% do solo agrícola da União Europeia é de produção biológica. A conjuntura atual, no entanto, deverá atrasar a implementação de legislação no âmbito destas estratégias até 2022. O futuro que aí vem é hoje, mais do que nunca, incerto. O poder de reação atempada e adaptação sólida, como aprendemos com o Covid-19, será uma exigência a todos os que almejem garantir o seu lugar no mercado. O desafio do setor leiteiro será, por um lado, garantir a continuidade da produção, recolha, processamento e distribuição dos produtos lácteos, mas também assumir a responsabilidade social de garantir a segurança dos seus colaboradores e ter um papel solidariamente ativo nas sociedades. Em paralelo, a eficiência e a flexibilidade da produção serão prioritárias: de que vias dispõem os produtores e distribuidores para aceder aos mercados e, em caso de limitações de acesso aos mesmos, quais são as alternativas? De que forma podem ser canalizados os recursos para responder a uma maior apetência para produtos processados de maior valor acrescentado, e ainda assim estar preparados para situações como distanciamento social, diminuição do pessoal ativo devido a doença e investimentos em automatização? Como irá reagir o setor face a todas estas questões? Estaremos cá para ver (com ou sem coronavírus). Até para o ano.
TABELA 1 PREÇO DO LEITE STANDARDIZADO (1) PAÍSES
COMPANHIA
PREÇO DO LEITE (€/100 KG) ABRIL 2020
MÉDIA DOS ÚLTIMOS 12 MESES (5)
ALEMANHA
Alois Müller
30,68
31,83
DINAMARCA
Arla Foods
31,83
32,62
FRANÇA
Danone Lactalis (Pays de la Loire) Sodiaal
37,10 33,48 34,66
34,83 34,82 34,93
INGLATERRA
Dairy Crest (Davidstow)
28,06
31,86
IRLANDA
Glanbia Kerry
30,29 31,27
29,89 30,82
ITÁLIA
Granarolo (North)
37,87
39,33
HOLANDA
DOC Cheese Friesland Campina
32,00
34,05
N. ZELÂNDIA
Fonterra (3)
28,82
32,00
EUA (4)
EUA
52,67
40,21
PREÇO MÉDIO LEITE (2)
Fonte: LTO; (1) Preços sem IVA pagos ao produtor; Preço do leite de diferentes empresas leiteiras para 4,2% de MG, 3,4% de teor proteico e CCS de 249,999/ml . (2) Média aritmética . (3) Baseado na previsão mais recente (4) Reportado pela USDA . (5) Inclui o pagamento suplementar mais recente.
TABELA 2 LEITE À PRODUÇÃO, PREÇOS MÉDIOS MENSAIS EM 2019/2020
MESES
EUR/KG Contin.
2019
2020
TEOR MÉDIO DE MATÉRIA GORDA (%)
Açores
Contin.
TEOR PROTEICO (%)
Açores
Contin.
Açores
JULHO
0,310
0,285
3,70
3,62
3,28
3,14
AGOSTO
0,311
0,285
3,75
3,68
3,27
3,16
SETEMBRO
0,314
0,289
3,80
3,72
3,30
3,22
OUTUBRO
0,315
0,293
3,89
3,82
3,34
3,29
NOVEMBRO
0,315
0,294
3,93
3,84
3,37
3,32
DEZEMBRO
0,314
0,294
3,90
3,83
3,34
3,30
JANEIRO
0,314
0,297
3,89
3,70
3,34
3,20
FEVEREIRO
0,312
0,289
3,81
3,65
3,28
3,18
MARÇO
0,311
0,290
3,78
3,62
3,26
3,18
ABRIL
0,312
0,289
3,78
3,66
3,25
3,20
MAIO
0,311
0,280
3,74
3,63
3,21
3,17
JUNHO
0,308
0,281
3,67
3,68
3,19
3,17
JULHO
0,306
0,277
3,68
3,68
3,19
3,13
Fonte: SIMA; Gabinete de Planeamento e Políticas.
RUMINANTES | OUT/NOV/DEZ 2020
95
ÍNDICE VL E ÍNDICE VL-ERVA
RENTABILIDADE DAS EXPLORAÇÕES AMEAÇADA OS DADOS PUBLICADOS PELO MMO (2020) PERMITEM VERIFICAR QUE O PREÇO MÉDIO DO LEITE PAGO AO PRODUTOR NO PERÍODO DE MAIO A JULHO DE 2020 FOI, MAIS UMA VEZ, MUITO INFERIOR EM PORTUGAL (0,3013 €/KG) QUANDO COMPARADO COM A MÉDIA DA UE27 (0,3292 €/KG). ESTA DIFERENÇA -2,80 CÊNTIMOS/KG DE LEITE SERIA FUNDAMENTAL PARA MELHORAR A RENTABILIDADE DAS EXPLORAÇÕES EM PORTUGAL. Por António Moitinho Rodrigues, docente/investigador, Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Castelo Branco; Carlos Vouzela, docente/investigador,
Faculdade de Ciências Agrárias e do Ambiente da Universidade dos Açores/IITAA; Nuno Marques, Revista Ruminantes.
A
nalisamos neste número da Ruminantes os Índices VL e VL - ERVA para o período de maio a julho de 2020. O Índice VL é um indicador muito útil que pode ser aplicado à própria exploração, permitindo que o produtor monitorize a rentabilidade da sua atividade muito influenciada pelos custos com a alimentação das vacas e pelo preço que recebe pelo leite produzido. Durante o trimestre em análise, o preço do leite pago aos produtores individuais do continente variou entre 0,311 €/kg em maio e 0,306 €/kg em julho, tendo o preço médio sido inferior (-1,07%) relativamente ao trimestre anterior. Na Região Autónoma dos Açores o preço do leite pago aos produtores individuais variou entre 0,281 €/kg em junho e 0,277 €/kg em julho, sendo o 96
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preço médio do trimestre inferior (-3,57%) em relação ao trimestre anterior (SIMA-GPP, 2020). Os dados publicados pelo MMO (2020) permitem verificar que o preço médio do leite pago ao produtor no período de maio a julho de 2020 foi, mais uma vez, muito inferior em Portugal (0,3013 €/kg) quando comparado com a média da UE27 (0,3292 €/kg). Esta diferença -2,80 cêntimos/kg de leite seria fundamental para melhorar a rentabilidade das explorações em Portugal. Significa que as principais organizações que recolhem e transformam leite em Portugal não conseguem acrescentar valor a este produto e que a grande distribuição valoriza pouco o mesmo. Só acrescentando valor ao leite recolhido é que será possível pagar melhor aos produtores. Estes são os elementos da cadeia de produção mais fracos, mas fundamentais.
Considera-se inadmissível que, no mês de julho de 2020, Portugal tenha voltado a integrar o lote dos 6 países da UE27 com preços mais baixos pagos ao produtor (Portugal 0,2964 €/kg, Bélgica 0,2956 €/kg, Hungria 0,2859 €/ kg; Estónia 0,2771 €/kg, Letónia 0,2648 €/kg e Lituânia 0,2549 €/ kg). Esta situação ainda é mais notória quando comparado com os 5 países maiores produtores de leite da UE27, com destaque para os preços pagos aos produtores franceses (0,3538 €/ kg), italianos (0,3464 €/kg) e holandeses (0,3400 €/kg) (MMO, 2020), curiosamente países onde há grande transformação do leite em queijo. No trimestre em análise, os preços médios das principais matérias-primas utilizadas na formulação dos concentrados utilizados neste trabalho sofreram uma redução que variou entre -8,9% no preço da cevada e -2,4% no preço do
milho. Também o preço da palha sofreu uma redução de 25% no preço relativamente ao trimestre anterior. A diminuição no preço das matérias-primas traduziu-se num decréscimo de 2,8% nos custos da alimentação da vaca tipo do continente. Na Região Autónoma dos Açores, como consequência da maior utilização de pastagem na alimentação da vaca leiteira tipo durante a primavera / verão, os custos com a alimentação dos animais diminuíram 12,9% relativamente ao trimestre anterior. A evolução do preço do leite e dos custos com a alimentação refletiuse no Índice VL e no Índice VL - ERVA que em julho de 2020 foi, respetivamente, de 1,730 e de 2,015. De referir que em julho de 2019 o Índice VL havia sido de 1,713 e o Índice VL - ERVA de 2,045. Um índice inferior a 1,5 (valor
Índice VL e VL-Erva
ÍNDICE VL JULHO 2012 A JULHO 2020 2,0 1,9 1,8 1,7 1,6 1,5 1,4 1,3 1,2 1,1 jul. '20
jan. '20
jan. '19
jan. '18
jan. '17
jan. '16
jan. '15
jan. '14
jan. '13
jul. '12
1,0
O ÍNDICE VL é influenciado pela variação mensal do preço do leite pago ao produtor no continente e pelas variações mensais dos preços dos alimentos que constituem o regime alimentar da vaca leiteira tipo (concentrado 9,5 kg/ dia; silagem de milho 33 kg/dia; palha de cevada 2 kg/dia).
ÍNDICE VL-ERVA JULHO 2013 A JULHO 2020 2,7 2,5 2,3 2,1 1,9 1,7 1,5 1,3
jul. '20
jan. 20
jan. '19
jan. '18
jan. '17
jan. '16
jan. '15
jan. '14
jul '13
1,0
O ÍNDICE VL – ERVA é influenciado pela variação mensal do preço do leite pago ao produtor na Região Autónoma dos Açores e pelas variações mensais dos preços dos alimentos que constituem o regime alimentar da vaca leiteira tipo (primavera/verão 60 kg/dia de pastagem verde, 10 kg/dia de silagem de erva e de milho, 5,6 kg/dia de concentrado; outono/inverno 47 kg/dia de pastagem verde, 13,3 kg/dia de silagem de erva e de milho, 6,7 kg/dia de concentrado).
muito baixo) indica forte ameaça para a rentabilidade da exploração leiteira; um índice entre 1,5 e 2,0 (valor moderado) indica que a produção de leite é um negócio economicamente viável à medida que nos aproximamos do valor 2; um índice maior do que 2,0 (valor elevado) indica que estamos perante uma situação favorável para o sucesso económico da exploração (Schröer-Merker et al., 2012). Com um Índice VL de 1,730 pode concluir-se que os produtores de leite do continente se encontram muito próximo do limiar de rentabilidade da exploração. Nos Açores o Índice VL-ERVA foi de 2,015 em julho, situação interessante que, no entanto, reflete melhor a realidade dos produtores da ilha de S. Miguel onde se produz cerca de 60% do total de leite dos Açores e onde os preços pagos aos produtores são mais elevados do que nas
restantes ilhas do Arquipélago. NOTAS - comparando o mês de julho de 2019 com o mês de julho de 2020 verifica-se que o preço do leite pago aos produtores do continente baixou 0,4 cêntimos e o preço pago aos produtores dos Açores baixou 0,8 cêntimos; - durante o trimestre em análise houve redução nos preços das principais matérias-primas que entram na formulação dos alimentos compostos da vaca tipo. Esta situação implicou uma redução de custos com a alimentação das vacas no continente. Como nos Açores, entre abril e setembro, a quantidade de pastagem que entra na alimentação da vaca tipo é maior, verificou-se uma redução do custo total do regime alimentar formulado para calcular o Índice VL – ERVA (-12,9%); - no trimestre em análise, a palha,
um dos alimentos forrageiros utilizados na formulação do regime alimentar, apresentou uma redução de preço; - as três considerações anteriores
refletem-se no Índice VL e no Índice VL - ERVA que em julho de 2020 foram, respetivamente, de 1,730 e 2,015. Bibliografia: consultar os autores.
EVOLUÇÃO DO ÍNDICE VL E ÍNDICE VL– ERVA JULHO 2019 A JULHO 2020 Mês
Índice VL
Índice VL - ERVA
jul-19
1,713
2,045
ago-19
1,761
2,083
set-19
1,783
2,118
out-19
1,782
1,797
nov-19
1,774
1,795
dez-19
1,752
1,783
jan-20
1,735
1,784
fev-20
1,716
1,732
mar-20
1,695
1,726 2,054
abr-20
1,695
mai-20
1,726
2,010
jun-20
1,739
2,042
jul-20
1,730
2,015
Os valores são influenciados pela variação mensal do preço do leite pago ao produtor individual do continente (Índice VL) e da Região Autónoma dos Açores (Índice VL ERVA) e também pelas variações mensais dos preços de 5 matériasprimas utilizadas na formulação do alimento composto e pelo preço dos outros alimentos que integram o regime alimentar da vaca leiteira tipo.
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