Lume#15

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lume Mato Grosso

Lixo No Lugar Do Lixo?

Revista nº. 15 • Ano 3 • Julho/2017

Projeto sócio cultural em Confresa. Pag. 22

ENTREVISTA ESPECIAL COM AROLDO MACIEL SENHORES DO ENGENHO DO SÉCULO XXI SEXUALIDADE NA 3ª IDADE A HOMOFOBIA NAZISTA RETRATO EM P&B - AECIM TOCANTINS O HIP HOP NO COMBATE ÀS DROGAS AMERICANIDADE - ISABEL ALLENDE

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C A RTA D O E D I TO R

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edição de julho de nossa revista está supimpa. Espero que agrade a todos. Temos procurado variar os temas e para isto a contribuição de nossos parceiros colaboradores tem sido inestimável. Um de nossos objetivos principais é o de levar feitos e históricos de pessoas que fazem a diferença em nossa sociedade, desde os mais remotos tempos até a contemporaneidade. Para ilustrar o que falamos nesta Carta, oferecemos aos nossos leitores na editoria Personalidade, um pouco de Lindinalva Rodrigues, uma Promotora de Justiça em Mato Grosso que tem brilhante trabalho na área social nacional, especialmente por ter sido a primeira autoridade a fazer valer as prerrogativas da Lei Maria da Penha. A revista homenageia postumamente, na editoria Retrato em P&B, o professor Aecim Tocantins, uma das mais expressivas referências de caráter e dignidade mato-grossense dos últimos tempos. Sua trajetória de vida sempre será um modelo a ser seguido. Gostaria de chamar a

JOÃO CARLOS VICENTE FERREIRA Editor Geral

atenção de nossos leitores para um recente artigo de autoria de Yan Carlos Nogueira, sobre a homofobia e combate ao homossexualismo, praticado pelo Nazismo de Hitler. É um texto relativamente curto, mas esclarecedor, e que pode levar, interessados no tema, às buscas de informações mais robustas desse período de ocorrências terríveis para a humanidade. Impressionante como o culto ao Nazismo é forte e continua a fascinar pessoas, em várias partes da terra. Recentemente a polícia federal da Argentina encontrou uma coleção de 75 peças nazistas em posse de um possível colecionador. Na coleção destacava-se uma lupa, que poderia pertencer a Adolf Hitler e um instrumento médico utilizado pelo médico nazista Josef Mengele. Ao publicar artigo sobre esse tema estamos colaborando com a disseminação de informações sobre o mal causado à humanidade pelo Nazismo, na 3ª Grande Guerra Mundial. Na entrevista especial de julho temos Aroldo Maciel, um paulista cuiabani-

zado que se tornou celebridade no Chile e em alguns países onde ocorrem abalos sísmicos, por conta de suas teorias e trabalhos realizados com vistas a antecipar informações sobre ocorrências de terremotos. Em outra editoria, temos um artigo denúncia grave, produzido por Rafael Lira, que é interprete e faz trabalhos sociais junto da comunidade haitiana em Mato Grosso. Lira aponta, sem citar nomes e endereços, que os Senhores de Engenho, que mandavam e desmandavam em escravos e empregados, no século XIX, possuem adeptos dessa prática neste começo de terceiro milênio. Quando entrarmos no campo da literatura, veremos que esta edição vem recheada de temas e autores interessantes e que devem ser acompanhados. Na editoria Americanidade nos deparamos com a escritora peruana Isabel Allende, o nome mais importante da literatura feminina da América do Sul. Tenham todos uma ótima leitura.


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EXPEDIENTE

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ELEONOR CRISTINA FERREIRA Diretora Comercial JOÃO CARLOS VICENTE FERREIRA Editor Geral MARIA RITA UEMURA Jornalista Responsável JOÃO GUILHERME O. V. FERREIRA Revisão AFRÂNIO CORRÊA, AMANDA GAMA, ANDRÉIA KRUGER, ANNA MARIA RIBEIRO, CARLOS FERREIRA, CARLOS GOMES DE CARVALHO, DIEGO DA SILVA BARROS, EDNA LARA, EDUARDO MAHON, ENIEL GOCHETTE, EVELYN RIBEIRO, JULIANA RODRIGUES, JÚNIOR CÉSAR GOMES GUIMARÃES, KALLITA DOS ANJOS MORAES, LUCIENE CARVALHO, MILTON PEREIRA DE PINHO - GUAPO, RAFAEL LIRA, ROSARIO CASALENUOVO, ROSE DOMINGUES, THAYS OLIVEIRA SILVA, VALÉRIA CARVALHO, WILLIAN GAMA, YAN CARLOS NOGUEIRA Colaboradores ANDREY ROMEU, ANTÔNIO CARLOS FERREIRA (BANAVITA), CECÍLIA KAWALL, CHICO VALDINEI, EDUARDO ANDRADE, HEITOR MAGNO, HENRIQUE SANTIAN, JANA PESSOA, JOSÉ MEDEIROS, JOYCE CORRÊA, JÚLIO ROCHA, LAÉRCIO MIRANDA, LUIS ALVES, RAI REIS,

MAIKE BUENO, MARCOS BERGAMASCO, MARCOS LOPES, MÁRIO FRIEDLANDER Fotos OS ARTIGOS ASSINADOS NÃO SÃO DE RESPONSABILIDADE DE LUME MATO GROSSO, E SIM DE SEUS AUTORES. LUME - MATO GROSSO é uma publicação mensal da EDITORA MEMÓRIA BRASILEIRA Distribuição Exclusiva no Brasil RUA PROFESSORA AMÉLIA MUNIZ, 107, CIDADE ALTA, CUIABÁ, MT, 78.030-445 (65) 3054-1847 | 36371774 99284-0228 | 9925-8248 Contato WWW.FACEBOOK.COM/REVISTALUMEMT Lume-line REVISTALUMEMT@GMAIL.COM Cartas, matérias e sugestões de pauta MEMORIABRASILEIRA13@GMAIL.COM Para anunciar ROSELI MENDES CARNAÍBA Projeto Gráfico/Diagramação DAYRON ARRAIS LIMA FOTO: HENRIQUE SANTIAN capa


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SUMÁRIO

8. 10. 20. 18. 34. 38. PERSONALIDADE

NOTAS

SAÚDE

PARA QUANDO VOCÊ FOR

SOCIAL

MEMÓRIA

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40. 52. 56. 58. COMPORTAMENTO

CULTURA

LITERATURA

JULHOS DE NOSSA HISTÓRIA

64. 62. 66.

LITERATURA

LITERATURA

LITERATURA

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PERSONALIDADE

DIVULGAÇÃO

Lindinalva

Temperamento alto, personalidade forte, determinada, focada e defensora dos direitos da mulher, acima de qualquer circunstância

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ssim é Lindinalva Rodrigues, Promotora de Justiça em Mato Grosso, mulher firme e forte em suas convicções, que não se deixa levar facilmente, que nunca perde a ternura e

nem ao menos a classe. Em sua área de atividades e em toda sociedade mato-grossense é uma vencedora. Lindinalva foi a primeira autoridade, em 2006, a aplicar a Lei Maria da Penha no Brasil, benefício onde qual-

quer pessoa pode acusar um homem de agressão física contra uma mulher. Essa prerrogativa lhe trouxe notoriedade nacional, visto que sempre atuou em defesa da família. Buscando encontrar alternativas para diminuir


foi oficialmente lançado, em 08 de março de 2013; assessorou, em 2011, a Frente de Defesa Parlamentar de Defesa da Família do Senado Federal; coordenou, de março de 2012 a março de 2013, a Comissão Permanente Nacional de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; em 2012 e 2013, auxiliou a Comissão Provisória de Reforma do Código Penal Brasileiro e a CPMI da Violência Doméstica no Congresso Nacional; no ano de 2013, ocasião em que teve anotada em sua ficha funcional elogios a sua dedicação e atuação nesse processo. Por conta dessa dedicação às causas sociais, o reconhecimento ao seu trabalho foi de forma intensa e sistemática, ocorrido não apenas em solo mato-grossense, mas em outras unidades da Federação, a exemplo de homenagem do MP do Piauí (2014); da Menção Honrosa da Secretaria de Política para Mulheres do Governo Federal (2010); da Moção de Aplausos do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Brasil, encaminhado pela Comissão Permanente de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e aprovada por unanimidade pelo Grupo Nacional de Direitos Humanos (2006). Recebeu a medalha do Mérito “Ruth Cardoso” pelo trabalho em defesa das mulheres e pelos projetos sociais desenvolvidos para as mu-

lheres em todo o país; foi indicada pelo Governo Federal, no mês de abril de 2012, entre as 25 mulheres que fazem a diferença no Brasil. Ao par dessas atividades elencadas, Lindinalva encontra tempo para dedicar-se à escrita sobre resultados de suas atividades e dos direitos humanos das mulheres. É coautora com a Juíza Amini Haddad Campos do livro “Direitos Humanos das Mulheres”, comentários à Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), que foi publicado pela Juruá Editora, em 2007. Com Amini também publicou “Constituição, Democracia e Desenvolvimento, com Direitos Humanos e Justiça”, em 2009. É também coautora do livro “Violência Doméstica – Vulnerabilidade e Desafios na Intervenção Criminal e Multidisciplinar”, produzido em parceria com a atual Presidente do STF, Ministra Carmem Lucia Antunes Rocha, Amini Haddad Campos, Juíza de Direito – TJ/MT, Lourdes Bandeira, Socióloga e Professora do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília, Fausto Rodrigues de Lima, Promotor de Justiça, Membro do Núcleo de Gênero do MPDFT. Além de livros, Lindinalva também é articulista, com intensa produção, notadamente com temas voltados à violência doméstica e familiar contra a mulher, além do que é referência maior sobre as questões ligadas à Lei Maria da Penha.

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casos de violência contra a mulher, Lindinalva já se manifestou em dezenas de milhares de processos, onde acusa agressores e garante os direitos das vítimas. Nascida Campo Grande/MS, formou-se em Direito pela UNIC (1994), com Pós-Graduação em Direito Financeiro e Tributário pela UFMT (2004). Em 1997, foi aprovada em Concurso do Ministério Público de Mato Grosso para o cargo de Promotora de Justiça. A partir de sua entrada no MPE dedicou-se com afinco às causas sociais, contabilizando-se dezenas de projetos e campanhas realizados pelo fim da violência doméstica e familiar contra as Mulheres, de combate ao abuso sexual infanto juvenil, de combate à pedofilia e ao abuso sexual de crianças e adolescentes, de luta nacional por compromisso e atitude. Sob seu olhar atento às causas sociais criou e coordenou muitos projetos, dentre os quais o Projeto Questão de Gênero, que foi premiado pelo Governo Federal como um dos três melhores do país, em agosto de 2010; criou e coordenou o Projeto Lá em casa quem manda é o respeito, em março de 2011, projeto este, selecionado e aprovado no Banco de Boas Práticas do Conselho Nacional do Ministério Público; criou e coordenou o Projeto Promotoras Legais Populares de Mato Grosso, que

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N OTA S

SOS À APAE

»»A Associação de Pais e Amigos dos

Excepcionais de Nossa Senhora do Livramento/MT, pede socorro para continuar atuando com dignidade. Quem quiser ajudar entre em contato com as seguintes pessoas: Benedita Saleth 99254 1624 / Paolla Capucho - 99936 1808 / Grasiele Rosa - 99234 4661.

CASA DA MEMÓRIA »»O município de Poxoréo tem a sua Casa da Memória, inaugurada em 24/06/2017, sob a coordenação do Instituto Histórico e Geográfico de Poxoréo

CUIABÁ 300 ANOS »»Críticas contundentes estão sendo disparadas ao prefeito Emanuel Pinheiro por conta da criação da SEC300, uma nova secretaria municipal para cuidar apenas dos festejos e preparativos da comemoração dos 300 anos de Cuiabá, que ocorre em 8 de abril de 2019. Acreditamos que o Secretário Vuolo, da Cultura, tem competência para acumular essa função, sem necessidade de criação da SEC300.

CAIS DO VALONGO

»»O Comitê do Patrimônio Mundial da

Unesco, composto de 22 países e reunido em Cracóvia, na Polônia, aprovou e homologou aprovação de título de Patrimônio Mundial ao Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, por ser classificado como local de memória e sofrimento da humanidade. REJUVENESCIDO

»»Após exitoso transplante de fígado, o

várzea-grandense Júlio José de Campos, que já ocupou a maioria quase que absoluta de cargos públicos em Mato Grosso e tem, portanto, experiência em gestão política, pode disputar votos na eleição de 2018. Disposição não lhe falta. LABORATÓRIO DE OBRAS DO TCE/MT

»»Trata-se de projeto que faz parte de um

complexo de construção que, junto à ampliação da Escola de Contas no pavimento superior, possuirá ao todo 335 m². Localizado no térreo, o Laboratório é composto de três repartições destinadas à execução de até 14 tipos de ensaios e do tratamento dos dados obtidos.

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COMBATE A QUEIMADAS »»O Governo do Estado lançou no dia 12/07, o “Plano integrado de ações de prevenção e combate às queimadas e aos incêndios florestais em Mato Grosso para 2017” e, paralelamente, de intensificação das campanhas de fiscalização ao desmatamento ilegal. O lançamento ocorreu no Parque Estadual Massairo Okamura, base do Batalhão de Emergências Ambientais (BEA), em Cuiabá. O período proibitivo deste ano começa no sábado (15.07) e segue até 15 de setembro, podendo ser prorrogado devido às condições climáticas. Nos últimos dois anos, a proibição seguiu até outubro.


FOTOS: DIVULGAÇÃO

Sonhar é acordar-se para dentro. MÁRIO QUINTANA Estou plenamente de acordo com o filósofo que afirma ser o homem o parasita do boi. JEAN BAPTISTE ALPHONSE KARR

MÃES REFUGIADAS ACNUR - Agência da ONU para Refugiados, lança campanha de arrecadação de fundos para atender as necessidades especiais de mulheres refugiadas grávidas ou que tenham filhos. Quer ajudar? https://doar.acnur. org/acnur/maes.html. Dúvidas? E-mail ONU_refugiados@unhcr.org.

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FRASES

Frequentemente tive a ocasião de observar que, quando a beneficiência não prejudica o benfeitor, mata o beneficiado. HONORE DE BALZAC

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DIÁLOGOS CONTEMPORÂNEOS »»A convite do grupo Multiplicadores de Conhecimento, de Cuiabá, a professora doutora Dorothea Werneck, com mestrado e curso de doutorado em Boston College, USA, profere palestra gratuita com o tema Crises versos Oportunidades no auditório do TCE/MT, no dia 03/08, as 19h30, na 1ª edição do projeto Diálogos Contemporâneos. Inscrições: MERGULHO ECOLÓGICO Assembleia Legislativa de Mato Grosso aprovou a Lei nº 10.561, publicada no Diário Oficial do Estado no dia 11/07, de autoria do deputado Guilherme Maluf. Trata-se de lei que cria o Circuito Mato-Grossense de Mergulho Ecológico, visando ampliar e solidificar o turismo ecológico no Estado.

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O melhor meio para ser-se enganado é considerar-se mais esperto que os outros. FRANÇOIS DE LA ROCHEFOUCAULD A companhia de um paulista é a pior forma de solidão. NÉLSON RODRIGUES FIM DO BODE APÓS 19 ANOS, A CONFRARIA BODE DO KARUÁ ENCERRA AS SUAS ATIVIDADES CARNAVALESCAS. O BLOCO SURGIU EM 1999, SOB GENIVALTER DA SILVA GOMES E RENATO MIGUEIS OLIVARRIA FIHO, QUE JÁ ARRASTOU MAIS DE 1,5 MIL PESSOAS PELAS RUAS DE CHAPADA EMITIU A SEGUINTE NOTA À IMPRENSA: “Chega a hora de pararmos com a nossa Confraria Bode do Karuá, com tristeza e já com muita saudades de tudo aquilo que fizemos nos carnavais de Chapada dos Guimarães”.

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E N T R E V I S TA ESPECIAL

Terremotos Previstos

De nada valem as ideias sem homens que possam pô-las em prática*

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POR JOÃO CARLOS VICENTE FERREIRA FOTOS DIVULGAÇÃO

professor Aroldo Maciel fez uma descoberta em 2011, de extrema utilidade pública por antever abalos sísmicos, com certa antecedência. A pesquisa, inicialmente foi criticada no Brasil, mas ofereceu resultados altamente satisfatórios em outros países, principalmente naqueles que sofrem com terremotos. Segundo palavras de Maciel isso tudo deu-se pela “necessidade de responder inquietudes internas durante conversas com

amigos.” Foi neste ano de 2011 que ocorreu um terremoto de magnitude 8,9 no Japão, considerado o mais forte de sua história com 337 mortos e 531 desaparecidos. Nesse período, em conversa com amigos ouviu da improbabilidade de prever terremotos com antecipação. Ele achava exatamente o contrário, achava ser possível prever sim. Tomou isso como um desafio a si mesmo, passando a estudar toda bibliografia sobre esse assunto, em especial um site de Monitora-

mento de terremotos pelo mundo em tempo real. Após um ano, com ajuda de amigos e apoiadores foi aconselhado a colocar em formato de projeto ou de uma tese científica os seus conceitos, fórmulas, ideias e sugestões, levando-a às discussões e eventos científicos. Surgiram questionamentos e opositores, mas isso não desanimou Aroldo Maciel, que viu nessas negativas mais estímulos e embasamentos após os vários embates ocorridos.


lumeMatoGrosso Maciel encara tudo que está ocorrendo em sua vida nos últimos seis anos com bastante naturalidade, inclusive quando se refere à sua atuação na previsão de terremotos na atualidade, sempre afirmando que não existem modelos de previsão, e a forma que utiliza e defende ainda é a mesma utilizada pelo russo Peter Shebalin , especialista em geologia, vulcanologia, geodesia, topografia, e membro da Academia Russa de Ciências. Nesta edição de LUME MATO GROSSO, o pesquisador Aroldo Maciel relata suas experiências, êxitos e desejos sobre terremotos, aos nossos leitores. O SENHOR NASCEU QUANDO E ONDE? HÁ QUANTO TEMPO ESTÁ EM CUIABÁ E ONDE ATUA? »»Eu nasci no dia 7 de setembro de 1972, em Lorena,

São Paulo. Cidade do vale do Paraíba conhecida como a terra das palmeiras imperiais. Cheguei em Cuiabá a 22 anos e já me considero um cuiabano, onde leciono em uma universidade local, a UNIC. Tenho uma pesquisa sobre análise e estatística para tentar antecipar terremotos. Lembro sempre que deixo livre a formula para que outros possam fazer a pesquisa e um dia validar o que eu proponho hoje. Sou grato pela oportunidade de trabalhar na Universidade de Cuiabá e poder ter gerado no lugar certo aquilo que poderá ser a inspiração para outros pesquisadores. Ver o logotipo da Universidade de Cuiabá em um dos maiores eventos de Geofísica do Mundo me fez pensar que o modelo de interdisciplinaridade é isso! A UNIC não possui um curso de geofísica ou mesmo geologia, isso é verdade a mas

a realidade é que boa parte das grandes descobertas, foram geradas em corredores ou porões no decorrer da história por pessoas simples. Alem disso o que me inspira não são as paredes e sim o sorriso de cada uma das pessoas que convivo na Universidade de Cuiabá. COMO SE INICIOU NA SISMOLOGIA E QUAL DENOMINAÇÃO QUE DEU AO SEU INVENTO? »»Não sou sismologo, decidi investigar após o destrutivo terremoto do Japão, o evento teve uma magnitude de 9.3 e deixou muita destruição além dos mais de 20.000 mortos em abril de 2011, O assunto foi pauta de muitas reuniões e resenhas entre amigos, e eu por curiosidade tentei ler tudo sobre o assunto e acabei descobrindo um padrão entre os terremotos. Confesso que busquei ajuda de mui-

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tos profissionais da área e que o tempo todo me diziam ser impossível prever terremotos e mais ainda que alguém sem formação pudesse assimilar a complexidade de tudo que já foi estudado sobre a sismologia. Sem apoio da comunidade cientifica, busquei ajuda de professores em outras áreas do conhecimento e foi onde tive base para argumentar sobre o assunto e aprofundar sobre questões técnicas. Do IFMT tive ajuda do Dr. Alexandre Schumacher e Dra. Ana Cecília, UNIC, na época, estava o Prof. Julio Orrego Zavala, geólogo peruano naturalizado no Brasil. O publicitário Gregório Frigeri, me aconselhou a colocar tudo em um twitter e foi

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assim que ideia tornou-se pública, em pouco tempo o numero de acertos tinha ganhado notoriedade e os seguidores passaram de dezenas de milhares para algumas centenas de milhares. Dizer que tem um método com base em números que pode prever terremotos é uma coisa, conseguir antecipar um evento com data e magnitude sobre os 8.4 é outra. Depois de alguns feitos, consegui chamar a atenção de um dos mais brilhantes cientistas brasileiros, Dr.George Sand França. Não digo isso pela amizade que alimentei durante todos esses anos e sim pela claridade mental e humildade. Mesmo ele tendo a certeza que os terremotos não

se podem prever, ele aceitou ouvir minha teoria. Bem! O resultado foi o convite para eu expor parte da minha hipótese no AGU – fallmeeteng, encontro mundial de ciências na Califórnia, em 2012. Com o tema “Is There An Earthquake Migration Global Pattern?” Devido a minha não formação para área de proposição tive que enviar um trabalho questionando se não poderia ser possível que algo que cause os terremotos pelo mundo, estejam migrando a longas distâncias? Ainda assim hoje sigo na busca pela oportunidade de que outros cientistas entrem na discussão ou mentes com capacidade para vislumbrar essa proposta.


O SENHOR ENVIOU UMA CARTA AO PRESIDENTE DO CHILE ALERTANDO-O DE POSSIBILIDADES SÍSMICAS? »»Sim, enviei uma carta para o presidente do Chile avisando sobre o risco de um evento de 7.0 na costa de Valparaíso, muitos dirão que lá tem terremotos todos os dias, sobre os 7.0 é raro. Logo após eu ir a público e falar sobre o risco de um 7.0, as tvs do Chile se en-

cheram de geólogos e geofísicos dizendo que o evento não aconteceria, e com um atraso de 45 minutos o terremoto aconteceu. No outro dia recebi uma carta protocolada da presidência com agradecimento e os cientistas locais ficaram intrigados. COMO A SOCIEDADE CIENTÍFICA O RECEBEU A PARTIR DESSAS SUAS INTERVENÇÕES E PREVISÕES? »»Em 2012, depois da confirmação do terremoto de 7.0, em Valparaiso previsto uma semana antes, em uma TV do Chile, recebi o convite para um debate na maior televisão do Chile, a estatal Televisión nacional de Chile TVN. O problema era que a LARED – Televisión, publicou o alerta na segunda-feira sobre as probabilidades de um 7.0, na noite de domingo, e reprisou todos os dias durante toda semana, os outros canais convidavam os grandes nomes do Chile para dar entrevistas ao vivo e dizerem à população chilena, porque a previsão não deveria ocorrer, segundo a ciência. Mesmo sabendo que o Chile é um país sísmico, geógrafos, geólogos, sismologos afirmaram categoricamente que o terremoto não aconteceria, não na noite de domin-

go como eu esperava, mas as 00:15 minutos, já na madrugada de segunda, ouviu-se um barulho ensurdecedor segundo relato de alguns seguidores, e segundos depois a terra tremeu com vigor. O abalo foi sentido em várias partes do Chile e em especial em Santiago do Chile. O desapontamento estava no olhar, a cada ataque que eu recebia dos cientistas locais eu os fazia recordar que estava ali por algo que eu disse que aconteceria e aconteceu. Depois de uma semana no Chile, voltei com duas convicções: Estava mais perto de comprovar minha teoria e havia agora uma categoria de cientistas com sentimento de desprezo pela minha pessoa. Hoje, em 2017, as coisas parecem estar mais calmas, no grande terremoto de 2016, de 8.3, na escala de Richter, na cidade de La Serena, eu pude falar abertamente no dia 10 de agosto, na TV, sobre o risco de um terremoto entre os meses de setembro e outubro e a magnitude prevista. Não tive relato algum sobre alguém que negasse meu aviso. Isso foi para sorte da maioria dos que vivem naquela região, pois o terremoto ocorreu e pela primeira vez o número de vítimas não passou de 12 pessoas.

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O SENHOR SE CONSIDERA UM CIENTISTA A SERVIÇO DO BEM E DA NOVA ORDEM MUNDIAL? »»O conceito de cientistas foi abandonado pela ciência contemporânea, o conceito real é “Um cientista, em um sentido mais amplo, refere-se a qualquer pessoa que exerça uma atividade sistemática para obter conhecimento. Em um sentido mais restrito, cientista refere-se a indivíduos que usam o método científico.” WKP partindo desse pressuposto posso dizer que sim, no caso de eu não estar delirando em minha busca, essa poderia ser uma descoberta da qual estão buscando a pelo menos cem anos e não seria a primeira vez, que alguém de outra área do conhecimento propõe algo inusitado ou “fora da casinha”.

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O SENHOR PRETENDE AMPLIAR E SE APLICAR À SISMOLOGIA ENQUANTO UMA CIÊNCIA? »»Estou ciente de que isso vai levar tempo e posso nem estar vivo quando acontecer. Li sobre pessoas que fizeram propostas de vanguarda e sofreram com isso. O caso do Dr. Petter Higgs que, em

1966, escreveu sobre a partícula de Deus e o trataram como louco ou charlatão por 60 longos anos ou até criação do LHC – Grande colisor de Hadrons pela CERN - Comissão Europeia de Pesquisa Nuclear. Um experimento de bilhões de euros que confirmou a existência do bóson de higgins. Com esse fato o que eu realmente quero é que a nova geração de pesquisadores questionem tudo o que já foi escrito. Quando Higgins teve seu insight sobre o bóson não estava escrito em lugar algum, estava apenas em sua imaginação. Isso pode ter um sentido de que as maiores invenções podem estar a um vislumbre de distância, mas o ego de alguns pode tornar essa viagem longa e cara. Meu sonho é comprovar minha tese e seguir com os estudos e enquanto não comprovo minha tese das migrações sísmicas em larga distancia, sempre estou bisbilhotando outro temático sim. Isso é o que me inspira. QUAIS SÃO OS SEUS PLANOS FUTUROS? PRETENDE PERMANECER MORANDO EM CUIABÁ? EXISTEM CONVITES PARA MORAR E TRABALHAR EM OUTROS PAÍSES? »»Eu adoro morar em Cuiabá, acredito no Brasil e gostaria mesmo que essa pesquisa fosse feita no Brasil. Depois de duros debates com grandes nomes

da sismologia em países como Peru, Chile, Portugal e Califórnia decidi que existem coisas que devem ser ditas ao seu tempo então iniciei um livro, assim posso ser confidente e como o papel aceita minhas ideias sem reclamações vou escrevendo. Pretendo ficar por aqui ainda um tempo, mesmo com os convites para apresentar programas de TV eu ainda acredito que a vida simples pode ser mais longa e proveitosa do que dias e noites cheias de adrenalina e animação. Tento não me esquecer de que minha inspiração pode ter sido concebida pelas belas paisagens ou então inconscientemente eu queira retribuir a tão calorosa recepção da boa gente da nossa terra Cuiabá.

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QUAL É A DIFERENÇA DO AROLDO MACIEL ANDANDO PELAS RUAS DE CUIABÁ E DO OUTRO, PELAS RUAS DE SANTIAGO DO CHILE? »»Eu sempre penso nisso, é incrível! Sou apenas um professor e só fui entender o que é liberdade quando estive no Chile. As vezes caio no riso pela situação, eu sei que sou uma pessoa simples e no inicio dispensava seguranças, não podia sair sozinho nas ruas e nem em locais públicos pelo assedio e pelos riscos de agressão por parte de extremistas. São fotos e convites para televisões e periódicos locais, convites para escolas e eventos com celebridades locais. Tudo parece maravilhoso, mas eu conheço minha natureza. O bom é poder viver a vida simples, poder estar na praça da mandioca e rever amigos. Aprendi a gostar da cuiabania, temos um ditado que diz “santo de casa não faz milagres”.A terra aqui é firme e nossas necessidades, por aqui, são outras.

O SENHOR SE CONSIDERA UM PREDESTINADO POR TER EVITADO MAIORES TRAGÉDIAS POR CONTA DE SUAS PREVISÕES? »»Não sei se predestinado, mas é fato que alguém sem nunca ter estudado nada sobre ciências da terra, jamais poderia ter tropeçado em algo tão fantástico. A probabilidade disso é muito remota, mas não é nula. Uma coisa é certa, no mundo em que vivemos existem padrões e correlações e se a percepção desses fenômenos me coloca nessa condição, então posso aceitar o esse termo. (*) Karl Marx

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PA R A Q UA N D O VOCE FOR

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CECÍLIA KAWALL Mora em Chapada dos Guimarães, é guia de ecoturismo e de aventura, empresária, fotógrafa e escreve para Lume MT.

Ubatuba

Onde a história e a natureza se encontram

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TEXTO E FOTOS CECÍLIA KAWALL

o litoral de São Paulo, tem um lugar que eu gosto muito. É a região de Ubatuba onde passei boa parte de minha infância. Tem praias de areia branca, fina, grossa, avermelhadas, bravas, tranquilas... onde o mar vem banhar a Mata Atlântica com seus pássaros de todas as cores. É um trecho pequeno mas muito bonito e ainda bem preservado com Parques e áreas de conservação. Na cidade tem uma unidade do Projeto Tamar com tanques de tartarugas marinhas para visitação mas ainda é possível visualiza-las nadando livremente em algumas

praias mais reservadas. Vários passeios de barco levam os vistantes para as centenas de ilhas e recantos, Ilhabela ou Anchieta, onde há um antigo presídio desativado. Foi uma importante região no início da história do país por sua localização entre o porto de Santos e a cidade do Rio de Janeiro e ainda guarda esta memória nos casarões e museus. Hoje um lugar ‘imperdível’ por sua beleza sem igual. Planeje sua estadia e procure fugir dos picos do verão quando a cidade fica muito cheia e movimentada, o clima por lá é sempre convidativo.

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SAÚDE

Hipertensão

Não Tem Cura, Mas Tem Controle

Você já mediu sua pressão hoje? Não?? Então vou explicar porque deve fazer isso hoje ou no máximo até amanhã.

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POR ANDRÉIA KRUGER FOTOS DIVULGAÇÃO

m em cada quatro brasileiros adultos tem hipertensão, ou seja, quase 30 milhões de pessoas. Pasmem, a maioria não sabe que é hipertenso. A pergunta seguinte seria, por que não tratam??? Infelizmente a maior parte das pessoas que têm hipertensão não apresenta qualquer sintoma ou quando os possuem são leves e passam desapercebidos. Daí o apelido macabro dessa doença, assassi-

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na silenciosa. Muitos só saberão que são hipertensos quando tiverem um AVC (acidente vascular cerebral), vulgo derrame, ou quando sofrerem um infarto. Os motivos de termos tantos hipertensos no Brasil estão ligados aos hábitos de vida dos brasileiros. Hoje mais da metade da população está acima do peso, esse é um dos fatores preponderantes no aumento dos níveis pressóricos. Outro fator é o consumo exagerado de sódio, muito presente nos pro-


dutos embutidos como salames, presuntos, mortadelas, salsichas e outros. Um dado interessante publicado recentemente revela que nós brasileiros consumimos 12 gramas de sal por dia, mais de duas vezes o recomendado para uma pessoa. Estamos salgando demais nossos alimentos. O sedentarismo também é um dos fatores que colaboram para se ter os níveis pressóricos elevados. A modernidade com toda sua tecnologia acabou levando o brasileiro ao comodismo pois hoje tudo está ao simples toque dos dedos sobre uma tela. A atividade física regular liberam hormônios que regulam naturalmente a pressão arterial, mas uma vez tendo uma vida sedentária esse mecanismo natural fica muito prejudicado. As bebidas alcoólicas em excesso também são responsáveis pelo aumento da pressão arterial . Outro mau habito que colabora para hipertensão é o tabagismo. Temos ainda um grande número de fumantes no Brasil e essas pessoas a cada cigarro que acendem é como se estivessem acendendo uma bomba que liga a boca ao coração. Sabemos que uma pessoa ao fumar deixa seus níveis pressóricos elevados por 10 a 15minutos. Agora, imagine alguém que fume entre 10 a 20 cigarros por dia.

As consequências da hipertensão quando não diagnosticada e tratada são terríveis , seja pelo risco de infarto , AVC (Acidente Vascular Cerebral) ou insuficiência renal crônica. Em resumo, a hipertensão atinge os principais órgãos do nosso corpo cérebro, coração e rins. Hoje temos milhares de pessoas fazendo hemodiálise no Brasil, a maioria delas a causa foi o diagnóstico tardio da hipertensão ou a negligência para com a própria doença. Sabemos que mesmo as pessoas com diagnóstico da doença não fazem uso regular da medicação e isso as colocam no mesmo risco daquelas que não estão medicadas. Portanto, hipertensão não tem cura, mas tem controle. A partir do diagnóstico feito, as mudanças de hábitos de vida como atividades físicas regulares, baixa ingesta de sal e bebida alcoólica, perda de peso aliados à medicação, fazem os níveis pressóricos ficarem dentro da normalidade. Então, quer saber se sua pressão é normal ou não??? Vá a qualquer unidade de saúde ou mesmo em uma farmácia e meça a sua. Certamente muitos de vocês que estão lendo esse texto agora é hipertenso e não sabem. Seja prudente e cuide da sua saúde antes que a doença tome conta de você.

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ANDREIA KRUGER É graduada em Direito, Especialista em Direito agroambiental, Engenheira de Alimentos, estudante de Nutrição e Articulista

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REC PON R TOAMGIEAM M E IEOS PAEMCBI A I ELN T E


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HENRIQUE SANTIAN O fotógrafo documentarista traz em suas obras um pouco daquilo por onde passa, histórias contadas em imagens, e sentimentos que nos fazem enxergar o mundo a nossa volta e ver que nosso espaço se resume na amplidão

Lixo No Lugar Do Lixo? Em Confresa, cidade do nordeste de Mato Grosso, foi utilizada, em projeto social, a arte fotográfica como forma de combate às práticas danosas advindas do lixo urbano

U

m dos principais problemas que assolam a sociedade contemporânea mato-grossense é a acumulação do lixo em locais inapropriados, a exemplo dos lixões a céu aberto, que pululam em todo território, e além de serem muito prejudiciais a saúde, também contaminam a visão e deixam mau cheiro, principalmente quando localizam-se próximos aos centros urbanos, incomodando a vida das pessoas. Por parte da saúde, o lixo descartado em lugares impróprios lança na atmosfera gases tóxicos e também, por meio do chorume, líquido que é resultado do acúmulo de resíduos orgâni-

POR HENRIQUE SANTIAN

cos que, em contato com os lençóis freáticos, contaminam a água que muitas vezes alimentam nascentes de rios e lagos, transformando-as em impróprias para o consumo. Confresa tem a economia baseada na pecuária leiteira, de corte e agricultura de subsistência. Conta com aproximadamente 38 mil habitantes e possui o maior Assentamento de reforma agrária do país, com 6 mil famílias distribuídas em 15 unidades. Ali, o destino dado ao lixo não difere muito do tratamento dado às outras cidades, em todos os seus quadrantes. Preocupados com essa situação a prefeitura municipal de Confresa mobilizou-se para mini-

mizar impactos ambientais. Com apoio do CRAS - Centro de Referência da Assistência Social, unidade estatal responsável pela organização e oferta dos serviços socioassisteciais da Proteção Social Básica do SUAS - Sistema Único de Assistência Social nas áreas de vulnerabilidade e risco social, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social e Trabalho, realizaram durante dois dias, no mês de junho de 2017, a Oficina de Fotografia com crianças e adolescentes do SCFV - Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculo, sob coordenação do fotógrafo profissional Henrique Santian, na semana do Meio Ambiente da Educação Ambiental.

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R E P O RTAG E M ESPECIAL

Nessa Oficina o público alvo eram crianças e adolescentes oriundas das famílias que participam de programas e projetos da Agricultura Familiar Regional, em assentamentos rurais. Esse projeto visou trabalhar e conscientizar os jovens sobre as questões ambientais do município de Confresa. O trabalho orientado por Santian atuou presencialmente em duas vertentes, o “lixo urbano”, com visitas ao lixão da cidade e a “água”, representado pelo Rio Cacau, curso d água que abastece a cidade. Fazia parte do projeto apre-

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sentar às crianças e adolescentes os aterros sanitários e o tratamento de água da região, como forma de trabalhar a sensibilização ao tema e estimular questionamentos sobre os mesmos. Ao final, a proposta da Oficina foi trabalhar a fotografia como ferramenta e veículo comunicativo, visando desenvolver a percepção das crianças e adolescentes com a proposta de trabalho e outras realidades de seu dia-a-dia. Além de, mostrar como a fotografia pode ser importante não só na educação ambiental, mas como

instrumento que nos possibilita a enxergar a realidade e nossas ações sobre o meio ambiente. Após a sensibilização foi realizada uma discussão sobre as fotos, promovendo uma reflexão sobre a realidade vivenciada. Cada criança e adolescente teve experiência de fotografar e enxergar em sua ótica a problemática do lixo e da água em Confresa. Foi realizada uma exposição dos resultados da Oficina, para as questões relacionadas ao tratamento de lixo seja visto e refletido por todos da cidade.


PERCEPÇÕES E DEPOIMENTOS O Rio Cacau, que é responsável por boa parte do abastecimento de água em Confresa sofre com a poluição, e com a seca, que ameaça a qualidade da água e preocupa toda população que sofre com a falta dela. O lixão da cidade tem se tornado um problema que afeta a cidade. Todo lixo é jogado e misturado sem que ocorra a sua seleção ou reciclagem. Além disto, o problema maior tem sido as queimadas no lixão. Quando isso ocorre, grande parte dessa fumaça afe-

ta a cidade através da força dos ventos que a carregam. Trata-se de fumaça altamente tóxica para a cidade, afetando também a vida de quem mora no lixão e das chácaras ao redor. Em visita ao lixão da cidade a convite da organização do projeto, na parte da manhã, o garoto Dayron Arrais Lima, de 6 anos e estudante da 1ª série da Escola Teotônio Carlos da Cunha Neto disse o seguinte de suas impressões sobre o lugar: “Eu nunca vi tanto lixo assim, na cidade em nossa casa o pouco de lixo que produzimos

se mistura ao lixo de outras casas formando esse grande lixão, aqui eu vi de tudo desde resto de comida podre, roupa velha e mau cheiro, aqui é muito feio eu nunca tinha visto um lixão tão grande, quando a gente vê isso tudo podemos perceber que tudo vem da cidade, ninguém separa o lixo na cidade aqui fica tudo junto e queimado, eu quero mostrar para as pessoas como é aqui.” Ao ser questionado sobre qual poderia ser a solução para equacionar problemas do lixão respondeu: “Limpar e separar quando for jogar.”

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R E P O RTAG E M ESPECIAL


lumeMatoGrosso Nessa parte presencial da Oficina ministrada pelo fotógrafo Henrique Santian, outros alunos foram convidados para as mesmas trilhas. O jovem Josenilson Araujo, de 15 anos, aluno na 9ª série da Escola Teotônio Carlos da Cunha Neto, assim se expressou sobre sua visita ao lixão: “Aprendemos muito vindo ao lixão, sabendo que ao separar o lixo em casa chegando aqui tudo é misturado causando uma desordem e prejudicando o meio ambiente e a vida de quem vive dos reciclados, aqui refletimos sobre nossas atitudes sobre o quanto produzimos de lixo e tudo que ele pode causar de ruim ao meio ambiente e nossas vidas, quando estamos na cidade não nos damos conta da quantidade de lixo que produzimos, ao chegar aqui ver montanhas de lixo de tudo que é tipo misturado entre animais e plantas, isso nos faz perceber que pra

melhorar isso tudo precisamos ter consciência evitando o auto consumo de embalagens, causando menos impacto ao meio ambiente muitas coisas aqui no lixão virão fumaça pois as pessoas vem aqui jogar e ainda tacão fogo causando uma fumaça tóxica muito ruim essa fumaça chega até a cidade que fica próxima do lixão e isso é muito ruim para nossa saúde e de quem mora no lixão também, precisamos cuidar mais das nossas atitudes e encontrar problemas para essa situação.” A exemplo de Dayron Arrais Lima, em depoimento anterior, Josenilson respondeu à pergunta sobre qual seria a solução para o lixo produzido em Confresa: “Organizando e separando e precisamos cobrar da prefeitura mais cuidado com o lixão, como um aterro sanitário e organização são um direito e compromisso de todos cuidarem disso.”

Adriely Eduarda Lima, de 14 anos, aluna da 6ª série da Escola Teotônio Carlos da Cunha Neto, que também visitou o lixão, e não diferente dos demais, se espantou com a quantidade de lixo no local e de seus possíveis danos causados a natureza, diz o seguinte: “No lixão o lixo é jogado de qualquer maneira acumulando sem cuidados como estes pneus e latões de tinta que podem ser criadores da dengue, podemos ver uma realidade diferente aqui os urubus comendo lixo e muitos animais como gatos e outras aves, vi muitas pessoas separando lixos pegando os reciclados para vender esse tipo de lixo sustenta muitas famílias aqui na região, e ainda vi gente se alimentando de comida do lixo assim como os urubus, isso me preocupa muito sobre a saúde tem muita fumaça no lixão, tem famílias morando no lixão com bebezi-

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R E P O RTAG E M ESPECIAL

nho pequeno, muito lixo do esgoto é misturado com outros lixos no tempo da chuva aquilo tudo fica no solo e fica ainda mais perigoso pessoas se contaminarem com o lixo, precisamos cuidar mais do nosso lixo e ajudar quem precisa dele separado.” A sua resposta para a pergunta “Qual a solução para o lixo?” foi semelhante aos seus colegas, da mesma escola: “Reciclando e separando o lixo, poderíamos melhorar o serviço de coletas.” Ainda dentro do projeto da Oficina, foi deixada a parte da tarde dos dois dias de trabalho com os jovens estudantes, para incursões às águas do Rio Cacau, também bastante prejudicado por receber boa parte do lixo produzido na cidade. O jovem Jeferson Pereira da Cruz, de 15 anos, aluno da Escola 29 de Julho, ao percorrer as margens do assoreado Cacau profe-

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riu a seguinte frase sobre o que presenciou em sua visita ao rio: “Além do lixo que encontramos no Rio Cacau, percebemos que nesta época da seca a água está muito baixa ameaçando ainda mais a população que bebe desta água, quando o rio está assim baixo nos preocupa ainda mais ver muito lixo as margens pescadores e pessoas que vem aqui tomar banho no cacau, deixam restos de lixo e isso nos preocupa muito.” A situação caótica do rio que abastece a cidade foi vivenciada por mais alunos, dos que emitiram pareceres ainda temos dois depoimentos, o de Wesley Resende da Silva, de 12 anos, que estuda na 7ª série da Escola Teotônio Carlos da Cunha Neto, que disse: “Nesta foto podemos ver os pescadores e as pessoa tomando banho no rio, muitas pessoas vem aqui por lazer e acabam deixando res-

tos de lixos aqui, encontramos muitos e diversos tipo de lixo no rio e em sua margem, precisamos perceber que isso vai poluir nossa água.” E, ainda, Mariana Lima de Souza, de 15 anos, aluna da Escola Vida Esperança, que encerrou com a seguinte fala: “Muito lixo foi encontrado no rio cacau, água que bebemos na cidade esta ameaçada por tanto lixo, além de sofrermos com a época da seca muitas pessoas ficam sem água na cidade isso é muito preocupante.” Ações semelhantes somente contribuem para tornar jovens e crianças adultos bem informados e cientes de seus deveres enquanto cidadãos de bem. Esse projeto é merecedor de créditos por seus objetivos finais e, especialmente, pelo alcance social a que se propôs. No entanto, é importante que seja sempre uma operação continuada.


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SOCIAL

FOTO NAJEDA REDON

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RAFAEL LIRA É professor, tradutor de crioulo, ex-missionário religioso e viveu, por quase um ano, no Haiti

Os Senhores De Engenho Do Século XXI A

POR RAFAEL A. LIRA

o voltarmos no tempo, mais especificamente ao período da colonização do Brasil na primeira metade do século XVI, podemos nos lembrar dos chamados engenhos de açúcares, nos quais mulheres e homens negros africanos eram trazidos de suas colônias na África para serem utilizados como mão de obra escravizada. Sujeitos a todo tipo de atrocidades e abusos, privados de liberdade, sentiam literalmente na pele a dor da crueldade desumana dos colonizadores brancos.

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SOCIAL Em pleno século XXI, mais de 500 anos após a colonização, presenciamos ainda hoje atitudes que nos remetem àquele período tão obscuro e triste do nosso passado. Os senhores de engenho desta era pós-moderna não se vestem nem se portam mais como os de outrora, nem mais andam armados com seus chicotes para os açoites. Sua postura escravocrata não é tão explícita quanto à dos colonizadores europeus. Porém, o sentimento de domínio sobre o outro permanece praticamente o mesmo, apenas com nuances e manifestações diferenciadas. Com a chegada volumosa de caribenhos negros e africanos em território brasileiro, em números mais expressivos de haitianos e senegaleses, a partir de 2012, viu-se um movimento nítido de contratações em massa dessa mão de obra nova e barata, por parte de inúmeras empresas. Frigoríficos, indústrias de bebidas ou alimentos, construtoras, multinacionais em

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geral, passaram a compor seu quadro funcional com muitos destes novos moradores. Esses novos grupos serviriam como um prato cheio para os senhores de engenho do século XXI. Em uma ocasião específica, eu estava procurando emprego com um imigrante haitiano em uma das empreiteiras responsáveis pela reforma de um shopping aqui na capital do Mato Grosso, Cuiabá. Este fato ocorreu no primeiro semestre de 2016, estávamos aguardando uma pessoa que viria nos dar uma resposta e, enquanto ali ficamos parados, comecei a observar dois haitianos trabalhando e dois outros senhores que os observavam e conversavam entre si, acredito que um deveria ser o encarregado e o outro algum supervisor da empresa. Recordo-me de ter ouvido, em dado momento, o possível encarregado falar ao outro senhor que aquele ali (indicando um dos trabalhadores haitianos) era bom para serviço porque tinha agilidade e força, já o se-

gundo empregado era muito lento e não prestava para aquele ofício. Em seguida, percebi que os demais empregados estavam indo embora, afinal havia chegado o horário para partir, e aqueles dois rapazes, nitidamente cansados da rotina do dia, estavam querendo também ir pra sua casa. Porém, de forma ríspida foram impedidos pelo suposto encarregado, que os alegou que eles receberiam por aquelas horas a mais, não lhes dando chance para ir. Recentemente um fato causou grande repercussão nas redes sociais e na imprensa digital, uma haitiana foi demitida de uma padaria de renome da capital mato-grossense após ter uma matéria publicada para um site que narrava, dentre outras coisas, o seu sonho de ser uma modelo no Brasil. A moça já vinha sofrendo inúmeros abusos morais dentro da empresa durante os sete meses em que ali trabalhou, na verdade não apenas ela como muitos outros funcionários haitianos e brasileiros


tir se realmente a escravização iniciada no Brasil no século XVI chegou ao fim com a abolição. Hoje, vejo que ela, na verdade, tomou proporções maiores, não atinge apenas os negros, apesar de serem estes o que mais sentem na pele a exploração devido ao passado doloroso, mas toda uma classe trabalhadora. Os novos senhores de engenho camuflam suas ações escravagistas por trás de promoções ou chantagens, além de fazerem a política da boa vizinhança para não sofrerem punições por parte dos órgãos fiscalizadores ou da própria clientela que, por vezes, não percebe o que se passa “nos bastidores”. Por fim, percebo que os imigrantes são “as presas” mais fáceis para os senhores de engenho atuais devido a sua posição mais vulnerável, e pela necessidade eminente de um trabalho para se sustentar e ainda ajudar os familiares que ficaram lá no país de onde saíram. A vontade de trabalhar acaba se sobressaindo ao cuidado com as condições em que se vai trabalhar. Por anseio de conquistar o que se veio buscar, sujeitam-se a patrões carrascos e tratamentos escravocratas. Assim, sentem na pele a dor que seus antepassados sentiram quando aqui chegaram. Em circunstâncias diferentes, mas com o mesmo requinte de desumanidade e ganância por parte dos atuais “colonizadores”.

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que por ali passaram ou ali ainda permanecem. Depois da sua demissão, alegada ter sido inicialmente por justa causa, mas revertida após intervenção jurídica, a imigrante caribenha resolveu denunciar as injúrias e abusos que sofreu ao longo do tempo que por ali ficou. Dentre as atrocidades narradas por Najeda Redon, haitiana que fora demitida na padaria, está o fato de que os funcionários não podem ir ao banheiro ou beber água quando há necessidade, somente o fazem sob a autorização do supervisor responsável que nem sempre concede a permissão. Em um dos comentários que li exposto abaixo da matéria sobre este caso, publicada na página de uma rede social de um jornal eletrônico, uma brasileira descrevia que já havia trabalhado na tal padaria e se lembra de uma ocasião em que o proprietário veio tomar um café e acabou rejeitando o que lhe foi servido porque havia gota do produto no pires que o serviram. Em outro relato, um ex-funcionário afirma que a comida que servem aos empregados é a sobra dos alimentos do restaurante, inclusive as frutas que ali ficam dias expostas nas prateleiras, já em fase de putrefação. Quando lemos depoimentos de empregados ou ex-empregados como os narrados anteriormente, ou ouvimos dos próprios o que sofreram e sofrem em certas empresas, podemos refle-

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VALENTIM FÉLIX Homem trans e comunicador social

Os Desafios Enfrentados Por Quem Não Se Encaixa Nos Padrões

Além do próprio conflito corporal e psicológico, as pessoas trans e travestis no Brasil ainda se depararam com preconceito que muitas vezes já começam na infância POR VALENTIM FÉLIX FOTOS DISTRIBUIÇÃO

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SOCIAL

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ão ter o nome social respeitado na hora da chamada. Não poder beber água o dia todo por medo de ir ao banheiro. Não reconhecer seu próprio corpo nas aulas de biologia. Não saber em que time ficar nas aulas de educação física. Ser excluído na hora do recreio porque ninguém quer ser seu amigo. Aguentar piadas dos colegas de sala e quando não dos próprios professores. Que atire a primeira pedra quem tem certeza que aguentaria viver dessa forma por muito tempo. Segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais - ANTRA, essa é a realidade das pessoas trans e travestis durante o período escolar no Brasil. Isso os torna o grupo social brasileiro mais sujeito à evasão escolar, com índices chegando

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a 73%. Essa série de atitudes discriminatórias que os levam para longe dos muros escolares faz com que boa parte desta população não tenha a educação básica exigida. Tudo isso somado a mais transfobia sofrida na hora de procurar um emprego leva cerca de 90% da população trans a recorrer à prostituição a fim de conseguir se sustentar. Não que viver de prostituição seja algo ruim, porém é importante problematizar porque essas pessoas não estão ocupando também outros espaços. Ser trans ou travesti diz respeito à identidade de gênero, ou seja, com qual gênero a pessoa vai se identificar. O que atualmente é muito confundido com orientação sexual, que na verdade é por quem essa pessoa vai se sentir atraída. Se você se identifica com o gênero que

lhe foi atribuído ao nascimento, então você é uma pessoa cisgênero ou simplesmente cis. Se não se identifica, então você é uma pessoa transgênero ou simplesmente trans. Partindo deste pressuposto é importante dizer que não é toda pessoa trans que vai se relacionar com o gênero oposto, afinal identidade de gênero e orientação sexual são duas coisas diferentes. Não entendeu? Então vamos lá. Imagine uma pessoa que ao nascer foi designada ao gênero masculino. Porém, ao crescer essa pessoa não se enxergou enquanto homem, como foi imposto a ela. Essa pessoa será então uma mulher trans ou uma travesti. Sendo uma mulher e se atraindo afetiva ou sexualmente por um homem, então ela será hetero. Correto? Pois se sabe que mulher que se atrai por homem


lumeMatoGrosso é uma mulher hetero. Entretanto, existem mulheres que não se atraem por homens ou que se atraem por homens e mulheres, essas mulheres são chamadas de lésbicas ou bissexuais. E assim como acontece entre as pessoas cisgêneros, as pessoas transgêneros também tem suas orientações sexuais. Quando uma pessoa trans ou travesti procura um emprego o primeiro desafio já se dá na hora da entre-

FOTO MÁRIO FRIEDLANDER

ga do currículo. Sem retificação do nome feita de forma rápida, o processo leva anos na justiça e isso faz com que muitas pessoas trans e travestis tenham que passar por constrangimentos diários sendo tratadas de forma inadequadas ao seu gênero. Isso sem mencionar outros tipos de violências sofridas no mercado de trabalho. No Brasil ainda não existe nenhuma lei referente à identidade de gênero. O projeto de lei de identidade de gênero “João W. Nery”, dos deputados federal Jean Wyllys e Érika Kokay, ainda tramita. Essa lei prevê que pessoas trans e travestis possam ir ao cartório e retificar seu prenome e gênero sem tanta burocracia como é atualmente. Até o dado momen-

to só pode-se contar com o decreto federal que dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional (Decreto Nº 8.727, de 28 de Abril de 2016). A luta trans brasileira encontra tantos desafios que ainda se está buscando direito a ter direitos. Muitas portas são fechadas quando a palavra trans entra na conversa. Enquanto ficarmos de braços cruzados sem entender que essas pessoas também são cidadãos e merecem dignidade e respeito, muita crueldade ainda vai acontecer. E você, vai apenas ler tudo isto e fingir que nada está acontecendo?

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MEMÓRIA

Chefe Da Sabinada Em Jacobina POR JOÃO CARLOS VICENTE FERREIRA FOTOS DIVULGAÇÃO

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o ano de 1844, chegou a Mato Grosso o médico baiano Sabino da Rocha Vieira, para cumprir pena no Forte Príncipe da Beira, naquela época ainda um dos baluartes da defesa do Império. Esse médico fora o chefe da famosa Sabinada, movimento revolucionário baiano que pretendeu implantar uma República no Brasil. A Sabinada começou com a revolta da guarnição do Forte de São Pedro, em 7 de novembro de 1837. Aos revoltosos foram dadas as alcunhas de sabinos ou raposas. Em pouco tempo, a revolta contabilizou apoio de significativa parcela da cidade de Salvador e mais ainda de Feira de Santana e da Ilha de Itaparica. Com apoio da massa, foi proclamada a Independência e criada a República Bahiense. No entanto, a revolta não era exatamente contra o regime imperial, mas sim contra a forma política praticada pela Regência sob Feijó, admitindo a reintegração baiana após a maioridade de D. Pedro II. A revolta teve duração de quatro meses, com saldo de mais de 1.500 mortos e milhares de feridos. Líderes foram presos e o principal deles, o médico Sabino Vieira, foi degredado, inicialmente para Goiás e, posteriormente, para Mato Grosso. Veio inicialmente, para Cuiabá, aos 16 de outubro, seguindo depois para Vila Bela, aos 5 de dezembro de 1844, onde permaneceu certo tempo aguardando seu pedido de indulto. Nesse ínterim, passou a clinicar e atender consultas de pessoas doentes, certamente um bálsamo para os vilabelenses, que naquele período se encontravam relegados a sua própria sorte. O médico e líder revolucionário Dr. Sabino ficou sabendo que seu indulto poderia não ocorrer e, pior, pretendiam le-

vá-lo, a ferros, para cumprir sua pena no forte Príncipe da Beira. Por conta dessa notícia, se pôs em fuga, em rota oposta a sua possível futura prisão. Descoberto, acabou sendo preso no Registro do Jauru, hoje cidade de Porto Esperidião, e foi levado para a cidade de Poconé, onde foi liberado da prisão por um habeas corpus, oferecido por um juiz local. Preocupado com seu futuro e uma possível nova prisão, fugiu em direção à cidade de Cáceres, indo parar na fazenda Jacobina, uma das mais antigas e prósperas propriedades de Mato Grosso no período provincial. O médico foi acolhido na fazenda pelo major João Carlos Pereira Leite, dono da propriedade e filho de tradicional família mato-grossense do município de Cáceres. O médico, Dr. Sabino, ali permaneceu até a morte, sob a proteção do major João Carlos Pereira Leite, de quem se tornara amigo, exercendo a sua profissão aos quantos precisassem. Faleceu a 25 de dezembro de 1846, sendo sepultado dentro da capela da fazenda, sendo seu corpo trasladado para a Bahia décadas depois, devido à importância que seus atos e atividades tiveram para a história do país. Por ter angariado amizade, respeito e simpatia de muita gente, mas principalmente do major João Carlos Pereira Leite, seu túmulo foi recoberto com uma tábua de jacarandá, de onde se lia o seguinte: TRIBUTO AO SABER E À AMIZADE Aqui dorme o sono dos mortos o Dr. F. Sabino da R. Vieira Nascido na província da Bahia, faleceu no dia 25 de dezembro de 1846 Deixando após a sua morte saudosas recordações

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C U LT U R A

A Arte E O Artesanato Deus seria um artista ou um artesão? Qual composição musical pode ser chamada de artesanato ou arte? Qual trabalho em geral deve ser denominada arte e qual artesanato?

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POR ROSÁRIO CASALENUOVO FOTO DIVULGAÇÃO

omo esta a arte no Brasil? Um país de luta para sobreviver, ser artista é meio que padecer. Mas po-

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rém no entretanto, temos tantos artistas que são milionários. Mas como são a arte deles? Uma dica para quem quer entrar para o

circulo destes que ganham dinheiro com a arte. Seja artesão e não artista. O artista tende a apenas fazer a arte e quanto me-


a diferença? A arte é única e o artesanato é repetição. Mas o artesanato um dia foi arte. Uma única vez. Na segunda ele virou produção e deixou de ser criação. O artista sente e se expressa, o artesão se adestra e aperfeiçoa. Nada contra, tudo a favor. Mas temos musica para a alma e musicas para o corpo. As da alma são para serem sentidas e entendidas as do corpo curtidas, para animar as festas e não para serem ouvidas. Agora, Deus é então um artesão ou artista? Tenho muita segurança que todos os que crêem que existe um Grande Arquiteto no Universo, ou que seja Allah, ou Deus mesmo, dirão que é Artista e não artesão. Mas porque o homem tenta ser igual ao outro? Pior, vê como inimigo aquele que pensa diferente., ou que tem uma religião que não é a dele. Até mesmo o partido político, sexo, cor, cabelo, roupa., etc. “Nós queremos que todos sejam iguais a gente”. Então Deus é um Artesão. Faz em repetição, tudo igual. Por isto o Japão é bem evoluído , talvez por que Deus fez por ultimo e aprimorou a semelhança. Todos quase iguais. Desculpe a brincadeira, pois são um dos que mais respeitam a individualidade. Ao meu ver, a maior riqueza da humanidade são as diferenças entre as pessoas. A nossa evolução é maior na miscigenação das raças, etnias, culturas, genéticas, ou seja, quanto mais desigual me-

lhor. Mas para isto temos que permitir , tolerar, ser grato, admirar quem é oposto. O habito mais destruidor do ser humano é a comparação entre si. Da comparação vem a inveja, a formação do ego, a baixa auto-estima ou a hiperauto-estima. Nenhum ser pode ser comparado com o outro. O anjo cupido prefere flechar os corações dos opostos, que acabam se amando e casando. Mas depois tendem a brigar e até separar. (Nem todos.) E em um novo casamento se encantam pelo mesmo tipo. O oposto. RS . É assim que Deus pode preferir, pois nas diferenças evoluímos,temos o dom de sermos perfectíveis ou seja poderemos um dia ser perfeitos. Melhor nem esperar este dia, é prazeroso é estar em crescimento a sempre aprendendo e assim teremos em cada um de nós um universo incrível. Quanto a música arte (única) deverá ser mais valorizada do que a música artesanato (todas iguais). Teremos um dia todos humanos, um ser diferente, do jeito dele, com o cabelo dele , com a roupa que combina com seu tipo de corpo, idade. Todos terão o seu lugar para ocupar e navegar em um mar azul. O sexo, não se quererá saber a opção sexual, sexo será para 4 paredes , assim o amor é sentido pela alma e não pelo corpo e na rua, vê-se apenas pessoas necessárias e fundamentais para o universo e nada mais. Assim Deus se sentirá um Artista.

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lhor e mais inovador, menos compreendido e isolado, pode nem ser reconhecido em vida, como Van Gogh. A arte vem da alma, vem do céu, vem de Deus (para aqueles que acreditam Nele), vem da inspiração, da expressão. A arte é inovadora, é única, é incomparável. Mas também é de difícil assimilação e compreensão. Quanto mais diferenciada e inovadora a arte, teremos menos admiradores que a compreenderão. A arte é solitária, quanto mais diferenciada e grandiosa, mais isolada fica. Uma musica, dificilmente será facilmente digerida se for arte e por isto o compositor fica excluído do montante. Junta-se aos passarinhos, que cantam, cantam e cantam na sua janela e se retiram sem esperar aplausos. As melhores musicas estão no lado B do disco de vinil. Agora que é CD que é um lado só, elas devem ficar escondidas entre as musicas que são feitas sem alguma inovação para serem aceitas pelo povão e vender a obra. Mas aí, as composições para enricar o artista ou melhor o artesão, não pode ser tipo, “Chovendo na Roseira” do Tom Jobim, nem “Trem Caipira” do Vila Lobos, muito menos “Passarinhadeira” do Guinga. Ela deve ser igual a todas que já foram feitas em série. Todas iguaiszinhas, idênticas. Então isto é artesanato e o artista um artesão. Viram

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COTIDIANO

“Amor E Sexo” Vida Sexual Na Terceira Idade POR JAIME DE SOUZA SILVA FOTOS REPRODUÇÃO

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COTIDIANO

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envelhecimento faz parte da condição da vida dos seres humanos e, por sua vez, a sexualidade é parte indissociável desse ciclo. Na velhice, o desejo sexual continuará existindo e a atividade sexual poderá ser constante, porém, com suas peculiaridades. A chamada terceira idade engloba a população que mais cresce no mundo devido, principalmente, aos avanços da medicina, melhores condições sanitárias, queda do índice de natalidade. Aliada a todas essas condicionantes, a melhora da qualidade de vida das pessoas. O aumento da perspectiva de vida desse segmento populacional tem atraído à atenção de profissionais especializados de diferentes campos do conhecimento como, por exemplo, a Medicina, a Farmacologia, a Psicologia, e as Ciências Sociais e outras com a finalidade de conhecer melhor o desenvolvimento e as potencialidades dessa fase da vida, consequentemente incluída a sexualidade na velhice. Sexualidade é construção social. Dessa maneira, pode-se afirmar que conceitos e conteúdos sobre sexualidade são múltiplos e dinâmicos, ou seja, construídos ao longo do tempo pela sociedade. Logo, os valores, crenças e atitudes re-

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lacionados a essa dimensão não são estanques e definitivos, passando por transformações ao longo das gerações. Nessa perspectiva, a sexualidade deve ser vista como dinâmica e processual. As mudanças sociais na atualidade acham-se alavancadas principalmente pela tecnologia e, nem por isso, deixam de manifestar um choque, um estranhamento entre o velho e novo, causando culpa e angústia nas pessoas. Isso porque a concepção de sexo ainda está mergulhada em uma cultura que interpreta a sexualidade ligada ao corpo e a reprodução. Tais concepções foram influenciadas pela igreja, ligada a moral religiosa judaico-cristã e mais recentemente pela medicina. Assim, o discurso religioso sobre a utilização do corpo, as atitudes, e comportamentos sexuais foram substituídos pelo discurso da ciência. Nesse sentido, o corpo físico é atravessado por elementos sócio-históricos e culturais e, desse modo, a sexualidade se faz presente em todas as sociedades e esta define o que é proibido ou permitido, adequado e inadequado, normal ou não, ou seja, pelas normas e preceitos morais vigentes. Os conceitos do que é ser idoso e de sexualidade são construções sociais. Es-


expressão ou do desejo sexual. Fingir que a sexualidade não existe ou que acabou, pois a função de procriação está concluída, pode gerar menosprezo a atividade sexual, e, por conseguinte, a negação de um importante aspecto da dimensão humana. “ Amor & Sexo” é um programa semanal de televisão, transmitido pela rede Globo e tem como temas principais sexualidade e relacionamento, apresentado pela atriz e modelo Fernanda Lima, no ar desde 2009, os assuntos têm sido abordados em uma linguagem clara e objetiva, principalmente voltada ao público jovem e de forma esporádica tem falado sobre sexualidade na terceira idade, mesmo assim, essas discussões tem contribuído socialmente para reflexões sobre a sexualidade do idosos. Ao meu ver, o programa deveria abusar mais vezes da temática. O ideal seria que a sexualidade do idoso fosse encarada com naturalidade, pois apaixonar-se e envolver-se afetivamente, ou até mesmo desejar a felicidade, não tem idade. A intimidade, aconchego, afeto, carinho e amor possibilitam ao idoso a viver melhor e com qualidade de vida. Assim, afirma Friedrich Nietzsche: “Sem prazer não há vida; a luta pelo prazer é luta pela vida”.

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ses conceitos imputam marcas corporais e lugares sociais a serem ocupados por essas pessoas, assim como comportamentos previamente esperados dos idosos. A díade envelhecimento-sexualidade é marcada por mitos e tabus e, ao mesmo tempo, traz de maneira equivocada no imaginário social do senso comum que a sexualidade na velhice é exclusivamente representada pelas disfunções sexuais e baixa frequência da atividade sexual. Ainda que haja outros estereótipos, no entanto, o mais comum é “dessexualização” do idoso, devido à ideia de que sexo está vinculado à procriação. Daí a tendência de negar a sexualidade nessa fase da vida. A sexualidade centrada no coito e associada à reprodução distancia o idoso do seu próprio corpo e, consequentemente, despreza-se outras formas de contato físico e de obtenção de prazer. Por sua vez, acrescenta-se sentimento de culpa e de vergonha por experimentarem sensações que socialmente são exclusivas das pessoas jovens. Dessa maneira, as crenças, os valores e tabus influenciam pensamentos, práticas e comportamentos das pessoas na terceira idade. As mudanças das condições fisiológicas advindas da idade e/ou dos problemas delas decorrentes, não significam o fim da

JAIME DE SOUSA SILVA Psicólogo/Especialista em Psicologia e Sexualidade

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MEMÓRIA SOCIAL

A Homofobia Nazista N POR YAN CARLOS NOGUEIRA FOTOS REPRODUÇÃO

o dia 01 de setembro de 1939, Hitler decide usar aquela que seria uma das mais famosas táticas de guerra da história, a Blitzkrieg. Seu alvo? A Polonia. O movimento tinha seu teor no ataque surpresa e era constituído por 1 milhão e 500 mil soldados, 2 mil e

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500 tanques e um pouco mais de 2 mil aviões (a Luftwaffe). Os poloneses não puderam reagir. Era o início da II Guerra Mundial. Depois do ataque brutal aos poloneses, Inglaterra e França declararam guerra contra Alemanha. No entanto, os tristes relatos que temos de pessoas persegui-

das pelos Nazistas, se remontam a um pouco antes da declaração. Hitler já cometia atos de crueldade contra judeus e grupos que ele considerava inferiores ou “defeituosos”. No presente texto vamos falar especificamente dos homossexuais e a incessante luta nazista em persegui-los.


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MEMÓRIA SOCIAL

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A política de “Libertação pelo Trabalho”, que nada mais era que um regulamento onde forçavam o trabalho escravo, foi muito pior para gays. Homens homossexuais recebiam os ofícios mais prejudiciais e arriscados. O símbolo para marcar homens gays foi um triângulo rosa e mulheres lésbicas recebiam um triângulo semelhante na cor preta. Soldados da SS, organização paramilitar nazista, utilizavam o símbolo como alvo para o tiro. A violência sofrida perpetuou igualmente nas “experiências cientificas” programadas por médicos do partido nazista. O objetivo maior desses médicos era encontrar um suposto “gene gay” afim de buscar uma medida para “curar” ou até mesmo abortar uma criança que, na visão deles, iria “nascer” homossexual. A comunidade heterossexual homofóbica, sempre tentou (e tenta) achar uma suposta “cura” para a homossexualidade de alguns homens e mulheres, mas nunca isso foi visto de forma tão repugnante como no período analisado. Um dos mais famosos sobreviventes homossexuais do holocausto foi o francês Pierre Seel. Falecido desde o ano de 2005, ele fora a única vítima francesa a contar abertamente o seu chocante testemunho. O francês foi enviado para o campo de concentração Schirmeck-Vorbrück.

Gays que tentaram resistir tiveram suas unhas arrancadas, seus intestinos perfurados e alguns foram assassinados. No campo de concentração foi obrigado assistir a execução de Mulhouse, o jovem foi devorado por cães pastores alemães. Ambos eram namorados. As torturas e todas as violências sofridas por gays e lésbicas assombram o imaginário da comunidade LGBT de todo o planeta até hoje. Nunca, em toda história, os direitos humanos de judeus, comunistas, pessoas com deficiência, gays e lésbicas foi tão atacado. O triangulo foi convertido em símbolo de luta do movimento por igualdade de gênero e orientação sexual em diversos países, inclusive no Brasil. No mês de abril deste ano surgiu, em diferentes jornais e sites das redes de militância LGBT, denúncias feitas por gays e lésbicas da federação Russa. Segundo relatos, a Chechênia está implantando políticas de repressão e até um suposto local onde pessoas LGBT vão e desaparecem. O local está conhecido como “campo de concentração” para gays. O governo checheno nega todas as acusações sem dar muitas explicações. Entretanto há fortes indícios de que seja verídica a informação. Investigações então sendo feitas por grupos e organizações de todo o mundo.

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Numa concepção racista extremamente indolente e violenta, os nazistas buscavam renascer, ou criar, uma raça. Essa raça era constituída por europeus de etnia branca-caucasiana que acreditava-se ser descendentes diretos do povo ariano. A homossexualidade, segundo eles, era rejeitada por motivos de “não reprodução” em uma lógica que, basicamente, coloca esses indivíduos como todos sendo estéreis (uma falácia). Mas, na década de 30 e 40, quando pouco se sabia sobre os homossexuais e os métodos hoje usados por este grupo para constituir família e terem filhos não existiam, aquele argumento era, no mínimo, convincente para maioria dos dirigentes do partido e também para a população alemã. Os homossexuais, assim como os Judeus, foram enviados para inúmeros campos de concentração, onde foram também fortemente violentados. Gays que eram judeus e comunistas tinham sua estadia ainda mais sofrida que outros. Assim como em toda a guerra, não se sabe o número correto de homossexuais mortos durante o período, entretanto fica-se entre 5 mil e 15mil. O ódio a gays era tão grande que, em muitos casos, foram perseguidos até mesmos por outros prisioneiros, passando por agressões físicas, verbais e psicológicas.

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R E T R ATO E M PRETO E BRANCO

Aecim Tocantins

Por toda sua vida foi um homem probo e exemplar modelo de conduta cidadã a ser seguida, por esta e gerações futuras

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POR JOÃO CARLOS VICENTE FERREIRA FOTO MARCOS BERGAMASCO

onheci o professor Aecim Tocantins em 1991, em um solenidade cultural. Apreciava ser chamado de professor Aecim. Sempre demonstrava esse gosto. O professor era um ser cati-

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vante e de extrema simpatia. Com o tempo nossa amizade se tornou mais próxima, se estendendo à de minha filha Maria Rita, que mora em Chapada dos Guimarães, passando a se admirarem, mutuamente.


Dona Celita, filha do professor Philogônio de Paula Corrêa. O casal teve dois filhos: Mário Luis e Maria Alice. Aecim sempre foi muito ativo nas questões de preservação da memória histórica cuiabana, sendo ele mesmo uma memória viva de Mato Grosso. Era muito consultado por pesquisadores, professores, alunos e pessoas que queriam saber mais sobre a nossa história. Interessante registrar que sempre atendeu a todos com simpatia e muita disposição, nunca deixando de oferecer aos seus visitantes um lauto chá com bolos. Publicou, em co-autoria com sua esposa Célia LombardiCorrêa, o livro “Philogonio de Paula Corrêa: Educador, Historiador Homem de Letras e Parlamentar”, em 1999; “Coletânea: Conceitos, Frases e Pensamen-tos”, em 2012 e “Cartas do Marechal Candido Mariano da Silva Rondon: relíquias do telegrafista Tocantins”, em 2013. Importante registrar que Aecim Tocantgins teve em Ivan Echeverria, um amigo e admirador de sua vida e obra, uma perfeita sintonia para iniciativas de publicação de livros, artigos e atividades culturais. Outro registro digno de nota da intensa vida do professor Aecim é o de que recebeu, ainda em vida, uma grande homenagem, pois seu nome foi dado ao moderno Ginásio Aecim Tocantins, em Cuiabá, inaugurado em 31 de maio de 2007. Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso, sempre frequentou de forma sistemática as reuniões mensais, deixando de fazê-lo apenas quando a saúde passou a não permitir. Mesmo assim sempre gostava de informar-se das atividades e dos andamentos que a instituição centenária estava tomando. Faleceu na madrugada de um domingo do dia 18 de junho de 2017, aos 94 anos, sendo sepultado no Cemitério da Piedade, no centro de Cuiabá.

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Através de registros da Casa Barão de Melgaço, produzidos pela professora Elizabeth Madureira, temos as seguintes informações biográfica do Professor: “Aecim nasceu em Cuiabá, aos 8 de junho de 1923. Era filho de Odorico Ribeiro dos Santos Tocantins e Alice Borges Tocantins, tendo ficado órfão de mãe aos cinco anos de idade. Foi criado pela irmã Arinil e depois pela madrasta, Professora Alina do Nascimento Faria Albernaz Tocantins. Iniciou a carreira de Contador, pela Academia de Comércio do Rio de Janeiro (hoje Universidade Cândido Mendes), bacharelando-se no ano de 1943. Ainda no Rio de Janeiro, prestou concurso e foi aprovado como contabilista da Estrada de Ferro Central do Brasil, porém não assumiu o cargo, retornando a Cuiabá. Na capital mato-grossense abriu escritório, sendo que mais tarde foi convidado pelo Coronel Palmyro Paes de Barros para atuar como contador na Usina Santo Antônio, mais conhecida como Maravilha. Mais tarde, atuou como contabilista secretário da Associação Comercial de Cuiabá, no ano de 1947, a convite de Manoel Miraglia, Delegado Regional do Senac e Sec em Mato Grosso. Em 1952, foi convidado para atuar como Chefe da Contadoria e Seção de Controle do Senac, no Rio de Janeiro. Em 1959 foi contratado para atuar na empresa construtora Siveletro. Foi sócio da Sociedade de Materiais de Construção – Somag, com sede inicial à Praça Ipiranga, Cuiabá. Contratado pelo Banco Nacional de Habitação – BNH, em 2 de dezembro de 1969, para processar auditorias contábeis junto à Associações de Poupança e Empréstimo, e da mesma forma, foi credenciado pelo Conselho Regional de Contabilidade do Estado de Mato Grosso como Auditor Independente, no ano de 1972.” O professor Aecim casou-se com Célia Lombardi Corrêa Tocantins, a

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C O M P O RTA M E N TO

Auxílio-Reclusão Mitos e verdades

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POR KALLITA DOS ANJOS MORAES* JÚNIOR CÉSAR GOMES GUIMARÃES** THAYS OLIVEIRA SILVA*** FOTO REPRODUÇÃO


que necessitam de seus proventos, os mesmos precisam comprovar dependência mediante documentação exigida. Importante ressaltar que o recluso deve ser de família baixa renda, existindo assim, um valor estimado de salário recebido até a data da prisão, a cada ano sendo atualizado, em 2016, o valor foi estimado em R$1.212,64. A família possui prazo de 90 dias a contarem da data da prisão para solicitar o auxílio em condição retroativa, passando esse prazo, o recebimento é a partir da data do requerimento. Para sua solicitação é necessária certidão que comprove regime fechado ou semi aberto do segurado retirado no órgão devidamente responsável. Muitos questionamentos são feitos em relação aos valores recebidos, esses, possuem variedade, pois são calculados a partir do salário do preso até a data de reclusão. O tempo de recebimento também possui variação dependendo do atendimento dos requisitos de contribuição na previdência e também comprovação de união estável, idade do conjugue e filhos, com exceção de pessoas com deficiência. Com a concessão do auxílio é exigido dos dependentes atualizar a certidão de reclusão a cada três meses. Adolescentes que estão em situação de internação em esta-

belecimento educacional,e se enquadram nos requisitos da vigente lei, seus dependentes também possuem direito ao auxílio reclusão. O benefício é encerrado quando não se existir a condição de estado de regime fechado ou semi aberto, em caso de fuga, liberdade condicional, transferência para prisão albergue ou cumprimento da pena em regime aberto. Visto como vilão por grande parte da sociedade, a existência desse auxílio não é nada mais que uma forma de prover os direitos básicos dos dependentes do preso. Mesmo cometendo algum crime ou infração (em casos de adolescentes) o preso que contribuiu tem direto do auxílio para prover dos mínimos de seus filhos e esposas.É importante o esclarecimento de informações como essa, assegurada em lei e dever do Estado. Estar sempre bem informado e certificando da veracidade do que recebemos e o que reproduzimos, é significativo para construirmos uma sociedade que materializam direitos e deveres para o bem estar de todos.

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ão é incomum em nosso cotidiano receber as famosas “correntes” nas redes sociais e aplicativos de celulares, essas, repassadas tornam-se assuntos nos encontros de família, com os amigos no bar, e algumas vezes gerando confusão, mitos e inverdades. Muito famoso entre os mal interpretados, está o auxílio reclusão, benefício recebido por famílias de pessoas em situação de regime fechado e semi aberto. A falta de conhecimento do assunto cria uma revolta em quem não o conhece, gerando uma imagem distorcida pela população. Garantido na Constituição Federal de 1988, na Lei 8.213 da Previdência Social, o auxílio é destinado aos dependentes do encarcerado que contribuiu no INSS até a data da prisão. No Art. 80 a respeito do benefício: “O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço”, ou seja, o detido não pode acumular nenhum outro benefício para que seus dependentes o possam adquirir. Ao contrário de muitos boatos, o segurado preso não recebe nenhum valor, o mesmo é destinado aos

* KALLITA DOS ANJOS MORAES Assistente Social ** JÚNIOR CÉSAR GOMES GUIMARÃES Assistente Social do Centro de Referência Especializado de Assistência Social de Juscimeira – MT *** THAYS OLIVEIRA SILVA Bacharel em Serviço Social

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C U LT U R A

No Combate

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COM VALÉRIA E LUCIENE CARVALHO FOTO DIVULGAÇÃO

ste é o título de projeto realizado em Cuiabá em junho deste ano. Foi idealizado por Raul Lázaro, apoiado pela PRAE e PROCEV/UFMT e apresentado, em sua terceira edição, nas instalações da Universidade Federal de Mato Grosso e na orla do Bairro do Porto cuiabano. O núcleo HIP HOP EM AÇÃO, da UFMT, é o coletivo que realiza o evento, que ocorre desde 2015. O Hip-hop é um movi-

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mento cultural iniciado no final da década de 1960 nos Estados Unidos como forma de reação aos conflitos sociais e à violência sofrida pelas classes menos favorecidas da sociedade urbana. É uma espécie de cultura das ruas, um movimento de reivindicação de espaço e voz das periferias, traduzido nas letras questionadoras e agressivas, no ritmo forte e intenso e nas imagens grafitadas pelos muros das cidades.

No Brasil, o movimento Hip-hop foi adotado, sobretudo, pelos jovens negros e pobres de cidades grandes, como forma de discussão e protesto contra o preconceito racial, a miséria e a exclusão. Como movimento cultural, o hip-hop tem servido como ferramenta de integração social e mesmo de re-socialização de jovens das periferias no sentido de romper com essa realidade O objetivo desse projeto cuiabano é lançar mão da


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Às Drogas linguagem Hip-hop para fomentar na sociedade a discussão da Dependência Química enquanto questão de saúde pública. É ação de cidadania de fundamental importância, que busca colaborar na busca de caminhos para que possamos tratar o dependente químico resgatando sua dignidade cidadã. Arte de rua discutindo DEPENDÊNCIA QUÍMICA sem preconceito. O evento buscou unir recursos públicos, da iniciati-

va privada e a força da arte urbana em que se traduz o Hip-hop, para chamar atenção da cidade para epidemia social em que vem se transfor-mando a dependência química. Com o apoio da Secretaria Municipal de Cultura, foram realizadas palestras, shows, apresentações de rappers e poetas, grafite, skate, b.boys, atendimento aos dependentes, distribuição de sopão. Foi tudo junto e misturado neste importan-

te evento que buscou ajudar dependentes químicos a encontrarem conforto e orientação para suas doenças. Em tempos de higienização forçada e tantas outras medidas tomadas pelo poder público que vão na contramão das reais e urgentes necessidades dos dependentes, este evento mostrou uma das inúmeras maneiras para mudança deste quadro, oferecendo amor, diálogo, informação, arte e cultura

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MILTON PEREIRA DE PINHO - O GUAPO Músico e escritor

Crônica Pantaneira Amarrar canoa no “batume”

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POR GUAPO FOTO DIVULGAÇÃO

uando chega o período da seca, no Pantanal, tal como ocorre todos os anos, entre os meses de maio e outubro, nos rios, lagoas e corixos da região, acontece o fenômeno denominado “vazante”. Isso se dá por que as águas do período chuvoso, acumuladas durante o período de cheia vão diminuindo, evacuando para o grande Rio Paraguai e, este por ser um “rio serpenteado”, recebe toda a pujança da vazante e a encaminha para o sul do continente, até o Oceano Atlântico, na boca do Rio da Prata, entre o Uruguai e a Argentina. Durante esse período as águas perdem a sua cor barrenta, da época das cheias, tornado-se mais claras, matizando uma beleza reluzente. Também nessa época aparecem, tanto nos rios, quanto em lagoas e corixos, pequenos bancos de areia ou baixios como é conhecido, devido a sua protuberância embranquecida e “improvisada” no meio desses meios aquáticos. No começo da vazante os bancos de areia ou baixios estão lá, “palpitando no meio das águas”. Quem passa por perto dessa formação, de barco ou de canoa, não consegue resistir ou conter a vontade louca de pisar naquela coisa bela, que mais parece uma praiazinha. Muitos param pra se refrescar e tomam um “banhozinho” rápido e, por um breve momento, se livram do calorão e da baixa umidade do ar que sempre

reina nesse período do ano. Mas, quando vai avançando o período da estiagem, os bancos de areias vão se aumentando e avolumando e, ao mesmo tempo, recebendo muitos outros materiais aquáticos, principalmente vegetais, galhos secos e restos de aguapés, que estavam rodando e agarraram-se neles. Com isso, no local, desenvolvem-se vários tipos de vegetações que formam uma espécie de “ilha falsa”, que recebe dos ribeirinhos o nome de “batume”, devido ao acúmulo desses materiais. Diversos animais e aves fazem guarita no “batume”, a exemplo de jacarés, capivaras, garças etc. Após certo tempo, com a chegada do período das cheias, as águas se avolumam e começam a se movimentar na vasta região pantaneira. O batume, por sua vez, devido ao seu peso ser mais leve que a água, “desprega” do enraizamento que se formou no banco de areia, durante o período da seca, e roda, levando consigo tudo que se encontra em cima de sua superfície e que estavam agarrados na “ilha falsa”. O dito pantaneiro “amarrar canoa no batume”, é o ato de se iludir com as coisas do mundo, da vida, não prestar atenção nos pequenos detalhes que o dia-a-dia nos mostra, acreditar na beleza eterna e nas pessoas erradas criando uma série de “batumes” no seu horizonte psicológico e, que mais tarde, “a cheia vai levar embora rio abaixo”.

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JULHOS DE NOSSA HISTÓRIA DIA 01

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»»1961. Nasce Diana Spen- »»1906.

cer, futura Princesa de Gales. DIA 02 »»1778. Morre o francês e filósofo do iluminismo Jean-Jacques Rousseau. DIA 03 »»1187. Saladino, Sultão do Egito e da Síria, comandando 60.000 soldados turcos derrota os cruzados perto do Mar da Galileia. É o começo do fim dos reinos francos na Síria.

DIA 04 »»1946. O Bikini, concebido por Louis Reard, é exibido pela primeira vez, em Paris.

Morre assassinado no poder, o governador de Mato Grosso, Antônio Paes de Barros - o Totó Paes, considerado o Pai da Indústria de MT. DIA 08 »»452. O papa Leão I sai de Roma ao encontro de Átila, chefe dos Hunos, para persuadí-lo a não invadir a Península italiana. DIA 09 »»1921. Morre o Arcebispo de Cuiabá Dom Carlos Luiz D´Amour. »»2008. Morre o escritor, pintor e jornalista Ricardo Guilherme Dicke. DIA 10 »»1871. Nasce o escritor Marcel Proust, na França, perto de Paris.

»»1959. Nasce em Itararé/SP, o jornalista, escritor e publicitário Paulo Maria Ferreira Leite, que fez parte da história do jornalismo em MT.

DIA 05 »»1860. Nasce em Chapada dos Guimarães o farmacêutico e governador de MT, Pedro Celestino C. da Costa.

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DIA 11 »»1965. Demolição de antigo chafariz do período provincial, na Praça Alencastro, em Cuiabá. DIA 12 »»1940. Nasce em Várzea Grande o contador, pecua-

rista, político e conselheiro do TCE, Ary L. de Campos. DIA 13 »»1972. Morre em Cuiabá o padre Wanir Delfino César, da AML. DIA 14 »»1789. A fortaleza da Bastilha é atacada e tomada pela população de Paris, dando início à Revolução Francesa. DIA 15 »»1606. Nasce o pintor Rembrant, em Leiden na Holanda. A sua obra prima é a Ronda da Noite. DIA 16 »»1871. Nasce em Poconé o jornalista e político, João Cunha, sócio fundador do IHGMT. »»1981. Nasce em Fátima do Sul/MS, o geógrafo e deputado estadual Wancley Charles Rodrigues de Carvalho. DIA 17 »»1957. Nasce no Rio de Janeiro a historiadora, indigenista e antropóloga Anna Maria Ribeiro Fer-nandes da Costa, do IHGMT. DIA 18 »»1957. Nasce em Alto Paraguai o historiador, professor, articulista e cientista político Lourembergue Alves, do IHGMT e AML. DIA 19 »»1899. Nasce em Alagoas o jornalista Amaro de Figueiredo Falcão.


O PERSONAGEM

a política e pecuarista, Aparecida Maria Borges Bezerra - a Teté Bezerra.

CENTO E NOVE ANOS DA MORTE DO CORONEL CORSINO DO AMARANTE »»26-07-1908. É importante na historiografia mato-grossense e nome de movimentada avenida em Cuiabá. Coronel Corsino nasceu em Cuiabá e estudou engenharia militar no Colégio Militar da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro. Dos seus feitos, que foram muitos, destacamos sua engenhosidade em período de Guerra do Paraguai (1864-1867), ocasião que se valeu de um balão cativo transformado em posto de observação das tropas e acampamento inimigo. Nesse período foi gravemente ferido no Chaco paraguaio. Mantinha estreito relacionamento com a família imperial e, com a República, afastou-se do Exército em solidariedade ao regime imperial, ao qual tão bem serviu. Deixou o cargo de tenente-coronel de Primeira Classe do Exército e se dedicou ao magistério militar.

DIA 21 »»1798. Batalha das Pirâmides, em frente ao Cairo, entre o exército francês comandado por Napoleão Bonaparte e os Mamelucos, casta militar que dominava o Egito. DIA 22 »»1949. Morre em Cuiabá o médico e ex-governador de MT, Estevão Alves Corrêa.

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DIA 20

»»1957. Nasce em Pirajuí/SP,

O ACONTECIMENTO DIA 27 »»1915. Nasce em Cuiabá o poeta, historiador e jornalista Rubens Mendonça, um dos mais importantes nomes da literatura de MT. DIA 28 »»1956. Nasce em São Paulo a jornalista, poeta e escritora, Sueli Batista, da AML. DIA 29

»»1889.

Nasce em Cuiabá o professor e escritor Alírio Hugueney de Mattos, da AML e do IHGMT.

OITOCENTOS E SETENTA E OITO ANOS DO (PROVÁVEL) NASCIMENTO DE PORTUGAL - BATALHA DO OURIQUE »»25-07-1139. Quando nasceu Portugal? Uns utilizam a data em que D. Afonso Henriques foi proclamado rei pelos seus pares a seguir à batalha de Ourique, em 1139. Outros a data da Conferência de Zamora, 1143, ou seria a data do reconhecimento pela Santa Sé, em 1179?. Preferimos a primeira opção, a Batalha de Ourique, com vitória de D. Afonso sobre um numeroso contingente muçulmano. Associada à batalha surgiu no século XV a lenda do milagre de Ourique. Dizia a lenda que, antes da batalha, teria surgido Cristo a D. Afonso Henriques, assegurando-lhe a vitória e a proteção futura do reino. A partir do século XIX a lenda foi posta em causa, primeiro por Herculano e depois pela moderna historiografia.

DIA 30

»»1996. Morre em Cuiabá o

literato e político padre Raimundo Pombo Moreira da Cruz.

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Americanidade A Busca Pelo Intercâmbio Cultural Entre Os Povos Da América Do Sul:

Isabel Allende A FOTO DIVULGAÇÃO

escritora Isabel Allende nasceu em Lima, no Peru, no dia 2 de agosto de 1942. Apesar do local de nascimento, é considerada uma autora chilena, pois viveu no país desde muito cedo, quando sua família se mudou. Isabel é filha de Tomas Allende, funcionário diplomático, este, primo-irmão de Salvador Allende, presidente do Chile e político deposto, ainda no poder, pelo regime militar de Pinochet, em 11 de setembro de 1973. A jornalista e escritora pertence ao movimento literário de realismo mágico. Na década de 1980, ganhou respeito internacional ao ser considerada uma das principais escrito-

ras latino-americanas. O livro de Allende, A Casa dos Espíritos, de 1982, fez tanto sucesso que foi adaptado para o cinema em 1993, e que teve atores conhecidos como Jeremy Irons, Mery Streep, Winona Ryder e Antonio Bandeiras. Durante a carreira, a escritora lançou em torno de 20 livros com tradução em diversos países e línguas. Além de A Casa do Espíritos, Allende produziu: A Cidade das Feras, A Ilha sob o Mar, A Lagoa Azul, A Soma dos Dias, Afrodite, Cartas a Paula, De amor e de Sombra, Eva Luna, Filha da Fortuna, O Bosque dos Pigmeus, O caderno de Maya, O Plano Infinito, O Reino do Dragão de Ouro, Retrato em Sépia, Zorro, Come-

ço da Lenda, dentre outros. A obra mais dramática da autora foi lançada em 1995, quando sua filha Paula entrou em coma. Isabel teria feito sua biografia para ajudá-la a retomar a memória caso a perdesse durante a internação. Infelizmente não foi possível, pois sua filha acabou falecendo. Apesar da perda, Allende decidiu publicar a obra mesmo assim.

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Serviços Gerais POR LUCIENE CARVALHO FOTO DIVULGAÇÃO

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o segundo toque do despertador ele se levantava, calçava os chinelos e ia em direção ao banheiro, 05 da manhã. Lavava a cara, o peito, os sovacos, se enxugava com a toalha de uso familiar comum e passava o desodorante de bolinha. Aí era só enfiar o uniforme e calçar a botina: Tava pronto! Sabia que sua mulher já estava na cozinha terminando de preparar o café e a comida da marmita. O café já tava esparramando seu cheiro gostoso pela casa inteira. Casa inteira! Parecia grande coisa, era uma casinha de dois quartos, sala e cozinha. Casa de Cohab , com uma varanda de madeira e Eternit no fundo. Passando pela sala enquanto ia em direção a cozinha escutou o ronco do filho caçula que dormia no sofá... Menino teimoso, andava metido num tal de Hip hop, que diz que ia ser cantor de RAP. Rap é o barulho do cinto no couro do rapaz, hora que ele fosse endireitar o lombo do moleque, HIP HOP, RAP... onde já se viu uma desgraceira dessas enfiada na vida de família de gente direita? Café bebido, pão com margarina mastigado, era seguir pro ponto de ônibus, até chegar ao trabalho eram três conduções: pegava um no bairro José Carlos Guimarães, descia no terminal Maggi, pegava outro até o centro de Cuiabá e lá pegava outro até chegar no Jardim Cuiabá, na clínica de radiologia aonde entrava até as 07:00 da manhã. Serviços gerais. E toma serviço, ele puxava pelo corpo, sabia que um homem chegado nos 60 anos, ainda tendo que levar o sustento pra casa, não pode fazer corpo mole. “Seo Luiz, houve derrame de líquido de contraste no segundo andar”.


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LUCIENE JOSEFA DE CARVALHO Escritora, poetisa e membro da Academia Mato-Grossense de Letras

“Seo Luiz o Sr. pode resolver a maca da sala de tomografia?” Marmita com arroz feijão e frango frito, tudo frio. “Seo Luiz o senhor não entendeu? Existe risco de contaminação, por favor, as luvas”. “Seo Luiz o senhor não pode dar um jeito no sifão da copa?” Sim, senhora Sim, senhor Sim, senhora Sim, senhor No começo da noite, o percurso de retorno, no transito horrível de sexta-feira: a Prainha entupida, na XV de novembro deu até para o ônibus seguir ligeiro, porém, quando chegou na avenida da FEB parecia que nada saia do lugar. Ele tava sentindo um peso nas pernas, queria chegar em casa, tomar um banho passar um álcool com arnica nas canelas, na batata da perna, tomar uma sopa, assistir ao Globo Repórter e dormir. O ônibus pro José Carlos Guimarães demorou, mas ele conseguiu ir sentado e as pernas doeram menos. A distância entre o ponto de ônibus e sua casa era pequena, logo avistou a casinha pintada de azul. O cheiro de sopa veio encontrar com ele antes que transpusesse a porta. O banho foi da cabeça aos pés, bufando água com gosto pela cara, no alívio da alforria provisória do final da semana. Ao sentar-se a mesa, começou a perceber algo estranho no ar - talvez no olho desviado da esposa, ou no caçula que não estava cantando aquela porcaria esquisita de RAP que ele chamava de música – o mais

velho estava na escola no Mapim, trabalhador, estudioso que só... “cadê Cristina?”, perguntou Seo Luiz em voz alta, procurando com os olhos sua filha do meio, sua única menina, “cadê Cristina?” dona Maria, sua esposa, balbuciou alguma coisa enquanto punha um caldeirão de sopa fumegante e de aroma delicioso. O terceiro “cadê Cristina?” Já foi um berro, seguido de um safanão na mesa fazendo voar pratos, colheres e o caldeirão da sopa. Os fios de macarrão foram decorando a geladeira, o fogão, as paredes, o botijão. O choro da mãe era encolhido ao dizer que há 2 dias Cristina vinha pedindo para ir a festa de São Benedito e que naquela sexta, a filha havia ido normalmente para escola porém, no horário de volta, tinha chegado um bilhete pelas mãos da filha da vizinha, estava escrito: “Mamãe, fui na festa de São Benedito, não vou voltar muito tarde”. Seo Luiz casara tarde, cuidou do pai doente até a morte pra só então constituir família. Aqueles filhos eram a única realização na sua caminhada, aquela menina, não podia sair assim; o mundo enorme... foi até o quarto, pegou o cinto, mandou a mulher e o caçula pra dentro dos quartos, pôs o cinto embaixo da almofada e ficou deitado, assistindo o Globo Repórter. Ele dormiu... Quando acordou, Cristina estava de joelhos ao lado dele. O rosto dela tinha uma luz intensa, ela dizia: pai, pai me perdoa, foi tão bonito, eu vi São Benedito, eu vi São Benedito. Seo Luiz, num impulso, abraçou a filha bem apertado de tanto alívio. Ele chorou de soluçar.

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L I TCE U R LT A TUURRAA

Viva, Marília Beatriz!

A

POR EDUARDO MAHON FOTOS OSMAR CABRAL JR.

o voltarmos no tempo, mais especificamente ao período da colonização do Brasil na primeira metade do século XVI, podemos nos lembrar dos chamados engenhos de açúcares, nos quais mulheres e homens negros africanos eram trazidos de suas colônias na África para serem utilizados como mão de obra escravizada. Sujeitos a todo tipo de atrocidades e abusos, privados de liberdade, sentiam literalmente na pele a dor da crueldade desumana dos colonizadores brancos.

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A gestão de Marília Beatriz vai se despedindo com galhardia. Soma mais um troféu valioso para a literatura mato-grossense: a eleição de Aclyse de Mattos. Nossa presidente merece o nosso aplauso. Não foi fácil. A responsabilidade, no caso dela, foi redobrada por uma tripla coincidência: Gervásio Leite, o poeta, jornalista, cronista, educador, deputado e desembargador, completou 100 anos e, com ele, relembramos os 40 anos que passaram da gestão desse modernista à frente da Academia.


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EDUARDO MAHON É titular da Cadeira 11 da AML

Não bastasse essa enorme responsabilidade, Marília Beatriz de Figueiredo Leite conduziu os festejos de 95 anos da mais longeva instituição literária do Estado. Em dois anos, a presidente reinaugurou a Casa Barão de Melgaço, lançou um volume da Revista da AML com discursos inéditos, participou de inúmeros eventos no interior e na capital de Mato Grosso, recebeu centenas de estudantes para discussões e palestras, além de produzir continuamente os textos que seduzem pela beleza plástica, própria de quem domina a semiótica. A gestão começou com o pé direito. Na posse de Marília, vieram os colegas escritores de Mato Grosso do Sul para a primeira sessão conjunta entre as duas academias, desde a separação dos Estados. Na ocasião, compunha a mesa de honra Gilberto Mendonça Telles e Wlademir Dias-Pino, uma moldura modernista que sempre coube à família de nossa presidente. A inteligência de Marília Beatriz fez troça com os tapumes que sufocavam a Casa Barão de Melgaço durante a lenta requalificação. Foi a presidente que nos convidou a pixar poesias nas estéreis folhas de madeira com a qual o cerco à literatura foi imposto pelo poder público. Coordenados pela criatividade da presidente, resistimos. Vencemos a sisudez estéril com a irreverência poética. Ali estava a marca dela: Marília entregou-se à Academia, com spray e lágrimas. Nos dois anos em que fomos contagiados pela delicadeza de Marília, sabíamos que ela não iria parar sentada. Falou de pé. Ninguém a segurou, ninguém a dominou, ninguém a controlou. A pauta foi dela, exclusiva, singular. Quando o protocolo assombra, os ritos oprimem, os estatutos pressionam, Marília Beatriz é aquela que nos relembra a razão de estarmos juntos: pela lite-

ratura, não pelo formalismo; pela literatura, não pela cerimônia; pela literatura, não pela norma. Deixou claro de dentro para fora: o que precisamos é de mais literatura e menos burocracia. As opções da gestão que se despede foram tomadas em prol das letras e dos autores que estão lutando em Mato Grosso pela poesia, pela prosa, pela música, pelo teatro. Eis uma mulher corajosa a quem admiro, respeito e festejo. No dia 12 de setembro, Marília Beatriz conduzirá a posse de Aclyse de Mattos. Preparem-se! Nada será como antes. Estejam todos presentes, haverá inovação como de costume. Porque o costume da presidente é perseguir novas imagens, novas formas, novas linguagens. Quem está parado, se anime. Quem está animado, pegue fogo. Esta é a contribuição que nos legou: não ter medo do futuro, porque o novo não se impõe pelo litígio com a tradição. Marília está nos deixando uma Academia de Letras mais jovem, mais viva, mais próxima da sociedade. Os nossos aplausos são partilhados com os vice-presidentes: José Cidalino Carrara, um lorde em terras cuiabanas, e Ivens Cuiabano Scaff, o embaixador das letras mato-grossenses. A itinerância da Academia Mato-Grossense descobriu uma nova geografia e, com ela, um desejo de interiorização. É preciso dar vez e voz aos escritores e leitores do interior. Marília palmilhou muitos lugares, criando espaço e desejos. De vez em quando, me lembro da provocação poética dela: “qual o lugar do desejo sem lugar?”. A pergunta fere fundo os nossos sentidos. Qual o lugar? Do desejo? Sem ligar? Não! O lugar de tudo é em Marília Beatriz. E o lugar de Marília Beatriz é na literatura mato-grossense pela eternidade. Obrigado, querida amiga. Você é brilhante!

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L I T E R AT U R A

Balada Doce Em Tempo Ácido

POR CARLOS GOMES DE CARVALHO FOTO DIVULGAÇÃO

me deixa inquieto em seu vai-e-vem-vai são passos trôpegos de um bêbado ou de um hesitante filósofo? indago-me e ... para não submergir vou-venho-vou-e-venho

entre os escombros que de minhas mãos escapam surge o gosto térreo do vinho áspero nos destroços de construções vadias me detenho surpreendido entre dois caminhos - o encanto, a astúcia – esqueletos de vozes ocas cujos ecos são sangue sem luz dardejam expressões que como chuva gélida em minha face escorrem lembrando velha canção de amantes tristes um indeciso transeunte entre nós

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prossigo entre tantas máscaras entre tantos seres de frágil argila sob a luz devoradora de olhos inquietos a alimentar o lago ardente da imaginação cuja superfície, embora pelo vento ondulada, está calma e serena como o céu opaco e intangível onde brilha a luz oculta da canção de teus olhos despojados de ilusão e viageiro no deserto da linguagem dos gestos profundos.

CARLOS GOMES DE CARVALHO Autor dos livros de poemas: A Arquitetura do Homem, Hematopoemas, Pássaros Sonhadores.


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