Pará+ 50

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Ambroise Paré, o “Pai da da Cirurgia Moderna”, maior cirurgião da Renascença, aboliu a prática atroz da cauterização das feridas. Costumava dizer: “Eu tratei Deus curou”

explicações. Depois que a vacina de Jenner praticamente erradicou do mundo a varíola, esta deixou de ser um flagelo, não mais preocupa e, por isso, nem mais dela se lembram ou se arreceiam. A sífilis, que já dizimou exércitos e populações inteiras, após o advento da penicilina de Fleming deixou de merecer atenção e importância. O grande Warren provocava delírios na platéia que o via realizar amputações de membros em poucos segundos, sem anestesia; depois que esta alcançou o nível de elevação, refinamento e segurança com que hoje é praticada, a operação deixou de ser espetacular, a anestesia vulgarizouse e, se porventura algum acidente anafilático (reação essencial e imprevisível a uma substância) ou de idiossincrasia (sensibilidade anormal a uma droga) medicamentosa ocorre, entre milhões de outros atos bem sucedidos, logo se lhe imputa a um provável “erro médico”. A AIDS, que ora a todos atemoriza (a alguns aterroriza), põe em evidência a todos os cientistas, pesquisadores, drogas e fatos novos que contribuem para o seu controle, a sua contenção, a

sua cura, após o que declinará de importância, não mais merecendo destaque, assim como os médicos e cientistas que dela se ocuparem. Os médicos de hoje fazem, sem ponta de dúvida, muito mais coisas notáveis que os de antigamente, porém, tornaram-se facilmente disponíveis, fartos, até, e atuam através de métodos científicos, que não suscitam o mesmo encanto da prestidigitação. Seu diagnóstico e sua arte não causam mais admiração. A Medicina é levada e divulgada para além dos recônditos das instituições acadêmicas, detalhada, esmiuçada, decodificada e exibida por meios outros que não os estritamente científicos como a imprensa leiga e a televisão, às vezes até de forma antiética e exibicionista, o que não deixa de ser, no entanto, fator positivo para a elevação cultural da população interessada e atenta. As técnicas científicas exaltam a Medicina, mas despersonalizam o médico, ainda que eficiente e capacitado, que passa a ser, assim, cada vez mais exigido e testado pelos que dele se valem. Qualquer senão, falhas às vezes até inexistentes, mas supostas pelos pacientes são motivos bastantes para inquiná-lo com alegação de negligência ou imperícia. A massificação do atendimento nos postos de saúde espalhados pelas cidades acabou, de vez, com a tão desejada e não mais possível relação médico-

Uma operação cirúrgica realizada no final do século XIX (c. 1890)

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