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No real ou no virtual, a vida é antes de mais a alma. A indústria cinematográfica já não se contenta com a animação assistida por computador, procura dar uma espécie de sopro a esses "seres" feitos de pixels e de algorrítmos, recriar "criaturas virtuais", capazes de aprender e de evoluir. Os clones, cada vez mais realistas, circulam nas redes com uma delegação de poder fascinante. Monika Liston e Hugo Jo casaram-se realmente no ciberespaço, pronunciando o "sim" através dos seus clones respectivos. É o prenúncio de comunidades virtuais de clones, baseadas na vizinhança virtual, metafórica, simulatória. O “adultério” é adultério, mesmo que seja virtual, de acordo com a “Famiglia Cristiana”. A Argila virtual é um material audiovisual que se modifica e transforma os dados apreendidos numa representação abstrata da significação destes dados. É sintomático que a crença fundamental dos ciber-gnósticos seja que o mundo da matéria, a carne ou a entropia sejam o demônio e que seja a pura informação o verdadeiro objetivo da realidade. A virtualização do ciberespaço, i.é., a deslocalização e a desmaterialização do espaço social da comunicação leva fatalmente à desencarnação nas relações sociais. A imaterialidade da comunicação coloca-nos os problemas da desmaterialização e da dessubstantialização que John Perry Barlow muito argutamente enuncia: "Os vossos conceitos legais de propriedade, expressão, identidade, movimento, e contexto não se nos aplicam. Baseiam-se na matéria. Aqui não há matéria." (John Perry Barlow, A Declaration of the Independence of Cyberspace, Davos, 1996)". Se combinamos as sociedades de Minsky, que são sociedades de espíritos

(1988) e a sociedade como texto de Brown (1986) obtemos um conceito de sociedades como hipertextos. O hipertexto baseia-se em duas categorias fundamentais, nomeadamente nós (nodos, pontos nodais) e elos. Os nós são estruturas atômicas de hipertextos que não estão comprometidos com um tipo particular de dados. Podemos pensar num nó hipertextual como um pedaço de texto, ou uma lexia, mas pode também esse nó(nodo) como uma matriz(x) de dados relacional, ou como uma peça de informação de um outro tipo qualquer: entidades visuais ou unidades acústicas. Esta distinção traz-nos um eco distante do Tatsachen und Sachverhalte de Wittgenstein e permite a criação de um número infinito de redes semânticas de um dado conjunto de dados. Não podemos esperar intensities of human consciousness (intensidades de consciência humana) dos jogos de aventura porque essas construções são fundamental e paradoxalmente extensivas, fundamentalmente despedaçados, como os seus jogadores, entre um percurso e as suas alternativas, entre saga e interface, hierarquia e rede. Mas podemos detectar a emergência de uma sensibilidade fictícia mais harmonizada com as lacunas, as tensões, as fissuras com que o mundo inconsútil das linhas tradicionais sempre procurou controlar, "purificar". O ciberespaço radicaliza a racionalidade do espetáculo; nele, o indivíduo torna-se espectador de si mesmo, do seu poder e da sua liberdade. O ciberespaço "existe" no interior de um espaço virtual acentuadamente gráfico e configurável pelo sujeito. O sujeito pode, assim, organizar e ordenar o cosmos à medida do seu gosto pessoal. O nosso planeta não é já a terra mas o Windows (ou o Linux, ou ...). Os ambientes gráficos enquadram o ciberespaço numa ilusão de mundo configurável pelo indivíduo.


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