Revista Deguste - Setembro 2017

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RD: Como foi o projeto do Yuru? A rede BHG (que administra o Golden Tulip) o procurou? JP: Na verdade, a rede BHG contratou um rapaz chamado Eduardo Merli, que era editor do Guia Quatro Rodas. Formataram um projeto com ele, como queriam o restaurante, e depois foram atrás de um chef para comandar o restaurante. Eduardo Merli sugeriu meu nome e casava muito bem com a ideia do conceito que eles tinham: uma proposta mais voltada para o que é da terra. É um restaurante-conceito para o Golden Tulip, que trabalha no Brasil só com cozinha internacional. Assim, Yuru foi o primeiro que eles quiseram trabalhar com uma cozinha mais autoral, mais sofisticada, mais trabalhada, mais exclusiva. Aquela história de um produto mais ímpar, em vez de sempre trabalhar com cozinha italiana, francesa, japonesa. Eles quiseram fugir um pouco dessa tradição.

RD: Como você vê o cenário gastronômico, hoje, no Brasil, em especial o Nordeste? JP: Está bem. Todo tipo de recessão é ruim, principalmente para restaurantes, mas eu acho que, apesar dos trancos e barrancos, está bem. Está indo em uma crescente. O Brasil está formando ainda uma identidade. Até porque o Brasil é muito grande. Não dá para dizer que a cozinha brasileira é isso... a cozinha brasileira são várias microrregiões que formam a cozinha brasileira. Não dá para ser, tipo, igual à comida portuguesa e tal. Até Portugal há várias sub-regiões. Penso que a cozinha brasileira está meio que em processo de formação. Acho que daqui a alguns dez anos vamos presenciar algo mais sólido. Mas acho que já temos. Cozinhas nordestina, do Sertão, Mineira, de São Paulo, do Sul, a do Norte... Amazônia e Pará, que são bem fortes.

RD: Como você definiria o seu conceito na cozinha, em síntese? JP: Eu gosto de citar que há uma música de Chico Science que falava “Pernambuco embaixo dos pés, minha mente na imensidão”. Eu procuro muito esse conceito. Eu guardo um pouco da minha raiz, mas também não me limito a ficar só ali no meu mundinho, de Recife, de Pernambuco. Então, eu estou com os pés fincados lá, mas a minha cabeça está pensando em um negócio mais abrangente, mais global.

RD: E no cenário mundial, o Brasil já consegue despontar? JP: Já sim. O Brasil não deve mais nada a ninguém, não. É só questão de formatar isso. Infelizmente, a gente não conseguiu fazer o que o Peru fez, de se tornar conhecido mundialmente com o ceviche, com a cozinha Nikkei. O Brasil não soube fazer isso com a tapioca, de deixar a tapioca conhecida no mundo

Infelizmente, a gente não conseguiu fazer o que o Peru fez”

RD: Foi lá na França que você aprendeu e teve contato com as técnicas? JP: Sim, foi. A França, vamos dizer, foi a minha escola. RD: Quais seriam as técnicas que você emprega? JP: A base técnica de cozinha mundial vem da França. Hoje, os melhores chefs do Japão, da Espanha, da Itália, todos eles passaram pela escola francesa. Tratase da primeira escola a regulamentar isso, a anotar isso em livro, a colocar no papel, a fazer um curso. A base técnica de tudo é a cozinha francesa.

todo. Mas, agora, conseguiu com o açaí, que está conhecido mundialmente, no entanto ainda não se associa muito ao Brasil.

RD: Aqui no Yuru, você trabalha as técnicas francesas com elementos regionais. Tem alguma coisa bem específica do Rio Grande do Norte? JP: Tudo. Quando eu fiz o cardápio daqui, não estava pensando em Pernambuco. A minha inspiração foi Natal, no RN, na região. Agora, a região daqui se assemelha muito à região pernambucana, vamos dizer assim. Castanha, carne de sol, camarão, feijão verde, macaxeira, queijo coalho...

RD: O que precisaria para isso? JP: Tem que ter um embaixador. No Peru, teve Gastón Acurio, que comanda um dos melhores restaurantes da América Latina. E ele teve um apoio maciço do governo. Aqui a gente tem Alex Atala. Infelizmente, o governo daqui não trata a gastronomia como cultura. Hoje em dia muita gente vai ao Peru por causa da gastronomia. Isso poderia ocorrer no Brasil também. 27

Deguste | Setembro | 2017


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