Rasgos Culturais: Consumo Cinéfilo e o Prazer da Raridade

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formato sempre que possível – que nem precisa ser tão ‘anti’ assim – mas que funcione como expressão, não os rotule e os posicione enquanto tal: a crítica para a perturbação e a favor da disseminação de sentidos. Acreditam na liberdade a partir do não agendamento imposto aos críticos tradicionais, onde nem o normativo, nem o anti-normativo sejam tomados como regra. Temos profundos diálogos entre linguagens, hibridização de formas e a dispersão de antigas fronteiras. A convergência não está sozinha. Antes tínhamos as belas artes, agora falamos em novas artes: tecno-arte, bio-arte, arte-crime. Antes tínhamos as disciplinas e o anseio acadêmico de se estabelecer enquanto disciplina; agora a interdisciplinaridade rompe as fronteiras da academia. “Abra os olhos e verá a inevitável marca na história”, dizia uma das pichações de Rafael Augustaitiz ao apresentar sua conclusão de curso, através da intervenção e invasão do centro universitário em que estudava. De fato, a própria noção de fronteira e de um modus operandi específico, que diferenciava a gestação do artista das telas de outro das folhas, ou mesmo que formatava a transgressão do artista como distinta da de um criminoso se dilui nesse contexto, fazendo da literatura, imagem; do cinema, palavra; da pintura, performance. Isso reverbera no perfil do crítico – que pode insurgir sem ser artista, acadêmico ou jornalista – e nos perfis de críticas que se distanciam de um 'único' ideal: crítica genética, biográfica, impressionista, visual, estrutural e semiótica se misturam. Tudo é permitido. E não que não fosse antes: é preciso saber dosar o excesso de visibilidade do presente para que ele não se torne a perda de um passado, pontuando sempre que necessário o novo, mas sem nunca perder de vista a história. Essa mediação é imprescindível: mesmo jovens e com pouca lembrança esses cinéfilos já leram Haroldo, Tarkovski e Glauber, viram Truffaut, Warhol e Pasolini, dançaram com Jomard e admiram a transmutação artística recorrente em Greenaway (ou deveria dizer Lynch?). Pois é, sabem que a crítica virtual não carrega Adão, Eva, nem um criacionismo inédito. A partir da constatação do processo de renovação da crítica, justamente quando muito se escrevia sobre uma crise da crítica, crise e

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