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cogumelos mágicos. Mas de alguma forma estes textos foram perdidos, ou ninguém os leu, ou se os leram, não acreditaram neles, ou ficaram horrorizados com eles. É a difusão da cristandade que parece sinalizar o fim do mundo psicodélico clássico. John Allegro, um dos originais estudiosos dos manuscritos do Mar Morto - ele ficou louco, conforme a maioria das pessoas – escreveu um livro chamado “The Mushroom and the Cross” (O Cogumelo e a Cruz) no qual ele afirmou que Jesus Cristo era um cogumelo. Sempre senti que Jesus Cristo pode ser qualquer coisa que você queira que ele seja, então porque não? Historicamente, talvez este efeito anti-psicodélico teve algo a ver com o vinho, o sacramento da cristandade. O vinho mesmo, embora seja psicoativo, não é nada psicodélico como cogumelos mágicos. E o alcoól tem seus problemas. Terence McKenna tomou uma posição bastante puritana: anti-alcóol, café, açúcar, chá, qualquer desses psicotrópicos modernos. O Ocidente provavelmente perdeu o conhecimento da maior parte das substâncias de alteração mental num processo gradual paralelo à difusão da cristandade. O vinho é sacramentado, e seu potencial dionisíaco permanece, como mágica – por exemplo na missa católica, uma performance mágica em que pão e vinho viram um festim canibal, e na “função soma”, que significa que tudo são psicotrópicos. Como disse um poeta sufi: “Um bêbado nunca se tornará sábio, mesmo depois de cem garrafas de vinho, mas um homem sábio ficará intoxicado com um copo de água.” Pensem em Rabelais, por exemplo. Ele dedicou o último capítulo de seu livro ao que chamou a “Erva Pantagruelion” e é claro que ele está falando aqui de

maconha. Logo, o conhecimento psicodélico não foi nem mesmo perdido, nem mesmo na época de Rabelais. Ele foi transmitido duma forma não alfabetizada – por mulheres sábias, médicos rurais, curandeiros, e mães camponesas que conheciam sobre plantas. O conhecimento se tornou oculto, é um segredo. Rabelais está brincando com o fato de que ele está a par de algo que você não sabe. O conhecimento nunca foi perdido porque nenhuma cultura pode persistir sem alguma abertura para a consciência não-ordinária. Você tem de ter alguma válvula de escape para a civilização, mesmo se for psicose em massa. Tem de haver uma escapatória. A idéia de transformação através da ingestão de enteógenos ou plantas psicodélicas ainda não tinha sido totalmente suprimida mesmo na Alta Idade Média. O conhecimento foi condenado para o inferno. O cogumelo da psilocibina sempre esteve aqui, nunca sumiu, mas estava escondido – estou falando como Terence agora, apenas tomemos isso como uma metáfora estava escondido porque ninguém o reverenciava, ninguém o necessitava. Não foi porque Wasson tirou os esporos de suas botas em 1956, que de repente cogumelos mágicos estavam por todo o mundo de novo; foi porque alguma mudança de paradigma ocorreu na mesma época. Se Wasson não o tivesse feito, alguma outra pessoa teria feito a descoberta. Como diz Robert Anton Wilson, “Quando é tempo de motor a vapor, a coisa é motores a vapor.” A redescoberta já estava em curso desde o século dezenove quando gente como Baudelaire, Rimbaud e De Quincey, ou os românticos, entraram no haxixe e no ópio. Eles aprenderam sobre isso do mundo islâmico. Mais uma vez, de uma maneira oculta e velada, estes eram poetes maudites -


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