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NÁDIA GERHARD À QUEIMA-ROUPA

Saiba quais os alvos que estão sob a mira da comandante mais famosa do Brasil

Entrevista: Andréia Fioaravante

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Edição: Patrícia Poitevin e Lucio Vaz

Fotos: Chico Pinheyro

Qual a importância da presença da mulher na política?

Eu entrei na política em 2016. Para as pessoas que não me conhecem, eu sou tenente-coronel da Brigada Militar, fui a primeira mulher a comandar um Batalhão de Polícia Militar, no nosso Estado. Isso me trouxe muito orgulho em assumir essa função tão importante, que é a questão da segurança das pessoas. Houve várias quebras de paradigmas, a Brigada Militar se moldando aos novos tempos, em que as mulheres, praticamente, estão em todos os segmentos. Existem mulheres comandantes de aviões, dirigindo tratores, âncoras, jornalistas e em todas as áreas. Até então, limitavam-se muito na questão da Educação e da Saúde. A Brigada Militar quebrou um paradigma, pois só os homens comandavam o Batalhão. No Rio Grande do Sul, a mulher tem cada vez mais experiência e expertise. Ela está se qualificando mais e assumindo funções muito importantes, de decisão, gerência e presidência, não apenas na área privada, mas na pública também. Nós podemos mostrar que não é só de força que precisa a Segurança Pública, mas de técnica e profissionalismo também. Eu entrei na política, quando já havia praticamente terminado o meu tempo de serviço na Corporação, fui convidada com o entendimento de que no Parlamento Municipal, Estadual e Federal, para falar de Segurança Pública, tem que ser alguém que possua legitimidade. Isso significa dar o instrumento àquela pessoa que saiba bem utilizá-lo. Eu acredito muito na força da mulher. Ela está se preparando para assumir postos de destaque. A política é um local diferenciado, em que a mulher, com todo o seu arcabouço, características e legitimidade, poderá fazer uma diferença enorme junto com os homens. Nós não desejamos tirar o lugar de nenhum homem, queremos o lugar que é devido a nós mulheres. Eu acredito que os dois possuem características e qualificações diferentes. A mulher tem um olhar mais amplo, já o do homem é mais longínquo, quando eles trabalham juntos dá muito certo, em qualquer área, principalmente na política, que precisa tanto trabalhar a engrenagem para fazer o melhor para todos.

Qual foi o principal aprendizado que ficou da Patrulha Maria da Penha?

O que nós aprendemos, na Brigada Militar, é servir e proteger. Eu sempre digo que quem mais serve e protege numa família é a mulher. As mulheres ingressaram na Brigada Militar, na década de 80, ou seja, há pouco tempo. Enquanto São Paulo já tinha mulheres coronéis na reserva, a Brigada Militar e o Estado do Rio Grande do Sul estavam engatinhando, no início do ingresso de mulheres na Corporação. Que bom que aconteceu, mesmo que tenha sido em 1985, ou seja, antes tarde do que nunca.

Na minha trajetória de 28 anos de atuação na linha de frente, houve um aprendizado mútuo. Os homens e as mulheres dentro da Segurança aprenderam a responsabilidade que todos temos, o respeito às diferenças. A Brigada Militar faz a proteção de todos, não interessa se você é uma pessoa idosa, jovem, com deficiência, branco, negro, homem ou mulher. A Brigada é o ente que possui homens e mulheres fardados representando o Estado, com o dever de agir para a proteção da sua família. Aprendi nessa minha caminhada na Brigada Militar a servir e a política é sobre isso também. Devemos servir e não nos servir dela, fazer boas escolhas perpassa em escolher pessoas que estejam abertas a servir. Na Corporação, eu tive um insight, acredito que foi por ter sido a primeira mulher a comandar um Batalhão. Eu consegui conviver e ver mais de perto mulheres, que mesmo com a medida protetiva de urgência estavam perdendo as suas vidas ou a dos filhos, sendo vítimas dessa violência familiar. O comando do Batalhão me mostrou esse todo.

Em Estrela, no 40º BPM, o meu primeiro Batalhão, eu lancei a operação “Família em Paz”, que era a Patrulha Maria da Penha com outro nome. Eu apresentei, em Porto Alegre, a operação para o secretário de Segurança, o governador do Estado e o próprio comandante da Brigada Militar, que adoraram e pediram para fazer um lançamento na capital. Eu fui transferida para Porto Alegre e comandei o 19º Batalhão, que é responsável por toda a Zona Leste. No dia 20 de outubro de 2012, eu fiz o lançamento da Patrulha Maria da Penha na capital, com seis patrulhas, que se expandiram pelo interior do Estado, fazendo história além das fronteiras, tanto do Brasil, como fora dele. Isso me deixa muito orgulhosa. É uma ideia que eu tive através da nossa vivência no dia a dia, que foi abraçada com muito vigor, credibilidade e amor pelos operadores da Segurança Pública. Eles entenderam que se nós não tivermos famílias que se respeitem, dali podem surgir outros tipos de contravenções, crimes e delitos. Assim, aquela bola de neve só tende a aumentar. A Pa- trulha está com 10 anos de atuação. Parabéns aos patrulheiros, homens e mulheres fardados que defendem as famílias!

Durante a pandemia, a procura por medidas protetivas para mulheres aumentou em 16%. Na sua visão, o que é necessário fazer para reduzir a violência contra a mulher?

Esses dois anos de pandemia, com tudo fechado, fizeram com que a violência intrafamiliar explodisse, porque havia uma aproximação muito maior da vítima e do agressor. Nós temos que deixar bem claro, que esse homem trabalha e não tem, na grande maioria das vezes, uma ficha corrida, não é assassino, não furta, ou rouba. É um homem trabalhador que, no entanto, dentro de casa se transforma e subjuga a sua esposa e os filhos. Antes da pandemia, esse homem saía para trabalhar e essa mulher tinha condições de levar o filho numa escola, ou creche. Ela tinha uma vida onde podia circular e conviver com outras pessoas. A pandemia fechou tudo e isso foi ruim para a economia, para a educação e para a questão da criminalidade, consequentemente, aumentando os casos de feminicídio. O agressor ficou muito mais próximo da vítima e os atritos foram mais seguidos. Essa mulher subjugada continuou submissa, só que de uma forma muito mais assídua.

Nós temos que ressaltar que essa é uma pauta de todos nós, homens e mulheres. Os homens têm filhas, irmãs, sobrinhas, afilhadas e mães. Por certo, os homens de bem também não querem que as mulheres das suas vidas passem por um crime, dentro do lugar que deveria ser o seu castelo, onde ela teria a proteção. Em casa, ela acaba sendo espancada, humilhada, e muitas vezes, ela e os filhos correm até risco de morte. Então, nós temos que dar para essa mulher ações afirmativas.

A violência doméstica é democrática, ela acontece em qualquer nível so- cial, para qualquer tipo de mulher, da mais tenra idade até a mais avançada, ou seja, ela aparece nas classes mais baixas, mas também nas mais abastadas. A mulher que tem dinheiro não usa o serviço público. Não precisa pedir para o agressor sair de casa, porque normalmente eles têm uma casa na praia ou serra e ela pode contratar o seu próprio advogado. O maior percentual de violência acontece com as mulheres na faixa etária, de 18 a 32 anos, que não trabalham, não terminaram os seus estudos, principalmente, o Ensino Fundamental e têm de dois a três filhos.

O problema começa com a dependência econômica. A mulher, assim como o homem, tem que ser protagonista da sua vida, com independência econômica. Por isso, nós temos que dar oportunidade para essa mulher estudar, se profissionalizar e ter um emprego. Antes disso tudo, eu não posso pegar uma mulher que está vulnerável, sensível, que já apanhou e dizer: “agora tu vai trabalhar”. Não acontece assim, eu preciso fortalecê-la psicologicamente e fazer um trabalho de coaching. Ela tem que entender a sua importância dentro da família, da sociedade, do bairro e da sua cidade, para que depois de fortalecida volte a estudar, tenha uma profissão e seja protagonista da sua vida e da sua família. Muitas acabam retornando para o agressor, mas com um outro olhar e eles acabam respeitando essa mulher, porque ela também coloca dinheiro dentro de casa.

O livro “Patrulha Maria da Penha: o impacto da ação da Polícia Militar no enfrentamento da violência doméstica” foi relançado recentemente. Conte-nos sobre essa obra que a senhora escreveu.

Esse livro surgiu da necessidade de nós vermos como estava sendo percebida a questão da Patrulha Maria da Penha, pelos atores importantes, que trabalhavam na questão da violência doméstica. São os juízes, promotores, defensores públicos, a pró- pria Brigada Militar, através dos seus patrulheiros, e o mais importante, as vítimas que são atendidas. Eu queria registrar de que forma a Patrulha modificou, ou não, a vida dessas pessoas. O livro veio exatamente para isso. Em 2003, quando foi lançada a primeira edição, nós mostramos o início, como tudo começou no Batalhão do interior, na cidade de Estrela. Ele aborda a importância da Brigada Militar se fazer presente em todos os momentos, nos mais diversos níveis da violência doméstica, porque até existir

A violência doméstica não acontece de segunda a sexta-feira, no horário comercial. Ela ocorre à noite, quando tudo está fechado, ou no final de semana, quando os órgãos públicos não estão em funcionamento, e quem está fazendo o policiamento ostensivo nas ruas é a horário comercial. Ela ocorre à noite, quando tudo está fechado, ou no final de semana, quando os órgãos públicos não estão em funcionamento, e quem está fazendo o policiamento ostensivo nas ruas é a Brigada Militar. Eu consegui, através de toda força do Comando Geral da Brigada Militar, dos colegas oficiais, do sargento e dos soldados, mostrar a importância da Corporação nesse circuito todo, porque não era na porta do Judiciário que essas mulheres pediam o auxílio para levá-las ao hospital, ou para fazer um registro. Elas ligavam para o número de telefone 190 da Polícia Militar. A Patrulha Maria da Penha entrou no circuito por conta disso. a Patrulha Maria da Penha, a Brigada não estava inserida no circuito de proteção das mulheres.

Eu me lembro que, em 2013, abriu um edital do Ministério da Defesa, para encontrar ações que combatessem a violência doméstica. A participação estava restrita ao Judiciário, Polícia Civil e ONGs que trabalhassem com a questão da mulher. Eu inscrevi a Brigada Militar, através da Patrulha Maria da Penha, para a aquisição de: 33 viaturas, que trabalhariam só com violência doméstica; de computadores para que tivéssemos o acesso rápido ao nome do agressor e colocar o registro da vítima também; de coletes; armas Taser, as armas de choque, e telefones. Eu pedi autorização ao comandante geral, para ir à Brasília conversar com o Ministério da Defesa. Agendei uma audiência, fui atendida e apresentei a Patrulha Maria da Penha. Eles ficaram encantados, nunca ninguém tinha visto que a Polícia Militar tinha esse potencial. Nós conseguimos comprar todos esses equipamentos, porque o edital beneficiou a Brigada, entendendo a importância do projeto.

Os atores fundamentais para atuar na violência doméstica, através da Lei Maria da Penha, eram o Judiciário, com o Ministério Público, a Promotoria e a Defensoria Pública, junto com a Polícia Civil. A nossa Corporação não estava ali. Eu comentei que ela estava 24 horas na rua, sete dias por semana. A violência doméstica não acontece de segunda a sexta-feira, no

O relançamento do livro, depois de 10 anos, é para mostrar a história de mulheres que foram vencedoras. Essas mulheres e os patrulheiros dão o seu depoimento no livro. Eu chamo de histórias verdadeiras, com atores verdadeiros, mostrando a importância de todos. Nós, cidadãos de bem, devemos nos unir e dizer não para a violência de qualquer tipo, seja contra mulher, ou criança. Quero deixar o meu agradecimento aos patrocinadores desta obra: a Associação dos Oficiais da Brigada Militar e Bombeiros do Rio Grande do Sul; a Fundação Walter Peracchi de Barcellos, através do seu querido presidente, Dr. Roberto Alexandre dos Santos e o Grupo Educacional João Paulo. Uma entidade que trabalha com educação fez questão de ser uma das apoiadoras desse relançamento, porque entendeu que através da Educação, nós podemos mudar essa cultura de violência intrafamiliar, que não faz bem para ninguém.

Qual a sua opinião sobre a redução da maioridade penal?

Eu vejo com bons olhos, porque hoje um adolescente de 16 anos vota, ele tem responsabilidade, se o jovem pode escolher o presidente da República, o governador e os parlamentares, ele também tem responsabilidades criminais. Nós sabemos que qualquer criança com três anos identifica o que é certo e errado. Se a mãe diz para não mexer aqui, porque é fogo e pode queimar, a criança sabe que não pode ir ali. Assim como as crianças de nível escolar sabem que não é certo pegar a borracha do coleguinha, porque não pertence a ele, assim é na questão do crime também. Os jovens de 16 anos têm muita capacidade, para saber o que é certo e errado. Com a minha experiência na Brigada Militar, nós sabemos que os jovens estão abusando dessa questão de não serem maiores de idade, para cometerem um maior número de crimes, delitos e contravenções. O maior passa para o menor, porque dá menos problema. Nós sabemos, também, que alguns menores só têm a idade, porque às vezes são maiores que nós, que estão armados, traficando e com posse de entorpecentes. Eu vejo que quanto mais apertarmos a questão da legislação penal, mais rápido nós conseguiremos colocar o trem nos eixos. Na América Latina, nós ainda somos o único país que tem 18 anos como a maioridade penal. Em outros países, com até 12 anos, eles já respondem criminalmente.

Eu sou a favor da redução da maioridade penal, para termos a punição e sermos fortes. Infelizmente, aqui no Brasil parece que o crime compensa. Nós ficamos até indignados, chocados e perplexos ao ver que um ex-condenado, que foi condenado em três instâncias, por mais de 10 desembargadores, simplesmente teve os seus crimes anulados, porque o local estava errado. Vou dar um exemplo, alguém entra na sua casa, mata um ente querido e é julgado. Ele será condenado a 30 anos de cadeia, mas o juiz cancela o julgamento, porque essa pessoa que entrou na sua casa, em Esteio, foi julgado nesse município, mas deveria ter sido em Porto Alegre. O crime continua e o seu ente querido está morto. Não se pode anular tudo, mas foi isso que aconteceu. Então, a nossa Justiça precisa realmente ter um equilíbrio na balança, não pode o ladrão de galinhas sofrer penalidades duras, enquanto o ladrão de colarinho branco está solto, pronto para cometer outros crimes.

Nessas eleições, a senhora se candidatou a uma vaga no Senado. O que a levou a abrir mão da sua candidatura?

Ninguém é candidato de si mesmo, nós temos que ser candidatos de uma coletividade. O meu partido, o Progressistas (PP), entendeu que eu seria a melhor opção, naquele momento, para o Senado. Uma vez que tínhamos o querido senador Luis Carlos Heinze, como candidato ao governo do Estado, junto com a Tanise Sabino de vice, nós teríamos que construir uma chapa completa. Eu aceitei e fizemos uma campanha belíssima, que desbravou os 497 municípios. Em muitas regiões fomos muito bem recepcionados, as pessoas entenderam as nossas propostas. Eu fui a única candidata ao Senado, na história do Rio Grande do Sul, que apresentou um plano de mandato, porque oito anos é muito tempo para ser improvisado.

Enfim, desistimos, porque nós temos um projeto coletivo. O meu projeto pessoal é ter a minha família. Sou muito bem casada, tenho três filhos lindos, que estão encaminhados na vida, a minha casa, o meu carro e a minha profissão definida. Já estou na reserva da Brigada Militar e tenho a minha arma para me defender. Quando eu entrei na política, ingressei para um projeto coletivo de defesa da nação. Naquele momento, nós estávamos vendo que, por mais linda que fosse a minha campanha, nós não estávamos alcançando o nível desejado para essa única vaga do Senado. Percebemos que o candidato do PT/ PSOL, com o mandato coletivo, estava muito à frente, a candidata do outro partido despencando e o General Mourão tentando chegar e não conseguindo. Com a votação que eu teria, se metade migrasse para o Mourão, ele estaria eleito, tirando o PT/PSOL de qualquer condição de ser eleito, que é a minha pauta. Eu não quero o PT no Governo, ou no Senado. Eu não quero o PT, porque eu não gosto do partido e ele tem ideias retrógradas, que são para o seu umbigo, para a camaradagem, para a companheirada, não é para a melhoria do Estado ou do País. Então, resolvi renunciar e agradeço àquelas pessoas, que confiaram no meu nome e que votariam em mim. Naquele momento, quando eu renunciei e disse para votar no Mourão, pelo bem do nosso Brasil, acreditaram na Comandante Nádia. Nós conseguimos juntos fazer com que o Mourão fosse o nosso senador.

Quais as suas considerações finais?

Primeiro, é muito bom ser entrevistada por ti, Andréia, que é uma mulher com os mesmos valores que os meus. Obrigada pelo programa Em Evidência na TV, por todo o carinho. Eu também sinto muito carinho por vocês. Desejo que o ano de 2023 seja próspero, que nós possamos continuar nas nossas ideias. Eu sou uma mulher de posição, nunca você vai me ver numa atitude titubeante, ou sem saber para que lado eu vou. O meu lado é da defesa das famílias, dos empreendedores, desses que dão trabalho para as pessoas que precisam de renda ter condições de colocar comida dentro de casa e cuidar dos seus filhos. O meu lado é o da Educação, da Escola Cívico-Militar, que tomou um golpe agora de não poder mais acontecer, no Rio Grande do Sul. Isso é um absurdo. O meu lado é das liberdades, de ir e vir, de expressão, porque nós vivemos num país bom, pagamos os impostos e temos o direito de nos manifestar, quando não gostamos e falar o que bem entendermos, desde que respeitemos a liberdade do outro. Eu quero uma polícia cada vez mais forte, porque não sou a favor da liberação das drogas e nem do aborto. Eu sou pela vida e eu a quero para todos nós. Quero muita esperança, paz, saúde e muito amor nas famílias, em 2023. Contem comigo! Me sigam nas redes sociais @comandantenadia.