Revista Grajaú Edição 15

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Revista

GRAJAÚ Ago/Set - 2020 | Ano 5 | nº 15 Distribuição Gratuita

Pagode da 27 completa 15 anos de alegria transporte público em tempos de pandemia

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O mundo das conexões culturais e empatias

Grajaú enfrenta pandemia com solidariedade coletivos e projetos distribuem cestas básicas para famílias atingidas pela crise


Quem Somos

Expediente

O Expressão Cultural Periférica, o ECP, é um coletivo de comunicação e cultura que surgiu em 2012 e atua na articulação sociocultural na região do Grajaú, Extremo Sul da cidade de São Paulo. Nosso objetivo é documentar e divulgar ações culturais e sociais que Coordenação Editorial e Edição acontecem especialmente na região Valéria Ribeiro onde estamos localizados e contribuir MTB 46.158 com o fortalecimento da identidade do território. Atualmente atuamos em três Equipe núcleos: EDUCAÇÃO: Com oficinas de Aécio Magalhães diversas linguagens em espaços Barbara Terra parceiros e em nossa sede. Gi Barauna PESQUISA: estudo aprofundado e Guilherme Zillieg criação do Centro de Identidade do Juliano Angelin Grajaú, o CIG, e a produção do livro Histórias e Memórias do Grajaú. Ricardo Negro COMUNICAÇÃO: A publicação de Sarah Stephanie nossa revista, antiga ECP, e agora Susy Neves Revista Grajaú é o projeto com Valéria Ribeiro o qual conseguiremos contribuir grandemente para o nosso território. Foto Grande da Capa: Ricardo Negro ECP GRÁFICA: criamos a ECP Gráfica em 2016, por necessidade de imprimir nosFotos menores da esquerda para sa própria revista, que nasceu em 2014. direita: Hoje ela funciona para a comunidade 1) Entregas de Cesta Básica pelo em geral e articula fortemente com os coletivo ECP; coletivos culturais e sociais do Grajaú. 2) Doblo do coletivo ECP com doações ESPAÇO CULTURAL ECP: No ano de recebidas pelo Grajaú Faz Assim; 2019 nosso coletivo foi contemplado 3) Coletivo Grajaú Faz Assim com Gi pelo 3º Edital do Fomento à Periferia, Barauna do ECP; que patrocinou a construção do Espaço Cultural ECP, anexo a nossa gráfica. Projeto Gráfico e Diagramação Nossa sede abriga a Biblioteca Comunitária Aurelina & Elisa e nosso espaValéria Ribeiro ço de informática, com computadores com internet a disposição da comuniImpressão dade gratuitamente. Em nosso Espaço ECP Gráfica & Serviços Cultural também acontecem diversos Tiragem: 8000 Exemplares cursos, todos abertos a comunidade.

E-mail: ecpgrafica@gmail.com

Espaço Cultural & Gráfica ECP Rua Boaventura Ferreira, 159 Jardim Reimberg (Grajaú) Cep 04845-160 - São Paulo-SP reportagem@revistagrajau.com.br anuncie@revistagrajau.com.br (11) 95854-6101

REALIZAÇÃO

PATROCÍNIO

2 REVISTA GRAJAÚ AGO/SET de 2020 www.revistagrajau.com.br

Missão: Revista Grajaú Nossa missão é difundir informações sobre o Extremo Sul de São Paulo através de um novo olhar, apresentando com nossas matérias possibilidades para melhorar a vida de quem mora na região, incentivando com isso que se sintam parte do bairro em que residem, estimulando a produção cultural, ações sociais, a economia colaborativa, o desenvolvimento local, a tolerâcia à diversidade e o respeito a todas as formas de vida.

VALORES

Qualidade editorial com excelência e inovação; Informações claras, úteis e comprometidas com a realidade dos leitores. Otimismo e afeição pela região, destacando as qualidades e refletindo soluções para os problemas.

Sumário 03 CARTA AO LEITOR Grajaú é o meu país! 04 ARTIGO Volitando - Maria Vilani 05 GRAJAÚ, MINHA CIDADE Pandemia no Grajaú: Direitos e Deveres 06 GRAJAÚ, MINHA CIDADE Transporte 07 EDUCAÇÃO Realidade Periférica 08 NA QUEBRADA Distanciamento Social 09 CULTURA 15 anos de Pagode da 27 10 CAPA Grajaú enfrenta pandemia com solidariedade 12 ADOLESCENTE SAUDÁVEL O Programa Adolescente Saudável 13 SAÚDE A Importância do Autocuidado 14 JOVENS DA QUEBRADA Sobre Crianças e Adolescentes 15 CULTURA Ser Ajardinado 16 CULTURA O mundo das conexões e empatias 17 CULTURA Tempos de Pandemia 18 TERRA INDÍGENA São Paulo é território indígena 19 PASSATEMPO revistagrajau revistagrajau Expressão Cultural Periférica (11)95854-6101


Carta ao Leitor

“Grajaú é o meu país!

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uem diria que viveríamos algo assim em pleno Século 21. Conhecedores dos escritos históricos, fictícios ou não em nosso percurso escolar, lemos sobre muito deles imaginando se ocorreu ou não!

Penso que o único ser contemporâneo nesse planeta que imaginou ver e/ou viver algo tão assustador foi o Raul que escreveu há mais de 40 anos a canção “O dia em que a terra parou”, relatando cenas profetizadas como as que vimos em 2020 durante a pandemia causada pelo COVID 19. Uma das únicas estrofes que não “previu” foi quando disse: que o médico não teria mais doença pra curar’, ainda temos poeta, infelizmente temos, e não é só doença viral não!

Quarentena, isolamento social, lockdown, grupo de risco, platô, hospitais de campanha, diversas fases, cada um com seu nome e ocasião. Tantas internações, tantos anseios, tanto descaso, quantas mortes! Nessa crise pandêmica o Grajaú chegou a ser o quarto distrito de São Paulo mais afetado pelo vírus, por diversos motivos, por várias questões públicas que se for mencionar não haverá páginas para descrever, mas, escrever um pouco mais, isso eu posso. Aprendemos desde cedo a driblar as dificuldades, a superar as adversidades, muitos de nós Grajauenses dribla um, dribla dois e lá na zona de ataque adversária nem pensa duas vezes vai e chuta pro gol, é assim que realizamos nossos ataques, escrevendo, recitando, grafitando, adquirindo conhecimento, pintando, compondo, trabalhando duro para poder dizer que nosso Grajaú é mais! Grajaú não é um número a ser contabilizado, não somos estatísticas, somos pessoas!!!! Grajaú é arte! O Grajaú é vida! O Grajaú não é uma simples vela de cera, com uma tímida luz e que se consome mais rápido com o simples sopro do vento. Grajaú é tocha que brilha, iluminando intensamente, nos clareando e nos conduzindo a novos caminhos. Temos o poder dentro de nós. E o orgulho em poder dizer: GRAJAÚ É O MEU PAÍS!!!!!

Por Gi Barauna

AGO/SET de 2020

REVISTA GRAJAÚ 3 www.revistagrajau.com.br


Artigo

volitando Volitando, é assim que encontramo-nos, sempre errantes, sem paradeiro. Chega a fadiga, companheira de todas as horas, dias eternos... Não há um cais para aportar nossa sensibilidade. Há um vírus que pulula no espaço, num tempo interminável. Muitas armas de defesa, todas vãs. Sem um antídoto, guardamo-nos como preciosidades em arcas, porém para o vírus não há lacre. Usamos máscaras, luvas, gel e medo para transitar o mundo lá fora. No mundo dentro da arca notícias aterradoras, imagens da dor. Perda, luto, correntes de orações, todas as crenças irmanadas em preces pela cura do Planeta. Ele está doente? No mundo de fora, dois pólos, num o desemprego, a fome, o abandono, solidariedade, irmãos ajudando irmãos e chorando seus mortos. Noutro, o sarcasmo, a negação da força do vírus, o conforto, um irmão amparando o outro na dor do luto. E assim, seguimos volitando entre um pólo e outro, nessa dicotomia que escancara as desigualdades sociais e o descaso daqueles que se intitulam donos do poder. No pólo das carências uma luz iluminando as consciências, a dizer aos deserdados da sorte que eles, são os verdadeiros donos do poder. Sem eles o Planeta para, não há produção de riqueza que proporciona conforto aos pseudo poderosos. No pólo da abastança, digladiação entre as lideranças, falta de entendimento quanto aos procedimentos de como agir numa situação em que o invisível ataca por todos os lados. Sem orientação de onde e como construir obstáculos ao inimigo, erguem barricadas contra os habitantes do pólo das carências.

Por Maria Vilani 06/08/2020 – 09h14 4 REVISTA GRAJAÚ AGO/SET de 2020 www.revistagrajau.com.br


Grajaú, Minha Cidade

pandemia no grajaú: Direitos e deveres Por Valéria Ribeiro

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maior número de pessoas circulando fora de casa com a flexibilização da quarentena faz com que seja realmente desafiador controlarmos a propagação do vírus, e para quem vive nas áreas mais pobres o problema é muito maior. Vivemos entre o descaso do governo e uma parcela da população que vive como se não tivéssemos enfrentando uma situação digna de um filme de Hollywood, com um vírus mortal descontrolado matando milhares de pessoas pelo mundo. No Grajaú os direitos são violados diariamente e essa situação reflete na forma com que a propagação do vírus acontece aqui. Em uma pesquisa divulgada no mês de julho que foi realizada em conjunto entre cientistas, médicos da Universidade de São Paulo e a Secretaria de Saúde do Estado, mostra que a prevalência da COVID- 19 tem nítido caráter de classe pois a cor da pele, a classe social, o nível de escolaridade e a desigualdade fazem os números de contágio e morte disparem aqui. A pesquisa mostrou que negros têm 2,5 vezes mais riscos de contrair a doença; e em bairros periféricos, a incidência é quase três vezes superior à das áreas ricas. Enquanto na população mais pobre a prevalência é de 16%, nos bairros mais ricos ela é de 6,5%. O dever do Estado é melhorar nossas condições, pois pagamos impostos, elegemos nossos representantes e temos nossos direitos. No entanto temos deveres também. Tem pessoas que, apesar de poderem contribuir para

a diminuição da propagação da doença, continuam a não se importar com a sua vida e muito menos com a do outro. Temos de pensar nas famílias que perderam seus entes queridos, e que poderiam ser nossos familiares. Precisamos respeitar os que precisam trabalhar fora de casa e se expor ao risco de contrair o vírus no deslocamento para o trabalho e em diversos lugares. Sabemos que tem pessoas que não podem ficar em casa pois precisam trabalhar para colocar comida na mesa e alimentar seus filhos e em uma situação extrema assim tem de ir para rua mesmo, não há o que fazer. Mas e aqueles que estão em uma situação “menos pior”, por que passam o dia na rua, sem máscara, em aglomerações, ajudando a propagar o vírus? É impossível ficar o tempo todo em casa, mas ao sair devemos tomar os cuidados necessários, pois ainda não temos vacinas, portanto devemos seguir os protocólos para evitar a disseminação do vírus. Nós temos de ajudar a cuidar de nossa comunidade, pois em grande parte o poder público não se incomoda muito com as vidas das margens da cidade, então temos de lutar por nossos direitos, mas também temos os nossos deveres, como cidadão e como seres humanos. Devemos exercer a empatia, se colocar no lugar do outro, e é aqui na quebrada que devemos fazer isso pois os poderosos só querem, em sua maioria, engordar a conta bancária e permanecer no poder enquanto os nossos morrem e entram para as estatísticas.

Notícias da Pandemia no Grajaú DIA 16.05.2020 Grajaú lidera em mortes suspeitas. DIA 22.05.2020 Grajaú registra morte a cada seis horas. DIA 03.06.2020 Grajaú lidera desrespeito ao isolamento social na Capital Paulista. Números de Casos Confirmados no distrito: 6.726. DIA 04.08.2020 O Grajáu é um dos três bairros com mais mortes por Covid-19 em São Paulo. Entre os dias 11 de Março e 03 de Agosto o Grajaú registrou cerca de 360 óbitos. MORTES 17.04.2020 - 33 mortes 30.04.2020 - 35 mortes 06.05.2020 - 86 mortes 20.05.2020 - 149 mortes 03.06.2020 - 183 mortes 03.08.2020 - 360 mortes

Conheça os métodos de transmissão do coronavírus A transmissão dos subtipos do coronavírus pode se dar por 3 formas: Vias respiratórias, através do ar e de gotículas provenientes de espirros, tosse ou da fala de indivíduos infectados; Contato físico, como beijos, abraços e apertos de mão; Por meio de contato em superfícies contaminadas, como corrimões, maçanetas, roupas etc. REVISTA GRAJAÚ 5 AGO/SET de 2020 www.revistagrajau.com.br


POR AÉCIO MAGALHÃES

Como se proteger no transporte público lotado em época de pandemia? Reportagem e foto: Aécio Magalhães

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os últimos meses, devido a pandemia do novo coronavírus, temos observado os diversos meios de prevenção da doença que vem sendo adotados pela população. Os estabelecimentos, as empresas, os comércios de rua, todos tiveram que se adaptar em higienização e circulação do fluxo de pessoas. Mas e o transporte público, qual a solução aplicada para contenção do vírus? O transporte público sempre foi um problema na questão da superlotação, é um dos locais de maior preocupação, pois a quantidade de pessoas transportadas em ônibus, trens e metrôs não mudou durante a pandemia. As condições de embarque não são muito favoráveis e a população se depara com filas imensas, sem o distanciamento social adequado e ainda embarcam em ônibus com as janelas fechadas. Eliane Bispo, moradora do Grajaú sai de casa para o trabalho às 04:30 da manhã, no horário considerado de pico, e tem presenciado o cenário do transporte público: “de manhã pego ônibus e trem e tenho observado que a lotação de pessoas continua, mesmo em tempos de coronavírus. A gente se protege ao máximo e tenta evitar a aglomeração, mas as vezes é impossível”. Os ônibus que chegam ao Terminal Grajaú são extremamente lotados e quando os passageiros desembarcam há uma equipe de profissionais que se encarregam de higienizar os ônibus por alguns minutos. Nota-se uma tentativa de minimizar os riscos para diminuir a infecção pelo vírus, mas ainda não é suficiente. O problema maior dos ônibus são a demora em sair e não há fiscalização para verificar a quantidade dos embarques de passageiros e das aglomerações. Os pas6 REVISTA GRAJAÚ AGO/SET de 2020 www.revistagrajau.com.br

sageiros ficam inseguros ao utilizar o transporte público. O Terminal Grajaú ainda dá acesso aos trens da CPTM, linha 9 Esmeralda, e o cenário também não é dos bons. O trem que liga o Grajaú a Osasco também é muito cheio. Bianca de Castilho não é moradora da região, mas tem vindo ao Grajaú todos os dias, por questões pessoais, e no último mês tem presenciado a situação do trem: “Geralmente pego o trem em Pinheiros entre 16:30 e 17:00, horário de pico e a lotação é muito intensa. As pessoas fazem de tudo para embarcar. Um cenário tenso demais e não podemos esquecer que estamos vivendo em plena pandemia”. Aos sábados os trens circulam em intervalos de aproximadamente 20 minutos. O tempo de espera nas plataformas deixa os passageiros aglomerados e até se esbarram quando tentam embarcar e desembarcar. Infelizmente muitas pessoas precisam utilizar o transporte público, principalmente para ir trabalhar. Agora com a flexibilização do isolamento social o número de pessoas nos transportes aumentou. Para nos protegermos alguns itens básicos fazem toda a diferença como: use máscara, tente manter um distanciamento mínimo de 1 metro dentro de ônibus e trem (quase impossível, mas precisamos tentar), durante o trajeto evite tocar o nariz, boca e olhos, evite manusear objetos e sempre que possível higienize-os com um pano e álcool. Precisou segurar nos dispositivos do transporte, ao descer lave sempre as mãos com água e sabão pelo menos por 20 segundos e utilize álcool em gel. O transporte público é grande foco de contágio e quanto mais longa a viagem for, maior será o risco de contrair covid-19. Por isso precisamos focar nas medidas de proteção e nos cuidar ao extremo até vencermos esse vírus.


Educação

Como a realidade da periferia interfere no Por Barbara Terra processo da educação Por Gi Barauna

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novo coronavírus alterou a rotina escolar do mundo inteiro. Sem aulas presenciais desde meados de Março, professores e alunos paulistas depararam-se com diversos desafios e vivem aventuras épicas para se adequar ao novo formato de ensino, conhecer de um dia para a noite as ferramentas para montar conteúdos online, ensinar, transmitir conhecimento. Na periferia, onde muitos alunos e professores só têm o acesso a meios tecnológicos como o telefone celular, acompanhar as atividades não foi tarefa fácil aos profissionais da educação. Fiz contato com alunos, professores e coordenadores que confirmaram as dificuldades que enfrentam nesse momento. Yasmin Costa dos Santos é aluna do 9º ano da EE Benedito Célio da Siqueira, diz: “Acredito que dentre os meus amigos e pessoas que eu conheço, eu sou a que não têm tantos problemas financeiros, meus pais conseguem me dar uma vida estável e com alguns luxos como cursos, eu tenho um aparelho celular bom, o que aqui na periferia já é algo maravilhoso. Mas conheço pessoas que se alguém da família tem celular é um que já é mais antigo ou que está em um estado ruim, então é difícil você realmente conseguir estudar com esse tipo de aparelho. Já não é fácil estudar na escola quando não tem livros ou apostilas para todos, imagina em casa onde você quase não tem um celular? Ou não tem um plano de internet e não consegue mandar as lições. Eu me sinto triste, pela situação que essas pessoas passam, e ao mesmo tempo com raiva, de um país que é tão desigual economicamente. O Governo do Estado de São Paulo criou o Aplicativo do Centro de Mídias do Estado de São Paulo com aulas ao vivo seguindo as normas e as habilidades exigidas pela BNCC (Base Nacional Curricular Comum) que define o conjunto das habilidades essências de ensino durante o período escolar. As aulas são gravadas por professores das diversas disciplinas para que alunos e professores possam assistir. As habilidades também são transmitidas pelos canais da TV Educação e TV Unifesp, na TV aberta, tudo isso é muito importante, mas tem aí o ponto que a Yasmim apontou, a internet. Professores e alunos podem assistir, mas precisam ter pelo menos dados móveis no celular. O app não gasta do seu pacote de dados, mas se você não tem pacotes de dados você não acessa, deu pra entender? Mônica Gomes é coordenadora da mesma escola que Yasmin estuda e reforça a dificuldade da internet na periferia. “Aqui no extremo internet de boa qualidade e

Mônica Gomes é coordenadora da escola EE Benedito Célio da Siqueira crédito no celular são para poucos. Muitos alunos esperam os pais chegarem do trabalho para utilizarem os celulares para realizar alguma atividade. Sem falar no despreparo de muitos professores para utilização das ferramentas disponíveis no mercado”. Ao pensar o quadro docente Monica os defende, justificando que muitos são da época que o ensino era tradicional, onde o uso exclusivo da aprendizagem era apenas o livro, giz, lousa e a garganta. “De uma hora para outra fomos obrigados a trabalhar remotamente e com uma defasagem enorme tecnologicamente falando, tanto para os professores como para os estudantes. Eu pensava que os jovens tirariam de letra, mas muito pelo contrario, eles também tiveram enorme dificuldades, encontramos alunos que não sabiam redefinir senha e enviar um email, anexar um documento. A gestão pública até disponibilizou inúmeras opções tecnológicas, mas do que adiantou se muitos não sabem nem utilizar um computador? Sirlei Gomes, professora de matemática da Escola Estadual Irmã Chalita, diz: “Uso algumas estratégias de engajamento para que a aula não fique apenas na exposição de conteúdo. Nuvem de palavras, quiz e votações sobre a própria dinâmica das aulas são algumas possibilidades bem recebidas pelos alunos. Nessa época de pandemia, acabamos dando aula para alunos e pais, percebi também que eu me tornei a aluna, pois a cada dia aprendo um aplicativo diferente para aplicar em aulas remotas”. Continua ela: “Essa troca de experiência acrescenta muito no processo de ensino aprendizado”. O momento pediu a todos nós uma readaptação e nas escolas públicas não foi diferente. A realidade é caótica, professores trabalhando excessivamente para dar conta das novas ferramentas de trabalho. Finalizo com mais um desabafo da coordenadora Mônica “Aí vemos várias postagens de pais nas redes sociais dizendo que não estamos trabalhando, que somos vagabundos. Falam sem saber da realidade que enfrentamos para conseguir dar conta do que nos foi solicitado. Lutamos tanto por uma educação de qualidade e quando necessitamos da união de todos, somos apedrejados”. AGO/SET de 2020 REVISTA GRAJAÚ 7 www.revistagrajau.com.br


Na Quebrada

A importância do distanciamento social para conter a pandemia no Grajaú Por Aécio Magalhães

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ste ano de 2020 o mundo atravessa um dos momentos mais críticos dos últimos tempos. Atualmente todos os continentes estão em estado de atenção devido a pandemia do novo coronavírus, um vírus que causa infecções respiratórias e seus sintomas podem ser leves como um simples resfriado ou mais graves como o comprometimento dos pulmões causando a síndrome respiratória aguda que pode levar a morte. Em março deste ano foi decretada quarentena em todo o estado de São Paulo e a medida fechou todos os estabelecimentos que geravam aglomerações como por exemplo academias, escolas, universidades, shoppings, etc... O funcionamento ficou permitido apenas para os serviços essenciais, o objetivo da ação era uma só: conter a propagação do vírus. Junto com a quarentena veio o distanciamento social, que é um conjunto de medidas com a finalidade de afastar as pessoas uma das outras e assim evitar que o coronavirus seja transmitido facilmente e atinja muitas pessoas ao mesmo tempo. Segundo o Ministério da Saúde, a recomendação é que uma pessoa fique pelo menos dois metros de distância da outra, principalmente em locais públicos e fechados, pois esses ambientes são mais propensos a circulação do vírus. Os estabelecimentos que estão em funcionamento também devem promover ações que visam o distanciamento social. Essa doença grave pode ser transmitida por gotículas expelidas por quem está infectado e a porta de entrada do vírus é o nariz, a boca e até mesmo os olhos. Sempre que tocar objetos é importante AGO/SET de 2020 8 REVISTA GRAJAÚ www.revistagrajau.com.br

Feira livre no Grajaú, situada na Rua São José do Rio Preto (conjunto habitacional Brigadeiro Faria

higienizar as mãos com água e sabão. O distrito do Grajaú, no cenário do covid-19, está entre os três bairros com maior mortalidade na cidade de São Paulo, os dados são da prefeitura da capital. Nos últimos meses temos observado muitas pessoas da região circulando sem máscara, realizando festas, eventos e se aglomerando em supermercados, bancos, feiras e bares. Por outro lado, a maioria dos estabelecimentos da região estão funcionando com os devidos cuidados, mas infelizmente não são todos. É preciso ter os cuidados mínimos e necessários e sempre com medidas de proteção, pois quanto maior o número de infectados, maior a superlotação dos hospitais podendo gerar um colapso na saúde pública e privada. Vale lembrar, ainda, que existem as pessoas assintomáticas, que é quando o cidadão pega o vírus, mas não sente os sintomas da covid-19, ou seja, dificulta ainda mais a contenção da doença. Vitor França, jornalista e trabalhando desde o inicio

da pandemia possui uma pessoa no grupo de risco em sua casa e sabe da necessidade de manter-se longe das aglomerações: “É importante mantermos o distanciamento social para que essa doença terrível não evolua. Eu convivo com uma idosa, e por ela ser do grupo de risco tento ao máximo me proteger e não me aglomerar, tenho cuidados ao acessar o transporte público e outros locais com grande número de pessoas. Além disso, higienizo as mãos a todo momento”. Caros grajauenses, chegamos à marca de mais de 100 mil mortes no Brasil. Essa batalha só será vencida se todos se empenharem e se ajudarem. Por isso reforçamos aqui a importância de usar máscara, lavar bem as mãos, usar e

abusar do álcool em gel e sair de casa apenas quando for necessário, e claro, mantendo o distanciamento correto e evitando aglomerações. Se cada um fizer a sua parte, mais rapidamente poderemos voltar a ter uma vida relativamente normal. Eu me protejo e ajudo a proteger você e sua família! faça o mesmo também!


Cultura

Pagode da 27

15 anos de amor e dedicação a música e ao Grajaú Por Valéria Ribeiro uando Ricardo Rabelo, Jeferson Santiago, Lerinho e Nenê Partideiro se reuniram para tocar naquele bar no dia 26 de agosto de 2005 na rua Manoel Guilherme dos Reis, mais conhecida como rua 27, não imaginavam que estariam comemorando 15 anos depois o aniversário de um projeto vitorioso e que inspira muita gente no Grajaú. O Pagode da 27 representa uma das forças culturais e sociais do bairro, pois não é só um grupo musical, é um grupo musical com endereço, que busca levar o bairro, representar e difundir sua cultura. Hoje eles tem uma legião de seguidores e fãs que comemoraram no último domingo dia 30 em uma live com muito samba e emoção essa data festiva. Por conta da pandemia eles não puderam fazer o que mais gostam, se juntar na comunidade para tocar, mas quem quiser saber como foi pode visitar o canal do grupo no Youtube, que traz uma mensagem emocionante e a comemoração merecida para essa galera que representa nossa quebrada. Para conhecer um pouco mais da história desse projeto tão importante para a comunidade do Grajaú conversamos com Flávio Sarmento, 30, que começou a frequentar a roda de samba em 2013 e em 2018 passou a fazer parte como voluntário e hoje coordena a parte social e a biblioteca, quem vem desenvolvendo um trabalho primordial junto as crianças da comunidade com o projeto “Meu livro do mês”. Ele conta que o projeto foi crescendo de forma natural, e o pessoal percebeu que o público foi criando uma identificação e começaram a ajudar, levando alimentos para serem doados para famílias carentes. “Essa prática de levar alimentos virou uma referencia”. As pessoas começaram a entrar em contato com eles quando precisavam de cestas ou as pessoas indicavam famílias que precisavam. “O pagode da 27 não é só um grupo musical que toca aos domingos. O pagode da 27 tem uma identificação com o bairro, carrega um ideal de melhoria”. Por isso decidiram arregaçar as mangas e voluntariamente tomar a iniciativa de ajudar da forma que podem. Hoje tem uma equipe de cinco pessoas que contribui com esse trabalho de distribuição de cestas. Começaram a fazer um cadastro e hoje tem um conhecimento da situação dessas famílias. Essa veia social do projeto se tornou importantíssima com a pandemia, pois intensificou-se a distribuição de cestas básicas, até mesmo fizeram uma live beneficente com a qual conseguiram arrecadar bastante alimentos. No entanto a música é a maior marca do Pagode da 27, pois é nesse quesito que se tornaram muito conhecidos na comunidade e fora dela também. Em 2010 lançaram o primeiro trabalho, A Comunidade Chegou, e em 2012 foi lançado Filhos da Favela, ai o projeto conseguiu reconhecimento e uma grande projeção. Em 2015, no aniversário de dez anos, foi lançado o vinil em comemoração. As músicas dos trabalhos lançados são autorais, algo que o grupo sempre procurou incentivar, pois buscavam atrair compositores para apresentar sua música. “São compositores, poetas, com o intuito de sempre incentivar o artista local”, fala Flávio. Em 2019 foi lançado terceiro CD É o Povo na Cabeça. Por estar no meio da comunidade as ações sociais também se destacam, como uma parceria que o grupo fez com uma ONG local para disponibilizar um curso de iniciação musical, buscando apoiar e fortalecer as diferentes iniciativas culturais. Flávio ressalta que jovens e crianças gostavam de chegar mais cedo no pagode para aprender, por isso pensaram no curso. Há cinco anos foi feita a biblioteca, que funciona dentro do bar. “A fundação da Biblioteca 27 motivos teve incentivo do próprio Criolo e quem colocou em prática foi o Jeferson. O Rafael Xavier, que chegou depois foi ajudando a coordenar, a deixar

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os livros expostos”, conta o rapaz. Hoje estão trabalhando basicamente com crianças, vão até a casa delas, escolhem um livro, e no mês seguinte recolhem o livro e deixam outro. Tentam interagir com as crianças para serem intermediadores no incentivo à leitura. Nesse ano, com o projeto “Meu livro do Mês”, foram contemplados pelo programa VAI, da prefeitura de São Paulo, que apoia financeiramente projetos de cultura na cidade. Vão reformar a biblioteca e expandir a distribuição de livros. A ideia inicial também era promover encontros, mas por conta da pandemia vão ter de pensar em como vão realizar essa ação. Para a parte musical do projeto o desafio é grande nesse momento, quem ainda tem seu emprego segue trabalhando, seguindo suas vidas, para aqueles que vivem da música está bastante complicado, estão tentando auxílios do governo. Tem alguns dos componentes que recebem direitos autorais de músicas que tem gravadas, mas não são todos. O pagode da 27 tenta trazer o orgulho de viver na comunidade e ter uma esperança de mudança. Um serviço cultural que tenta contribuir com a motivação das pessoas, para que elas acreditem em seus sonhos. Querem expandir o trabalho cultural e trabalhar com esporte. Flávio, que também atua no projeto com a produção, capitação de recursos e produção cultural diz que eles ficam muito felizes de fazer esse trabalho e o fato de ele ser na rua torna muito democrático, apesar de não estarem conseguindo fazer isso agora. “Levamos arte e cultura ancestral, africana. Acreditamos muito no poder da arte acessível a todos. Continuamos a acreditar que é possível uma mudança pra melhor em nossa comunidade e esse trabalho que fazemos é essencial pra isso”, finaliza.

acesse os trabalhos do pagode da 27

projeto meu livro do mês

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9 REVISTA GRAJAÚ www.revistagrajau.com.br


Capa

Articulação de Coletivos na Pandemia: o reconhecimento da dor do outro Por Gi Barauna

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crise pandêmica decretada em Março de 2020 causada pela proliferação do Vírus Covid 19, nos fez ver o quanto somos frágeis, o quanto devemos ter empatia pelo outro, afeto e descobrir em nós o amor a tudo e a todos, esquecer o apego e enxergar o amor puro, singelo, fraterno, amor ao próximo, para que a cada dia lembremo-nos dos mais de 121 mil mortos acometidos pelo coronavírus. A periferia tem sido afetada de formas diversas por essa pandemia e um dos muitos coletivos que promoveram ações para minimizar os efeitos dessa crise para a população periférica foi o “Grajaú Faz Assim”, criado em 2017 por professores, assistentes sociais, artistas e ativistas do Grajaú que decidiram se articular diante do desmonte de políticas públicas que afetou os serviços públicos locais como Centro de Juventude(CJ), Centro para Criança e Adolescente(CCA), UBS, Salas de Leitura em escolas, bibliotecas, além do racionamento da merenda escolar e do corte de verbas para a cultura dentre outros. “O Grajaú faz Assim nasceu nesse momento e realizou o encontro de vários serviços, coletivos e talentos do território do Grajaú e a ideia era que os usuários (visitantes) que eram sempre os mesmos, conhecessem os serviços e se conhecessem para fortalecer o território”, fala Soraia Domingues, professora da rede estadual que faz parte do coletivo. Uma das ações iniciais do grupo foi a conjunta curadoria na realização da Mostra Cultural em protesto pacífico em prol de melhorias nas áreas afetadas e expansão das ações. A partir desse dia passaram a se reunir com frequência e fortalecer o propósito, que é a luta contra a desigualdade social evidenciando a força que possui o Grajaú. 10 REVISTA GRAJAÚ

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Sarah Monteiro e susy neves do coletivo ecp preparam kits de higiene para cestas básicas

Em março desse ano Soraia, que além de professora tem mais de 7 anos de experiência em CCA, conhecedora das reais condições das famílias do distrito e sabendo que com a pandemia tudo iria piorar, foi uma das coordenadoras que reuniu amigos de coletivos e iniciaram a campanha “Grajaú faz Assim” de doação de alimentos e que contou com a ajuda de diversos projetos como Coletivo sem Fronteira, Instituto Anchieta, CCA MAE II, Ação Educativa, UniGraja, Coletivo Expressão Cultural Periférica – ECP, Dentistas do Bem, Ação Cidadania, CAPSArtes, Pagode da 27, Futebol Callejero, e Casa Ecoativa dentre outros. Com isso a iniciativa passou a ter uma força bastante expressiva na distribuição de cestas básicas, contando com doações de diversas fontes e conseguindo estender as fronteiras, chegando as Aldeias Indígenas em Parelheiros e Ilha do Bororé.

Um dos parceiros dessa cam panha e que também se tornou ponto de distribuição cestas foi o Espaço Cultural e Gráfica ECP, sede do coletivo Expressão Cultural Periférica. Sarah Monteiro, Valéria Ribeiro e toda a família se uniram para tentar ajudar a comunidade de alguma forma. “Por termos os projetos, trabalhar com a cultura, trabalhar com o social, morar aqui desde que nasci e conhecer essa realidade não dava pra ficar de mãos atadas, não dava pra ficar parado enquanto todo mundo sofria, então foi uma coisa orgânica... a partir de uma conversa com a Gi Barauna, (que também faz parte do coletivo ECP), a gente teve mais certeza de que tinha que fazer alguma coisa, não dava pra ficar parado”, fala Valéria, sobre a ideia de começar a distribuir as cestas básicas. Pensando em por onde começar o coletivo entrou em contato com Mônica Ramos, que coordena o CCA do Jd. Reimberg, e que por conta das pessoas que são assistidas pela instituição ela poderia indicar famílias que precisavam receber as cestas. O coletivo divulgou que estava coletando itens para montar as cestas e logo começaram a receber alimentos de toda a comunidade, de pessoas que frequentam a gráfica e o espaço cultural ou pessoas que os indicava para receber cestas. Em uma só doação receberam 20 cestas e logo


Articulação de Coletivos foram pra rua fazer as entregas, que inicialmente eram realizadas nas casas das famílias indicadas, para evitar aglomeração na gráfica por causa dos pais da Valéria que já são idosos,(a gráfica é anexa a casa da família), mas a partir desse dia a atividade tomou uma proporção inesperada, o boca a boca gerou um número bastante significativo de famílias na lista de espera e assim, as cestas passaram a ser entregues no endereço do projeto, com agendamento prévio, mantendo as normas de higiene e distanciamento necessários exigidos pela Organização Mundial de Saúde. Até Agosto foram distribuídas mais de 450 cestas e contou e conta com muitos amigos e continua recebendo doações para ser guardada na sala da Dona Dejanira Ribeiro, mãe da Valéria. Perguntada se a ação não a incomodava, por conta da “invasão” de sua casa ela responde. “Eu apoio muito, muito mesmo, ajudei no que eu podia ajudar e no que eu posso ajudar. Até acolher alguém que vêm procurando em dias diferentes, horário diferentes, até eu faço isso. Atendo a pessoa com o maior carinho, com prazer, de coração, então, não foi incomodo nenhum e continua não sendo”. As doações vieram de várias pessoas e lugares, todas elas muito bem vindas, não importando a quantidade. Foram pessoas da comunidade, amigos e parceiros como o “Grajaú faz Assim”, que através de Soraia Domingues doou mais de 200 cestas, Will Ferreira, fundador e gestor do Espaço Kamohelo, na região de Parelheiros que doou 30 cestas, Isabel Nogueira, amiga do coletivo que articulou doações com amigos Irlandeses, Luciana Nadj, Integrante do (CEMP) Centro Espirita Maria Preta, é uma amiga que todo mês leva alimentos para montar novas cestas, e Sarah Miehle-Honecker,

pagode da 27 fazendo entregas de cestas básicas

Encontro online do a bordar espaço terapêutico

alemã que veio conhecer o Grajaú e por intermédio de Igor Oliveira, que é amigo e apoiador do coletivo, soube do projeto ECP Solidário e doou dinheiro para comprar cestas. Sarah Monteiro que atua no coletivo fala: “Espero que a gente continue com esse projeto até Deus permitir, porque quando acabar a pandemia a gente quer continuar com essa entrega de cestas, claro que a gente cansa, terminamos o dia com os ombros, braços doendo, dor de cabeça e tudo, mas é muito gratificante eu imaginar, eu saber que estou fazendo alguma coisa para ajudar o próximo, ainda mais nossa comunidade”. “É desafiador, cansativo porque ao mesmo tempo temos as atividades da gráfica, as questões do projeto... a gente ouve as histórias, vê muita coisa, as pessoas próximas da gente, muito simples, passando muita necessidade, a gente viu situações bem difíceis, não é fácil”, conclui Valéria. A pandemia ocasionou transtornos por todo o lado e fomos obrigados a nos reinventar, criando padrões de superação ao desconhecido, e alguns sentimentos surgiram nesses últimos meses, o medo, ansiedade, depressão, insegurança e anseios de viver um momento sem igual. Essa enxurrada de sentimentos levou muita gente a buscar terapias para ajudar no controle emocional. O A Bordar Espaço Terapêutico é o local pensado e desenvolvido para atender questões acerca do autocuidado elaborado por moradoras do extremo sul de São Paulo. Dayana Almeida, Elânia Francisca e Lidia Sena atuam na promoção de reflexões e ações sobre coexistência e acesso à saúde. Nessa crise não se isolaram e criaram vínculo e desenvolveram várias ações. Em parceria com a Rede Nois por Nois, 8M na quebrada e Lideranças Comunitárias do Jardim Novo Jaú, entregaram cestas básicas a comunidade do distrito. Continuaram a atender com psicoterapia individual, criaram o aten-

dimento de apoio psicológico em grupo com duas escolas públicas da região e contribuíram com atividades online como no projeto “Quem compõe nossa corpa educadora?” recebendo mulheres periféricas em defesa de suas “corpas”. Em parceria com o Projeto Amanhãs ofereceram palestras e mini cursos àqueles que dependiam de ensinamentos e conhecimentos, principalmente os naturais, para que saíssem fortalecidos de mais um dia de isolamento e que compreendessem a importância do autocuidado e o uso diário desses métodos. Mobilizaram com todo o sigilo devido, atenção, cuidado, amor e afeto, o suporte e indicação de locais de moradia a mulheres que estão vivendo em situação de violência doméstica, permanecendo lá até conseguirem resolver as questões que a envolve. Em Setembro o grupo abre inscrição para 3 novas ações: Acolhimento de mulheres, psicoterapia em grupo para mulheres e direitos sexuais reprodutivos. Esse último apoiado pelo Fundo de Ações Urgentes e a Associação Cultural Cafundó, que destinará as inscritas uma bolsa de R$ 100,00. “Esse curso é uma forma das mulheres receberem orientação sobre o autocuidado e a preservação de si e também receberem uma grana para que elas possam destinar da melhor forma que elas acharem. A cesta básica é muito necessária, muito importante, mas a gente entende que dar o dinheiro na mão da mulher faz com que ela tenha autonomia para escolher o destino desse dinheiro porque nós entendemos que a maioria das famílias periféricas é chefiada por mulheres.”

Contatos dos coletivos @grajaufazassim @espacoculturalegraficaecp @abordarespacoterapeutico AGO/SET de 2020 REVISTA GRAJAÚ 11 www.revistagrajau.com.br


Adolescente Saudável

O Programa Adolescente Saudável O PAS é fruto da parceria global entre a Plan International e a AstraZeneca e é desenvolvido na Zona Sul de São Paulo desde 2017, nas regiões do Capão Redondo e Grajaú. Seu principal objetivo é empoderar adolescentes e jovens para tomarem decisões positivas sobre sua própria saúde e para multiplicarem conhecimentos sobre saúde para seus pares. Por que Capão Redondo e Grajaú? Os dois distritos são marcados por altos níveis de vulnerabilidade, com problemas sociais relacionados ao desemprego, moradia, saneamento básico, transporte, segurança e escassez de serviços públicos. A população entre 10 e 19 anos representa cerca de 15% em cada distrito, somando mais de 100.000 adolescentes no Capão Redondo e Grajaú. Diante do cenário de vulnerabilidades, os comportamentos de risco à saúde estão mais presentes e podem afetar decisivamente a vida de adolescentes e jovens. Como o PAS atua? A Plan International Brasil desenvolve o conhecimento e capacidades de adolescentes e jovens por meio da realização de oficinas sobre doenças crônicas não transmissíveis, fatores e comportamentos de risco, saúde sexual e saúde reprodutiva, direitos sexuais e direitos reprodutivos, gênero e protagonismo. Os adolescentes e jovens que passam pelos treinamentos se transformam em educadores pares e multiplicam o conhecimento adquirido para outros adolescentes e jovens das suas comunidades. Resultados: Durante sua atuação no Capão Redondo e Grajaú, o Programa Adolescente Saudável treinou 237 adolescentes e jovens educadores pares que sensibilizaram 37.877 outros adolescentes e jovens das suas comunidades nas temáticas do Programa. O PAS também capacitou 515 profissionais de saúde e educação e sensibilizou 370 familiares dos educadores pares. Indiretamente, o Programa alcançou mais de 5 milhões de pessoas por meio de campaAGO/SET de 2020 www.revistagrajau.com.br

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Participantes do Programa Adolescente Saudável no Grajaú

nhas presenciais e online, com sensibilização sobre Doenças Crônicas Não transmissíveis – DCNT, fatores e comportamentos de risco, direitos sexuais e direitos reprodutivos, gênero e protagonismo jovem. A avaliação final do PAS também mostrou que apesar de muitos adolescentes terem adquiridos hábitos saudáveis, alguns comportamentos de risco ainda estão muito presentes no cotidiano deles. A partir de uma amostra de 102 adolescentes e jovens educadores pares do Capão Redondo e Grajaú, 85% afirmaram ter o costume de consumir frutas, verduras e legumes e 59% indicaram que costumam praticar atividades físicas. Por outro lado, com um número também expressivo, 85% responderam que tem o hábito de consumir lanches, frituras, bolachas recheadas e refrigerantes. Sobre o consumo de tabaco, 30% informaram que já fumou ou experimentou tabaco alguma vez e 32% disseram que consomem bebidas alcóolicas com alguma frequência. O Programa Adolescente Saudável traz à tona a necessidade de olhar para adolescentes e jovens como sujeitos de direitos e como usuários dos serviços de saúde. O PAS evidencia o adolescente como sujeito que detém conhecimento sobre sua própria vida e realidade, capaz de tomar decisões positivas e autônomas, e que deve fazer parte da solução para questões relacionadas à juventudes, saúde e comunidade. O PAS acredita em promover o jovem como protagonista da sua própria história!


Saúde Mental no Grajaú

a importâcia do autocuidado Por Valéria Ribeiro

O

distanciamento social causado pela pandemia do COVID 19 causa várias consequencias na vida das pessoas, principalmente na periferia. As preocupações são imensas, saúde, família, perda da renda e do emprego, o convívio diário, sem nenhuma folguinha... As notícias ruins o tempo todo afetam muitas pessoas que sentem no corpo e na alma os efeitos. Ansiedade, depressão, insônia, medo, dentre muitas outras coisas. Pensando nisso a Rede Nóis Por Nóis criou um guia de autocuidado que está disponível gratuitamente na internet. O guia traz dicas simples e até mesmo indicações de locais com atendimento psicoterapeutico gratuito ou a preço popular. A ideia surgiu de uma inquietação sobre o que estamos atravessando na periferia, sobre a saúde mental, fala Barbara Terra, Coordenadora Geral do projeto. Juntamente com Romária Sampaio e Jeniffer do Carmo que atuam com saúde e prepararam o contéudo do guia, perceberam o quanto a periferia é carente nesse suporte de autocuidado. Fortificaram a colaboração dentro da própria rede e conseguiram uma parceria com o Instituto C&A para iniciar o processo do núcleo de apoio terapêutico para os empreendedores e moradores locais. Percebendo as demandas da comunidade, que não tem muito acesso a esse tipo de informação ou não tem muito tempo para olhar pra si mesma pois os desafios pela sobrevivência são diários elas decidiram contribuir. “É um processo de percepção nossa enquanto liderança”. Esse

discernimento interno surgiu da própria Barbara que já havia decidido, antes da pandemia, que esse ano precisava se dedicar mais para si mesma. Queria criar esse espaço de autocuidado. “Veio muito desse lugar que é coletivo, mas que também é individual”. Que haja espaço para o nosso autocuidado! “Vamos propagar o que a gente vem aprendendo para a nossa quebrada”, finaliza.

dicas que funcionaram comigo! Faça Exercícios ! O Youtube tem vários canais que podem ajudar com dicas de aeróbica, bicicleta ergométrica, step, jump. Escolha o que mais lhe agrada e mexa o esqueleto. Não fique o tempo todo assistindo notícias ruins! É importante se informar e saber o que fazer, mas ficar sabendo de tudo de ruim que acontece no mundo o tempo todo não vai ajudar e vai te deixar mal. Cuide de sua alimentação e Medite! Vai melhorar seu corpo e sua mente. Está disponível o download da versão digital gratuita da primeira edição do Guia de Autocuidado da Rede Nóis por Nóis, um guia básico para dias melhores. Um material com dicas e informações importantes sobre como podemos cuidar de nós mesmos e de nossa saúde mental, importantíssimo para conseguirmos manter o equilíbrio e o bem estar em tempos difíceis que para muitos do nosso território já é a normalidade há muito tempo. Agradecemos muito a todos os parceiros que tornaram esse trabalho realidade.

Disponível em: https://bityli.com/guiadeautocuidadonpn

Conheça mais o trabalho da Rede Nóis por Nóis Redenoispnois

Nois por Nois AGO/SET de 2020

REVISTA GRAJAÚ 13 www.revistagrajau.com.br


Jovens da Quebrada

SOBRE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA PANDEMIA Por Sarah Monteiro

N

os altos de meus 17 anos estou vivendo em uma pandemia mundial, e a cada dia que passa o índice de mortalidade aumenta e milhares de pessoas morrem por dia. Pode parecer besteira, mas a vida de um adolescente é difícil, constantemente preocupado com o que vai ser quando “crescer”, em outras palavras, “ser alguém”. Tudo então piora com a nossa situação atual, tendo como exemplo, eu. Antes de toda a pandemia, estava certa dos cursos que iria fazer e da faculdade que iria cursar, após essa pandemia, tudo se complicou, nossas escolhas mudam frequentemente por conta da ansiedade e do isolamento social. Fui conversar com outros adolescentes e crianças para saber o que eles estavam passando e entrevistei a Giovanna Beatriz, que tem 8 anos de idade. A garota diz: “eu não gosto dessa pandemia, não consigo mais estudar, ir pra escola e sair pro parque.” Falei também com Kelvin Monteiro, de 15 anos. “Por um lado, a pandemia está sendo o motivo da minha aproximação familiar, pois passo mais tempo em casa, tendo mais contato com minha família, a pior parte é não poder mais sair com os amigos e os estudos a distância, o que dificultou muito meu aprendizado, pois tenho alguns problemas em aprender virtualmente.” Finaliza.

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Entrevistei também a Sofia Fernandes, 4 anos: “Eu não gosto do corona não, não posso passear com o Thor (cachorro), nem brincar com meus amigos na piscina do prédio, tenho saudade de ir pra escola e ver a professora, em casa eu não consigo aprender a lição”, reclama a menina. Outro relato foi do Vinícius de Souza “mudou muita coisa na minha vida, fiquei sem aula, totalmente isolado, mas a parte boa é que a vacina já está sendo desenvolvida, espero que tenha muitas mudanças no ser humano e que tenham mais fé em Deus.” A vida das crianças e adolescentes em meio a pandemia está mudada, as crianças não tem mais o contato físico com as outras, o que nessa fase é essencial, tanto para o aprendizado, quanto para o desenvolvimento de si mesmo. Já nós, adolescentes, precisamos desse contato, muitos passam por problemas familiares, problemas psicológicos e muitas vezes só conseguem conversar com seus amigos...

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na oficina histórias e memórias do grajaú o artista ricardo negro posta mensalmente em nosso canal no youtube vídeos contanto sua história, apresentando sua arte e vivência no grajaú.


Cultura

Por Valéria Ribeiro

C

om um estilo profundo e um intenso mergulho interior, Ser Ajardinado, Reflexões e Poesias para nossa Alma é um livro delicado, que traz em forma de poesia o universo de Gisele Verillo, sua autora. Lançado em janeiro desse ano no Sarau das Minas, realizado no Graja Beer Pub, a obra é resultado de anos de uma busca interior, tentando responder a questões como: Por que eu vim para essa terra? Qual o meu propósito? Gisele é moradora do Jd. Reimberg, no Grajaú, e desde os 8 anos já buscava respostas existenciais e tinha interesse em espiritualidade. Aos 22 mudou de religião, mas a busca continuou. Da infância trouxe seu diário, quando escrevia para Deus, sabendo que existia um ser superior, divino e universal. Por meio das letras vai conversando com Deus e entre preces e clamores produz poesias meditativas, que perpassam as páginas de Ser Ajardinado.

Ser Ajardinado

Reflexões e Poesias para nossa Alma A escritora, que adora estar em contato com a natureza e fazer trilhas diz que o livro a inspirou a trabalhar com a terra, mexer com as plantas, e se interiorizar ainda mais. Hoje aos 38 anos continua sua busca pelo sentido da vida através da antroposofia, segundo ela uma metodologia muito profunda, que estuda o ser integral universal, que vai além do interno, espiritual, religioso e está integrada a pedagogia Waldorff, que trata da pedagogia curativa. Em sua busca ao longo da vida fez teologia, estudou a bíblia e se adentrou um pouco na questão mediúnica também. “Sou meio curiosa”, ela diz. Pedagoga de formação, atua nas creches conveniadas pela prefeitura desde 2007. Frequentadora dos saraus que acontecem em vários lugares de nossa região, dentre eles Sarau do Grajaú, Sarau das Águas, Sarau de Cordas da Casa Ecoativa, Sarau

das Minas, Clamarte e a Roda de Poesia do CAPSarte. Esses encontros a estimulou a lançar o livro, e já está escrevendo seu segundo, que traz entre os temas a força solar e dos anjos. Além desse no qual está trabalhando já tem dois livros infantis escritos, Infância Inocente e no Jardim De Infância, que traz uma pegada mais filosófica. A pandemia interrompeu os outros lançamentos do livro e o último antes da quarentena foi realizado em março, no Sarau Luau, na cidade de Mogi das Cruzes, em um encontro de trilheiros em meio a natureza e ao som do crepitar das labaredas de uma fogueira. “Foi bem ritualístico... um momento de meditação e desabafo”, fala a escritora que continua sua busca pelo autoconhecimento. “Nosso propósito de existência no mundo é florir e melhorar”, finaliza.

Quer conhecer mais o trabalho de Gisele e adquirir seu exemplar? Entre em contato com a escritora: ser ajardinado AGO/SET de 2020 REVISTA GRAJAÚ 15 www.revistagrajau.com.br


Cultura Por Valéria Ribeiro

A

família humana é conectada por sentimentos que vão muito além de cor, raça, cultura, bandeiras ou idiomas. Eu diria que a família humana é conectada pela centelha divina, seja ela representada por Jesus Cristo, por Buda, por Maomé, por Tupã, por Oxalá, por Ganesha, por Brahma ou outras representações de Deus que há em todos nós, filhos da terra. Alguns sentem esse chamado por se conectar com o outro de maneira mais profunda, independente da língua que fala ou de sua localização geográfica, quanto mais ”lejos” melhor, quero dizer, quanto mais longe melhor, pois são nesses casos que iremos vivenciar culturas e saberes diferentes, porém, que se juntam aos nossos e nos tornam extremamente ricos. Essa sintonia aconteceu entre Sarah Miehle-Honecker, alemã de 25 anos, moradora da cidade de Ludwigsburg e Igor Oliveira, 27 anos, morador do distrito do Grajaú. O encontro entre essas duas almas realizou-se em outro idioma, no país vizinho, Argentina, mais precisamente na Universidade de Buenos Aires, quando ambos participavam de um intercâmbio naquele país, no ano de 2016. O espanhol foi a primeira língua “oficial” dessa amizade, que dura até hoje e que ano passado trouxe Sarah para conhecer o Grajaú, já se comunicando em português. Segundo Igor foi uma “orquestração do universo”. Para ele o intercambio foi um divisor de águas, trouxe experiências que jamais pensou em ter na vida. No domingo, 2 de agosto, em uma tarde ensolarada de inverno no Brasil, quase noite no verão da Alema-

O mundo das conexões culturais e empatias

igor oliveira e Sarah miehle-honecker curtindo a cidade de sp nha, visto que 5 horas de fuso horário nos separam, Sarah, Igor e eu tivemos um encontro virtual, como ficou comum nesses tempos de pandemia. Conversamos durante quase 2 horas sobre a vida e a conexão entre as pessoas. Sarah, que faz graduação, nos conta que tinha a intenção de continuar seus estudos para dar aulas em Alemão, mas acabou indo para Portugal, onde aprendeu o português e de certa forma a trouxe para o Grajaú. Igor conta que a visita da amiga em sua casa foi incrível. Os pais do rapaz ficaram encantados com a moça, que tem o sotaque de Portugal, o que enriquece o contato, pois são outras palavras utilizadas também. “Eu também aprendi no processo” fala Igor. “Nossa amizade cresceu e fiquei muito agradecida de visitar o Igor em seu país e conhecer a sua família”, conta Sarah. Em sua graduação de Cultura e História tinha de estudar fora do país, e foi para a Cidade do Cabo, na África do Sul. Depois iria para Cuba, mas o avião faria uma escala em São Paulo, daí surgiu a possibilidade de visitar o

Sarah entre os amigos que conheceu no projeto aldeias 16 REVISTA GRAJAÚ AGO/SET de 2020 www.revistagrajau.com.br

Brasil e o Igor. Isso foi em novembro do ano passado. Teve também a oportunidade de viajar para Moçambique, também na África, país no qual o português é a língua oficial, então pôde praticar. Ela não havia planejado isso, mas ficou radiante com a possibilidade. No Brasil Sarah acompanhou Igor em sua rotina diária aqui no Grajaú. Conheceu o projeto Aldeias Infantis SOS, próximo ao Sesc e participou junto com os alunos do Igor, refugiados venezuelanos, do Sarau das Nações. “Foi muito, muito lindo, de verdade!”, diz Sarah. Eu estava muito agradecida em poder falar com as pessoas, de fazer parte de sua vida em São Paulo (da vida de Igor), não somente conhecer as atrações turísticas da cidade”. Ela gostou da comunicação entre os vizinhos em nosso bairro, comentou da interação de Igor com sua vizinha, uma menininha, e que entraram na casa dela, coisa que não é comum na Alemanha. “Esse tipo de comunicação espontânea para mim foi muito lindo”. Minha conexão com Igor tam bém aconteceu por meio do espanhol. Nós moramos em bairros vizinhos e não nos conhecíamos, no entanto depois de uma reportagem que fiz sobre os refugiados venezuelanos e outras nacionalidades que vivem no Grajaú, na edição 12 dessa revista, lançada em agosto do ano passado, ele ao ler a reportagem viu que tivemos a mesma professora de espanhol, a chilena Paulina Cesped. Entrou em contato comigo, nos conhecemos, ficamos amigos, fomos juntos visitar a Paulina e até mesmo fomos juntos assistir a Banda argentina Perotá Chingó tocar aqui no Brasil e nossa amizade só cresce!


Cultura

Tempos de Pandemia

N

esses tempos desafiadores que estamos vivendo, a ligação e a empatia com o próximo aumenta, ou deveria aumentar. A televisão e a internet nos permitem ver e buscar informações sobre como cada povo e cada nação está enfrentando esse momento. Sarah Miehle-Honecker, que tem consciência de que é privilegiada em várias formas, por conta de onde nasceu, usa essa situação para ajudar outras pessoas. Por isso em seu aniversário desse ano teve uma ideia para tentar contribuir com aquelas que estão sofrendo com a pandemia. Em vez de as pessoas lhe darem presentes poderiam dar o valor do presente em dinheiro, para que ela pudesse juntar e doar para quem precisa. “Se vocês querem dar uma coisa, penso em compartilhar um pouquinho, podem dar dinheiro a um projeto porque eu sei que tem outras pessoas que precisam (falava para seus familiares e amigos). Eu fico feliz e vou fazer pessoas felizes também.” A alemã teve contato com a nossa revista quando visitou o Grajaú e até mesmo levou algumas edições para ajudar em seu aprendizado com o português. Então Igor fez o contato conosco, pois sabe que estamos fazendo arrecadação de alimentos e recursos para montar cestas básicas para doar para a comunidade e sugeriu que ela fizesse a doação ao nosso projeto ECP Solidário e foi o que ela fez. Ao todo Sarah conseguiu arrecadar e doar R$ 960,00 reais, com os quais conseguimos montar 14 cestas básicas + kit de higiene, que já foram doados para as famílias que estavam em nossa lista de cadastros. Sarah tem em seu interior essa conexão e vontade de ajudar. Na Alemanha trabalhou em um campo de refugiados, assim como o Igor trabalhava aqui no Grajaú com os refugiados venezuelanos do proje-

to Aldeias Infantis SOS. Ela foi ensinada em sua família, principalmente pela avó Esther Honecker, de 83 anos, que é importante partilhar a felicidade. Inclusive ela também doou para essa ação que sua neta idealizou. Sarah fala da felicidade que sentiu ao estar junto com o Igor no Aldeias Infantis e então essa ação foi uma forma de “devolver” ou compartilhar com outras pessoas a felicidade que teve. O aprendizado da jovem em seus intercâmbios mudou a forma como ela vê o mundo. As interações com as pessoas nas ruas, entender a realidade, compartilhar. Tudo isso lhe ensinou que independente do lugar onde se encontra são as mesmas coisas que nos fazem sorrir e nos fazem chorar. “No final há muito mais coisas que nos conectam do que coisas que nos separam”. Falar um idioma, mesmo que poucas palavras te conectam com a outra pessoa. “Quando alguém sabe algumas palavras em seu idioma quer dizer que quer saber mais de mim, quer dedicar tempo, quer compreender a tua trajetória”, fala ela que agora está estudando árabe. “Não importa o nível, se são apenas 10 palavras, elas vão fazer diferença”. Essa ligação com o idioma e com a cultura fez mais uma conexão no último final de semana, 23 de agosto, quando mais uma vez Igor me apresentou um novo amigo. Jimmy Guerra, um peruano nascido em Puno, onde fica o Lago Titicaca, cartão postal tanto do Peru quanto da Bolívia. O rapaz está vivendo na Cidade Dutra, pois veio ao Brasil em fevereiro e não conseguiu voltar por conta da pandemia. A conversa, que era para durar 20 minutos, durou mais de duas horas! Mas essa história fica para outra edição da Revista! Assim como a matéria sobre os venezuelanos trouxe o Igor, a Sarah e o Jimmy, espero que essa matéria faça mais conexões que reverberem na vida de todos nós.

Sarah no sarau das nações no aldeias infantis sos

#DONAVERAPRESENTE

N

ós, do coletivo Expressão cultural periférica, o ECP, que produz a Revista Grajaú queremos prestar nossa homenagem a Dona Vera, idealizadora de um projeto que inspira milhares de pessoas em todo o território do Grajaú e prestar nossas condolências a família e amigos. Seguimos nossa luta como uma forma de homenagea-la e continuar a luta em favor de nossa comunidade.

E

VOZES DO GRAJAÚ

u sou a Maria Aparecida Goes, moradora do Grajaú. O medo que cresce a cada dia, o desemprego, eu perdi o emprego, viver em paz a gente não consegue, qualquer coisa a gente treme, até de por a cabeça lá fora por causa do vírus e está sendo difícil, muito difícil. É uma insegurança imensa. É pedir felicidade a Deus e proteção para cada um de nós.

M

eu nome é Márcia Pereira, tenho 56 anos, moro aqui no Grajaú. Viver aqui nessa pandemia é complicado, porque a gente fica presa dentro de casa. Eu sou informal, agora não estou mais fazendo porque não tem mais bico de diarista então tá bem complicado. Pessoas que nos ajudam graças a Deus, mas todo mundo na rua passeando, o bar é lotado, fazendo churrasco, parece que está de férias. A gente sai quando é necessário e se protege. Principalmente os jovens não respeitam o isolamento, eles acham que não pegam, que tem de ficar em casa são só os idosos e pessoas com doenças crônicas, é bem complicado...

AGO/SET de 2020 REVISTA GRAJAÚ 17 www.revistagrajau.com.br


Terra Indígena

São Paulo é território indígena

Por Juliano Angelin

O

s nomes de lugares como Jurubatuba, Jabaquara, Ibirapuera, Anhangabaú e o próprio Grajaú são derivados das línguas Tupi-Guarani. Essa presença indígena vem de um passado distante, estudos revelam que a ocupação humana desse território ocorre há pelo menos 12 mil anos. Mas não é só no passado que estão estes povos indígenas, atualmente nesse território que chamamos de Brasil há mais de duzentos povos indígenas, que falam cerca de 274 línguas diferentes. Na região metropolitana de São Paulo há, entre aldeados e não aldeados, aproximadamente 21 mil indígenas. Nos extremos Norte e Sul da capital paulista encontram-se as terras indígenas Jaraguá e Tenondé Porã, onde totalizam cerca de 15 aldeias da etnia Guarani Mbya. Na aldeia Krukutu, uma das aldeias da terra Tenondé Porã (região de Parelheiros),vive Olívio Jekupé, escritor guarani que já lançou 19 livros sobre a sua cultura, com poesias, lendas e histórias. Seus livros estão em diversas livrarias, bibliotecas e escolas públicas do estado de São Paulo. Para ele, a literatura nativa (escrita pelos próprios indígenas) é fundamental para combater o preconceito e a desinformação. Olívio vê a alfabetização do indígena como uma importante arma para a defesa dos direitos. “O mundo do branco é traiçoeiro, então a gente tem que saber essa arma deles para não sermos enganados. Por muitos séculos as populações indígenas foram exploradas e massacradas, então hoje temos que usar a mesma arma deles, que não

18 REVISTA GRAJAÚ AGO/SET de 2020 www.revistagrajau.com.br

é o revolver, mas o conhecimento” Sobre as dificuldades atuais e a chegada do corona vírus na aldeia, Olívio diz: “Na nossa aldeia, tivemos que pensar em algumas coisas: a escola foi fechada, o CECI (Centro De Educação E Cultura Indígena) está sendo usado no atendimento de saúde, não estamos mais recebendo visitas de escolas de fora da aldeia. A gente sabe que o isolamento é uma forma de defesa.” “A gente fica triste de saber que muitas lideranças indígenas no Brasil morreram com essa doença. Eu gostaria de citar o nome do Aritana, do Xingu, que faleceu recentemente. E também o Paulinho Paiakan que foi uma das maiores lideranças que conheci até hoje. Na década de 80 ele (Paiakan) era muito conhecido por que lutava pelo seu povo e pelo Brasil. Em 1992 ele ia participar da grande conferência internacional ECO 92, mas uma semana antes do evento armaram uma cilada para ele que deixou seu nome sujo até hoje. Muita gente zomba do nome Paulinho Paiakan, mas ele era inocente. Então podemos dizer que mataram o nome dele enquanto ele era vivo e agora mataram através do COVID”. Além da questão de saúde, um

grande problema que os indígenas enfrentam hoje no Brasil é a política do atual presidente. “Nós indígenas sempre sofremos nas mãos dos políticos e agora, por azar, temos esse novo governo que atrapalha não só os indígenas, mas as pessoas periféricas, negras, mulheres… todo mundo está sofrendo na mão dele. Porque esse governo é racista, ele é muito radical. A gente sabe que muitos fazendeiros, ruralistas e políticos lutam contra os povos indígenas, então por isso ele fez a promessa de acabar com os povos indígenas se ele fosse eleito, e agora ele está cumprindo. No dia que ele tomou posse, 1 de janeiro a noite, a primeira coisa que ele assinou foi cancelar toda a demarcação das terras indígenas no Brasil” Nesses tempos difíceis, de perdas e mudanças que estamos todxs vivendo, o escritor guarani nos deixa o recado: “As pessoas costumam falar que o indígena não faz nada, mas enquanto ‘não fazemos nada’ fazemos muito mais do que o não-indígena, porque protegemos a floresta. Enquanto a sociedade não entender que a floresta é um bem de todos, eles não vão respeitar. Por isso é importante as pessoas verem que quando nós valorizamos a floresta nós estamos fazendo bem para o mundo. Enquanto destruírem a floresta estarão prejudicando o mundo.”


Parceiros Passatempo

Caça-Palavras: Projetos culturais do grajaú

AGO/SET de 2020 REVISTA GRAJAÚ 19 wwwww.revistagrajau.com.br



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