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para isso ou então me deixa aqui desse jeito. E o Gil curtia. Porque o Gil falava... Eu me lembro de uma hora que começou um zum-zum no Ministério: “– Claudio é porra-louca...”. E um dia o Gil... tava todo mundo na sala dele... O Gil chama o povo e fala assim: “– O Claudio é porralouca.”. E a turma que defendia essa tese... “– Ôpa!”. “– É, mas foi por isso que eu chamei ele aqui.”312

Após os problemas que atingiram o projeto das BACs, Prado continua amadurecendo e articulando a ideia à qual havia chegado junto com os Articuladores. No evento What the Hack, que reuniu ciberativistas na Holanda, ele volta a mencionar que o Ministério da Cultura brasileiro estudava a possibilidade de distribuir um kit multimídia a áreas não privilegiadas, “[...] como uma maneira de pular do século XIX direto ao XXI, ignorando as ruas sem saída do século XX [...]”.313 Anuncia ainda que o projeto seria, ao mesmo tempo, governamental e não governamental, e que teria como objetivo “[...] empoderar movimentos ativistas num processo anárquico de construção de ‘ilhas’ de conhecimento livre [...]”. (Freire, A., 2003) Era, mais uma vez, o embrião da ideia dos Pontos de Cultura, sob a perspectiva dos commons, que finalmente viria a tomar forma com a chegada ao Ministério, em junho de 2004, de Célio Turino, o novo titular da Secretaria de Programas e Projetos Culturais, mais adiante renomeada como Secretaria de Cidadania Cultural. Turino conta em seu livro Pontos de Cultura: o Brasil de baixo para cima (2009):

Quando cheguei ao governo, o Ministério da Cultura já havia iniciado o diálogo com o movimento da cultura digital. Claudio Prado, um jovem velho hippie, capitaneava um grande número de hackers e redes sociais de software livre. [...] Realizamos um primeiro encontro. Foi em um sábado, em meio a quadros, livros e velhas mobílias, num apartamento da rua Augusta, centro de São Paulo, residência de Claudio, descendente de tradicional família paulista. Havia jovens de diversas origens, universitários, artistas, rappers, militantes sociais, mil ideias. [...] Eles discorreram sobre as possibilidades das câmeras digitais, dos estúdios de garagem, das ilhas de edição em um só computador, falaram de sampling, da composição musical a partir da mistura, da mixagem. Pedi para relacionarem um kit com esses equipamentos, com custo de até R$ 20 mil por unidade e que fosse de fácil utilização e manutenção. Diferentes de outras formas de registro cultural ocorridas no Brasil – registros de viajantes no Brasil colônia ou império, Missão Folclórica de Mário de Andrade, inventários e mapeamentos culturais mais recentes – queria uma forma de registro realizado pelos próprios agentes culturais, para as falas na primeira pessoa, por isso era necessário que o kit fosse simples e replicável. Desse encontro, nasceu o “estúdio multimídia”, um kit com câmera de vídeo, mesa de som, microfones e três computadores funcionando como ilha

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Entrevista de Claudio Prado à autora. Disponível em (www.e-estudo.com.br/Docs/sociedade_civil_soft_livre.doc). Acesso em 20/06/10.

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