Revista Terminal #2 - Nov 2013

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Seu primeiro grande livro, a “Phänomenologie

coisas; ele não está expressando nada sério a res-

des Geistes,” concluído mais ou menos na época

peito de sua própria piedade ou grau de interesse.

da batalha de Jena, e publicado no início de 1807,

Ele ainda é o crítico. Sua admiração era a aprovação

completava sua separação de Schelling

do espectador. Em sua privacidade, ele permanece o que era antes, intocado pelo ardor do coração dos

lhe dirá tudo o que você fez, em poucas palavras

próprios serafins.

sobrenaturalmente precisas, por assim dizer, embora talvez altamente técnicas, um homem que

No ano de 1788, Hegel entrou na universidade de

parecerá auscultar seu coração exatamente como

sua província em Tübingen. Lá ele estudou até

um habilidoso especialista em doenças nervosas

1793, sendo interrompido um bocado em seu tra-

sondaria as misteriosas e secretas profundezas

balho acadêmico por problemas de saúde. Seu

da consciência de um paciente mórbido; mas um

principal estudo era a teologia. Um certificado

homem que é por si só aparentemente tão livre das

dado na conclusão de seu curso declarava que ele

profundas experiências pessoais de tipo emocio-

era um homem de alguns dons e industriosidade,

nal quanto o médico é livre da cogitação mórbida e

mas que não prestara uma atenção muito séria à

nervosa do seu paciente. Hegel é dotado desse tipo

filosofia. No entanto, sua leitura tinha sido muito

semiprofissional de sensibilidade em toda sua ati-

variada. Além da teologia, ele demonstrara um

tude diante da vida.

grande carinho pelos escritores de tragédia gre-

Seu primeiro grande livro, a “Phänomenologie des Geistes,” concluído mais ou menos na época da batalha de Jena, e publicado no início de 1807, completava sua separação de Schelling.

gos. Seus amigos e colegas mais íntimos e dignos de nota foram o jovem poeta Hölderlin e o próprio Schelling. Ninguém ainda havia detectado qualquer elemento de grandeza em Hegel. A amizade com Scheling agora continuava na forma de uma correspondência, que durou enquanto Hegel, como um obscuro tutor familiar, passou os anos de 1793 a 1796 na Suíça, e então, numa função semelhante, trabalhou em Frankfurt am Main até o final de 1800, quando, com a ajuda de Schelling, encontrou uma oportunidade de começar uma carreira acadêmica na universidade de Jena. Durante todos esses anos, Hegel amadureceu lentamente e não

ativo e atento do que ele para compreender, mas

escreveu nada. As cartas para Schelling são todas

também ninguém mais impiedoso para dissecar

escritas num tom bajulador e receptivo. A filo-

as mais sábias e mais tenras paixões do coração.

sofia se torna mais proeminente no pensamento

E, no entanto, não se trata apenas de inclemência

e na correspondência de Hegel conforme passa o

no seu caso. Quando ele analisa, ele não condena

tempo. Ele apela a Schelling como o líder eleito

da maneira cínica. Depois da dissecação, vem a

da mais nova evolução do pensamento, e diz que,

reconstrução. Ele separa o que considera ser o

a partir da filosofia kantiana, deve-se desenvol-

verdadeiramente humano na paixão, descreve

ver um novo grande movimento criativo, e a idéia

os interesses artísticos ou religiosos do homem,

central desse novo movimento será a doutrina do

retrata as formas mais admiráveis da auto-

eu absoluto e infinito, cujos processos construtivos

-consciência; e agora, de fato, seu discurso pode

deverão explicar as leis fundamentais do mundo.

assumir em certos momentos um tom religioso,

Hegel expressa essa noção já em 1795, quando

quase místico. Ele louva, representa com apro-

tem apenas vinte e cinco anos e Schelling ape-

vação e admira o valor absoluto dessas coisas.

nas vinte. Mas, quanto ao desenvolvimento desse

Você sente que, enfim, encontrou o coração dele

novo sistema em sua própria mente, ele pouca ou

também pulsando. Mas não; isso também é uma

nenhuma dica dá até 1800, exatamente antes de

ilusão. Uma palavra logo abre seus olhos quanto à

se unir a Schelling em Jena. Então, como confessa

postura pessoal de Hegel. Ele só está preocupado

a seu amigo, “o ideal de minha juventude teve de

com seu ofício de um professor sagaz; ele apenas

tomar uma forma reflexiva, e tornou-se um sis-

está lhe contando o valor verdadeiro e objetivo das

tema; e agora pergunto como posso retornar à vida

OUTUBRO 2013

Ninguém mais penetrante e mais delicadamente

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